936 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
todos os operarios que se apresentaram, pedindo pão e dizendo que não tinham trabalho!
Foram-se admittindo successivamente, de modo que no fim de 1893 havia 2:700 operarios em Lisboa, e em 1897, dias antes de eu tomar conta do ministerio das obras publicas, chegou esse numero a 6:517 operarios, só em Lisboa.
Não pude, nem era conveniente fazel-o, acabar de vez com a admissão de operarios que se apresentavam a pedir trabalho, nem era possivel despedir aquelles que havia nas obras publicas em grandissimo numero, e carregando sobre o thesouro com enorme despeza. Vi-me mesmo obrigado, por considerações de ordem publica, a admittir ainda alguns, mas fui-os successivamente admittindo, obedecendo aos principios estabelecidos, até que, em maio de 1897, chegava o numero d'elles a 7:243.
Um grande numero d'estes operarios, que sobrecarregavam o thesouro, não produziam o trabalho util correspondente. (Apoiados.} Se ainda esses operarios produzissem um trabalho util, emfim era um sacrificio que o thesouro fazia, pagando-lhes, mas que tinha uma certa compensação.
Não succedia, porém, assim. Esses operarios não podiam fazer um trabalho de maior utilidade, porque, na precipitação de os admittir, eram empregados em obras que não estavam projectadas, orçamentadas, emfim estudadas, e por conseguinte estes operarios não produziam todo o trabalho, toda a utilidade que d'elles se podia tirar, se fossem empregados com mais socego em obras já estudadas, bem dirigidas. (Apoiados.)
De maio em diante cessou a onda, chegou o preamar, e depois foi decrescendo, graças ao cadastro completo que eu estabeleci.
Mandei fazer o cadastro dos operarios, e averiguou-se que muitos dos que se diziam taes não o eram; e depois, por decreto de outubro, mandei para as provincias todos os operarios que não sustentavam familia em Lisboa, para serem empregados lá em obras publicas.
A maior parte d'esses operarios não queriam ir e foram despedidos. Com este systema de mandar para as provincias os operarios que não tinham familia em Lisboa, e como o numero dos operarios que se apresentavam, pedindo pão e trabalho, tinha decrescido, consegui que o numero de operarios do districto de Lisboa esteja hoje reduzido a 4:285, sendo de 3:284 os que estão empregados em obras publicas dentro da area da cidade.
Tendo chegado o numero total a 7:200, parece-me que se a crise operaria não está de todo vencida, está em bom caminho para isso.
Emquanto á despeza das ferias, que chegou a ser de 22 contos de réis, está hoje reduzida a 14 contos de réis, havendo, por consequencia, uma economia por semana de 8 contos de réis.
Aqui está o que eu fiz relativamente a operarios.
Não quero cansar a attenção da camara.
Emquanto aos serviços do ministerio, a camara vê por este projecto de orçamento quaes são as redacções que se fizeram e os augmentos.
Effectivamente no orçamento d'este anno ha um augmento relativamente ao do anno passado, ha uma verba de 20 e tantos contos da réis com caminhos de ferro e 20 contos de réis nos correios. Este augmento não deve assustar ninguem, e é mesmo perfeitamente justificado.
O trafego do caminho de ferro tem augmentado consideravelmente, a ponto de na linha ferrea do sul e sueste o anno passado ter augmentado 90 contos de réis a receita bruta relativamente ao anno anterior.
Já se vê que este augmento de trafico exige maior numero de comboios, por consequencia maior quantidade de carvão, emfim exige uma despeza correspondente. Augmentando a despeza 24 contos de réis e augmentando a receita 18 contos de réis, parece-me que é uma situação lisonjeira, ou pelo menos que não é para temer. (Apoiados.)
Nos correios succede o mesmo; todos os annos augmenta consideravelmente a verba da receita; e este augmento de receita representa maior numero de trabalho, de distribuidores, de ordens de serviço, de estações; e tudo isto exige despeza. Por consequencia é altamente justificado o augmento de despeza da verba dos correios. (Apoiados.)
Em outros capitulos ha diminuições e suppressões, que a camara conhece perfeitamente.
Permitta-me v. exa. que eu me refira tambem a alguns pontos, a que alludiu o sr. Pereira dos Santos.
Censurou-me s. exa., e já esta censura tinha sido feita por s. exa. n'outra occasião, e tambem pelo sr. Mello e Sousa n'uma sessão do mez passado, por eu ter applicado a verba de 36 contos de réis para a construcção do caminho de ferro do Algarve, e disse o sr. Mello e Sousa que o governo n'essa occasião tinha feito dictadura, e da peior especie.
Peço licença para dizer que não houve dictadura, nem da peior especie, nem da melhor, porque não houve dictadura de especie alguma. (Apoiados.)
O governo estava auctorisado por uma lei a votar a verba de 36 contos de réis para o caminho de ferro do Algarve. Esta lei era a lei de meios de 3 de setembro de 1897, artigo 18.°, que diz:
(Leu.)
O sr. Pereira dos Santos: - Tinha havido maiores despezas do que este acrescimo.
O Orador: - Mas a receita arrecadada era superior a 38 contos de réis; por consequencia não houve dictadura em votar esta verba para o caminho de ferro do Algarve.
Dizia s. exa. que havia outras despezas a pagar pela verba de 110 contos de réis. É verdade; esta verba de 110 contos de réis talvez não chegasse para estas despezas; mas tambem na receita do caminho de ferro, no anno de 1897, havia mais do que os 36 contos de réis.
Em todo o caso dictadura é que não houve, nem da peior, nem de especie alguma.
Tambem o illustre deputado me censurou pela abertura de novos lances de estradas, dizendo que a abertura d'esses lances era um acto illegal. Peço licença a s. exa. para tambem lhe dizer que não vejo illegalidade n'esse acto.
Bem sei que a lei de 23 de abril de 1896 prohibe a abertura de novos lances de estradas. Mas o artigo 3.º da mesma lei diz:
(Leu.)
Assim o artigo presuppõe haver casos em que se podem abrir novos lanços, e quando tenham de abrir-se ha de ser segundo umas certas formalidades, uma d'ellas a consulta do conselho superior das obras publicas, e emfim, quando se julgue necessaria a construcção. Mas quem é o juiz da utilidade da construcção de novos lanços? Bem ou mal, não póde deixar de ser o ministro, o que julga, em vista das representações das localidades, da disposição do lanço e, se seguindo os preceitos estabelecidos na lei, manda construil-o; não commette uma illegalidade. Tanto isto é assim, que estes actos classificados por s. exa. de illegaes, foram praticados pelo meu illustre antecessor em muito maior numero.
Isto não é uma censura ao meu illustre antecessor; pelo contrario, acho que elle fez muito bem. O que eu quero é escudar-me com essa auctoridade, que é insuspeita...
O sr. Pereira dos Santos: - Em muito maior numero, diz v. exa.?
O Orador: - Quer fallar sobre quantos e quaes foram os lanços que o meu illustre antecessor mandou construir? Eu lh'o digo.
O sr. Pereira dos Santos: - Foram tres.
O Orador: - Tres? Está v. exa. muito enganado. Vou enumeral-os a um e um.
(Leu.)