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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Tendo ali muitos amigos, apressei-me em ir visital-os e indagar quaes oram as causas de procedimento tão extraordinario per parto da auctoridade administrativa.

Soube então o que se tinha passado, mas o que não póde perceber é os meus amigos não me poderam explicar, foi a presença da força. Receiava-se por acaso alteração de ordem?

Parece-mo que não, posso affiançar que ninguem ali pensava em tal.

N’esta ida da força militar para Grandola ha um ponto importantissimo á que logo me referirei.

Disse s. ex.ª o sr. ministro do reino que a força militar tinha ido para Grandola em virtude, de uma requisição da auctoridade administrativa.

De accordo.

Eu bem sei que 3. ex.ª não tem responsabilidade alguma n’este facto; todavia a força foi, e eu posso affiançar a v. ex.ª que ella não era ali precisa, e que a ordem não seria alterada, como não foi e nunca tem sido.

Não passou tudo dos sustos exagerados da auctoridade administrativa, e do desejo que essa auctoridade tinha de vexar aquelle povo.

E vou fundamentar o que digo.

Quando em outubro ultimo, aquelle concelho me honrou com os seus suffragios, dando-me uma votação quasi unanime, porque tive ali 1:036 votos, ao passo que o meu antagonista, o candidato governamental, teve apenas 18, n'essa occasião, como acontece em toda a parte quando se realisam as eleições, era natural que os animos estivessem um pouco exaltados.

Pois esta mesma auctoridade administrativa entendeu então que eram bastantes 30 praças para que a ordem publica não perigasse.

Effectivamente lá estiveram o não houve alteração da ordem.

Houve apenas um pequeno incidente, mas que foi suscitado por estrangeiros o nada tinha com a eleição ou com a povoação.

Agora é tão anarchico e tão perigoso o estado d'aquelle concelho, que são precisas 105 bayonetas, 6 policias civis e 1 telegraphista!

Permitta-me v. ex.ª que eu diga, que a ida d'estes 6 policias e a farçada mais ridicula que tenho visto. (Apoiados.)

Estivo na localidade, e maravilhou-me realmente ver a altitude nobre daquelle povo, que nem mesmo se indignava, ria-se apenas.

N'uma povoação entregue toda aos seus trabalhos agricolas; n'uma povoação, cujas ruas são nos dias de semana como as ruas do todas as terras das provincias, pouco concorridas, andarem 6- policias vestidos á paizana. procurando um inimigo que não existe, não póde ter outro nome que não seja o de farçada. (Apoiados.)

Mas, emfim, fez-se isso; cumpriram-se-as ordens da commissão, é a auctoridade administrativa foi satisfeita.

O ponto mais importante do procedimento da auctoridade administrativa de Grandola, alem de vexar o povo, foi o de coagir o thesoureiro do concelho a pagar ameaçando com a presença da força.

Isto é expressamente prohibido pela lei; e appello para as palavras que s. ex.ª o sr. ministro dos negocios estrangeiros Andrade Corvo, proferiu n'esta casa na sessão de 7 do março, em resposta ao meu illustre amigo o collega, o sr. Rodrigues de Freitas.

Disso o sr. ministro dos negocios estrangeiros, que não sabia o que se tinha passado, mas que, se a auctoridade administrativa tinha coagido o thesoureiro a fazer aquelle pagamento,. ameaçando-o com a força, s. ex.ª se compromettia a que essa auctoridade seria severamente punida, porque não se podia, de fórma alguma, admittir um tal procedimento.

Este facto é confessado pela propria auctoridade, o para o provar, tenho outra vez de servir-me das palavras do sr. Arouca.

Disse s. ex.ª, na sessão de 8 de março, o seguinte: (Leu.)

E o proprio administrador do concelho que confessa que o thesoureiro deu cumprimento ao alvará da. commissão districtal, e isto por estar já ali estacionada a força publica.

Mas não é só isto: ha mais ainda. O thesoureiro pagou; mas, depois, reunindo-se a camara em sessão, protestou contra esse pagamento, dizendo que o tinha feito porque fóra avisado de que seria preso, senão o fizesse immediatamente; e, tão compromettida se achava aquella auctoridade, que nem se atreveu a reclamar contra similhante protesto, e como fazel-o? Se ella já o havia confessado n'um officio á commissão.

Aquelle concelho h i sempre exemplaríssimo do ordem, e excellentemente dirigido por cavalheiros dignos de todo o respeito, sem que até hoje ali fosse precisa a presença da força publica.

Desde que uma auctoridade administrativa, em concelho pacifico, como o de Grandola, precisa, para manter o prestigio da sua auctoridade, a presença constante, ou quasi constante, de 305 bayonetas e 6 policias civis, é forçoso confessar que o seu prestigio é mui diminuto; o nós sabemos bem, e a historia aponta-nos, quão triste e desgraçada é sempre a auctoridade que, desprezando as sympathias dos povos, tem por unico elemento o apoio das bayonetas.

Creio que com a transferencia d'aquelle administrador, que ao mesmo tempo é amanuense do ministerio da fazenda, accumulando o respectivo ordenado, lucraria o paiz, mais o concelho onde elle está exercendo as suas funcções, o ainda mesmo elle proprio, porque o procedimento, o precedentes que adoptou lhe fizeram perder o pouco prestigio que já tinha, e alem d'isto possuo uma imaginação fertilissima de sustos e receios que muito o devem incommodar, de tudo isto estaria isempto se ocupasse como devia o seu logar e ahi effectivamente estava no seu elemento, sentinella A porta, guarda do Terreiro do Paço, policia, continuo da repartição, e á noite o guarda nocturno para o acompanhar a casa, asseguravam-lhe a sua mais completa tranquillidade.

De passagem referir-me-hei a uma parte do discurso de s. ex.ª o sr. ministro do reino, que dizia que a tropa, fraternisára com o povo, julgo que s. ex.ª se referiu a um telegramma enviado á redacção do Progresso, eu não sei quem enviou esse telegramma, e só d’elle tive conhecimento quando aqui cheguei; parece-me porém que essas palavras têem uma facil explicação, e esta é que o povo vivia em boa harmonia com a tropa, o que me serve ainda para provar que não é tão mau e povo daquelle concelho, como o pertende fazer a auctoridade administrativa.

Não vejo presente o sr. ministro do reino, e por isso não lhe posso pedir explicações a este respeito; entretanto s. ex.ª ha de ter conhecimento d'estas minhas observações e estou certo de que não ha de deixar de dar explicações á camara sobre este ponto.

Sr. presidente, a camara não póde achai' louvavel o procedimento. d'esta auctoridade, e n'esta parte appello para as palavras do sr. Corvo. (Apoiados.)

O procedimento da auctoridade. administrativa é digno da maior censura e não póde ser desculpavel, porque com o seu procedimento offendeu até o artigo 345.° da carta constitucional que diz: « que nenhum cidadão será obrigado a praticar qualquer acto senão em virtude da lei», e esta auctoridade administrativa coagiu o thesoureiro da camara municipal a praticar um verdadeiro attentado á lei.

Nada mais tenho a dizer sobre este assumpto, e termino agradecendo a v. ex.ª e á camara a attenção que me prestaram.

O sr. Presidente; —- Acha-se nos corredores o sr. vis-

Sessão de 19 de março de 1879