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918 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

alguem, que não se limitasse a conceder o bill de indemnidade ao governo, mas que apresentasse até uma moção para que a camara o applaudisse por esse acto, por ter rasgado a constituição!
O sr. presidente do conselho fez até um reparo notavel.
Quando um dos meus collegas, não me lembro quem foi, notou que o governo devia apresentar-se com mais humildade ao trazer aqui a sua proposta, s. exa. pareceu magoado com este reparo, dizendo que os poderes eram todos iguaes, e n'essas condições se negava a apresentar-se com humildade, fazendo-o apenas respeitosamente, como era de esperar da sua cortezia e do seu cavalheirismo
Permitta-me, porém, s. exa. que lhe diga que os poderes politicos o como os dilimita a carta, são iguaes; mas desde que qualquer d'elles sáe da esphera que está traçada na mesma carta, ha desigualdade e o que sae da orbita é o que se reduz e amesquinha, porque já não tem a salvaguardai-o a magestade da lei, podendo apenas chegar a merecer a benevolência dos legisladores, a benevolencia da nação.
Tambem não posso associar-mo às idéas apresentadas por um dos mais illustres oradores d'esta casa, distinctissimo, primoroso, que nos enleva tanto quanto nos entristece, quando o vemos envolver em palavras tão eloquentes, idéas, na minha opinião, tão erroneas.
O sr. Antonio Candido, illustre orador da opposição progressista, desalentado e quasi descrente, apresentou-se todavia cheio de enthusiasmo e como que inebriado diante de umas certas e determinadas dictaduras, no entender de s. exa. necessarias e indispensaveis para corrigir a fraqueza e debilidade do systema parlamentar.
Não comprehendo como possa considerar-se a força do organismo social, independente e alheio a esse mesmo organismo, como se imaginam esses dictadores, não sabemos que entes sobrehumanos capazes de resuscitar os mortos ou de dar sentimento às pedras.
Eu considero errónea a doutrina expendida por s. exa.; considero-a como uma semente perigosissima lançada no seio das massas populares, e mais perigosas estas doutrinas por serem servidas por uma palavra eloquentissima, cheia de suavidade e até de uncção verdadeiramente evangelica.
Não posso, por consequencia, acompanhar s. exa. n'este ponto.
O que eu queria era que os poderes públicos nunca saíssem da orbita legal e se acostumassem sempre a governar dentro da lei, para que com o seu exemplo insinuassem no espirito de todos os cidadãos o respeito pela mesma lei.
O que eu queria, o que eu desejava, o meu enlevo era que o governo tivesse confiança na lei, que o governo entendesse que dentro ,da lei são possíveis todas as transformações, todos os progressos.
D'essa maneira era natural que se insinuasse tambem no espirito publico a confiança na legalidade; dessa maneira era natural que todos os cidadãos se convencessem de que se podem, dentro da lei, realisar todas as transformações, satisfazer todas as aspirações, as mais largas, as mais amplas, as mais generosas.
Se não for assim, se o governo der estes exemplos, se o governo proceder por esta forma, se nas regiões superiores houver reacção ou acção, tambem nas regiões inferiores ha de haver acção ou reacção. Isto é natural.
Assim a harmonia perturba-se, e a paz publica altera-se.
Em vez da paz tão util para todos, podem soltar-se os interesses apaixonados, e poderemos assistir a scenas que não sei quaes serão, mas que se póde facilmente imaginar que podem ser bem lamentaveis.
Portanto, não acompanho o meu illustre collega. por quem tenho aliás o maior respeito e admiração, no seu enlevo pelas dictaduras.
Realmente, até pasmei de que s. exa. se referisse aqui a dictaduras parlamentares.
Não posso reunir estas duas palavras.
Dictaduras parlamentares!...
Não comprehendo.
Mas s. exa. teve o cuidado de indicar duas para nos dar um exemplo d'ellas.
Uma d'essas duas dictaduras foi a de Napoleão III, a respeito da qual, talvez pela admiração que professa pelas dictaduras, a custo pronunciou algumas palavras desagradaveis.
Citou s. exa. depois outra, que era, segundo a sua opinião, o propósito que lhe aprouve imaginar que existia na mente e no cerebro de Gambetta quando pugnava pelo escrutínio de lista plurinominal.
Não posso acompanhar o meu nobre collega em attribuir similhante propósito áquella illustre cidadão, tão illustre que, simples deputado, morreu cercado de respeitos e de saudades.
O que elle tinha exercido fôra uma grande, uma nobilíssima magistratura, magistratura da opinião, sem benesses, sem benefícios, sem insígnias, sem regalias, sem nada emfim.
E exercendo essa magistratura teve o grande mérito de transplantar da Itália o processo político que dera unificação áquelle paiz, para implantar e robustecer as instituições republicanas na sua patria.
Gambetta foi compellido ao governo, não o requestou.
Quantas vezes se não disse que Gambetta devia ir para o governo? Mas Gambetta repellia essa indicação.
Gambetta não solicitava o poder; e exerceu-o democraticamente.
Elle, subindo ao poder, não fez mais do que provar ser um espirito eminentemente respeitador das instituições democraticas; e com igual respeito defendendo as suas idéas e os seus princípios, firme n'esses princípios e n'essas idéas, e tendo a sua voz, tão calorosa quer no governo quer no parlamento, sempre prompta para a defeza da politica elevada que era necessario estabelecer na Europa para que a corrente liberal ficasse definitivamente assente, por que, as duas grandes nações, a França e a Inglaterra, uma vez unidas, a liberdade do mundo não corre risco. Esta era a opinião de Gambetta; não é a de um dictador.
Que singular contraste entre estas duas dictaduras! Uma verdadeiramente imaginaria, outra tão perniciosa, que até começara por um verdadeiro massacre! A differença entre estes dois homens é grande.
Um, poupado das balas, para assistir ao espectáculo desolador das desgraças que provocara; o outro, Gambetta, no vigor da idade a morte nol-o arrebata, porque se inclinem, admirados e pezarosos, junto d'aquelle tumulo, os que o tinham insultado, os que o tinham calumniado, os que não o tinham sabido apreciar, e até mesmo os que a respeito de Gambetta fazem apreciações inexactas, como o meu illustre collega, esses mesmos se rendem, porque com essa injustiça não pretendem apoucal-o, mas engrandecel-o.

u estimo que o elogio d'aquelle grande espirito fosse traçado com tão bellas e eloquentes palavras n'esta casa pelo meu illustre collega.
E n'este ponto ha tambem um adiantamento n'esta camara. Quando chegou aqui a noticia tristíssima da morte d'aquelle grande cidadão francez, eu desejei apresentar n'esta casa um voto para que o parlamento portuguez se associasse á dôr da França; e não só á dor da França, mas de todo o mundo liberal e democratico.
Não o fiz; e não o fiz porque fui cauteloso; entendi dever primeiro saber se podia obter a aquiescência dos membros da maioria desta casa; e como não a obtive, abstive-me de o fazer, para que alem da dor que sentia pela morte d'aquelle grande cidadão da França, como já em uma occasião anterior experimentara o desgosto, de ver surgir no parlamento uma nota discordante, e ver mais