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SESSÃO DE 28 DE JUNHO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho

Secretarios - os exmos. srs.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa

SUMMARIO

Dá-se conhecimento de um officio da caixa geral de depósitos, fazendo remessa de exemplares do relatórios da administração. - Segunda leitura e admissão de um projecto de lei do sr. Ruivo Godinho. - Representação mandada para a mesa pelo sr. Vieira de Andrade. - Requerimentos dos srs. Antonio Maria Cardoso e Francisco Machado, e apresentação de pareceres. - O sr. Vieira de Andrade apresenta um projecto do lei, auctorisando a direcção geral da divida publica a averbar, sem pagamento de contribuição de registo, um legado ajunta do parofhia de Seroa; faz o elogio do benemerito bemfeitor Manuel Alves Barbosa Junior e chama a attenção do governo sobre a construcção dos cães do rio Douro. - O sr. presidente dá conta á camara da nomeação das commissões de infracções, petições, estatistica, saude publica, regimento e recrutamento. - O sr. ministro das obras publicas dá explicações ao sr. Vieira de Andrade sobre o assumpto sobre que chamara a sua attençào, e manda para a mesa uma proposta de lei estabelecendo um cabo submarino para os Açores por conta do governo.- Participa o sr. Pedro Victor que se acha constituída a commissão de obras publicas. - O sr. José de Alpoim interroga o sr. ministro dos negócios estrangeiros ácerca da noticia de factos occorridos em Paris, offensivos para a nação portugueza. - O sr. ministro dos negocios estrangeiros dá conta do procedimento do governo. - Faz considerações sobre o mesmo assumpto o sr. Carlos Lobo d'Avila. - Resolve-se, a requerimento do sr. Laranjo, que se abra uma inscripção especial sobre este incidente: usa da palavra o sr. Laranjo, respondendo-lhe o sr. ministro dou negocios estrangeiros.- O sr. Pinheiro Chagas, por parte da commissão do bill, manda para a mesa um parecer, relevando o governo transacto da responsabilidade pelo estabelecimento em Lisboa de um curso de pathologia e clinica ophtalmologica. - O sr. Ruivo Godinho chama a attenção do sr. ministro das obras publicas e pede providencias sobre a maneira por que se está executando o regulamento de 2 de outubro de 1K86 para a extincção do pantanos e arrozaes. - Promette providencias o sr. ministro das obras publicas.
Na ordem do dia continúa em discussão o projecto de lei n.° 183 (organisação do ministerio da instrucção publica), proseguindo no seu discurso, combatendo o projecto, o sr. Eduardo Villaça. - A requerimento do sr. Agostinho Lucio resolve-se prorogar a sessão até ser votado o projecto - Responde ao sr. Eduardo Villaça o sr. José de Castro. - Combate o projecto o sr. Elias Garcia, e julga-se a materia sufficientemente discutida a requerimento do sr. Agostinho Lucio. - Usam da palavra sobre o modo de propor os srs. Elvino de Brito, Francisco Machado e Almeida e Brito, enviando estes para a mesa algumas propostas e additamentos. - Procede-se á votação, sendo a final approvado o projecto. - Usa da palavra, antes de se encerrar a sessão, o sr. ministro da instrucção publica.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 56 srs. deputados. São os seguintes: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Amandio Bduardo da Motta Veiga, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio Maria Cardoso, Antonio Maria Jalles, Antonio Ribeiro da Santos Viegas, Antonio Sergio da Silva o Castro, Antonio Teixeira de Sousa, Aristides Moreira da Motta, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa, Carlos Lobo d'Avila, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Eduardo de Jesus Teixeira, Eduardo José Coelho, Elvino José de Sousa e Brito, Feliciano Gabriel de Freitas, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Frederico de Gusmão Correa Arouca, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João Marcellino Arroyo, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Paiva, João Pinto Moreira, João Simões Pedroso de Lima, João de Sousa Machado, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, José Antonio de Almeida, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José de Azevedo Castello Branco, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Domingos Ruivo Godinbo, José Elias Garcia, José Frederico Laranjo, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Julio Rodrigues, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Monteiro Soares de Albergaria, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Julio Antonio Luna de Moura, Julio Cesar Cau da Costa, Luciano Cordeiro, Luiz Virgilio Teixeira, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Manuel Vieira de Andrade, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Pedro Augusto de Carvalho, Pedro Ignacio de Gouveia, Pedro Victor da Costa Sequeira, Roberto Alves de Sousa Ferreira e Thomás Victor da Costa Sequeira.

Entraram durante a sessão os srs.: - Agostinho Lucio e Silva, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Alfredo César Brandão, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio Baptista de Sousa, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Fialho Machado, Antonio Costa, Augusto José Pereira Leite, Augusto Maria Fuschini, Bernardino Pacheco Alves Passos, Bernardino Pereira Pinheiro, Carlos Roma du Bocage, Christovão Ayres de Magalhães Sepulveda, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Emygdio Julio Navarro, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Eugenio Augusto Ribeiro de Castro, Fernando Mattozo Santos, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Antonio da Veiga Beirão. Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco José Machado, Francisco Severino de Avellar, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Jacinto Cândido da Silva, João Alves Bebiano, João do Barros Mimoso, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim Germano de Sequeira, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, Joaquim Simões Ferreira, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Dias Ferreira, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Maria Greenfield de Mello, José Maria de Sousa Horta e Costa, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Manuel Affonso Espregueira, Manuel de Arriaga, Manuel d'Assumpção, Manuel Francisco Vargas, Manuel Pinheiro Chagas, Matheus Teixeira de Azevedo, Miguel Dantas Gonçalves Pereira e Visconde do Tondella.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abilio Guerra Junqueiro, Adolpho da Cunha Pimentel, Adriano Augusto da Silva Monteiro, Adriano Emílio de Sousa Cavalheiro, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Alfredo Mendes da Silva, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio José Arroyo, Antonio José Ennes, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto da Cunha Pimentel, Barão de Paço Vieira (Alfredo), Caetano Pereira Sanches do Castro, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Conde do Côvo, Conde de Villa Real, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Abreu, Fidelio de Freitas Branco, Fortunato Vieira das

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Neves, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco do Castro Mattozo da Silva Corte Real, Francisco José de Medeiros, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio José Franco, Jayme Arthur da Costa Pinto, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José de Alpoim do Sousa Menezes, José Freire Lobo do Amaral, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Latino Coelho, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria dos Santos, José Paulo Monteiro Cancella, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Da caixa geral de depositos, remettendo 150 exemplares do relatorio da administração das caixas, gorai de depositos e economica portugueza, relativo ao anno economico de 1888-1889 o ao exercicio de 1887-1888.
Para a secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - São geraes e obvios os inconvenientes para os povos e para o estado, que provêem da difficuldade que haja em se poderem fazer os respectivos títulos de quaesquer contratos, principalmente quando taes contratos, envolvem transmissão de propriedade immovel.
Para que taes inconvenientes se não prolongue 011 não continuem em Proença a Nova, do districto de Castello Branco, tenho a honra de propor o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É creado em Proença a Nova um officio de tabellião de notas, que póde ser servido pelo escrivão do julgado sujeito á respectiva tabella.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 21 de junho de 1890. = O deputado, Ruivo Godinho.
Lido na mesa foi admittido e enviado á commissão de legislação civil.

REPRESENTAÇÃO

De habitantes da freguezia de S. Verissimo da Valbom, no concelho de Gondomar, pedindo que seja ordenada a conservação e o prolongamento do antigo dique transversal á margem, existente junto do pinheiral da quinta da Vinha, sobre o Douro.
Apresentada pelo sr. deputado Vi rira de Andrade, enviada á commissão de obras publicas e mandada publicar no Diario do governo.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PUBLICO

Por parte da commissão de marinha, roqueiro que sejam enviados ao governo, a effeito de serem devidamente informados pelo ministerio da marinha, os adjuntos requerimentos em que o vice-almirante D. Carlos Frederico Botelho do Vasconcellos de Mello e Matos de Noronha e o contra-almirante Celestino Claudio da Fonseca Ferreira pedem melhoria de reforma. - Antonio Maria Cardoso.

Requeiro que, pelo ministerio do reino, me seja enviada uma relação de todas as confrarias e irmandades que existem no continente do reino e ilhas adjacentes. Declaro que nesta relação basta que se indique as designações d'essas confrarias ou irmandades e as localidades onde existem. = F. J. Machado.
Mandaram-se expedir.

O sr. Vieira de Andrade: - Sr. presidente, o ar. Manuel Alves Barbosa Junior, natural da freguezia de Seroa, concelho de Paços de Ferreira, districto administrativo do Porto, tendo regressado do Brazil, onde ganhou a sua fortuna, o encontrando a sua freguezia sem uma unica escola, fez construir duas casas para escolas primarias dos dois sexos e d'ellas fez doação á respectiva junta de parochia. Denominam se, escolas Barbosa, e custaram ambas mais de 5:000$000 réis.
Vendo porém o sr. Barbosa que a freguezia é muito pobre e que não podia pagar aos professores nem prover á sustentação das aulas, entregou-me, por intermédio do respeitavel banqueiro do Porto, sr. Joaquim Pinto da Fonseca, 10:000$000 réis em inscripções de assentamento para eu as fazer averbar ajunta de parochia para fundo de sustentação das mesmas escolas.
Succede, porém, que na direcção da divida publica se negam a fazer o averbamento sem previo pagamento do imposto do transmissão, em vista do disposto no regulamento da contribuição de registo.
E considerando que tal dadiva representa um importante beneficio feito á instrucção primaria do paiz, e que cumpro animar outros particulares á repetição d'estes actos de benemerencia, vou por isso mandar para a mesa um projecto de lei, auctorisando a direcção geral da divida publica a averbar á junta de parochia de Seroa, sem pagamento de contribuição de registo, os 10:000$000 réis de inscripções de assentamento que lhe foram doadas pelo benemérito portuguez sr. Barbosa Junior.
Parece-me que este projecto é digno da attenção dos srs. ministros e da camara, e eu entrego-o aos cuidados e carinhos do sr. ministro da instrucção publica, para que elle seja convertida em lei ainda na presente sessão, visto parecer-me que o estado deve animar e proteger todas estas acções patrioticas que são proprias da boa e generosa indole dos portuguezes e que prestam beneficios á instrucção publica.
Agora chamo a attenção do governo, e especialmente do sr. ministro das obras publicas, para a necessidade urgente de se proceder desde, já ás obras necessarias para que os cães do rio Douro, na cidade do Porto, possam servir ao commercio que está soffrendo grandes prejuizos e transtornos com o estado lastimoso em que esses caes se encontram.
Este assumpto tem sido objecto de muitas petições e de repetidas promessas por parte de todos os governos; todavia os annos passam e as obras não só fazem, talvez por ser uma obra necessaria e indispensavel.
Sei que, existe um plano de melhoramentos do Douro inferior, devido ao distincto engenheiro hydraulico, sr. Thomás Costa, plano que tom o voto favoravel de todas as estações com potentes, e da associação commercial do Porto, mas até agora não se deu andamento a nenhuma obra, parecendo ter sido esse plano desprezado.
Se o estado da fazenda publica, pelo qual agora vejo acudir com tantos cuidados, não permitte que esta obra se faça immediatamente, pelo menos peço que se mande desde já concertar o pequeno cães da estiva, ha muito annos em derrocada, vedado por um velho tapamento o que entorpeci; o transito das mercadorias e o movimento de passageiros.
Este meu pedido não representa uma impertinência, pois que da realisação da obra para que estou chamando a attenção do governo, não resulta sómente beneficio para a

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praça e cidade do Porto, mas tambem interesse para o estado.
Lembro ao governo e á camara que hoje, desde que se acha concluído e em serviço o ramal da alfândega, que poz em communicação a parte baixa e ribeirinha da cidade com a estação principal dos caminhos de ferro do Minho e Douro, o estado é interessado em que as margens do Douro, sobretudo no espaço que fica entre a ponte de D. Luiz I e a alfandega, estejam em condições de poderem facilitar o transito de mercadorias, chamando para ali um grande movimento commercial, que por vezes tem fugido áquelle rio por falta absoluta de cães e de mais simples commodo de carga e descarga.
Direi á camara que por falta de cães, de pontes, de guindastes e de meios faceis de descarga, succede que algumas vezes os vapores deixam a carga em barcos no rio Douro, vão a Hamburgo, voltam com um novo carregamento e ainda encontram a carga anterior no rio, nas mesmas barcas, sujeita assim aos perigos de um tão caro e perigoso acondicionamento.
Isto succede muitas vezes em occasiões de grande transito originado pelos principios de estacões, e succede isto por ser absolutamente impossivel obter um pequeno espaço de cães onde atraquem as barcaças para descarregar.
Eu já não peço a realisação immediata do plano do engenheiro hydraulico sr. Thomás Costa, obra que não póde deixar de ser morosa e de bastante custo, mas peço com instancia que se attenda ao mais indispensável, fazendo-se as obras mais urgentes, para facilitar o transito do commercio nas duas margens do rio Douro, no espaço que fica a jusante da ponte D. Luiz I, entre esta e a alfandega eu peço encarecidamente ao sr. ministro das obras publicas que attenda á urgente necessidade, pelo menos, de mandar desde já fazer as obras necessarias no cães da estiva, ha tanto tempo em derrocada, obra que não é muito despendiosa.
Aproveito-me tambem da presença do sr. ministro das obras publicas, para chamar a attenção de s. exa. para uma representação que mando para a mesa.
É dos pescadores de Valbom, concelho de Gondomar, districto do Porto.
Pede esta pobre gente que seja conservado e reparado o antigo dique que existe na quinta da Vinha, sobre o rio Douro, e que obriga as aguas a deixarem um certo espaço de areia, que é aproveitado pelos pescadores, para se entregarem á pesca fluvial, quando a braveza do mar não lhes permitte ir barra fora, exercer a sua penosa industria.
Não conheço o assumpto, todavia peço ao sr. ministro das obras publicas que, se isto é possivel e pratico, mande suspender a intimação feita pelo chefe da respectiva cir-cumscripção hydraulica para que o molhe seja immediatamente destruido, averiguando-se posteriormente se a sua conservação é ou não prejudicial, e se a falta que faz aos pescadores é rasão que mereça ser attendida pelos poderes publicos.
Mando para a mesa a representação e peço a v. ex. que consulte a camara sobre se consente que ella seja publicada na folha official.
Foi auctorisada a publicação.
O sr. Presidente: - Em virtude da auctorisação que a camara conferiu á mesa, vou nomear os srs. deputados que hão de compor as commissões que ainda faltam.
Nomeio os seguintes srs.:

Commissão de infracções:
Albino de Abranches Freire de Figueiredo.
Antonio Maria Cardoso.
Antonio Maria Jalles.
Aristides Moreira da Mota.
Augusto da Cunha Pimentel.
Fidelio de Freitas Branco.
Francisco de Barros Coelho e Campos.
João de Barros Mimoso.
José Maria de Alpoim de Cegueira Borges Cabral.

Commissão de petições:
Adolpho da Cunha Pimentel.
Amandio Eduardo da Mota Veiga.
Antonio Maria Cardoso.
Antonio Maximo de Almeida Costa e Silva.
Antonio Ribeiro dos Santos Viegas,
Eugenio Augusto Ribeiro de Castro.
João Alves Bebiano.
João Pinto Moreira.
Coberto Alves de Sousa Ferreira.

Commissão de estatistica:
Abilio Eduardo da Costa Lobo.
Adriano Augusto da Silva Monteiro.
Alvaro Augusto Froes Possolo de Sousa.
Antonio Maria Jalles.
Antonio Eduardo Villaça.
Eduardo Augusto Xavier da Cunha.
Elvino José de Sousa e Brito.
Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria.
Tose Maria de Sousa Horta e Costa.

Commissão de saude publica:
Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro.
Agostinho Lucio e Silva.
Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso.
Arthur Hintze Ribeiro.
Eduardo de Jesus Teixeira.
Fortunato Vieira das Neves.
João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo.
José Antonio de Almeida.
Tose Azevedo Castello Branco.

Commissão do regimento:
Alexandre Maria Ortigão de Carvalho.
Antonio Baptista de Sousa.
Antonio José Arroyo.
Antonio Manuel da Costa Lereno.
Antonio Sergio da Silva e Castro.
Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa.
Eduardo Augusto da Costa Moraes.
Ignacio Emauz do Casal Ribeiro.
Marcellino Antonio da Silva Mesquita.

Commissão de recrutamento:
Amandio Eduardo da Mota Veiga.
Antonio Azevedo Castello Branco.
Antonio José Lopes Navarro.
Antonio Ribeiro dos Santos Viegas.
Augusto da Cunha Pimentel.
Custodio Joaquim da Cunha e Almeida.
Francisco José de Medeiros.
João de Paiva.
Luiz de Mello Bandeira Coelho.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Arouca): - Sr. presidente, ouvi as considerações feitas pelo illustre deputado, pela cidade do Porto.
Em relação á segunda parte, eu não conheço o facto, mas hei de tomar informações a respeito d'elle e para providenciar como for justo.
Emquanto às observações relativas ao cães do Porto, eu affirmei ao illustre deputado que este assumpto tem merecido a minha attenção especial.
Tenho tido repetidas conferencias com o distincto engenheiro o sr. Espregueira a respeito deste objecto, e s. exa., desde que eu estou no ministério, já tem ido três vezes ao Porto para estudar a questão do cães.
Convém dizer que ha uma grande quantidade de proje-

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ctos que é preciso destrincçar, sendo preciso tambem habilitar o governo com os meios necessarios para realisar as obras.
Tem-se pensado em dividir estas obras em differentes secções, comtanto que umas não contrariem as outras, para serem construídas successivamente; mas parece que a opinião dos engenheiros é contraria a esta idéa; opinam os engenheiros que se façam todas as obras, organisando uma grande empreitada, paro, este melhoramento se conseguir de uma vez e rapidamente.
Os trabalhos, porém, não estão preparados para isto.
Espero que a junta de obras publicas dê o seu parecer sobre o assumpto, que foi submettido á sua deliberação.
Logo que me seja apresentado este parecer hei de tomar as providencias que me parecerem mais convenientes.
Já que estou com a palavra, mando para a mesa uma proposta de lei que tem por fim estabelecer por conta do governo um cabo submarino para os Açores.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Pedro Victor: - Pedi a palavra para participar a v. exa. e á camara que a commissão de obras publicas se constituiu, nomeando o sr. Manuel d'Assumpção para presidente, e a mim para secretario.
Vou mandar para a mesa uma proposta para que sejam aggregados á mesma commissão os srs. José de Azevedo Castello Branco, Lourenço Malheiro, Ortigão de Carvalho e Adriano Monteiro.
O sr. José Maria Alpoim: - Começo por agradecer ao sr. ministro da instrucção publica o haver transmittido ao sr. ministro dos negócios estrangeiros os meus desejos de o ver n'esta casa na sessão de hoje; e para mostrar que não sou faccioso nem faço politica, agradeço tambem ao sr. ministro dos negocios estrangeiros a presteza com que veiu a esta camara para ouvir o que desejo perguntar-lhe, e ao mesmo tempo ainda, congratulo-me com a camara por ver presente o sr. ministro das obras publicas, mostrando assim não ser lenda o s. exa. ser ainda ministro.
S. exa. é ainda ministro das obras publicas e está ali sentado.
Desejava fazer algumas perguntas a s. exa., mas como o assumpto que me proponho tratar é mais importante no actual momento, guardarei para depois, as considerações que desejo fazer na presença de s. exa.
Dirigir-me-hei, pois, ao sr. ministro dos negócios estrangeiros sem grandes dissertações.
Já hontem dei conta á camara dos acontecimentos que se tinham dado em Paris na ultima semana. Vou expor os factos que hontem relatei á camara.
Li hontem n'um jornal regenerador, e portanto insuspeito para esta situação, que na ultima semana appareceram em Paris alguns carros de praça, guiados por cocheiros vertidos com fatos de cores portuguezas, azues e brancos, com chapéus tambem de cores portuguezas, tendo gravadas a oiro n'um papelão as armas reaes portuguezas e o seguinte dístico: «os inglezes e que os ensinara».
Pendentes d'estes carros de praça estavam enormes cartões em que se liam as mesmas palavras, e os cocheiros e outras pessoas que iam dentro espalhavam prospectos e cartazes insultantes para o nosso decoro e para Portugal.
V. exa. comprehende com que profunda emoção eu li isto, e tenho a certeza de que quando hontem transmitti á camara esta noticia, todos os seus membros, quer progressista», quer regeneradores, quer republicanos, por certo sentiram a mesma impressão que eu senti. Faço-lhes essa justiça.
Se este facto tivesse acontecido com outra qualquer nação, o nomeadamente com essa nação com quem estâmos n'um conflicto dolorosissimo, não mo admirava, porque v. exa. sabe que são estas as tradições e costumes d'esse paiz; mas com a Franca, com quem mantemos hoje as melhores relações, n'um paiz cuja grandeza de animo todos conhecemos, admira-me sobremaneira.
Tenho a certeza de que se o governo de Portugal se tivesse dirigido ao governo francez, seria attendido nas justíssimas reclamações que a este respeito fizesse. Suspeito portanto que o governo procedeu mal e que o nosso ministro em Paris não tem sido tão solícito e tão cuidadoso como devia ser.
Para corroborar as minhas asserções, vou referir-me a um facto, de que se dá conta na mesma correspondencia.
Ha pouco tempo, appareceram affixados nas esquinas das ruas de Paris, cartazes, muitos cartazes, em que se annunciava que em breve iria á scena n'um theatro francez uma peça chamada Mahomet. O embaixador ottomano dirigiu-se ao governo francez para que fizesse retirar de scena essa peça, porque a julgava offensiva para a religião do seu paiz e portanto para o seu paiz.
O governo francez accedeu a esto pedido.
Ora, sr. presidente, nós não estamos por tal forma desprestigiados no conceito publico, que se façam para a Turquia excepções que não se fazem para nós.
E é perciso que v. exa. note, que a affronta do que se queixara o ministro ottomano era sem duvida insigniticantissima em relação áquella que se nos fez e em que somos alcunhados de bancaroteiros e pussilanimes.
N'estas condições mais se me confirma ainda de que o governo não procedeu como devia. É extraordinario o que acontece!
O que acontece agora, nunca aconteceu em nenhuma situação progressista d'este paiz, e com certeza não aconteceu ainda a nenhum ministro quer em Paris, quer em outra qualquer capital estrangeira!...
Sr. presidente, confirma as suspeitas de que o governo não procedeu como devia proceder, a declaração feita pelo sr. ministro da instrucção publica em resposta às palavras que lhe dirigi.
S exa. entre mil protestos da inflexibilidade do governo, inflexibilidade de que aliás nos dá tantas provas no conflicto com a Inglaterra, disse «que não era o primeiro facto d'este genero!»
Tenho idéa realmente, do que quando o sr. ministro da fazenda apresentou o seu relatório, pouco depois foram affixados alguns cartazes em Paris, aproveitando as phrases do sr. ministro da fazenda, que se referiam á nossa situação financeira e em que se malsinava os seus antecessores.
O facto que se tinha dado é muitissimo differente deste, porque nenhum é tão infamante, tão attentatorio dos nossos brios o da nossa dignidade. Mas se se deu, mais confirma as minhas idéas, e o nosso ministro em Paris tinha obrigação de reclamar do governo francez contra tal facto, embora praticado por meia duzia de individuos.
Consta que o facto se deu, mas não conta que esses individuos tenham sido castigados!
Pedia ao sr. ministro dos negócios estrangeiros que nos informasse do que sabe a este respeito e que nos desse todos os esclarecimentos que fossem solicitados.
E peço a v. exa., sr. presidente, se não me satisfizer, e á opposição parlamentar, a resposta dada pelo sr. ministro dos negócios estrangeiros, que me conceda novamente a palavra para eu, ou qualquer outro deputado da opposição, responder às declarações que o sr. ministro dos negócios estrangeiros entenda dever fazer.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Hintze Ribeiro): - Só por extrema deferencia é que o illustre deputado póde agradecer a minha comparencia n'esta. casa; não faço mais do que cumprir com o meu dever, sempre que qualquer representante do paiz entende pedir explicações sobre actos do meu ministerio, dando as explicações que poder e julgar convenientes.
O illustre deputado referiu-se a varias correspondencias

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publicadas n'um jornal d'esta cidade, e citou os factos que n'esta correspondencia se mencionavam.
Eu tenho informações especiaes ácerca d'este ultimo facto. É possivel, todavia, que se tenha dado repetição de outros factos não menos desagradáveis, como em outras occasiões e ainda ultimamente se deram, por occasião da emissão do nosso emprestimo em Paris.
Então tambem foram affixados nas esquinas da cidade de Paris, e foram mesmo levados em carros pelas ruas, cartazes, pasquins offensivos para o decoro de Portugal e para o credito portuguez.
O facto é verdadeiro.
O illustre deputado foi porém injusto para commigo, suppondo que eu poderia ficar indiferente ante factos, que assim atacavam o nosso brio e a nossa dignidade, como nação.
Tão depressa eu tive conhecimento de que esse facto se dava, não só por intervenção do representante de Portugal em Paris, mas directamente daqui, eu fiz sentir, tão vivamente quanto podia, que o procedimento havida em Paris mal podia ser consentido e tolerado pelo governo de uma nação amiga.
Em Paris, o sr. Dantas, nosso ministro n'aquella corte, procurou o sr. ministro dos negocios estrangeiros ali, o sr. ministro do interior e até o gr. prefeito da policia.
Aqui, fil-o immediatamente na primeira conferencia que eu tive occasião de ter com o sr. Bihourd, que acabava de chegar a Portugal, e antes mesmo de entregar as suas credenciaes a El-Rei. Por este facto vê o illustre deputado toda a importancia que liguei a este assumpto, porque não esperei sequer que as formalidades se cumprissem, tanto quanto estava no uso da diplomacia, para desde logo lhe expor a minha fundada queixa e o meu justo resentimento.
Em Paris e aqui, o nosso ministro e eu, apresentâmos em nome de Portugal tudo quanto nos era licito e nos cabia em defeza do decoro deste paiz, para que não se consentissem nem tolerassem factos de tal modo ultrajantes, sobretudo quando esses factos partem de uma nação que tantos testemunhos do sympathia nos tem dado, e que em diversas occasiões tem mostrado quanto a sua benevolencia se estende até Portugal e quanto os bens sentimentos são sinceros para comnosco. (Apoiados.)
Já vê s. exa. que foi absolutamente injusto na censura que julgou poder dirigir-me e, francamente, era necessario suppor bem mal de mim, no desempenho de minhas funcções, e eu não posso suppor da parte do illustre deputado, desde que s. exa. declarou pôr neste assumpto completamente de parte quaesquer intuitos ou vistas partidarias, era necessario suppor bem mal de mim para imaginar que perante factos que realmente feriam e molestavam o espirito nacional e que mal condiziam com os sentimentos geraes de uma nação como a França, para comnosco, que eu podesse permanecer indifferente e quedo. (Apoiados.)
Reclamei tanto quanto podia reclamar, instei tanto quanto podia instar.
O governo francez, não só em Paris, mas aqui, em resposta ás nossas instancias, fez, porém, ver, corroborando inteiramente as suas sympathias para com Portugal e affirmando os seus sentimentos perfeitamente affectuosos, toda a sua boa vontade para comnosco, do que nós não podia-mos duvidar, porque factos repetidos o attestavam.
O governo francez mostrou a impossibilidade em que se encontrava em presença das proprias leis francezas, de tomar quaesquer providencias attinentes a impedir a collocação ou circulação de cartazes ou pasquins, embora offensivos para a dignidade de Portugal; e não o fazia, não por que não o desejasse fazer, não porque tivesse em menos attenção ou consideração o decoro de Portugal, mas porque as leis do seu paiz o vedavam absolutamente.
Em abono d'isto foram-me citados factos passados na propria França.
Assim, em Beiras, em uma occasião de effervescencia politica, em que se affixavam pasquins ultrajantes para o governo, e muito especialmente para um deputado da localidade, a policia julgou dever intervir.
Mais tarde, tambem em uma occasião de effervescencia politica, quando se deu o movimento boulangista, o governo julgou dever e poder intervir na affixação dos cartazes, mas os tribunaes declararam que aquelle assumpto estava fora da alçada do governo, e que sem exorbitar das suas attribuições o governo não podia proceder contra similhante facto.
Aqui tem v. exa. a rasão por que, mau grado meu e do governo francez, esses factos se têem dado n'aquella capital.
Que esses factos são contrarios ás boas praxes e aos bons principies de direito internacional, é fóra de duvida.
Se o representante da França, ao chegar aqui para entregar as suas credenciaes, encontrasse affixados nas esquinas das cartazes em desdouro da dignidade e do decoro da França, de certo teria uma tristissima impressão ácerca do nosso estado de civilisação, e todavia ninguem póde pôr em duvida o estado do civilisação da França. Não posso comtudo deixar de lamentar que, á sombra do principio de liberdade, se commettam actos attentatorios da dignidade de Portugal. (Apoiados.)
Ha ainda outra circumstancia em que eu não desejaria tocar.
Disse o illustre deputado que factos d'esta natureza só agora se davam, e nunca se deram durante o tempo da administração progressista.
Lamento que quando se trata de assumptos internacionaes que ferem o brio e o decoro do Portugal, nós estejâmos a levantar discussões partidárias e a fazer distincções entre progressistas e regeneradores (Apoiados.) tanto mais jiianto a verdade é que factos similhantes se deram no tempo do governo progressista. (Apoiados.)
E note s. exa. que não digo isto para fazer a menor censura ao governo que me precedeu, nem para pôr era duvida as diligencias empregadas peio representante de Portugal em França, naquella occasião; pelo contrario, tenho na minha secretaria testemunhas das vivas diligencias empregadas pelo nosso representante, naquella occasião, em favor do decoro de Portugal.
Todavia os factos deram-se, e o governo francez affirmou sempre que não estava na sua alçada o meio de impedir que esses factos se praticassem, por isso mesmo que exorbitaria das suas attribuições e incorreria na censura dos tribunaes francezes.
Creio ter dito o sufficiente para affirmar ao illustre deputado que, tanto como s. exa., sinto que em uma nação como a Franca se dêem factos d'esta natureza, e para mostrar que não fiquei, como não podia ficar, indifferente a abusos assim commettidos, e que reclamei tanto quanto de mim dependia, aqui e em França.
Parece-me tambem ter demonstrado que procurei cumprir os meus deveres e que não irroguei censura a ninguem, nem puz em duvida as diligencias, os bons esforços empregados pelo governo que precedeu este e pelo nosso representante então em França, quando factos d'essa natureza, que reputo attentatorios da honra do governo portuguez, se deram igualmente ali.
Tambem devo dizer ainda ao illustre deputado que a correspondência que appareceu publicada no jornal a que s. exa. se referiu, tão intimamente me feriu tambem que, apesar das instancias já feitas e da resposta já recebida, como. neste ultimo facto havia circumstancias verdadeiramente aggravantes, como eram, a exposição das cores nacionaes portuguezas, e a exposição da corôa de Portugal, rodeada de um distico que, por uma allusão frisante, desenvolvia quasi que o desprezo para com o nosso paiz, eu entendi que, apesar de tudo, devia novamente instar; e dei instrucções ao nosso representante em França, a fira de que este mais uma vez fizesse sentir ao governo frau-

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cez que não era possível isto, que tudo tem um limite neste mundo, e que a França, paiz liberal e tolerante como é, não podia consentir que através de tudo, e por todos os meios, ainda os mais ultrajantes, fossem feitas offensas á dignidade e á corôa de uma nação como Portugal, que sempre nutriu para com a França os mais affectuosos sentimentos de dedicada amisade e sympathia.
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Carlos Lobo d'Avila: - É inutil que eu repita o que disse o meu illustre amigo o sr. Alpoim, que n'uma questão desta ordem, em que estão em jogo a honra e a dignidade da nação, nós não tinhamos nenhum intuito faccioso da politica partidaria. (Apoiados.)
A camara recorda-se, e talvez o sr. ministro dos negocios estrangeiros se recorde tambem, de que numa das primeiras sessões deste anno eu tive occasião de referir-me nesta casa ao doloroso assumpto de que estamos tratando, e de mandar para a mesa um requerimento pedindo, pelo ministerio dos estrangeiros, copia de toda a correspondência trocada entre a secretaria d'estado dos negocios estrangeiros e o nosso representante em Paris, e aqui com o ministro francez, relativamente á questão das pretensões dos chamados portadores do emprestimo de D. Miguel. O illustre ministro dos estrangeiros tem visto que eu não sou impaciente, porque vão passados dois mezes e eu ainda não recebi os documentos nem instei pela remessa d'elles, apesar de eu ter lembrado que podia seguir-se o exemplo que já uma vez se dera, de virem os documentos para a mesa para poderem ser examinados pelos srs. deputados, embora não fossem publicados.
Lembro este facto. Sem desejar ser indiscreto, porque não o desejo ser, eu peço ao illustre ministro que, quando entender que não ha inconveniente, mande esses documentos para a camara, e então veremos quaes são as responsabilidades de cada um.
O que digo é que, lamentando o facto, como todos lamentam, (Apoiados.) não duvido, comtudo, das intenções e diligencias do sr. ministro dos negocios estrangeiros; mas peco-lhe que attenda ao que vou dizer.
Sem querer entrar agora na questão da legislação fran-ceza a que s. exa. se referiu, e de que nós já tivemos uma triste demonstração no serviço dos tribunaes francezes na acção que intentámos ali por causa de diffamação, que já em 1878 se fizera ali ao credito portuguez e á honra da nação portugueza, por parte dos mesmos indivíduos; sem me querer referir a este facto, nem contestar as boas diligencias que tenham sido empregadas pelo governo junto do representante francez aqui, e pelo nosso ministro em Paris junto do governo francez; eu tenho a dizer a s. exa. que, quando foi do ultimo emprestimo contratado pelo governo progressista, appareceram os pasquins affixados nas esquinas de Paris; mas pela solicitude e diligencias empregadas pelo nosso representante, que eu não quero louvar, por motivos que a camara comprehende, e mesmo por que não fez senão cumprir com o seu dever, o prefeito de policia mandou arrancar esses pasquins. (Apoiados.)
Este é o facto.
Os portadores do emprestimo de D. Miguel são capazes de tudo n'este genero de industria diffamatoria.
O que eu digo é que o facto reveste agora circumstancias singularmente aggravantes. Passear numa carruagem com as cores portuguezas, e levando pasquins injuriosos para a honra e credito nacional, mesclando com isso mesmo questões pendentes com outras nações, é effectivamente uma cousa que mal póde consentir se numa cidade civilisada como Paris. (Apoiados.)
Não quero insistir mais do que a questão o permitte.
O meu amigo e collega o sr. Alpoim, não teve outro fim, sei-o perfeitamente e a camara toda lhe presta certamente esta homenagem ao seu caracter e ás suas intenções, senão chamar a attenção do sr. ministro dos negocios estrangeiros para este facto, para nos dar uma consolação no que houvesse de menos verdade n'esta noticia e de nos dizer que envidará todas as suas diligencias para que se evitem factos desta ordem. Espero que s. exa. o fará.
Não duvido da solicitude do nosso representante em Paris, mas desejava bem que elle podesse provar a sua solicitude por um facto análogo ao que já se deu ali.
Antes de deixar este assumpto desejava dirigir uma singela pergunta ao sr. ministro dos negocios estrangeiros. Pedia a s. exa., se entendesse não haver inconveniente nisso, que mandasse uns documentos que eu pedi em tempo, tanto mais que eu disse na occasião de apresentar o requerimento que talvez houvesse inconveniente, como da outra vez tinha sido ponderado pelo ministro progressista. Esses documentos podiam ser enviados para a camara, como da outra vez, para poderem ser examinados sem se lhe dar publicidade, que a qualquer de nós parecesse inconveniente para o paiz.
Antes de terminar desejava tambem fazer uma pergunta ao sr. ministro dos negocios estrangeiros.
A camara recorda-se, quando ha poucos dias chegou a triste noticia da morte de dois soldados portuguezes e de se ter queimado a bandeira nacional no Chire, o sr. ministro dos negócios estrangeiros disse que se tinha dirigido ao sr. ministro de Inglaterra expondo lhe os factos e pedindo uma explicação á Inglaterra a este respeito, que o sr. ministro de Inglaterra ficara com s. exa. de telegraphar para Londres e que depois viria á camara trazer a noticia da resposta que tivesse.
Depois disso o sr. ministro dos negócios estrangeiros não voltou a esta casa; mas apesar de serem independentes as discussões nas duas casas do parlamento, não passou desapercebida aos nossos illustres collegas a declaração feita por s. exa. na outra camara. O sr. ministro dos negocios estrangeiros disse ali que o sr. ministro de Inglao terra, numa conferencia e em resposta a este seu primeir-pedido, declarara que o governo inglez nada sabia dos factos occorridos e que elle, ministro dos negócios estrangeiros, em presença desta resposta, dirigira então uma nota ao sr. ministro de Inglaterra para ser transmittida ao gabinete de Londres, expondo a narração official dos factos e chamando para elles a séria attençao do governo de Sua Magestade Britannica.
Não quero apreciar os termos desta nota, nem as pha-ses que percorreu este negocio; não quero apreciar cousa alguma.
Pergunto ao sr. ministro se já recebeu alguma resposta a esta nota.
Faço a pergunta, não só porque é natural a impaciência de todos nós em um assumpto desta ordem, mas porque tendo lido nos jornaes que estava em Londres o cônsul inglez em Moçambique o sr. Johnston, tendo recolhido dali, esse funccionario inglez que tinha intervindo nesse facto, como nos declarou o sr. ministro dos negócios estrangeiros, aconselhou até moderação e prudência ao agente Bu-chanan, creio que o governo inglez já a esta hora podia ter informações que habilitassem o sr. ministro dos negocios estrangeiros a dar essa resposta, que eu muito desejava fosse satisfactoria.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Hintze Ribeiro): - Pelo que toca aos documentos que o illustre deputado reclamou, tenho a declarar que, logo que possa, serão presentes á camara pela mesma forma por que já o foram de outra vez, a fim de que os srs. deputados os possam examinar, não se publicando, por isso mesmo que são informações de natureza confidencial.
Pelo que toca ás diligencias que o illustre deputado deseja que eu empregue, s. exa. viu já pelos termos da minha reposta que ainda ultimamente, em presença de infor-

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mações que na imprensa se davam, activei as diligencias a este respeito.
E pelo que toca á pergunta que s. exa. agora formulou, responderei que effectivamente eu disse n'esta camara que procurara o sr. ministro de Inglaterra para lhe pedir explicações ácerca dos factos annunciados da morte de dois sipaes e da queima da bandeira portugueza, e que o ministro inglez telegraphára para Londres, a fim de informar o seu governo da minha instancia o a, fim de se poder habilitar a dar uma resposta que fosse conveniente. Por essa occasião acrescentei que viria informar o parlamento da resposta que obtivesse.

Não vim a esta camara por uma rasão; porque estando na camara dos pares, tive occasião de dizer ali o que se tinha passado, e julguei-me desde esse momento dispensado de vir a esta camara, porque como as sessões das duas camaras são publicas, esta camara tinha conhecimento do que eu lá dissera.

Effectivamente, a resposta que n'aquella occasião me foi dada, foi que o governo inglez nem no officio de Buchanan, nem em telegramma posterior a este officio, onde se narravam differentes acontecimentos occorridos no Chire, se encontrava referencia alguma ao facto que se allegava.

Eu disse tambem na camara dos pares que, não me podendo eu satisfazer com esta resposta, pois que ella significava apenas que o governo inglez não estava informado de factos de que o governo portuguez tinha conhecimento, eu compendiaria numa nota mais desenvolvida e accentuada os factos, taes como me constavam das informações officiaes, reclamando do governo inglez a sua mais seria attenção sobre este assumpto, a fim de que elle procedesse como Portugal procederia, desde o momento em que se averiguasse que com offensa do direito internacional se tinham praticado actos que significavam uma violação das garantias individuais e ao mesmo tempo um desacato feito á bandeira portugueza.

(Apoiados. - Vozes: - Muito bem.)

Eu creio que riflo podia fazer mais. (Apoiados.)

Esta reclamação consta de uma nota escripta, que ha de ser publicada a seu tempo, e a camara terá então occasião de ver se eu tive em menos attenção, não digo já os interesses de Portugal, mas a dignidade do paiz, (Apoiados.) e se no desempenho das minhas funcções cumpri ou não com aquillo que eu entendo que deve ser o dever de um homem publico. (Apoiados.) E não me arreceio, quando a nota for publicada, da livre critica e do livre exame que os illustres deputados possam exercer sobre os meus actos. (Apoiados.) Simplesmente o que não posso é por emquanto publical-a, desde que o assumpto está entre mãos.

Sei que depois disto o governo inglez mandou pedir informações ás suas auctoridades na Africa.

O illustre deputado disse que o consul de Inglaterra em Moçambique se achava em Londres, e que elle poderia informar.

De certo. O illustre deputado comprehende bem uma cousa, e é que nós não podemos estranhar que o governo inglez, desde o momento em que lhe era denunciado este facto, e que elle não se passara sob a alçada directa do sr. Johnston, mas dizia respeito a um acto proprio do sr. Buchanan, que se encontrara em Africa, o governo inglez precisára de informações locaes precisas e minuciosas para se habilitar a responder á nota do governo portuguez. Essa nota, dirigida ao governo de Inglaterra, sei que lhe foi communicada.

É claro que ha de seguir os seus tramites, e quando tiver uma resposta final, não terei duvida em vir ao parlamento informal-o do que se tiver passado, dos termos que esse incidente seguiu, e da attitude do governo portuguez em vista das informações contidas nas participações officiaes que lhe forem feitas.
Por agora não posso responder outra cousa ao illustre deputado e creio que, se s. exa. estivesse sentado n'este logar nada mais acrescentaria aquillo que eu digo.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu as notas tachgraphcas.)

O sr. Pinheiro Chagas: - Mando para a mesa um parecer da commissão do bill sobre uma medida dictatorial tomada pelo ministerio transacto e que importa regularisar.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Ruivo Godinho.

O. sr. Alpoim: - Peço perdão, parece-me que o sr. Laranjo tinha pedido a palavra sobre o incidente.

O sr. Ruivo Godinho: - Se o sr. Laranjo tem muito desejo de fallar, eu não tenho duvida em me reservar para depois de s. exa.

O sr. Presidente: - S. exa. não requereu que se abrisse uma discussão especial, nem eu consultei a camara a tal respeito. Estavam muitos srs. deputados inscriptos e em ultimo logar o sr. Laranjo.

O sr. Ruivo Godinho: - Mas se o sr. Laranjo deseja fallar sobro o incidente, que é muito importante, porque diz respeito á dignidade nacional, posto que seja tambem importante o assumpto sobre que desejo fallar, não tenho duvida em ceder o meu logar na inscripção a s. exa. pedindo a v. exa. que me reserve a palavra para eu fallar depois.

O sr. Presidente: - Antes do pr. Laranjo estavam inscriptos muitos srs. deputados.

(Leu a lista da inscripção.)

Não posso alterar a ordem da inscripção sem consultar a camara.

O sr. Laranjo: - Nesse caso peço a v. exa. o favor de a consultar.

O sr. Ruivo Godinho: - Sem prejuízo de eu fallar em seguida ao sr. Laranjo, porque preciso aproveitar a presença do sr. ministro das obras publicas.

O sr. Laranjo: - Direi pouco em resposta às considerações do sr. ministro dos negocios estrangeiros.

Diz o sr. ministro que não foi, nem de certo podia ser indifferente o facto grave passado em Paris, relativamente ao nosso credito. Acreditâmos isso sem custo, assim como acreditâmos que s. exa. sente, tanto como nós, taes factos, tão grandes aggravos; mas ha um ponto em que não concordo, nem posso concordar de modo algum com o sr. ministro.

Diz s. exa. que o ministro de França lhe respondera, quando reclamou, que as leis francezas não consentiam ao governo francez a intervenção naquelle facto, e que em vista d'esta resposta, não estando na sua alçada apreciar a legislação franceza, nada mais podia fazer.

Esta consideração, este silencio diante de tal resposta do representante da França e que me não contenta (apoiados da esquerda.) é que não póde contentar a camara.

A legislação franceza de certo permitte ao governo d'aquelle paiz a intervenção e intervenção energica para reprimir actos d'esta natureza contra uma nação amiga.

Basta ler a legislação franceza sobre a fixação de cartazes e sobre a distribuição de escriptos, sobre o que os francezes chamam affixage e coportage, para se ver que esses factos, todas as vezes que constituirem crime ou delicto, estão sujeitos á intervenção da policia para os reprimir promptamente, e á dos tribunaes judiciaes para lhes applicar a pena correspondente.

S. exa. não póde ficar tranquillo e inerte diante da resposta do ministro da França em Portugal ou da do ministro dos estrangeiros da França.

Pois quando se faz uma reclamação qualquer a uma nação, e ella responde que a sua legislação lhe prohibe intervir no facto originario dessa reclamação, o ministro que reclama deve logo por isso desistir do que reclama e não fazer mais nada?!

Se se admittisse tal doutrina, nenhuma reclamação originaria uma satisfação ou uma reparação qualquer, porque é raro que as nações ás quaes se reclama não tentem

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Defender-se a si ou aos seus subditos contra a reclamação que se apresenta. (Apoiados.)

Quando se tem direito insiste-se. (Apoiados.)

O que v. exa. tem a fazer é ver se a legislação francesa permitte ou não ao governo d'aquella nação intervir no caso, e se permitte, apresentar novamente as suas observações respeitosas sim, delicadas, sim, como são, e s. exa. bem o sabe, todas as reclamações diplomaticas; mas mostrando que a legislação franceza permitte a intervenção que se recusa, mostrando mais, que se tal facto se passasse; em Portugal, o governo portuguez não ficaria indifferente, e que se o governo portuguez não deixaria insultar a França, Portugal póde o deve pedir a reciprocidade. (Apoiados.)

Peça-a, pois, o sr. ministro, e se, por outra occasião, como disse o sr. Carlos Lobo d'Avila, a policia de Paris mandou arrancar das esquinas cartazes que ali se affixaram contra nós, porque não havia de intervir agora, sendo o facto muitíssimo mais grave?

Porque não ha de o sr. ministro insistir no pedido do tal intervenção e acrescentar-lhe o pedido da intervenção do poder judicial para castigar os auctores do facto?

Se tudo isso nós faziamos á França ou a qualquer outra nação, por pequena que fosse, que nos fizesse qualquer reclamação em caso identico, reclame s. exa.; não fique tranquillo diante; das primeiras evasivas do ministro da França. (Apoiados.)

Sobre o que se passa com a Inglaterra não quero dizer nada; respeito as reservas do sr. ministro.

O chefe do meu partido, na outra camara, disse já a s. exa. que nós, em tudo que seja questão internacional, acompanhariamos o governo, dando-lhe todo o nosso auxilio o só depois lhe pediriamos a responsabilidade inteira e completa do seu procedimento. Repito a mesma cousa; não quero levantar difficuldades ao governo, mus no negocio actual direi ao sr. ministro dos estrangeiros que não está feito tudo aquillo que se podia o devia fazer. (Apoiados.)

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Hintze Ribeiro): - Para que ha de o illustre deputado estar a confundir o que eu disse? Eu não disse que não podia discutir em face da lei escripta franceza, se ella era ou não applicavel ao facto que nos dizia respeito. Eu disse que não podia permittir me apreciar a legislação franceza, sobre se ella era justa ou injusta, conveniente ou inconveniente, acceitavel ou inacceitavel e compativel ou não com os bons processos de uma nação civilisada. Isto e mais nada.

O que eu disse, é que, sentindo que as leis francezas auctorisassem um procedimento desta natureza, contrario áquelle que deve partir de uma nação amiga, não podia comtudo entrar na apreciação se essa lei devia ou não subsistir em França como compativel ou incompativel com o regimen que a França entende dever admittir para si; (Apoiados.) o que é muito diverso.

O illustre deputado perguntou se as leis francezas auctorisavam factos d'esta natureza. Eu já respondi antecipadamente que tudo tem um limite. Podem as leis francezas ser inspiradas na maxima liberdade e tolerancia; comtudo ha uma cousa que deve ser contraria á interpretação das leis, ainda no paiz mais liberal e tolerante, e é que se possa fazer um aggravo com as circumstancias que presentemente se deram, em governo de uma nação estrangeira. (Apoiados.)

E foi exactamente por eu entender isto, que eu dei instrucções ao nosso representante em França, para que activasse as diligencias e que fizesse novas
instancias.

É claro que do contrario não tinha nada mais a fazer.

Já s. exa. vê que estâmos todos de accordo ácerca da maneira como procedi. (Apoiados.)

Perguntou-me s. exa. tambem por que não se fazia agora o mesmo que se tinha feito da outra vez, mandando arrancar os cartazes?

S. exa. comprehende que eu não posso, por melindre meu, entrar na apreciação desses factos passados; mas pondero uma cousa, e é que estes cartazes circularam em carros e não estavam affixados nas esquinas, e portanto não se podiam fazer arrancar das esquinas. (Apoiados.)

O processo evidentemente era outro; mas o processo não nos pertence a nós, pertence ao governo francez.

Nós temos que lhe dar inteira liberdade na maneira de proceder, do forma a salvar o decoro e a dignidade de uma nação, com a qual a França tem relações amigaveis. (Apoiados.)

Por estes principies é que nós pugnamos. (Apoiados.) Isto e o que nos pertence a nós, o resto da acção pertence ao governo francez.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.}
O sr. Ruivo Godinho: - Pedi a palavra para chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para factos graves que estão succedendo na provincia do Minho.

S. exa. sabe que pela lei de 1 de julho de 1867 ficou o governo auctorisado a proceder às obras necessarias ao saneamento dos pantanos e arrozaes em conformidade com as bases annexas a essa mesma lei.

Em cumprimento das disposições dos artigos 15.º o 17.º desta lei publicou-se o regulamento de 2 de outubro de 1886 para a sua execução.

Esta lei é para a extincção dos pantanos e dos arrozaes, e o regulamento, logicamente, não devia ter outro fim senão o executar a lei. Effectivamente as disposições deste regulamento são para este fim, mas nos artigos 139.° e 140.° estabelece penas para aquelles que cavarem, semearem ou colherem fructos nas margens das correntes.

Estas disposições estão, porém, dependentes da determinação das diversas zonas hydraulicas, creadas pela lei de 1 de julho de 1867.

Essas zonas têem de ser determinadas por uma commissão districtal, que tem de fixar quaes as correntes que ficam pertencendo ás zonas e que ficam sujeitas á lei de 1867 e de 6 de março de 1844.

Este regulamento, porém, está sendo applicado indistinctamente a todas as correntes.

V. exa. sabe, e o sr. ministro das obras publicas, que é um jurisconsulto e que tem exercido a profissão de advogado, sabe o direito que têem os donos de propriedades marginais a rios e correntes, e vê que as disposições deste regulamento estão diametralmente oppostas aos direitos estabelecidos pelo codigo civil.

D'aqui resulta que ha de haver muitas resistencias, e póde haver muitos prejuizos na applicação deste regulamento a todos as correntes, porque vae offender os direitos que o codigo civil garante aos donos das propriedades marginaes.

Eu pedia ao sr. ministro das obras publicas a fineza de prestar a sua attenção a este assumpto, e de dar instrucções aos empregados subordinados do ministerio das obras publicas, para que respeitem os direitos particulares, e não vão, como até aqui, invadir as propriedades particulares, prohibindo a todos os proprietarios, como acontece no Minho, que lavrem, semiem ou apanhem os fructos que se criem rins margens das correntes, mesmo particulares que sejam, pois não são elles que hão de determinar se as correntes são particulares ou não.

Isto está dando logar a graves prejuizos, e póde dar logar a graves conflictos, porque os proprietarios hão de acabar por invocar os seus direitos, e em vez de recorrerem aos tribunaes, podem desforçar-se por sua propria força e auctoridade, porque, como v. exa. sabe, o podem fazer, e como d'ahi resultariam graves conflietos, eu peço a v. exa. que, usando das attribuições do seu cargo, dê as instrucções necessarias para que esses inconvenientes cessem.

(s. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Arouca): -

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Declaro a v. exa. que hei de providenciar, e dar todas as instrucções necessarias a fim de que os direitos dos proprietários sejam respeitados, como é de justiça.

O sr. Alpoim: - Eu desejava fazer algumas perguntas ao sr. Arouca; como boje não posso fazel-as, pedia a s. exa. se dignasse comparecer na sessão de segunda feira,

O sr. Francisco Machado: - Sr. presidente, eu faço identico pedido ao do meu collega o sr. Alpoim. Também desejo, como s. exa. trocar explicações com o sr. Arouca.

O sr. Antonio Maria Cardoso: - Por parte da commissão de marinha, mando para a mesa dois pareceres que concluem por que devem ser remettidos ao governo os requerimentos de Alberto César de Carvalho Montenegro e de Gonçalo Ayres da Costa Campos.

Mando tambem para a mesa um requerimento, e peço a v. exa. se digne dar-lhe o destino conveniente.

(O requerimento vae publicado na secção competente a pag.).

Leu-se na mesa o seguinte:

PARECER N.0 140-A

Senhores. - A vossa commissão de marinha examinou o requerimento em que Alberto César de Carvalho Montenegro, commissario de 2.ª classe, allegando rasões de conveniência no serviço da administração naval, pede se determine o immediato preenchimento do respectivo quadro, creado pelo decreto de 31 de março de 1890; e, attendendo a que não compete á camara deferir tal pretensão, por se achar o poder executivo auctorisado a reorganisar esse ramo de serviço, é de parecer que o requerimento seja enviado ao governo para o tomar na consideração que merecer.

Sala das sessões da commissão de marinha, em 28 de junho de 1890. = Manuel Pinheiro Chagas = Arthur Hintze Ribeiro = Luciano Cordeiro = J. B. Ferreira de Almeida = Pedro Victor da Costa Sequeira = Pedro Ignacio de Gouveia = Antonio filaria Cardoso = Matheus Teixeira de Azevedo = Francisco Joaquim Ferreira do Amaral.

PARECER N.° 140-A

Senhores. - A vossa commissão de marinha, tendo examinado o requerimento em que o capitão de fragata reformado Gonçalo Ayres da Costa Campos, capitão do porto do Funchal, pede que, por meio de uma providencia legislativa, as disposições do § 2.° do artigo 156.° do plano de organisação dos quadros da corporação da armada de 31 de março de 1890, se tornem extensivas aos officiaes de marinha militar, reformados e em serviço, nas capitanias dos portos do continente do reino e ilhas adjacentes; e considerando que o poder executivo se acha auctorisado para a organisação das mesmas capitanias, é de parecer que esto requerimento seja remettido ao governo para o tomar na consideração que merecer.

Sala das sessões da commissão de marinha, em 28 de junho de 1890 = Manuel Pinheiro Chagas = Arthur Hintze Ribeiro = Luciano Cordeiro = J. B. Ferreira de Almeida = Pedro Victor da Costa Sequeira = Pedro Ignacio de Gouveia = Antonio Maria Cardoso = Matheus Teixeira de Azevedo = Francisco Joaquim Ferreira do Amaral.

O sr. Eduardo Villaça: - (O discurso será publicado na integra, em appendice a esta sessão, quando s. exa. devolver as respectivas notas.)

O sr. Agostinho Lucio: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que seja prorogada a sessão até se votar o projecto.

A camara resolveu affirmativamente.

O sr. José de Castro: - Sr. presidente, em harmonia com o regimento mando para a mesa a seguinte moção de ordem, que passo a ler:

«A camara, reconhecendo a conveniencia do que passem para o ministerio da instrucção publica os estabelecimentos de ensino profissional e industrial, passa á ordem do dia. = José de Castro.»

Sr. presidente, em verdade reconheço que, havendo de fallar nesta casa, tenho innumeras difficuldades. Não são aquellas innumeras a que se referiu o illustre deputado, sr. José Julio Rodrigues, criticando o relatório do nobre ministro da instrucção publica, onde se encontra tal expressão e a respeito da qual disse aquelle cavalheiro: «que se o sr. ministro sabia que eram innumeras, fôra porque as havia contado». Eu não as contei; e por isso mesmo lhes reconheço a qualidade de innumeraveis, embora possa classificar as que mais de perto se me apresentam.

A primeira é o assumpto. Effectivamente este é espinhoso; porque, ou se considere como queria o sr. José Julio Rodrigues, como comprehendendo toda a instrucção, e n'esse caso v. exa. vê e a camara comprehende que tal questão e de uma complexidade e de uma gravidade enormes; ou só refere apenas á creação do ministerio da instrucção publica, como dizia o illustre parlamentar, sr. Elvino de Brito, e em taes circumstancias a questão peiora-se para mim, porque o assumpto está completamente esgotado. Mas em um ou outro caso cumpre-me fallar, visto que pedi a palavra.

Sr. presidente, tenho para mim que é sempre difficilimo fallar nesta casa e muito principalmente a um homem, que como eu, vem pela primeira vez á camara e que tem de o fazer em presença de tantas intelligencias superiores, de tantos talentos provados, como os que compõem esta assembléa. E o meu embaraço é tanto maior, quanto é certo ter de usar da palavra depois de distinctissimos professores, como os srs. José Julio Rodrigues, Luciano Cordeiro, Theophilo Ferreira, Elvino de Brito e Eduardo Villaça, de experimentados parlamentares, como os srs. Fernando Palha e Lourenço Malheiro e finalmente depois do sr. conselheiro José Dias Ferreira, que é incontestavelmente uma das primeiras summidades do nosso fôro e um dos ornamentos mais brilhantes d'esta casa.
(Muitos apoiados.)

Fallar depois de tudo o que ha de eminente nas sciencias e nas letras é, alem do temeridade, uma audacia inqualificavel. Mas dir-me-hão: se reconhecias tudo isso para que pediste a palavra e para que falias? E eu respondo:

Foi uma insidia que inconscientemente a mim proprio armei. Vou contar:

Ouvindo o sr. José Julio Rodrigues, a quem escutava com a maior attenção pareceu-me, em certa altura do seu discurso, que havia uma enorme contradição. Pedi então a palavra. Attentei logo na situação critica em que me collocára.

Se me fora permittido recuar, tinha desistido d'ella; mas, visto que a tinha pedido e já não podia retroceder, sob pena de ser mal interpretado o meu procedimento, assumi todas as responsabilidades.

Eis a rasão por que fallo.

Alem d'esta rasão que aponto, ha ainda uma outra. O illustre parlamentar, sr. Dias Ferreira, discursando aqui a respeito d'este assumpto, começou por dizer que tinha por costume votar sempre contra os pareceres ou projectos que tivessem por fim crear despeza.

Ora, eu tenho a honra de fazer parte da commissão de fazenda; e por isso cumpre-me dizer as rasões que me levaram a assignar, como membro d'aquella commissão, esses pareceres.

O que imperou, pois, no meu espirito para assignar o parecer?

Vou dizer.

Sr. presidente, v. exa. recorda-se que nós fomos perfeitamente assaltados por um acontecimento desagradável, tal foi o ultimatum de Inglaterra.

Todos se recordam de que esse acontecimento produzia em nossos corações uma perturbação extraordinaria.

Eu tambem, soffri, porque sou portuguez e patriota.

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Mas que rasões haverá para entroncar n'este facto, que parece tão estranho, o de se crear o ministerio da instrucção publica?

Com o mesmo livro com que o distincto parlamentar que me precedeu, sr. Villaça e a quem ouvi com a maior attenção, porque não conheço caracter mais sympathico, orador mais fluente, deixem-me dizer, mais meigo, e se fora uma senhora, eu diria mais adorável, com o mesmo livro, repito, que s. exa. fez obsequio de me ceder e com O qual pretendeu combater a opportunidade da creação do ministerio da instrucção publica, vou demonstrar pela minha parte que se o estremecer da nossa alma foi análogo ao da França ao cair fulminada em Sédan, analogos tambem são os meios que procurámos para lavar a affronta que nos foi feita pela Inglaterra, comparando-os com os seguidos por aquella nação depois da vergonhosa derrota.

E assim evidenciarei a necessidade da nossa rehabilitação por meio da instrucção publica.

Diz-se n'este livro que tem por titulo: - L'Education de nos fils, e que 6 escriptor por Jules Rochar, o seguinte:

«Ha vinte annos a esta parte (o auctor já escreve em 1890) as questões de educação são entre nós a ordem do dia. O paiz occupa-se dellas com um interesse igual á indifferença que anteriormente lhes votava. A França tinha com effeito parado na via do ensino. As nações que marcham mais resolutamente no caminho do progresso, têem por vezes descansos, durante os quaes deixam que as que vinham na rectaguarda lhes tomem a vanguarda...

«As suas infelicidades (refere-se á França) accordaram-n'a. Estupefacta do seu desastre, e não podendo explicar a si própria uma igual derrota, preferiu attribuir o triumpho dos allemães mais ao seu saber do que á sua organisação militar, etc.»

Em que se baseava, pois, a organisação militar allemã? No serviço obrigatório e no ensino obrigatorio.

Portanto aqui está n'este segundo elemento a confirmação d'aquella verdade. O mestre-escola venceu em Sadowa. A phrase á força de repetir-se está estafada, como s. exa. disse? Mas isso dá-lhe ainda mais foros de verdadeira. Um principio verdadeiro, por muito que se repita, não perde essa qualidade essencial.

Quer dizer, depois d'este acontecimento terrivel, foi então que a França acordou para só rehabilitar por meio da instrucção.

E agora recordo-me, fallando da França e de Sédan, de uma phrase que ouvi ao sr. capitão Machado.

Ha dias este illustre deputado, occupando-se da questão ingleza e das sympathias que o nosso paiz tinha no estrangeiro, disse que se podia resolver tal pendencia perfeitamente, aproveitando as sympathias manifestadas pelos outros paizes.

É extraordinario que se venha dizer isto; porque a verdade é que o desgraçado Tliiers, vendo a sua pátria em perigo e julgando que captava as sympathias das nações da Europa, conseguindo d'ellas o necessario auxilio, percorreu-as inutilmente.

Obteve sympathias, é certo; mas nada mais.

As sympathias nada resolvem. Se eu quebrasse um braço ou uma perna em presença de varias pessoas, ser-me-ia certamente mais agradavel que estas me lamentassem do que mofassem da minha infelicidade. Mas que fazia isto á minha perna ou ao meu braço? Nada, absolutamente nada.

As sympathias que teve a França não lhe deram resultado pratico algum; do mesmo modo que as que nós temos não irão mais longe.

Fallou tambem s. exa. e leu até aqui um livro em que se reuniram alguns escriptos de differentes jornalistas francezes, querendo demonstrar assim as extraordinarias sympathias de que gosamos no estrangeiro. Escusava de lá ir tão longe. Ha tempos publicou-se em Coimbra um livro intitulado o Anathema, em que os distinctos académicos An-tonino Vaz de Macedo e Pinto da Rocha, colligiram escriptos dos primeiros homens dos povos latinos, nos quaes mais uma vez se affirma a elevada estima que nos consagram e a enorme indignação que lá fora produziu a affronta que soffremos. N'essa excellente e patriótica publicação collaborou tambem o nosso insigne caricaturista Bordallo Pinheiro, cujo lapis é assombroso de graça e de talento.

E quer ver v. exa. como eu }á pensava nesse tempo com respeito ao que nos cumpria fazer, sem me importar com as sympathias do estrangeiro?

Eu leio o final de um pequeno artigo que mandei para essa publicação.
Dizia eu o seguinte:

«Accorrtunos todos e vinguemos o presente em nome do passado. Mas facâmol-o digna e serenamente, pela prudencia que dá o bom conselho, polo trabalho que dá o valor e pela união que dá a força.»

Trago isto tambem para dizer a v. exa. e á camara qual o meu modo de pensar desde ha muito tempo, e especialmente desde que se deu aquelle tristissimo acontecimento.

Apesar da minha organisação extremamente nervosa que devia levar-me para os exageros da linguagem indignada, que devia arrastar-me para as injurias violentas contra a nação que nos offendeu, e ainda para a desforra pelo meio da força armada, eu não segui esse caminho. Entendi que a desgraçada pendencia devia ter uma outra solução.

Pareceu-me que se devia seguir um outro rumo, e que a todos os alvitres apaixonados deviamos antepor esta verdade: vençamos com o trabalho.
Mas como o trabalho, todo o trabalho de qualquer especie que seja, quer se refira ás industrias, quer às artes, quer ás sciencias, tem como base a instrucção; e como esta para ser proficuamente distribuida e desenvolvida requer sem duvida um centro de acção e de unidade que lhe dê força, movimento e vigor proprios, eu comprehendi a necessidade da creação do ministerio da instrucção publica.

Como se vê eu tinha já este pensar. O livro do illustre deputado, sr. Villaça, veiu-me confirmar ainda mais n'elle, se mais era possivel.

Sr. presidente, ouvi com muita attenção o discurso do sr. José Julio, como ouvi do mesmo modo todos os oradores que me precederam.

O discurso deste illustre parlamentar já em parte foi respondido por alguns illustres membros d'este lado da camara; e por isso eu só tocarei em alguns pontos que ainda não tenham sido tratados.

S. exa. disse que já tinha advogado a creação do ministerio da instrucção publica; e depois ouvi-lhe apresentar argumentos para demonstrar que tal ministerio se não devia crear.

Perdoe-me o illustre deputado, mas a isto chama-se uma contradicção flagrante.
Pois advoga a creação do ministerio e agora combate-a!? Como se comprehende isto? Eu não sei explicar.

Disse tambem s. exa. que o havia impressionado muito uma expressão que se encontrava no relatorio e era o affirmar-se que a creação do ministerio devia merecer uma attenção especial.

Julgo que esta impressão do distincto professor e tambem distincto parlamentar não tem rasão de ser.

Ao que me parece, a palavra especial não tem importância sufficiente para s. exa. se impressionar tanto; porque, embora a instrucção seja effectivamente uma cousa geral, pois serve de base a todos os conhecimentos humanos; é certo, todavia que, pelo amor que o governo e o ministro respectivo lhe devem dedicar, ella 5 um assumpto especial, especialissimo.

Por consequencia, não vejo rasão alguma para s. exa. vir admirar-se do emprego
da expressão especial.

S. exa. estranhou tambem de que por parte do governo

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houvesse o pensamento de julgar-se que effectivamente a instrucção primaria é uma origem de riqueza, tanto no presente como no futuro.

Tambem não encontro motivo algum para essa estranheza porque s. exa. é naturalmente o primeiro a acceitar como verdade incontestavel que sem instrucção não póde haver nem trabalho, nem artes, nem industria nem cousa alguma util e productiva.

(Interrupção do sr. José Julio.)

Só se eu mesmo me trahi. A não ser assim, ha uma contradicção entre aquillo que s. exa. tinha affirmado anteriormente e aquillo de que tomei nota.

Disse s. exa. que a Instrucção, como elemento de defeza, não é para já.

Admirei-me de que s. exa., affirmasse isto, e admirei-me pelo seguinte:

Pois a Instrucção que tem a Prussia, a derrotada em lena, foi alcançada de um dia para o outro?!

Vejâmos.

A batalha de lena deu-se em 1806, e a batalha de Sédan deu-se em 1871. Trabalharam, portanto, durante sessenta e cinco annos os prussianos para chegarem de lena a Sédan!

Não póde por consequencia dizer-se que a Instrucção, como elemento de defeza, não é para já.

A instrucção, como elemento de defeza, é para hoje, é para ámanhã, é para o anno, é para sempre.

É evidente que de um dia para o outro não podemos educar muitos milhares de soldados. Não é isso possivel. Mas ao menos eduquemos, por exemplo, dois mil soldados n'um anno, dois mil no anno seguinte, e assim successivamente.

Permitta-me a camara que n'esta occasião eu leia um trecho que tem muitissima relação com o assumpto.

Não leio, note-se, pelo prurido de mostrar erudição, porque é facil para todos ir buscar um trecho de um livro e lel-o aqui. Leio porque desejo que estas palavras fiquem consignadas nos annaes parlamentares:

Mr. Jules Simon no seu excellente livro - Le gouvernement de M. Thiers, diz:

«A Prussia tinha comprehendido isto muito bem (referindo-se á Instrucção) depois de lena! Stein reorganisou a administração, Sharnhost o exercito, Humboldt o ensino e Fichte, o philosopho, percorria as cidades e as provincias, fazendo renascer a honra e o patriotismo não só pelos seus discursos vigorosos, mas sobretudo prégando a reforma da educação nacional. Nós pertendiamos em 1872 seguir o caminho traçado por Sharnhost; era preciso tambem imitar Humboldt e Fichte. Os patriotas austriacos diziam a mr. Jules Simon que percorria a Austria depois de Sadowa: Foi o mestre escola que nos derrotou.»

Foi, me parece, o sr. Eduardo Villaça que fez mais ou menos espirito com esta ultima phrase a que já anteriormente me referi.

Mais tarde eu direi a s. exa. que o acompanho no caminho que seguiu, porque tenho tambem para mim que a Instrucção do militar não é só saber ler.

Entendo que só chegâmos á verdade desde que juntemos dois elementos: o saber ler e a instrucção militar propriamente dita. Isto é que constituo a educação completa do soldado. (Apoiados.)

As duas cousas conciliam-se perfeitamente.

Agora que fallei de Fichte, do homem que fez a propaganda do ensino e da educação nacional na Prussia, permitta-me o sr. José Julio Rodrigues, que alem de parlamentar distincto, é professor insigne, lhe peça para se collocar ao lado d'este ministerio, do ministerio que vier, de todos os que se seguirem - porque não deve haver politica n'esta questão - (Apoiados) illucidando com a sua longa pratica e fazendo a propaganda por meio de prelecções, de escriptos, por meio de tudo o que a sua superior intelligencia lhe suggerir.

S. exa. tem um talento superior e sobretudo qualidades especiaes, faculdades especialissimas, em que não é facil ser comparado com outro qualquer professor, visto que s. exa. se tem dedicado mais que ninguem entre nós a este modo de dizer, perfeitamente de prelector, que é muito facil para s. exa., mas muito difficil para os que se não tiverem dedicado a essa especie de ensino. Rogo, pois, a s. exa. que seja o Fichte do nosso Portugal.

Occupando-me do ensino na Allemanha permitta-me tambem o sr. Luciano Cordeiro que me afaste de s. exa. em uma apreciação que fez.

Segundo o meu modo de ver, a Prussia deve inquestionavelmente a sua posição hegemonica, a sua supremacia sobre os povos germanicos aos dois factores que s. exa. apontou-o ensino e o serviço militar obrigatorio; mas isto constituiu apenas a hegemonia d'aquelle paiz, da Prussia; mas quanto á união d'aquelles povos, não; deve-se esta a um outro elemento muito mais importante que tem de tomar-se em consideração: o Zolhverein germânico. Foi elle a causa primeira e unica da união dos povos da raça germanica; o elemento principal para a formação do grande imperio allemão da actualidade.

O Zollwerein está considerado pelos primeiros economistas como a quarta potencia commercial do mundo, como a terceira da Europa, e a segunda do continente europeu. Imagine-se, portanto a importancia d'esse elemento para a unificação d'aquelles povos.

Foi, pois, este grande elemento, esta grande força, esta grande potencia, que fez, antes de tudo, a união germanica.

E devo dizer, que este enorme trabalho de um homem de altissimo merecimento, de Frederico List, alguem o quer reproduzir nos povos da raça latina.

Esteve ha tempos entre nós o benemerito que tem trabalhado ha vinte e tantos annos, n'esta lucta extraordinaria de estabelecer a união commercial dos povos da nossa raça sob o nome de Zollwerein mediterranico.

Esse homem é um francez illustre, Marc Amédée Gromier.

D'aqui por quarenta ou cincoenta annos é possivel que aquelle elevado pensamento possa tornar-se uma realidade entre os povos latinos, pelo menos no que respeita ás relações economicas e commerciaes que hajam de unil-os.

Assim, pois, discordando do sr. Luciano Cordeiro apenas n'aquelle ponto, não posso deixar de admittir que o facto que mais influencia teve na supremacia da Prussia sobre a Allemanha foi o ensino obrigatorio e o serviço militar obrigatorio.

Dizia o distincto parlamentar, sr. José Julio Rodrigues: «O povo não sabe ler, e não com prebende o governo, os seus deveres, etc.»

Eu tambem digo, que o povo não sabe muito ler; sabe pouco, muito pouco. Perfeitamente de accordo. Mas por isso mesmo é preciso ensinal-o.

E o sr. Malheiro, referindo-se a este assumpto ou similhante, disse: «que não queria leitura só, queria mais alguma cousa, queria educação pratica.» Concordo com s. exa., mas apenas discordo n'um ponto, e é o seguinte: tenho para mim que o homem completamente ignorante, sem sequer saber o A B C, está nas condições, em que estaria o individuo, que tivesse uma casa cheia de instrumentos para trabalhar, mas estivesse ás escuras e de modo a não poder achar um de que precisasse servir-se.

É perfeitamente isto. No cerebro lá estão os instrumentos que são as suas faculdades, mas não sabe usar d'ellas.

Mas cáia um raio de lua sobro aquelle cerebro, saiba ler e escrever, que é mais do que luz lançada sobre aquelle espirito, e veremos como póde trabalhar em qualquer industria, ser soldado, artista, emfim applicar-se a tantas cousas quantas são as variedades de trabalho em que o homem póde occupar-se.

Concordo em que com effeito o ensino unico e exclusivo

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de saber ler e escrever, dado a quem quer que seja, não é sufficiente; é preciso effectivamente formar-lhe uma faculdade, com a qual elle possa ser util ao paiz e aos seus; mas, como origem de todos os conhecimentos, não póde deixar de vir o ler e escrever, como condição essencial. (Apoiados.)

Lembro-me, de que com relação á creação do ministerio da instrucção publica, cousa que já está discutida, disse o illustre parlamentar o sr. Dias Ferreira que tinha por systema não votar dinheiro algum para despezas.

A este respeito occorre-me, feitas as necessarias differenças, uma historia, que me contava um juiz de direito, meu amigo, que é realmente muito amavel e gracioso. A historia é a seguinte:

«Havia um individuo que fôra chamado ao tribunal para responder por um crime que se lhe imputava. Tinham-lhe recommendado que negasse tudo. Pois bem; chegado á presença do juiz, este começou o interrogatorio pela seguinte fórma:

« - Como se chama?

« - É essa a primeira cousa que eu nego! respondeu o interrogado.»

Ora s. exa. n'esta sua resistencia a approvar a despeza com a creação do ministerio da instrucção publica, faz-me com effeito lembrar do caso a que me referi. Reprova tudo o que sejam despezas!

É certo que nós devemos estar sempre com receio de peiorar a nossa situação financeira; mas é certo tambem que ha despezas, como dizia o sr. José Julio Rodrigues, que são santas. N'uma questão como esta da instrucção publica, todos os dispendios são santos, e não deviamos realmente por fórma nenhuma oppor-nos ás despezas justas que nos cumpre fazer. Estas que agora se nos pedem são, justissimas.

É necessario preparar os trabalhos por fórma tal, que haja pouco onus para o thesouro, mas quanto a mim affianço a v. exa. e á camara, que votarei sem repugnancia tudo que se mo disser que é para o desenvolvimento da instrucção da nossa patria.

Eu fui o sou ainda um louco pela instrucção, com quanto não a tenha.

Vozes: - Não apoiado.

O Orador: - Dizia tambem o sr. José Julio Rodrigues que este ministerio vinha enfesado e fraco. Devo lembrar a s. exa. que um dos homens que nasceu mais enfesado no seculo actual foi Victor Hugo.

Pois o enfesado transformou-se n'esse gigante que s. exa. viu, deixando o nome mais glorioso que um homem póde ter. (Apoiados.)

Assim tambem este ministerio que começa fraco e enfesado, como s. exa. diz, póde tornar-se grande se souberem cumprir os seus deveres os que hão de occupar aquelle logar.

Emquanto ao nobre ministro sr. Arroyo, cujos elevados talentos sou o primeiro a admirar e a respeitar, tenho a convicção de que ha de cumprir o seu dever (Apoiados da direita.) e elevar-se á altura de um estadista para cumprir perfeitamente a sua missão patriotica.

Eu não digo isto para lisonjeai, não costumo lisonjear ninguem; digo unica e exclusivamente o que sinto na minha consciencia. É o meu feitio.

Como a questão da centralisação ou descentralisação do ensino já foi tratada largamente pelos meus illustres collegas, os srs. Theophilo Ferreira e Lourenço Malheiro, não fali o sobro esse assumpto.

Já se fez referencia aqui tambem a programmas.

Eu pedia n'este momento ao sr. ministro da instrucção publica o pedia-lhe com todo o encarecimento, que no momento do elaborar aquelles, tivesse s. exa. muito em consideração um facto digno de attender-se e é que póde em alguns pontos haver necessidade do se crearem aulas nocturnas.

Pedia a s. exa. com todo o interesse e com todo o empenho que póde ter um bom portuguez em ver desenvolver-se no nosso paiz a instrucção, que tivesse isto em consideração.

Eu sou de uma povoação pequena, e sei perfeitamente a necessidade dos povos que estão n'aquellas circumstancias.

N'essa povoação abriu-se uma aula do instrucção primaria, nocturna, que deu magnificos resultados.

Estou persuadido que n'uma grande parte do paiz aonde se trabalha desde manhã até á noite, e de inverno especialmente, como diz o meu illustre collega e amigo, sr. Alpoim, era de altissima conveniencia que se organisassem estas escolas nocturnas. (Apoiados da direita.)

Fallou o illustre deputado, sr. José Julio, em creação do escolas para meninas.

Eu não conheço institutos que possam dar melhores resultados do que são esses que se destinam á educação da mulher.

Mas não se vá pensar que quero institutos para fazer d'ellas doutoras ou escriptoras.

Eu approximo-me muito do pensar do sr. José Julio Rodrigues. Desejaria que a mulher tivesse uma educação essencialmente pratica, propriamente para donas de casa: na gente do povo ainda e mais imprescindivel esta educação.

Uma senhora da alta sociedade póde e deve talvez saber francez, inglez, allemão, piano, etc; mas para a gente do povo tudo isto é zero, a não ser que a queiram dedicar ao professorado; mas querendo ser apenas dona de casa, não conheço nada mais prejudicial, porque geralmente as mulheres n'estas condições tornam-se vaidosas e até indifferentes aos misteres do governo domestico.

Fallando n'este assumpto, aproveito a occasião para pedir ao sr. ministro da instrucção publica que não deixe de organisar esses estabelecimentos apropriados para educação de meninas, em conformidade com as tradições do paiz e com as necessidades que as alumnas tiverem, segundo a posição que occuparem. Esta medida é de alta conveniencia social.

Maistre dizia: «as mulheres não inventaram nem a algebra, nem o telescopio; mas fazem alguma cousa maior do que isto. É nos seus joelhos que se fórma o que ha de melhor no mundo: um homem de bem e uma mulher honesta».

Podia acrescentar muitos outros conceituosos pensamentos que a este respeito diz, o bom Michelet, o homem que escreveu com mais delicadeza a respeito da mulher; mas fico por aqui para não cansar a attenção da camara.

Com respeito ao exagero do nosso viver e da nossa educação e no intuito de evital-os, lembra-me agora um caso que vem a proposito, e é contado nas Farpas pelo notabilissimo escriptor, sr. Ramalho Ortigão.

Em uma occasião o honrado bispo de Vizeu, D. Antonio Alves Martins, passeiando em uma rua d'esta cidade, encontrou o seu barbeiro que ía com as filhas vestidas de seda, chapéus correspondentes, etc., etc., em summa, muito luxuosas.

O bispo perguntou-lhe:

- Para o que destina você as suas filhas? O barbeiro respondeu:

- Para arranjarem um casamentosinho bom e para serem mulheres honestas.

- Pois está enganado; para o que você as destina, é para serem umas typas.

Foi esta a phrase! Não se admirem s. exas.. Tinha phrases d'estas o bispo do Vizeu.

Desde o momento em que os pães não tratam de dar educação apropriada a suas filhas, é fazerem d'ellas umas typas. O honrado prelado tinha rasão.

O illustre deputado sr. José Julio disse que não gostava do ministerio da instrucção publica, porque elle não vinha dotado largamente. Tinha rasão, porque em verdade, um ministerio da instrucção publica que não possua uma larga

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dotação, não póde dar certamente os resultados que todos nós desejamos. Póde dar alguns, mas não dá todos. Esta é a verdade; mas por essa rasão, não devemos repellir o pouco, porque não vem o muito. Se o pouco é conveniente, acceitemol-o emquanto não vem o mais. Se acceitassemos em absoluto as idéas de s. exa. nada fariamos, por que nós nas circumstancias em que nos achamos, não podemos fazer dotações largas para serviço algum.

O illustre deputado o sr. Fernando Palha, fallando a respeito do projecto, disse que elle estava completamente inane de idéas, e assim, que de modo nenhum o podia acceitar. Se eu não tivesse uma grande confiança em que o illustre ministro da instrucção publica se elevaria a tudo que ha de superior para organisar um plano completo de instrucção publica; se eu não tivesse a certeza de que s. exa. ha de manifestar mais uma vez o seu grandissimo talento, então eu lembraria uma solução, que era facilima, e que responde perfeitamente ao sr. Fernando Palha.

O marquez de Pombal, esse homem extraordinario, não fez cousa alguma por si proprio; não reorganisou o nosso exercito; não fez os estatutos da universidade, não fez nenhum regulamento de fabricas; o que fez foi usar do seu grandissimo talento para rodear-se de homens illustrados e intelligentes, de homens verdadeiramente superiores.

N'este momento, longe de toda a idéa de politica partidaria, eu lembrava ao illustre ministro da instrucção publica, como lembro desde já a todos aquelles que vierem a occupar aquelle logar, que, embora não façam por si mesmos, a remodelação do novo ensino, se rodeiem de homens de todos os partidos, e organisem um trabalho que seja tão duradouro, como estou certo ha de sel-o o nome do ministro, que fica vinculado ao primeiro ministerio da instrucção publica em Portugal.

Desejo responder, uma a uma, a todas as affirmações do illustre deputado o sr. Villaça.

S. exa. fez um discurso erudito, despretencioso, mas cheio de saber. Impressionou-me, como me impressiona sempre s. exa. quando falla n'aquelle superior estylo a que s. exa. sabe elevar-se.

É possivel, e mesmo certo, que eu não possa responder com a proficiencia e clareza com que s. exa. o fez. Em todo o caso irei pouco a pouco respondendo a cada uma d'essas afirmações e veremos se posso conseguir o que eu desejo.

Antes, porém, preciso tocar noutros pontos que tenho por muito importantes.

Com relação a programmas, de que tambem fallou o illustre parlamentar o sr. José Julio Rodrigues, eu lembraria que não usassemos d'elles muito pesados, muito eruditos para os professores de instrucção primaria ruraes.

Quer v. exa. ver, sr. presidente, o que diz um publicista allemão, M. Bluntschli, queixando-se da enorme extensão dos programmas de ensino, exigidos aos professores, e que tem toda a applicação para nós?

«As nossas escolas normaes têem-nos sobrecarregado de estudos que são ou devem ser inuteis para o seu modesto ensino. Seduzidos por pedaços de sciencia, enchem-se de uma vaidade pedante ou de uma sede de estudos superiores pouco compativeis com a sua missão. A escola popular perde d'este modo a sua simplicidade e a sua moralidade, qualidade essenciaes...»

Na sabia Allemanha pensa-se assim.

Effectivamente succede que a maior parte dos professores de instrucção primaria das nossas aldeias, esquecendo-se completamente que são apenas professores e não sabios ou doutores, dão-se ares unicamente por se lhes exigirem programmas a, que realmente elles não deviam ser obrigados. Bastava que o professor de instrucção primaria soubesse ler, escrever o contar muito bem e ter, emfim, umas idéas geraes de certos conhecimentos indispensaveis; mas estarem a sobrecarregar os programmas ao ponto em que actualmente se encontram é uma cousa monstruosa. Parecem-me bachareis formados em direito!

(Interrupção do sr. Alpoim.)

Nem com capello, diz o meu collega, sr. Alpoim; (Riso) e acho-lhe rasão. É de mais!...

Ouvi ao illustre deputado, sr. Villaça uma affirmação que tambem já ouvira anteriormente ao distincto parlamentar, sr. Dias Ferreira, affirmação com a qual não me conformo; e não me conformo porque os factos estão demonstrando o contrario. Affirmaram s. exas. que fôra o numero que vencera em Sedan. Não foi só o numero, foi a instrucção e educação do soldado. (Apoiados.}

Eu tenho aqui, extrahidos do livro de M. Jules Simon, alguns trechos de discursos, que foram expostos por Thiers e outros no parlamento francez. D'elles se conclue que a rasão está do meu lado.

Thiers dizia:

«Se o numero deve ser considerado como elemento importante para a victoria, o valor moral contribue para ella mais efficaz e mais seguramente.»

E M. Jules Simon acrescenta:

«Um pequeno exercito de soldados bem dirigidos é preferivel a uma grande multidão de soldados mediocres que não saibam obedecer nem sustentar o fogo e a fadiga.

..................

«Um individuo completamente ignorante não poderia nunca ser um bom soldado.
«Como quereis vós, dizia o general Guillemaut, que possamos ensinar aos nossos recrutas a apreciar, a comparar, a medir distancias, a fazer uma pontaria conveniente se um quarto não sabe ler nem escrever e só os tres quartos restantes sabem apenas o que é um kilometro? Como quereis que nós possamos ensinar aos nossos cavallarias a fazer reconhecimentos serios, uteis, só a maior parte são incapazes de entender um mappa, do notar as estradas, as pontes, os caminhos de ferro, os vales e as montanhas?»

O numero é muito, mas o saber é muito mais.

Era n'este ponto que eu queria demonstrar ao sr. Villaça que, segundo o meu modo de entender, não está bem na verdade. A verdade é que o soldado precisa, primeiro que tudo, instrucção; se não tiver esta, não comprehenderá as manobras nem o mais que d'elle queiram exigir. E demais os exercicios ou as manobras são o complemento para a perfeita educação militar.

Peço aos briosos militares, membros d'este parlamento e meus illustres collegas que se acham presentes, me não levem a mal o estar fallando em assumptos militares sem ter para isso competencia; mas tenho de responder ao que aqui se disse, e faço-o não com opiniões minhas, mas com a opinião de homens de altissimo merecimento, como Thiers, Jules Simon e Guillemaut, a quem já me referi ha pouco.

É pois certo que a educação militar tem de basear-se na instrucção primaria principalmente.

Isto é evidente. Desde que o soldado não sabe ler, não póde perceber o que se lhe pretende ensinar.

(Interrupção que se não percebeu.)

Tinha desejo de continuar para responder por completo ao illustre deputado, sr. Villaça; mas a hora vae adiantada e sei que ha oradores inscriptos para se occuparem d'este assumpto ainda n'esta sessão; e por isso não quero roubar mais tempo á camara nem aos cavalheiros que vão seguir-se.

Terminando cumpre-me agradecer muito reconhecido á camara a forma distincta porque me tratou e a delicadeza com que me ouviu, não tendo eu merecimento algum.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado pelos srs. deputados de ambos os lados da camara.)

Foi lida na mesa a moção do sr. José de Castro, que foi admittida.

O sr. Luciano Cordeiro: - Por parte das commissões

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reunidas mando para a mesa uma emenda ao n.° 2.° do artigo 1.° aclarando uma ambiguidade de redacção, que foi notada pelo sr. Fernando Palha.

O sr. Elias Garcia (sobre a ordem): - A minha moção de ordem é a seguinte:

«A camara resolve manter as disposições da lei de 2 de maio de 1878 e passa á ordem dia. = J. Elias Garcia.»

A estreiteza do tempo, por isso que a camara resolveu prorogar a sessão, obriga-me a restringir as considerações que eu desejava fazer com respeito a este projecto; cingir-me hei principalmente ao assumpto da minha moção.

Não tratarei da creação do ministerio, mas não mo esquivarei a notar uma circumstancia que me parece digna de observação.

Ha muitos annos que se falla entre nós na creação de um ministerio de instrucção publica, e eu não sou opposto, como mais de uma vez tenho dito d'este logar, á creação d'esse ministerio.

Já se creou em 1870; por essa epocha estava eu n'esta casa; e se os meus esforços podessem lograr os resultados que eu desejava, o ministerio da instrucção publica ter-se-ía salvado então.

Mas não succedeu assim.

Têem passado annos e agora surge o ministerio da instrucção publica e bellas artes. Eu prescindiria do acrescentamento. Entendo que melhor seria ficar com a denominação de ministerio da instrucção publica, porque as bellas artes lá estavam comprehendidas na direcção geral.

E se se quisesse fazer alguma cousa, que nada teria de mau, bastaria o exemplo do que se fizera em 1870, aggregando áquelle ministerio os serviços da beneficencia.

N'aquella epocha julgou-se que os serviços da beneficencia deviam ficar no ministerio da instrução, pois esses serviços na actualidade estão incomparavelmente mais desenvolvidos.

E não se póde dizer que estes serviços devam estar menos sob a acção do ministerio da instrucção do que propriamente as bellas artes, por que é tambem conveniente que a beneficencia não seja uma arma politica. (Apoiados.) E eu posso dizer que actualmente ella está sendo uma das armas com que mais se explora na politica. (Apoiados.)

Mas digo eu que este projecto não trata da organisação da instrucção publica, disse-o o sr. ministro, e dil-o o proprio projecto; do que se trata apenas é de acrescentar um pouco mais, de dar um passo mais depois do decreto que creou este ministerio. Não é mesmo da organisação da instrucção publica que se trata; trata-se apenas de uma auctorisação para organisar o ministerio em bases laconicamente redigidas, e algumas d'ellas extraordinariamente obscuras.

Já se tem dito, e digo-o tambem agora, que, no projecto de organisação do ministerio da instrucção publica, não ha uma base pela qual possâmos imaginar qual será a nova organisação do conselho superior da instrucção publica. Sobre este ponto tenho ha muito idéas assentes.

Segundo a minha opinião supponho conveniente que os assumptos sejam considerados no conselho de instrucção publica, de maneira que se preencha convenientemente o fim que interessa á instrucção.

Uns estabelecimentos são preparatorios, outros completam a instrucção.

Não devem ser ouvidos só os conselhos das escolas, que são as que preparam, mas tambem as que completam, porque, se fosse ouvida apenas uma parte, o trabalho ficaria incompleto.

É portanto necessario fazer isto. Já o disse aqui, citando a opinião de um homem incontestavelmente mais auctorisado do que eu. Disse-o José Estevão n'esta casa, depois de reconhecer a organisação viciosa do conselho de instrucção publica, quando foi reformado em 1860.

Com respeito ao ministerio da instrucção publica, direi ainda que não é o que mais me preoccupa a divisão por ministerios.

Eu desejaria que os serviços publicos se organisassem constituindo-se uma direcção para caia serviço, e assim saber-se-ía bem o que custa cada serviço; depois, segundo as necessidades de momento, poder-se-íam reunir duas ou tres direcções sob a direcção superior de um ministro, porque as circumstancias nem sempre recommendam, por exemplo, que quem está no ministerio da justiça, seja o mais proprio para os negocios ecelesiasticos, ou que quem está á frente dos negocios do ultramar, deva estar tambem com os negocios da marinha, ou que o que tem a seu cargo os assumptos relativos á agricultura, deva ter os que respeitam
ás obras publicas.

O conveniente é que os serviços estejam completamente organisados, se saiba o que custam para se poderem apreciar bem. A reunião d'elles em ministerios, tem para mim secundaria importancia.

Mas comquanto este projecto não mire a organisar a instrucção publica, apresenta como condição essencial para a organisação do ministerio duas cousas: uma a devolução para o estado dos serviços da instrucção publica, que não estavam a cargo d'elle, outra a reunião n'este ministerio de uma parte dos serviços da instrucção, que estão actualmente no ministerio das obras publicas.

Sobre este segundo ponto nada tenho a acrescentar ás valiosas considerações feitas pelos meus collegas e com as quaes em geral me conforme, pedindo apenas a quem houver do dirigir este assumpto que as tome na consideração que lhe é devida. Afigura-se-me que o sr. ministro, para realisar o seu pensamento, se porventura o tem, deve armar-se de todos os elementos, de todos os recursos.
Um dos nossos collegas disse hontem n'esta casa que é preciso não dizer só boas cousas. Isso só não serve. Fazer e o essencial, dizia elle citando o que se fazia na America, parecendo estar fallando menos como portuguez do que como americano.

Ora, eu sou portuguez, e como tal me tenho, mas tambem tenho ha muito tempo a convicção do que mais vale uma escola do que trinta mil discursos.

Eu antes quero que uma cousa qualquer se faça, em vez de dizer-se que se vão fazer, e ainda ha pouco ouvi um meu illustre collega que está, sob este ponto de vista, um pouco de accordo commigo. Eu tambem não gosto de grandes planos, e o sr. ministro disse que não fazia um plano de ensino, por que não valia a pena fazel-o; é possivel que saiba escrevel-o, e em todo o caso foi bom que não o fizesse, porque talvez elle tivesse uma discussão verdadeiramente infinda, como succedeu quando aqui se tratou da reforma da instrucção secundaria, que não deu resultado.

Mas pergunto eu: se o sr. ministro da instrucção quizesse effectivamente formar um ministerio capaz de produzir alguma cousa util, teria procedido como procedeu?

Em minha opinião não procedia assim.

S. exa. foi buscar embaraços e difficuldades de seu motu proprio, porque é muito mais difficil organisar o ministerio como s. exa. quer, do que organisal-o nas condições em que seria conveniente organisar-se para produzir cousa boa.

O illustre ministro diz n'este projecto que a primeira medida que urge tomar é a seguinte:

«A primeira medida, que urge tomar desde já, como base preparatoria de uma posterior remodelação do ramo fundamental do ensino, é a de reunir no ministerio da instrucção publica e bellas artes todo o ensino official da instrucção primaria elementar e complementar, que a lei de 2 de maio de 1878, n'uma applicação rasgada do principio da descentralisação administrativa, confiou á iniciativa e direcção das camaras municipaes e das juntas de parochia.»

Ora, em 1870, creou-se, como todos sabem, o ministerio da instrucção publica, e depois d'elle creado o primeiro

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acto do ministro foi dizer que era indispensavel passar a instrucção primaria para o serviço das localidades.

Entendeu, e muito bem, o ministro de então, que para a reforma vingar era preciso interessar n'ella não só o reformador, mas o paiz inteiro, todos os municipios, todas as juntas geraes, todas as juntas de parochia. Procedendo assim deu o ministro uma prova de que desejava reformar a instrucção, e ao mesmo tempo da sua capacidade para a gerencia d'aquella pasta. Agora faz-se exactamente o contrario!

O sr. ministro da instrucção publica, antes de entrar no seu ministerio, antes de saber o que lá encontraria, entendeu que era preciso juntar tudo dentro d'elle.

Todos nós sabemos a confusão que resulta de uma mudança; pois duas quiz s. exa. fazer!

Uma foi passar para S. Roque, e bastava esta para causar serias perturbações no ministerio. Digo isto seriamente. Ninguem imagina o que é mudar um estabelecimento grande. Ha de partir-se muita cousa e daqui a dez annos ainda hão de estar alguns caixotes fechados!

E acrescentem a isto tudo que vier do ministerio das obras publicas e o que respeita ao serviço da instrucção primaria, e veja s. exa. e a camara que embaraços, que dificuldades e que confusão isto vae causar!

O que é que imperou no espirito do sr. ministro, ou de quem quer que fez isto, porque eu não sei se foi s. exa. ou só foram todos os ministros que contribuiram para que isto se fizesse?

Todos nós sabemos que ha inspectores primarios, mas não conhecemos o que elles dizem. Soubemos hontem, graças á boa disposição de animo em que estava o nosso collega o sr. Malheiro, que nos leu trechos de uns relatorios dos inspectores de instrucção primaria que condemnam, ao que parece, pelo que s. exa. leu, as disposições da lei de 1878.

V. exa. recorda-se de que immediatamente se pediu ao sr. ministro para que publicasse esses relatorios, e s. exa., fez logo a distincção dizendo: eu publicarei o que poder publicar e não publicarei o que for reservado.

Eu, sr. presidente, não comprehendo que haja parte reservada n'estes relatorios, porque a lei diz que os relatorios devem conter o seguinte:

«Artigo 58.° (da lei de 2 de maio de 1878):

§ 1.° Na inspecção examinar-se-ha sempre:

1.° Os methodos seguidos pelos professores do ensino;

2.° O aproveitamento obtido pelos alumnos;

3.° Se no ensino se cumprem os programmas estabelecidos e mandados seguir.»

Por conseguinte, os inspectores não podem dizer nos relatorios senão sobre estes assumptos. E se os inspectores de instrucção primaria têem ido alem do que está marcado por lei, e se o ministro recebe informações, e diz que ellas são confidenciaes pelo que respeita ao pessoal, digo que está estabelecido entre nós um systema inquisitorial, contra o qual eu protesto. (Apoiados.)

Ora se estes relatorios tivessem sido publicados, o publico apreciaria se effectivamente o que elles diziam era inteiramente exacto ou não. (Apoiados.) Mas quem teve á sua disposição esses relatorios foi o sr. Malheiro, não foi o publico nem o parlamento. (Apoiados.)

E pareceu-me ouvir dizer que aquelles relatorios eram de 1885 até 1889; por conseguinte já desde 1885 vinha no relatorio consignada a opinião sobre a lei de 1878, ácerca da qual os inspectores não são chamados a dizer; mas no nosso paiz é muito difficil que um individuo se colloque no seu logar e não sáia d'elle nem deixe que outros entrem no que lhe compete.

Eu entendo que cada um deve conservar-se no seu logar, não deve saír da esphera da sua acção, nem deixar que ninguem entra no que lhe pertence. (Apoiados.)

Os inspectores são para inspeccionar, e não para informar da bondade das leis. Elles devem dizer só o que a lei os manda dizer. (Apoiados.) E, dizendo só o que a lei os manda dizer, cumprem o seu dever.

Ninguem os chama a pensar como legisladores, assim como ninguem chama os burocratas a pensar como legisladores, porque os legisladores estão aqui; elles lá informarão dentro da sua esphera. (Apoiados.)

Mas, pergunto, estas informações vem de largo tempo?

Ha dois annos o sr. José Luciano apresentou um projecto para estabelecer o fundo escolar. O sr. José Luciano devia ter tido conhecimento d'esses relatorios, por consequencia vejamos a opinião formada pelo sr. José Luciano, que estava no ministerio, e que já lá tinha estado desde 1886, ácerca do relatório d'aquelles inspectores, e comparemos esta opinião do sr. José Luciano com a do actual ministro da instrucção publica que formou a sua opinião antes de lá entrar.

O sr. José Luciano disse que tinha havido varias queixas contra a lei de 2 de maio de 1878 e que uma das queixas que se tinha levantado mais vezes, era sobre a falta de pagamento dos honorarios aos professores, e era para acudir a essa necessidade, que elle vinha apresentar ao parlamento uma proposta para a creação do fundo especial de instrucção primaria.

Dizia o sr. ministro:

«Podem outras medidas considerar-se de grande utilidade e mesmo de immediata conveniencia, para o aperfeiçoamento da instrucção primaria. Ao governo afigura-se que nenhuma merece preferencia á de que se trata, não só porque a experiencia ainda não demonstrou com perfeito conhecimento de causa os verdadeiros e reaes defeitos do systema implantado pela legislação actual, e é mister em questões de ensino deixar amadurecer a opinião e não precipitar as resoluções, senão tambem porque, não estando os professores seguros do que lhes é garantida a subsistencia pelo pontual embolso dos seus salarios, serão inuteis e estereis quaesquer disposições tendentes a exigir-lhes mais sabor, mais trabalho, mais zelo e assiduidade no desempenho da missão que lhes está confiada.»

Por consequencia o sr. ministro vinha dizer ha dois annos, depois de estar dois annos no ministerio, que era isto o que convinha mais attender, porque com respeito á execução da lei era necessario deixar passar mais tempo para ver como as cousas corriam.

Em 1888 o sr. José Luciano dizia:

«Desde julho de 1881, em que passou para as camaras municipaes a sustentação das escolas, o poder central não tem cessado de applicar constante attenção e solicita diligencia no empenho de remover e acabar o atrazo no pagamento dos professores. A principio occorreram, como era natural, muitas difficuldades e numerosas duvidas sobre: organisação dos orçamentos municipaes; lançamento dos impostos; fixação dos ordenados; abono de gratificações; processo para se realisar a cobrança das contribuições; modo de se effectuar aos trimestres o pagamento dos professores, etc. A tudo foi o governo acudindo e dando expediente, consoante os meios que as leis lhe facultavam. Muito se conseguiu, e força é confessar, que estes serviços se acham hoje incontestavelmente melhorados.

«Apesar d'isso, em mais de sessenta municipios os vencimentos dos professores são pagos ainda com atrazo...»

Quer dizer, o sr. ministro já então reconhecia que estes serviços estavam melhorados com respeito ao pagamento dos professores.

Ora, os municipios são 290 e tantos e n'essa occasião era apenas em 60 que o atrazo se dava. Mas esta lei foi publicada em agosto e o ministro fez as instrucções em dezembro para a sua execução, designando-se o processo a seguir para a formação do fundo escolar, indicando mesmo os mappas que a tal respeito se deviam formular.

O resultado é este.

Na conta geral da administração financeira do estado que vae até 30 de junho de 1889, e é a primeira em que

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figura o fundo especial de instrucção, encontra-se o mappa das receitas arrecadadas e das despezas effectuadas.

Ora v. exas. querem saber o que está n'estes mappas?

Os mappas são: um o resumo por districtos e outro o desenvolvimento por municipios, ou concelhos.

Nos mappas ha as receitas, e ahi na columna que se refere ao que dá o estado, ha cifrão, e na columna que se refere ás camaras vêem-se as verbas votadas por ellas como receita; e ha tambem as despezas, e nessas a columna das dividas aos professores, vencidas do 1.° de julho de 1881 até 1888, o entre duzentos e noventa e tantos concelhos, a importancia em divida paga é de réis 1:297$225.

O sr. José Luciano disse que cerca de sessenta municipios estavam em atrazo, a final aqui vê-se que são apenas tres, Mangualde, Penalva do Castello e Tabuaço. Depois do tudo que se disse das camaras municipaes, mostra-se que ellas apenas estavam em atraso por esta importancia de 1:297$225 réis.

Já s. exas. vêem que as camaras municipaes não são dignas de que a respeito d'ellas só diga o que disse a commissão de instrucção primaria o secundaria d'esta camara, no parecer sobre o projecto de 1888. O sr. ministro era mais correcto, mais delicado e mais cortez na sua linguagem, a commissão entendeu que não devia usar d'esta delicadeza e não encontrou outras palavras senão estas:

«Ou seja por incuria e desleixo das camaras municipaes na elaboração dos orçamentos, por falta de regularidade nos processos da cobrança das receitas destinadas ao ensino primario, por menos exacta comprehensão das leis que regulam este serviço...»

Não encontrou esta commissão de instrucção primaria outras palavras, com que mimoscasse as camaras municipaes, senão dizer que tinham procedido por incuria ou desleixo.

Quando se creou o fundo especial de instrucção, o artigo 1.° dizia assim:

«Artigo 1.º E creado em cada municipio do continente do reino e ilhas adjacentes, excepto no de Lisboa, um fundo especial de instrucção primaria.»

Quando se fez esta lei em 1888, o sr. ministro do reino propunha á camara a creação de um fundo especial para a instrucção primaria, com excepção do concelho de Lisboa; quer dizer, o concelho de Lisboa não tinha que concorrer para este fundo.

Seria por que o ministerio do reino entendesse que Lisboa não merecia ser attendida com relação aos interesses da instrucção primaria? O sr. ministro entendeu que devia acudir a todos os concelhos do reino, e apenas se esqueceu da cidade do Lisboa. Por que rasão? Por que seria que assim procedeu?

Esse governo já desappareceu, e já não póde dizer os motivos porque o concelho de Lisboa foi exceptuado.

O actual ministerio apresentou um projecto para devolver toda a instrucção primaria ao ministerio da instrucção publica, e diz que esta lei é o primeiro passo para a centralisação. Mas o sr. ministro deixa de dar o primeiro passo, porque dá dois ou tres ao mesmo tempo, e o individuo que dá muitos passos ao mesmo tempo, sabe-se a que está exposto.

Eu não posso deixar de citar o nosso velho ditado que diz «de vagar, que tenho pressa» e quem váe a correr cáe sempre.

Se o sr. ministro de 1888 entendeu que o concelho de Lisboa devia ser exceptuado; se os ministros que se seguiram entenderam que o concelho de Lisboa devia ser uma excepção em relação a todos os outros, porque rasão não cegue o sr. ministro o mesmo caminho?

A camara municipal de Lisboa occupou-se seriamente da questão da instrucção primaria e talvez por isso merecesse uma correcção, como foi a da dissolução; mas quando vier a organisar-se outra vez este concelho, e ha de organisar-se, elle ha de recuperar todos os seus direitos.

Mas pergunto, por que rasão não vae s. exa. no mesmo caminho dos governos seus antecessores? Faça o governo tudo isso muito embora, se o quer fazer, mas não ha de ser com o meu voto, com o meu conselho ou com o meu parecer.

Exceptue, o sr. ministro, Lisboa, ponha Lisboa fóra da sua ordem de idéas, faça com que Lisboa seja esquecida pelo governo, e deixe Lisboa entregue á sua amaldiçoada sorte, e estou convencido de que ella não lhe ha de desagradecer. Lisboa ficará agradecida se for esquecida pelo governo, por que ella sabe como o poder central se comporta em relação a ella quanto á instrucção.

Eu não sei o que vae por todo o paiz, como o meu amigo o sr. Malheiro, mas o que sei é o que vae por Lisboa.

O meu collega disse que tem viajado por todo o paiz e que sabe o que por lá vae, mas o que me parece é que s. exa. não tem viajado por Lisboa: pois peço-lhe o favor de fazer uma viagem tambem por cá.

Eu já uma vez observei a um collega que me perguntava se havia alguma escola na Boa Vista, o seguinte - v. exa. vae para a camara todos os dias, volte a certa altura os olhos para a esquerda e verá logo a escola.

«Homem, me retorquiu elle, tenho passado por lá todos os dias e ainda não a vi.»

Ora, o nosso amigo Malheiro parece-me que tambem ainda não viu as escolas de Lisboa, apesar de ter visto o que ha a este respeito pelo nosso paiz e pelo estrangeiro, principalmente em Boston, pois até collocou os Estados Unidos na situação de copiarem da Russia em questões de instrucção technica, em questões de industria.

A Russia! Todos nós sabemos que se podem dizer muitas cousas em relação á Russia, mas tambem sabemos que a Russia não póde ser apresentada como typo em questões de industria, nem como typo em muitas outras cousas, senão na organisação despotica do seu governo.

O sr. Lourenço Malheiro: - Pois é uma verdade. Baston copiou o instituto technologico de S. Petersburgo. Eu não tenho culpa de que o illustre deputado não saiba isto.

O Orador: - Não copiou, amigo. (Riso.)

(Pausa.)

Dizia eu que Lisboa sabe perfeitamente como tem sido tratada. E digo que o sabe porque passo por aqui todos os dias e vejo o que se passa.

Embora tenha andado pelo resto do paiz algumas vezes e tenha visto algumas cousas, o que é certo é que não tenho visto tudo. Aqui ando todos os dias, veja tudo, e posso tirar todas as duvidas.

Em Lisboa, se tenho alguma duvida, metto-me no americano e vou ver.

O meu amigo Malheiro, que é um distincto engenheiro, e que tem andado pelo estrangeiro, sabe que o melhor meio, em muitos casos, de só tirar uma duvida é ir ao local.

Se duvidâmos, vamos lá; mesmo que falte o tal parafuso. O parafuso arranja-se.

É o que eu faço, e o governo tem ainda melhores meios para isso.

Em 1881 é que foi entregue á camara municipal de Lisboa a instrucção primaria.

Tinha tentado fazer isto em 1870 o sr. D. Antonio da Costa, mas essa reforma não se realisou. Em 1872 houve nova tentativa, começaram os trabalhos, mas não foram por diante logo.

E qual era a situação em que estava a instrucção primaria desde 1844?

Os legisladores de 1844, embora avocassem a si toda a instrucção primaria, por motivos de diversa ordem, e mesmo porque a instrucção estava n'aquella epocha muito mais

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atrazada do que está hoje, já então diziam que as camaras municipaes deviam contribuir para ella.

Nos annos anteriores a 1881 tinha a camara municipal de Lisboa de dar para as escolas do instrucção primaria 20$000 réis a cada professor, e o governo tinha de pagar o resto, que não era muito.

Não se podia dizer que o governo estivesse mais longe das escolas do que a camara, porque ambos estavam na mesma cidade.

O governo dava 140$000 réis ou 90$000 réis a cada escola, e a camara municipal dava 20$000 réis.

Antes da reforma de 1878, isto é, em 1875, por uma lei que passou nesta camara, augmentaram-se mais 10$000 réis aos professores de instrucção primaria, não para o estado pagar, mas sim as camaras.

Pois a camara municipal de Lisboa apesar de não ter a faculdade de nomear os professores, apesar de não ter nenhum mando sobre elles, apesar de os não escolher, a camara municipal de Lisboa não só lhes deu nos annos anteriores a 1881, esses 30$000 réis, mas estabeleceu premios para os professores, segundo o numero de alumnos que elles habilitassem.

E deu-lhes isto de muito bom grado, e contribuiu immediatamente, com muito prazer, para que se pozesse em pratica uma proposta votada na junta geral do districto, para se lhes dar um auxilio para renda de casas.

A junta geral do districto foi generosa em votar, mas a camara municipal foi ainda mais generosa em pagar, porque pagou immediatamente.

A camara municipal de Lisboa, alem d'isso, instituiu premios e subsidios para as associações, para as escolas particulares e para a mobilia das escolas do estado, quer dizer, a camara municipal, sem ter absolutamente nenhuma acção, nem dos professores, nem nas escolas, gastou, posso dizer a verba porque a tenho aqui, era 1874 a 1875 mais de 4:000$000 réis, e depois, em 1875 a 1876, já ascendia a verba de despeza desta ordem, a 8:700$000 réis! Isto com as escolas, quando quatro annos gastava apenas 1:000$000 réis!

A camara municipal de Lisboa entendeu que um dos maiores beneficios que ella podia fazer, era contribuir para melhorar a sorte do ensino, por todos os modos, e por isso sem ter á sua disposição as escolas nem os professores, deu-lhes auxilios, gratificações, subsidios, e a quem quer que fosse, que se interessasse pelo desenvolvimento da instrucção, quer fosse associação, quer escola particular; e consignou alem d'isso uma verba para melhorar a mobiliadas escolas, porque a mobilia das escolas que o estado ou o governo tinha em Lisboa, não se póde descrever. (Apoiados.)

As casas eram uma miseria e as mobilias uma lastima! Quasi todas sem excepção.

A propria escola central que o governo já tinha, era bem fracamente pró vida; porque o governo já tinha uma escola central, na qual alguns professores eram distinctissimos, mas o material da escola servia para muito pouco.

Pois a camara municipal antes d'este serviço lhe ser entregue, já contribuia muito para elle.

E depois creou mesmo duas escolas centraes, uma por causa de um donativo, do legado de um cidadão muito distincto, que o deixou ao municipio de Lisboa para se construir uma escola com a condição de ser para quatro professores e com habitação para elles, o se a camara municipal não acceitasse o encargo, passaria o legado para a camara do Porto.

A camara tomou o encargo, construiu a escola, mobilou-a, e tratou depois do provimento do pessoal porque não bastava a casa, e antes do provimento do pessoal, tratou de determinar a remuneração dos professores, porque não podia ser a remuneração mesquinha que o estado dava.

Pois no momento em que a camara municipal deliberou dar a esses professores o ordenado de 300$000 réis, o estado, isto é, o governo, como se julga muitas vezes, e não porque seja assim, porque o estado e tudo, não é só o governo, é a camara municipal, são ao demais corporações locaes. O estado, digo, nesta occasião pretendeu embaraçar, que se pagasse aos professores por aquelle modo, o note-se, que os professares eram escolhidos em concurso, e por concurso composto de um jury, formado de cavalheiros estranhoo á camara municipal.

Assim é que foram instituidas as primeiras escolas centraes em Lisboa. Foram escolhidos os professores por um jury, que era composto de pessoas estranhas ao municipio e depois o municipio para confirmar essas nomeações, praticou effectivamente um erro, como já aqui se disse, mas remediou esse erro, porque em vez de uma escola, ficamos com duas, e em vez da preterição ficar effectiva, ficaram galardoados todos que concorreram ao concurso.

Por consequencia a cidade de Lisboa já se achava n'estas condições, e quando chegou o anno de 1881, e que em virtude da lei de 1878 deviam ser entregues á camara municipal as escolas de Lisboa, sabe v. exa. o que aconteceu?

O governo não entregou as escolas de Lisboa, e digo de Lisboa porque não sei o que succedeu nas outras terras. Mas as escolas de Lisboa ficaram completamente abandonadas, verdadeiramente engeitadas!

A camara municipal de Lisboa tomou conta d'essas escolas, porque as encontrou completamente abandonadas; não foi possivel receber do ministerio do reino indicação nenhuma com relação ao assentamento dos professores, com relação a todas estas cousas, que devem constituir uma entrega para haver posse.

O governo nada fez a este respeito, mostrando assim em 1881, que durante o tempo em que tivera em seu poder, a seu mando e sob a sua vigilancia immediata as escolas de instrucção primaria, ellas se achavam no estado mais deprimente, no maior estado de miseria. Não se póde descrever esse estado, é o peior que se podia attingir.

Se o sr. ministro imitasse o seu antecKssur, que ao reconhecer a necessidade de constituir um fundo especial para a instrucção primaria, parou diante de Lisboa e disse: «aqui não é preciso», fazendo justiça á municipalidade de Lisboa, porque viu e reconheceu, que não tinha esta sobreposto o pagamento de outras despezas á da instrucção, e que fora sempre zelosa no pagamento dos vencimentos aos seus professores e no melhoramento das suas escolas; se o sr. ministro, vendo que os seus anteriores procederam d'este modo, e perguntasse a alguem, que de longe lhe dissesse o estado das cousas, com certeza devia reconhecer que a cidade de Lisboa não havia de dizer mal da lei de 1878, nem havia de dizer mal das camaras municipaes.

Ninguem, com justiça, póde dizer que a cidade de Lisboa descurou a instrucção publica nos ultimos annos. Póde ser que ella tenha commettido erros, mas não ha ninguem que os não commetta, e lá devem estar os vereadores, para diligenciar por todos os modos, para que ossos erros se não repitam e para que qualquer abuso que tenda a insinuar-se se possa immediatamente evitar; é isto o que se quer, ou deve querer.

Por consequencia, o sr. ministro da instrucção publica, avocando a instrucção primaria para o seu ministerio e tirando a instrucção primaria do estado em que se encontra hoje em Lisboa, fique sabendo que emquanto cita esteve a cargo do poder central, este nunca foi capaz de fazer o que eu disse, e assevero que elle não ha de ser capaz de fazer como ministro o que lá está feito, e a rasão é simples, é porque não basta um ministro só para o fazer, é preciso o concurso de muitos elementos, de muita vontade, de muito trabalho, de muita pertinacia e de muita paciencia, e principalmente não se importar em cousa alguma com a gloria, (Apoiados.) póde consolar-se a consciencia do individuo, mas o trabalho é completamente inglorio, (Apoiados.)

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Nem todos estão dispostos a isso, porque as duas primeiras escolas centraes que se organisaram em 1875 caíram aos golpes do governo. A municipalidade em peso sustentou-as, mas o conselho de districto e o ministerio do reino deitaram-nas abaixo. Ellas reviveram e lá estão.

Encontrou esse trabalho grandes difficuldades, mas venceu-se, e foi preciso para se poder conseguir isto que as circumstancias favorecessem. Por consequencia fique s. exa. certo que o estado em que se encontra a instrucção primacia em Lisboa não o póde s. exa. manter.

Fique na certeza d'isso, ella ha de fatalmente declinar nas mãos do poder central, porque é da natureza d'esse serviço o ter de ser desempenhado por tal fórma, carecer taes cuidados, attenções e exigencias que o poder central absolutamente incapaz de o fazer. Nós o veremos.

A instrucção primaria não declinou em Lisboa, com a lei de 1878, o numero das escolas no resto do paiz era relativamente menor que em Lisboa e os professores queriam vir de fóra para cá porque eram mais bem pagos.

Se, pois, em Lisboa se dão todas as circumstancias que recommendam que o serviço continue entregue a quem tem estado, e se entende, o que ou não entendo, que lá fóra se faça o que diz o projecto, faça-se muito embora, mas poupem ao menos o que se fez em Lisboa e não vão s. exas. estragar completamente esses esforços, esses trabalhos feitos pela municipalidade de Lisboa e pelos municipes, e cuide o sr. ministro do resto do paiz, embora na minha opinião não devesse cuidar.

Creia que Lisboa não lhe agradece a lembrança, e s. exa. ha de arrepender-se necessariamente do que fizer.

Eu entendo que este serviço deve pertencer ás corporações locaes, porque para a instrucção primaria torna-se necessaria a cooperação de muitos elementos, e o governo que tem na mão a instrucção secundaria e a instrucção superior, não tem dado muitas provas do cuidado que ellas lhe merecem.

Agora que se vae crear o ministerio da instrucção publica, dedique-se o sr. ministro a este assumpto, mas dê provas d'isso, e não tenha receio de começar pela instrucção superior, porque ha sempre uma grande vantagem em todas as nações em que a instrucção superior soja altamente considerada.

É necessario que o ensino superior se faça como deve ser, fazendo-o sair da rotina em que está e dando-lhe a orientação que deve ter.

Portanto, se o sr. ministro quer fazer obra util, tem na sua mão a instrucção secundaria, a instrucção superior, o conservatorio, a academia das bellas artes, e tudo isso é roais que sufficiente para occupar a attenção de um homem. Alem d'isto, deve ter tambem na anã mão a inspecção superior da instrucção primaria, a fim de recolher todos os elementos que se póde e deve reunir n'aquelle ministerio, para então formar opinião ácerca da verdadeira execução e applicação da lei.

Tem-se fallado muito da descentralisação; mas eu não chamo a isto descentralisação, na verdadeira accepção da palavra, porque a descentralisação verifica-se quando effectivamente as corporações se transformem em autonomas e independentes; mas o que ha é uma cousa utilissima e necessaria; é uma desconcentração, uma divisão de trabalhos, uma maneira de fazer com que elementos diversos collaborem para o mesmo fim.

Mas o governo tem, como não póde deixar de ter, a superior direcção do ensino, porque isso pertence naturalmente ao estado, que somos todos nós, poder central e poderes locaes. O estado tem a inspecção e fiscalisação, por meio das leia e dos regulamentos, porque é elle que faz tudo. Ali não ha senão a applicação do principio da divisão do trabalho, uma maneira de seduzir, de aproveitar esforços, que de outro modo se afastam e se perdem.

Portanto, o governo ficava perfeitamente armado, fazendo isto que eu digo. Deixe as escolas industriaes e profissionaes no ministerio das obras publicas, onde ellas nasceram, onde agora começam a dar os primeiros fructos, onde poderiamos ver, passados alguns annos mais, se ellas podiam ou não dar bons resultados; e deixasse aos municipios as suas escolas, não indo aproveitar-se de uma gloria que lhe não póde pertencer, (Apoiados.) mas se não quer deixar era todo o paiz, ao menos deixe em Lisboa, onde o governo póde ter a certeza de que lhe vão entregar uma escola com professores, com mobilia e alfaias de tal ordem, que certamente nunca pensou que poderia ter. Quem visse as instrucções de 1866, nunca poderia imaginar que poucos annos depois, as escolas de Lisboa estariam no pó em que hoje se encontram. (Apoiados.)

Mas ainda quando s. exa. não acceda a isto, que é incontestavelmente o melhor e o mais facil para s. exa., porque eu estou convencido de que em pouco tempo o governo terá de entregar tudo quanto agora vae receber; (Apoiados.) ao menos eu peço a attenção de s. exa. para o seguinte: Diz s. exa. que na devolução dos estabelecimentos para o ministerio da instrucção publica não vão todos os estabelecimentos de educação e de instrucção que tem a camara municipal de Lisboa; já disse que alguns d'elles eram postos de parte e citou as escolas Maria Pia, Rodrigues Sampaio, Froebel e não sei se mais algumas. Naturalmente punha de parte a escola de Santo Antonio e as dos asylos. Mas lembro a s. exa. que ha duas escolas que foram creadas antes de 1881, a escola n.° 1 e a escola n.° 2. A escola n.° 1 está em edificio feito pela camara, aproveitando os legados de dois cidadãos, que os deixaram ao municipio com essa condição; a escola n.° 2 está em edificio proprio da camara. Estas duas escolas são anteriores á lei de 1881, e não devem passar para o governo. Na camara a instrucção ficara assim mutilada, mas apesar d'isso eu creio que ella ha de rivalisar n'uma concorrencia justa com o governo, mostrando que é capaz de fazer mais do que o governo.

Em minha opinião essas escolas não devem ir com as outras pela simples rasão de que o governo, como disse, abandonou as escolas que tinha a seu cargo. A camara suppondo que elle, apesar de se ter esquecido de as entregar tinha alguma tenção de se lembrar d'ellas, mandou elaborar o plano provisorio das escolas; mas esse plano nunca foi approvado pelo governo. Quer dizer a camara estava pois collocada era uma situação de poder conservar as suas escolas, não era virtude da lei de 1881, mas na conformidade das disposições consignadas no codigo administrativo. É como se póde suppor que estavam as escolas de Lisboa. Depois da camara as haver creado e dotado é que o governo quer lançar mão d'ellas. Eu diria, portanto, que a levar-se por diante este pensamento, ao menos se saívassem aquellas duas escolas.

O illustre relator do projecto mandou para a mesa um additamento em que se diz que os professores ficarão com os vencimentos que tiverem. Lembrarei a s. exa. que não basta considerar a situação dos professores com respeito aos vencimentos que têem.

É preciso attender tambem a que se aã escolas do municipio de Lisboa têem, como têem incontestavelmente muitos bons professores, isto é devido á remuneração superior que se lhes dava. D'aqui resultou que muitos professores ou professoras que eram vitalicios e de fóra de Lisboa, desejaram vir para cá, embora não entrassem logo no quadro e ficassem como adjuntos; porque, entrando, estariam collocados em uma situação muito superior pelo accesso que se lhes abria. Operada agora esta transformaão, elles terão de arrepender-se do que fizeram, porque abandonaram uma situação que era incontestavelmente muito melhor do que aquella em que vão ficar. Se o sr. ministro está disposto a prestar a sua attenção a isto, peço á camara, e em especial ao sr. relator do projecto, que se recorde d'esta situação dos professores que eram vitalicios, fóra de Lisboa, e vieram a concurso para substitutos, não

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concorrendo a elle pela vantagem immediata, mas pela vantagem mediata, porque o accesso os collocava em excellente situação.

E agora fecha-se este accesso, e elles acham-se n'uma situação muito inconveniente e embaraçosa.

S. exa. dizia que um dos inconvenientes da lei actual era o serem differentes os vencimentos, mas ha de successivamente encontrar essa difficuldade, porque evidentemente se respeita os vencimentos d'esta, ha de elevar os dos outros; e eu não sei se o poderá fazer.

Pelo que respeita á uniformidade com relação á area da superficie, considerando principalmente o numero de escolas para uma certa e determinada area, tomando uma unidade, esta uniformidade não se póde achar, esta maneira de comparar não é acceitavel.

O numero de escolas ha do ser funcção dependente não só da area, mas tambem da densidade da população n'um certa area; e por consequencia ha de apparecer n'uma área muito pequena, em que a população esteja muito condensada, um grande numero de escolas, ao passo que não succederá assim em área igual de população menos densa.

Com relação aos vencimentos, tambem diria que elles hão de ser maiores nas capitães, como Lisboa e Porto, porque as exigencias da vida são aqui muito maiores, e a nossa legislação consignou sempre este principio.

Eu não desejo cansar a attenção da camara. Lamento não poder expender algumas observações, posto que de muito pouco valor sobre este assumpto; mas limito-me a consignar da maneira mais frisante por que o posso fazer, que o sr. ministro, se não quizera fazer uma obra inteiramente má, ao menos salve a cidade de Lisboa do desbarato e do destroço a que vae expol-a, se levar por diante a sua obra.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Agostinho Lucio: - Requeiro a v. exa. consulte a camara se julga o projecto sufficientemente discutido.

O sr. Elvino de Brito: - (O discurso de s. exa. será publicado na integra e em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Francisco José Machado (sobre o modo de propor): - Mais um attentado praticado pelo governo e pela maioria? (Apoiados da esquerda e riso da direita) V. exas. riem-se. Levam estas cousas a rir e a brincar? (Apoiados da esquerda.)

Este projecto que se vae votar é o mais inconstitucional, o mais inconveniente e o mais prejudicial ao paiz e se mais favoritismo que eu tenho visto. (Apoiados.)

O governo não manda ao parlamento os documentos necessarios para se discutir este projecto, ao passo que o governo progressista, sempre que lhe eram pedidos quaesquer documentos, os enviava a esta casa. (Apoiados.)

Quando n'esta casa se discutiu o projecto dos quarteis apresentei eu um pappa, e um documento propriamente particular.

A opposição parlamentar pediu que esses documentos fossem impressos e distribuidos apesar d'esses documentos serem perfeitamente meus.

E todavia não os recusei á opposição.

O que faz agora o governo? O que faz a maioria?

Sr. presidente, não é possivel estarmos sob este regimen.

Creou-se o ministerio da instrucção publica para metter. lá o sr. Arroyo, por que não deu conta da pasta da marinha, como não ha de dar conta d'esta, e senão veremos.

Vozes: - Ordem, Ordem!

O Orador: - Insisto no que disse. O sr. Arroyo é muito intelligente e illustrado, mas não tem a competencia, nem a pratica necessarias para ministro.

Vozes: - Ordem, ordem!

O Orador: - Eu estou no meu direito apreciando os factos. No que digo não ha offensa para o caracter do sr. Arroyo. (Susurro,) V. exa. é que estão fóra da ordem!

O sr. Presidente: - V. exa. pediu a palavra sobre o modo de propor e eu não posso permittir essas divagações. (Muitos apoiados da direita.) Convido v. exa. a restringir-se ao modo de propor. (Muitos apoiados da direita.)

O Orador: - Eu estou dentro da ordem.

(Susurro.)

V. exas. já não se lembram do que fez o sr. Arroyo na opposição? S. exa. discutiu durante dois ou tres dias sobre o modo de propor! S. exa. quebrou carteiras, sobre o modo de propor (Apoiados da esquerda.), e eu, que sobra este projecto pedi a palavra, vendo abafada a discussão antes de usar d'ella, não posso dizer duas palavras sem ser chamado á ordem!

Eu podia, no uso do meu direito, fallar sobre o modo de propor até ámanhã, mas não o faço, por que não quero seguir o exemplo do sr. Arroyo.

r. presidente, vou terminar, mas antes direi que tenho o plenissimo direito de apreciar os factos como elles se dão.

O sr. Arroyo foi tirado da pasta da marinha, porque não dava conta d'ella!

Vozes: - Está fóra da ordem!

(Susurro.)

O Orador: -Foi por isso, e só por isso, que se creou o ministerio da instrucção publica.

(Susurro.)

O sr. Presidente: - Eu peço ordem! (Muitos apoiados da direita.) Peço licença para novamente observar ao illustre deputado que não está discutindo o modo de propor, e eu não posso permittir-lhe que continue nas suas considerações. (Muitos apoiados da direita) Tenho mais a dizer a s. exa. que, não obstante não lhe ter chegado a palavra na discussão do projecto, tem s. exa, nos termos do regimento, o direito de mandar para a mesa as propostas que tencionava apresentar.

O Orador: - Vou mandar para a mesa as minhas propostas, e, se não as mandei já foi por causa das interrupções da maioria que provocou as minhas respostas. S. exas. protestam, mas eu, e o paiz acompanha-me, estou convencido de que se o sr. Arroyo tivesse dado conta da pasta da marinha não se teria creado o ministerio da instrucção publica.

Foi preciso arranjar uma peanha para um santo, e o paiz é que é a espiga que segura o santo á peanha.

O ministerio da instrucção publica vae custar quarenta e tantos contos por anno; cara peanha para tão ruim santo!

Os meus collegas estão impacientes por eu dizer as verdades.

Eu estou a advogar os verdadeiros interesses do paiz. Entendo que não se devem crear ministerios para lá metter individuos que não são competentes.

O sr. Arroyo é um homem de talento; mas, se o partido regenerador quizer collocar todos os homens de talento, tem que arranjar um grande numero de pastas, porque todos se julgam competentes para serem ministros.

Vozes: - Ordem, ordem.

(Susurro.)

O sr. Presidente: - Eu peço ao sr. deputado que mande as suas propostas para a mesa.

O Orador: - Eu não abuso da paciencia de v. exa. e da camara; mas eu e o paiz estamos maguados e indignados de ver como se tratam os interesses publicos é o destino que se dá aos dinheiros do paiz, que é para crear um ministerio para o sr. Arroyo.

Vozes: - Ordem, ordem.

O sr. Presidente: - Peço ao sr. deputado que mande para a mesa as suas
propostas.

O Orador: - As propostas que eu tinha a mandar para a mesa, se me coubesse a palavra, são as seguintes:

«Proponho que no quadro do pessoal do serviço do ministerio das obras publicas se façam as reducções necessa-

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rias em proporção com os empregados e serviços que passam para o novo ministerio, voltando para este fim o projecto ás commissões. = F. J. Machado.»

«Proponho que ao artigo 1.º do projecto em discussão se acrescente:

«§ unico. As primeiras nomeações para os logares do ministerio da instrucção publica não poderão recaír em deputados da nação, actuaes, sendo estas e as subsequentes sempre feitas por concurso. - F. J. Machado.»

«Sendo da auctorisação das côrtes crear empregos publicos e estabelecer-lhes ordenados (carta constitucional, artigo 15.°, § 14.°):

«Proponho que a camara não delibere sobre a materia que se discuto sem que no projecto se determinem especialmente os novos empregos que se vão crear e se fixe para cada um os respectivos ordenados. = F. J. Machado = F. de Almeida e Brito = Simões Ferreira = José Frederico Laranja = Christovão Pinto.»

Sr. presidente, v. exa. vê quanta necessidade eu tinha de desenvolver estas propostas.

O sr. Presidente: - V. exa. não póde sustentar as suas propostas. (Apoiados.)

Vozes: - Está fóra da ordem. Não pôde.

O sr. Presidente: - Peço ordem.

O Orador: - V. exa. dá-me licença que eu diga mais duas palavras?

O sr. Presidente: - Eu tenho a responsabilidade da direcção dos trabalhos e procuro encaminhar a discussão. (Apoiados.)

V. exa. sabe que, não lhe cabendo a palavra, póde mandar para a mesa quaesquer propostas, mas não póde fundamental-as. (Muitos apoiados.)

O Orador: - Eu pedi a palavra sobre o modo de propor, o estou a justificar o modo como proponho. (Apoiados.)

O governo actual publicou em dictadura um decreto regulando as incompatibilidades dos ministros; e eu entendo que esse decreto deve ser extensivo á camara dos deputados. (Apoiadas.)

Eu entendo que as nomeações que se vão fazer não devem recair em deputados; (Apoiados.) e já se diz lá fóra quem são os deputados que vão ser nomeados para esses logares. Eu cumpro o meu dever e o paiz julgara como entender.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Vou consultar a camara sobre o requerimento do sr. Agostinho Lucio, para se julgar a materia sufficientemente discutida.

A camara resolveu affirmativamente.

O sr. Luciano Cordeiro: -Por parte das commissões reunidas declaro que ellas não podem acceitar nem as propostas do sr. Fernando Palha, nem as que acaba de mandar para a mesa o sr. Francisco Machado.

O sr. Almeida e Brito (sobre o modo de propor): - Não me chegou a palavra e eu queria mandar para a mesa uma proposta, sendo uma parte d'ella um adiamento e a outra parte uma substituição ao projecto.

Mando a proposta para a mesa; peço a v. exa. que a considere como um adiamento e que sobre ella recáia uma votação antes de ser votado o projecto.

O sr. Presidente: - As propostas apresentadas pelo sr. Francisco José Machado representam uma emenda e dois additamentos; e a do sr. Almeida e Brito é uma proposta de adiamento e deve por isso ser votada antes do projecto.

Como, porém, antes d'esta ha uma outra de adiamento apresentada pelo sr. Manuel do Arriaga, vou submettel-a á votação, por ser a que foi apresentada era primeiro logar.

Lê-se na mesa a seguinte:

Proposta

Proponho que não seja admittido á discussão qualquer projecto que envolva augmento de despeza, como o projecto n.° 133 de que se trata, sem que seja previamente discutido e votado o orçamento do estado, para sabermos definitivamente as condições financeiras em que nos achâmos.

Sala das sessões, 23 de junho de 1890. = Manuel de Arriaga.

Foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta mandada para a mesa pelo sr. deputado Almeida e Brito.

Lê-se na mesa a seguinte:

Proposta

Considerando que os serviços da actual direcção geral da instrucção publica não podem por si só constituir um ministerio, por maior que seja o desenvolvimento que se lhes dê;

Considerando que a secretaria d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, está actualmente bastante sobrecarregada com muitos serviços de differente natureza;

Considerando que, segundo as affirmações do sr. ministro da fazenda, a situação do thesouro não permitte novas despezas, e que o novo ministerio se póde organisar sem augmento de despeza e por fórma conveniente aos interesses publicos:

A camara adia a resolução do projecto em discussão e resolve que elle volte á commissão, a fim de que ella elabore novo parecer nas seguintes bases:

1.ª O ministerio da instrucção publica será constituido por tres direcções geraes: direcção geral da instrucção publica, direcção geral de agricultura e direcção geral do commercio e industria;

2.ª Cada uma d'estas direcções geraes passara para o novo ministerio com todo o pessoal e respectiva dotação, despeza de expediente correspondente e mais verbas consignadas nas tabellas de distribuição de despeza para os serviços d'ellas dependentes, e a somma destas dotações constituirá a dotação da nova secretaria d'estado;

3.ª Na organisação do novo ministerio não serão creados novos empregos, nem será augmentada a despeza, com excepção da que for indispensavel para a creação da decima repartição de contabilidade;

4.ª A nova secretaria d'estado denominar-se-ha ministerio da instrucção, agricultura e commercio. = F. de Almeida e Brito.

Foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Vão ler se a primeira moção mandada para a mesa e que termina por se passar á ordem do dia.

É a moção do sr. José Julio Rodrigues.

O sr. Almeida e Brito: - Roqueiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha moção.

A camara permittiu.

Leu-se na mesa a moção do sr. José Julio Rodrigues.

É a seguinte:

Moção

A camara, lamentando que a organisação do ministerio da instrucção publica não corresponda ás necessidades urgentes, que pretendeu remediar ou remover, quer sob o ponto de vista do incremento da riqueza patria, quer sob o ponto de vista da educação nacional, e que, na sua contextura e propositos, se não inspire de verdadeiros principios liberaes, económicos e scientificos, que devem presidir a serviços de tanta magnitude e trancendencia, passa á ordem do dia. = O deputado, José Julio Rodrigues.

Foi rejeitada.

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O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Theophilo Ferreira.

O sr. Theophilo Ferreira:-Roqueiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitto que eu retire a minha moção.

A camara permittiu.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Dias Ferreira.

Leu-se e é a seguinte:

Moção

A camara, reconhecendo que no estado da fazenda publica não póde augmentar-se a despeza do estado, senão por motivos imperiosos e urgentes, continúa na ordem do dia. = Dias Ferreira.

Foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Lourenço Malheiro. Leu-se e é a seguinte:

A camara, satisfeita com as explicações do governo, continúa na ordem da noite. = Lourenço Malheiro.

Foi approvada.

O sr. Presidente: - Como foi votada esta moção ficam prejudicadas todas as outras que foram mandadas para a mesa.

Vae ler-se o projecto para se votar.

Leu-se.

É o seguinte:

Artigo 1.° É o governo auctorisado:

1.° A reunir no ministerio da instrucção publica e bellas artes todo o ensino official da instrucção primaria elementar e complementar com os estabelecimentos annexos, devolvendo-se para o estado os serviços da creação, transferencia e conversão das escolas e cursos, casas escolares, material de ensino, nomeação dos professores, matriculas, organisação dos horarios das aulas e dos jurys, dos exames dos alumnos, licenças, applicação de penas disciplinares, aposentações, pagamento dos vencimentos, e bem assim a fixação d'estes em harmonia com a legislação em vigor;

2.° A regular a creação de quaesquer outros estabelecimentos do instrucção e educação, que de futuro as corporações administrativas venham a fundar o dotar, assim como a fiscalisação do estado sobre os referidos estabelecimentos e sobre os já existentes á data da publicação d'esta lei;

3.° A regular a passagem para o estado de todas as receitas, de qualquer ordem ou natureza, actualmente destinadas por lei ou por deliberações das corporações administrativas á instrucção primaria elementar e complementar e aos estabelecimentos annexos, ou recursos que tenham essa applicação, ficando essas receitas ou recursos constituindo dotação do fundo geral da instrucção primaria;

4.° A passar para o ministerio da instrucção publica e bellas artes o serviço da inventariação, guarda e exposição dos monumentos historicos nacionaes, a superintendencia sobre a sua conservação e restauração e o serviço do ensino industrial e profissional, transitando para o orçamento d'este ministerio as verbas constantes do artigo 23.°, secções 1.ª, 2.ª, 4.ª 5.ª e 6.ª, artigo 24.°, secções 1.ª, 2.ª, 4.ª, 5.ª e 6.ª, artigo 29.°, secção 2.ª e artigo 30.° secção 2.ª do orçamento do ministerio das obras publicas, commercio e industria;

5.° A organisar a secretaria d'estado dos negocios da instrucção publica e bellas artes e a reorganisar o conselho superior da instrucção publica, em harmonia com as bases seguintes:

a) A secretaria d'estado dos negocios da instrucção publica e bellas artes compor-se-ha de uma secretaria geral e de tres direcções geraes;

b) A secretaria geral constituirá a repartição central do ministerio e a ella incumbirão, alem dos negocios relativos á administração interna é expediente do ministerio, os assumptos que por sua natureza não pertençam determinadamente a qualquer das direcções geraes;

c) A primeira direcção geral terá a seu cargo os serviços relativos á instrucção primaria; a segunda direcção geral os serviços relativos á instrucção secundaria e superior; a terceira direcção geral os serviços relativos ás bellas artes e ao ensino industrial e profissional;

d) Cada uma das direcções geraes será formada por duas repartições, sendo um da chefes de repartição o director geral da respectiva direcção;

e) Junto á secretaria geral do ministerio funccionará uma secção technica, composta de dois engenheiros, um architecto e dois desenhadores, servindo em commissão;

f) Não poderá ser excedida em mais de 22:000$000 réis a verba actualmente destinada á direcção geral da instrucção publica e ao conselho superior de instrucção publica, transitando para o quadro do ministerio os empregados da extincta direcção geral, nos termos do decreto de 5 de abril de 1890;

6.° A crear a 10.ª repartição de contabilidade na direcção geral da contabilidade publica, que funccionará junto do ministerio da instrucção publica e bellas artes, supprimindo dois logares de segundo official e dois de amanuense no quadro da 3.ª repartição, e dois de amanuense na 9.ª repartição da mesma direcção geral, não podendo o augmento de despeza ser superior a 3:930$000 réis, o devendo os individuos providos nos logares supprimidos ser transferidos para o quadro da repartição a crear;

7.° A regular a exportação dos objectos artisticos, historicos ou archeologicos, não podendo o direito de saída exceder, em caso algum, 30 por cento do valor do objecto exportado;

8.° A fazer os mais regulamentos necessarios para a execução da presente lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

O sr. Francisco Machado: - Requeiro a v. exa. que consulto a camara sobre se quer que haja votação nominal.

Resolveu-se negativamente.

O sr. Presidente:- Os srs. deputados que approvam o projecto sem prejuizo das emendas, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vão ler-se as propostas mandadas para a mesa pelo sr. Fernando Palha.

Leram-se. São as seguintes:

Propostas

Para os novos logares, com excepção dos directores geraes, creados em virtude das auctorisações dadas por esta lei, serão nomeados de preferencia os actuaes empregados do serviço de instrucção da camara municipal de Lisboa, ficando os que não tiverem logar no quadro adidos ao mesmo quadro. = Fernando P. Palha.

Aos actuaes professores e mais empregados das camaras municipaes são garantidos os seus direitos e actuaes vencimentos. = Fernando P. Palha.

Foram rejeitadas.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o additamento mandado para a mesa em nome das commissões reunidas. Leu-se na mesa o seguinte:

Additamento

Proponho, em nome das commissões reunidas, que no 1.° do artigo 1.°, ás palavras «legislação em vigor», se acrescentem as seguintes «desde a data da presente lei» = L. Cordeiro, relator.

Foi approvado.

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934 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Presidente: - Vão ler-se a emenda e additamento mandados para a mesa pelo sr. Francisco Machado. Leram-se na mesa as seguintes:

Emenda

Proponho que no quadro do pessoal do serviço do ministerio das obras publicas se façam as redacções necessarias em proporção com os empregados e serviços que passam para o novo ministerio, voltando para este fim o projecto ás commissões. = F. J. Machado.

Additamento

Proponho que ao artigo 1.° do projecto em discussão se acrescente:

§ unico. As primeiras nomeações para os logares do ministerio da instrucção publica não poderão recair era deputados da nação, actuaes, sendo estas e as subsequentes sempre feitas por concurso. = F. J. Machado.

Foram rejeitados.

O sr. Presidente: - Tem a palavra, antes de encerrar a sessão, o sr. ministro da instrucção publica.

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): - Eu pedi a palavra exclusivamente para responder ao sr. Elvino de Brito ácerca de um facto do natureza mais especial, sobre o qual eu entendi que não podia deixar encerrar a sessão sem me explicar.

Eu não tenho duvida em fazer a publicação dos documentos a que s. exa. se refere, porque não tenho n'isso o menor interesse; pelo contrario, tenho todo o interesse n'essa publicação, porque esses documentos só servem para corroborar as minhas idéas.

Não creia, porém, a camara que ha apenas dois, tres ou quatro relatorios, mas muitos que formarão um grosso volume.

Repito, não tenho duvida em fazer essa publicação; mas tem de ser feita com methodo e com ordem e a organisação do ministerio de instrucção publica dá logar a que elles sejam publicados com o respectivo boletim.

Está claro que d'esta publicação têem do ser exceptuados os documentos que forem de natureza confidencial.

Quando estes documentos só eram favoraveis á causa que defendo, eu não podia ter interesse, nem conveniencia em os não publicar; mas o que eu não podia, era comprometter-me a fazer publicar no Diario do governo um volume de documentos que havia de levar muitos mezes a compor.

O sr. Elvino de Brito: - O que eu perguntava a s. exa. era se tinha duvida em mandar publicar, por trechos, excluindo os que forem de natureza confidencial, os extractos dos relatorios a que se referiu o sr. Lourenço Malheiro.

O Orador: - Posso declarar que já hoje fui á secretaria e dei ordem para que se pozessem á disposição do illustre deputado quaesquer documentos que s. exa. quizesse consultar, e hontem quando me levantei mandei para a mesa, para poderem ser examinados pelos srs. deputados, os extractos dos relatorios a que se referiu o sr. Lourenço Malheiro.

Em todo o caso, não tenho duvida alguma em satisfazer aos desejos dos srs. deputados; não tenho duvida em mandar publicar documentos, de cuja publicação não póde resultar para mim senão vantagens.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é, alem da que está dada, mais os projectos n.ºs 135, 136, 137 e 120.

Está levantada a sessão.

Eram sete horas e meia da tarde.

Errata

Publica-se em seguida o projecto de lei n.° 76-C, cuja iniciativa renovou na sessão de 25 de junho o sr. Jacinto Candido, por ter saído no Diario das sessões de 26 do mesmo mez, em vez d'este, o projecto 76-D.

Projecto de lei

Senhores. - O serviço de saude publica deve ser considerado como um dos mais importantes prestado ao estado e por consequencia deve ser bem remunerado.

Não sem grandes riscos e acrisolado patriotismo cumprem as suas difficeis funcções todos os empregados de saude, especialmente os incumbidos das visitas aos navios em todos os portos. Não só expõem a sua vida em repetidas e varias occasiões, quando têem que luctar com a bravura dos mares em procura das embarcações quando demandam os portos; mas tambem por causas extraordinarias são os guardas mores de saude obrigados a tratar dos doentes, que trazem muitos, que ficam impedidos quando não tem logar o regulamento de saude n'esses portos, e taes navios têem de fazer a competente quarentena junto aos lazaretos. A desigualdade na remuneração dos empregados de saude nos differentes portos, especialmente nos das ilhas dos Açores, cujas circumstancias maritimas são iguaes, não podo continuar. Aos portos d'aquellas ilhas chegam embarcações de toda a parte do mundo, o commercio nos ultimos annos tem augmentado e diversamente são remunerados os seus guardas mores de saudei

Não póde occultar-se que o serviço feito pelo guarda mor de Angra do Heroismo está hoje mal recompensado com o vencimento annual de 400$000 réis, quando o de Ponta Delgada é pago pelo duplo.

Em Ponta Delgada as visitas são feitas quando as embarcações se acham fundeadas já na ilha e em Angra só póde executar-se em mar largo, sem as vantagens que dão as visitas d'aquella fórma feitas, e com grave risco da vida a que estão expostas as auctoridades maritimas encarregadas do serviço de saude.

Os corpos legislativos têem reconhecido a necessidade da elevação dos vencimentos dos guardas mores de saude de todos os portos dos Açores e Madeira, e ainda ultimamente pelas leis do 8 e 23 de maio de 1878 foram creadas em quatro ilhas dos Açores differentes logares de guardas mores e sub-delegados de saude com o vencimento de 600$000 réis.

São de certo menos importantes as funcções d'aquelles funccionarios comparadas com as dos guardas móres do districto, e por consequencia completamente justificavel a necessidade de elevar o vencimento do empregado de saude do porto de Angra do Heroismo.

Alem de que aquelles funccionarios têem outras gratificações pagas pelas municipalidades e misericordias das quatro ilhas dotadas com aquelle beneficio, emquanto que os outros empregados nem emolumentos têem, pois entram todos no cofre da fazenda.

Por tão justos e incontestaveis motivos, e porque nem mesmo é conveniente continuar a existir uma tão grande desigualdade de vencimentos em empregados da mesma categoria, como presentemente se dá, temos a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É elevado a 800$000 réis o ordenado de guarda mór de saude do porto de Angra do Heroismo.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da camara dos senhores deputados, 10 de fevereiro de 1879. = Visconde de Sieuve de Menezes, deputado pela ilha Terceira = Pedro Roberto Dias da Silva, deputado pelo circulo das Vélas.

O redactor = Lopes Vieira

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