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Isto é o mesmo que dizer: A fabrica ha de dar muito lucro, mas ninguem ha de querer compra-la! Contradicção manifesta! Se o nobre ministro da fazenda receia que os individuos que comprarem a fabrica fiquem em condições excepcionaes, e se esta é a rasão que actua no seu espirito para condemnar a régie provisoria, pergunto ao nobre ministro da fazenda — como ficam pelo projecto os caixas actuaes? Ficam nas mesmas condições excepcionaes.

Eis aqui pois como o nobre ministro da fazenda condemna aquillo mesmo que quer sustentar (apoiados) depois com toda a força. Outra contradicção!

E eu aprecio muito mais estas manifestações espontaneas, filhas da successão das idéas, a que a propria intelligencia se curva, mau grado seu, do que essas outras, calculadas para sustentar uma determinada theoria, um determinado projecto (apoiados).

Diz o projecto: «Fica extincto o monopolio em Portugal, ilhas e Macau ». Este monopolio macaense é uma especie de bispo in partibus. Em Macau, depois que foi declarado porto franco, cessou toda a fiscalisação. Se os actuaes caixas mandam algum rapé para Macau, é porque ninguem mais sabe fabricar rapé d'aquella qualidade. E de certo se este monopolio valesse alguma cousa, o sr. ministro da fazenda não deixaria de convidar aos funeraes d'elle o nobre ministro da marinha (riso).

Quatro são as rasões com que se sustenta o projecto: primeira, as vantagens do consumidor; segunda, a liberdade do fabrico; terceira, vantagens da fazenda; quarta, liberdade de cultura nas ilhas.

As vantagens do consumidor são a barateza, e a barateza é filha da concorrencia. A concorrencia é tanto menos efficaz e é tanto menor, quanto ha mais privilegios de facto e de direito.

E effectivamente pelo projecto ha privilegios de facto e privilegios de direito.

Os privilegiados de facto... não sou eu que o digo, é o mesmo nobre ministro da fazenda no trecho que eu acabei de ler, são os actuaes caixas que têem uma fabrica experimentada e em acção; que têem materia prima; que possuem todos os segredos do commercio e todos os segredos do consumo; que têem, para assim dizer, fechado nas mãos, por emquanto, o dominio d'esta industria.

Para se levantarem outros industriaes que possam competir com estes, quanto tempo não é preciso? Quanto tempo não é preciso para fazer estudos, para tomar informações, para mandar vir o tabaco, para todos os trabalhos preparatorios?

Os privilegiados de direito são os fabricantes de Lisboa e Porto, que, por isso mesmo que são fabricantes, são tambem negociantes do tabaco.

As tendencias do projecto são para matar a divisão do trabalho, são para engrossar as industrias, para proteger as grandes, e para afugentar, para desfavorecer as pequenas, que são exactamente aquellas que produzem maior concorrencia.

A concorrencia mede se pelo numero e pelo tempo, e o numero e o tempo são limitados pelo modo instantâneo por que vae estabelecer-se a liberdade e pelos privilegios que se concedem.

As industrias não sáem dos bicos da penna como sáem projectos e regulamentos. As industrias nascem debeis e fracas como uma creança, incertas e vacilantes em seus primeiros passos; tropeçam muitas vezes, e nos tropecimentos aprendem; soffrem não poucas, e nos soffrimentos se instruem até que chegam á virilidade.

Eu não queria que se esperasse até então, mas tambem não queria surprezas nem privilegios.

Não é a primeira vez que eu vejo n'esta casa tratar as industrias como a um correio da secretaria. Levanta-se um e diz: «Industria portugueza, pega nos teus capitães e vae deseccar os pantanos». Levanta-se outro e diz: «Industrias portuguezas, começae a negociar em tabaco desde 1 de maio, que eu governo vos proponho um lucro de 27 por cento, e as côrtes da nação hão de approva-lo». Illusão e phantasia! Illusão e engano suppor que as industrias hão de curvar-se doceis e submissas aos regulamentos que os ministros lhes fazem no silencio dos seus gabinetes, regulamentos que se lançam no papel, do papel não sáem, no papel morrem, no papel hão de jazer para sempre. Para tratar destes regulamentos é que eu julgo as camaras incompetentes (apoiados).

Mas o nobre ministro quiz desculpar-se de ter apresentado este projecto tão tarde, e não foi porque não houvesse n'esta casa quem lh'o lembrasse (apoiados). O sr. Casal Ribeiro foi até importuno. Cansou-se debalde. A camara ha de estar lembrada que o sr. ministro foi aqui repetidas vezes instado para que dissesse qual era a sua opinião sobre a questão do tabaco, e s. ex.ª recusou-se sempre a isso (apoiados). O nobre ministro dava então a resposta que quasi sempre dá aos seus adversarios, e é: «Eu hei de explicar-me, eu me explicarei»; mas quasi nunca se explica (apoiados). E quando se explica é tão tarde, e tão mal, como n'este projecto (apoiados).

S. ex.ª dá como rasão no seu relatorio que = continuando o monopolio ninguem podia mandar vir tabaco nem fabricar =. Não posso aceitar em toda a extensão esta rasão. Desculpe-me s. ex.ª

Se a liberdade fosse decretada com tempo, podiam as industrias ter mandado vir tabacos, deposita los nas alfandegas para os terem á mão no primeiro dia de maio. As fabricas podiam estar montadas, o que ellas não podiam era funccionar (apoiados).

Diz o illustre ministro: «Mas as industrias podem agora mandar vir tabaco da Hollanda, de Inglaterra e de Gibraltar». Sinto que s. ex.ª não soubesse os preços por que o tabaco se vende n'estas praças, e o preço por que se podem obter da America. Tanto isto é assim, que os actuaes caixas não compram tabaco n'estas praças senão quando se vêem apertados por uma urgente falta.

Diz-se tambem que = as industrias podem agora mandar vir tabaco e deposita-lo na alfandega, para no 1.° de maio lançarem mão d'elle =. Qual é o industrial que havia de mandar vir tabaco com a esperança de que o projecto havia de passar nas duas casas do parlamento? E se não passasse, não tinha elle de se ver obrigado a vende-lo pelo preço que lhe offerecessem os caixas ou a régie? (Apoiados). E mal de nós se as industrias ou os particulares tivessem uma tal confiança! Isso seria suppor que as camaras eram uma chancella do governo e nada mais (apoiados). Rejeito um tal conceito pela parte que me toca.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Mas a fabrica mandaram-a vir.

O Orador: — A fabrica podiam-n'a mandar vir da mesma fórma.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Vendiam-n'a depois?

O Orador: — Vendiam se não quizessem ficar com ella; mas esta não é a questão. A questão é que, querendo-se estabelecer a liberdade, deviam decreta-la com antecedencia (apoiados). O sr. ministro da fazenda tomou sobre si uma gravissima responsabilidade. Não é com argumentos futeis que se defenderá d'esta omissão, que póde trazer grandes prejuizos para o thesouro.

Vou agora provar, com a logica dos algarismos, que o tabaco não póde ser depois da liberdade mais barato do que hoje. São tão extraordinarios os direitos! Antes de descer aos calculos devo prevenir que ou eu estou n'elles completamente enganado, ou o nobre ministro da fazenda o está n'aquelles que fez. É mais provavel que seja eu do que o illustre ministro; mas vale bem a pena de examinar os calculos, porque se for eu o enganado, os meus erros expia-los ha o meu amor proprio; se for porém o nobre ministro, os erros de s. ex.ª são mais perigosos, e portanto é necessario que haja com elles muita mais severidade.

O calculo que fez o nobre ministro da fazenda é este. Ver quanto paga o actual monopolio ao estado, o que importa, entrando os direitos da alfandega, em 1.748:000$000 réis, e ver quanto lucra o monopolio, o que importa, na opinião de s. ex.ª, 102:000$000 réis, sommar ambas as quantias, acrescentar-lhes mais 35:000$000 réis, e dividir tudo como direitos e imposto de fabrico sobre o tabaco importado. Eis-ahi o modo por que s. ex.ª procede nos seus calculos.

Ora sendo isto assim, entrando já os lucros do actual monopolio, acrescentados com 35:000$000 réis nas despezas de producção, é claro que se as outras despezas de producção depois da liberdade não diminuírem, o tabaco não póde ser mais barato. É impossivel que o seja. Pois a concorrencia póde fazer com que um genero seja vendido por um preço que seja inferior ás despezas da producção? Supponhamos um negociante de vinhos que vendia uma garrafa de vinho por 1$000 réis, 200 réis era despeza de producção 600 réis eram de direitos e 200 réis era o lucro. Ora se o governo sobre cada garrafa de vinho impozesse o direito de 850 réis, está claro que se o negociante continuar a vender a garrafa pelo preço antigo perde 50 réis; para tirar o mesmo lucro que tirava ha de vende-la por 1$250 réis.

E para dar prova da minha lealdade e dos desejos de sinceridade com que entro n'esta discussão, não tenho duvida em apresentar os meus calculos á commissão, se ella os quizer ver. Posso estar enganado, mas se erro é na melhor boa fé (apoiados).

Começarei.

O actual monopolio despende em materia prima réis 400:000$000, para fabricação 130:000$000 réis, preço da arrematação 1.521:000$000 réis, direitos das alfandegas 227:147$446 réis, administração, fiscalisação e venda réis 400:000$000. Somma tudo 2.678:147$446 réis. (Todos estes dados são tirados do relatorio.) O rendimento bruto é de 2.830:434$000 réis, o lucro é portanto 152:000$000 réis.

Façamos agora o mesmo calculo em relação ao vendedor livre. É provavel que com a venda haja uma diminuição nas despezas, mas logo direi o alcance d'esta diminuição.

Os vendedores livres devem pagar:

De direitos......................... 1.840:824$000

3 por cento de emolumentos para os empregados da alfandega... 55:224$720

De imposto sobre o fabrico.......... 130:000$000

Pela materia prima.................. 400:000$000

Pela fabricação e venda............. 160:000$000

Administração....................... 280:000$000

Somma...... 2.866:048$720

Se pois elles quizerem vender os generos pelo mesmo preço por que os vende o actual monopolio, isto é, por 2.830:434$000 réis deve perder 35:614$720 réis.

Não empreguei só este systema, dividi os 2.866:048$720 réis, que têem de despender os vendedores livres pelos kilogrammas que annualmente se consomem; e o resultado foi que se quizerem vender pelo mesmo preço por que os vende o actual monopolio, perdem 26 réis por kilogramma. Ora, 26 réis multiplicados pelo numero dos kilogrammas consumidos dá proximamente os mesmos 35:000$000 réis.

Mas o nobre ministro apresentou um calculo que mostra que em cada kilogramma ha o lucro de 374 réis. Permitta-me s. ex.ª que lhe diga que este seu calculo está muito inexacto. É facil prova-lo.

O nobre ministro, querendo encontrar a media do preço actual de um kilogramma, divide o rendimento do actual monopolio pelos kilogrammas manipulados que se vendem, e acha a media do preço de 2$104 réis; e depois, querendo achar a media do custo de um kilogramma depois da liberdade, toma um kilogramma bruto.

Sendo o consumo actual de 1.344:000 kilogrammas, diz s. ex.ª no seu relatorio, e o seu valor pelo preço da venda de 2.830:434$000 réis, o termo medio por kilogramma é 2$104 réis. Ora, pergunto eu que kilogrammas são estes? Manipulados ou brutos? Manipulados de certo como se deprehende do relatorio. Decretada a livre importação, fabrico e venda, continua s. ex.ª, teremos que um kilogramma deve pagar de direitos 1$200 réis. Ora, que kilogramma é este? Bruto ou manipulado? Não póde ser senão o kilogramma bruto, porque é exactamente o kilogramma bruto que paga 1$200 réis.

Isto não é indifferente para o calculo, porque o kilogramma bruto quando passa a manipulado perde 7 por cento, e o direito correspondente a estes 7 por cento deve ser acrescentado á parte que resta. D'onde um kilogramma manipulado paga muito mais direitos do que o kilogramma bruto, e aqui devia figurar o manipulado e não o bruto.

Mas não pára aqui a inexactidão. Chamo a attenção do nobre ministro e da illustre commissão de fazenda para outro equivoco. O nobre ministro em logar de tomar a media do direito, tomou o minimo do direito, porque 1$200 réis era no projecto o minimo do direito. Pois se para tirar a media do custo era necessario que dividisse tambem os diversos direitos dos diversos tabacos pelos kilogrammas importados, não o fez assim, tomou o minimo.

É pois, confundindo o kilogramma manipulado com o bruto, comparando o meio termo de uma serie com o extremo da outra, que s. ex.ª encontrou o resultado de 374 réis de lucro em cada kilogramma, resultado visivelmente contradictorio.

Eu fiz o calculo pelas medias, e encontrei ainda por este modo o prejuizo de 35:000$000 réis.

Importam se 1.448:251 kilogrammas de tabaco manipulado e não manipulado, reduzem-se todos a manipulados 1.344:906, donde um kilogramma de tabaco fabricado e não fabricado reduz-se a 0928,6 fabricado.

Dividindo os 1.840:824$000 réis, que são os direitos de toda a especie de tabacos por 1.448:251 kilogrammas, temos como direito medio de cada kilogramma 1271,06. Junte-se-lhe mais de 3 por cento 38,13, mais de custo medio do imposto de fabrico 89,70, somma tudo 1398,89. Como o kilogramma de tabaco bruto se reduz a 0928,6 de tabaco manipulado, segue se que 1 kilogramma de tabaco manipulado deve pagar em direitos 1506,45. Juntem-se lhe mais de materia prima 394,08, mais de despezas de administração e venda 230, somma tudo 2130,53.

Vendido pelo actual preço, que é 2104,5, deixa uma perda de 26,0.

Tambem fiz o calculo do minimo que póde custar 1 kilogramma manipulado depois da liberdade, com o minimo do preço que custa actualmente, e achei uma perda de 18 réis em cada kilogramma. Esta perda é, por exemplo, nos cigarros, que são consumidos pela classe menos abastada.

Calculo do minimo do custo de 1 kilogramma depois da liberdade

Direitos por 1 kilogramma bruto................ 1$000 réis

Tres por cento................................. $030 »

Imposto de fabrico............................. $100 »

Somma..... 1$130 »

Como 1 kilogramma bruto 86 reduz a 0928,6 temos que 1$130 réis se elevem a... 1$226 »

Materia prima.................................. $150 »

Fabrico........................................ $070 »

Venda.......................................... $022 »

Administração.................................. $150 »

Somma..... 1$618 »

Minimo do preço actual......................... 1$600 »

Perda..... $018 »

O minimo do preço da materia prima foi tirado da seguinte nota:

Preços dos tabacos

[Ver diário original]