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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

não haviam contado como verdadeiramente se passaram (apoiados).

O que havemos nós de concluir d'essas factos, sr. presidente! Não é difficil.

Eu, pela minha parte, conclui, assim como concluiram todos os membros da commissão de fazenda, e já agora todos os srs. deputados, que o governo, longe de ter iniciativa, reagiu aqui na camara e na commissão contra as reformações, a ponto de se tornar contradictorio. Esta é a verdade (apoiados). O governo nada sabia, o governo cruzava os braços quando não resistia. Não era agente, era paciente; soffria, supportava, e reluctava quasi sempre a ponto tal, que o sr. relator da commissão teve trabalhos dignos de um Hercules (riso). Poderia citar agora a occasião em que com Hercules se compara o sr. relator. Basta lembrar Augias (riso).

O sr. Arrobas teve um trabalho herculeo em vencer as resistencias, as hesitações, as retratacções do governo.

Não acertou em muita cousa o sr. relator; errou, confundiu e escureceu. Mas como é que assim não aconteceria, se o governo empecia, não illuminava e não aconselhava, antes, sempre em desaccordo, falho de energia e iniciativa, tolhia os movimentos da commissão e gerava duvidas e hesitações em todos os animos? A tal ponto chegou esta confusão, que um relatorio foi rejeitado por não conter a verdade do que se passára nas resoluções que se haviam toma-lo. Coteje-se este facto com as confissões dos srs. ministros e maiormente do sr. ministro da marinha, e chegar-se-ha ao resultado de que a iniciativa do governo foi sempre um mytho.

(Apoiados dos srs. Latino Coelho, Luiz de Campos e Saraiva de Carvalho).

Mas, sr. presidente, para contar os trabalhos e os perigos do sr. relator, lembrarei a fabula de Oxylus, que Pausanias nos legou, e peço a attenção da camara.

Oxylus era um cidadão da Etolia e tinha por brinquedo muitas vezes jogar a bola, e uma vez (tão dominado era por este vicio) jogando com o proprio irmão, aconteceu que se zangaram, agastaram-se, e por fim o que succedeu? O irmão tirou um olho a Oxilus e este matou ao irmão. O bom do Oxylus fugiu para se escapar ao rigor das leis, e refugiou-se na Eolia, cujos habitantes queriam entrar em som de guerra no Peloponneso. Como era usança n'aquelle tempo, tinham elles consultado o oraculo e este dissera-lhes que nomeassem para chefe aquelle que só tinha um olho e seis pés.

Ficaram espantados com aquella resposta tão sybillina. Ora foi n'esta occasião que Oxylus fugira da sua patria montado em um rocim cego e apparecera na Eolia. Era elle com effeito o emissario da guerra.

Só tinha um olho e vinha montado em um rocim cego, por consequencia era um olho em dois corpos com seis pés. Cumprira-se o oraculo.

Oxylus foi collocar-se á frente das tropas e ganhou a ha talha, e em recompensa dos seus serviços pediram-lhe que fosse rei da Etolia, sua patria.

Applique-se a moralidade ao caso.

O sr. marquez d'Avila foi consultar a pythia, porque queria conquistar o seu Peloponneso, que era a popularidade pelas economias.

Lembrou-se do sr. Arrobas, que não sei se já jogou a bola, mas que nunca foi fratricida, nem é cego de um olho (riso), antes um cavalheiro digno, e que de certo não se agastará com isto.

O sr. Arrobas (rindo): — De modo nenhum.

O Orador: — Sacrificou-se o sr. Arrobas, e tanto mais fortemente quanto todos sabem que não queria ser rei da Etolia, porque não quererá ser ministro da marinha (riso).

A estrategia do governo era reconhecidissima. Queria para si toda a vantagem das economias, e queria a responsabilidade d'ellas sobre a commissão de fazenda e sobre a camara, que havia de approva-las, e não se lembrando já de que tinha tomado para si a honra, o proveito e até os perigos da iniciativa, veiu depois, pela bôca dos srs. marquez d'Avila, Carlos Bento e parece-me que do sr. ministro da marinha, dizer: que importa d'onde vem a iniciativa e a origem d'ellas, se nós conseguirmos derramar pelo paiz o balsamo santo das economias, e se nós sararmos e guarecermos estas chagas, que ha tanto tempo se alastram por todo o corpo da patria?

E isto diese o sr. Carlos Bento, ministro da fazenda, com umas vaidades immodestas, que eu podia comparar com as de Falstaff, e com uma originalidade e agudeza que o proprio sire de la Palisse não renegaria.

O sr. Pereira Bastos: — Apoiado.

O Orador: — A iniciativa importa tudo, e é o essencial.

Não é que cada um de nós individualmente queira a honra da iniciativa de uma certa e determinada economia, mas é necessario que cheguemos a determinar se o governo é capaz de governar, se é ou não governo, se tem ou não tem iniciativa, para que a responsabilidade vá a quem deve ir, recaia sobre quem deve recair.

O sr. Latino Coelho: - Apoiado.

O Orador: — Se o governo tem iniciativa, as economias hão de fazer-se. Se não tem iniciativa, por mais que a camara se canse e se esfalfe, as economias não hão de passar de uma mentira ou de uma aspiração.

A commissão de fazenda fez tudo o que era humanamente possivel fazer (apoiados). Cada qual estudou a questão a seu sabor; cada qual a encarou como devia encara-la; cada qual apresentou o seu parecer, a sua opinião, e tratou de a impor aos outros, estabelecendo-se o debate e a discussão.

E o governo, no meio de toda esta azafama, como Jupiter no Olympo, sentado no seu throno coruscante, contentava-se com dizer-lhe: fazei, que eu verei se posso aceitar. A isto se limitou a iniciativa do governo. A isto, quando muito.

E o parecer da commissão de fazenda, que tem muitos pontos vulneraveis, e eu sou o primeiro a confessa-lo apesar de o ter assignado, não é senão a reproducção fiel, a imagem verdadeira d'aquillo que se passou na mesma commissão. O parecer em muitos pontos não é senão o cabos, a confusão e a luta de opiniões encontradas.

E sem haver um pensamento, uma iniciativa, que servisse para dar uma fórma harmonica e una, como é que se haviam de homologar tantos alvitres diversos? Se não havia uma força central que imprimisse uma feição uniforme, como se havia de resolver o problema?

O sr. Luiz de Campos: — Apoiado.

O Orador: — Dizia n'uma das passadas sessões o sr. ministro da fazenda, que não era muito para admirar que o governo não tivesse iniciativa rasgada, porque, nas circumstancias que vamos atravessando, difficil era a iniciativa.

Vozes: — É verdade.

O Orador (com vehemencia): — Eu podia ter-lhe respondido com um trocadilho, que s. ex.ª (não quero ferir a arrogancia de a. ex.ª nem a minha modestia) não deixaria de aceitar. Nós não pedimos já que o governo tenha uma iniciativa rasgada, o de que nós precisâmos ao menos é que o governo não venha rasgar a nossa iniciativa.

Eu não me importava já que o governo se contradissesse comsigo mesmo, o que não queria era que viesse contradizer-nos aqui, o que ainda aconteceu ha pouco.

Pois o sr. ministro da marinha, que foi o que mais combateu o parecer da commissão, não vem dizer-nos que elle tinha sido elaborado de accordo com o governo, quando não houve senão a maior discordancia, o que aliás se prova pelas confissões publicas de s. ex.ª?

Nem admira que haja tão notavel discordancia no seio do governo, quando o sr. ministro da fazenda, respondendo com sarcasmos e epigrammas coxos (e com isto imagina