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Discurso na sessão de 15 de março, que devia ter logar a pag. 786, col. 2.ª, lin. 68.ª

O sr. Santos e Silva: — O regimento manda ao orador, que pede a palavra sobre a ordem, começar por ler a moção que tem de apresentar. E exactamente o que vou fazer (leu).

Sr. presidente, a: rasões que tive para não aceitar o augmento extraordinario do imposto de viação, são as que me assistem para declinar a responsabilidade do projecto que esta em discussão.

Não voto impostos ao governo, emquanto os nossos homens d'estado se não curarem do prurido de fazer reformas ou melhorar serviços publicos, que se traduzam por encargos do thesouro. Estas palavras são ministeriaes; estão escriptas n'um dos ultimos relatorios do sr. ministro da fazenda.

É sina minha, sr. presidente, que, quando me preparo para ser ministerial, é exactamente ria occasião em que os relatorios, as palavras, o pensamento e a logica dos srs. ministros me obrigam a votar contra o governo!

Se as economias e reducções no orçamento são as questões previas, na opinião da actual administração para justificar o pedido do imposto, venham primeiro essas economias, venham primeiro essas reducções, mas em todos os serviços, em todos os ministerios; discutam-se, approvem-se, e depois examinaremos e apreciaremos o pedido do imposto.

Este é o reducto em que me entrincheirei por occasião da discussão do imposto de viação; é um valioso meio de guerra para atacar o presente projecto sobre o imposto geral de consumo; e tenho a consciencia, sem desvanecimento e sem vaidade, de que não fui nem serei facilmente desalojado ou vencido. V. ex.ª e a camara bem veem que combato com as armas e forneço-me no arsenal do proprio governo.

O nobre ministro da fazenda, n'um dos seus ultimos discursos, que pronunciou n'esta casa, em defeza do imposto de viação, fez-nos uma seductora resenha de todas as economias, de to las as reducções que elle e os seus collegas fazem ou vão fazer pelos seus respectivos ministerios. Não fez menção, naturalmente por lapso de memoria, porque não quero attribuir este descuido a algum proposito, da reforma do ministerio dos negocios estrangeiros. Apesar de ser uma questão finda, torno a liberdade de levantar do chão esta engeitada do nobre ministro da fazenda e da guerra, e de a recommendar á camara como o mais acabado typo de todas as economias e reducções que vão dar entrada no nosso orçamento. Mas se é facto, e não me cansarei de insistir n'este ponto, se é facto, repito, que todas as reformas pendentes, e todas as promettidas, se traduzem, segundo diz o governo, e segundo affirmam os defensores dos seus projectos, em allivio do thesouro, e tendera a attenuar o deficit, venham essas medidas; conveçam-nos com a eloquencia dos facto; destruam os meus receios o os meus pressentimentos; açaimem as agitações do paiz; provem que a opposição parlamentar nas suas casas, as populações importantes, que representam em massa contra o governo, e, finalmente, todos nós, andámos caminho errado, e apreciâmos mal e inexactamente o pensamento governamental (apoiados).

Aqui anda necessàriamente entremettido algum genio mau a contrariar as excellentes intenções do governo, e tambem as minhas que não são más. Quando o governo começava a obedecer às minhas indicações, quando começava a obedecer ás intimações da opinião publica, quando nos preparávamos para discutir uma daquellas medidas que, na opinião do illustre ministro das finanças e da respectiva commissão, trás uma reducção de vinte e tantos contos de réis, convertíveis desde já em saldo positivo ou receita effectiva; quando esperávamos a discussão da reforma do ministerio da fazenda, eis que da presidencia baixa a ordem de interrompermos a sua discussão e do darmos um salto perigoso do projecto n.° 15 para o n.° 24!

Veja V. ex.ª que tal é a fatalidade que nos persegue! Até a pobre arithmetica de Bezout tem soffrido n'esta quadra tratos do polé! Até a têem humilhado nas suas vaidades, ou nos seus justos direitos de preeminencia! Narro um facto, não faço accusações. É historia parlamentar, ou antes regimental, e nada mais.

A brilhante e risonha synopse que o sr. ministro da fazenda nos fez aqui ha poucos dias das importantes economias que estão presas ás reformas ministeriaes, fez vacillar um pouco a minha consciencia. Creio que na opinião de s. ex.ª ou não ha ou são poucas as medidas que trazem encargos para o thesouro! Rasão logica, «r. presidente, rasão poderosíssima para eu pedir, com todo o vigor da minha voz, a discussão previa d'essas medidas.

Quero desencarregar a minha consciencia, quero habilitar-me para votar o imposto. Antes d'isso não. Em questões d'esta ordem não posso louvar-me nas palavras, promessas ou affirmações do governo ou de uma commissão, por mais respeitaveis que sejam. Quero o exame, a discussão previa, a approvação das economias e reducções (apoiados). Quero a logica e nada mais (apoiados).

Não são os meios que nego ao governo. Não me arvoro nem nunca me arvorei em apostolo de certa doutrina, que parece ter sido em outro tempo o mote de um partido que tende, como todas as cousas d'este mundo, a transformar-se. Eu nunca disse, nem direi, que o povo não póde pagar mais.

Sou homem do meu tempo, e se não declino a responsabilidade que me possa advir na solidariedade politica, que pertence a todos os filhos de uma nobre, heroica e gloriosa familia que se chamou partido setembrista ou historico, tambem não posso hoje aceitar idéas que não sejam d'esta epocha, principios que porventura o progresso da civilisação condemna e expedientes politicos ou estratégias parlamentares, que podem ser excellentes para revezar homens no poder, mas que não são de certo os mais adaptados para attenuar os gravissimos males de que esta padecendo a republica (apoiados).

Peço o cumprimento do programma ministerial. Nada mais, na la menos.

Em primeiro logar as economias, depois o imposto; mas o imposto rasoavel, o imposto em harmonia com as forças do contribuinte (apoiados) e com as verdadeiras e urgentes necessidades publicas (apoiados).

Se for necessario, por fim, recorrer ao credito, não tenho duvida em votar tambem esse meio. Ainda não ha um anno que dei aqui uma prova authentica da minha indole governamental. Votei um emprestimo ao governo, e votei-o sem perguntar á opposição como queria votar; votei-o porque na minha consciencia entendi que não devia negar, naquella occasião, meios ao governo. Votaria por consequencia hoje tambem o imposto, senão entendesse que o governo tinha obrigação de satisfazer primeiro ao seu programma (apoiados). Estão, n'esta questão, empenhadas a sua palavra e a sua seriedade (apoiados).

É necessario examinar, prèviamente, até que ponto são urgentes, indispensaveis, as reformas que porventura se traduzam em augmento de despeza, e vão absorver uma grande parte do imposto que se pede ao paiz (apoiados).

Não monopolisem para si o amor pelos melhoramentos da nação. Ha mais quem ame o progresso moral e material da terra em que nasceu. Dizem que parar é morrer! Será; mas não lancem, com a phrase, insinuações odiosas a ninguem. Parar é morrer, quando se pára para sempre, ou quando se pára para retrogradar. Mas parar é viver, quando pára, para não caír no abysmo que se vê debaixo dos pés (apoiados). Parar é viver, quando se trata de sondar primeiro o terreno que se tem de atravessar. Parar é viver, quando se prefere a prudente inspecção das cousas publicas á vertigem de subscrever o seu nome a reformas inopportunas em presença do estado assustador da fazenda publica (apoiados). Parar é viver, quando o sr. ministro das obras publicas diz n'esta casa: «Hei de fazer caminhos de ferro, mas quando o thesouro me fornecer meios para isso; quando as nossas finanças estiverem em melhor estado. Não posso satisfazer a todos os pedidos dos srs. deputados sobre melhoramentos publicos, porque é preciso primeiro habilitar o paiz com meios para poder satisfazer estes encargos». Aqui esta o que é parar para viver. Morre-se ás vezes quando se pára; mas tambem se pára, muitas vezes, para não morrer (apoiados).

Quando, em presença de um deficit, que se aggrava todos os annos, e encaminha á bancarrota, se aceitam medidas luxuosas, que avoluma a despeza orçamental, morre-se. Quando se pede aos poderes publicos, que parem no errado caminho de reformar serviços, augmentando os encargos do thesouro, pára-se, por algum tempo, para viver. Aqui esta, na minha humilde opinião, e attento o estado da nossa fazenda publica o que é parar e o que é morrer (apoiados).

Não joguem os dados sobre a túnica do paiz. Isto não é só de um partido, de um grupo ou de um governo. Isto é de nós todos, governantes e governados.

Se o governo chegasse ao parlamento, e demonstrasse que fizera economias e reducções, até onde fôra possivel faze-las; melhorara serviços publicos, mas sem acrescentar os encargos do thesouro; e que, ficando-lhe a descoberto um deficit de alguns milhares de contos de réis, pedia meios para pagar despezas impreteriveis, declaro solemnemente a V. ex.ª e á camara, que votaria receita ao actual ministerio, salva a analyse dos meios ou do imposto que elle escolhesse para saldar os onus orçamentaes. Não faço politica em finanças. Encaro e estudo as questões de administração publica como sei e como posso.

Não teme o governo a confrontação dos seus actos com o que se pratica n'outros paizes, e trouxe-nos o nobre ministro da fazenda os exemplos da Italia.

Peço licença a s. ex.ª para não aceitar comparações com um paiz que está n'uma posição excepcional, e entregue aos grandes esforços de reconquistar a sua unidade e de firmar a sua liberdade.

Lastimo que o governo, para acobertar a falta de cumprimento do seu programma, e das suas promessas, fosse buscar confrontações a um paiz que esta numa posição anormal, e que precisa de enormes e impreteriveis sacrificios para recuperar a sua independencia e assentar em bases solidas a sua liberdade! Em Italia nenhum ministro, nenhum governo, andou, quasi dois annos, em cem discursos e relatorios, a prometter, como questão previa, reducções e economias que justificassem o pedido do imposto. A questão suprema da Italia tem sido, até hoje, a unidade e a independencia pela guerra; e n'estes fastos extraordinarios de salvação publica, nem se poupam sacrificios, nem ha tempo para escolher meios.

Tem sido, sr. presidente, aggredida a opposição de pretender embaraçar systematica o governo. Não é verdade. Accusam-na, por outro lado, de que não vale nada, anda desnorteada, é contradictoria, e está indisciplinavel! Vejam em que ficam; vejam o governo e a sua maioria em que accordam. Cuidado com as contradicções, porque é facil mostrar onde ellas estão.

A opposição valerá pouco, mas é aqui n'esta casa, o echo da opinião sensata e illustrada do paiz! (apoiados); e essa opinião geral já conseguiu que o governo reconsiderasse sobre a guarda civil (apoiados). Havemos de ter guarda civil, segundo nos prometteram os srs. ministros do reino, guerra e fazenda, mas sem que os encargos do thesouro sejam augmentados n'um ceitil. A despeza que se faz com a guarda municipal, junta ás economias que se fazem no exercito, ha de dar para os encargos da guarda civil. Para alguma cousa serve pois a opposição; não a maldigam, não queiram monopolisar para si o amor do paiz.

Vem agora a proposito dizer algumas palavras em resposta a um distincto orador que hontem occupou a tribuna. Não sei se s. ex.ª esta presente; mas como o que vou dizer a seu respeito não é nem podia ser por fórma alguma offensivo, não só porque não é da minha indole aggredir ninguem, mas principalmente pela muita consideração e estima que tenho pelo seu caracter, talentos e altas qualidades, posso, na sua ausencia, apresentar á assembléa as minhas breves reflexões.

Orou o sr. Mendes Leal com notavel correcção, como sempre, alteza de conceitos e galas de estylo, como distincto homem de letras, que incontestavelmente é. Quiz, de certo, s. ex.ª fazer uma agradavel surpreza á camara quando hontem aqui nos disse que = nem era financeiro, nem economista, nem politico =. O seu notavel discurso, afóra uma parte que se póde classificar de historico - politica, versou especialmente sobre cifras, a que de certo s. ex.ª não tem tanto horror, como nos disse, sobre impostos, sobre finanças e sobre economia publica.