950 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
um typo de navio apresentado para concurso, por ter a sua principal artilheria em condições de menos efficiencia, por estar no pavimento da tolda e não no pavimento superior, o mesmo pessoal, na mesma epocha, approva um plano feito pelo sr. Croneau, em que a artilheria principal fica na tolda e a artilheria de menos força nos pavimentos superiores.
E já que fallei no sr. Croneau devo dizer que hei de publicar no Diario das sessões um documento illustrativo e muito significativo, que é o contrato celebrado com esse engenheiro, para vir dirigir a construcção naval e o ensino do trabalho em aço, e reger a cadeira de architetura naval.
O anno passado disse, que a nossa marinha estava de baixo da pressão, do imperio, de um syndicato clerical francez, e começou esse dominio porque um cavalheiro progressista insinuou ao ministro da marinha de então, que era o sr. Jacinto Candido, a conveniencia de ser chamado a dirigir as construcções de aço no nosso arsenal o sr. engenheiro Croneau, porque se entendia que ninguem sabia cá do assumpto.
Contra esta opinião protestam os factos, porque em 1895 se restauraram os fundos de duas canhoneiras de aço, a Massabi e a Cacongo e não foi necessario vir engenheiros estrangeiros para mostrar como se trabalha em aço, quer em chapa, quer em cantoneira.
E essas reparações faziam-se; e v. exa. sabem quanto é mais difficil muitas vezes fazer reparações subordinando-se a uma obra já feita, do que fazer uma obra nova.
O mais curioso, porém, é que, reconhecendo-se que os nossos engenheiros navaes não têem illustração bastante para fazer construções metallicas no nosso arsenal, estejam a construir-se navios fora do paiz sem que, nem o meu successor, nem os que se lhe seguiram, mandassem engenheiros navaes assistirem a essas construcções, não só para as fiscalisar, mas para aprender. Quando ministro, mandei assistir á construcção do Adamastor por parte do governo um engenheiro naval, mas as actuaes commissões têem muitos officiaes e muitos machinistas, mas engenheiros nenhum!
E se é certo que a essas commissões deve presidir um official de marinha, não é menos certo que é indispensavel que a ellas pertença um engenheiro naval, para examinar as condições de construcção e um engenheiro machinista, não tanto para verificar como a machina é construida, como para ver como ella é montada, para no caso de avaria, não ter dificuldades em a desmontar e separar.
Essas commissões, em que foram arrumados, pelo meu successor, todos aquelles que o orientaram ou desorientaram e que pelo seu numeroso pessoal foram criticados pelos jornaes progressistas, mantiveram-se, porque a inspirou a siamezisse catholico-politica, Barros Gomes e Jacinto Candido.
Não esqueça a camara, que emquanto uma commissão declarava que deviam ser repudiadas, algumas propostas de navios do ultimo concurso, por não satisfazerem á condição do ter a sua principal artilheria nas melhores condições de utilisação, é acceita esta resolução, e na mesma epocha, e sob as mesmas influencias, é acceito um plano onde esse grave erro, sob o ponto de vista militar, se continha e se conserva.
Disse eu aqui, em 15 de julho, sessão n.° 14, que o que nós precisavamos era ter navios de combate e que estes careciam de ser de 4:000 a 5:000 toneladas, lembrando n'essa occasião o typo Buenos-Ayres e não o Yoshino, que de antes proconisava, porque o typo Buenos-Ayres é o Yoshino aperfeiçoado, como o Yoshino é o Nove de Julho, melhorado.
Pois, sr. presidente, as doutas commissões navaes que foram encarregadas pelo meu successor de preparar as condições do programma para a acquisição de navios, teimaram em querer adquirir um navio de 3:600 toneladas, mettendo-lhe todas as melhorias e bemfeitorias que a sciencia successivamente tem introduzido n'esses typos de navios. A resposta, sabem qual foi? É que o concurso foi feito pro forma por parte de algumas casas concorrentes ou mandaram propostas de navios de maior tonelagem do que aquella que o concurso estabelecia, e a casa ingleza Armstrong, em documento de que tenho aqui a copia, disse: tudo o que os srs. pedem é muito bom, muito bem entendido, simplesmente isso tudo não cabe n'um navio de 3:600 toneladas, e o minimo que a minha repartição technica de construcções admitte é um navio de 4:100 toneladas. Se os srs. querem isso não tenho duvida em fazel-o!
Estiveram os conselhos technicos, e os conselhos de familia a meditar n'um programma de concurso para um cruzador de 3:000 toneladas, com melhoramentos e condições que não cabiam dentro delle, e no fim de contas uma casa constructora diz-lhe: isso é uma tolice, um navio n'essas condições não póde ter menos de 4:100 toneladas. As commissões technicas, o governo de então e todos os que o inspiravam, orientavam e desorientavam, acabaram por acceitar que se fizesse um navio de 4:100 toneladas! Era melhor terem começado por onde acabaram.
Estou vingado, pois os factos vieram provar que eu tinha rasão na minha propaganda nas e criticas que faço.
Os navios de que nós precisamos têem, nas actuaes da architectura naval, de estar comprei entre 4:000 a 5:000 toneladas, como eu já disse, indicando n'essa occasião o typo Buemos-Ayres, que reune todas as condições desejaveis; por fim faz-se um concurso, que teve como remate apanharmos uma reprimenda de uma das mais notaveis casas constructoras, com o que utilisámos alguma cousa, porque emfim sempre veiu um navio, que não é mau de todo.
Os nossos navios devem ter um raia de acção de 10:000. milhas, não me canso de o dizer, que é o indispensavel para a acção da nossa esquadra, quer em relação ao nosso dominio colonial, quer em relação aos paizes estrangeiros onde tenhamos colonias a proteger, como no Brasil e no Rio da Prata.
No material naval, de que trata o projecto em discussão e o que possuimos, alem de se comprehender como a camara acaba de ouvir, os elementos, necessarios nas colonias ha outros perfeitamente dispensaveis, como são as canhoneiras de estação em numero do 15 de 500 toneladas, que podem e realmente devem ser em muito menor numero e que não se devem reproduzir. Percebem-se mais navios de 500 toneladas como contra torpedeiros e com 30 milhas de marcha.
Ha ainda uns navios especiaes de fiscalisação que tambem não têem rasão de ser, porque póde haver um material de serviço nas colonias e outro como de reserva em Lisboa que faça esse serviço de policia costeira.
Ha ainda, pontões 4, escolas 4, transportes 2 um a vapor e outro de vela, rebocadores 3.
A respeito de rebocadores ha uma nota muito curiosa, para a qual não posso deixar de chamar a attenção da camara.
No concurso para rebocadores, a proposta mais cara era a da casa Armstrong, de New Castle, que pedia pelo typo proposto do concurso 17:400 £. Em seguida apparece a "Forges et Chantiers", participante no tal syndicante clerical e pede 15:200 £. Todos os outros preços são abaixo d'este. Quer v. exa. saber com quem se contratou? Contratou-se com a "Forges et Chantiers", não por 15:200 £, mas por 16:800 £.
Não commento, os documentos hão-de ser publicados e cada um aprecie e admire como correm as cousas da administração publica.
Aqui está porque, tendo eu dantes a orientação de reduzir a despeza, e fazer economias, não tenho hoje coragem para propol-as diante de desperdicios d'esta ordem,