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SESSÃO DE 26 DE MARÇO DE 1888
Presidencia do ex.mo sr. Francisco de Barros Coelho e Campos (vice-presidente)
Secretarios os ex.mos srs.
Francisco José Machado
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral
SUMMARIO
E approvada a acta com uma rectificação indicada pelo sr. Antonio Maria de Carvalho. - Teve segunda leitura um projecto de lei do sr. Silva Cordeiro, determinando que as funcções de ministroo d'estado, par do reino e deputado sejam incompatíveis com qualquer emprego, directamente dependente do poder executivo, e bem assim com os cargos de director ou fiscal de qualquer sociedade anonyma que explore um privilegio ou concessão do estado. - Teve tambem segunda leitura, e foi approvada, uma proposta do mesmo sr. deputado, para que uma commissão de treze membros seja nomeada pela mesa a fim de dar o parecer com urgencia sobre o seu projecto de lei - O sr. presidente, com applauso da camara, nomeia a deputação que, alem da mesa, devia aguai dar ámanhã na gare de Santa Apolonia a volta de Sua Magestade a Rainha, que regressava do Porto, onde fôra para acudir pessoalmente ás desgraças provenientes do incendio do theatro Baquet, commissão que tambem iria ao paço da Ajuda agradecer a EI-Rei a boa vontade que manifestar a de ir ao Porto, e bem assim a iniciativa que se dignára tomar em promover soccorros paia as famílias que soffreram com aquelle desastre. A esta commissão poderiam associar-se todos os srs. deputados que o quizessem fazer. - O sr. Francisco Machado apresenta uma representação da associação artística vimaranense, pedindo o prolongamento do caminho de ferro de Guimarães até Chaves. Disse tambem que, se estivesse presente na ultima sessão, em que se votou um projecto que concedo uma pensão á srª condessa do Lavradio, teria pedido a palavra para dizer que havia famílias de outros funccionarios que estavam nas mesmas circumstancias, e entre ellas lembrava a sr. condessa de Touca Novas, cujo mando fizera toda a campanha da liberdade e fizera outros serviços. - O sr Avellar Machado refere-se ao estado de desorganisação em que se achava a administração da misericordia da villa do Mação, pedindo providencias; refere-se tambem á questão de fornecimentos de pannos para a policia fiscal. Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - O sr. Serpa Pinto apresenta, de Antonio Avelino de Castro Guedes, tenente coronel de caçadores n.º 8, e de mais officiaes reformados, vinte e quatro requerimentos, pedindo que seja approvado o projecto de lei do sr. Dantas Baracho, relativamente ás tarifas dos soldos. O mesmo sr. deputado estranha a não comparencia do sr. ministro da guerra na camara, quando se faziam accusações a que devia responder. O sr. ministro da, fazenda diz que o sr. ministro da guerra já respondera na camara dos dignos pares áquellas accusações, e que não deixaria de vir tambem responder a ellas na camara dos deputados - O sr. Vieira Lisboa mata pela remessa de esclarecimentos que pedira, com relação ao caminho de feiro de Cintra e Torres Vedras -Apresentam requerimentos de interesse particular os srs. Alpoim, Almeida e Brito e visconde da Torre. - O sr. Ruivo Godinho apresenta um requerimento, pedindo novos documentos com relação a negocios da policia civil de Castello Branco, e insta pela remessa de outros que pedira sobre o mesmo assumpto. - Justificam as suas faltas a algumas sessões os srs. Barbosa Colen, D. Jorge de Mello e visconde da Torre.
Na ordem do dia entrou em discussão o projecto n.º 23 (determinando que a fabricação dos tabacos no continente seja exclusivamente por couta do estado, expropriando se as fabricas existentes). - O sr. Julio de Vilhena propõe o adiamento da discussão até que ter minem as ferias parlamentares. - Sobre esta questão de adiamento estabeleceu-se uma pequena discussão, em que tomaram parte, alem do auctor, os Srs. ministro da fazenda, Eduardo de Abreu, Marçal Pacheco, Franco Castello Branco, Antonio Maria de Carvalho, Manuel d'Assumpção e José de Azevedo Castello Branco, sendo a final julgada discutida a materia a requerimento do sr. Heliodoro da Veiga. - O sr. Franco Castello Branco requer votação nominal sobre a proposta de adiamento, que é rejeitada, sendo tambem rejeitado o adiamento. O sr. Franco Castello Branco, como questão prévia, propõe que haja duas discussões, uma na generalidade, outra na especialidade, por bases. Esta proposta é assignada por mais cinco srs deputados do grupo da opposição. - O sr. Vicente Monteiro (relator) não se oppõe á proposta, mas requer que fique em discussão conjunctamente com o projecto, votando se, porém, em primeiro logar. - Sobre a questão prévia tomam parte, alem do proponente, os srs. Fuschini, Elvino de Brito e Consiglier Pedroso, - e fica a materia pendente. - O sr. presidente nomeia a commissão que ha de dar parecer sobre o projecto do sr. Silva Cordeiro sobre incompatibilidades parlamentares.- O sr. ministro da marinha mandou para a mesa uma proposta de lei, auctorisando o governo a manter, com algumas modificações, o contrato celebrado em á de junho de 1887 com Alfredo de Oliveira de Sousa Leal e Antonio de Sousa, Carvalho Lara, para o serviço de navegação entre a metropole e as províncias de Africa, e approvado por carta de lei de 20 de agosto do dito anno.
Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.
Presentes á chamada 56 srs. deputados. São os seguintes: - Serpa Pinto, Alfredo Brandão, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Sousa e Silva, Campos Valdez, Ribeiro Ferreira, Tavares Crespo, Antonio Maria de Carvalho, Mazziotti, Pereira Carrilho, Simões dos Reis, Eduardo José Coelho, Elizeu Serpa, Feliciano Teixeira, Almeida e Brito, Francisco de Barros, Francisco Mattoso, Fernandes Vaz, Francisco Machado, Francisco Ravasco, Gabriel Ramires, Guilherme de Abreu, Pires Villar, Cardoso Valente, Franco de Castello Branco, Vieira de Castro, Rodrigues dos Santos, Sousa Machado, Simões Ferreira, Jorge de Mello (D.), Avellar Machado, Ferreira Galvão, Barbosa Colen, Pereira do Matos, Ferreira de Almeida, Eça de Azevedo, Ruivo Godinho, Abreu Castello Branco, Figueiredo Mascarenhas, Ferreira Freire, Alpoim, José de Saldanha (D.), Santos Moreira, Julio Graça, Julio Pires, Vieira Lisboa, Poças Falcão, Bandeira Coelho, Manuel José Correia, Manuel José Vieira, Marianno de Carvalho, Martinho Tenreiro, Matheus de Azevedo, Miguel da Silveira, Miguel Dantas, Pedro Victor, Vicente Monteiro e Visconde da Torre.
Entraram durante a sessão os srs.: - Moraes Carvalho, Anselmo de Andrade, Alves da Fonseca, Baptista de Sousa, Antonio Candido, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Gomes Neto, Pereira Borges, Moraes Sarmento, Fontes Ganhado, Jalles, Barros e Sá, Hintze Ribeiro, Augusto Pimentel, Augusto Fuschini, Augusto, Ribeiro, Victor dos Santos, Lobo d'Avila, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Eduardo de Abreu, Elvino de Brito, Emygdio Julio Navarro, Madeira Pinto, Fernando Coutinho (D.), Castro Monteiro, Severino de Avellar, Guilhermino de Barros, Sant'Anna e Vasconcellos, Candido da Silva, Izidro dos Reis, Santiago Gouveia, Alfredo Ribeiro, Silva Cordeiro, Joaquim da Veiga, José Castello Branco, Dias Ferreira, Elias Garcia, Laranjo, Pereira dos Santos, Oliveira Matos, Simões Dias, Abreu e Sousa, Julio do Vilhena, Lopo Vaz, Mancellos Ferraz, Luiz José Dias, Manuel Espregueira, Manuel d'Assumpção, Brito Fernandes, Marçal Pacheco, Marianno Prezado, Pedro Monteiro, Pedro de Lencastre (D.), Estrella Braga, Visconde de Silves, Wenceslau de Lima e Consiglieri Pedroso.
Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello, Antonio Castello Branco, Oliveira Pacheco, Antonio Ennes, Guimarães Pedrosa, Santos Crespo, Miranda Montenegro, Barão de Combarjúa, Bernardo Machado, Conde de Fonte Bella, Goes Pinto, Estevão de Oliveira, Mattoso Santos, Freitas Branco, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Francisco de Medeiros, Lucena o Faro, Soares de Moura, Frederico Arouca, Sá Nogueira, Casal Ribeiro, Baima de Bastos, João Pina, Souto Rodrigues, Dias Gallaa, João Arroyo, Menezes Parreira, Teixeira de Vasconcellos, Correia Leal, Alves Matheus, Oliveira Valle, Joaquim Mana Leite, Oliveira Martins, Jorge 0'Neill, Amorim Novaes, Alves de Moura, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, José de Napoles, José Maria de Andrade, Barbosa de Magalhães, Rodrigues de Carvalho, José Maria dos Santos
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Pinto Mascarenhas, Santos Reis, Pinheiro Chagas, Sebastião Nobrega, Dantas Baracho e Visconde de Monsaraz.
Leu-se a acta.
O sr. Antonio Maria de Carvalho (sobre a acta): - Na sessão de sabbado, quando eu requeri que fosse prorogada a sessão até que votasse o projecto e o incidente levantado pelo sr. Arroyo, e a camara votou esse requerimento, levantou-se o sr. José de Azevedo Castello Branco e requereu que se suspendesse a sessão até estar presente o er. ministro da fazenda.
Creio que com respeito a este requerimento não ha duvida que foi apresentado á camara, e que sobre elle recaiu uma votação. (Apoiados.)
N'estas condições tinha caducado a questão ou o incidente levantado pelo illustre deputado o sr. Arroyo; pois, apesar d'isso, os oradores que se seguiram não fallaram senão sobre o incidente levantado pelo sr. Arroyo, e que deu logar a que um membro da maioria fizesse um requerimento, para que a camara fosse consultada sobre se achava a materia sufficientemente discutida; visto que a opposição nada tinha dito sobre o projecto.
Na acta da sessão e no extracto official não vem porem mencionado o requerimento do sr. Azevedo Castello Branco, o que altera a verdade do que se passou. (Apoiados.) N'estas condições peço que se rectifique a acta, inserindo-se em seguida ao meu requerimento o requerimento do sr. José de Azevedo Castello Branco, para que fosse adiada a discussão até estar presente o sr. ministro da fazenda.
O sr. Presidente (Francisco de Campos): - Eu supponho que não será necessario consultar a camara; rectifica-se a acta n'essa parte. (Apoiados)
Foi approvada a acta com a rectificação indicada pelo sr. Antonio Maria de Carvalho.
EXPEDIENTE
Segundas leituras
Projecto de lei
Artigo 1.° As funcções de ministro d'estado, par do reino e deputado são incompatíveis com qualquer emprego directamente dependente do poder executivo, e bem assim com os cargos de director ou fiscal de qualquer sociedade anonyma que explore um privilegio ou concessão do estado.
§ unico. As côrtes designarão annualmente as excepções a esta lei quanto ao numero de funccionarios subsidiados pelo estado, que nunca poderá exceder, em cada uma das duas camaras, um quarto do numero total dos seus membros.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = O deputado, J. A. da Silva Cordeiro.
Lido na mesa foi admittido e enviado á commissão especial quando nomeada.
Proposta
Proponho que uma commissão de treze membros seja nomeada pela mesa para dar com urgencia o seu parecer sobre este projecto. = O deputado, J. A. da Silva Cordeiro.
Foi approvada.
REPRESENTAÇÃO
Da associação artística vimaranense, pedindo a construcção da linha ferrea de Guimarães a Chaves.
Apresentada pelo sr. deputado F. J. Machado e enviada á commissão de obras publicas.
REQUERIMENTO DE INTERESSE PUBLICO
Instando novamente pelos documentos que tenho pedido em relação a negocios da policia civil de Castello Branco, requeiro tambem seja enviada a esta camara copia da syndicancia feita ultimamente a requerimento do commissario sobre alguns actos da sua administração. = Ruivo Godinho.
Mandou-se expedir.
REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR
Dos officiaes reformados Joaquim Guilherme da Costa, Francisco Antonio de Carvalho, Francisco de Paula da Cruz, Domingos Lopes Xisto, Francisco Carneiro de Brito, João Baptista da Silva Correia, Augusto Carlos de Oliveira, Apparicio Ferreira, Luiz Lobo, Antonio Leitão de Carvalho, Floriano Antonio Pessoa, Antonio Maria Campino, Joaquim Manuel Simões, José Maria Correia Monção, José Mana de Almeida Serrão, Antonio Correia de Mello, Manuel Augusto Miranda, Frederico da Cunha, Agostinho José Pereira, Joaquim Viegas do O. Thomás da Rocha Pinto, João Filippe do Carvalho, Caetano Joaquim de Carvalho Ramos e Carlos Duarte de Miranda, pedindo que seja approvado um projecto do lei apresentado pelo digno par do remo D. Luiz da Camara Leme, nu sessão de 9 de janeiro ultimo, tendente a melhorr os soldos dos officiaes reformados, anteriormento á lei de 22 de agosto do anno findo.
Apresentados pelo sr. deputado Serpa Pinto e enviados ás commissôes de fazenda e de guerra.
Dos officiaes reformados Francisco José Roma e Gaspar Ribeiro, no sentido dos antecedentes.
Apresentados pelo sr. deputado visconde da Torre e enviados ás commissôes de fazenda e de guerra.
Do official reformado Daniel Baptista de Barros, no mesmo sentido dos antecedentes.
Apresentado pelo sr. deputado Almeida e Brito e enviado ás commissões de fazenda e de guerra.
Do Antonio Avelino de Castro Guedes, tenente coronel de caçadores n.° 8, pedindo que lhe seja contada para a reforma a antiguidade de alferes de 29 de abril de 1851.
Apresentado pelo sr. deputado Serpa Pinto e enviado ás commissões de fazenda e de guerra.
De Dionysio Antonio Saraiva, intendente de pecuaria, ao serviço do ministerio das obras publicas, pedindo que os vencimentos de exercício dos intendentes e vice-intendentes de pecuaria sejam equiparados aos que recebem os agronomos chefes ou subalternos.
Apresentado pelo sr. deputado José Alpoim e enviado á commissão de obras publicas ouvida a de fazenda.
JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS
Participo a v. exa. e á camara, que tenho faltado a algumas sessões, por motivo de doença. = D. Jorge de Mello.
Declaro que por doença não compareci a diversas sessões d'este mez. = José Barbosa Collen, deputado pelo circulo de Figueira de Castello Rodrigo.
Declaro a v. exa. e á camara que por motivo justificado deixei de comparecer a algumas sessões da camara dos senhores deputados. = O deputado, Visconde da Torre.
Para a secretaria.
O sr. Primeiro Secretario: - A commissão de redacção não fez nenhuma alteração na redacção do projecto de lei n.° 10.
Foi approvada a ultima redacção dos projectos de lei n.ºs 11 e 12.
Foram enviados para a camara dos dignos pares.
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O sr. Presidente: - Antes de dar a palavra aos srs. deputados que estão inscriptos, tenho a communicar á camara que ámanhã deve chegar a Lisboa, regressando do Porto, Sua Magestade a Rainha, acompanhada de seu filho o senhor Infante D. Affonso.
Parece-me que interpreto o sentir da camara, propondo que seja nomeada uma grande deputação para ir esperar Sua Magestade na estação de Santa Apolonia e agradecer lhe a nova manifestação do seu acrisolado amor pelo povo portuguez e dos seus caridosos sentimentos em presença da recente catastrophe que enlutou a cidade do Porto, (Apoiados) e que todos nós deplorâmos. (Apoiados geraes.) Supponho que tambem será da vontade da camara que esta deputação vá igualmente agradecer a El-Rei (Apoiados) a parte que tomou n'esta manifestação da família real, sentindo ao mesmo tempo que o estado de saude de Sua Magestade não lhe tivesse permittido satisfazer o seu desejo de ir tambem áquella cidade. (Muitos apoiados.}
Em vista da manifestação da camara, parece me que deve ser considerada approvada esta proposta. (Apoiados)
A deputação será composta, alem da mesa, dos seguintes srs. deputados:
Serpa Pinto.
Carlos Lobo d'Avila, Pina.
Fernandes Vaz.
Barão de Combarjua.
Manuel d'Assumpção.
Ruivo Godinho.
Marçal Pacheco.
Eduardo José Coelho.
D. José de Saldanha.
Podendo aggregar-se-lhes todos os srs. deputados que assim o quizerem.
A deputação será avisada da hora certa em que chega Sua Magestade a Rainha, assim como do dia e hora em que poderá ser recebida por El-Rei. (S. exa. não reviu.)
O sr Pedro Victor: - Sr. presidente, eu pedi a palavra para declarar á camara e ao sr. ministro da fazenda que o illustre deputado e meu amigo o sr. Arrojo não póde hoje comparecer por motivo de doença. O sr. deputado Arroyo na sessão passada tinha combinado com o sr. ministro da fazenda estar hoje presente para discutir o fornecimento de pannos para a policia fiscal. Por isso me incumbiu de participar á camara e ao sr. ministro, para que não notassem a sua falta quando o motivo é por doença. O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Eu pedi a palavra para declarar ao illustre deputado que sinto extremamente que por incommodo de saude não possa comparecer hoje n'esta camara o sr. João Arroyo.
Eu compareci hoje n'esta camara, porque desde o momento em que se pediram explicações ao governo, a minha obrigação era vir aqui dal-as.
Sinto bastante que s. exa. não esteja presente, e muito mais quando a sua ausencia é motivada por doença.
O sr. Francisco Machado: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação da associação artística vimaranense, pedindo o prolongamento do caminho de ferro de Guimarães a Chaves.
Abstenho me de fazer considerações ácerca da justiça d'este pedido, porque são obvias as vantagens que d'elle advem para Guimarães e para toda a região que este caminho de ferro atravessa, e limito-me a pedir a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario ao governo.
Sr. presidente, aproveito a occasião de estar com a palavra para dizer a v. exa. que, tendo visto nos jornaes, que foi na sessão ultima approvado um projecto de lei que concede a pensão de 800$000, réis annuaes á sr.ª condessa do Lavradio, sem eu estar presente, devo dizer que, se estivesse na camara, eu teria pedido a palavra, não para o guerrear nem combater, porque entendo que o paiz se honra em não deixar na miseria as famílias dos que prestaram serviços relevantes ao paiz; mas para pedir que igual medida se tornasse extensiva á sr.ª condessa de Torres Novas, cujo marido prestou ao paiz serviços ainda mais importantes, derramando muitas vezes o seu sangue para implantar a liberdade que desfructâmos.
O sr. conde de Torres Novas foi um dos bravos que desembarcaram no Mindello, tomou parte no cerco do Porto, fez todas as campanhas da liberdade, continuando até ao fim da vida a prestar grandes e valiosos serviços ao paiz, á liberdade e ás instituições e foi um dos militares do nosso exercito que mais as honram e ao paiz.
Este bravo deixou á sua estremecida esposa um nome honrado e a miseria, porque a sr.ª condessa de Torres Novas só tem o monte pio de seu marido com que está pagando as dividas que elle deixou, para lhe honrar o nome e a memoria, luctando por isso com innumeras difficuldades.
Peço portanto á commissão de fazenda dê o seu parecer sobre o requerimento que lhe está affecto, da sr.ª condessa de Torres Novas, e que tem sido patrocinado por varios deputados de ambos os lados da camara.
O sr. Avellar Machado: - O assumpto para que pedi à palavra diz respeito á pasta do reino; mas como não vejo presente o ministro respectivo, espero que s. exa. o. sr. ministro da fazenda sé dignará communicar ao seu collega as breves considerações que vou fazer.
Sr. presidente, v. exa. de certo ha de estar lembrado, que eu me levantei n'esta casa, e por duas vezes já, a fim de chamar a attenção do sr. ministro do reino, para a situação anormal em que se encontrava a administração da misericordia de Mação, e para os abusos que se deram na eleição da mesa da referida misericordia.
Havendo-se levado recurso perante o tribunal administrativo districtal, este, no uso do seu direito e cumprindo com o seu dever, pronunciou um accordão mandando riscar alguns irmãos d'aquelle instituto de caridade, que haviam sido admittidos na vespera da eleição, sem as formalidades estatuídas no compromisso, unicamente com o fim de, por meios illegaes e violentos, a auctoridade administrativa fazer eleger indivíduos da sua facção para gerirem, ao seu arbítrio, os negocios da misericordia. Acabo de receber um telegramma de um importante cavalheiro d'aquella villa, e meu honrado amigo, em que se me dá noticia de que o administrador do concelho, longe de fazer cumprir, como era sua rigorosa obrigação, o accordão do tribunal administrativo, pretendeu pelo contrario fazer votar na segunda eleição os irmãos nomeados á laia de cabos de policia na vespera da primeira eleição.
Os verdadeiros irmãos reagiram dentro da legalidade, e o administrador do concelho, que viu que nem mesmo com os votos dos pseudo-irmãos mandados riscar pelo tribunal administrativo alcançava maioria, houve por bem declarar que não permittia que se fizesse a eleição no dia marcado pelo alvará do governador civil.
Apesar de tantas violencias, fez-se a eleição com os irmãos legalmente inscriptos, e juntou-se á acta da eleição a copia autentica do accordão do tribunal administrativo, que determinava que só votassem em a nova eleição os irmãos que como taes se achavam inscriptos até certa e determinada data, e que haviam sido admittidos em harmonia com as disposições do compromisso.
Peço ao sr. ministro da fazenda que pondere ao sr. ministro do reino, que de certo não auctorisa taes arbitrariedades, a urgente necessidade que ha de s. exa. tomar de prompto as devidas providencias, recommendando ao governador civil de Santarem, que aliás é um distincto cavalheiro, que muito prezo, que ordene ao administrador do
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concelho de Mação que cumpra e faça cumprir, como é dever de todo e qualquer cidadão, e muito mais de uma auctoridade, o accordão do respeitavel tribunal, em vez de dar força aos que se acham fóra da lei.
V. exa. sabe de certo que desobediencias d'esta ordem são puníveis pelos tribunaes criminaes, e estou certo que o honrado agente do ministerio publico saberá cumprir com o seu dever logo que tenha conhecimento de qualquer facto punível pelo codigo penal.
Espero que o sr. ministro do reino, a quem por esta fórma dou conhecimento d'estas graves irregularidades, ha de proceder convenientemente contra uma auctoridade que calca aos pés as prescripções das leis.
Eu levantei tambem aqui ha dias a questão de um concurso para o fornecimento de uniformes á policia fiscal.
O meu illustre amigo e collega o sr. Arroyo mostrou tambem, por essa occasião, desejos de conversar a este respeito com o sr. ministro da fazenda.
S. exa., por motivo de doença, que deveras lastimo, não está presente; mas parece-me que não melindro aquelle meu illustre collega e honrado amigo, fazendo algumas perguntas ao sr. ministro da fazenda ácerca d'este importante assumpto, perguntas ás quaes s. exa. responderá, se estiver habilitado para isso.
Já no outro dia eu disse que o concurso para tal fornecimento havia sido feito em condições tão inacceitaveis, que mais parecia querer fazer-se um simulacro de concurso do que um concurso a valer.
Vou dar a rasão d'esta minha affirmativa.
O annuncio para a arrematação foi publicado no Diario do governo de à do corrente, mas não se marcava n'elle o dia em que se deveria realisar a mesma arrematação.
Veiu depois novo annuncio no Diario de 6, marcando dia para a arrematação, que se realisou, segundo estou informado, no dia 16.
Por consequencia, quer n'um quer n'outro caso, não mediou entre a publicação do annuncio para a abertura de praça e a arrematação o praso marcado no artigo 75.° do regulamento de contabilidade publica de 31 de agosto de 1881.
Isto, para a questão de que se trata, é um ponto secundario, ainda que para a questão de legalidade tem bastante importancia. Limito-me, pois, a accusar esta irregularidade.
Disse eu tambem á camara, que as condições, e é esta a parte essencial, que acompanhavam aquelle annuncio, eram taes, que mais parecia que se tinha em vista afugentar concorrentes, e proteger uma certa fabrica ou um intermediario d'essa fabrica, do que fazer com que o concurso fosse uma verdadeira praça publica.
Citei a condição 5.ª, que diz o seguinte:
«Os artigos fornecidos serão iguaes aos padrões typos, sendo os lanifícios da mesma qualidade e proveniencia fabril do padrão patente.»
Quer dizer, no uso do seu direito, a commissão fiscal que presidiu ao concurso escolheu um typo qualquer, que não sei nem quero saber qual seja.
Esse typo foi escolhido particularmente, pois que se não fez concurso entre as fabricas para essa escolha, e é differente do que foi estabelecido legalmente no decreto de 17 de novembro do anno proximo passado.
Mas isso é tambem uma questão para mim secundaria. O mais importante é que a commissão fiscal escolheu, bem ou mal, amostras de fazendas n'uma certa e determinada fabrica, e que considerou essas amostras como typos ou padrões, e sobre esses padrões annunciou concurso publico. Se a commissão se tivesse limitado a favorecer a fabrica a que se dirigiu, ou o intermediario d'essa fabrica, escolhendo os typos d'entre os pannos que esta produzia, sem ouvir as outras fabricas, não seria um procedi mento muito correcto; mas, pela minha parte, callar-me-ia. A commissão, porém, foi mais longe. Não se limitou a exigir que todos os concorrentes se compromettessem a fornecer fazendas do padrão e qualidade typo; tornou ainda obrigatorio que as fazendas a fornecer fossem da mesma proveniencia fabril do padrão escolhido particularmente n'uma certa fabrica. Nem mesmo se disse se a fabrica protegida era portugueza; póde ser que seja estrangeira; mas, quer seja nacional, quer estrangeira, a camara comprehende que sem duvida ha muitíssimas fabricas, que podem produzir fazendas dos mesmos typos e qualidades das que a commissão escolheu logo que lh'as encommendem e paguem pelo preço da fabricação, augmentada de um pequeno beneficio, que constitua o lucro d'essa empreza industrial. Estas fabricas, muitas ou poucas, nacionaes ou estrangeiras, seriam outros tantos concorrentes á arrematação com grande vantagem para o estado.
Longe de mim o querer levantar a menor suspeita sobre o caracter dos membros da commissão, e muito especialmente do honrado commissario da policia fiscal, cavalheiro mui digno e honesto, que tem prestado relevantes serviços ao paiz. Sobre estes factos só exijo a responsabilidade do sr. ministro da fazenda, que é quem de direito a tem perante a camara. (Apoiados.)
Tambem não desejo levantar a menor suspeita ácerca do caracter do cavalheiro ou dos cavalheiros que elaboraram as condições do concurso.
Trato esta questão sob um ponto de vista mais elevado, e não quero saber para nada dos interesses de qualquer fornecedor; desejo apenas salvaguardar os interesses e a dignidade do estado, encarando o assumpto pela sua feição theorica.
O concurso abriu-se parecendo, na apparencia, que se respeitavam os preceitos do regulamento de contabilidade publica, mas, na verdade, as condições para esse concurso foram elaboradas de tal modo, que para os simples profanos, como eu, parece que se tem em vista apenas evitar que fosse a praça mais de um concorrente. E esse concorrente só poderia sor a fabrica onde se escolheram os typos, ou que estivesse combinado e harmonisado com a fabrica.
Quer dizer, longe de se procurar obter uma praça ampla, estabeleceram-se condições que produziam exactamente o effeito contrario.
Tambem chamo a attenção para a seguinte condição:
«10ª Quando se reconhecer que a fazenda empregada em qualquer manufactura não é da proveniencia e qualidade igual á do padrão, o fornecedor, não só perderá o artigo manufacturado, como pagará uma multa igual ao dobro do seu valor.»
Eu explico á camara esta condição. Supponhamos que o fornecedor apresenta fazenda perfeitamente igual ao padrão, ou mesmo até de superior qualidade; mas, só pelo facto de a não ter comprado n'uma certa e determinada fabrica (e não sei qual seja essa fabrica, porque as condições o não dizem), não só perde a fazenda, mas paga ainda de multa o dobro do seu valor!
Isto é realmente extraordinario! (Apoiados.)
Mas não param aqui as penalidades a impor ao fornecedor que tiver a ousadia de apresentar fazenda perfeitamente igual ou superior ao typo estabelecido.
Diz a condição 14.ª:
«A falta de cumprimento de qualquer das clausulas impostas n'este contrato, importa a perda do deposito.»
Trocado isto em miudos, quer dizer que, pelas condições 5.ª, 10.ª e 14.ª, o indivíduo que ousar apresentar, para o fornecimento da policia fiscal, fazendas iguaes ou mesmo de qualidade superior ao padrão estabelecido, mas que não tenham sido compradas n'uma certa e determinada fabrica, não só perde a fazenda, mas tambem paga do multa o dobro do seu valor, e ainda perde o deposito de garantia, que é de 450$000 réis! (Apoiados.)
Faltou só mandal-o pôr fóra do reino como inimigo do estado e da tal fabrica. (Apoiados.)
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Por consequencia e resumindo, eu vejo n'este concurso as seguintes irregularidades:
1.º Não ter decorrido entre o dia da publicação dos annuncios para o concurso, e a aquelle em que elle se realisou, o praso minimo estabelecido no artigo 75.° do regulamento de contabilidade publica.
2.° Ser a condição 5.ª do concurso feita de uma maneira tal, que constitue um verdadeiro monopolio a favor de uma fabrica, de um intermediario d'essa fabrica, ou de um indivíduo combinado com a mesma fabrica.
3.° Terem as restantes condições sido elaboradas de maneira tal, que vão aggravar ainda as exigencias já de si extraordinarias e inadmissíveis formuladas na condição 5.ª
É sobre estes pontos que eu chamo a attenção do sr. ministro da fazenda, a fim de que se não repitam concursos de fornecimentos em taes condições; porque realmente não me parece que seja esta a maneira mais conveniente de impedir que no publico se levantem suspeitas sobre o caracter dos cavalheiros que entraram n'este negocio, e que sem duvida não tiveram em mim proteger esta ou aquella fabrica, este ou aquelle intermediario. Mas a verdade é que o que está escripto está escripto, e que os factos são o que são, e quem não conhece, como eu, conheço, esses cavalheiros poderá formar taes suspeitas.
É certo que, em presença das condições do concurso ninguem dirá que se quiz abrir praça ampla, que podesse ser bastante concorrida; e é exactamente em praças abertas, n'estas condições, que o estado tem mais assegurada a possibilidade de se fornecer melhor e mais barato. (Apoiados.)
É isto tambem o que determina o bom senso e a lei. (Apoiados.)
Não me digam que se queria afastar, com taes condições, este ou aquelle fornecedor.
Este argumento nada vale, ou póde valer muito.
V. exa. sabe perfeitamente que se á commissão fiscal não conviesse nenhuma das propostas apresentadas, e por qualquer rasão, não as acceitava e n'esse caso o regulamento de contabilidade publica permittia-lhe que se fornecesse no mercado, e então podia comprar a essa fabrica, ou a qualquer outra, e escusava de se illudir o publico com um simulacro de concurso.
Por outro lado, se um ou outro arrematante que não costuma cumprir os seus contratos com o estado, concorresse á arrematação de fazendas para os uniformes da policia fiscal, o conselho poderia ter a franqueza e a coragem de lavrar na acta a declaração que, por estas ou por aquellas rasões, entendia não convir aos interesses da fazenda que ao arrematante F... fosse adjudicado o fornecimento. Mas emquanto se não provar que este ou aquelle negociante é indigno de se contratar com elle, parece-me que as boas praxes e os interesses do estado mandam que se façam as arrematações com o caracter de seriedade e de generosidade, com que as fez o sr. ministro da fazenda para a guarda fiscal, o sr. ministro da guerra para os fornecimentos do exercito, o sr. ministro da marinha para os da armada, e que o sr. ministro do reino promettia ha pouco que ia fazer para os das guardas municipaes.
Pedia, pois, ao sr. ministro da fazenda que me apresentasse as rasões d'esta diversidade de procedimento. Se essas rasões me satisfizerem, muitíssimo bem; se me não satisfizerem, peço a v. exa. que tenha a bondade de consultar a camara sobre se permitte que eu faça ainda algumas considerações em resposta ao sr. ministro da fazenda, e seguidamente a s. exa.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Avellar Machado: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte. da eu use da palavra para dizer algumas palavras, poucas, em resposta ao sr. ministro da fazenda.
Consultada a camara resolveu affirmativamente.
O sr. Avellar Machado - Não era preciso que o sr. ministro da fazenda declarasse que o sr. commandante da guarda fiscal e o sr. chefe de policia fiscal mereciam a confiança a todos os homens de bem, porque a primeira declaração que eu fiz ao levantar esta questão foi que poucos funccionarios conhecia tão zelosos e tão honestos como s. ex.ªs
Por consequencia não era necessario que o sr. ministro levantasse bem alto os nomes d'estes distinctos funccionarios, por que a consciencia publica lhes faz essa justiça, e eu mesmo, antes de entrar na discussão d'este assumpto, declarei que tinha por esses funccionarios toda a consideração que elles na verdade merecem. (Apoiados.)
Disse o sr. ministro da fazenda que não desejava n'este momento travar discussão commigo; só assim se explica que s. exa. passasse tão de leve sobre as minhas principaes observações. (Apoiados.)
Não tenho, pois, que rebater os argumentos de s. exa., o vou apenas rectificar factos.
Para a escolha de typos para fardamentos do exercito procedeu-se da seguinte maneira: foram convidadas as fabricas do paiz a apresentarem amostras dos seus productos, que nais convenientes se lhes afigurassem para vestuario do exercito.
Uma commissão examinou essas amostras e escolheu de entre ellas as que pela sua cor, contextura, etc., lhe pareceram mais adequadas ao fim a que eram destinadas. Mais tarde, e depois de feita a escolha, foram mandadas analysar no laboratorio as amostras escolhidas para typos, pelo modo que indiquei, ficando registado o resultado da analyse para o fim de decidir futuras contestações que porventura se levantassem.
A este concurso foram algumas fabricas e não todas, porque se tratou apenas de um convite e não de um concurso.
Os padrões assim adoptados serviram depois de base para um concurso publico entre todas as fabricas nacionaes.
Isto comprehende-se e é logico, racional, não levanta suspeitas de favoritismo, o acautela os interesses da fazenda.
Eu não combato a escolha de um padrão, mas entendo que o que é indispensavel é que essa escolha se faça em concurso aberto entre todas as fabricas do paiz. (Apoiados.)
(Interrupção do sr. Ravasco.)
Eu estou a rectificar factos, e não prescindo do meu direito de o fazer.
Concordo perfeitamente em aguardar a presença do meu illustre amigo o sr. Arroyo para entrar largamente n'esta discussão; mas peço, ao sr. ministro do fazenda para mo deixar ver os documentos em que fallou, e bem assim aos meus collegas que desejam tomar parte no debate.
Repito, que não posso acceitar a escolha de padrão feita por favor ou capricho n'uma fabrica, e entendo que se devia ter aberto concurso publico para esse fim entre todas as fabricas portuguezas que quizessem enviar amostras. Escolhidos os padrões typos, dever-se-a abrir concurso para o fornecimento, entre essas fabricas, e só assim se poderia considerar correcto, e não eivado de favoritismo, o procedimento do governo.
Emquanto ás outras condições do concurso disse s. exa. que as achava ainda pouco apertadas!
Se estão pouco apertadas a culpa é de s. ex.ª; poderia lel-as apertado mais. Creio, porém, que ellas já estão bastante apertadas para que não haja receio de que se não alcance o fim que parece se teve em vista ao formulal-as.
Eu pão desejo discutir agora o assumpto, o que desejo
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é registar estes factos e a seu tempo lhe tirarei as consequencias.
Peço a s. exa. que, logo que lhe seja possível, ponha á minha disposição os documentos a que se referiu para que quando chegar o dia de se tratar d'esta questão possamos todos estar habilitados com os dados que s. exa. possue.
Concordando pois com os desejos do sr. ministro da fazenda, nada mais direi n'este momento.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Os documentos que s. exa. deseja estão no ministerio da fazenda para quando s. ex.ªs quizessem examinal-os; mas se os illustres deputados não quizessem lá ir, envial-os-hei para a camara.
O sr. Serpa Pinto: - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão guando s. exa. o restituir.}
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Eu communicarei ao sr. ministro da guerra as observações do illustre deputado, e s. exa. não deixará de vir responder.
Devo, porém, dizer que o assumpto já foi tratado na camara dos pares e o sr. visconde de S. Januario respondeu como entendeu conveniente; mas quem conhece o sr. visconde de S. Januario sabe que elle não recua diante de responsabilidade de nenhuma especie, e que não tinha duvida em vir responder á camara dos senhores deputados. (Apoiados.}
O que s. exa. neto podia, era adivinhar que se lhe fariam hoje perguntas a esse respeito.
Quando não fosse bem conhecido o caracter de s. exa., o facto de ter respondido na outra camara bastava para mostrar que s. exa. não teria a menor hesitação em vir responder a quaesquer perguntas que n'esta camara se lhe quizessem fazer.
Portanto, não é fundada a estranheza por não estar presente o sr. visconde de S. Januario, porque s. exa. não sabia que se lhe queriam dirigir quaesquer perguntas; mas eu prevenirei o meu collega das observações do sr. deputado e estou certo que elle não deixará de vir muito breve responder ao que se lhe perguntar.
O sr. Serpa Pinto: - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.}
O sr. Vieira Lisboa: - Desejo saber se já vieram as informações e documentos que pedi na sessão de 28 de fevereiro ultimo, relativamente ao caminho de ferro de Lisboa a Cintra e Torres Vedras.
O sr. Presidente: - Sou informado que ainda não chegaram.
O Orador: - N'esse caso peço que se inste pela remessa de taes documentos, e informações, porque careço d'elles para, ácerca d'aquelle caminho, fazer algumas considerações, porventura pouco agradaveis, como pouco agradaveis são as impressões que tenho a respeito do mesmo caminho.
Como, porém, desejo sempre e sobretudo ser consciencioso e justo em quaesquer apreciações, aguardarei os esclarecimentos pedidos.
E visto que estou com a palavra, que tão raras vezes peço e ainda mais raras vezes me cabe, na propria ausencia de s. exa. o sr. ministro das obras publicas, que sinto não ver presente, ouso chamar a sua attenção para um assumpto que igualmente respeita á viação publica.
Sr. presidente, ha muitos annos que se tem reconhecido a grande conveniencia e até impreterivel necessidade da viação tanto accelerada como ordinaria; e tão profundo é o convencimento de todos a tal respeito, que sem a menor repugnancia se sujeitam aos maiores sacrifícios, indispensaveis para taes melhoramentos.
Ainda no anno passado se promulgou uma lei tendente a apressar o desenvolvimento e conclusão da rede das estradas reaes e districtaes.
Mas se tal serviço é de grande utilidade, se é preciso construir ainda muitas estradas, maior é de certo a conveniencia, muito mais indeclinavel, é a necessidade de conservar as estradas já construídas, não só para se não perder as grandes sommas com ellas despendidas, como para não prejudicar valiosos interesses á sombra d'ellas creados.
Ora, n'este aliás importantisso servido da conservação das estradas ordinarias, tanto reaes como districtaes, todas agora exclusivamente a cargo do estado, não tem evidentemente havido o zêlo e cuidado que merecem e hão mister.
São geraes e repetidas as queixas sobre o seu estado lastimoso
De algumas tenho noticia e até conheço estradas que causa vergonha vel-as e cujo transito é perigoso.
Alem do muitas, lembro-me no districto de Lisboa das da Alhandra a Torres Vedras, do Carregado á Merceana e do Carriche a Rio Maior.
É tão deploravel o seu estado, no seu proprio leito ha taes fossos e barrancos que os vehiculos de carga e passageiros tombam facil o frequentemente.
Uma tal situação, quasi inacreditavel mas verdadeira, não póde, porém, airosamente continuar; e ouso por isso esperar que o nobre ministro das obras publicas, em quem tenho a maxima confiança, dará as providencias immediatas, que as circumstancias tão imperiosamente reclamam.
O sr. Almeida e Brito: - Mando para a mesa o requerimento de Daniel Baptista de Barros, capitão de mar e guerra reformado, pedindo a approvação do projecto de lei apresentado pelo sr. deputado Dantas Baracho em sessão de 20 do corrente.
ORDEM DO DIA
Discussão do projecto de lei n.° 23, determinando que a fabricação dos tabacos no continente seja exclusivamente por conta do estado, expropriando-se as fabricas existentes.
Leu-se na mesa o projecto n.º 23.
É o seguinte:
PROJECTO DE LEI N.° 23
Senhores. - A commissão de fazenda, chamada de novo a consultar a respeito da importante questão do tabaco, vae dar parecer sobre a proposta n.° 9-C.
Reconheceu o governo ser impossível a continuação da relativa liberdade da fabricação do tabaco, que as côrtes no anno passado procuraram pelo systema do gremio, conciliar com os legítimos interesses e indispensavel necessidade da fazenda nacional. Por isso, para evitar as difficuldades da execução da lei de 18 de agosto ultimo (1887) e attender os resultados do inquerito a que se procedeu nos termos do decreto de 23 de setembro do mesmo anno, resolveu propor-vos modificações áquella lei, harmonisando as conveniencias geraes do thesouro publico com as particulares das respectivas classes trabalhadoras, a que a economia social não póde igualmente ser estranha.
Consiste a principal modificação proposta pelo governo á lei vigente, não só em desistir da tentativa do gremio, por se reconhecer a impossibilidade da sua execução, mas tambem na passagem immediata para o estado do exclusivo da fabricação dos tabacos.
As restantes disposições da proposta são consequencias e complemento d'aquelles fundamentos, que antes de tudo o mais cumpro apreciar.
Não se deteve muito a commissão de fazenda com o exame da questão política e administrativa sobre o systema a que estas sciencias reconhecem preferencia, não só por não ser da especialidade das suas funcções, mas principalmente porque considerou assente e teve como logico corollario da sabia deliberação d'esta camara e da dos dignos pares, ainda na sessão passada, que este assumpto tinha
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na presente conjunctura de ser resolvido pelo seu lado fiscal.
O mesmo succedeu já em 1864, como bem recordado foi na discussão do anno passado, e assim é tambem considerada a questão pelas auctoridades nas sciencias economicas e financeiras, entre as quaes a citação do sr. P. Leroy Beaulien não deve ser esquecida.
Que nada lhe custa approvar o monopolio da fabricação do tabaco, mantendo-o nas mãos do estado, diz o sabio professor do collegio de França, e acrescenta, com rasão; que seria necessario que as finanças de qualquer paiz fossem muito prosperas, para se renunciar ao melhor meio do lançamento depura imposto tão inoffensivo, tão moral, tão productivo e de facil cobrança.
Se a questão fosse tirada d'este seu campo pratico para o da theoria, em que ha tão pouco de firme o certo no periodo como que de transição, hesitação, ou como queira dizer-se, por que as sciencias sociaes estão passando, não adiantaríamos talvez muito, e seguramente não facilitavamos a resolução do principal problema, o do nosso equilíbrio orçamental. Se não; haja vista ao que ainda ha poucos annos se passou a este respeito no Reickstag.
Deixando, pois, de parte e adiada para melhor opportunidade a questão do princípios, vejamos se o gremio é impossível, e se ao estado interessa a immediata transição para a regie.
Diz que sim o governo e com respostas affirmativas consulta tambem a vossa commissão.
O gremio é effectivamente impossível já; a administração pelo estado assegura melhor que outra a receita publica.
Demonstremos:
O gremio foi logo recusado por emprezas que empregavam 6:094 operarios e produziam cerca de 2.000:000 kilogrammas; nas outras apenas trabalhavam 584 operarios que produziam uns 200:000 kilogrammas.
Em consequencia, tomou o governo posse d'aquellas fabricas para, feita a avaliação d'ellas, se procurar em praça quem por esse ou maior preço as quizesse. Está, pois, já o governo na administração de uma parte tão consideravel das forças productoras do tabaco e em concorrencia com forças pequenas em si, mas vantajosamente armadas para a lucta n'este período transitorio, em que ellas pouco arriscam e muito podem ganhar.
Assim, toda a demora é prejudicial aos interesses geraes, más nem a avaliação póde ultimar se sem tempo, o tempo que tende a alongar-se pelas difficuldades que a natureza das cousas, e quiçá as conveniencias particulares levantam, nem terminada ella se póde garantir que então o concurso para arrematação d'essa fabrica não fique deserto, nem que mais tarde não succeda o mesmo a outra arrematação, a do exclusivo, que lhe seria consequencia. Urge, portanto, tomar providencia que permitia pôr termo a este período provisorio.
Só a immediata expropriação das fabricas pelo estado e a administração por elle, pôde resolver a questão. É claro que negociação com terceiros, só depois de findas as avaliações se poderiam começar, e alem d'este inconveniente da demora havia o de ser incerto a esse tempo, como dissemos, se poderia realisar-se contrato em boas condições:
A preferencia dada á regio fica assim justificada e só há a verificar se tem inconvenientes que obriguem a rejeital-la.
Seguramente resolvereis que os não ha.
A superioridade mesmo d'esta fórma sobre a de arrematação do monopolio por terceiros, foi sempre reconhecida entre nós.
Basta para o verificar abrir os registos parlamentares. E bom é recorrer a elles para procurar saber os inconvenientes que se lhe apontam e podermos pesar o seu valor. Dois elles; a falta de interesse individual, que sirva de incentivo à boa producção, e a falta de concorrencia para a estimular. Nenhuma das objecções colhe, porque a concorrencia existirá com tabacos de manufactura estrangeira e o interesse resulta da participação nos lucros.
Nem outros inconvenientes julga a vossa commissão que possam advir da administração pelo estado, no que a fortificam os exemplos da França, Austro Hungria, Italia e por tanto tempo da vizinha Hespanha.
Não esquecemos que esta nação deixou ultimamente o systema da regie para adoptar o da arrematação. A esse exemplo, porém, não só falta tempo de experiencia a provar-lhe as vantagens, não faltando já factos a contestar as mas é destinado pelo de Italia, onde o estado tendo administrado até 1868 a industria do tabaco, passou tambem o exclusivo para terceiro, mediante o pagamento de venda certa e ganho nos lucros; comtudo voltou já á antiga fórma. A ultima arrematação para o quinquennio de 1879-1883 foi de 94.600:000 liras; as contas da administração de 1884-1885, que temos presentes, accusam um saldo liquido de 122.707:300 liras.
O governo, na proposta sobre que estamos consultando, apresenta differentes calculos da receita do novo regimen dos tabacos, que nos permittem esperar de 4.434:000$000 réis a 4.810:000$000 réis, sem augmento consideravel de preços, nem contar com o natural augmento do consumo. E note-se que nem aquelle seria violento, nem este póde deixar de ser esperado.
Facil é o convencimento de quem queira confrontar o nosso consumo e a quota tributaria que elle leva ao nosso thesouro com o que um e outro são, calculados por habitante, em outras nações da Europa.
Utilisando os trabalhos do importante instituto internacional de estatística, podemos de prompto justificar esta asserção pelo seguinte mappa:
Consumo Quota
Kilogr tributaria
Réis
Portugal 0,46 $720
Russia 0,56 $085
Italia 0,61 1$100
Inglaterra 0,64 $870
Hespanha 0,77 $130
Suecia 0,80 1$416
França 0,83 $270
Noruega 1,04 $095
Finlandia 1,24 $0955
Allemanha 1,36 $135
Belgica 1,43 $102
Dinamarca 1,68 $106
Austro-Hungria 1,71 $954
Hollanda 3,14 $030
Optando, pois, pela administração dos tabacos pelo estado, pelos motivos expostos, alem de outros que a vossa competencia e illustração hão de supprir, acceitou a vossa commissão a proposta do governo, fazendo-lhe apenas, de accordo com elle, as alterações que encontrareis no projecto que vamos ter a honra de submetter ao vosso esclarecido exame.
Como vereis, consistem essas alterações umas em simples aperfeiçoamentos de fórma e outras em complemento de doutrina por modo a ficar a lei equitativa o de facil e economica execução.
Foi para estes fins, que separámos as disposições permanentes do projecto das que são meramente transitorias e aclarámos a redacção das que nos pareceu carecerem de explicação; limitámos as auctorisações concedidas ao governo e regulámos o modo e condições de as exercer; reduzimos o numero de vogaes do conselho fiscal; e tirámos lição do inquerito. francez e dos resultados praticos colhidos por outras administrações para additar uma providencia quanto á compra de tabacos estrangeiros em rama, providenciando,
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ou ajudando mais um passo para a cultura de tabaco nacional.
Assim se explica, pois, e motiva o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° A fabricação dos tabacos no continente do reino será feita exclusivamente por conta do estado, sendo para isso expropriadas por utilidade publica as fabricas existentes no continente do reino, tudo nos termos e condições das bases annexas á presente lei e que fazem parte integrante d'ella.
§ 1.° O governo poderá levantar as quantias, até ao limite do 7.200:000$000 réis, de que carecer para as indemnisações, capital fixo e circulante, liquidação de contas de transição e mais pagamentos legaes, a que for obrigado, emittindo para isso obrigações especiaes amortisaveis no praso maximo de quarenta annos com encargo não excedente a 432:000$000 réis annuaes para juro e amortisação.
§ 2.° A verba annual para juro e amortisação das obrigações emittidas nos termos do paragrapho antecedente é encargo da administração do fabrico dos tabacos.
§ 3.° O governo dará conta ás côrtes na sua primeira reunião do uso que fizer d'esta auctorisação.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Bases
1.ª
O governo, logo que a presente lei for publicada, decretará a expropriação, por utilidade publica, das fabricas do tabacos existentes no continente do reino.
§ 1.° A propriedade das referidas fabricas passará logo para o governo, que tomará posse administrativamente das que não estiverem já na sua administração, depositando na caixa geral de depositos como garantia do preço das expropriações, títulos de divida publica consolidada, equivalentes, pelo preço do mercado, ao valor do activo liquido de cada empreza, segundo a respectiva escrituração, e mais um terço d'esse valor.
§ 2.° O valor definitivo da indemnisação devida pela expropriação da fabrica ou fabricas de cada sociedade ou empreza, será fixado por arbitros nomeados em numero igual pelo governo e pela sociedade ou empreza, e consistirá no valor effectivo dos bens e direitos transmttidos para o estado, acrescido dos lucros cessantes, a que a expropriada tenha direito.
§ 3.° O arbitro de desempato, não concordando as partes na escolha, será eleito pelo supremo tribunal de justiça em sessão plena.
§ 4.° Os arbitros decidirão ex aequo et bono sem recurso.
§ 5.° Sendo a empreza exproprianda sociedade anonyma, poderá esta optar pela venda ao estado das suas acções pela ultima cotação de operações effectuadas antes de 31 de dezembro de 1886, respondendo para com o adquirente pela effectividade e não deterioração dos valores dos seus inventarios e balanço na mesma data e transferindo-lhe o resultado das operações posteriores, recebendo em troca o juro commercial da mora d'aquelle capital.
§ 6.° Os lucros cessantes devidos ás emprezas, a que não for applicada a fórma de indemnisação prescripta no paragrapho anterior, ou que por ella não optarem, serão fixados na mesma proporção para com o valor do respectivo activo liquido, que corresponda ás necessidades da producção regular de cada fabrica.
2.a
A administração do fabrico de tabacos por conta do estado será confiada a um conselho de administração composto de cinco membros, sob a inspecção de um conselho fiscal composto de tres membros, nomeados ou eleitos para servirem por tres annos.
§ 1.° Um membro do conselho de administração será eleito pela camara dos dignos pares do reino, outro pela camara dos senhores deputados, e tres, dos quaes um será o presidente, nomeados pelo governo.
§ 2.° Para o conselho fiscal serão eleitos um vogal pela camara dos dignos pares, que será o presidente, outro pela camara dos senhores deputados, que será o vice-presidente, e o terceiro nomeado pelo governo.
§ 3.° As camaras legislativas elegerão para o conselho de administração e para o conselho fiscal tantos vogaes supplentes, quantos forem os effectivos que lhes pertença eleger.
§ 4.° Os deveres e attribuições dos membros dos dois conselhos regulam-se pelas prescripções do contrato de mandato, podendo este ser renovado no fim do praso e a todo o tempo revogado.
§ 5.° O presidente do conselho de administração, que terá a designação de administrador geral dos tabacos, vencerá o ordenado fixo de 900$000 réis; os vogaes do conselho o de 600$000 réis annuaes. Os do conselho fiscal receberão em senhas de presença 18$000 réis por sessão até o maximo de vinte e quatro sessões em cada anno.
§ 6.° Os vogaes supplentes do conselho de administração e do conselho fiscal perceberão, emquanto servirem, os vencimentos fixos e as percentagens que pertenceriam aos vogaes effectivos substituídos.
§ 7.° O exercício dos legares de membros do conselho de administração é incompatível com o exercício de qualquer outro emprego publico. Se algum empregado publico for nomeado ou eleito e acceitar, perderá o logar.
§ 8.º O conselho de administração e o conselho fiscal apresentarão no fim de cada anno relatorios minuciosos, que pelo governo serão submettidos á apreciação das côrtes.
§ 9.° As contas do conselho de administração serão julgadas pelo tribunal de contas, como as de quaesquer outros gerentes ou exactores de dinheiros publicos.
3.a
A fabricação dos tabacos será feita em duas fabricas em Lisboa e duas no Porto, não podendo este numero ser reduzido senão quando a diminuição não prejudique a collocação dos operarios em boas condições hygienicas.
§ 1.° As condições de serviço interno e do trabalho dos operarios, penas disciplinares e motivos do suspensão e despedida, serão determinados em regulamento proposto pelo conselho de administração, tendo ouvido os delegados dos operarios, e approvado pelo governo.
§ 2.° Será estabelecida uma caixa de reformas para os operarios impossibilitados, dotando-a annualmente o governo com 20:000$000 réis, se maior quantia não for determinada pelas côrtes.
A reforma de cada operario não será inferior a 1$500 réis semanaes.
§ 3.º O dia de trabalho será fixado em oito horas, podendo só em casos excepcionaes reduzir-se a seis horas e pagando-se qualquer excesso sobre oito horas, á rasão de 10 por conto de dia e 20 por cento de noite.
§ 4.° As despezas do escriptorio; incluindo ordenados de empregados, não poderão exceder a 72:000$000 réis em cada anno, sendo as nomeações, promoções, demissões e castigos dos empregados attribuição exclusiva do conselho de administração.
§ 5.° Nos primeiros seis mezes do seu exercício, o conselho de administração formulará e fará publicar no Diario do governo o quadro definitivo do pessoal de empregados de escriptorio.
§ 6.° O estado interessará os conselhos de administração e fiscal e o pessoal operario e não operario, nos lucros da fabricação do tabaco na percentagem de 5 por cento ao
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excesso d'esses lucros annuaes sobre 3.500:000$000 réis, dos quaes pertencerão 1/5 ao conselho de admininistração, 2/50 ao conselho fiscal, 4/10 ao pessoal não operario e 32/50 ao pessoal operario; e serão distribuídos a todos proporcionalmente aos respectivos ordenados e vencimentos, podendo uma parte do quinhão dos operarios ser destinada á dotação de uma caixa de socorros.
Continuam era vigor na região do Douro as disposições da carta de lei de 12 de março de 1886 e 28 de abril de 1886, sendo, porém, obrigada a administração do estado a consumir até 10 por cento de tabaco produzido n'aquella região, quando o haja. O bonus concedido por aquellas leis será mantido como differença de preço.
§ 1.° A administração do estado consumirá tambem até 6 por cento de tabaco produzido nas ilhas e 5 por cento das províncias ultramarinas, quando lhe seja offerecido.
§ 2 ° Se a região do Douro não perfizer o fornecimento do 10 por cento de tabaco preciso para a fabricação, o governo poderá auctorisar o cultivo de tabaco em outras regiões onde os vinhedos tenham sido destruídos pela phylloxera.
§ 3.° A parte das percentagens fixadas por este artigo e seu § l °, que não for preenchida pelo tabaco da respectiva localidade, completar-se ha pelo tabaco nacional das outras localidades onde for permittido pelo governo no uso da auctorisação conferida no paragrapho antecedente.
§ 4.° Na falta de accordo dos vendedores de tabacos de producção nacional do continente ácerca dos preços de venda, serão estes fixados por arbitragem, sendo um dos arbitros nomeado pela administração do estado, outro pelos vendedores, e o terceiro, para desempate, pelo juiz presidente do tribunal do commercio de Lisboa.
5.ª
As compras do tabaco estrangeiro e de outras materias primas de consumo, superior ao valor de 10:000$000 réis em cada anno, serão feitas precedendo concurso aberto no reino e nos principaes mercados e centros productivos.
§ único. A administração do fabrico de tabacos poderá, porém, realisar compras particularmente quando o faça por preços inferiores aos da ultima arrematação publica effectuada pela administração de qualquer dos estados que tiver empregado o meio do concurso.
6.ª
A venda de tabacos fabricados continúa livre nos termos da legislação em vigor.
§ l.º A administração do estado poderá empregar os recebedores de comarca como depositarios dos tabacos, para por si, por seus propostos e pelos cobradores da freguezia fazerem o fornecimento dos vendedores e revendedores, abonando-lhes commissão que não seja superior a 2 1/2 por cento.
§ 2.° Poderá igualmente o governo empregar na venda de tabacos parte do pessoal reformado da fiscalisação externa das alfandegas, e auctorisar tambem por elles ou outros agentes a venda ambulante, principalmente nas pequenas povoações da raia.
7.ª
Os direitos de importação sobre tabacos manipulados estrangeiros continuarão a ser os fixados no decreto de 27 de janeiro de 1887, e só dos que tiverem pago direitos de importação e dos fabricados por conta do estado é livre a venda no continente do reino.
§ unico, É prohibido o despacho para consumo de tabaco em rama, folha, rolo ou outra fórma não manipulada, a não ser feita pelo estado para as suas fabricas.
A cobrança coerciva dos creditos da administração do estado pela venda de tabacos, será feita nos mesmos termos que a das contribuições directas.
9.ª (transitoria)
O governo fará conservar nas fabricas do estado os operarios que actualmente trabalham nas particulares, e todos os outros empregados das mesmas emprezas existentes em 31 de dezembro de 1887, e reorganisará o serviço da fiscalisação, regulado por decreto de 25 de agosto ultimo, nos termos convenientes ao regimen prescripto n'estas bases.
§ 1.° Os salarios dos operarios serão regulados pelos mais vantajosos e iguaes em Lisboa e Porto.
§ 2.° O pessoal operario ou não operario, que do serviço particular passe para o do estado, não poderá ser despedido sem motivo justificado, reconhecido pelo conselho e administração ou julgado por sentença do poder judicial.
§ 3.° A administração do estado garantirá a todo o pessoal operario e não operario actualmente interessado no legado João Paulo Cordeiro, o beneficio d'esse legado calculado pelo do anno de 1886.
§ 4.° O pessoal não operario, que ficar addido ao quadro definitivo organisado em observancia da base 3.ª, fará serviço nas fabricas ou nas alfandegas e outras repartições publicas onde o governo julgar conveniente collocal-o, não podendo ser admittido ou nomeado para aquelle quadro pessoal novo, ou augmentados os ordenados do actual emquanto houver empregados addidos e a despeza não estiver reduzida ao limite prescripto na citada base.
§ 5.° A disposição da base 6.ª, § 1.°, não prejudicará os actuaes revendedores, sendo em regra as percentagens d'estes e dos vendedores, que por intermedio d'elles se abastecerem, determinadas pelas tabellas em vigor da companhia nacional de tabacos.
§ 6.° Na reorganisação do serviço da fiscalisação das fabricas poderá esta ser dividida em dois districtos correspondentes aos circules aduaneiros.
10.ª
Ficam era pleno vigor todas as disposições repressivas do contrabando, descaminho, e das trangressões dos regulamentos relativos a tabacos actualmente em vigor.
Sala das sessões da commissão de fazenda da camara dos senhores deputados, 12 de março de 1888. = José Dias Ferreira (vencido) = J. P. Oliveira Martins = A. Fonseca = Antonio E. Villaça = Fernando Mattozo Santos == José Frederico Laranjo - Marianno Prezado = A. Baptista de Sousa = Gabriel José Ramires = Antonio M. Pereira Carrilho = Antonio Candido = Elvino de Brito = Vicente B. Monteiro.
N.° 9-C
Artigo 1.° A fabricação dos tabacos no continente do reino será feita exclusivamente por conta do estado, noa termos e condições das bases annexas á presente lei è que fazem parte integrante d'ella.
§ 1.° O governo decretará a expropriação, por utilidade publica, das fabricas existentes no continente do reino.
§ 2.° O governo, para o pagamento das expropriações e indemnisações e para capital circulante da exploração, poderá levantar as quantias necessarias em obrigações especiaes amortisaveis no praso maximo de trinta annos.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
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Ministerio dos negocios da fazenda, 31 de dezembro de 1887. = Marianno Cyrillo de Carvalho.
Bases para o estabelecimento da fabricação de tabacos por conta do estado
Base l.ª A indemnisação das fabricas expropriadas para effeito de se estabelecer a fabricação do tabacos por conta do estado, sei á fixada arbitralmente nos termos do § 1.º da base 8.ª das annexas á lei de 18 de agosto de 1887.
§ 1.° Sendo as emprezas fabricadoras constituídas em sociedade anonyma, poderão ellas optar entre serem indemnisadas, adquirindo o estado todas as suas acções pela, ultima cotação de operações effectuadas antes de 31 de dezembro de 1886, ou serem-o pela avaliação arbitrai dos seus haveres, acrescida de lucros cessantes na mesma proporção.
§ 2.° Verificando-se a primeira hypothese do paragrapho antecedente, todas as operações das emprezas, desde l de janeiro de 1887, serão por conta do estado, mas este abonará o juro commercial da mora desde aquella data aos expropriados, os quaes por sua parte responderão pela effectividade e pela não deterioração dos seus inventario e balanço de 31 de dezembro de 1886.
§ 3.° Verificada a segunda hypothese do § 1.°, os expropriados responderão pela collecta que lhes tiver sido distribuída, conforme a base 2.ª das annexas á lei de 18 de agosto de 1887, por todo o tempo decorrido desde 20 de outubro de 1887 até a posse das fabricas pelo estado.
§ 4.° O pagamento do preço da expropriação, ou a consignação em deposito nos casos em que por direito é permittida, será feita pelo estado antes de tomar posse das fabricas expropriadas.
Base 2.ª A administração do fabrico de tabacos por conta do estado será confiada a um conselho do administração e a um conselho fiscal, compostos cada um de cinco membros, nomeados ou eleitos para servirem por tres annos.
§ 1.º Um membro do conselho de administração será eleito pela camara dos dignos pares do reino, outro pela camara dos senhores deputados, e tres, dos quaes um será O presidente, nomeados pelo governo.
§ 2.° Para o conselho fiscal serão eleitos um vogal pela camara dos dignos pares, um pela camara dos senhores deputados e tres nomeados pelo governo.
§ 3.° As camaras legislativas elegerão para o conselho de administração e para o conselho fiscal tantos vogaes supplentes, quantos forem os effectivos que lhes pertença eleger.
§ 4.° O presidente do conselho fiscal será o membro eleito pela camara dos pares, o vice-presidente será o eleito pela camara dos deputados.
§ 5.° Os deveres e attribuições dos membros doa dois conselhos regulam-se pelas prescripções do contrato de mandato. Uns e outros podem ser reconduzidos no fim de cada, período de tres annos, quando tenham bem servido.
§ 6.° O presidente do conselho de administração, que terá a designação de administrador geral dos tabacos, vencerá o ordenado fixo de 900$000 réis, os vogaes do conselho o de 600$000 réis annuaes. Os do conselho fiscal receberão em senhas de presença 18$000 réis por sessão até o maximo de vinte e quatro sessões em cada anno.
§ 7.° Alem dos vencimentos fixos determinados no paragrapho antecedente, deduzir-se-hão cada anno l 1/2 por cento dos lucros líquidos superiores a 3.000:000$000 réis, dos quaes l por cento serão distribuídos proporcionalmente aos ordenados entre os membros do conselho de administração e 1/2 por cento igualmente entre os do conselho fiscal.
§ 8.° Os vogaes supplentes do conselho de administração e do conselho fiscal perceberão, emquanto servirem, os vencimentos fixos e as percentagens que pertenceriam aos vogaes effectivos substituídos.
§ 9.º O exercício dos logares de membros do conselho de administração é incompatível com o exercício do qualquer outro emprego publico. Se algum empregado publico for nomeado pelo governo, e acceitar, perderá o logar que exercia ao tempo da nomeação. Se, porém, algum empregado for eleito pelas camaras dos pares ou deputados, ficará addido ao quadro a que pertencer com os mesmos direitos e vantagens, excepto vencimentos, que teria, se continuasse em serviço no referido cargo.
§ 10.° O conselho de administração terá pelo menos uma reunião em cada semana, e o conselho fiscal pelo menos uma cada mez.
§ 11.° Um e outro conselhos redigirão no fim de cada anno relatorios minuciosos, que pelo governo serão submettidos ao exame do poder legislativo.
§ 12.° As contas do conselho de administração serão julgadas pelo tribunal de contas como as do quaesquer outros gerentes ou exactores de dinheiros publicos.
Base 3.ª A fabricação dos tabacos será feita em duas fabricas em Lisboa e duas no Porto, não podendo este numero ser reduzido senão quando a reducção não prejudique a collocação dos operarios em boas condições hygienicas.
§ 1.° Serão mantidos nas fabricas do estado os operarios que actualmente trabalham nas particulares, não podendo ser despedidos sem motivo justificado, reconhecido pelo conselho de administração ou julgado por sentença do poder judicial. O dia de trabalho será fixado em oito horas, podendo só em casos excepcionaes reduzir-se a seis horas, e pagando-se qualquer excesso sobre oito horas, a rasão de 10 por cento de dia e 20 por cento de noite. Os salarios sei ao regulados pelos mais vantajosos e iguaes em Lisboa e Porto.
§ 2.° A administração do estado interessará o pessoal operario nos seus lucros com uma percentagem não inferior a 5 por cento do excesso d'esses lucros annuaes sobre 3 500:000$000 réis, podendo uma parte do quinhão dos operarios ser destinada a dotação de uma caixa de soccorros.
§ 3.° Alem d'isso a administração do estado estabelecerá uma caixa de reformas para os operarios impossibilitados, dotando-a annualmente com uma percentagem até 3 por cento dos lucros líquidos, mas sempre com o mínimo de 20:000$000 réis, e não sendo a reforma de cada operario inferior a 1$500 réis semanaes.
§ 4.° A administração do estado garantirá a todo o pessoal operario e não operario, beneficiado pelo legado João Paulo Cordeiro, os interesses d'esse legado, calculados pelos do anno de 1886.
§ 5.° As condições de serviço interno e do trabalho dos operarios, penas disciplinares e motivos de suspensão e despedida, serão determinadas em regulamento proposto pelo conselho de administração e approvado pelo governo.
Base 4.ª As despezas do escriptorio, incluindo ordenados de empregados, não poderão exceder a 72:000$000 réis em cada anno, sendo as nomeações, promoções, demissões e castigos dos empregados attribuição exclusiva do conselho de administração.
§ 1.° A administração do estado conservará, porém, ao seu serviço todos os empregados das emprezas particulares existentes em 31 de dezembro de 1887, não podendo admittir ou nomear outros, nem promover os actuaes ou augmentar-lhes os vencimentos, emquanto a despeza não estiver reduzida ao limite fixado n'esta base.
§ 2.° Nos primeiros seis mezes do seu exercício, o conselho de administração formulará o quadro definitivo do pessoal de empregados do escriptorio, e n'elle só poderá collocar os actuaes empregados ao serviço das fabricas.
Base 5.ª Todas as compras de tabaco e outras materias primas, cujo consumo annual exceda o valor de 10:000$000 réis, serão feitas precedendo concurso nos principaes mercados e centros productores.
Base 6.ª A venda de tabacos fabricados continua livre, nos termos da legislação em vigor, e aos vencedores
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SESSÃO DE 26 DE MARÇO DE 1888 931
garantirá a administração do estado a percentagem mínima de 10 por cento.
§ unico. A administração do estado poderá empregar os recebedores de comarca e seus propostos como depositarios dos tabacos para fornecimento dos vendedores e revendedores, abonando-lhes commissão que não seja superior a 2 1/2 por cento.
Base 7.ª Os direitos de importação sobre tabacos manipulados estrangeiros continuarão a ser os fixados no decreto de 27 de janeiro de 1887, e só dos que tiverem pago direitos de importação e dos fabricados por conta do estado é livre a venda no continente do reino.
Base 8.ª A administração do estado empregará no seu fabrico 20 por cento de tabaco nacional, se o houver, sendo 10 por cento do produzido no Douro, 5 por cento das ilhas e 5 por cento das provincias, ultramarinas.
§ unico. Na falta de accordo dos vendedores de tabacos de producção nacional do continente e ilhas ácerca dos preços de venda, sento estes fixados por arbitragem, sendo um dos arbitros nomeado pela administração do estado, outro pelos vendedores e o terceiro, para desempate, pelo juiz presidente do tribunal do commercio de Lisboa.
Base 9.ª A cobrança coercitiva dos creditos da administração do estado pela venda de tabacos será feita nos mesmos termos que a das contribuições directas.
Base 10.ª Ficam em pleno vigor todas as disposições repressivas do contrabando, descaminho e das transgressões dos regulamentos relativos a tabacos actualmente em vigor.
Ministerio dos negocios da fazenda, 31 de dezembro de 1887. = Marianno Cyrillo de Carvalho.
O sr. Julio de Vilhena: - (O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão quando o restituir.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): -(0 discurso será publicado em appendice a esta sessão quando o restituir.)
O sr. Julio de Vilhena: - (O discurso será publicado em appendice a está sessão, guando o restituir.)
O sr. Presidente: - Lembro a v. exa. que seria melhor mandar para a mesa a sua proposta.
O sr. Franco Castello Branco: - V. exa. deve crer bem que ha cinco deputados na camara que apoiam o adiamento apresentado pelo sr. Julio de Vilhena.
O sr. Julio de Vilhena: - N'esse caso mando a minha proposta para a mesa. (Apoiados.)
Leu-se na mesa a seguinte:
Proposta
Proponho que seja adiada a discussão d'este projecto até que sejam terminadas as ferias parlamentares. = Vilhena.
O sr. Presidente: - Esta proposta fica conjunctamente em discussão com o projecto.
Vozes: - Não póde ser. É uma questão prévia.
O sr. Presidente: - Para ser considerada como questão, prévia, tem a proposta de ser assignada por cinco srs. deputados.
O sr. Franco Castello Branco: - N'esse caso vamos assignal-a.
(Foi tambem assignada a proposta pelos srs. Franco Castello Branco, Avellar Machado, Pedro Victor e Manuel de Assumpção.)
Leu-se e foi admittida.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando o restituir.)
O sr. Eduardo de Abreu: - Vejo o sr. ministro da fazenda inclinado a acceitar a proposta do sr. Julio de Vilhena, por ser adiada para alguns dias a discussão d'este projecto.
Tenho a lembrar a v. exa. e á camara que, em todos estes projectos de fabricação de tabacos, em que o estado avoca a si o direito da manipulação para d'ella tirar os respectivos interesses, é costume ser sempre ouvida a commissão de saude publica, para ella estatuir as garantias que pelo lado da hygiene se devem conceder aos operarios. (Apoiados.)
N'este projecto só se falla de garantias pecuniarias e não se diz uma unica palavra relativamente á questão hygienica, isto é, á maneira como as fabricas podem e devera ser fiscalisadas, e vigiadas por peritos competentes como medicos e hygienistas.
Sobre isso nada do positivo existe no projecto, e, portanto, parecia-me conciliar-se tudo, se n'estes poucos dias em que tem de ser adiada a discussão do projecto podesse ser ouvida a commissão de saude publica, que, pela minha parte affirmo, dará o seu parecer em vinte e quatro horas, na, parte em que póde intervir.
O sr. Julio de Vilhena: - (O discurso será publicado em appendice, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - (O discurso será publicado em appendice, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Marçal Pacheco: - Sr. presidente, por melindres especiaes da minha situação, eu não pretendo entrar n'este debate. Não entrei n'elle o anno passado, e o mesmo farei este anno. Mas á vista do que se pretende, entendo que devo protestar contra este precedente de se fechar a sessão parlamentar, ou de não se encetar uma discussão, pelo facto de não estar presente um deputado, que deseja fallar. (Apoiados.) Ninguem mais do que eu, n'esta casa, respeita os talentos e o nobre caracter do meu illustre amigo, o sr. deputado Arroyo; mas se, realmente, o verdadeiro motivo do adiamento é a ausencia de s. exa., eu quero protestar para que não passe com a minha approvação o mau precedente de não se discutir um projecto qualquer, por não estar presente um deputado. (Apoiados.)
Se porventura este motivo, que se apresenta, é apenas um pretexto para o sr. ministro da fazenda evitar uma discussão violenta...
0 sr. Antonio Maria de Carvalho: - Isso não é.
O Orador: - Deixe-me v. exa. continuar na minha ordem de idéas. Eu formulo a hypothese: se porventura o motivo que se apresenta é apenas um pretexto para evitar uma discussão violenta, então volto-me contra o sr. ministro da fazenda e contra o governo, que não tem força para levar por diante uma discussão d'esta ordem. Se o governo não tem força, á face do paiz, para discutir um assumpto tão importante e grave como este, então está-lhe indicado qual o caminho que deve seguir: retire se, deixe essas cadeiras.
Eu formulo a hypothese.
Se é esta a rasão do adiamento. Mas se, porventura, não é esta, então não fica nenhuma, das que têem sido apresentadas para se adiar a discussão do projecto. Que os meus illustres collegas da opposição proponham o adiamento com o fundamento de que o projecto é nocivo aos interesses publicos, comprehende-se. Que se proponha o adiamento pela falta de esclarecimentos, que habilitem os oradores a entrar na discussão, tambem se comprehende. Que o sr. Eduardo de Abreu proponha o adiamento com o fundamento de que o projecto precisa ir á commissão de saude publica, tambem se comprehende. O que não comprehendo é que se não discuta um projecto, qualquer que elle seja, com o fundamento de que um membro, embora muito conspícuo da camara, está privado de comparecer á sessão. Existem n'esta casa muitos outros correligionarios de s. exa., que são tão capazes como elle de discutir o projecto, com utilidade para o paiz e com utilidade para os interesses da discussão parlamentar. O meu protesto fica lavrado.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
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O sr. Ministro da Fazenda (Marianno do Carvalho): - (O discurso será publicado em appendíce quando s. exa. o restituir.)
O sr. Franco Castello Branco: - Eu pedi a palavra quando ouvi mais de um membro da maioria apoiar as palavras do meu illustre amigo o sr. Marçal Pacheco, que não fazia outra cousa senão combater a proposta, que tinha emanado do sr. ministro da fazenda. E vou dar a rasão d'isto.
O meu illustre correligionario e amigo o sr. Julio de Vilhena tinha proposto um verdadeiro adiamento d'este projecto, com os fundamentos que a camara ouviu. Levanta-se o sr. ministro da fazenda e substitue esta proposta por uma outra, em que conservava a idéa principal do adiamento, e simplesmente o que mudava eram os fundamentos do adiamento. Unica e simplesmente isto, e mais nada.
Ora contra esta proposta do sr. ministro da fazenda ninguem fallou senão o sr. Marçal Pacheco, que só foi apoiado por alguns membros da maioria, como eu ouvi e como todos ouviram. (Apoiados.)
Eu cito este facto, porque me parece que este projecto dos tabacos vão abrir dentro da maioria uma sessão que...
Vozes: - Não abre, não abre
O Orador: - Tenho ouvido fallar tanto em Marianaceos e em Lucianaceos; é tão sabido que n'esta questão as torrentes de opinião, os manejos e as intrigas têem sido tão diversos e tão contradictorios, segundo as exigencias são do sr. ministro da fazenda ou do sr. presidente do conselho, que eu estava convencido de que iamos ver manifestarem-se perante a camara, perante o paiz, que tem direito a conhecer o que se passa, tanto o que tem caracter publico como aquillo que nós pensâmos e sabemos, e n'esta questão ha muita cousa que é necessario trazer para a discussão, que é necessario apreciar e julgar, opiniões muito importantes e diversas.
Eu julguei que ao menos agora, quasi ao findar o período normal da sessão legislativa, discutindo-se um projecto que poz em perigo a situação, a maioria se lembrasse de que acima dos interesses do ministerio estavam os interesses do paiz e de que aquillo que se tem dito em voz baixa, nos corredores da camara, e até em alguns jornaes, era occasião de o dizer na camara, à cceur ouvert, em voz alta. (Apoiados.)
Já vejo que me enganei, e que o sr. Marçal Pacheco foi apoiado por engano, por equivoco.
Julgavam apoiar o sr. ministro da fazenda, mas aquelles que apoiaram deram uma desgraçada idéa da maneira como ouvem; já não digo da maneira como entendem.
Se todos estamos conformes, se o unico que não se conforma é o sr. Marçal Pacheco, que vale muito pelos seus talentos e pelos seus meritos, mas que n'estas questões de discutir e votar vale tanto como outro qualquer, supponho que não merece a pena gastarmos mais tempo com uma proposta que partiu das cadeiras ministeriaes, sendo apoiada por toda a maioria, e sendo apoiada pela opposição, com excepção do sr. Marçal Pacheco.
E a resolução da questão dos tabacos não será prejudicada por se esperar que o sr. Arroyo venha. (Apoiados.)
Não terminarei sem dizer á camara que estes actos de deferencia pessoal, de que fallou o sr. Marianno do Carvalho, não são sem antecedentes nos annaes d'esta casa.
Mais de um membro d'esta camara, e que tem assento n'ella ha mais annos do que eu, sabe perfeitamente que no ministerio de 1881 a 1885, sob o consulado regenerador, mais de uma voz se adiou a discussão de projectos á espera do sr. Marianno de Carvalho e do sr. Saraiva de Carvalho. (Apoiados.)
O sr. Marçal Pacheco: - Não ha nenhuma resolução a este respeito.
O Orador: - Se não ha, devia havel-a.
E se não ha é porque nunca se deu um caso igual áquelle que se está dando agora.
Eu comprehendo que podesse haver algumas duvidas da parte do sr. ministro da fazenda.
E aqui estou eu a defender o sr. ministro da fazenda; aqui estou eu a encaminhar-me para s. ex.ª...
Somos nós que nos estamos a approximar do governo. Desde o momento em que s. exa. tem dados para ordem do dia mais de um projecto da responsabilidade da sua pasta, comprehendo que o sr. ministro da fazenda não podesse ter a minima repugnancia em acceder a uma proposta de adiamento, que era legitimamente feita pelo sr. Julio de Vilhena. Seja como for, parece-me que não vale a pena estar a gastar mais palavras com este assumpto.
O que é certo é que este projecto fica adiado, e ha de acontecer como aconteceu o anno passado; então escolheu-se o gremio, este anno escolheu-se a régie; e se as opiniões são tantas, se não os interesses, é completamente impossível pôr-se de accordo, não digo a camara toda, porque isso seria muito difficil, mas a maioria.
Entretanto, apesar do que temos presenceado, parece-me que ha um facto resolvido: é que se não póde entrar na discussão d'este projecto. (Apoiados.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Não sei quantas vezes hei de pôr a questão no seu verdadeiro terreno. Recusei a proposta do sr. Julio de Vilhena, mas não fiz proposta alguma. Fui informado, porém, de que era um certo e determinado motivo que dera origem á proposta de adiamento, e como membro do governo não podia deixar de ter desejo de condescender com a opinião parlamentar. Mas, repito, não fiz nem faço proposta alguma. E submettendo-me á deliberação da camara para mim é completamente indifferente que a camara adie o projecto ou que entre immediatamente na sua discussão. Entretanto entendi que devia praticar um acto de deferencia pessoal para cora vim illustre membro da opposição parlamentar e nada mais do que isto. A camara resolverá como entender.
O sr. Marçal Pacheco: - Estamos sem nos entendermos. Tomo de novo a palavra para responder ao meu nobre amigo, o sr. Franco Castello Branco e para ratificar um ponto importante. Eu não me opponho ao adiamento nem tenho que me oppor; comecei por dizer, nas considerações que, ha pouco, tive a honra de apresentar á camara, que não entrava n'esta questão, mas que não podia deixar de protestar contra a rasão do adiamento apresentado pelo sr. Marianno de Carvalho. Uma cousa é discutir, approvar ou rejeitar o adiamento, outra cousa é acceitar, como boa, uma rasão, que eu entendo não deve constituir precedente. Não me opponho, repito, a que seja adiado o projecto, se a opposição entende que, em harmonia com os legítimos interesses do paiz, elle deve ser adiado; mas quero deixar registado nos annaes parlamentares o meu protesto contra a rasão invocada pelo sr. ministro da fazenda de que se adie a discussão pela circumstancía unica de um deputado não estar presente!
E dizendo isto, quero deixar bem consignado que não posso permittir que em materia de delicadeza nem o sr. ministro da fazenda nem ninguem vá adiante de mim.
Não estamos aqui n'uma sala onde se preleccione delicadeza. A delicadeza, é de direito commum, á obrigação de todos.
A delicadeza, para esta casa, traz-se como se traz uma gravata, não é rasão para se decidir nem a favor, nem contra. O facto de ser delicado é obrigatorio, não póde ser invocado, n'um dado momento, n'uma dada conjunctura, para determinar o voto a favor ou contra esta ou outra questão. Já ha tempo tive occasião de apresentar esta mesma idéa.
Lembro-me que em 1885, a proposito de um requerimento apresentado n'esta casa, para que uma eleição da Madeira fosse enviada ao tribunal de verificação de poderes, o sr. Marianno de Carvalho, ou o sr. Elias Garcia, mas parece-me que foi o sr. Elias Garcia, disse que tinha
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levado algum tempo a arranjar as quinze assignaturas, e que por fim só se tinham arranjado, devido ao favor e generosidade de alguns srs. deputados.
Por essa occasião tambem me revoltei contra o facto de ser o favor ou generosidade de qualquer deputado, principio determinativo das nossas decisões.
Como v. exa. vê, sou coherente com os meus princípios, sustentados em outra occasião.
Rematando as minhas breves considerações, quero deixar accentuado este facto: não combato o adiamento, combato a rasão dada pelo sr. ministro da fazenda, a qual não desejo que fique constituindo precedente.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Antonio Maria de Carvalho: - Não pude deixar de pedir a palavra sobre este assumpto, pela rasão simples que vou expor.
Pela muita consideração que me merece o meu illustre collega o sr. conselheiro Julio de Vilhena, tendo ouvido dizer a s. exa., em conversa commigo, que a verdadeira rasão porque a opposição desejára o adiamento d'esta discussão era não estar presente o sr. Arroyo, que o anno passado tomou na discussão do tabaco uma posição proeminente, julguei dever de informar d'isso o sr. ministro da fazenda, que, tendo então conhecimento da verdadeira causa por que a opposição desejára o adiamento, entendeu muitissimo bem, a meu ver, e muito em conformidade com o que muitas vezes os governos têem feito aos deputados das opposições, que devia condescer e concordar com o adiamento pedido; mas, desde o momento em que o facto do sr. ministro acceitar este adiamento é interpretado da fórma por que o fui pelo meu distinctissimo collega o sr. Marçal Pacheco, declaro, pela minha parte, que não posso deixar de votar contra esse adiamento.
Estamos n'uma posição difficil. Procurâmos seguir um determinado caminho a contento, quanto possível da opposição. Se temos a mínima condescendencia, como outras camaras têem tido com a opposição, a nossa condescendencia é immediatamente interpretada como acto de fraqueza e cobardia da nossa parte. (Apoiados.)
Pois, perante uma insinuação d'esta ordem, creio poder dizer, em nome de toda a maioria, que não estamos dispostos, por consideração alguma, a fugir perante a ameaça de quaesquer tempestades que s. ex.ªs pretendam levantar
n'esta ou n'outra discussão.
Só o desejo do condescender com a opposição nos podia levar a acceitar o adiamento, porque a coherencia aconselhava-nos a manter o que tínhamos sustentado no sabbado, de que, pelo facto de não estar presente o relator da commissão se não devia suspender a discussão de um projecto. (Apoiados.)
E surprehendeu-me que o sr. Marçal Pacheco se opponha hoje a que seja adiado este projecto por não estar presente o sr. Arroyo, que o anno passado tomou uma posição proeminente no projecto dos tabacos, sendo s. exa. quem tanto se empenhou no sabbado para que o pequenino projecto da Madeira fosse adiado por não estar presente o relator, o sr. Vicente Monteiro.
O sr. Marçal Pacheco: - Eu não fallei a favor nem contra o adiamento do projecto. O que eu disse foi que não se devia, pôr á votação o requerimento para que a ma teria fosse julgada sufficientemente discutida, quando nem discussão tinha havido. (Apoiados.)
O Orador: - O meu voto fica consignado. Desejo fazer unicamente sentir que eu não me oppunha ao adiamento d'este projecto, porque desde que o partido regenerador desejou que fosse o sr. Arroyo quem encetasse esta discussão, eu desejava dar esta prova de deferencia á opposição; mas visto que o sr. Marçal Pacheco considera este voto como uma prova de medo da nossa parte d'essas tempestades que nos ameaçam, voto contra o adiamento, porque pela minha parte não estou disposto ainda a fugir diante d'essas tempestades. (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem.
O sr. Julio de Vilhena: - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Heliodoro da Veiga (para um requerimento}; - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se julga ou não a proposta do adiamento, que está sobre a mesa; sufficientemente discutida.
O sr. Eduardo de Abreu (sobre o modo c)e propor):- E paia deixar bem consignada uma declaração muito terminante e muito categorica, de que eu era incapaz, absolutamente incapaz, a proposito d'este projecto, de abrir um conflicto grave com o governo. (Apoiados)
O sr. conselheiro Julio de Vilhena com muito boa fé disse que eu tinha mandado para a mesa uma proposta de adiamento. Peço licença a s. exa. para dizer que não mandei tal proposta. Eu disse simplesmente que no caso do governo acceitar o adiamento só podia aproveitar esse adiamento para a commissão de saude publica apresentar o seu parecer; mas no caso de não se adiar a discussão, esse inconveniente desapparece, porque no correr do debate posso eu ou qualquer sr. deputado apresentar alguma proposta para garantir quanto possível aos operarios, o poderem trabalhar nas melhores condições hygienicas. Appello para o cavalheirismo do s. exa. para tomar á, boa fé que o que disse não foi o que s. exa. me attribue, mas simplesmente o que acabo de declarar.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Manuel de Assumpção: - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Presidente: - Tem a palavra sobre o modo de propor, o sr. Franco Castello Branco; mas peço ao sr. deputado que sobre o modo de propor não faça um discurso tão longo, como o que o sr. Manuel de Assumpção acabou de fazer. (Apoiados.)
O sr. Franco Castello Branco: - Sr. presidente e sr. Francisco de Campos, creia v. ex.ª...
O sr. Manuel de Assumpção: - O que fez aqui o sr. Eduardo de Abreu a quem v. exa. não fez observação alguma?!
O Orador: - Póde v. exa. ter a certeza, e fallo com toda a seriedade, como é dever n'esta casa, que não ha membro nenhum n'esta assembléa a quem eu mais considere e respeite do que a v. ex.ª; não ha absolutamente ninguem a quem eu mais deseje prestar o testemunho da minha consideração e de annuencia a qualquer vontade exprimida, do que a v. ex.ª; mas eu não quero senão usar do mesmo direito de que têem usado todos os oradores que se inscreveram na discussão antes da ordem do dia, e depois da ordem do dia, quer sobre o modo de propor, quer sobre o modo de votar.
Eu lembro á camara, que não ha muito tempo ouvi O illustre parlamentar o sr. Elvino de Brito, a proposito dos tumultos que iam pelo paiz, discutir o caminho de ferro dê Ambaca...
O sr. Elvino de Brito: - Não foi sobre o modo de propor.
O Orador: - Qual é o artigo do regimento que designa o assumpto sobre que deve fallar o deputado, e que prescreve os limites dentro dos quaes elle se deve conservar?
Para a palavra sobre a ordem quer ouvir v. exa. o que diz o regimento?
V. exa. veiu deitar azeite no fogo; v. exa. tinha vontade que eu fosse breve, e obriga-me a justificar não só o procedimento que vou ter e o que possa vir ter de futuro; mas o procedimento dos meus collegas Manuel de Assumpção e Eduardo de Abreu hoje, e de muitos outros deputados em outras occasiões.
Ora, sr. presidente, diz o artigo 141.° do regimento:
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"O deputado que tiver a palavra tem direito a usar d'ella por todo o tempo que julgar conveniente. Ninguem póde interrompel-o sem seu consentimento expresso, salvo se se desviar da ordem da discussão, seja entregando-se a divagações prolongadas, seja usando de termos injuriosos, ou offensivos, seja infringindo por qualquer modo as disposições d'este regimento. N'estes casos o presidente o chamará á ordem, procedendo nos termos do regimento."
Lembro aos illustres deputados da opposição e da maioria, que podem querer interromper-me, que o regimento diz que ninguem o póde fazer, sem o meu consentimento, salvo se eu me desviar da ordem da discussão e n'este caso só o sr. presidente...
(Interrupções.)
V. exa. está-me interrompendo e o regimento não o permitte; v. exa. infringiu o regimento e eu tambem o quero infringir.
Isto não é brincadeira; não me permitto o direito de brincar no parlamento; isto é para mostrar aos illustres deputados que querem que se cumpram exactamente os artigos do regimento, que quando eu estava lendo o artigo do regimento, que prohibo as interrupções, e quando eu exactamente pedia a sua attenção para elle, s. ex.ªs me interromperam.
É necessario que tenhamos uma certa condescendencia pessoal uns com os outros, e que nos convençamos todos, que, combatendo ou defendendo o governo, somos bastante honestos e conscienciosos para não ultrapassarmos os justos limites.
Mas o que era a ordem da discussão em que o illustre parlamentar o sr. Elvino de Brito discutia o caminho de ferro de Ambaca?
Era uma moção sobre as perturbações da ordem publica que ia, por todo o resto do paiz.
Ora o caminho de ferro de Ambaca tinha tanta relação com a ordem publica, que estava em discussão, como póde ter o eu discutir a harmonia, a relação, a uniformidade de pensar e sentir, a affeição, a amisade e a política que existe entre o sr. Luciano de Castro, ministro do reino, e o sr. ministro da fazenda Marianno de Carvalho.
Isto é absurdo, é um assumpto deslocado d'esta discussão, mas não é mais do que era a discussão do caminho de ferro de Ambaca a respeito das responsabilidades que cabiam ao governo por causa dos tumultos que se davam no paiz em janeiro d'este anno.
Isto, pois, demonstra que eu tenho sempre a melhor boa vontade de annuir aos pedidos de v. ex.ª; mas não posso, como deputado, deixar de usar de um direito igual áquelle que todos os membros d'esta camara, maioria e opposição, têem usado na discussão.
E posto isto, quero fazer notar o seguinte:
No tempo em que o parlamento portuguez merecia o seu verdadeiro nome, em que a unica cousa que preoccupava os ministros como as maiorias, eram os interesses do paiz, não se procedia como hoje; o que se procura hoje é fazer votar todos os projectos que interessam á vida política do governo.
Fazem-se accusações as mais energicas e mesmo desairosas aos ministros: e sabe v. exa. como se responde? Com o silencio; fica-se callado. D'antes, quando eu era maioria, não era assim; respondia-se.
Quando era presidente do conselho o sr. Fontes, por parte do governo não faz consentia que se fechasse uma discussão sob uma accusação que podesse ter desaire para os membros do governo. (Apoiados.) N'esse tempo nunca assisti a um espectaculo como o que se está presenceando, determinado pela fórma mais ridícula e absurda. Nunca assisti ao facto de um ministro levantar-se e concordar com o adiamento de um projecto que diz respeito á pasta que gere, e a maioria em acto seguido manifestar-se em sentido contrario áquelle ministro. (Apoiados.)
Não posso deixar de pôr este facto em releve. Não sei qual será a importancia que lhe dará o sr. Marianno de Carvalho; mas, no meu modo de sentir, s. exa. devia já estar cansado de prestar mais serviços ao seu partido, do que o seu partido tem tido do considerações por s. exa.
É muito bom ser habil, passar aos olhos dos seus e do paiz como um homem de expedientes para resolver todas as difficuldades; é bom ter essa reputação, mas não á custa do que s. exa. está soffrendo.
S. exa. levantou-se e declarou que não acceitava o adiamento proposto pelo sr. Julio de Vilhena pelo facto de que, se o acceitasse, isso equivalia a declarar que tinha receio das violencias que a opposição quizesse dar á discussão d'este projecto; e que só concordava com o facto do adiamento em si.
Que significa, que importa adiar?
Qual é o criterio a que deve ser subordinado este adiamento?
Unicamente aos interesses do paiz.
Um certo e determinado projecto entra em discussão, e é claro que os membros do poder executivo devem merecer a confiança da maioria; se a discussão d'esse projecto não precisa de ser immediata, se ha quem proponha o adiamento e se o ministro da pasta por onde o negocio corre, e que é o mais competente para julgar da necessidade do projecto, concorda com o adiamento, em que circumstancias fica a maioria votando contra?
Eu faço justiça ao sr. ministro. S. exa. disse que tinha desejo de fazer a vontade á opposição, mas não tem força e toda a maioria ha de votar contra, do mesmo modo que não teve força para resistir aos membros do governo que lhe impozeram a regia quando s. exa. queria o monopolio. E o sr. ministro da fazenda ha de recuar successivamente diante das reclamações dos contrarios.
E a primeira vez que se vê uma verdadeira exaltação no seio da maioria contra um ministro...
O sr. Presidente: - Em consciencia, pergunto ao illustre deputado se está tratando da questão sobre o modo de propor?
O Orador: - Se v. exa. me faz essa pergunta, eu digo-lhe que não; mas eu fui magistrado oito annos, e conheci as praticas da magistratura; sei que ha uma cousa muito peior do que a injustiça absoluta que é a injustiça relativa, e sempre n'esta camara, como já tive occasião de demonstrar, quer fallando-se antes da ordem do dia, quer na ordem do dia, quer sobre a ordem, quer sobre o modo de propor, tem sido praxe constante o orador fallar n'aquillo que julga necessario para justificar o seu proposito.
Eu prefiro que v. exa. me retire a palavra, e eu obedecerei, porque comprehendo que a minha obrigação é obedecer a v. exa., visto que o regimento lhe dá o direito de me retirar a palavra; mas o que não consinto, sem deixar de lavrar o meu protesto, é que v. exa. me não conceda os mesmos direitos que se concedem a todos os deputados.
Esse facto ficará para demonstrar que o projecto alem de ser nocivo aos interesses do estado começa por uma violencia...
O sr. Presidente: - Tenho a observar ao sr. deputado que é injusto no que acaba de dizer com referencia a mim. Eu não costumo fazer injustiças absolutas nem relativas.
Effectivamente é verdade que qualquer orador tem direito de fallar durante o tempo que quizer, mas é sobre o assumpto para que pediu a palavra; e se o sr. deputado não o quer assim entender, creia que nem por isso me obriga á violencia de retirar-lhe a palavra.
O Orador: - Em vista das considerações que v. exa. acaba de fazer, vou resumir as considerações que tenho a fazer.
Eu quero pôr bem em evidencia o facto de que o sr. ministro da fazenda concordou com a proposta de adiamento apresentada pelo meu collega o sr. Julio de Vilhena, e o
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facto do adiamento é a unica cousa a considerar n'este momento.
As rasões com que o sr. Julio de Vilhena fundamentou o seu adiamento não estão prescriptas na proposta, e o que vae ser submettido á consideração da camara é o facto de um adiamento, com o qual concordou o sr. ministro da fazenda.
A camara vote como quizer, o sr. ministro proceda como entender, mas póde ter a certeza de que, se preferir mais uma vez vencer pela sua habilidade, ficando, como ficou, ver-se-ha exautorado perante o parlamento.
(Pausa.)
Dizia eu que o sr. ministro póde evitar que o adiamento d'este projecto tenha logar; mas se se verificar, o que eu classifico de uma verdadeira exautoração parlamentar, estou certo que s. exa. devo estar cansado de soffrer mais do que humilhações políticas, mas verdadeiras torturas, n'esta questão dos tabacos; deve estar cansado de ver as suas opiniões constantemente contrariadas e postas de parte, para que consinta mais uma vez em ser o Cyrineu que, contra sua vontade e a sua opinião, vão arrastando esta triste questão dos tabacos para um precipício, em que unicamente ganham as fabricas, e em que perdem o estado e o contribuinte.
(O sr. deputado não reviu as notas tachygraphicas.}
O sr. José Castello Branco: - (O discurso será publicado na integra, em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Presidente: - Não está mais ninguem inscripto. Vae votar-se.
O sr. Franco Castello Branco (sobre, o modo de votar): - Requeiro a v. exa. que consulte a camara se quer votação nominal.
Consultada a camara, foi rejeitada, a votação nominal.
O sr. Franco Castello Branco: - V. exa. diz me quantos deputados estão presentes, e quantos são precisos para se poder considerar approvado ou rejeitado um requerimento para a votação ser nominal?
O sr. Presidente: - Não posso dizer quantos srs. deputados estão presentes, mas o requerimento está visivelmente rejeitado.
O sr. Franco Castello Branco: - Pedimos a contraprova.
Assim se fez, verificando-se estarem sentados 73 deputados e 25 de pé.
O sr. Franco Castello Branco: - Então é mais de umterço.
O sr. Presidente: - Mas é um terço da totalidade dos srs. deputados presentes
Posta á votação a proposta de adiamento do sr. Julio de Vilhena, foi rejeitada.
O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto.
0 sr. Franco Castello Branco: - Mando para a mesa uma proposta, como questão prévia. Vae assignada por mais cinco srs. deputados.
É a seguinte:
Proposta
Proponho que haja duas discussões, uma na generalidade e outra na especialidade por bases. - Franco Castello Branco - Consiglieri Pedroso = Jalles de Vilhena = Jalles = João Pinto = Augusto Pimenta.
Foi admittida.
O sr. Franco Castello Branco (para uma questão prévia): - A questão prévia que desejo fazer discutir e votar antes de se entrar na apreciação do projecto, parece-mo de toda a importancia e digna de uma especial attenção, por parte da camara, não por ser eu o seu apresentante, mas pelo valor da questão em si, como vou demonstrar.
Como v. exa. sabe, sr. presidente, o artigo 138.° do regulamento d'esta camara estatue que todas as projectos de lei, que tiverem mais de um artigo, passarão por duas discussões distinctas; e tem-se entendido que não estão; n'estas circumstancias, isto é, que não podem ter duas discussões distinctas, os projectos que, contendo dois artigos, o segundo precentua, apenas a revogação da legislação em contrario.
Não vou agora discutir se esta é a interpretação mais consentanea com a disposição do artigo 188.° Reconhecendo e acceitando a praxe ou jurisprudencia estabelecida, quero apenas justificar a necessidade, para mim incontestavel, do projecto que vae entrar em discussão relativamente ao fabrico do tabaco, e que a commissão redigiu só em dois artigos, e muitas bases, soffrer duas discussões distinctas, uma na generalidade e outra na especialidade, isto é, relativamente a cada uma das suas bases.
O procedimento do governo n'esta questão e, o que é ainda mais significativo, o proprio procedimento d'esta camara, já devem ter feito comprehender a todos, que em assumptos d'esta ordem, que n'estes pontos especiaes da administração publica, toda a cautela e toda a sizudez são poucas, e que o tempo gasto em melhor discutir e estudar, não é por fórma alguma perdido, mas antes, muito utilmente gasto. (Apoiados.)
O parlamento já no anno passado se occupou de um projecto governamental sobre este mesmo assumpto. E o tempo que n'isso gastou é que foi tempo perdido, pois que este anno vão o governo e o parlamento destruir a sua propria obra!
De onde todo o paiz deverá concluir, e por certo conclue com grave desdouro para os altos poderes do estado, que, ou não souberam resolver o problema, ou procederam à coeur léger n'uma questão em que muitos milhares de contos, por parte do estado, se vão arriscar e comprometter em especulações d'esta ordem. (Apoiados)
É necessario que este anno não succeda o mesmo, é necessario que, boa ou má, na minha opinião, ou na de qualquer dos membros d'esta camara, a lei que sair da discussão e da votação parlamentar não tenha de soffrer novas emendas e revisões, sempre humilhantes o prejudiciaes para o parlamento e para o paiz.
Ao governo isso pouco importaria, no habito em que está de rasgar e annullar as suas proprias medidas e providencias de administração. Mas o prestigio do parlamento cumpre-nos sustental-o tão alto quanto seja possível.
Pelo artigo 1.° d'este projecto diz se: que o governo fica auctorisado a levantar 7.200:000$000 reis, por meio de uma operação, que durante quarenta annos pesará sobre o orçamento do estado na rasão de 432:000$000 réis por anno, para comprar as fabricas de tabacos.
Repito, pois, que em negocio de tanta monta como este, em que se vão arriscar tantos milhares de contos, é necessario que se proceda com uma prudencia e cautela, bem differentes d'aquellas, com que se procedeu no anno passado. Se alguem accusar de leviana a resolução que na ultima sessão se tomou, nenhum dos membros das maiorias parlamentares, nem do governo, se poderá julgar offendido nem melindrado, porque é o proprio governo, é a propria maioria, pela sua commissão, quem, reconhecendo os seus erros passados, lavraram uma sentença de manifesta incuria, senão de incapacidade, para bem gerir os negocios do estado.
E não julguem que o seu erro e incuria ficarão baratos ao paiz. Quando examinarmos os documentos que o sr. ministro enviou a esta camara a pedido da opposição, documentos aliás deficientissimos, pois que os mais importantes foram sonegados, ver-se-ha quantos centos de contos de réis nos custou o simples ensaio da comedia do gremio representada pelos srs. presidente do conselho e ministro da fazenda.
Sr. presidente, em Hespanha, e é este um antecedente da maior ponderação, como. v. exa. sabe, passou se no anno
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passado, do regimen da régie por conta do estado, para o da arrematação. Não houve, pois, uma mudança tão completa, tão radical, em relação ao regimen da industria da fabricação dos tabacos, como se dará em Portugal, se este projecto for convertido em lei.
O projecto apresentado pelo governo hespanhol tinha, se bem me recordo, dois ou tres artigos, e tambem diversas bases, que faziam parte integrante de um d'esses artigos. Pois sabe v. exa., sr. presidente, como o projecto foi discutido? Na generalidade e na especialidade, recaindo sobre cada uma das bases, que acompanhavam o projecto, uma discussão e uma votação distinctas.
Em Hespanha procedeu-se, pois, com toda a reflexão e madureza no estudo da idéa do governo. E por isso mesmo elle não passou lá pela vergonha, porque e necessario dar ás cousas o seu verdadeiro nome, de voltar ao parlamento, a dizer que andára levianamente em uma questão de milhares de contos de réis, e que interessa a milhares de pessoas, como acaba de fazer, e continuará fazendo o governo portuguez, que felizmente nos rege! (Apoiados.)
Proponho, portanto, sr. presidente, e é essa a minha questão prévia, que sobre este projecto recaiam duas discussões distinctas, uma na generalidade, outra na especialidade, isto é, uma discussão singular, sobre cada uma das bases do projecto, recaindo tambem sobre cada uma uma votação especial.
Eu posso affirmar a v. exa., que sobre diversas disposições de cada uma d'essas bases, mais de um deputado da opposição deseja apresentar emendas, substituições ou additamentos. E, portanto, v. exa. comprehende bem que, se houver uma unica discussão, ou ella terá de se prolongar indefinidamente, ou então os deputados terão de mandar para a mesa as suas emendas, substituições ou additamentos, sem as fundamentar, sem poderem convencer a camara da utilidade e conveniencia das suas doutrinas.
Em Hespanha, como já tive occasião de dizer, foi assim que se procedeu em assumptos d'esta ordem, e quando se tratava de passar do systema da régie, administrada pelo estado, para o da arrematação, e não, como entre nós da liberdade absoluta na fabricação para a administração pelo estado, indemnisando se escandalosamente, e este é talvez o ponto mais importante, as fabricas actualmente existentes.
Parece-me ter justificado sufficientemente a minha questão prévia, esperando que ella será admittida e votada pela maioria, que muito precisa fazer esquecer o seu procedimento n'esta questão, e que se nos apresenta fazendo amende honorable, de certo contricta e arrependida.
Inspirem-se no exemplo do parlamento hespanhol, visto que infelizmente é preciso buscar exemplos de constitucionalismo á terra dos pronunciamentos.
Para que o governo não torne a fazer a figura triste, que fez, é necessario não levar de assalto esta discussão, e dar tempo bastante ao parlamento e fornecer-lhe os elementos precisos para todos e cada um saberem o que votam.
Nada mais me parece necessario dizer, e termino mandando a minha proposta para a mesa.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O sr. Vicente Monteiro: - Pedi a palavra para propor a v. exa., que a questão prévia fique conjunctamente em discussão com o projecto.
Vozes na esquerda: - Não póde ser; é contra o regimento.
O Orador: - Não é de v. ex.ªs sómente, que depende o chamar-se a uma proposta questão prévia, ou não. Segundo as praxes parlamentares, é evidente que essa proposta tem de ficar conjunctamente em discussão com o projecto, mas votando-se depois, primeiramente a questão prévia, e depois o projecto.
Se a camara approvar a proposta, haverá outra discussão; do contrario, não haverá senão uma discussão.
O sr. Fuschini: - Não tinha tenção alguma de entrar na discussão da questão prévia apresentada pelo illustre deputado o sr. Franco Castello Branco, e acataria, em silencio, a decisão da maioria. Mas a doutrina peregrina apresentada pelo illustre relator da commissão, cavalheiro que tem graves responsabilidades, não só pelos seus meritos, como pela sua posição na maioria, obriga-me, sr. presidente, a protestar ainda mais uma vez contra as quebras das praxes parlamentares e, permitta-me v. exa. a palavra, porque não quero melindrar ninguem, de bom senso. (Apoiados.)
Discutir-se uma questão prévia d'esta ordem, uma questão prévia que trata da essencia da discussão, na propria discussão, é um absurdo, permitta-se-me que o diga.
Discutir-se o methodo da discussão na propria discussão não se comprehende. (Apoiados.}
Chega se ao fim, e, quando se poder apreciar a necessidade de discutir na especialidade, abafa-se, porventura, a unica discussão do projecto!
O sr. Vicente Monteiro: - Se for necessaria.
O Orador: - E como se ha de demonstrar esta necessidade?!...
Sr. presidente, realmente nós soffremos todos actualmente das consequencias de males de longa data semeados n'este campo parlamentar. (Apoiados.}
O erro de apresentar projectos d'esta ordem só com um artigo e com bases numerosas e importantes não pertence só a esta situação, já vem de traz.
O systema é, certamente, mau; mas quando isto se faz, quando isto se admitte, ao menos ha energia de opinião e passa-se por cima da questão previa, não se pretende illudil-a com tophismas d'esta natureza. (Apoiados.}
Comprehendo que sejam necessarios, principalmente n'um parlamento para o qual foi necessario que um escriptor distincto inventasse uma palavra para definir o excesso de loquacidade, regras, normas e garantias, que evitem a perda de tempo e o obstruccionismo.
Acceitem, portanto, a solução intermedia que vou propor.
Dêem uma discussão na generalidade, e depois, sobre as bases, uma discussão da especialidade, sobre todas as bases, note se, não digo uma discussão ácerca de cada base.
Isto parece-me ser um termo medio acceitavel.
Regular seria dividir, se quizerem, este projecto, em tres artigos de modo que tenha discussão na especialidade.
No ponto onde se diz: tudo nos termos e condições das bases annexas façam um novo artigo, um artigo 2.°, de modo que haja duas discussões: uma geral e outra em que possam discutir-se todas as bases conjunctamente.
Isto é um termo medio rasoavel.
Seja, porém, com o for o que desejo, pela minha parte, é protestar contra esta continua alteração das boas praxes parlamentares; desejo recordar mais uma vez que os pessimos processos que temos empregados todos, de cá e de lá, têem levado o systema parlamentar ao estado de decadencia em que se encontra.
Tenhamos todos um momento de bom senso. Não é difficil, um momento só.
Vejamos as consequencias deste acto.
Transija o sr. ministro e a maioria; transija a opposição.
Não haja uma discussão na especialidade sobre cada base; abra-se apenas discussão sobre todas as bases; mas dêem uma discussão na generalidade e outra na especialidade.
D'esta fórma, a meu ver, se harmonisarão os desejos da opposição com as exigencias da maioria; d'esta fórma se alliarão as vantagens de uma boa e profunda discussão com o aproveitamento do tempo.
(Interrupção)
Divida s. exa. o projecto e ponha mais um artigo, que tem exactamente o que desejo.
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Haja a discussão na generalidade e depois na especialidade sobre as bases, não para cada uma, mas uma só para todas as bases.
(Interrupção.)
Não peço que concordem com o alvitre; nem eu estou a propor alvitres para a maioria, ou para a opposição; não estou acorrentado a nenhuma fracção da opposição...
Uma voz na esquerda: - Ainda bem.
O Orador: - Para mim; para v. exa. não sei; assim acceito a phrase porque se não fosse para mim era deslocada e, por aggressiva pessoalmente, inconveniente.
O sr. Julio de Vilhena: - V. exa. dirige-se a mim?
O Orador: - Dirijo-me a quem disse ainda bem, quando, pronunciei a phrase, que não estava acorrentado a nenhuma fracção da opposição.
Eu estava fallando em geral, não aggredi ninguem, porque não é esse o meu habito, apenas estabelecia uma questão de princípios...
O sr. Pedro Victor: - Fui eu que disse ainda bem; não foi por desconsideração pessoal, mas porque não tenho furor de pertencer ao mesmo partido a que exa. pertence...
O Orador: - Costumo sempre evitar aqui as questões pessoaes, porque entendo que não se tratam no parlamento.
O sr. deputado diz que não foi por desconsideração pessoal, não tenho rasão para me offender e devo acredital-o.S. exa., entretanto, não comprehendo o serviço enorme que estamos prestando ao governo n'este momento; com a differença que não fui eu que pronunciei a phrase - ainda bem.
Quero deixar bem definida a minha opinião ácerca do incidente que se levantou. Não disse que me honrava ou deshonrava de pertencer a qualquer fracção da camara, assim como não disse que fazia política por furor ou por amor.
Não fallei em nome de qualquer grupo, fallei em meu proprio nome; disse que não estava acorrentado a nenhuma fracção da opposição, e disse o com o pleno direito, que tem de o dizer aquelle que tendo pertencido á maioria, nunca foi acorrentado pelas opiniões governamentaes.
Disse-o em nome da logica que tenho seguido toda a minha vida, e, sé v. ex.ªs me permittem acrescentarei de passagem, talvez com grave quebra dos meus interesses particulares.
Foi em nome d'essa logica que disse e digo que, achando honradas todas as fracções políticas d'esta camara, não estava nem estou acorrentado a alguma d'ellas.
Para que é que n'este momento vem proferir-se uma phrase que póde ser considerada, por todos, não direi uma desconsideração, mas uma phrase duvidosa? Para que?)
(Interrupção do sr Victor Sequeira}
Peço licença para fazer, notas a s. exa. que continúa a fazer uma questão pessoal, o que desejo evitar; nem! vejo, necessidade de a fazer porque é deslocada n'este momento é n'este logar.
Pois eu disse alguma cousa que melindrasse algum grupo político d'esta casa? (Apoiados.)
Disse alguma palavra,, que não podesse ser legitimamente proferida por qualquer Deputado? (Apoiados.)
Então por que são os odios de s. exa. para commigo? Pessoaes não, porque s. exa. acaba de dizer que tem por mim toda a consideração. São odios, partidarios? Se são odios partidarios são muitissimo injustos. Desde 1879 até 1887 trabalhei sempre com a regeneração. (Apoiados.) Desde 1879 até 1887 dei-lhe o meu trabalho, a minha palavra, os meus fracos mas sinceros conselhos, emfim, tudo quanto pude, e em troca d'isso nada recebi nem lhe pedi nada.
Um correligionario d'estes póde não ser lamentado, mas não se escorraça. Não ha rasão para dizer a um homem n'estas condições, que não se quer estar politicamente ao lado d'elle.
Disse uma vez n'esta casa, e repito, que a política de suspeições e de odios era uma fórma jacobina. Declaro a v. exa. que nunca fiz política de suspeições nem de odios. Declaro tambem a v. exa. que quando pessoal e directamente quizer dirigir uma phrase a algum dos meus collegas n'esta casa, correligionario ou não, saberei sempre escolher o local onde assuma completa responsabilidade d'essa phrase e onde ella tenha o seu devido valor.
Nunca pronunciei n'esta casa uma só palavra, que se dirigisse pessoalmente a quem quer que fosse. Nunca! Tenho discutido princípios, idéas e opiniões; jamais, em condição alguma discuti homens. Lamento ter sido exactamente eu o alvo de uma phrase injusta proferida por una homem que acaba de declarar-te meu. amigo.
Voltando á questão prévia, parece-me que podemos chegar a esta transacção, que proponho apenas em meu nome. Discute-se o projecto considerando-o com tres artigos. Divide se o artigo 1.° nas palavras «tudo conforme as bases»... faça-se d'essas palavras em diante um novo artigo e ter-se-ha apenas uma discussão na generalidade e duas na especialidade. D'esta maneira as bases serão discutidas convenientemente sem ser necessario haver dez discussões na especialidade, como aliás seria indispensavel.
Se o meu alvitre for acceite, imagino ter prestado um serviço harmonisando esta discussão; se não for acceite, como no parlamento fallo tambem para o paiz, elle, na parte mais ou menos insignificante, que se occupa com as minhas opiniões e com as minhas idéas, reconhecerá a sinceridade do que faço, e a conveniencia do que proponho.
O sr. Elvino de Brito: - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão quando s. exa. o restituir.)
O sr. Consiglieri Pedroso: - Sentiu que o sr. relator se oppozesse á proposta apresentada pelo sr. Franco Castello Branco, para haver duas discussões, uma na generalidade do projecto e outra na especialidade sobre as bases.
Esta proposta julgava a de todo o ponto justa e necessaria.
Tratava-se de um assumpto de grande importancia, e que não podia ser discutido á pressa, e sem haver ácerca d'elle o estudo devido.
Parecia-lhe que o governo e a maioria fariam bem adoptando o alvitre indicado na proposta.
Lembrava que, quando foi apresentado pelo sr. Hintze Ribeiro como ministro da fazenda do governo regenerador, a proposito da reforma das alfandegas, uma proposta que não tinha a importancia nem a magnitude da que se discutia, a opposição progressista de então, capitaneada e dirigida pelos actual presidente do conselho e ministro, da justiça, não só exigira que houvesse discussão na generalidade; mas, quando tal pedido foi rejeitado, servirá-se d'esse facto para fazer recriminações ao governo, accusando-o até de fazer dictadura no seio do parlamento.
Pois quem assim praticára, não tinha direito a vir pedir que hoje se fizesse o mesmo que tanto criticára.
Parecia-lhe que não havia exigencia mais rasoavel e mais justamente fundamentada, do que a que a opposição apresentava, attenta a gravidade, do assumpto de que se ia tratar.
A questão dos tabacos devia ser tratada com largueza e com, estudo, para não succeder o que aconteceu com a lei de 18 de agosto ultimo!
Pensasse o governo e a maioria na resolução que ia tomar, devendo declarar que o fim da opposição, pedindo que houvesse duas discussões, era no sentido de facilitar a discussão do projecto, e não lhe parecia que, por um subterfugio qualquer, se devesse deixar de considerar a proposta apresentada pelo sr. Franca Castello Branco como uma questão prévia, porque o contrario d'isso seria grave
erro.
(O discurso será publicado na integra quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - A commissão especial encarre-
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gada de dar parecer ácerca do projecto de lei apresentado pelo sr. Silva Cordeiro, será composta dos seguintes srs: Eduardo José Coelho, Silva Cordeiro, Lobo d'Avila, Antonio Candido, Correia Leal, Barbosa Magalhães, Eça de Azevedo, Baptista de Sousa, Julio Pires, Lopo Vaz, Correia Arouca, Julio de Vilhena e Consiglieri Pedroso.
Sua Magestade a Rainha chega á estação de Santa Apolonia ámanhã, ás seis horas da tarde, e por esse motivo a sessão ámanhã abre á uma hora e encerra-se ás cinco.
O sr. Ministro da Marinha (Henrique de Macedo): - Mando para a mesa uma proposta de lei. Visto a hora estar muito adiantada, peço dispensa da leitura do relatorio e passo simplesmente a ler a proposta.
É a seguinte:
Proposta de lei n.º 27-F
Senhores. - Na sessão passada teve o governo a honra de apresentar ao parlamento uma proposta approvando o 'contrato celebrado em 4 de junho do anno findo com Alfredo de Oliveira de Sousa Leal e Antonio de Sousa Carneiro Lara para o serviço de navegação entre a metropole e as províncias de Africa. Essa proposta, que foi convertida na lei de 20 do agosto do dito anno, representava a esperança da realisação de grandes melhoramentos nas communicações com as nossas províncias ultramarinas de Africa, pela duplicação das carreiras para a costa occidental, pela ligação das duas províncias de Angola e Moçambique, e pelo estabelecimento de um serviço com bandeira portugueza que levasse aos differentes portos da costa oriental, a par da rapidez das communicações com a metropole, os elementos para o largo desenvolvimento do seu commercio em proveito dos interesses nacionaes. A experiencia parecia indicar que só uma empreza portugueza, com os capitães indispensaves para a execução de todos estes serviços, que só intimamente ligados e conjugados facilmente se realisariam com probabilidade de resultado, poderia levar a cabo tão patriótico emprehendimento. De prever era que seria preciso vencer muitas difficuldades para reunir os capitães nacionaes para uma empreza d'esta ordem, e que haveria a superar muitos obstaculos primeiro que se podessem conseguir todos os elementos indispensaveis para lhe dar garantias de exito seguro.
Effectivamente os concessionarios não pouparam esforços para chegarem a este resultado e contam já com os capitães necessarios para dar execução ao seu contrato; mas quando conseguiram ver coroados os seus esforços, quando obtiveram a subscripção das quantias precisas para a acquisição dos vapores, era já tarde para que podesse ter cumprimento a disposição 14.ª do mencionado contrato, pela qual, para obterem a prorogação de praso para o começo do serviço definitivo lhes era obrigação provarem que a construcção dos vapores estava começada tres mezes antes.
Assim os concessionarios não poderam, é certo, cumprir o seu contrato no praso n'elle fixado, mas conseguiram reunir os capitães portuguezes necessarios para lhe darem plena execução, logo que lhes seja relevada aquella falta.
A impossibilidade do quebrar a unidade do serviço estabelecido no contrato de 4 de junho de 1887, sem corrermos o risco de cair na situação actual, e do não obter o estabelecimento de uma carreira portugueza de navegação para a costa oriental; a circumstancia muito attendivel de terem os concessionarios já a subscripção de valiosos capitães portuguezes, e a benevolencia com que em geral se tem procedido para com muitas emprezas em casos do não cumprimento de contrato por motivos muito menos attendiveis, parece nos que nos aconselha a mantermos o contrato alludido, embora procuremos dar ao estado garantias efficazes de que elle não deixará, no praso agora fixado, de ser fielmente cumprido.
Assim é que na proposta que o governo tem a honra de vos apresentar, concedendo-se á empreza a prorogação de praso que parece necessaria para que possa habilitar-se devidamente para dar execução definitiva ao seu contrato, se exige a elevação do deposito a 80:000$000 réis. O deposito do contrato actual era de 9:000$000 réis. Pareceu que d'este modo se asseguraria o estabelecimento do serviço tão importante que todos desejam ver realisado; porque, embora possa julgar-se excessiva esta elevação do deposito, é certo que, dispondo a empreza dos capitães necessarios, e dos elementos requeridos para o desempenho do seu contrato, não póde ter difficuldade em garantir com aquella quantia o cumprimento das suas obrigações.
JulgAmos, em presença d'estas considerações, que merece a vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a manter, com as seguintes modificações e condições, o contrato celebrado em 4 de junho de 1887 pelo ministerio da marinha com Alfredo de Oliveira de Sousa Leal e Antonio de Sousa Carneiro Lara, para o serviço de navegação entre a metropole e as províncias de Africa, e approvado por carta de lei de 20 de agosto do dito anno:
l.ª O serviço nos termos e condições do mesmo contrato começará dentro de um anno, a partir da data da presente lei.
2.ª A empreza, terminado o praso assim fixado, começará desde logo o serviço definitivo, não lhe podendo aproveitar, sob qualquer pretexto, a excepção consignada no artigo 14.° do dito contrato.
3.ª A empreza, antes que o governo use da auctorisação contida no presente artigo, elevará o seu actual deposito de 9:000$000 a 80:000$000 réis, ficando em vigor, com relação a este novo deposito, todas as condições estabelecidas no contrato quanto ao deposito actual.
Art. 2.° Provisoriamente e até que comece o serviço a que se refere a condição l.ª do artigo antecedente, fica o governo auctorisado a contratar o serviço do navegação entre a metropole e a costa de Africa Oriental, e o de ligação entre os portos da província de Moçambique, nas condições em que estes serviços têem sido realisados nas ultimas viagens.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrato.
Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 26 de março de 1888. = Marianno Cyrillo de Carvalho = Henrique de Macedo.
Foi enviada ás commissões de marinha e fazenda
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que vinha para hoje.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarde.
Redactor = Rodrigues Cordeiro.