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702 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

regimento, vota-se primeiro o parecer da minoria (apoiados).

Consultada a camara, resolveu que fosse considerado como emenda.

Procedeu-se á chamada para a votação por espheras.

O sr. Secretario (Holbeche): - Foi approvado o parecer da minoria por 51 espheras brancas, contra 7 espheras pretas.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a discussão dos projectos n.º 26, sobre a fixação da força de terra, e n.°31, que já estava dado, sobre a contribuição predial. Temos mais para a primeira parte os projectos n.ºs 24 e 27, que são auctorisações às camaras municipaes para levantar emprestimos.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas e meia da tarde.

Discursos do sr. deputado Levy Maria Jordão, pronunciados na sessão de 5 do corrente, e que deixaram de ser publicados no competente logar

O sr. Levy: - N?o tomaria por alguns instantes a attenção da camara se a tanto me não forçasse o ter ha muito a minha opinião comprometida na questão de direito a que dá logar o parecer em discussão.

Trata-se de um processo instaurado em um juizo criminal d'esta cidade contra o sr. deputado Santos e Silva, processo que o respectivo juiz remetteu a esta camara para ella, nos termos do artigo 27.º da carta dar ou negar a licença para a sua continuação.

Pondo de parte a questão, aliás importante, de direito constituendo, occupar-me-hei do direito constituido, porque é á face da legislação em vigor que havemos de resolver.

Qual tem sido a intelligencia constante do artigo 27.º da carta até hoje?

Que preparado o processo criminal é remettido á camara pelo juiz; e esta, examinando o mesmo processo, a natureza e valor da incriminação, e as circumstancias que a possam aggravar, attenuar, ou extinguir, concede ou nega a licença para a continuação da cousa.

Esta disposição constitucional é uma garantia politica da independencia do deputado, estabelecida com o fim de evitar que elle seja victima de paixões politicas, de odios ou vinganças de qualquer especie.

Quanto á natureza da funcção que a camara exerce em virtude do artigo 27.º ha duas opiniões; consideram uns a camara como uma especie de tribunal de ratificação de pronuncia; entendem outros que ella exerce uma funcção meramente politica, como o governo quando nega ou concede a licença para a continuação do processo contra funccionarios administrativos.

Esta divergencia de opiniões quanto á natureza da funcção, não destroe porém a intelligencia que os partidarios de ambas dão ao alcance e importante d'essa mesma funcção.

Hoje apresenta-se por parte da commissão (ou para melhor dizer, da maioria d'ella) uma nova opinião, que é a do seu illustre relator, o sr. Ferreira de Mello, sustentada por elle tão habilmente na polemica jornalistica com um dos primeiros publicistas d'esta terra, o sr. Antonio Rodrigues Sampaio.

A theoria da commissão é em poucas palavras s seguinte:

O processo não deve ser remettido á camara, nem esta tem de o analysar ou estudar.

O juiz deve limitar-se a participar que o deputado está pronunciado por tal crime.

E a camara, conhecendo só da opportunidade do processo, decide se este ha de continuar já ou mais tarde, sem poder negar a licença.

D'aqui tira a commissão por conclusão que deve ser dada a licença para seguir o processo, mas finda a presente sessão.

Para eu repellir similhante doutrina bastava-me attender a que ella repugna até ao bom senso.

Querer obrigar a camara a dar a licença, a declarar se o deputado deve ou não ficar suspenso do exercicio de suas funcções, se deve ou não ser preso, sem conhecer a natureza e valor da accusação, e as circumstancias que n'ella podem influir, seria fazer justiça às cegas.

Mas eu não quero limitar me a isto; e vou demonstrar o mais concisamente que a doutrina da commissão se oppõe á letra e espirito da carta, pugna com o espirito da mais legislação politica, funda se n'uma confusão de idéas, leva ao absurdo, dá em resultado a immoralidade, e é repellida pela jurisprudencia parlamentar, e até pela dos tribunaes.

Oppõe se á letra da carta - porque esta dá expressamente á camara no artigo 27.° o direito de conceder ou negar a licença; e a commissão recusa-lhe o direito de negar la, dando lhe apenas o de suspender ou adiar o processo, que a tanto se reduz a questão da opportunidade.

Oppõe-se ao espirito da carta - 1.°, porque o seu fim, estabelecendo esta garantia politica, foi evitar que o deputado podesse ser victima de paixões politicas, odios ou vinganças; e a commissão, recusando á camara o direito de negar a licença, aniquila a garantia - 2.°, porque se a camara tivesse direito de suspender o processo, como entende a commissão, estaria isso em manifesta opposição com o artigo 145.º § 12.°, que prohibe a qualquer auctoridade sustar causas pendentes.

Pagam com o espirito da mais legislação politica, porque se pronunciado um deputado a camara só tivesse direito de suspender o processo até findar a legislatura ou a sessão legislativa, continuaria elle deputado a funccionar como tal dentro da camara; mas se a lei não quer que o pronunciado possa votar, como poderia admittir que podesse fazer leis?

Funda se n'uma confusão de idéas, porque para negar á camara o direito de negar a licença (que aliás lhe reconhece o artigo 27.º) argumenta com o artigo 41.º, que dá á camara dos pares a competencia para julgar os deputados, o que é uma confusão de idéas. Pois uma cousa é julgar o criminoso, outra é decidir se o processo instaurado deve ou não continuar; a primeira attribuição pertence á camara dos pares, como tribunal; a segunda á dos deputados ou seja como uma especie de jury de ratificação de pronuncia, ou como exercendo, com respeito aos seus membros, uma funcção politico igual á que o governo exerce com relação aos funccionarios administrativa, como já disse.

Lera ao absurdo, porque sendo a disposição do artigo 27.º igual para os pares e deputados, reduzida a questão á simples opportunidade sem se conhecer do fundo a doutrino da commissão, seria inapplicavel aos pares que são vitalicios, e daria em resultado, julgada a inopportunidade em relação a algum d'elles, nunca poder ser processado emquanto vivo fosse.

Dá em resultado immoralidade; 1.º, porque admittida a doutrina da suspensão de processo por inopportunidade, poder se-ia dar a grande immoralidade de estar funccionando no seio da camara um deputado accusado de um crime grave; 2.º, porque conhecido o fundamento da accusação, para fazer justiça é sempre tempo.

E repellida pela jurisprudencia parlamentar, porque durante mais de trinta annos tem sido a doutrina que sigo, impugnado o parecer, abraçada por todos os parlamentos e seguida e sustentada pelos homens mais distinctos que n'elles têem tido assento.

É repellida finalmente pela jurisprudencia dos tribunaes: 1.º, porque a commissão diz que não tem o processo de ser remettido á camara, e os tribunaes enviam sempre o processo, como ainda remetteram este que nos occupa; 2.º, porque a commissão recusa á camara o direito de negar a licença e os tribunaes reconhecem-lh'o até com o effeito de extinguir a acção criminal, como ainda há pouco decidiu o supremo tribunal de justiça com relação ao processo instaurado contra o ex-deputado José Vaz de Carvalho, e que hoje se pretendia fazer reviver, apesar de ter sido negada a licença pela camara.