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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Se effectivamente o numero de metros cúbicos que mandei pagar era o que existia, se o preço pelo qual se mandou pagar era aquelle que estava no contrato, e se o contrato era legal, eu tenho muito prazer em assumir a responsabilidade d'este grande escandalo, e em responder por ella para todos os effeitos que o parlamento quizer.

Conforme disse a v. ex.ª o facto de ter saído do governo não me absolve do nenhuma responsabilidade a que os meus actos possam ter dado logar; estarei sempre diante d'cila em qualquer circumstancia da minha vida para responder por todos os actos que pratiquei durante o tempo em que me cabe responsabilidade nos conselhos da corôa.

Ha outro facto que peço á camara que tome em consideração.

O sr. deputado disse, que sabia que os motivos não eram estes, mas outros, e não só os sabia elle, mas sabia-o lodo o districto da Horta.

Diga o sr. deputado quaes são esses motivos.

Uma voz: — Muito bem.

O Orador: — Emquanto fui ministro um dos casos mais afflictivos que tive de resolver foi este da doca da Horta.

O sr. deputado effectivamente deu-me uma exposição muito bem deduzida de tudo; e eu tive um horror tal pelo modo porque estavam administrados e geridos os dinheiros do ministerio das obras publicas, que me dirigi ao sr. presidente do conselho pedindo-lhe que tratasse de me substituir porque eu não queria mais servir.

O sr. duque d'Avila, então marquez d'Avila, fez-me a honra n'essa occasião de me dizer que procedesse eu como entendesse em todos os negocios de moralidade e para evitar a pilhagem dos dinheiros publicos, porque elle me dava a sua palavra que me havia de sustentar.

Com effeito sustentou-me, cumpriu honradamente a promessa que me fez.

Mais de uma pessoa, mais de um amigo, sabe que isto é verdade; e muitos d'elles fizeram para commigo as instancias que poderam para que então tivesse cedido do proposito de me exonerar de uma responsabilidade, da qual v. ex.ª está vendo quaes são as consequencias e os perigos a que estou todos os dias sendo submettido e arrastado.

Eu entendi quando tomei a responsabilidade de ministro, que o unico meio que a nação portugueza linha de ser igual ás difficuldades com que estava lutando, e com que tem do lutar, era unicamente por actos de moralidade, economia e de boa administração, chamar a si e conciliar a opinião do paiz, para que elle fizesse os sacrificios que são indispensaveis para mantermos o credito dos nossos fundos, para solver as obrigações que já temos contraindo, e para fazer respeitar os direitos incontestaveis, que temos, á manutenção da nossa nacionalidade.

Saindo do governo posso assegurar a v. ex.ª que me senti completamente alliviado da immensa responsabilidade que durante onze mezes compartilhei com os meus collegas, responsabilidade e tormento que não desejo nem aos meus maiores inimigos.

Vejo, porém, que a situação que nos veiu succeder, em vez de arcar de frente com as obrigações que lhes são impostas, se occupa unicamente de manter e accender odios pessoaes, do fazer constantemente provocações, e de restaurar toda a qualidade de abusos, que procurámos reprimir.

Como eu tenho sido interrompido agora por um sr. deputado, que é membro da commissão de fazenda, e que vejo sentado nas bancadas superiores, direi que os escandalos, que as immoralidades revoltantes existem, pullulam e crescem por toda a parte, (Apoiados.) e de uma maneira tal que é indispensavel que, se o parlamento o não quizer fazer, a nação portugueza se lembre do pôr um dique a este desvario. (Apoiados)

Não é só na questão das arrematações da madeira, nem da pedra, nem da cal, nem da areia, nem de tudo isso de que o paiz já tem conhecimento e de que espero que ainda terá conhecimento mais cabal; é tambem dentro das secretarias d'estado que e preciso ir procurar os escandalos. (Apoiados.)

No ministerio da fazenda distribue-sc permanentemente em gratificações annuaes a quantia de 20:098$504 réis a empregados da direcção geral das contribuições directa, da direcção geral das alfandegas, da direcção gera! dos proprios nacionaes, da direcção geral da contabilidade, da direcção geral da thesouraria e do tribunal do contas. (Vozes: — Ouçam, ouçam.)

Alem disto distribue-se em gratificações extraordinarias a quantia de 8:130$000 réis.

Veja v. ex.ª que só no ministerio da fazenda se distribuo illegalmente uma somma de perto de 29:000$000 réis annuaes pelos empregos d'aquelle ministerio. (Vozes: — Ouçam, ouçam.)

O sr. Carrilho: — Porque não acabou v. ex.ª com isso?

O Orador: — Eu tenho aqui a folha do orçamento do ministerio da fazenda, que foi confeccionado quando o sr. José de Mello Gouveia era ministro d'aquella repartição; e, como o sr. deputado me pergunta a rasão porque não acabei com estas gratificações, direi que a rasão é que não fui ministro da fazenda. (Apoiados.)

No dia em que fosse ministro da fazenda, e foi talvez por isso que o não fui, eu teria feito ás gratificações do ministerio da fazenda o mesmo que fiz ás gratificações do ministerio das obras publicas; porque no ministerio das obras publicas todas as gratificações e ajudas do custo que se tiravam das obras, e que se davam sem auctorisação legal, furam todas supprimidas, excepto... (Sussurro.)

Os illustres deputados sabem que as gratificações por serviços extraordinarios, não são gratificações permanentes.

O sr. Carrilho: — E a legalidade? O Orador: — -A legalidade lá existo, por que ha uma verba para despezas eventuaes, que é applicada para esse fim.

Uma voz: — Por isso se gastaram 20:000$000 para despezas eventuaes.

O Orador: — Os illustres deputados lêem á sua disposição os archivos das secretarias, o podem pedir os documentos pelos quaes consto quaes as gratificações que mandei dar. (Apoiados.)

Assuma cada um a responsabilidade que lhe pertence, e se a maioria d'esta casa está tão resolvida a propugnar poios principios de moralidade e justiça na administração o gerencia das cousas publicas, faça-o, mas não me queira impor a responsabilidade de actos pelos quaes não sou do maneira alguma culpado.

E seja-mo licito agora dizer que me admiro muito de que uma interpellação que dirigi ao sr. ministro das obras publicas ácerca dos negocios da penitenciaria central, nao tenha ainda achado graça perante s. ex.ª para se dar por habilitado para responder a ella; mas como existo uma commissão de inquerito parlamentar, desejaria, visto que estamos no penúltimo dia da sessão ordinaria, que qualquer membro d'essa commissão esclarecesse a camara (Apoiados.) ácerca do que tem apurado no inquerito, porque não era mau que o paiz, antes de se fechar o parlamento, podesse saber se me cabe, ácerca dos actos da penitenciaria, a mesma responsabilidade que o sr. deputado me quer impor ácerca dos actos da doca do Faial.

E, concluindo, peço desculpa á camara de lhe ter tomado mais tempo do que desejava com este assumpto, mas a camara comprehende que não era decoroso para mim, nem para ella, que um membro do parlamento ficasse silencioso diante de accusações de tão subida gravidade. Vozes: — Muito bem.

O sr. Presidente: — São horas de se passar á ordem do dia, mas...

(Sussurro.)