946 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Vá a responsabilidade a quem toca e o paiz fará a devida justiça a quem a tiver.
Não é só vir para aqui o sr. Arroyo tomando sessões e sessões sobre os acontecimentos do Porto e outros que inventa, repisando as mesmas cousas todos os dias, formulando as mesmas queixas, usando os mesmos já conhecidos e estafados adverbios e adjectivos antes da ordem do dia, na ordem do dia e depois, e sempre, e a proposito de tudo, como ahi temos visto.
E o sr. Franco Castello Branco, com a celebre questão do governador civil de Braga, fallando todos os dias e a todas as horas, intercalando esta magna questão entre outras, fazendo-a reviver e não se contentando nunca com a resposta dos srs. ministros, levando o seu amor de rhetorica até fazer o que aqui ainda ninguem fez, pedir a palavra antes da ordem do dia e pedir logo tambem o copo da agua, para poder gastar a hora toda!
Não é só para isto, para esta exhibição espalhafatosa; que os nossos eleitores aqui nos mandam e que o paiz nos paga, é preciso aproveitar o tempo, é preciso fazer mais alguma cousa de bom e de util, (Apoiados.} ou ao menos não embaraçar que os outros o façam:
A opposição devia lembrar-se que ha de vir a sei governo, e convencer-se que os maus exemplos do seu systema podem vir a fazer escolas, a ser exemplo.
E dito isto, sr. presidente, findo aqui as minhas observações, que já foram longas de mais, pedindo desculpa á camara dos momentos que foi obrigado a tornar-lhe, e para não incorrer na mesma falta de que me estou queixando, e não me alistar na ala dos bravos da parola, vou tratar do que é mais util e para o que especialmente tinha pedido a palavra.
Tive a honra de mandar pára a mesa, em julho do anno passado, um projecto de lei, pedindo auctorisação para que a camara municipal de Goes, do circulo que tenho a honra de representar, podesse desviar do cofre da viação municipal uma certa quantia para o começo da construcção dos paços do concelho e repartições de fazenda, sala do tribunal e administração, que todas estavam agrupadas e reunidas no mesmo edifício, que foi o anno passado destruído por um violento incendio.
Este projecto teve parecer favoravel por parte da respectiva commissão; não foi porém, ainda dado para ordem do dia, e consta-me que este facto é devido a haver accumullados outros projectos de igual natureza é em iguaes circunstancias e que logo que entre um em ordem do dia para discussão, têem de entrar todos os outros.
É sobre isso que vou fazer as seguintes considerações, nas quaes pouco tempo tomarei á camara.
Não trato agora de saber se ha muitos, se ha poucos projectos d'esta natureza e nas mesmas circumstancias, e se devem todos ser ou não attendidos; trato de apresentar as rasões justissimas e attendiveis com que os meus constituintes pedem, e foi para isso, para zelar os seus direitos e interesses, e expor as suas necessidade», pedindo os melhoramentos de que precisarem, que ellee cá me mandaram.
E hei de reforçar-me para cumprir o meu dever como poder e souber, mas sem fraquezas nem transigencias de especie alguma impropria do meu caracter. O que me faltar em intelligencia, sobrar-me-ha em boa vontade e energia.
O edifício da camara municipal de Goes foi, como ha pouco disse, destruido por um incendio, ficando apenas um montão de ruinas; e agora n'esta occasião, em que o paiz inteiro está aterrado pelo incendio terrivel occorrido na cidade do Porto, facto que profundamente todos lamentâmos, n'esta occasião, era que se estilo tratando do tomar providencias em favor de todas as victimas d'esse horrivel incendio, satisfazendo aos pedidos a que a catastrophe deu logar; parecia-me tambem occasião opportuna para que o parlamento e o governo attendesse ao pedido da camara de Goes; visto que todo o concelho é victima e soffreu com aquelle desastre, approvando o seu projecto, e incluindo-a assim, n'esta occasião, no beneficio que recebem as victimas do incendio.
Acrescentando, ainda assim, que a camara municipal de Goes não pede uma esmola, não é um soccorro humanitario e que se lhe concede; pede que, no exercicio do seu direito e administrando os seus dinheiros como entende, accudindo primeiro ás necessidades mais urgentes dos seus municipe; lhe deixem construir com os fundos de viação, que lhe pertencem e tem em deposito, um edificio em que reuna os paços do concelho, administração e repartição de fazenda; como tinha antes da desgraça, que os reduziu a cinzas.
A camara municipal de Goes ainda que hoje queira recorrer a um emprestimo n'aquelle concelho, não o póde fazer, não tem recursos para isso, tão sobrecarregados se acham os povos d'aquella região, porque, sr. presidente se o paiz todo atravessa uma crise agricola que chega até lá, como v. exa. e a camara muito bem sabem, existe alem d'essa crise geral; uma crise local, que aquelle concelho está atravessando n'este momento; com uma terrivel molestia manifestada nos castanheiros e nas oliveiras; principal fonte de riqueza d'aquella localidade, que está completamente aniquilada; e n'estas condições torna-se completamente impossivel o lançamento de qualquer imposto especial, para attender aos encargos provenientes de qualquer emprestimo que se levantasse para a realisação da obra que se deseja o se torna indispensavel.
Ainda alem d'este grave inconveniente ha um outro muito poderoso, e é que; ainda que a camara municipal de Goes queira tomar de arrendamento um predio qualquer, para ahi estabelecer as repartições publicas do concelho, tão o póde fazer, porque não ha ali casas para arrendar e muito menos em condições de satisfazer ao serviço a que se pretende destinar a construcção a fazer; que não podem as referidas repartições e archivos municipaes continuar como, até agora, installados separadamente e por obsequio em casa de particulares, que a isso se prestaram por occasião do incendio.
É pois impossivel continuar um tal estado de cousas, como que vergonhoso e prejudicialissimo para o serviço publico de Goes.
Em vista das rasões que exponho, e que não alongo para não tomar tempo á camara, torna-se indispensavel á approvação do projecto, a que me refiro e tive a honra de apresentar e que tem o n.° 182.
Peço, pois, a v. exa. que attendendo ao pedido, que em nome dos meus constituintes faço, e que é justissimo, ponha o projecto em ordem do dia, logo que seja possivel, para entrar em discussão n'esta camara, e por essa occasião farei algumas considerações mais sobre o assumpto.
Como estou com a palavra, associo-me inteiramente ao desejo demonstrado pelo meu illustre amigo o Sr. Francisco Mattoso Côrte Real de que sejam attendidas as reclamações justissimas dos distribuidores telegrapho-postaes de Coimbra, que tambem se me dirigiram; isto comquanto não tenha a honra de representar aquelle circulo, mas com a devida venia e com todas as deferencias para com s. exa. que está presente 5 porque não posso admittir bem sem reparo, certa interferencia que se permittem alguns srs. deputados ingerindo-se nos negocios dos circulos uns dos outros, sem terem as devidas attenções com os directos representantes, principalmente quando estes são das localidades que os elegeram ou as conhecem bem.
Partilho da theoria apresentada aqui hontem pelo meu illustre amigo sr. Fuschini, do que todos os deputados são deputados da nação, e como tal têem direito a intervir em todos os assumptos de administração publica; mas partilho tambem com s. exa. á idéa de que é necessario deferencia e attenção com aquelles que representam os seus circu-