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SESSÃO DE 27 DE JUNHO DE 1890

Presidencia do exa. sr. Pedro Augusto de Carvalho

Secretarios - os exmos. srs.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa

SUMMARIO

Lê-se na mesa um officio do ministerio do reino, remettendo documentos pedidos pelo sr. Ruivo Godinho; outro do mesmo ministerio, communicando que não foram ali recebidas as informações requeridas pelo sr. Arriaga; outro do ministerio da justiça, solicitando licença para que o sr. deputado Augusto Fuschini possa depor como testemunha n'um processo.- Têem segunda leitura, e são admittidos, uma renovação de iniciativa de um projecto de lei sobre annexação de uma freguezia do concelho de Ourique ao concelho de Odemira, e um outro projecto de lei relativo á admissão a exames do lyceu, apresentados pelo sr. Paiva.- Presta juramento o sr. Sanches de Castro.- O sr. José de Alpoim, referindo-se a factos, que affectam o credito do paiz, succedidos em Paris, pede a presença do sr. ministro das obras publicas. - Responde-lhe o sr. ministro da instrucção publica.- O sr. Alpoim, não se dando por satisfeito com a resposta do sr. ministro, insiste no seu pedido. - O sr. Ferreira de Almeida lê um requerimento de interesse publico, que manda para a mesa depois de ácerca d'elle, fazer algumas considerações.- O sr. Almeida e Brito estranha que ainda não houvesse sido suspenso o administrador do concelho de Penafiel, pronunciado por abuso de poder.- O sr. ministro da instrucção publica declara que communicará ao seu collega do reino as considerações do sr. deputado.- Manda para a mesa um projecto de lei, orçando um officio de tabellião, o sr. Ruivo Godinho, que pergunta se o governo tenciona reformar o regulamento dos lyceus.- O sr. ministro da instrucção publica declara que, para esse fim, está colhendo informações. - O sr. Cancella falla sobre a necessidade de se conceder pensões ás familias de medicos que venham a fallecer no serviço de epidemias.- O sr. ministro da instrucção publica declara que se associa á idéa do sr. Cancella, e que brevemente dará o governo providencias a esse respeito.- Propõe o sr. Pinheiro Chagas, e a camara approva. que a mesa seja auctorisada a nomear as commissões que faltam a eleger, e manda para a mesa uma representação dos guardas da escola polytechnica.- O sr. Antonio Maria Cardoso apresenta uma proposta de aggregação. - Trocam-se explicações entre os srs. José Julio Rodrigues e ministro da instrucção publica sobre assumptos de instrucção.- O sr. Dias Costa apresenta um requerimento de interesse publico e alguns de interesse particular.- O sr. Francisco José Machado manda para a mesa uma representação contra o addicional de 6 por cento.

Na ordem do dia continua a discussão do projecto de lei n.° 133.- O sr. Elvino de Brito combate o projecto, principalmente por centralisar o serviço da instrucção publica, e apresenta contra elle grande copia de argumentos. - O sr. Lourenço Malheiro, defendendo-o, entende que toda a argumentava do orador precedente só provou a necessidade urgentissima de se crear o ministerio da instrucção publica.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 57 srs. deputados. São os seguintes: - Agostinho Lucio e Silva, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alvaro Augusto Froes Posnollo de Sousa, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio Maria Cardoso, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Teixeira de Sousa, Aristides Moreira da Motta, Arthur Alberto de Campos Henriques, Carlos Lobo d'Avila, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Eduardo de Jesus Teixeira, Elvino José de Sousa e Brito, Eugenio Augusto Ribeiro de Castro, Feliciano Gabriel de Freitas, Francisco do Almeida e Brito, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco José Machado, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João de Barros Mimoso, João Marcellino Arroyo, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Paiva, João Simões Pedroso de Lima, João de Sousa Machado, Joaquim Simões Ferreira, José Antonio de Almeida, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Domingos Ruivo Godinho, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Julio Rodrigues, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria Greenfield de Mello, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Monteiro Soares de Albergaria, José Paulo Monteiro Cancella, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Julio Antonio Luna de Moura, Luciano Cordeiro, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Pedro Augusto de Carvalho, Pedro Ignacio de Gouveia, Roberto Alves de Sousa Ferreira e Thomás Victor da Costa Sequeira.

Entraram durante a sessão os srs.: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Antonio Baptista de Sousa, Antonio Fialho Machado, Antonio José Arroyo, Antonio Maria Jalles, Antonio Costa, Arthur Hintze Ribeiro, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa, Bernardino Pacheco Alves Passos, Bernardino Pereira Pinheiro, Caetano Pereira Sanches de Castro, Christovão Ayres de Magalhães Sepulveda, Eduardo José Coelho, Emygdio Julio Navarro, Fernando Mattozo Santos, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Severino de Avellar, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Moreira, Joaquim Germano de Sequeira, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, José de Alpoim de Sousa Menezes, José de Azevedo Castello Branco, José Dias Ferreira, José Elias Garcia, José Frederico Laranjo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Maria Latino Coelho, Julio Cesar Cau da Costa, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luiz Virgilio Teixeira, Manuel de Arriaga, Manuel d'Assumpção, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Manuel Pinheiro Chagas, Manuel Vieira de Andrade, Matheus Teixeira de Azevedo e Miguel Dantas Gonçalves Pereira.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abilio Guerra Junqueiro, Adolpho da Cunha Pimentel, Adriano Augusto da Silva Monteiiio, Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Mendes da Silva, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio José Ennes, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto da Cunha Pimentel, Augusto José Pereira Leite, Augusto Maria Fuschini, Barão de Paçô Vieira (Alfredo), Carlos Roma du Bocage, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Conde do Covo, Conde de Villa Real, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Abreu, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Fidelio de Freitas Branco, Fortunato Vieira das Neves, Francisco Antonio da Veiara Beirão, Francisco de Barros Coclue e Campos, Francisco de Castro Mattozo da Silva Côrte Real, Francisco José de Medeiros, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Frederico Ressano Garcia, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio José Franco, Jacinto Candido da Silva, Jayme Arthur da Costa

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Pinto, João Alves Bebiano, Jotto Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Freire Lobo do Amaral, José Luiz Ferreira Freire, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria da Santos, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Gonzaga dos lieis Torgal, Manuel Affonso Espregueira, Manuel Francisco Vargas, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Pedro Victor da Costa Sequeira, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Visconde de Tondella e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Officio do ministerio do reino, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Ruivo Godinho, copia do processo do tomada de contas dos legados pios instituidos no testamento de D. Joanna Ruivo Godinho, fallecida em Castello de Vide.

Para a secretaria.

Outro do ministerio do reino, communicando que ainda não foram recebidas n'aquelle ministerio as informações requeridas pelo sr. deputado Manuel de Arriaga.

Para a secretaria.

Outro do ministerio da justiça, solicitando licença para que o sr. deputado Augusto Fuschini possa depor como testemunha noa autos do embargo de D. Maria de Campos Valdez, na 3.ª vara da comarca de Lisboa.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores deputados da nação portugueza. - Segundo as disposições legaes em vigor não póde fazer-se exame de admissão aos lyceus sem previo exame de ensino elementar, decreto de 24 de julho de 1884, artigo 1.º e portarias de 26 de fevereiro de 1887, artigo 2.°, e de 24 de fevereiro de 1888, artigo 2.º

Mas os exames de admissão começam em 15 de abril e devem estar concluidos em 15 de maio, portaria de 24 do fevereiro de 1888, emquanto que os de ensino elementar principiam sómente em julho, decreto do 24 de fevereiro do 1887, artigo 1.º

Resulta d'ahi que, embora o alumno esteja habilitado em julho para o exame de admissão, só por qualquer eventualidade não poder fazer exame de ensino elementar, sómente d'ahi a dois annos poderá fazer exame de admissão!

E quando mesmo faça exame de ensino elementar e esteja, como dito fica, habilitado para o exame de admissão, não o poderá fazer senão no anno immediato.

E um ou dois annos perdidos na educação dos alumnos representam muitos cuidados e muitas despesas por parte dos pães, o na carreira dos filhos representam um sensivel atrazo, que muito poderá influir no seu futuro.

Esse grande mal evita-se, ou determinando-se que os exames de admissão não careçam de previo exame de ensino elementar, ou determinando se que os exames de admissão possam ser feitos na mesma epocha, embora seja posteriormente aos de ensino elementar, como preceituava o artigo 2.° do decreto de 24 de julho de 1884.

Parece-nos mais acceitavel o primeiro alvitre. Ha para isso as rasões geraes do facil intuição que motivaram o designar para os exames de ensino elementar o mez de julho, que póde dizer-se o ultimo do anno lectivo. E a essas rasões acresce o seguinte:

É do todo escusado incommodar os paes, os examinadores e os alumnos, sujeitando estes ultimos ao previo exame de ensino elementar quando estes estejam habilitados para o exame de admissão. Os que n'este exame obtêem ou podem obter approvação, têem mais conhecimentos do que os indispensaveis para o exame do ensino elementar. Basta confrontar para isto o programam de um e de outro exame.

Este alvitre está mesmo em harmonia com o artigo 44.°, § unico da lei de 2 de maio de 1878, que determina: «que os que têem exame de ensino complementar não necessitam de passar pelo exame de admissão.»

Igualmente os que fazem exame de admissão para nada carecem do exame de ensino elementar, cujo programam está comprehendido no de admissão.

Terá a demora ou duplicação de exames por fim o fazer com que os alumnos entrem mais habilitados para os lyceus? De certo que não, porque as habilitações de um alumno não dependem de inutuis delongas, de escudadas repetições de exames, mas sim da intelligencia do alumno, do estudo e ensino methodicos e da aptidão e espirito recto com que os examinadores se desempenhem do seu espinhoso dever.

Talvez se diga que é inopportuna esta alteração, porque poderá ella ser attendida na reorganização dos estudos que todos esperam do elevadissimo talento do exmo. sr. conselheiro e digno ministro de instrucção publica.

Mas a approvação do presente projecto não inhibe o nobre ministro de inserir igual ou similhante disposição na desejada reforma; e muito convem que ao principiar em breve o novo anno lectivo, possam os professores e os chefes de familia saber se sim ou não os seus dirigidos têem de fazer um só ou dois exames, para que assim procurem habilital-os convenientemente.

E a urgencia d'esta lei e da sua prompta publicação é de todos bem conhecida, e em especial dos que por momentos quizerem ponderar quaes os sacrificios, cuidados e despezas a que lêem de votar-se os paes, para apresentarem os seus filhos a exame e qual o trabalho, quaes as amarguras dos professores para bem dirigirem e apromptarem os seus discipulos para as provas que do seu adiantamento hão de dar nos primeiros exames.

Em vista do que fica exposto, creio que merecerá approvação o seguinte projecto de lei, que tenho a honra de submetter ao vosso esclarecido exame:

Artigo 1.º Poderá fazer-se exame de admissão aos lyceus sem previo exame de ensino elementar.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara, 26 de junho de 1890.= O deputado, João de Paiva,

Lido na mesa foi admittido e enviado á commissão de instrucção primaria e secundaria.

Renovação de iniciativa do projecto n.° 129-B e sobre que recaiu o parecer n.° 152, em 1 de julho de 1887.

Senhores deputados na nação portugueza.- Foram tirados á comarca de Odemira tres freguezias, sendo uma para a comarca de S. Thiago do Cacem e duas para a comarca do Ourique.

A ultima que passou para Ourique foi a freguesia de S. Martinho das Amoreiras; e essa mudança representa uma gravissima injustiça, qualquer que seja o lado por onde se encare.

A planta junta mostra claramente, que pela sua posição deve aquella freguezia pertencer á comarca de Odemira.

A categoria de comarca tambem nos leva a essa conclusão; assim, a comarca de Ourique, é de 3.ª classe e tem tres concelhos e ainda parte do de Aljustrel; a co-

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marca de Odemira é de 2.ª classe e tem um só concelho; Ourique, de 3.ª classe, tem alem da villa de Ourique mais dezeseis freguezias; Odemira, de 2.ª classe, tem alem da villa de Odemira sómente mais oito freguezias!

A administração da justiça tambem assim o exige. S. Martinho das Amoreiras era a cabeça do julgado composto d'aquella freguezia e das de Collos, Reliquias e Valle. Agora, já que não é julgado deverá ser um districto de juiz de paz com a mesma area do antigo julgado, pois que só assim aquellas freguezias poderão ter mais prompta, mais facil e mais proxima administração de justiça.

E se a sua posição, se a categoria das comarcas, se a administração da justiça, exigem que a freguezia seja de novo annexada á comarca de Odemira, não menos o exigem as correntes que d'aquella aldeia se estabelecera para Odemira. Essas correntes são:

1.° As suas relações particulares de ha dezenas de annos com a villa, concelho e comarca de Odemira, onde contam parentes e amigos e com quem viveram sempre na melhor harmonia;

2.º O ser do lado de Odemira a estação do caminho de ferro por onde têem de seguir para Lisboa ou Algarve, para a cabeça do districto ou para os povos vizinhos;

3.° O serem quasi exclusivamente com Odemira as suas relações commerciaes e existir na villa de Odemira o porto por onde exportam ou importam os generos que a freguezia produz ou os artigos de que necessita e que pela navegação os colloca em relações quasi directas e proximas com Lisboa e Algarve.

Em vista do que fica ponderado e da representação d'aquelles povos que acompanhou o projecto:

Renovo a iniciativa do projecto n.° 129-B apresentado em 20 de junho de 1887 e ácerca do qual foi dado sob n.° 152, em 1 de julho do mesmo anno, parecer favoravel pelas commissões reunidas de administração publica e legislação civil, chegando em seguida a ser approvado pela camara dos senhores deputados.

Devo, porém, desde já dizer que ao passar o projecto pelas illustradissimas commissões, a ultima parte do artigo 1.° - e fica fazendo parte do julgado de Odemira - terá de ser substituida, em vista do decreto de 29 de julho de 1886, por esta - e ficará sendo a séde de um districto de juiz de paz composto d'essa freguezia e das freguezias de Collos, Reliquias e Valia - o que tudo constituia o antigo julgado de S. Martinho das Amoreiras.

Odemira, comarca de 2.ª classe, com um só concelho; Ourique, de 3.ª classe, com tres concelhos e parte de um outro!

Odemira, de 2.ª classe, tem a seu lado oito freguezias sómente; Ourique tem a seu lado dezeseis freguezias.

S. Martinho, encravada nas freguezias de Collos, Reliquias e Santa Clara (que pertenceu a Odemira) faz parte da camara de Ourique!

Sala das sessões, 26 de junho de 1890. = O deputado, João de Paiva.

Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de administração publica e de legislação civil.

Esta renovação refere se ao seguinte:

Projecto de lei

Srs. deputados da nação.- Os cidadãos eleitores da freguezia de S. Martinho das Amoreiras, do concelho e comarca de Ourique, no districto de Beja, vem pedir á representação nacional a annexação da sua freguezia ao concelho e comarca de Odemira, no mesmo districto, para todos os effeitos civis, politicos e eleitoraes, a cujo concelho e comarca pertenceram por mais de trinta annos, até que por carta de lei de 7 de maio de 1884 foi esta freguezia desannexada do seu antigo concelho e comarca, e annexada ao concelho e comarca de Ourique, de onde pretendem separar-se por motivos de ordem publica, de interesses mutuos de parentesco, amisade e tendencias d'este povo para com os seus vizinhos de Odemira, com quem sempre viveram na melhor harmonia em suas relações civis e commerciaes, que mais entretêem com o porto do rio de Odemira, por onde exportam os seus productos agricolas e importam o que lhes é necessario á sua industria e commercio, como allegam em sua representação, em cujas circumstancias não se acha a villa de Ourique.

A camara municipal de Odemira acompanha o sentir dos cidadãos eleitores da freguezia de S. Martinho das Amoreiras, e pede tambem a annexação d'esta sua antiga freguezia para o seu concelho e comarca, por conveniencia publica d'estes povos que representa, enviando a sua representação ao parlamento.

Na organisação dos antigos municipios attendeu-se sempre á maior commodidade dos povos e ás suas relações de amisade e commercio e justas aspirações para a aggregação das freguezias no regimen municipal, como attesta a historia dos antigos municipios, e ainda hoje vigora na lei do reino este mesmo principio de ordem publica.

N'estas circumstancias, tenho a honra de apresentar á sabia consideração da camara dos senhores deputados a representação do povo de S. Martinho das Amoreiras e da camara municipal de Odemira, acompanhada do seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º A freguezia de S. Martinho das Amoreiras, que actualmente pertence ao concelho e, comarca de Ourique, será annexada ao concelho e comarca de Odemira, para todos os effeitos civis, politicos e eleitoraes, e fará parte do julgado de Odemira.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 20 de junho de 1887.= José Maria de Andrade.

REPRESENTAÇÕES

Dos guardas da escola polytechnica, pedindo augmento de ordenado.

Apresentada pelo sr. deputado Pinheiro Chagas e enviada á commissão de fazenda.

De proprietarios e habitantes em Bombarral, contra o imposto de 6 por cento.

Apresentada pelo sr. deputado F. J. Machado, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

Requeiro que sejam impressos e enviados a esta camara, para serem distribuidos pelos srs. deputados, os trabalhos realisados até esta data pela commissão, e sua delegada, encarregada de apreciar as propostas para a acquisição de quatro cruzadores para a marinha de guerra. = J. B. Ferreira de Almeida.

Requeiro que, pelo ministerio do reino, me seja remettido, com toda a urgencia, o processo original relativo á dissolução da mesa da misericordia da villa de Porto de Moz, e bem assim copia do relatorio sobre o estado da referida misericordia apresentado em 1879 ou 1880 ao governador civil do districto de Leiria pela respectiva commissão administrativa e do qual foi relator o actual administrador do concelho de Almada, José Carlos de Carvalho Pessoa. = F. F. Dias Costa.

Mandou-se expedir.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PARTICULAR

De Antonio Maria Lage, corneteiro n.° 710 da 6.ª companhia de reformados, José Godinho, Joaquim da Silva,

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Manuel Pereira e Sebastião da Silva, pedindo melhoria de reforma.

Apresentado pelo sr. deputado Dias Costa e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

Foi introduzido na sala e prestou juramento o sr. Sanches de Castro.

O sr. José Maria de Alpoim: - Estranhou que o sr. ministro das obras publicas não comparecesse na camara, ha muitos dias, e pediu ao sr. presidente que fizesse constar ao sr. ministro dos negocios estrangeiros que a opposição parlamentar o desejava interpellar sobre um assumpto importante.

Lêra um telegramma publicado em um jornal regenerador, em que se dizia que tinha atravessado París um fiacre com as cores portuguezas com um cocheiro agaloado, vestido tambem com as cores portuguezas, com um papel no chapou em que se dizia: «Os inglezes é que os ensinam.»

Desejava saber se este facto era verdadeiro, e, se o era, se o governo já, tinha tomado qualquer providencia.

(O discurso será publicado na integra e em appendice quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): - Relativamente á primeira parte das considerações do sr. Alpoim, cumpre-me dizer á camara que a ausencia do meu collega das obras publicas não póde, por fórma alguma, considerar-se como um acto de menos consideração e respeito pela camara em geral, e particularmente pela opposição parlamentar.

O sr. Arouca está á frente de uma das pastas em que o serviço é mais sobrecarregado, e em que o despacho diario rouba horas seguidas ao respectivo ministro.

Podem asseverar o mesmo ao illustre deputado, varios membros da opposição progressista que têem gerido aquella pasta.

O sr. Alpoim: - Nunca aconteceu no tempo do governo progressista estarem os ministros quinze dias sem apparecerem n'esta camara.

Acontecia muitas vezes, é verdade, que se suspendia a sessão até estarem presentes os ministros com os quaes s. exas. desejavam trocar explicações que algumas vezes se achavam na camara dos pares.

O Orador: - Em primeiro logar não posso duvidar da memoria do illustre deputado; mas s. exa. ha de confessar, qualquer que seja a profunda incompatibilidade politica que exista entre nós, que, quando fomos opposição, a sessão se suspendia por não estar representado o governo, e não quando faltava um determinado ministro.

Era isto o que eu, em primeiro logar, tinha a dizer.

Em segundo logar, se o illustre deputado se der ao trabalho de percorrer os Diarios da camara, constatará a ausencia de alguns ministros da situação progressista, durante semanas inteiras, e eu poderei dizer quem era o titular que assim procedia.

Portanto, posso affirmar a v. exa. que se o sr. ministro das obras publicas tem faltado á camara, é porque os deveres do seu cargo reclamam a presença de s. exa. n'outro logar, onde é obrigado a permanecer mais tempo do que talvez desejasse, dada a necessidade que assiste aos ministros de comparecerem nas camaras.

Relativamente ao outro assumpto a que s. exa. se referiu, tenho a declarar que não é do meu conhecimento o facto de que acabou de fazer menção, mas dada a hypothese de que elle seja verdadeiro, nada mais representa senão um dos meios de exploração de que os portadores de titulos do emprestimo de D. Miguel tantas vezes têem lançado mão não só na gerencia do actual ministro, mas nas gerencias transactas, facto que devo ser do Conhecimento do illustre deputado, e contra o qual o governo sempre luctou, em defeza dos interesses nacionaes.

Relativamente a esse assumpto o governo continuará a manter a mesma linha inflexivel de conducta, propugnando pelos interesses legitimos do estado.

Emquanto ás outras considerações, e que se referem ao governo de um paiz com o qual o actual gabinete se acha em negociações, tenho a dizer que respeitando o direito liberrimo que o illustre deputado tem de fazer quaesquer considerações que lhe pareçam opportunas, s. exa. me reconhecerá igualmente o direito e o dever de me reservar de as fazer, porque isso incumbiria a qualquer outra pessoa que estivesse n'este logar. (Apoiados.)

O sr. José Maria de Alpoim: - Não me satisfazem as explicações dadas pelo sr. ministro da instrucção publica, e como não podemos deixar de interrogar o governo sobre este facto, visto que o sr. ministro dos negocios estrangeiros não póde comparecer hoje, porque talvez tenha rasões para isso, peço ao sr. Arroyo a fineza de prevenir o seu collega que não deixe de comparecer ámanhã, porque a opposição quer explicações a este respeito, e entendo dever lançar á conta do governo a responsabilidade de qualquer descuido a que tenha dado logar em questão tão melindrosa como esta.

Torno a pedir ainda com toda a insistencia a v. exa. que previna o sr. ministro dos negocios estrangeiros para comparecer ámanhã na camara.

Eu sei que é possivel que hoje não possa s. exa. vir aqui, e longe de mim querer imitar o procedimento da opposição regeneradora, quando pretendia obrigar os ministros a saltar por cima de todas as conveniencias, só para não faltarem uma ou outra vez á camara.

O que peço unicamente a v. exa. é que faça saber ao sr. Hintze Ribeiro que a opposição progressista deseja interrogal-o sobre este grave assumpto.

O sr. Presidente: - O que eu posso fazer é communicar ao sr. ministro dos negocios estrangeiros o desejo do illustre deputado.

O sr. Ferreira de Almeida: - Mando para a mesa o seguinte requerimento.

(Leu.)

Peço licença para fazer algumas breves considerações a respeito da materia d'este requerimento.

Quando no principio d'este anuo o governo, e especialmente pela pasta da marinha, o sr. Arroyo, se dispoz a dotar a marinha de guerra com uns navios que fossem considerados como taes, tinha precedido essa deliberação do governo uma conferencia feita por mim na sociedade de geographia, e artigos publicados em diversos jornaes, notoriamente As Novidades, A Revolução de setembro, e Esquerda dynastica, todos elles reclamando effectivamente que a marinha de guerra fosse dotada com os elementos precisos de força, que a pozessem em condições regulares do poder reagir, ainda que limitadamente, contra qualquer offensa feita á dignidade nacional.

Por essa occasião dizia um artigo das Novidades que era preciso que o governo se desprendesse de considerações de qualquer ordem na acquisição d'esses navios, por isso que, geralmente, negocios d'aquella ordem se envolviam sempre em intrigas de toda a especie.

Ora, como eu sou secretario da commissão encarregada de apreciar os projectos para a compra d'esses navios, e como ao mesmo tempo sou secretario de sub-commissão; como desejo que as minhas apreciações a esse respeito sejam tão conhecidas, tão publicas, quanto possivel, porque pretendo, no que a ellas diz respeito, tomar a mais completa e absoluta responsabilidade; como desejo, por um lado, conservar-me estranho ás intrigas a que se referia o jornal As Novidades, e por outro lado dar á critica seria e justa todos os elementos para se exercer com fundamento; eis as rasões por que acabo de mandar para a mesa este requerimento, que tem por fim dar uma publicidade, tão lata quanto legitimamente possa ser, pelo menos pelo que diz respeito aos membros da representação nacional, aos

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trabalhos d'essa commissão, para que, repito, a critica se possa exercer com fundamento sobre as minhas opiniões.

Tenho dito.

O requerimento mandou-se expedir.

O sr. Almeida e Brito: - N'uma das sessões passadas pedi ao sr. ministro da instrucção publica, para communicar ao sr. ministro do reino, que eu desejava solicitar de s. exa. providencias que o estado em que se encontrava o concelho de Penafiel onde os administradores effectivos e o substituto continuam em exercicio apesar de pronunciados por crimes e arbitrariedades praticadas no exercicio do seu cargo, como posso provar por documentos que tenho em meu poder. Ora como até hoje não tenha sido suspenso nem demittido nenhum d'estes funccionarios, eu preciso saber se effectivamente o sr. Arroyo deu conta ao sr. ministro do reino das considerações que aqui fiz, e se elle já tomou alguma providencia a este respeito.

Estou informado de que aquellas duas auctoridades continúam no exercicio das suas funcções, de onde concluo ou que o sr. ministro do reino não deu as providencias que eu reclamei, ou essa ordem não foi obedecida.

Consta-me mesmo que ha mais processos pendentes no juizo de Penafiel, em que as ditas auctoridades estão implicadas.

Pergunto a v. exa. e pergunto á camara só é serio, se é conveniente para o prestigio da auctoridade que estejam á frente da administração do concelho de Penafiel individuos que não têem força moral para o administrar.

Eu comprehendo que o sr. ministro do reino tivesse duvida em demittir estes administradores do concelho, visto que o despacho de pronuncia não passou ainda em julgado e póde ter havido recurso do despacho judicial; mas o que decorosamente não se póde consentir é que o governo conserve, sem os suspender, á testa da administração do concelho de Penafiel homens que estão pronunciados.

Desejo, pois, que o sr. ministro da instrucção publica diga, se foram dadas ordens terminantes a este respeito e caso não o tenha sido peço a v. exa. que inste novamente com o sr. ministro do reino para que mande suspender immediatamente as auctoridades a que me refiro.

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): - Em conformidade com os desejos do illustre deputado declaro que communiquei ao sr. ministro do reino as observações feitas por v. exa.

Não posso dizer quaes as providencias que s. exa. tomou relativamente aos pontos para que o illustre deputado chamou agora, novamente a sua attenção. O que posso fazer é tornar a transmittir ao meu collega, sr. Antonio de Serpa, o pedido feito por s. exa.

O sr. Almeida e Brito: - Espero que v. exa., da segunda vez, seja attendido.

O sr. Ruivo Godinho: - Pedi a palavra para fazer o mesmo pedido que fez o meu collega o sr. Alpoim, isto é, que v. exa. se digne fazer prevenir o sr. ministro das obras publicas de que eu desejo chamar a attenção de s. exa. para um assumpto grave que corre pela sua pasta, e que muito desejava por isso que s. exa. se dignasse comparecer n'esta casa do parlamento logo que lhe seja possivel antes da ordem do dia, a fim de tratar do assumpto a que me referi.

Como está presente o sr. ministro da instrucção publica aproveito este ensejo para lhe perguntar se s. exa. tenciona reformar ainda antes de outubro o regulamento dos lyceus, a cujos defeitos já aqui me referi, de modo que a reforma possa aproveitar já para o futuro anno lectivo.

Já outro dia indiquei rapidamente alguns dos inconvenientes resultantes da execução do regulamento e a necessidade da sua reforma, e que o sr. ministro o póde reformar sem nova auctorisação das cortes. s. exa. fez-me a honra de. me responder em relação aos exames em outubro, mas emquanto aos outros defeitos e inconvenientes que eu notei, não se dignou s. exa. responder-me; por isso e porque eu não concordo com o que me disse sobre exames em outubro, permitta-me v. exa. e a camara, que eu volte ao assumpto, posto que resumidamente.

Se bem me recordo, o sr. ministro da instrucção publica disse que não podem acabar os exames em outubro emquanto houver dependencia de disciplinas. Ora, eu não condemno os exames em outubro em absoluto: eu quero-os; mas limitados áquelles a quem falte apenas um ou dois exames para se matricularem em curso superior ou para mudarem de classe, e que mostrem que estiveram em disciplina durante o tempo necessario para se aprender, e depois se a causa da conservação dos exames em outubro e a dependencia de disciplinas, e se o sr. ministro entende que taes exames não convêem, e que só pela dependencia de disciplinas se vê obrigado a conserval-os póde acabar com essa dependencia, quando reformar o regulamento, e tirada a causa cessa o defeito.

O sr. ministro diz, que não é por este motivo que tem de os conservar?

Pareceu-me que foi esta a rasão que s. exa. deu, quando defendeu os exames em outubro, mas seja esta ou outra a rasão dos exames em outubro, se s. exa. entende como eu, que elles não são convenientes ao ensino, acabe com a causa ou causas que os produzem.

Já notei como a segunda epocha de exames é prejudicial ao ensino, e que é necessario ou acabar com ella, ou reduzil-a o mais possivel, por isso não repito o que já disse, e a este respeito limito-me agora a pedir ao sr. ministro que emquanto mandar fazer os exames em outubro os mande ao menos fazer de modo, que o serviço se faça como deve ser, e sem accumulação com a regencia das cadeiras, porque assim não se faz bem nem um nem outro serviço.

Quando outro dia toquei n'este objecto referi-me tambem a outros pontos ou factos, que respeitam á instrucção secundaria, é claro que não posso antes da ordem do dia dizer o que penso sobre instrucção secundaria e reforma ou organisação dos lyceus, mas aproveito este ensejo para ir lembrando alguns inconvenientes, que se podem remediar de prompto e sem augmento de despeza, que é o principal.

Não sou inteiramente da opinião do illustre deputado o sr. José Julio Rodrigues de que se não póde melhorar a instrucção sem se gastar mais dinheiro; entendo ao contrario com o sr. conselheiro Dias Ferreira que ainda se póde melhorar muito a instrucção sem se gastar mais do que actualmente ella custa ao paiz; e ahi vae um exemplo d'esta verdade emquanto á instrucção secundaria.

A camara ha de recordar-se de que já houve nos lyceus a cadeira de legislação com um programma que comprehendia a faculdade de direito completa.

A introducção d'esta cadeira nos lyceus representava de certo um melhoramento da instrucção secundaria, mas com o programma, que lhe deram, e provavelmente com o gosto e costume, que muitos ou alguns professores têem de mostrar erudição aos rapazes, que ainda os não comprehendem, e que por isso dão ás materias um desenvolvimento muito superior ao que devem ter nos lyceus, entendeu-se bem depressa, que tal cadeira não dava resultado, e sem se attender a que o mal estava no programma e não na cadeira, em vez de modificar aquelle, acabaram com esta.

Em um paiz, em que o cidadão tem obrigação de ser vereador da camara do seu concelho, membro da junta de parochia da sua freguezia, regedor e administrador substituto; em um paiz, em que tem de ser mesmo contra sua vontade tutor de qualquer orphão, e vogal de qualquer conselho de familia; em um paiz, em que o cidadão tem de escolher o seu representante em côrtes, deve saber ao menos o principal da constituição do seu paiz, os seus principaes direitos e deveres eleitoraes; as principaes obrigações do regedor de parochia; em uma palavra, deve saber ao menos o principal das obrigações, que é obrigado a ac-

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ceitar o os direitos, que é chamado a exercer; e mal se comprehende, que nos lyceus se não ensine isto aos alumnos, e por isso e que eu entendo, que se devia restabelecer nos lyceus, não a cadeira de legislação, onde se pretende ensinar o direito, que constituo uma faculdade da universidade de Coimbra, mas onde se ensinasse o que todo o cidadão deve indispensavelmente saber para se poder desempenhar das funcções publicas, que a lei lhe impõe, e exercer os seus principaes direitos de cidadão.

No meu modo de ver o restabelecimento da cadeira de legislação nos lyceus é uma necessidade, a que não póde deixar de se satisfazer com a maior brevidade; e tanto mais, que póde ella satisfazer-se sem augmento de despeza, como eu disse a principio e posso demonstrar.

A cadeira de philosophia é ordinariamente regida nos lyceus por um bacharel formado em direito; portanto, pelo que respeita a habilitações póde muito bem ser regida pelo mesmo professor, e se não for bacharel em direito, não é natural, que mesmo assim não esteja habilitado para ensinar a legislação, que se devo aprender nos lyceus, que como disse se deve limitar ao absolutamente indispensavel; ao conhecimento dos direitos politicos, organisação dos poderes publicos; e ás funcções, que qualquer cidadão é obrigado a desempenhar na sociedade.

A falta de prova previa do professor não deve ser obstaculo, porque assim como a maior parte dos professores actuaes dos lyceus foram ali collocados sem concurso, tambem a cadeira de legislação póde ser dada ou incumbida ao professor de philosophia sem concurso previo.

Mas supponhamos que o professor de philosophia, contra o que é de esperar, não está habilitado a reger a cadeira de legislação; póde ser encarregado de outra cadeira, e o d'essa cadeira encarregar-se da de legislação, porque o conselho escolar póde continuar a ficar auctorisado a distribuir as cadeiras segundo as habilitações de cada professor e o tempo de serviço.

Portanto, não ha receio fundado de que em cada lyceu não haja quem possa reger a cadeira de legislação.

Vejâmos agora se o professor de philosophia tem tempo para a reger.

Não ha duvida que tem, porque actualmente este professor tem metade do tempo de serviço, que tem qualquer outro professor, por isso póde muito bem ter alem da aula do philosophia a de legislação em outro tanto tempo, e d'este modo introduz-se a cadeira de legislação nos lyceus sem augmento de despeza, e com igualdade de serviço pelos differentes professores, o que é tambem uma vantagem, por que não é justo nem regular, que no mesmo lyceu e com o mesmo ordenado haja professores com metade o menos de metade do serviço que têem os seus collegas de igual categoria e com habilitações iguaes.

Referi-me tambem o outro dia ao gravame que resulta da circumstancia do conselho superior de instrucção publica fazer a lista dos compendios a adoptar nos lyceus, já depois d'estes abertos, mas é tão grande e tão vexatorio este inconveniente, que eu não julgo de mais lembral-o outra vez e muitas ao sr. ministro da instrucção publica para que o remedeie.

S. exa. póde não só remediar de prompto a injustiça a que annualmente dá logar aquella circumstancia, mas regular mesmo o assumpto mais radicalmente, e com utilidade do ensino.

Eu não comprehendo que qualquer disciplina ou sciencia faça tantos progressos que seja preciso estar todos os annos a mudar de compendios, e senão é preciso estar-se todos os annos a mudar de compêndios, não é preciso publicarem-se listas annuaes como se faz agora.

Uma medida d'estes não prejudicava o ensino a antes economicamente o favorecia muito; por esta fórma podiam os livros que serviram a um irmão passar para outro, e podia um alumno que completasse o estudo de uma disciplina vender os livros, que já podiam dispensar para comprar outros, de que carecia nos annos seguintes, de modo que o estudante que começava, adquiria livros mais baratos comprando-os em segunda mão, e o estudante que acabava obtinha alguns meios para comprar os livros de que carecia.

É facil de comprehender o alcance de uma tal medida em relação a estudantes pobres, a quem principalmente se deve attender, quando se trata de propagar a instrucção, e se reconhece que ella deve ser dada gratuitamente.

Quantos alumnos deixam de frequentar os lyceus por não terem meios para a matricula e para comprar livros?

Estou convencido que muitos pobres aproveitariam com uma medida d'estas, por isso a lembro ao sr. ministro da instrucção publica, na esperança de que s. exa. a tome como os outros alvitres que lhe lembrei, na consideração que julgo merecem para bem do ensino.

Tenho dito.

O projecto ficou para segunda leitura.

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): - Procurarei responder ás considerações que o illustre deputado que acaba do fallar, julgou dever fazer sobre a parte regulamentar respeitante ao ensino secundario.

Direi a s. exa. que vou dedicar-me a este trabalho com toda a urgencia e com toda a assiduidade, encarando-o sob os seguintes pontos de vista:

Primeiro reforma do regulamento.

Não posso prejudicar introduzindo habitos novos e modificações capitães, e reformar adical e fundamental, de que tanto precisa o ensino secundario.

Segundo ponto. Estou colhendo algumas informações sob o ponto de vista pratico e de natureza mais urgente, que sem importarem uma remodelação profunda, da parte regulamentar do ensino secundario, careçam de prompta applicação; logo que tenha alcançado todas as indicações, apressar-me-hei a publicar algumas medidas mais de natureza provisoria do que definitiva, e que muito desejo aproveitem já no futuro anno lectivo, que vae começar em outubro.

Relativamente a exames em outubro, s. exa. não comprehendeu bem o meu pensamento. Eu não disse que não podia acabar com os exames em outubro emquanto houvesse dependencia de disciplinas. O que eu disse foi que os exames em outubro eram a unica fórma possivel de corrigir a dependencia de disciplinas de anno para anno.

O sr. Ruivo Godinho: - Por isso eu os admitto para o caso de passagem de classe ou de anno.

O Orador: - A unica fórma de attenuar um pouco o defeito d'essa dependencia, que se não baseia hoje na homogeneidade de conhecimentos de materias, mas unicamente no systema de dispor as cadeiras gradualmente por annos, é manter por emquanto os exames em outubro, que aliás se justificam por outros principies, que julgo inutil expor agora.

O illustre deputado é um professor de instrucção secundaria muito distincto para não saber, que n'este caminhar cada vez peior em materia de instrucção secundaria temos luctado sobre tudo com a gravissima difficuldade e grandissimo obstaculo que vem principalmente, do prejuizo de metter em um anno, uma quantidade enorme de materias, aggravado ainda pela importação ás vezes feita com pouco esmero de programmas de ensino, que existem no estrangeiro.

Relativamente á cadeira de legislação nem sympathiso nem antipathiso. Entendo, que a instrucção secundaria precisando de uma profunda remodelação, deve ser organisada de fórma a servir de base a cursos superiores ou mesmo a cadeiras d'esses cursos, e sob este ponto de vista pouco logar terá a cadeira de legislação na organisação do instrucção secundaria; mas n'este momento não posso fallar senão em geral, s. exa. comprehende bem, que não posso descer a especialidades.

A dificuldade para o restabelecimento da cadeira de le-

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gislação não provém da falta de habilitação do respectivo professor, provém da fixação do quadro da instrucção secundaria, e das materias, que devem formar essa cadeira.

Pelo que respeita a ser indispensavel a cadeira de legislação como base do instrucção secundaria, direi que tenho outra opinião sobre o assumpto; no entanto pela muita consideração que tenho pelo illustre deputado tomo em toda a consideração as suas palavras, que têem a auctoridade da sua illustração e competencia, e da sua longa pratica no ensino.

Pelo que respeita á questão dos compendios já pedi a s. exa., que me fornecesse uma nota do que a sua longa pratica no professorado lhe indicar como uma necessidade para a instrucção. Renovo o pedido, e creia s. exa., que tenho todo o empenho em melhorar a instrucção secundaria, e que aproveitarei com reconhecimento todos os esclarecimentos e indicações que me possam servir para este fim.

Tenho dito.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Paulo Cancella: - Sr. presidente, principio por declarar que o assumpto de que vou occupar-me não tem para mim caracter algum politico.

Não sei se o meu partido adoptará as minhas idéas, mas não me preoccupa a politica partidaria quando se trata do interesse da humanidade.

Eu, sr. presidente, opponho-me sempre a quaesquer medidas ou projectos que augmentem a despeza publica mas ha casos que se impõem por tal fórma que uma excepção satisfaz por assim dizer um dever do verdadeira gratidão.

Chamo, pois, a attenção do governo para as considerações que vou fazer e que são, parece-me, da maior importancia.

Grassa actualmente em Hespanha, como se sabe, a epidemia do cholera, e nós podemos, infelizmente, ser tambem invadidos por essa terrivel epidemia tendo de lamentar muitas mortes.

Em consequencia d'isso vou chamar a attenção do governo para uma classe, até agora tão desprotegida dos poderes publicos, e cujos serviços á humanidade são realmente dignos de ser considerados.

Eu li hontem que os municipios de Hespanha resolveram conceder uma pensão ás viuvas e familias dos medicos victimas da epidemia.

Como v. exa. sabe, os medicos são os devotados benemeritos da humanidade, e eu não vejo realmente rasão para o nosso governo conceder, como tem concedido, pensões ás familias de militares que têem morrido no serviço da patria, negando-as ao mesmo tempo aos medicos, mortos em serviço da humanidade por occasião de uma epidemia.

Eu não quero deprimir os serviços dos que matam, mas devo exaltar e concorrer para que se premeiem os serviços dos que salvam, o que até agora têem sido completamente esquecidos.

Eu conheço muitos medicos cujas familias vivem apenas do trabalho diario da sua clinica e que se porventura morrerem no cumprimento do seu dever, tratando dos cholericos, as deixarão na maior miseria.

É preciso attender a este mal em quanto as camaras estão abertas a fim de se remediarem as consequencias que podem resultar d'este estado de cousas.

É precisa que o medico, que no meio da epidemia sobe ás mansardas o ver os doentes, onde nem sequer espera receber remuneração, vá com o animo tranquillo, porque tem a certeza de que, se morrer, o estado lhe sustenta a familia que elle deixa na viuvez e na orphandade por ter cumprido um dever sacratissimo de humanidade. (Muitos apoiados.)

Ha dentro d'esta casa muitos medicos, e quem sabe quantos d'elles deixarão as familias no luto o na miseria, se o cholera nos invadir e elles morrerem, sem que o estado se importe com o futuro das suas familias!

Eu desejava, pois, que e governo, agora que temos o cholera a bater-nos á porta, attendesse a esta classe verdadeiramente benemerita e humanitaria, (Apoiados.) e apresentasse ás côrtes uma proposta de lei, concedendo uma pensão ás viuvas, aos filhos menores, e filhas solteiras dos medicos que morrerem por causa do cumprimento dos seus deveres, no tratamento dos doentes da epidemia. (Apoiados.)

Peço, pois ao governo que attenda a esta classe, que nos merece toda a consideração (Apoiados.) pelos serviços que nos presta e ha de prestar.

Eu não quero que se dêem pensões ás familias de todos os medicos que morrerem, mas sómente ás d'aquelles que morrerem no tratamento do cholera, no caso em que esta epidemia invada o paiz. (Apoiados.)

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): - Nutro a esperança de que o flagello, de que se manifestaram alguns casos em Hespanha, não chegue a invadir o nosso paiz, porque, as noticias que d'ali vêem chegando não são por tal fórma alarmantes que não possamos ver, com inteira satisfação, que a epidemia que ali se tem desenvolvido, e que se conserva n'uma limitada zona, parece ser endemica, apesar de todas as contradições.

O governo começou e continuará a tomar todas as medidas necessarias para evitar a invasão de qualquer epidemia d'aquella natureza em territorio portuguez.

Tenho tambem a declarar ao illustre deputado que adhiro, e parece-me que toda a camara adhere (Apoiados geraes.) ao pensamento e sentimento inteiramente humanitario que s. exa. acaba de manifestar relativamente áquellas entidades que no periodo acceso de uma epidemia sacrificam a sua vida, pondo ao serviço da humanidade afflicta a arte que professam, menosprezando os seus interesses mais vitaes, e a sua propria familia, no cumprimento da missão que desempenham. (Apoiados.)

Direi, portanto, ao illustre deputado que as suas considerações, com referencia aos medicos do corpo, com igual justiça devem ser applicadas aos medicos da alma.

E devendo por estes dias entrar em discussão uma proposta de lei, que foi apresentada hontem pelo sr. presidente do conselho, para auctorisar o governo a tomar varias medidas extraordinarias contra a invasão de qualquer epidemia, parece-me que será essa a melhor occasião para se tratar do assumpto para o qual o illustre deputado chamou a attenção do governo.

O sr. Pinheiro Chagas (para um requerimento): - Consta-me que ainda falta eleger algumas commissões, o segundo o exemplo que só tem dado em outras sessões parlamentares, peço a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se consente que essas commissões sejam nomeadas pela mesa.

Aproveito a occasião para mandar para mesa uma representação dos guardas da escola polytechnica, pedindo augmento de ordenado, e eu recommendo esta representação á justiça e benevolencia das commissões a que tenha de ser apresentada.

A representação teve o destino indicado a pag. 903 d'este Diario.

O sr. Presidente. - Queira o sr. deputado mandar para a mesa a sua proposta.

O sr. Pinheiro Chagas: - Mando a seguinte proposta e peço a urgencia.

É a seguinte:

Proposta

Proponho que seja auctorisada a mesa a nomear as commissões que ainda não foram eleitas. = Manuel Pinheiro Chagas.

Foi approvada.

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O sr. Antonio Maria Cardoso: - Por parte da commissão de marinha mando para a mesa uma proposta.

É o seguinte:

Proposta

Proponho que á commissão de marinha seja aggregado sr. deputado Pedro Ignacio de Gouveia. = Antonio Maria Cardoso, secretario da commissão.

Foi approvada.

O sr. José Julio Rodrigues: - Referindo-se ás palavras proferidas na sessão de hontem pelo sr. ministro de instrucção publica, felicitava s. exa. pela fórma eloquente por que fez o seu discurso e dava-lhe os seus agradecimentos pela amabilidade com que o tratára.

Dissera s. exa. que a descentralisação em França era tilo grande, que chegava a assustar; pois elle desejava que lhe explicasse como é que se gastam na cidade de Paris 4.559:000$000 réis em escolas.

Hoje mesmo escrevêra ao antigo ministro da instrucção publica de França, pedindo-lhe varios esclarecimentos, que espera submetter á apreciação de s. exa.

S. exa. dissera que alguns membros da opposição tinham estudado depressa o assumpto; pois s. exa. fizera mais, estudára-o a vapor. D'esses oradores, alguns d'elles, quando o sr. ministro nascêra, já se dedicavam ao ensino.

Fez ainda referencia a outros pontos do discurso do sr. ministro de instrucção publica.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): - De dois generos foram as considerações do illustre deputado que acaba de fallar.

Umas d'ellas foram propriamente sobre o assumpto que está em discussão na ordem do dia e v. exa. comprehende que, em obediencia ás praticas parlamentares, tenho de me abster de fazer quaesquer observações a esse respeito.

Em todo o caso sempre direi uma cousa.

A referencia que s. exa. fez ás escolas estrangeiras não sei se representava uma simples pergunta, ou se representava mais do que isso, a contradicção de um facto.

Se era uma simples pergunta, s. exa. por certo se equivocou, porque ella não correspondeu á fórma porque a apresentou, e ao entono que deu á sua voz.

Se era alguma observação elucidativa da questão, cumpre-me dizer que quando ella vier ao debate poderá s. exa. contradictar factos com factos, e apreciações com apreciações, na certeza de que me encontrará sempre correcto e prompto para responder.

Quanto á maneira por que eu me referi aos srs. deputados da opposição, o sr. José Julio Rodrigues ha de permittir-me umas simples palavras.

Eu não me esqueço nunca de que fiz opposição intransigente aos gabinetes que combati, e não me esqueço, nem me esquecerei nunca, desde que entrei para este logar, do respeito e consideração que devo a todos os membros do parlamento a fim de poder proseguir, firmemente, na estrada que me dispuz a trilho.

Tenho a consciencia dos meus deveres, mas tambem a tenho dos meus direitos; e levo tão longe este principio, que constitue o norte para o qual caminho, a objectiva a que miro em todas as questões parlamentares, que nem sequer me melindrei quando o illustre deputado n'esta questão, algumas palavras proferiu, que na realidade não me pareceram justas.

Fiz-lhe porventura alguma observação, quando s. exa. taxou de comico o projecto em discussão?

Nem sequer levantei o adjectivo; e s. exa. póde ter a certeza de que se estivesse um outro ministro aqui sentado, que não tivesse o grande respeito e consideração que eu tenho pelo professor publico e pelo parlamentar que fallava, algumas observações apresentaria estranhando a fórma por que era atacado o projecto. No que disse quiz apenas reivindicar para mim, o direito do defender, não a minha personalidade como ministro, mas ao menos, a minha personalidade academica, que chegou a este logar, tendo-o conquistado á custa de muito trabalho, estudo, e sacrificios.

Tenho a dizer ao sr. José Julio, que sei que s. exa. era já estudante feito, creio que até professor, quando eu começava a estudar as primeiras letras; mas não costumo medir o trabalho pelas idades; nem o facto de ser mais novo ou mais velho prova cousa alguma contra ou a favor de s. exa.

Dou esta explicação á camara, e direi ao illustre deputado que entre o activo e o passivo da opposição parlamentar, na apreciação de phrases agradaveis ou desagradaveis, o activo está do meu lado e o passivo do opposto.

As queixas poderia eu fazel-as, não as fiz, porque o meu dever é ouvir muita cousa que não me agrade, pois que como ministro tenho determinados deveres a cumprir.

Mas o que affirmo ao illustre deputado, e tenho a consciencia da verdade do que digo é que nenhuma phrase proferi, que no mais pequeno ponto podesse ser desagradavel a s. exa. e que a intenção que constantemente procuro manter com firmeza, é a de sempre proceder com a maior correcção.

O sr. José Julio Rodrigues: - V. exa. permitte-me que diga ainda duas palavras em resposta ás considerações do sr. ministro?

O sr. Presidente: - A hora está muito adiantada.

Vozes: - Falle falle.

O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camara, tem v. exa. a palavra.

O sr. José Julio Rodrigues: - Replica ao sr. ministro.

(As palavras proferidas pelo orador serão publicados na integra, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do parecer n.° 133 (organisação do ministerio da instrucção publica)

O sr. Elvino de Brito: - Leu a seguinte moção:

«A camara reconhece que não ha rasão para se alterar profundamente o systema e os principios liberaes de descentralisação, em que assenta a reforma da instrucção primaria de 2 de maio de 1878 e continúa na ordem do dia. = Elvino de Brito.»

Sentia-se muita á vontade na discussão d'este projecto, porque para todos a questão propriamente politica estava por assim dizer arredada do debate.

A conveniencia e opportunidade da creação do ministerio da instrucção publica fôra um assumpto larguissimamente discutido na camara e considerava-o, como todos, perfeitamente liquidado.

Todavia desejava fazer uma affirmação ácerca da opportunidade da conveniencia da creação do ministerio da instrucção publica.

Quando usára da palavra na discussão do projecto do bill de indemnidade, só por esquecimento não alludíra á creação do ministerio da instrucção publica, condemnando a fórma por que fora creado e a opportunidade mesmo da sua creação, porque não lhe parecia que um assumpto de tanta magnitude devesse ser conjunctamente promulgado com actos dictatoriaes, que realmente não agradaram na sua generalidade ao paiz e que não trouxesse sobre si o odioso de muitos d'esses actos.

O que tinha trazido a nota irritante a este debate?

Seria o querer o sr. ministro da instrucção publica organisar o ministerio?

Mas como poderia s. exa. trabalhar sem organisar o seu ministerio?

Seria o facto de estar á testa do ministerio da instruc-

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ção publica um homem que não tivesse dado exuberantes provas do seu talento e aptidão?

Não, porque como a camara sabe, o sr. Arroyo pelo denodo, pela seriedade, pela actividade infatigavel de que deu provas durante quatro ou cinco annos, nas luctas parlamentares, em que se distinguíra tanto, que, apesar do seu mau processo politico, chegára, filho de uma familia obscura, mas honrada, ao mais alto cargo da sociedade, mostrára que não lhe faltava, nem intelligencia, nem aptidões.

Então porque motivo viera a nota irritante? Era porque este projecto só devia ser discutido depois da approvação do bill?

Descendo a minuciosidades, devia dizer que lhe parecia que o sr. Arroyo lêra todas as organisações de ensino, tanto na Europa como na America, e tinha alguma cousa occulta no seu pensamento.

S. exa. vira de certo que nos Estados Unidos ha os technicos no ministerio da instrucção publica, como no ministerio das obras publicas, e talvez tivesse querido apresentar n'esse sentido as bases do seu projecto, como se via de um artigo d'elle.

Pela necessidade, porém, de trazer em breve a proposta de lei ao parlamento, s. exa. não se sentíra talvez com coragem para contrariar as tradições burocraticas do paiz.

O que era certo era que s. exa. começava por declarar que o sou fim era apenas organisar a secretaria do ministerio da instrucção publica, e queixára-se do sr. Dias Ferreira ter confundido a organisação da secretaria com a organisação dos serviços dependentes da mesma secretaria.

Responderia a isto que o projecto é mais alguma cousa do que a organisação da secretaria da instrucção publica, porque é a alteração profunda dos serviços da instrucção primaria.

Entendia que o sr. ministro da instrucção publica fôra injusto, para com o sr. José Julio Rodrigues, quando proferiu aquella phrase; «conhecimentos, ou sciencia de fancaria».

Desejava que s. exa. cortasse esta phrase do seu discurso, porque o sr. José Julio Rodrigues é um professor distinctissimo, e demonstrou a sua alta competencia em muitas conferencias scientificas, nas quaes se occupou brilhantemente de todas as grandes questões sociaes.

O sr. ministro tinha dito que era urgente passar-se para o systema da centralisação quanto á instrucção primaria, por causa dos vicios da lei de 2 de maio de 1878, e um da argumentos que apresentara fôra a enorme irregularidade na distribuição das escolas.

A regularidade na distribuição das escolas não dependia, porém, da centralisação ou descentralisação.

A distribuição das escolas tinha ficado dependente da organisação de um plano provisorio feito nas localidades, plano que o governo podia modificar ou ampliar.

Se o governo não tratou da organisação d'este plano, para o modificar ou ampliar, e em vista d'elle estabelecer as escolas, como é que se attribue á lei de 1878 a irregularidade na distribuição das escolas?

A distribuição das escolas não dependia do systema. Se com o systema da centralisação não se fizer o plano provisorio a que se refere a lei, não haverá irregularidade na distribuição das escolas?

Com qualquer dos systemas o governo tem nas suas mãos a fiscalisação.

O orador passou a descrever os casos em que o governo tem intervenção nos assumptos de instrucção primaria, segundo a lei de 2 de maio de 1878, sustentando que os defeitos que se têem notado n'este serviço não vem tanto d'aquella lei, como do modo por que ella tem sido executada.

Tinha a notar que nunca se tinham publicado os relatorios biennaes a que se referia a lei de 1878, e a respeito de regulamentos apenas estava publicado o regulamento financeiro.

Tinha sempre acompanhado os negocios publicos, especialmente os da instrucção, e ha muito que trazia o coração maguado por ver a incuria com que os governos têem tratado este assumpto.

A lei de 1878 não fôra escripta sobre o joelho, nem feita n'um momento de anciedade publica, ou n'um momento em que fosse necessario satisfazer a exigencias politicas ou partidarias. A lei de 1878 viera pela primeira vez á camara em 1872, e fora largamente discutida, tendo vindo muitas informações esclarecer a opinião publica e a camara.

Como era, pois, que os governos, não executando aquella lei, sonegando ao parlamento os relatorios e as estatisticas, julgavam que os vicios provém d'ella?

Aquella lei, se tinha defeitos, o que devia era ser aperfeiçoada ou melhorada.

Esta alteração profunda que se lhe queria fazer estava em manifesta opposição com as idéas liberaes de Sampaio e do sr. Thomás Ribeiro, idéas de que o partido regenerador fazia a sua gloria.

Estava convencido de que o sr. ministro da instrucção publica havia de trazer á camara, ha proxima sessão legislativa, alguma proposta do lei para remediar os inconvenientes que hão de nascer d'esta transformação mal pensada.

Em todo o caso diria que, se s. exa. lhe demonstrasse que a publicação da nova lei punha cobro a todos os abusos e deficiencias, applaudil-o ía, embora o seu coração soffresse por ver mais uma vez sacrificados os principios liberaes.

Dissera o sr. ministro da instrucção publica uma grande verdade, quando exclamara: não imaginam o que é n'este momento a creação de uma secretaria do estado.

A este ponto já alludíra o sr. José Julio Rodrigues, fallando antes da ordem do dia, ao dizer que via imminente um chuveiro de cartas dirigidas ao sr. Arroyo, quando tem que preencher tantos logares pela sua pasta.

Era occasião de fazer reviver umas palavras que ha pouco proferíra.

Perguntou se era o systema seguido nos Estados Unidos aquelle que o sr. ministro da instrucção tencionava seguir para a nomeação do pessoal do seu ministerio. Se s. exa. seguisse um tal systema, para o anno seria o primeiro a dar-lhe os devidos louvores.

O illustre ministro apresentara um argumento a que não podia deixar de se referir. Parecia que s. exa., por uma confusão de idéas, apresentára o argumento da centralisação da lei de 1878 sobre instrucção primaria, e da centralisação da parte technica do ensino da instrucção. Uma cousa era differente da outra.

Acerca da centralisação dos serviços da instrucção, entendia que o exemplo trazido da França não colhia, porque mesmo na parte financeira e economica havia communas que tinham a liberdade de escolher a materia collectavel em que o imposto devia recaír.

E a França, que era liberal, tivera, no que respeita ao ensino, as difficuldades proprias da sua organização politica. Por uma necessidade fatal a França fôra obrigada a restringir-se nos seus principios descentralisadores, a fim de repellir as tendencias clericaes.

E perguntava, lembrou-se o sr. ministro do ensino religioso entre nós?

Lembrára-se de que o estado não exercia, o que era vergonhoso, a minima fiscalisação nos seminarios?

Por um decreto de 26 de abril de 1877, referendado pelo sr. marquez d'Avila, havia-se retirado a esses estabelecimentos a inspecção e fiscalisação do estado; e quanto não estimaria elle, orador, ver que o collegio de Sernache, das missões ultramarinas portuguezas, ficasse tambem sujeito á inspecção do governo pelos delegados do ministerio da instrucção publica?

E não queria referir-se á instrucção do ultramar, mas

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910 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

não podia deixar de dizer que aquillo não era só uma vergonha e uma miseria, mas era tambem uma nodoa para a administração do paiz.

Não era uma sombra de instrucção; era uma verdadeira nodoa da nossa administração, e não se perderia nada se ella passasse para o novo ministerio da instrucção publica.

O projecto em discussão dizia que o governo ora auctorisado a organisar a secretaria de estado dos negocios da instrucção publica debaixo das seguintes bases. Mas onde estavam as bases? O parlamento não sabia quaes ellas eram, e quanto á remodelação do conselho do instrucção publica, desejava que o sr. ministro dissesse como tencionava organisar esse conselho, porque o parlamento tambem nada sabia a tal respeito.

Talvez que ao sr. ministro não conviesse desde já declarar a maneira como havia de organisar o conselho por causa dos pedidos, e estava persuadido de que os pretendentes haviam de ser mais do que escolas ha no paiz.

Imagina que o sr. ministro ha de ter grandes difficuldades na organisação do novo ministerio, e, pela pratica que tem do serviço publico, sabe quaes as difficuldades que o sr. ministro ia ter.

Queria tambem alludir ao serviço da estatistica.

Dirigira a repartição de estatistica do ministerio das obras publicas, e publicára um relatorio; mas viu desde logo a dificuldade que havia de haver para se continuar aquella publicação, aliás importante.

N'esse relatorio tivera a coragem de dizer com verdade quaes eram os defeitos e os vicios da organisação do serviço de estatistica, e como deputado apresentara um projecto de lei tornando autonoma aquella instituição por entender que só assim se poderia melhorar o serviço.

Mais tarde, sendo ministro das obras publicas Fontes Pereira de Mello, aproveitara o projecto d'elle, orador, modificando-o em alguns pontos, e publicando um decreto para a repartição de estatistica ser autonoma, o que passado algum tempo deixára de ser.

Expoz as difficuldades que se davam para a publicação dos relatorios de estatistica e os motivos por que entre nós não podia haver uma boa estatistica.

Fazia votos para que o sr. ministro da instrucção publica fizesse a organisação do seu ministerio livre de influencias politicas, e por modo que podesse satisfazer ás necessidades d'este ramo de serviço.

Concluiu mandando para a mesa a sua proposta.

(O discurso do sr. deputado será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)

Leu-se na mesa a seguinte

Moção

A camara reconhece que não ha rasão para se alterar profundamente o systema e os principios liberaes de descentralisação, em que assenta a reforma da instrucção primaria de 2 de maio de 1878 e continua na ordem do dia. = Elvino de Brito.

Foi admittida.

Leu-se na mesa um oficio do ministerio da justiça, solicitando licença para que o sr. deputado Augusto Fuschini possa ir depor como testemunha, n'um processo.

Foi concedida a licença pedida.

Foi lida e admittida á discussão a moção de ordem do sr. Elvino de Brito.

O sr. Lourenço Malheiro, era seu proposito dizer algumas palavras ácerca das considerações feitas pelo sr. deputado que acabava de fallar sobre o projecto em discussão.

S. exa., de todas as considerações que fez, e como resumo de todas, provára apenas uma cousa, que era a necessidade absoluta e urgentissima de crear o ministerio da instrucção publica.

Defendêra s. exa. a lei de 1878 e julgara um attentado contra as liberdades o derogar ou destruir essa lei; mas o facto sobre o qual todos estavam conformes, era que o estado da nossa instrucção primaria era pessimo, e o estado da instrucção industrial era horrivel.

E não era só o ensino theorico que tinha defeitos, era tambem o ensino pratico.

A maioria dos cidadãos devia ser educada para um fim pratico.

A questão da instrucção não estava só em ensinar a ler; era educar para um fim util e pratico, a fim de que o cidadão sirva para alguma cousa.

Estava do accordo com o sr. José Julio Rodrigues, quando s. exa. disse que o ensino industrial era a questão capital.

A lei de 1878 não se executara porque se não podia executar, porque em seguida a inercia absoluta das camaras municipaes havia a inercia dos municipes.

Era facil discutir uma lei quando se estava um pouco afastado do paiz, quando não se viajava, quando se não palpavam as necessidades do paiz.

Para se ensinar, era preciso ter orientação da educação, e como era que as camaras municipaes podiam ter essa orientação?

Os professores não eram nomeados pelo merecimento dos individuos, nem pelos serviços que podiam prestar; eram nomeados pelos empenhos que tinham, pela politica e por outros motivos em que a instrucção não influia nada.

Mas porque era que não se executava a lei de 1878?

Porque os governos não têem podido fazel-a executar, e talvez que uma das rasões fosse o desleixo e o resultado de não haver um ministerio que especialmente se occupasse d'este assumpto.

Para mostrar que o ensino industrial deve ser mais pratico do que theorico, citou o que succede no instituto industrial de Boston, em que os aluamos são obrigados a fazer trabalhos praticos nas officinas, nas machinas e nos fornos, saindo depois os alumnos com toda a competencia para dirigir certa ordem de serviços.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - A ordem da noite para hoje 6 a continuação da que está dada.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

O redactor = Sá Nogueira.

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