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Não tenhamos tanta facilidade em accusar os rigores que n'um paiz onde a cultura não foi prohibida, o fisco julga indispensavel empregar para não inutilisar completamente a legislação em vigor, e faça-se justiça a essa legislação; é assombroso em França, o resultado do augmento da receita proveniente do tabaco, não obstante a existencia da cultura, que, na opinião dos illustres signatarios d'este projecto, não póde existir sem matar completamente o rendimento de que se trata.

Como disse, não se trata do triumpho de nenhum principio. Neste ponto, já que é preciso citar nomes para tudo, o illustre deputado que me precedeu lembrou á camara que nomes illustres se contam a favor de qualquer solução que se apresente a respeito d'esta questão.

Contam-se, por exemplo, entre nós a favor da arrematação do contrato do tabaco, os nomes os mais illustres, porque não haverá ninguem que dispute ao Manuel da Silva Passos a distincção a que lhe davam direito as suas virtudes e illustração. Toda a camara lhe presta este testemunho, que o paiz inteiro está prompto a dar (apoiados).

Nem na questão da régie falta o testemunho de um caracter illustre que a morte roubou a esta camara e ao paiz, e que não póde ser suspeito a ninguem, porque foi sempre defensor extrenuo da liberdade, e comtudo não julgou irreconciliavel o systema da régie com os principios da verdadeira liberdade. Fallo do sr. José Estevão.

Eu disse que a consideração financeira influe na resolução d'este projecto, e sinto que nos vejamos na necessidade de decidir esta questão na occasião da existencia de um deficit. E esta circumstancia é independente de certo da vontade do illustre ministro. S. ex.ª estava diante da necessidade de providenciar sobre este assumpto, e não póde ser accusado do que fosse o ardor da sua imaginação que lhe suggerisse a necessidade de providenciar sobre um ramo de administração que tinha um termo natural. Effectivamente haviamos de fazer alguma cousa a este respeito, e alguma cousa havemos de fazer. A tentativa porém parece-me a mais arriscada, pela natureza do expediente que se escolheu.

Mas a existencia de um deficit que o sr. ministro da fazenda calculou em 2.300:000$000 réis, é uma circumstancia seria. Não digo que seja uma circumstancia absoluta e despotica; não digo que um paiz deixe de dar um só passo no caminho do progresso depois de verificar que assim progride, porque o ameaça e intima que não avance o algarismo de um deficit qualquer; mas tambem é verdade que os homens de estado, os financeiros devem attender a essa circumstancia, e a prudencia pede que não seja n'essa occasião que se intente mudar radicalmente uma abundante fonte de receita; e logo examinarei até que ponto se póde considerar importante a modificação apresentada no projecto.

Devo dizer a v. ex.ª que a consideração suggerida pelo illustre ministro da fazenda, de que vamos conseguindo o equilibrio entre a nossa despeza ordinaria e a nossa receita ordinaria, não é tão forte que tire completamente á existencia do deficit a sua significação pouco agradavel.

Não digo que as rendas publicas não tenham augmentado, e que esse augmento não seja um symptoma favoravel, porque fôra desconhecer a verdade. Seria para mim a maior das responsabilidades desconhecer a verdade neste ponto, seria mesmo negar me a um sentimento natural de satisfação que tenho em poder consignar esse facto, porque pertencendo a esta nação, a dizer a verdade toca-me moralmente, quando não materialmente, uma parte, um quinhão, um dividendo no desenvolvimento da nossa prosperidade.

Mas dizia eu que — o equilibrio entre a receita e a despeza corrente não é uma consideração tão procedente como á primeira vista se podia apresentar. Em primeiro logar nós temos a necessidade de consagrar annualmente uma somma para a construcção das nossas estradas. Mesmo sem nos lançarmos nas emprezas mais arriscadas... mais arriscadas? De certo que o não é esta; precisâmos indispensavelmente por anno de 1.000:000$000 réis para as nossas estradas, e creio que não póde haver exigencia mais modesta em relação ás necessidades do nosso paiz (apoiados).

Está claro pois que essa somma de 1.000:000$000 réis, pelo menos, que não podemos deixar de consagrar aos melhoramentos das nossas communicações, é um algarismo constante que tem de acompanhar o orçamento ainda por muito tempo. Devemos contar com ella, e que seja despeza ordinaria ou despeza extraordinaria, para mim é a mesma cousa, é uma despeza indispensavel durante muitos annos (apoiados).

Ha ainda outras sommas. Temos, por exemplo, os creditos supplementares. Esses é que mal se póde dizer que são despezas extraordinarias, visto que se repetem todos os annos. E tanto isto é assim que o orçamento francez na distincção que estabelece entre despezas ordinarias e despezas extraordinarias não comprehende essa verba. Todos sabem, melhor do que eu, que uma das reformas introduzidas pelo actual ministro da fazenda de França, foi supprimir completamente essa verba do orçamento, e nós queremos considerar como despeza extraordinaria uma verba com que em França se não conta, porque se considera já incorporada nas despezas dos diversos ministerios, convenientemente dotados para esse fim. O mesmo poderia dizer a respeito de se votar como despezas extraordinarias subsidios que todos os annos se pedem para o ultramar.

Por consequencia se effectivamente temos um deficit fixado, e fixado por ora no minimo, se esse deficit não póde desapparecer por se dizer que são despezas ordinarias as extraordinarias, porque são sempre despezas infalliveis, regulares e devemos contar com ellas dentro de um certo numero de annos, precisâmos de procurar por todos os meios a existencia de receitas que façam face a essas despezas, sem de modo algum comprometter aquellas que estão consignadas para outros fins.

E note-se que o calculo das nossas receitas por ser feito, como não póde deixar de ser, com antecipação, não apresenta uma exactidão que comprehenda todas as contingencias do futuro.

É assim que eu não tenho satisfação alguma em ver, mas não posso por dever occulta-lo, que o movimento das nossas alfandegas nos ultimos oito mezes não corresponde ao augmento de 14 por cento com que se contou no orçamento para o seu augmento annual. Parece-me que esse calculo não é muito a probabilidade normal do augmento da receita das nossas alfandegas, pelo menos segundo os ultimos dados estatisticos, que são aquelles por que se póde fazer mais obra, principalmente desde que se adoptou no orçamento calcular a receita das alfandegas pelo exercicio dos ultimos annos. Não digo que a idéa seja má, basta que isso se faz lá fóra.

O sr. ministro porém calculava que as alfandegas renderiam no anno de 1864-1865 mais 480:000$000 réis do que no anno de 1863-1864 que s. ex.ª suppunha dever ter já augmentado em igual somma relativamente ao anno de

1862-1863.

Ora, o augmento do rendimento já publicado nos primeiros oito mezes do actual anno economico, em relação aos oito mezes correspondentes do anno economico anterior, foi só de 120:000$000 réis; o de certo por aqui se pôde calcular que o ultimo quartel está longe de poder produzir o que falta para completar aquella somma. Seguindo a receita na mesma proporção teremos no fim do anno de

1863-1864 um augmento de 180:000$000 réis em relação ao anno anterior, ou uma differença de 300:000$000 réis do que se calculava para este anno, sendo necessario, para que os calculos não falhassem, que o futuro anno economico nos desse um augmento de 600:000$000 réis.

Mas toda a gente se engana. E tambem a mim cabe a responsabilidade de que, quando fui ministro, a realidade não correspondeu ás minhas esperanças e ás dos meus collegas, no que diz respeito ás probabilidades do orçamento das contribuições indirectas. Quando porém apparecem os factos desapparecem as probabilidades que elles contrariam.

Estas considerações nada têem de estranho e de improprio na discussão de que nos occupâmos.

O Diario de Lisboa publicou ha alguns mezes documentos relativos á questão do tabaco no reino vizinho, aos quaes está claro que o governo não deu publicidade senão por entender que elles illustravam a discussão, e podiam servir para a apreciação da medida, que se propunha.

N'esses documentos, o ministro da fazenda hespanhol, que em 1855 propunha a abolição da administração do tabaco por conta do estado, dizia: «Assegurámos os pagamentos em dia aos funccionarios; desappareceu o deficit: apresento pois ás côrtes esta proposta importante sobre a modificação de um dos ramos da nossa fazenda». Ha até o que quer que seja de ingenuidade no modo por que aquelle cavalheiro recommenda a medida de que se trata, quando diz: «As circumstancias são favoraveis, assegurámos o pagamento aos funccionarios».

No nosso paiz existe felizmente ha alguns annos consagrado esse principio. Entre nós essa circumstancia favoravel para os servidores do estado, não o é menos para o credito do paiz, porque não podiamos aspirar a ter uma especie de credito senão podessemos fazer face aos recursos exigidos pelo serviço ordinario do pessoal das nossas repartições do estado.

Assegurados os pagamentos em dia aos funccionarios do estado, extincto o deficit, era a occasião de apresentar um projecto que garantia todas as eventualidades, e dava a certeza de que o estado não perdia nem um real (real hespanhol) da importancia do rendimento de que se tratava, porque dizia aquelle cavalheiro: Qualquer deficit seria indesculpavel.

E indesculpavel qualquer deficit quando se reforma a legislação sobre tabaco; logo é necessario que nós tenhamos a certeza antecipada de que nem um real (portuguez) se ha de perder na mudança do rendimento de que se trata.

O illustre deputado que me precedeu tambem se referiu a estes documentos, que de alguma fórma são o commentario da medida de que tratâmos.

Propõe-se entre nós a liberdade do commercio do tabaco, porque em Hespanha no anno de 1855 se propoz casa liberdade, que não passou. E ali foi ella então proposta, pela necessidade de proseguir no caminho das reformas, porque havia sido proposta em Portugal no anno de 1853.

É notavel que n'aquella nação se propozesse uma reforma pela necessidade de proseguir no caminho das reformas, porque se ía adoptar em Portugal; e que entre nós sirva de argumento para a necessidade da adopção d'esta medida o ter-se em 1855 apresentado em Hespanha um projecto para a liberdade do tabaco!

Mas vejamos as circumstancias. Desde que o Diario de Lisboa entregou á publicidade estes documentos e chamou para elles expressamente a nossa attenção, a camara não ha de entender que é prolixo ou inconveniente da minha parte lembrar lhe alguns pontos d'esses documentos.

Em primeiro logar, em novembro de 1855 apresentou-se em Hespanha um projecto para que podesse haver commercio livre de tabaco, de julho de 1857 em diante.

Achará a camara que a antecipação com que n'aquelle paiz se chamava a attenção dos poderes publicos para um ramo d'esta ordem, seja uma circumstancia que não devesse merecer toda a consideração dos legisladores de qualquer paiz?

Eu entendo que uma grande recommendação do acto d'aquelle ministro era de certo a antecipação com que elle propoz a medida que queria que fosse adoptada.

O que resultou d'aqui? Resultou que esta medida proposta em novembro de 1855 foi entregue a uma commissão do parlamento, a qual só apresentou o seu parecer em junho de 1856, creio eu.

Dizia o ministro de Hespanha n'aquella epocha o seguinte:

«Deve tambem ser mettido em linha de conta o termo dos contratos que o governo tem celebrado».

Mas esta não era a unica rasão da antecipação. Acrescentava no mesmo relatorio aquelle cavalheiro:

«Deve tambem ser mettido em linha de conta o tempo que naturalmente empregarão as côrtes no exame do projecto, de modo que quando mesmo ellas desenvolvam a maior actividade, terá já decorrido uma boa parte do anno de 1856 antes de ser convertido em lei o referido projecto.»

Aquelle cavalheiro entendia que a discussão deste projecto requeria tal attenção e tão seguido e detido exame da parte do parlamento, que parecia necessario consagrar-lhe seis mezes de exame para poder contar com que fosse votado. E não faltavam esclarecimentos no relatorio ministerial, e esses esclarecimentos eram tanto mais importantes quanto era certo que provinham da administração do tabaco que o governo tinha a seu cargo.

Mas ha mais. Dizia ainda aquelle ministro, e eu peço para este ponto a attenção da camara, o seguinte:

«E alem d'isso é necessario dar tempo a que a industria e o commercio se preparem, reunam fundos e criem estabelecimentos proprios para a sua laboração. De outro modo a passagem de um para outro systema far-se-ía com precipitação indesculpavel por falta de tempo; não se occorreria talvez ás necessidades do paiz, e as transacções mercantis neste ramo, feitas prematuramente, dariam motivo a oscillações sensiveis nos mercados e em prejuizo dos consumidores.»

Estas considerações do ministro da fazenda hespanhol, que foram publicadas no Diario de Lisboa, parecem me importantes.

A primeira — de que as côrtes devem consagrar toda a sua attenção a este projecto, parece-me que não precisa demonstrar-se.

A segunda tambem não precisa de demonstração. Entretanto não se pôde deixar de insistir na sua significação; e tanto mais que algumas observações que têem sido apresentadas para combater a opinião contraria, não me parece que tenham o menor fundamento.

Pois diz-se, tem-se dito e escripto neste e em differentes relatorios que = não era necessario que se estabelecesse com antecipação uma discussão a este respeito, porque nenhum transtorno virá aos negocios commerciaes d'aquelles que têem de concorrer á nossa praça =. Direi uma cousa. Como podemos nós saber o tempo que precisam as emprezas commerciaes para que effectivamente a liberdade do commercio não seja uma ficção? Eu estou persuadido de que nós vamos decidir este negocio na vespera do dia em que terminar o monopolio, senão for no dia seguinte; e acontecendo assim, o monopolio não existirá de direito, mas existe de facto (apoiados).

Direi mais, e fallo com toda a sinceridade, porque entendo que n'um assumpto d'estes a sinceridade é não só um dever em relação á moral, como em relação á conveniência— que não acredito na possibilidade de discutir o projecto que foi apresentado, como se deve discutir um assumpto tão importante, no pouco tempo que resta até ao praso em que termina o contrato. Em 1 de maio cessa o actual contrato, e pouco menos será preciso ao parlamento para discutir. Demais, este projecto depende de regulamentos, e regulamentos importantes, como elle mesmo reconhece, e não era necessario que o declarasse, porque ha uma disposição geral da carta que diz (leu). Mas o projecto com rasão achou tão importantes os regulamentos que, apesar da carta o dizer, não entendeu que repeti-lo fosse um pleonasmo constitucional.

Pelo artigo que está no projecto entendeu-se que não bastava a disposição da carta. O artigo do projecto diz (leu). Sabe v. ex.ª quaes são estes regulamentos? É a organisação dos serviços necessarios para se fiscalisarem as receitas provenientes d'este ramo de administração. Diz-se que = se tem toda a confiança em que o governo ha de estabelecer um bom systema de fiscalisação; e suppomos que será passando os empregados do contrato para as ordens dos directores das alfandegas, porque n'um d'estes artigos se diz que = o pessoal da fiscalisação do contrato se incorporará no pessoal das alfandegas =.

E estará tudo feito fazendo-se isto? Quem ignora que a administração do contrato do tabaco é um corpo independente do das alfandegas, com chefes seus, com repartições independentes, com fiscaes independentes, com uma organisação toda independente da das alfandegas? E sendo assim, dando-se uma simples disposição de que fica incorporado na fiscalisação da alfandega, sem se attender a mais nada, ter-se-ha alcançado o que se deseja? É preciso não confundir a hierarchia de uma administração com a hierarchia da outra, é preciso attender ás circumstancias especiaes que se dão e devem dar na administração de um dos ramos que maiores receitas póde trazer ao thesouro, e isto não se póde fazer de repente, não se póde regular dentro de um mez (apoiados). Não é possivel, ou então não havemos de discutir o projecto.

Quer V. ex.ª saber o que aconteceu no reino vizinho? A commissão, a que foi incumbido o exame de um projecto identico, começou por declarar que — o meio unico para se tratar e decidir, como devia ser, um assumpto de tal ordem, era abrir um inquerito. Eu lamento que nós, pertencendo a uma nação que se diz tão adiantada, não tivesse-