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sessão de 21 de março de 1879

Presidencia do ex.mo sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva

Secretarios - os srs. Antonio Maria Pereira Carrilho (Barão de Ferreira dos Santos

SUMARIO

Presta juramento o Sr. deputado Cazimiro Antonio Ribeiro da Silva. — O governo apresenta differentes propostas de lei. — E aggregado á commissão de agricultura o sr. Frederico Arouca. — Perguntas ao governo á corôa do saneamento da capital, negociação do tratado de commercio com a França, e emigração de menores para o Brazil: respondo o sr. ministro dos negocios estrangeiros. — Continua a discussão do projecto de lei n.º 76: faltavam os srs. visconde do Rio Sado (relator), visconde de Moreira de Rey, e ministro do reino.

Abertura —- As duas horas e um quarto da tarde.

Presentes á chamada 62 srs. deputados.

Presentes a abertura da sessão — Os srs.: Adriano Machado, Carvalho e Mello, Nunes Fevereiro, Alfredo de Oliveira, Rocha Peixoto (Alfredo), Anselmo Braamcamp, Torres Carneiro, Pereira de Miranda, Lopes Mendes, Carrilho, Mendes Duarte, Pinto de Magalhães, Telles de Vasconcellos, Ferreira de Mesquita, Victor dos Santos, Barão de Ferreira dos Santos, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Diogo de Macedo, Eduardo Moraes, Emygdio Navarro, Filippe do Carvalho, Mesquita o Castro, Fonseca Osorio, Francisco Costa, Pereira Caldas, Sousa Pavão, Guilherme de Abreu, Paula Medeiros, Freitas Oliveira, Jeronymo Pimentel, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Barros e Cunha, Sousa Machado, J. A. Noves, Almeida e Costa, J. J. Alves, Ornellas de Matos, Laranjo, José Frederico, Figueiredo de Faria, Namorado, Rodrigues de Freitas, José Luciano, Ferreira Freire, J. M. Borges, Sá Carneiro, Barbosa du Bocage, Luiz Garrido, Pires do Lima, Correia do Oliveira, Alves Passos, Manuel José Vieira, Aralla e Costa, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Jacome Correia, Visconde da Aguieira, Visconde do Moreira Rey, Visconde do Rio Sado, Visconde de Sieuve de Menezes.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Adolpho Pimentel, Fonseca Pinto, Osorio do Vasconcellos, Alexandre Lobo, Alipio Sousa Leitão, Gonçalves Crespo, A. J. d'Avila, Arrobas, Pedroso dos Santos, Barros e Sá, Augusto Fuschini, Pereira Leite, Neves Carneiro, Saraiva de Carvalho, Zeferino Rodrigues, Avelino de Sousa, Cazimiro Ribeiro da Silva, Moreira Freire, Hintze Ribeiro, Firmino Lopes, Fortunato das Neves, Mouta e Vasconcellos, Gomes Teixeira, Van-Zeller, Palma, Silveira da Mota, Osorio do Albuquerque, Anastacio de Carvalho, Gomes de Castro, Melicio, João Ferrão, Pires de Sousa Gomes, Dias Ferreira, Tavares da Pontes, J. M. dos Santos, Pereira Rodrigues, Sousa Monteiro, Taveira e Menezes, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Almeida Macedo, Bivar, Freitas Branco, Faria o Mello, Manuel d'Assumpçâo, M. J. de Almeida, M. J. Gomes, Souto Maior, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Thomás Ribeiro, Visconde de Alemquer, Visconde de Andaluz, Visconde da Arriaga, Visconde da Azarujinha, Visconde de Balsemão, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Emilio Brandão, A. J. Teixeira, Bernardo de Serpa, Carlos de Mendonça, Conde da Foz, Goes Pinto, Francisco de Albuquerque, Frederico Arouca, Costa Pinto, Matos Correia, Guilherme Pacheco, Teixeira de Queiroz, Mello Gouveia, Lopo Vaz, Lourenço de Carvalho, Rocha Peixoto (Manuel), Nobre de Carvalho, Mariano de Carvalho, Miranda Montenegro, Pedro Carvalho, Pedro Correia, Pedro Barroso, Pedro Roberto, Ricardo Ferraz, Rodrigo de Menezes.

Acta — Approvada.

O sr. Presidente: — Acha-se nos corredores da camara o sr. deputado Cazimiro Antonio Ribeiro da Silva. Convido 03 srs. vice-secretarios a introduzil-o na sala.

Foi introduzido na sala e prestou juramento.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Do ministerio das obras publicas, acompanhando, era satisfação ao requerimento do sr. Luciano de Castro, copia dos processos relativos aos contratos celebrados entre o actual director das obras da penitenciaria e o engenheiro João Burnay.?

Enviado á secretaria.

2.° Do mesmo ministerio, acompanhando, em satisfação ao requerimento do sr. visconde do Sieuve de Menezes, copia authentica da representação em que a associação commercial da cidade de Angra do Heroismo pede o augmento de direitos sobre os cereaes estrangeiros.

Enviado á secretaria.

3.° Do mesmo ministerio, acompanhando, em satisfação ao requerimento do sr. Rodrigues de Freitas, o processo de syndicancia feita em 1877, pelo coronel Gilberto Antonio Rola, aos actos do conductor de primeira classe da direcção das obras publicas do districto de Coimbra, Antonio Jorge Freire, e outros empregados.

Enviado á secretaria.

4.° Do ministerio da fazenda, acompanhando o relatorio das actas do mesmo ministerio durante o anno de 1878, o participando que, apenas esteja concluida a impressão dos respectivos documentos, serão enviados os exemplares necessarios para se distribuírem.

Enviado á commissão de fazenda.

5.° Do mesmo ministerio, devolvendo a representação em que a mesa da misericordia de Montemór o Novo pede um edificio do estado para estabelecer um hospital.

Enviado á commissão de fazenda.

SEGUNDAS LEITURAS

O sr. Presidente: — Vão ler-se duas propostas mandadas na ultima sessão para a mesa pelo sr. deputado Emygdio Navarro.

Proposta

Proponho que seja permittido aos deputados apresentar requerimentos antes da ordem do dia, tendo preferencia a palavra para um requerimento. = O deputado, Emygdio Navarro.

O sr. Presidente: — Consulte a camara sobre se admitte esta proposta á discussão..

Foi admittida e enviada á commissão de regimento.

Proposta

A camara deseja que no ministerio das obras publicas, e suas dependencias, se observe a doutrina da portaria do ministerio do reino, de 20 de novembro de 187 3. = O deputado, Emygdio Navarro.

Não foi admittida a discussão por 44 votos contra 14.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Mando para a mesa a seguinte

Declaração de voto

Declaram os deputados Alberto Osorio do Vasconcellos o Antonio de Sousa Pinto do Magalhães, que, se estivessem presentes, votariam o parecer que approvou a eleição de Moncorvo. = Osorio de Vasconcellos = Pinto de Magalhães.

Inteirada.

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O sr. J. A. Neves: — Sr. presidente, tenho a honra de mandar para a mesa uma representação, em que a illustre camara municipal, do concelho de Ourique pede que lhe sejam concedidos os restos, ou ruinas, da antiga igreja de S. Salvador, da mesma villa, que pertenceu á extincta commenda de S. Thiago, cujos bens foram encorporados nos proprios nacionaes.

Estas ruinas consistem em tres restos de paredes, que occupam uma pequena area junto ao edificio em construcção, destinado á accommodação do tribunal judicial e outras repartições publicas.

Pretendo a camara fazer derrubar as paredes, e converter o espaço, que n'ellas se comprehende, em um largo ou praça publica, no intuito não só de aformosear aquelle sitio, mas de facilitar a approximação centrada no tribunal e mais repartições.

Basta esta, simples exposição para logo ficar demonstrada, sem mais commentarios, a justiça do pedido.

Sr. presidente, a illustrada vereação a que me estou referindo, luctando constantemente com grandes difficuldades, principalmente com as que provém da escassez de recursos pecuniarios, conseguiu, apesar d'isso, levar quasi á conclusão aquelle importante edificio, o qual brevemente deve estar completo e prompto a satisfazer os fins a que é destinado, graças ao zêlo e actividade d'esta digna corporação.

É portanto, alem de justo, urgente o deferimento a esta representação; e para o abreviar mando tambem para a mesa o respectivo projecto de lei, que passo a ler, dispensando-me da leitura do breve relatorio que o precede, para não tomar mais tempo a esta camara.

(Leu.)

Rogo a v. ex.ª se digne ordenar que se do os devidos destinos, tanto á representação como ao projecto de lei.

O projecto de lei apresentado pelo sr. deputada ficou para segunda leitura.

O sr. Almeida Macedo: — Mando para a mesa uma representação da santa casa da misericordia da villa de Extremoz, pedindo a confirmação, por meio de uma disposição legislativa, do decreto de 29 de agosto de 1878, pelo qual o governo concedeu á referida santa casa o edificio e suas pertenças do extincto convento das freiras maltezas, situado no Bócio da dita villa.

Peço a v. ex.ª que tenha a bondade de mandar dar a esta representação o conveniente destino.

O sr. Alfredo Peixoto: — O official, os aspirantes do 1.ª o 2.ª classe e o continuo da repartição de fazenda do do districto de Vianna do Castello, encarregaram-me de apresentar n'esta casa uma representação em que pedem melhoria na sua sorte, pela elevação dos seus vencimentos.

Pedem que na occasião em que for discutido o orçamento, os seus ordenados sejam elevados do seguinte modo:

O do official a 400$000 réis, os do cada aspirante do 1.ª classe a 360,5000 réis, os de cada aspirante do 2.ª classe a 240$000 réis, e o do continuo a 150$000 réis.

Enviando para a mesa esta representação, peço a v. ex.ª a bondade, se a camara annuir a este meu desejo, de dar as ordens necessarias para que esta representação seja, impressa no Diario do governo.

Como os representantes pedem que esta questão seja tomada em consideração na discussão do orçamento, e como é justo que os srs. deputados tenham conhecimento das rasões em que os supplicantes se fundam, entendo que ha interesse e vantagem em que a representação seja impressa, para que cada um de nós possa examinal-a com a devida attenção.

Alem d'este pedido, que espero seja attendido, permitta-me a camara que eu faca umas ligeiras considerações para fundamentar esta representação.

V. ex.ª sabe que, embora n'este paiz tenham acabado os morgados e O odiosa distincção de filhos segundos, ficaram subsistindo uns e outros nos quadros dos empregados publicos dos differentes ministerios, e especialmente nos quadros dependentes dos ministerios das obras publicas e fazenda.

E realmente para contristar o que sé está vendo 1103 quadros de ambos estes ministerios, e sem me demorar em uma completa comparação, porque effectivamente isto levaria muito tempo e causaria pena, lembrarei a v. ex.ª o á camara o desanimo a que se chega quando se comparam os directores do correio, com qualquer dos empregados das direcções das obras publicas dos differentes districtos.

A comparação é triste, tanto pela natureza do serviço, como pela remuneração, que é muitissima desigual.

Na direcção das obras publicas dos districtos encontram conductores que, sem habilitações especiaes que representem e custem capital e trabalho, estão vencendo ordenados muito importantes.

Ainda ha povco vi no quadro do pessoal technico das obras publicas de Vianna, conductores com vencimentos iguaes ou superiores, conforme as circumstancias aos dos alferes o tenentes!

Nas direcções das obras publicas, estão empregados engenheiros feitos á pressa, elevados a tenentes, que, permitta-me a camara, uma vez que não cito os nomes, diga que são tenentes pintados, e recebendo do vencimento mensal 58000 réis!

No ministerio da fazenda basta comparar os empregados que estão nas condições dos que assignam esta representação, com os seus proprios chefes, e sobre tudo com os escrivães de fazenda o com os recebedores de comarca.

Digo francamente que admiro a coragem de um pae que manda educar um filho nas escolas, em vez de habilitai o para escrivão de fazenda ou recebedor de comarca.

V. ex.ª e a camara sabem que ha escrivães de fazenda e recebedores de comarca com vencimentos superiores aos dos juizes do supremo tribunal do justiça..

Sei bem que é um problema difficil a definitiva organisação dos quadros dos empregados publicos, não só quanto aos serviços, como quanto aos vencimentos, mas é tambem certo que nos quadros das repartições do fazenda nos districtos e concelhos, o remedio é facil, nem tenho duvida em indical-o. Basta distribuir as quotas que estão destinadas aos recebedores e escrivães de fazenda de fórma que elles tenham uma remuneração justa, mesmo elevada proporcionalmente aos dos outros funccionarios do estado, correspondente aos seus serviços e á sua responsabilidade, o destinar do resto o que for necessario para a justa remuneração dos quadros a que pertencem estes representantes, dos pobres escripturarios da fazenda, dos guardas da alfandega e de muitos outros infelizes de quem todos os dias estamos a receber aqui representações e pedidos.

Já v. ex.ª vê que, reconhecendo eu a difficuldade que ha de uma reorganisação completa dos quadros dos empregados publicos, o que entendo ser trabalho superior ás forças de um homem só, penso e declaro com franqueza que para os empregados, que tenho considerado em especial, o remedio é muito facil, em vez de cada escrivão de fazenda o recebedor de comarca ter tanto por mil ou cem, tenha menos, e o resto seja repartido pelos outros empregados que com elle cooperam nos mesmos serviços.

Tinha pedido a palavra para tambem referir-mo a uma questão de summa importancia para o districto do Vianna, especialmente para os circulos de Vianna, Ponto do Lima, Monsão, e o que tenho a honra do representar n'esta casa, mas julgo conveniente fazel-o na presença do sr. ministro das obras publicas.

Como, porém, o negocio não é urgente o posso esperar a presença de s. ex.ª, peço a v. ex.ª que me reservo, a palavra para quando o sr. ministro estiver presente, hoje mesmo ou em outra sessão.

O sr. Barros e Cunha: — Vejo que chegaram á mesa

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os documentos ácerca da syndicancia que teve legar nas obras publicas do districto de Coimbra.

Para este assumpto tinha pedido a palavra quando o sr. ministro das obras publicas respondeu ao sr. deputado por Aviz, ella porém não me chegou n'essa occasião. lias, apesar de estarem os documentos na mesa, e portanto a camara habilitada e o publico tambem, a poder julgar como a syndicancia foi feita, não posso deixar que peso sobre o empregado syndicante que enviei, não só aquelle districto, mas ao districto de Peja, nenhum desfavor, que de certo lho podia ser attribuido, porque o sr. ministro declarou que negava as certidões que lhe eram pedidas, por ter sido a syndicancia feita por um empregado da confiança do governo.

Todos os empregados do ministerio das obras publicas, emquanto tive a honra do ser depositario d'aquella pasta, eram dignissimos da confiança de qualquer ministro e de qualquer governo, todos sem excepção; e o sr. Rola que foi encarregado d'aquella syndicancia e da syndicancia do districto de Beja, está, pelos proprios actos que desempenhou, a coberto de qualquer suspeita de parcialidade. Ao mesmo tempo que a syndicancia do districto de Coimbra obrigou o governo a submetter o processo á consulta da procuradoria geral da corôa, a syndicancia feita ao districto do Beja era a mais satisfactoria possivel, e onde não havia senão motivo para tecer os maiores elogios e louvores, ao engenheiro director das obras publicas do districto.

A contabilidade, todos os processos, o maior escrupulo em todas as arrematações e em todos os fornecimentos, põem aquelle dignissimo empregado n'uma luz tal que o torna merecedor dos elogios do governo, e confesso a v. ex.ª que teria procedido a respeito d'elle, como n'outra occasião procedi, se acaso os trabalhos que o sr. Rola apresentou, me. tivessem sido apresentados quando eu estava no governo.

Não procurei nunca, como se me attribuiu, deprimir nem lançar suspeitas sobre a probidade ou merecimento de ninguem. A camara sabe que eu não fiz senão mandar aos tribunaes, que julgassem e conhecessem de processo» e de factos, quando a minha responsabilidade era pedida para cobrir esses actos, que eu em caso nenhum queria sanccionar.

Hoje o publico conhece parte dos inqueritos e dos trabalhos feitos pela camara dos senhores deputados, e espero que elle tenha conhecimento cabal e completo de tudo; porque entendo que o publico tem direito de saber como os seus dinheiros são gastos, (Apoiados.) e se as leis são excepcionalmente applicadas para com os empregados que têem logares politicos ou influencia politica nos corpos legisladores em relação aos infelizes que não têem quem os proteja (Apoiados.)

Eu tive á infelicidade de ler de mandar proceder criminalmente, contra muitos empregados do ministerio das obras publicas; e confesso a v. ex.ª, que algumas vezes tive pezar do meu procedimento.

Houve um infeliz que era chefe de uma estação telegraphica, ou do caminho do ferro, que teve á infelicidade de desviar, Ou de se deixar roubar, na quantia de 60$000 a 70$000 réis; pois v. ex.ª póde imaginar que um dia, entrando em casa, encontrei aquelle desgraçado á porta, com cinco filhos, dos quaes o mais velho tinha sete annos, pedindo-me que lho valesse, e d’esse pão á sua familia.

Como esse, outros.

Eu, portanto, não podia ter duas medidas differentes, uma para os desgraçados que ficavam completamente perdidos, e outra para áquelles que tinham influencia para me levantarem opposições politicas.

Estas eram as explicações que eu tinha de dar á camara. O sr. Rola procedeu como entendeu; mas devo dizer que a sua missão foi tão imparcialmente cumprida, que emquanto n’um districto não achou senão que censurar, em outro districto não achou senão que louvar ao engenheiro que dirigia as obras publicas.

Agora, como eu vejo presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros, peço licença para lho dizer que desejo muito obter de s. ex.ª algumas informações ácerca do assumpto, que já se debateu entro nós quando em outra epocha s. ex.ª era ao mesmo tempo ministro da marinha e doa negocios estrangeiros. É o que se refere ao habito do permittir para a repressão do trafico da escravatura, a acção das forças navaes inglezas nas aguas territoriaes portuguezas, nos rios das nossas possessões ultramarinas.

Creio que o sr. ministro, porque elle não póde ignorar o facto, tem a consciencia de que não posso deixar de lhe pedir a sua opinião a esse respeito; porquanto á interpellação que eu então dirigi a s. ex.ª, o com a explicação de que me dei por satisfeito, se attribue, mas muito mal, que o trafico da escravatura tenha revivido. E verdade que o governo prohibiu posteriormente que os navios inglezes entrassem para fazer policia nas aguas territoriaes portuguezas. Esse acto é da nossa responsabilidade; mas carecemos de saber as suas consequencias.

Este assumpto é grave, e eu não darei por agora mais desenvolvimento a este «negocio, porque entendo que o sr. ministro precisa preparar-se para responder sobre elle; mas acrescento que muito desejo que o governo reconheça que eu, deputado da opposiçâo, estou não obstante resolvido a votar-lhe meios e recursos necessarios para que a policia nas aguas territoriaes das nossas colonias seja perfeita e convenientemente realisada pela nação portugueza, e para que seja efficaz, decidida e poderosa, a ponto do poder supprimir completamente o trafico da escravatura; porque não venho aqui, nem nunca procurei de modo nenhum, levantar ao governo o menor embaraço para que possa dignamente cumprir os deveres que lhe impõem a humanidade e a civilisação. (Apoiados.)

Desejava tambem, se por acaso não houvesse inconveniente, e sem de modo nenhum querer que reviva a questão Paiva de Andrada, mas em vista de umas phrases do sr. ministro dos negocios estrangeiros, saber quaes são os meios de cooperação que o governo portuguez quer empregar para auxiliar o governo inglez no desenvolvimento da cultura e na civilisação das provincias ultramarinas que nos pertencem.

Eu não tenho pressa; antevejo que a sessão não irá alem, ou muito pouco alem, do praso em que o governo costuma, ter o parlamento aberto, e desejava, por honra e dignidade do governo e honra e dignidade do parlamento que s. ex.mo o sr. ministro, quando julgar opportuno se sirva comparecer antes da ordem do dia, e de trocar com um deputada da nação as explicações que s. ex.ª tiver por convenientes, e que elle no cumprimento do dever do seu cargo não poda deixar do lhe pedir.

O sr. Ferreira de Mesquita: — Tenho a honra de mandar para a mesa, e v. ex.ª lhe dará o destino conveniente, o requerimento em que José do Azevedo Vellez, invocando os serviços militares feitos por seu pae, o general Azevedo Vellez, pede a esta camara lhe seja concedida uma pensão.

Permitta v. ex.ª que eu faça uma ligeira observação tocante a este assumpto.

Poderá parecer estranho que um homem venha requerer auxilio pecuniario, que natural seria poder auferil-o do seu proprio trabalho e da sua actividade.

Esta estranheza, porém, não terá rasão de ser, desde que se saiba que o desgraçado signatario do requerimento é paralytico, o padeço uma horrivel enfermidade, como se vê, do attestado junto, que tambem remetto para a mesa.

Ponho, pois, esta triste miseria sob a protecção da camara, que resolverá, como julgar melhor.

O sr. Alves Passos: — Mando para a mesa uma declaração do que por falta de saude não pude assistir á sessão do dia 19, e um requerimento em que peço diversos es-

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clarecimentos pelo ministerio dos negocios da fazenda, requerimento a que v. ex.ª dará o destino conveniente.

Eu desejo que se esclareça por todos os meios possiveis a questão do varejo aos bancos, não só a respeito do modo porque deve ser interpretada a lei e interpretado o regulamento do sêllo. n'este ponto, mas tambem para que não estejam pesando sobre alguns d'estes estabelecimentos insinuações pouco leaes, e censuras immerecidas por não terem cumprido a lei, quando outros, sobre que pésa a mesma responsabilidade, são abrigados com o manto da benevolencia o com a sombra da equidade.

Desejo appellar para os sentimentos dó justiça, de benevolencia e de rectidão do sr. ministro da fazenda em occasião opportuna; para isso careço d'estes esclarecimentos que requeiro, e, portanto, peço a v. ex.ª que se digne mandar expedir o meu requerimento com a maior brevidade possivel.

Leu-se na mesa a seguinte

Declaração

Declaro que por falta de saude não pude assistir á sessão do dia ]9.

Sala das sessões, 21 do março de 1879. = O deputado, Alves Passos. Inteirada.

Leu-se na mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja, com a possivel brevidade, remettido a está camara:

1.° Relação de todos os estabelecimentos de credito, irmandades, lojas, casas de vendas, e hotéis ou estalagens, visitados ou varejados pelo visitador especial do sêllo em Barcellos, Vianna, Ponte do Lima e Guimarães.

2.° Nota dos livros sujeitos a sêllo de veria antes de escriptos, que achou devidamente sellados nos estabelecimentos visitados, com designação do titulo de cada um, e da data em que foi n'elles lançado o termo da verba do respectivo sêllo.

3.° Nota dos livros do registo dos accionistas, dos balancetes mensaes, e dos balanços annuaes que encontrou por sellarem cada um dos bancos e estabelecimentos visitados..

4.º Nota dos livros de recibos dos accionistas, com relação aos dividendos ou juros, e dos recibos dos empregados, com relação aos vencimentos, nos bancos e estabelecimentos visitados, mencionando a data do sêllo a óleo, ou da inutilisação das estampilhas.

5.° Nota numerica dos cheques ou ordens sobre banqueiros, sujeitos a sêllo, e que foram encontrados sem elle, em cada, um dos bancos e estabelecimentos visitados.

6.° Nota das apprehensões de livros e documentos não. sellados, o dos autos levantados a tal respeito, ou das multas pagas n'esse acto, nos estabelecimentos ou bancos visitados nas mencionadas povoações do Barcellos, Vianna, Ponte do Lima e Guimarãs.

E outro sim requeiro que, se n’alguma d'estas terras não tiver ainda sido dado ou concluido o varejo aos seus estabelecimentos, sejam sem demora enviados a está camara os esclarecimentos relativos aos bancos e estabelecimentos já visitados e varejados. = O deputado, Alves Passas.

Foi mandado expedir com urgencia.

O sr. Pereira Caldas: — Pedi a palavra para chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas sobre um assumpto importante que diz respeito ao circulo que tenho a honra do representar n'esta casa. S. ex.ª não está presente, peço ao sr. ministro do reino que communique a s. ex.ª as observações rapidas que vou apresentar.

Pela lei de 7 do julho de 18G2 foi creado um imposto sobre todos os generos importados e exportados pela barra de Villa Nova de Portimão, e sobre todas as tonelagens dos navios que entrassem,

Se -mo não engano, o rendimento d'este imposto anda por 12:000$000 réis annuaes: a sua applicação era para melhorar a barra de Portimão, melhorar o porto e canalisar o rio de Silves.

Por iniciativa do illustre deputado o sr. Barros e Cunha, então deputado per Silves; foi o governo auctorisado, pela lei de 4 de fevereiro de 1876 a consignar no orçamento a verba de 8:000$000 réis para auxiliar a mais rapida conclusão d'estes melhoramentos.

Todo o dinheiro que até aqui se tem, gasto proveniente d'estas duas receitas tom sido unica e exclusivamente applicado ás melhorias de Villa Nova de Portimão, sobre tudo na construcçâo de um excellente caes, um dos melhores e maiores do paiz. Silves, que ha dezesete annos soffre estes encargos de uma contribuição tão pesada, continua com o seu rio no estado em que estava antes d'este imposto.

Não me parece justo que Silves, que ha dezesete annos está soffrendo encargos tão pesados, continue no mesmo estado lastimoso.

Eu desejava que o sr. ministro das obras publicas, com a sua rectidão e qualidades que o distinguem, fizesse cessar esta injustiça para áquelles povos do Silves, mandando proceder aos estudos e melhoramentos do rio, do que muito depende aquella terra, uma já hoje das mais importantes do Algarve pela sua industria o pelo seu commercio.

Tenho noticia por pessoa competente de que a despeza a fazer não é grande se attendermos aos recursos especiaes que lhe estão destinados. ' ¦

Espero, pois, que o sr. ministro das obras publicas não deixará de tomar na devida consideração as minhas reflexões, attenta a justiça que assiste aos meus constituintes.

O sr. Agostinho Fevereiro: — Mando para a mesa a seguinte

Declaração de voto

Declaro que, por motivo justificado, tenho faltado a algumas sessões d'esta camara e que, se estivesse presente quando se votou a moção de ordem apresentada pelo sr. Manuel d'Assumpção na questão sobre a concessão feita pelo governo ao sr. Paiva de Andrada na Zambezia, approvaria a dita moção. = Agostinho Fevereiro.

Inteirada.

O sr. Luciano de Castro: — Mandei ha poucos dias para a mesa uma proposta para ser, convidado o sr. ministro da guerra a apresentar á camara uma proposta do lei tendente a legalisar umas despezas que, no exercicio de 1876-1877, se fizeram por aquelle ministerio a mais das auctorisações que tinham sido dadas pelo parlamento.

Essa proposta foi adiada por não estar presente o sr. ministro da guerra.

O sr. Luiz de Lencastre: — Foi adiada até estar presente o sr. ministro da guerra. (Apoiados.).. O Orador,: — Eu estava persuadido de que tinha, sido adiada por não estar presente o sr.' ministro da guerra.

Vejo agora que foi adiada até s». ex.ª estar presente, mas como esse até, é indefinido,. (Apoiados) eu desejava que s. ex.ª me dissesse se estava disposto; a tomar algumas providencias para que fosse avisado o sr. ministro da guerra, a fim de vir a esta camara assistir á discussão d'essa proposta.

Se v. ex.ª não quer encarregar-se de fazer saber ao sr. ministro, da guerra os meus desejos de que s. ex.ª aqui venha, e sé nenhum dos srs. ministros que estão presentes se encarrega de communicar ao sr. presidente do Conselho, que esta proposta está pendente, e aguarda a sua presença para ser discutida, n'esse caso vejo-me obrigado a mandar pára a mesa uma proposta convidando s, ex.ª a vir aqui com toda a brevidade. (Apoiados)

Já mais de uma vez alludi n'esta casa á necessidade de que o sr. ministro da guerra apparecesse aqui mais vezes, a fim de que nós tivessemos occasião de exercer a nossa

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prerrogativa em relação ao ministerio que s. ex.ª gero para fortuna (Testo paiz.

O sr. ministro da guerra appareceu aqui por occasião da questão dá Zambezia, a qual ainda se adiou visto que s. ex.ª tinha feito saber á camara, pela voz do sr. ministro da marinha, que tencionava honrar aquella discussão com a sua presença e com a sua palavra.

Depois disse s. ex.ª ausentou-se, e nós continuámos a esperar todos os dias que aquelle distincto estadista se sirva comparecer aqui para termos occasião de lhe fazer perguntas, como podemos fazer a todos os srs. ministros (Apoiados.) mas o sr. ministro da guerra não apparece nunca. (Apoiados.)

Trata-se da discussão de uma proposta em que s. ex.ª é convidado a satisfazer uma necessidade instante, qual é a de antes de ser encerrada a actual sessão legislativa vir pedir a esta camara a absolvição de uma illegalidade que commetteu na applicação dos dinheiros publicos, (Apoia dos.) e o sr. ministro da; guerra favorece-nos com a sua ausencia, não se digna apparecer!

Não sei como haja de acudir a esta necessidade, porque é evidente que nós não podemos deixar, calcar aos pós os nossos direitos de representantes da nação, e havemos de obrigar O sr. presidente do conselho a vir aqui ouvir as justas reclamações que temos de lhe fazer, no desempenho do nosso mandato.

Este desprego pela camara dos deputados é pouco decoroso.

E pareço incrivel que sendo o sr. presidente do conselho filho do parlamento, tendo aqui nascido e medrado, e havendo-se alevantado, pelos esplendores da tribuna, á altura em que hoje se encontra, tenha pelo parlamento tão escassa consideração. (Apoiados.)

Não se póde Conseguir a presença de s. ex.ª n'esta casa E não querendo v. ex. dignar-se prevenir o sr. presidente do conselho para que compareça em um dos dias proximos, ou não querendo os seus collegas prevenil-o no mes me sentido, vejo-me obrigado" a mandar para a mesa uma proposta; que provavelmente não será admittida á discussão pela camara; segundo é a sua pratica o estylo constantes; com o intuito de pedir ao sr. presidente do conselho que compareça aqui, a fim de nos desempenharmos dos deveres que nos impõe o nosso mandato.

Tenho muitas e variadas perguntas que dirigir ao sr. ministro da guerra, porque n’aquelle ministerio não ha lei, ou se á ha, não se cumpre. (Apoiados.)

Eu podia formular uma nota de interpellação, porém não o quero fazer antes de ouvir da parte do sr. presidente do conselho algumas explicações ácerca do que desejo Saber.

Peço, portanto, a v. ex.ª tenha a bondade de fazer, constar ao sr. presidente do conselho este meu desejo.

Agora pretendo fazer uma pergunta ao sr. ministro das obras publicas, pergunta que já annunciei em uma das sessões passadas, e que hoje formulo, porque o assumpto é grave;

Desejo saber de algum dos srs. ministros presentes, visto que o sr. ministro das obras publicas não está presente, se o governo está resolvido a cuidar do saneamento da cidade do Lisboa, e a tirar algum proveito da somma de réis 28:000$000 que for applicada, ao pagamento dos estudos do contrato Gotto.

V. ex.ª e a camara sabem que sei compraram por réis 28:000$000 os celebres estudos do contrato Gotto, e que se compraram illegalissimamente, pois que deviam ter sido pagos pelo municipio de Lisboa.

Por tanto é preciso saber se se pagaram illegalmente 28:000000 réis pelos estudos destinados aos trabalhos do saneamento da capital, e se o paiz não ha de auferir nenhum resultado d'essa despeza?!

Sr. presidente o saneamento da cidade de Lisboa é assumpto gravissimo. (Apoiados.) A mortalidade cresce todos os dias o é preciso que o governo o os poderes publicos empenhem todo o sou cuidado na resolução de assumpto tão ponderoso e serio como este.

V. ex.ª sabe que se publicou a lei de 12 do abril de 1.876, para acudir a essa urgentissima necessidade. Essa lei encarregava a camara municipal de Lisboa dos estudos o trabalhos para o saneamento da capital. D'essa lei não se colheu outro resultado senão o de pagar o governo aquella importante somma!

O paiz fez a despeza de 28:000$000 réis e nada mais! Creio que a camara municipal, desde que o governo, acceitou o encargo de pagamento dos estudos, entendeu que tinha cessado toda a sua responsabilidade em relação a este assumpto, e que ao governo pertencia cuidar dos trabalhos do saneamento da cidade.

Preciso saber se o governo está resolvido a tomar alguma iniciativa n'este objecto, se tem a intenção de fazer executar pela camara municipal de Lisboa a lei de 12 do abril de 1876, ou se está resolvido a trazer alguma medida ao parlamento a este respeito, porque é impossivel adiar por mais tempo esta gravissima questão. (Apoiados.)

O, sr. ministro das obras publicas não está presente! no outro dia annunciei a v. ex.ª que desejava fazer-lhe uma pergunta a este respeito.

Estão presentes nas cadeiras ministeriaes dois cavalheiros, e entre elles o sr. Corvo, que geriu por algum tempo a pasta das obras publicas é possivel que esta questão tenha sido tratada em conselho de ministros, e eu muito folgaria que qualquer dos srs. ministros presentes, nomeadamente o meu illustrado amigo o sr. Corvo, se dignasse dar á camara algumas explicações sobre este assumpto do saneamento da capital, que é importantissimo para Lisboa, (Apoiados.)

V. ex.ª sabe que na sessão passada suscitou-se aqui uma questão grave a respeito da obrigação que os ministros lêem de mandar passar certidões dos documentos officiaes que lhes são requeridos para a defeza dos particulares nos crimes de abuso de liberdade de imprensa, por accusações dirigidas a funccionarios publicos no exercicio das suas funcções.

O sr.'ministro das obras publicas declarou que respondia por contemplação com os deputados que lhe fizeram algumas perguntas;, e dignou-se affirmar á camara que, a não ser por esse motivo, não daria as explicações que devia 1

Devemos considerar estas palavras do sr. ministro como um lapso parlamentar, (Apoiados) porque não julgo que ex.ª. tivesse intuito de faltar propositadamente ao respeito que deve ás prerogativas parlamentares, sendo s. ex.ª o primeiro interessado em manter o zelar os seus direitos como deputado.

Mas não me são indiferentes os principios que aqui 'foram debatidos, e por isso preciso que solemnemente se diga se os ministros têem ou não obrigação do mandar passar certidões de documentos publicos que estão nos seus ministerios, e que lhes são exigidas, não só para defeza de um individuo que é accusado do crime de diffamação perante os tribunaes, mas tambem para defeza da, sociedade. (Apoiados.)

A lei que n’estes, casos, por excepção, admitte a prova dos factos imputados, impõe virtualmente aos ministros o dever de passar todas as certidões de documentos que forem necessarias para fundamentar essa prova.

Ora, sr. presidente, é preciso entendermo-nos a este respeito.

O sr. ministro do reino n'uma portaria de 20 de novembro de 1873, estabeleceu excellentes e magnificas doutrinas sobre este assumpto. S. ex.ª só admittiu como restricção ao principio da publicidade o segredo exigido pelo interesse do estado.

Q sr. Andrade Corvo, ha dias, referindo-se a documentos diplomaticos que diziam respeito ao ministerio a seu

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Cargo, estabeleceu analogos principios, que foram recebidos com espontaneos applausos por toda a camara.

Eu applaudo as doutrinas que a este respeito affirmaram

srs. ministros dos negocios estrangeiros e do reino, mas essas doutrinas estão em desaccordo com a doutrina apresentada em uma das ultimas sessões pelo sr. ministro das obras publicos.

Ora, como podem conciliar-se no gabinete ministros com opiniões diametralmente oppostas?

Como é que o sr. ministro das obras publicas póde estar a defender doutrinas tão diversas das que sustentam os seus collegas? Não comprehende

Peço aos srs. ministros dos negocios estrangeiros e do reino que exponham á camara francamente a sua opinião a este respeito, e que declarem se entendem que só deve soffrer modificação o principio da ampla publicidade, em nome do segredo exigido pelas conveniencias sociaes o de ordem publica, ou se admittem a doutrina seguida pelo sr. ministro das obras publicas, de negar o governo arbitrariamente certidões dos documentos existentes nas repartições publicas, ainda quando lhe são pedidos no interesse da sociedade e da justiça.

Espero que algum dos srs. ministros dê explicações ácerca dos pontos em que toquei, e se não me couber outra vez a palavra ainda na sessão do hoje, eu a tomarei em outra sessão, para fazer mais algumas reflexões, se entender dever fazel-as.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Andrade Corvo): — Eu desejava muito responder á multiplicidade de perguntas que o illustre deputado dirigiu ao governo, e especialmente a mim, mas peço licença a s. ex.ª para tomar mais amplas informações sobre estes assumptos, para depois responder mais cabalmente, porque não sei responder a sabatinas sem as ter estudado.

Acredite o illustre deputado que não é por menos consideração para com s. ex.ª, com cuja amisade me honro ha muito tempo, que deixo de responder, nem por falta de vontade, mas sim por falta de preparos.

Só Uma cousa direi, o é que me pareço que não ha toda a justiça que s. ex.ª benevolamente emprega para com os ministros, accusando alguns de faltarem á alta consideração que elles votam ao parlamento.

A multiplicidade de negocios póde influir para que em um ou outro dia os ministros não possam comparecer, mas sempre que seja necessario dar explicações ao parlamento ou a qualquer dos srs. deputados da opposição, estou certo de que nenhum dos meus collegas se recusará a um dever, e a um dever que todos os homens parlamentares reconhecem.

Por esta occasião mando para a mesa uma proposta renovando a iniciativa de outra que foi approvada por esta camara, mas que não o chegou a ser na camara dos dignos pares do reino, o por consequencia tem de ser novamente discutida n'esta camara.

(Leu.)

E a seguinte:

Proposta de lei n.º 9O-C

Senhores. — Renovo a iniciativa da proposta de lei apresentada ás côrtes pelo meu antecessor, em 8 de janeiro do anno findo, tendente a legalisar algumas despezas que excederam os creditos auctorisados para occorrer ao pagamento dos encargos do ministerio dos negocios estrangeiros nos annos economicos de 1865-18G6 a 1875-1876, a qual tendo sido approvada pela camara dos senhores deputados em sessão de 27 de abril do 1878, não chegou a ser convertida em lei.

Secretaria d'estado dos negocios estrangeiros, 12 de fevereiro de 1879. — João ele Andrade Corvo.

O sr. Emygdio Navarro: — As explicações que deu o sr. Barros o Cunha, relativamente á syndicancia ás obras publicas do Coimbra, mostram que este assumpto é mais grave do que se poderia suppor, porque juntamente com o caso da recusa de documentos pedidos por um cidadão que quer defender-se perante os tribunaes, póde dar-se. o caso de grandes delapidações!

E visto que a camara recusou admittir á discussão a proposta que eu tinha mandado para a mesa na sessão anterior, mando para a mesa a seguinte nota do interpellação.

(Leu.)

E requeiro a v. ex.ª consulte a camara sobre se consente que os documentos que dizem respeito a esta nota de interpellação, bem como o auto de syndicancia que o sr. secretario disso que estava sobre a mesa, sejam publicados no Diario da camara ou no Diario do governo, como parecer melhor.

Leu-se na mesa a seguinte:

Nota de interpellação

Desejo interpellar o sr. ministro das obras; publicas sobre o indeferimento dos requerimentos apresentados pelo bacharel Francisco Maria de Lima Nunes, para que se lhe passasse certidão da syndicancia feita em 1877 pelo coronel de engenheria o sr. Gilberto Rolla, ás obras publicas de Coimbra, e bem assim sobre a falta do seguimento da mesma syndicancia. = O deputado, Emygdio Navarro.

Foi mandada communicar ao governo.

Consultada a camara ácerca do requerimento do sr. Emygdio de Navarro, resolveu que não se fizesse a publicação requerida.. '

O sr. Mesquita e Castro: — Mando para a mesa o seguinte projecto de lei.

(Leu.),

Ficou para segunda leitura..

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — Mando para a mesa uma proposta de lei.. (Leu.)

E a seguinte:

Proposta de lei n.º 90-D.

A camara municipal do Coimbra no seu orçamento ordinario para o corrente anno, no capitulo das contribuições directas, lançou a do 10 por cento sobre a decima parte do rendimento das inscripções averbadas a individuos residentes no concelho..

O orçamento assim votado pela camara foi approvado pela commissão executiva da junta geral do districto, e em virtude d'esta approvação formulou-se prol da repartição, que, conforme as disposições do codigo administrativo, foi exposto ás reclamações dos contribuintes.

Tendo reclamado alguns, possuidores de inscripções contra o lançamento d'aquelle imposto, a camara municipal desattendeu as reclamações, o que deu occasião a que se interpozessem recursos perante os tribunaes do contencioso administrativo.

Estes factos têem impressionado desfavoravelmente, não só os possuidores, das inscripções, mas tambem o publico em geral, pela depreciação que d'ahi resulta para áquelles titulos de credito, a que estão ligados importantes interesses publicos e particulares.

Cuidou portanto o governo, como lhe cumpria, de se informar do estado d'esta questão e de estudar os meios, do evitar as perturbações, que tão justificadamente se receiam das faculdades tributarias das camaras municipaes, se lhes for reconhecida a extensão com, que as exerceu a camara municipal de Coimbra.

Em resultado d'essas informações e exame é que vimos propor-vos as providencias legislativas, que nos parecem necessarias para garantir aos possuidores das inscripções as vantagens que lhes foram promettidas pelo estado.

A camara municipal de Coimbra sustenta, a legalidade, do lançamento do questionado imposto com fundamento na disposição do § unico do artigo 115.° do codigo administrativo vigente, que é igual á do § unico do artigo 139.º do codigo anterior, e segundo o qual os rendimentos isentos das contribuições geraes do estado podem e devem ser

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tributados em uma quota proporcionada á que se lança aos rendimentos sujeitos aquellas contribuições.

A camara não desconhecendo que os juros das inscripções estão por lei isentos das contribuições geraes, sendo até no reconhecimento d'essa isenção que ella se funda para considerar applicavel áquelles rendimentos o § unico do artigo 115.° do codigo, não reconhece todavia (e e n'este ponto que os collectados impugnam o acto camarário) que a isenção do imposto se refere não sómente aos impostos geraes do estado, mas tambem a toda e qualquer imposição que prive os possuidores dos titulos de receber integralmente os respectivos juros.

Collocada a questão n'este terreno, parece mais defensável a causa dos collectados, pois que o decreto de 18 de dezembro de 1852, no artigo 1.°, dispondo que os juros das inscripções não teriam deducção alguma, quiz de certo comprehender nesta prohibição tanto o cerceamento dos juros no acto do pagamento, segundo querem alguns que sómente signifiquem as palavras do decreto na sua stricta accepção, como qualquer outro desfalque sob fórma diversa, mas que tenha de commum com o primeiro a privação, para os possuidores dos titulos, de uma parte dos rendimentos que o estado lhes quiz garantir integralmente. O principio do alta conveniencia publica que justifica o pagamento integral dos juros ordenado no decreto ficaria prejudicado, se ao mesmo decreto se desse a interpretação tão litteralmente restricta, que lhe pretendem dar os defensores da legalidade do imposto municipal.

Entendido assim o decreto de 1852, que é lei especial sobre o assumpto, as disposições do codigo administrativo, como lei geral, não podem ser applicadas som resalva das disposições do mesmo decreto, devendo portanto considerar-se n'este ponto limitadas as faculdades concedidas ás camaras municipaes pelo artigo 115.° e ás juntas de parochia pelo artigo 172.° do codigo administrativo.

Seja, porém, esta ou outra a recta interpretação das leis applicaveis, é certo que, ácerca d'este ponto, as opiniões estão divididas, e que comquanto as leis estabeleçam meios de alcançar que o procedimento dos corpos administrativos se harmonise com os preceitos das mesmas leis rectamente entendidas, não são infalliveis esses meios, e em todo o caso não são tão expeditos, como conviria que o fossem, para evitar os damnos provenientes da immediata execução das deliberações administrativas.

N'estas circumstancias entende o governo que o meio mais curial e mais efficaz para por termo ás duvidas suscitadas, é a interpretação authentica das leis que regem o assumpto, e n'esta conformidade temos a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° Os juros dos titulos de divida publica são isentos de toda e qualquer deducção ou imposto, quer geral quer local.

Art. 2.° Ficam assim declarados e interpretados o artigo 1.° do decreto de 18 de dezembro de 1 852 e o § unico do artigo 115.°, e os §§ 1.° e 2.° do artigo 172.° do codigo administrativo.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 21 de março do 1879. — Antonio Rodrigues Sampaio - Antonio de Serpa Pimentel.

O sr. Visconde de Andaluz: — Mando para a mesa a seguinte:

Proposta

Proponho que seja aggregado á commissão de agricultura o illustre deputado o sr. Frederico Arouca.

Sala das sessões 21 de março do 1879. = Visconde de Andaluz.

Foi logo aprovada.

O sr. Saraiva de Carvalho: — Remetto para a mesa duas representações.

Uma dos é fabricantes do seda sobre a reforma das pautas.

Peço a v. ex.ª que lhe de o destino competente, sendo remettida á commissão para a tomar em consideração.

A outra é dos operarios de associação dos trabalhadores da região portugueza, com diversas classes do officiaes tanto de Lisboa o Porto, como de outras terras do reino, que pedem ao poder legislativo que seja estabelecido o dia normal de trabalho, necessidade que elles sentem ha muito e que entendendem devo ser tomada em consideração por esta camara.

Peço que esta representação seja remettida á commissão competente.

E pedindo a v. ex.ª toda a solitude para este assumpto, requeiro que consulte a camara sobre se permitte que se dê publicidade a estas representações no Diario da camara ou no Diario do governo.

Creio que não haverá duvida, a este respeito, mesmo porque o assumpto das representações não é analogo ao da syndicancia sobre as obras do governo.

Consultada a camara decidiu que a representações apresentada pelo sr. Saraiva de Carvalho fossem publicadas.

O sr. J. J. Alves: — Mando para a seguinte

Declaração

Declaro que por motivo justificado faltei á sessão de 19 do corrente.

21 do março de 1879. = J. J. Alves, deputado por Lisboa.

Inteirada.

O sr. Barres e Cunha: — Peço á camara que me desculpe ter de occupar ainda á sua attenção para dar explicações ácerca de uma phrase proferida pelo sr. deputado José Luciano de Castro.

Disse s. ex.ª que o pagamento de £ 6:400, mandado fazer pelo governo a Eduardo Gotto pelos estudos de canalisação de Lisboa, tinha sido illegal!

Posso informar o illustre deputado que o pagamento foi legal

O governo estava auctorisado, pelo § 2.° do artigo 4.° da carta de lei de 12 do abril de 1876 para adiantar á camara municipal de Lisboa a verba para os estudos necessarios para abrir o concurso.

O governo não podia fazer cousa differente do que fez, para corresponder ao que o illustre deputado deseja, j Encontrando feito um contrato para os estudos, o governo primeiro exigiu modificações e em seguida negou a approvação para se executarem. as obras, emquanto -o inquerito a que mandára proceder no estrangeiro, não viesse 'provar que a applicação d'aquelle systema na cidade do Lisboa podia dar os resultados que o illustre deputado o todos os que habitámos n'esta cidade anciosamente desejamos obter.

O engenheiro já recolheu; os estudos que elle fez, as observações praticas a que procedeu foram entregues ao governo, e d'aqui por diante só podem dar explicações os ministros actuaes que estão encarregados de fiscalisar, de promover e de executar estes trabalhos.

0 pagamento dos estudos foi auctorisado por mim; pela legalidade d'elle respondo eu pessoalmente, e estou prompto para sustentar e mostrar que esse pagamento foi completa e perfeitamente legal, porque estava estipulado em um contrato perfeito o auctorisado por uma disposição de lei.

Em relação ao contrato era um contrato, e n'elle, como em muitos outros contratos, que hão teria feito nem sanccionado, não teria remedio senão reconhecel-o e soffrer-lhe as consequencias.

O sr. Pereira de Miranda: — Aproveito a presença do sr. ministro dos negocios estrangeiros para dirigir uma pergunta a s. ex.ª

Talvez parecesse mais regular que essa pergunta fosse dirigida ao sr. ministro da fazenda, mas eu tenho motivos para suppor que o assumpto a que me vou referir foi tomado em mão pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros e

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que é s. ex.ª que tem dirigido exclusivamente este negocio.

Eu desejo saber, não havendo inconveniente, as condições em que está a negociação do tratado do commercio com a França, negociação de que foi encarregado um distincto professor que se encontra actualmente em París.

Creio que o sr. ministro dos negocios estrangeiros tomou a iniciativa de negociar a prorogação do actual tratado com a França ou a sua substituição.

Como disse, talvez pareça que esta pergunta devia ser dirigida especialmente ao sr. ministro da fazenda, mas tenho motivos para suppor que o sr. ministro dos negocios estrangeiros está mais habilitado para dar quaesquer inumações, se as puder dar sem inconveniente publico.

Por isso peço a s. ex.ª que me diga qual é a altura em que está a negociação, que veiu embaraçar um pouco a apresentação de uma proposta de lei', que eu julgo de bastante importancia, e que o sr. ministro da fazenda tencionava trazer ao parlamento.

Aproveito tambem a occasião de estar presente o sr. ministro do reino para perguntar a s. ex.ª se sabe alguma cousa com respeito ao facto annunciado pelos jornaes da chegada ao Rio de Janeiro de um grande numero de menores contratados na ilha da Madeira.

Desejo saber se s. ex.ª tem algumas informações a este respeito da auctoridade superior da Madeira.

Considero o assumpto digno da mais seria attenção do governo, e julgo que s. ex.ª deve tratar de o estudar para saber se têem sido respeitadas as leis e as disposições legaes sobre o assumpto e mesmo se não seria necessario pedir ao parlamento alguma medida com o fim de fazer com que áquelles contratos não sejam uma exploração e uma, nova escravatura auctorisada! (Apoiados.)

E isto o que tenho a dizer.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Respondo ao sr. deputado o que já na outra casa do parlamento tive occasião de dizer, quando foi denunciado o tratado entre Portugal e a França.

A primeira cousa que o governo procurou foi que qualquer modificação a fazer em relação ao novo tratado, não prejudicasse o direito que tenhamos de conservar as clausulas d'aquelle. que estava em vigor durante o periodo completo, e que podia vigorar um anno mesmo depois da denuncia.

Por uma rasão muito simples, tendo manifestado a França tendencias contrarias aos tratados, nós não podiamos esperar vantagens maiores do que aquellas que já existiam, e que podiamos tirar durante o anno em que elle ainda podia vigorar.

Mas logo que se approximou a epocha em que esse tratado caducava, tratei de conseguir que fosse prorogado, ao menos até ao fim do anno, com a promessa de uma nova prorogação, até que o parlamento, no anno proximo, podesse approvar uma nova combinação que fosse adoptada entre os dois governos.

Tive esperança, durante um certo tempo, de conseguir isto, mas essa esperança, infelizmente, não se manteve em mim tão vigorosa, como então, e desde esse momento, procurei, dando as instrucções convenientes ao nosso ministro em França, que podessem, ao menos, pernos ao abrigo de uma combinação temporaria, para termos o tratamento de nação mais favorecida.

Esta combinação, que é a mesma que alcançou a Italia com a França quando teve o tratado rejeitado pela camara em Versailles, e que é a mesma que alcançou, a Austria tambem quando o seu tratado com a França terminou, esta combinação, digo, parece-me que nos auxiliaria; mas não basta.

Precisamos preparar-nos para uma renovação de tratado, logo que a França, depois de fazer passar os seus trabalhos de reforma geral de tarifa, que estão no parlamento, possa estabelecer ou o direito differencial, ou novo regimendo tratado, podendo nós, n'essa occasião sermos ao menos considerados como uma das nações mais favorecidas.

É por isso que julguei conveniente ter em França um homem que, pelas suas largas habilitações, e pelos seus estudos do cousas economicas, e particularmente do cousas industriaes, podesse auxiliar os trabalhos efficazes e zelosos do nosso ministro. Foi preferido o sr. Aguiar, que todos conhecem, que todos devidamente apreciam. (Apoiados.)

O sr. Mendes Leal acceitou com satisfação o auxilio do sr. Aguiar, e os dois estão trabalhando para que antes que caduque o nosso tratado, se realise uma combinação, a fim de termos ao menos o tratamento de nação mais favorecida, sem interromper os trabalhos que podem, de futuro, collocar-nos em circumstancias tão vantajosas, senão mais vantajosas do que outras nações. (Apoiados.)

E isso que se trata n'estas luctas, em que as nações, depois de numerosas exposições para a paz o economia, andam de protecção em protecção!

E uma cousa singular! Quanto mais combinações se fazem para se manter o equilibrio e a paz, mais guerras apparecem; quantas mais exposições se fazem para harmonisar os interesses economicos entre as nações, mais levanta a cabeça o principio protector exagerando os seus tributos!

Mas isto é uma questão incidental que não vem para aqui.

O illustre deputado fez uma pergunta. Não sei se respondi cabalmente; se poder dar mais algumas explicações não terei duvida em as dar, porque estou sempre á disposição da camara não só n'este assumpto, como em todos áquelles que me disserem respeito.

Vamos ao outro negocio.

Perguntei ao sr. ministro do reino, para não estarem dois ministros a tomar a palavra, se tinha recebido noticias da ilha da Madeira ácerca do escandalo a que alludio o illustre deputado, e s. ex.ª disse-me que não. Eu, ha dois ou tres dias apenas, recebi noticias do Brazil, e sei que lá se procede rigorosamente para pôr impedimento a uma exploração, não pude achar palavra mais doce, que se deseja fazer de menores, fazendo-se d'elles, por contratos auctorisados por seus paes, e isto é singular, verdadeiros escravos.

A isto hão de oppor-se todos os impedimentos (Apoiados); hão de empregar-se todos os impedimentos que estiverem na nossa mão.

Não sei até que ponto ha direito para esses contratos, não tenho estudado bastante a fundo esta questão, não sei até que ponto se podem fazer esses contratos com menores, com auctorisação de seus paes; o que posso assegurar é que por todos os meios, directos ou indirectos, eu não descançarei um minuto de me oppor a, esse acto ignobil, a essa exploração infame. (Apoiados.)

(8. ex.ª não costuma revêr os seus discursos.) O sr. Pereira de Miranda: — Agradeço ao sr. ministro dos negocios estrangeiros as explicações que teve a bondade de me dar, e com as quaes me dou por plenamente satisfeito.

Espero que em relação ao ultimo assumpto a que s. ex.ª se referiu o governo, se na legislação vigente não ha medidas bastantes para reprimir taes actos, se apresentará ainda n'esta sessão a pedir ao parlamento essas medidas.

Acompanho o nobre ministro no elogio merecido que elle dirigio á pessoa a quem incumbiu mais directamente as negociações para o tratado do commercio com a França. Effectivamente o sr. Aguiar é competentissimo para tratar d'este importante assumpto.

O nobre ministro nutre a esperança de poder obter um resultado mais favoravel que o que tem conseguido outras nações em relação a tratados de commercio ultimamente celebrados com a republica franceza. Eu não alimento essa esperança.

(Interrupção do sr. ministro dos negocios estrangeiros.) O que eu supponho é, que o sr. ministro o muito que

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poderá obter é um tratado analogo ao da Italia ou de Hespanha.

O sr. ministro dos negocios estrangeiros disse-nos que a demora d'este negocio depende do parlamento francez se occupar da reforma das pautas aduaneiras. Ora o sr. ministro deve saber que o seu collega da fazenda preside a uma commissão que elle proprio nomeou para estudar tambem uma reforma de pautas em Portugal; essa commissão tem tido constantes reuniões.

Não me cumpre como membro d'essa commissão apreciar n'esta occasião os seus trabalhos, nem sei se elles merecerão a approvação do parlamento quando tiverem de vir aqui; mas o que me parecia do conveniencia era que o nosso negociador tivesse conhecimento dos trabalhos d'essa commissão, trabalhos que se podem considerar como concluidos.

É o que lembro ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, o que me parece de grande conveniencia.

O sr. Presidente: — Vae passar-se á ordem do dia; e os srs. deputados que tiveram requerimentos ou outros papeis a mandar para a mesa queriam envial-os.

O sr. Luciano de Castro: — Mando para a mesa os seguintes:

Requerimentos

1.º Requeiro que me seja enviada pelo ministerio da fazenda uma conta dos fundos que entraram no cofre das receitas pelas leis do recrutamento desde a sua creação até 31 de dezembro de 1878, com declaração da applicação que tem sido dada áquelles fundos. = José Luciano.

Foi mandado expedir com urgencia.

1.° Requeiro que me seja enviada copia de qualquer requerimento dirigido pelo engenheiro João Burnay, ao governo, pelo ministerio das obras publicas, depois do 3 de janeiro de 1879, sobre contratos que se dizem celebrados em 18 e 19 de setembro de 1876 entre o mesmo engenheiro o a direcção das obras da penitenciaria central de Lisboa com declaração do seguimento que se lhe tiver dado. = José Luciano.

Foi mandado expedir com urgencia. O sr. Zepherino Rodrigues: — Mando para a mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro, pelo ministerio do reino, seja enviada, a esta camara a copia de informação do administrador do concelho do Grandola e da resposta da respectiva camara sobre o ultimo recurso do official de diligencias da administração ácerca do vencimento. — Zepherino Rodrigues.

Foi mandado expedir com urgencia.

O sr. Rodrigues de Freitas: — Mando para a mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que seja novamente pedida ao ministerio da guerra copia do orçamento das obras dos tribunaes de Santa Clara, feito pelos engenheiros militares. — Rodrigues de Freitas.

Foi mandado expedir com urgencia.

O sr. Luiz Garrido: — Mando para a mesa o seguinte:

Declaração

Declaro que faltei ás sessões de 3, 14, 15, 18 e 19 do corrente mez, por incommodo de saude. == Luiz Garrido, inteirada.

O sr. Freitas Oliveira: — Mando para a mesa a seguinte

Participação

Participo a v. ex.ª e á camara que se acha constituida a commissão de regimento, que nomeou para presidente o sr. visconde de Sieuve do Menezes o para secretario a mim participante. = Freitas Oliveira.

Inteirada.

ORDEM DO DIA

Continua em discussão o projecto de lei n.º 70, na generalidade

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. visconde do Rio Sado, relator da commissão.

O sr. visconde do Rio Sado (relator): — Todos os que têem lido os ultimos annaes parlamentares dos paizes estrangeiros, hão de ter observado, como eu, que ali se tem substituido as pomposas galas de uma luxuosa eloquencia pela simples, singela e precisa expressão da idéa.

Agrada-me este systema, por entender que é o unico parlamentar, porque o parlamento não é uma academia, e porque me colloca a mim, que não sou orador, na facil posição de levantar a minha voz n'esta casa, quando os interesses geraes do paiz, ou os especiaes do circulo que tenho a honra de aqui representar, a isso me obrigarem.

Cabe-me a grande responsabilidade de ter de fallar em seguida a dois cavalheiros tão distinctos sobre assumptos administrativos, como são os srs. Van-Zeller e Dias Ferreira.

Se eu não tivesse banido da minha orthographia o ponto de admiração, teria ficado realmente surprehendido quando vi este projecto ser combatido pelo modo porque o foi e pelas pessoas que o combateram, e digo pelas pessoas, dando n'isto uma prova do respeito pela competencia de s. ex.ªs

É por isso que foi grande a minha estranheza quando vi apresentar theorias completamento modernas para mim, que não as sabia, nem as aprendi e estou disposto a não seguir.

Admirei-me que o partido constituinte, que eu muito respeito e considero, e cujos principaes membros, e especialmente o seu chefe o sr. Dias Ferreira, têem sempre propugnado n'esta casa pelos bons principios, fosse aquelle que viesse entrar n'esta discussão, e sustentar que o projecto que se discute é altamente attentatorio dos direitos eleitoraes, e das garantias e regalias que a constituição confere, quando é exactamente o contrario.

E se não fosse assim declaro francamente que eu não seria o relator, ou que teria assignado o parecer vencido, como fez o sr. visconde de Moreira de Rey, persuadido como estava de que elle era attentatorio das publicas liberdades.

Ouvi com muita attenção todos os argumentos apresentados, tanto pelo sr. deputado Van-Zeller, como pelo sr. Dias Ferreira, e por isso seguirei' a ordem da sua apresentação.

Disse o sr. Van-Zeller:

«O projecto (caso notavel) appella para a legislação do 1852, ahi eram as commissões do recenseamento, e os quarenta maiores contribuintes eleitos pelas camaras municipaes.»

N'isto houve uma confusão que depois creio que o sr. Van-Zeller rectificou.

Uma pessoa da competencia do sr. Van-Zeller não podia dizer que as commissões de recenseamento, pelo decreto de 1852, eram eleitas pelas camaras municipaes.

As eleições da commissão de recenseamento eram effectuadas no edificio da camara.

Ali se reuniam o presidente da camara, o administrador do concelho, e o escrivão de fazenda levando a relação dos quarenta maiores contribuintes d'aquelles que pagavam no concelho a maior contribuição predial, segundo á disposição do artigo 21.° do decreto de 1852.

O sr. Van-Zeller, seguindo na sua argumentação, disse que a lei de 1859 era óptima!

Ora realmente, o que quer dizer a palavra optimo?

É o superlativo do bom; e suppondo mesmo, que o sr. Van-Zeller não dissesse que a lei era óptima, com relação a todas as suas disposições; o que de certo quiz dizer foi, que a lei era óptima com relação ao assumpto especial da

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commissão do recenseamento; o que era óptima, quando creou essa commissão, tirando da mão do escrivão de fazenda uma attribuição, que podia ser exercida facciosamente, como sendo um agente eleitoral do governo, que aliás nunca deveria ser.

Ora a lei de 1859, diz o seguinte no artigo 8.°:

(Leu.)

E no projecto o que se diz? (Leu.)

E exactamente a mesma disposição, o quasi a mesma redacção.

Pergunto, portanto, ao sr. Van-Zeller, se está ainda na mesma opinião, de que a lei de 1859 é óptima, porque sendo assim s. ex.ª tem necessariamente de approvar o projecto em discussão.

E esta a illação que se tira das suas palavras. (Apoiados.)

E note-se que respeito tanto como toda a camara, a opinião do sr. Van-Zeller em assumptos administrativos; posso dar d'isso testemunho, ainda que não sou o mais competente, mas quando tive a honra de funccionar com s. ex.ª na commissão de administração publica, tive occasião de admirar o talento de s. ex.ª em materia administrativa, não podendo nunca deixar de tomar em muita consideração a opinião de s. ex.ª; e é por isso que o seu argumento do hontem me servo exactamente para defender o projecto.

Diz o sr. Van-Zeller: «o projecto quer regular pelo decreto de 1852 os casos que se derem».

Peço aos illustres deputados os srs. Van-Zeller o Dias Ferreira, que se porventura eu for inexacto, como. o posso ser, já se vê involuntariamente, na exposição que faço dos argumentos do s. ex.ªs, os rectifiquem immediatamente, evitando-me o trabalho de combater o que s. ex.ªs não disseram.

Ora a lei o que quiz foi prevenir um caso muito excepcional, unico talvez que se tenha dado desde que existem as commissões de recenseamento.

(Interrupção que se não percebeu.)

E verdade não é unico, ha mais e logo os mostrarei, que tiveram logar, um no tempo em que era ministro o sr. Dias Ferreira, e outro o sr. duque de Loulé, sendo resolvidos por simples portarias! (Apoiados.)

Casos perfeitamente identicos resolvidos por moras portarias em quanto que o actual governo veiu aqui, respeitando o parlamento como muito bem disse antes de hontem o sr. Luciano do Castro, nos casos omissos é melhor consultar o parlamento, pedir-se-lhe providencias, do que decidir unicamente por uma portaria.'

E isto mais harmonico com o disposto no § 6.° do artigo 15.° da carta constitucional, que diz: compete ao parlamento fazer leis, interpetral-as, suspendel-as e revogal-as. Foi isto o que fez o actual governo. (Apoiados.)

Commetteu-se uma falta! Mas como é que se commetteu essa falta? Não sei, sou deputado pelo circulo do Pombal mas não tenho nada com a commissão do recenceamento, nada tenho tambem com o administrador do concelho.

Como relator da commissão de administração púbica não me compete censurar a auctoridade administrativa, nem tenho competencia para a exonerar o nomear outra. Essa questão pertence ao nobre ministro do reino, que a tratará com aquella habilidade e proficiencia que todos lho reconhecem. (Apoiados.)

Disse mais o sr. Van-Zeller:

«A camara entendeu que devia proceder á eleição, segundo o decreto do 1852.»

Quer dizer) a camara entendeu que se devia proceder á eleição, e para esse fim reuniram-se no edificio da mesma camara e mandaram vir o recenseamento; apresentou-se este, e viu-se que nenhum cidadão era classificado como um dos quarenta maiores contribuintes. Que fazer n'este caso? Ir buscar os do anno anterior, corço disseram os srs. Dias Ferreira e Van-Zeller? Era impossivel, por isso que uns podiam ter morrido, outros terem mudado do fortuna, deixando, por consequencia, de lhes pertencer tal classificação.

Mandou-se chamar o escrivão de fazenda, e, não sei se bem ou mal, constitui-se a assembléa e elegeu se a commissão.

Houve um cidadão que protestou; levou-se o recurso para o conselho de districto, o qual não podia deixar do tomar uma resolução; e, todavia, não deliberou, disse o sr. Van-Zeller.

Ora, eu peço licença para observar a s. ex.ª, que não reparou no que' a este respeito dizem, tanto o relatorio que precede a proposta do governo, como o que precede o projecto da commissão. Diz o relatorio que precede a proposta o seguinte.

(Leu.)

Como se vê, o conselho do districto não quiz approvar a eleição com o fundamento de faltar aos membros da assembléa a capacidade eleitoral, e, por consequencia, não se póde dizer que não deliberou. Resolveu annullando, o não marcou dia para a nova eleição, deixando assim de cumprir o disposto na lei de 8 de maio do 1878, por entender que não se dava a hypothese d'este artigo, visto que não havia corpo eleitoral. (Apoiados.)

Disse o sr. Van-Zeller:

«Porventura estavam exhaustos os recursos? Que fez o secretario geral? E o codigo administrativo novo?»

Mas que tem o novo codigo administrativo com um assumpto que se regula por leis especiaes? A lei do 8 de maio de 1878 diz no artigo 10.°: «O governador civil, logo que receba a acta da eleição impugnada, deferirá o negocio ao conhecimento do conselho do districto, o qual resolverá até ao dia 14 do janeiro».

N'este caso é que remette ao conselho de districto. Logo, o recurso é facultativo, o não podia deixar de o ser.

Confesso que fique admirado quando ouvi dizer ao sr. Dias Ferreira, que era um caso pendente. Não sei como tal se possa considerar. (Apoiados.)

O recurso em geral (segundo o principio de direito que s. ex.ª me ensinou na universidade) é sempre facultativo, e torna-se obrigatorio sómente para os agentes do ministerio publico quando ha violação da lei, ou é necessario salvaguardar os interesses da fazenda publica. Fora destes, casos o recurso é sempre facultativo. (Apoiados.)

E claro que n'um crime, por exemplo, que excedo cinco annos de degredo, o ministerio publico tem que appellar, a fim de salvaguardar os interesses da sociedade, representada na pessoa do individuo que foi condemnado. Podia ter-se errado, a pena era grande e por consequencia tornava-se necessario adoptar-se um meio de salvaguardar esses interesses; mas em materia administrativa o recurso é sempre facultativo, e n'este ponto appello para a opinião do sr. Van-Zeller, dignissimo ajudante do procurador geral da corôa junto do supremo tribunal administrativo. Ficam salvos, é claro, os casos em que o estado seja prejudicado ou violado o direito, por que então o ministerio publico cumprirá s seu dever interpondo o competente recurso.

Mas diz o sr. Van-Zeller: «Porque não se interpoz o recurso?» Porque não havia que interpor. E alem d'isso o recurso era facultativo, como já disse. (Apoiados.)

S. ex.ª prestaria um grande serviço ao paiz, propondo qualquer emenda que tendesse a remediar os inconvenientes que se lhe affiguraram existir no projecto, que se discute, emenda que eu não teria duvida em acceitar por parte da commissão, se me convencesse de que effectivamente existiam esses inconvenientes; mas sinceramente confesso que não os vejo. (Apoiados.)

Porque não funccionou a commissão do anno de 1877? Disse o illustre deputado.

S, ex.ª estabeleceu a similhança do que se pratica para

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os Corpos administrativos, onde se admitte á theoria de que esses corpos continuam com a mesma jurisdicção e competencia. Mas pergunto eu. Que tem o codigo administrativo com a questão de que se trata? (Apoiados.)

Torno a repetir, era impossivel apurar os quarenta maiores contribuintes, segundo a lei de 1859, por isso que pelas rasões que já indiquei, nascendo a commissão de recenseamento de uma assembléa que estava illegalmente constituida em consequencia do seu vicio de origem, não representava-o que a lei exige que ella represente. (Apoiados.)

O sr. Van-Zeller entrou depois na questão administrativa fallando largamente sobre differentes assumptos que com ella têem relação.

Não entro n'essa questão, e direi apenas a tal respeito que s. ex.ª, meu collega na commissão de administração publica, na sessão em que ella se occupou do codigo administrativo, assignou o parecer que approvou esse codigo, e por Consequência o sr. Van-Zeller do ha dois annos que responda ao sr. Van-Zeller de hoje. Em questões de familia não estro. (Riso.)

Disse tambem o sr. Dias Ferreira que o poder legislativo era chamado a intervir nos actos dos tribunaes administrativos, avocando a si processos pendentes.

Devo dizer a s. ex.ª que não houve aqui avocação de processo, porquanto o processo não estava pendente. (Apoiados.)

O recurso era facultativo, e não foi interposto pelo secretario, que estava no seu direito de o interpor ou não.

A propria palavra recurso está indicando que se póde ou não, usar d’elle; mas o governo preferiu seguir a theoria exposta pelo sr. Luciano do Castro, o vir ao parlamento pedir providencias por meio d'esta medida que se está discutindo.

Eu entendo que é melhor pedir providencias por meio de um projecto de lei, do que resolver estes negocios por portarias.

Sabe a camara como estes negocios eram resolvidos? Eu vou ler uma portaria de 1865.

(Leu.).

Foram prorogados os prasos por esta portaria. (Apoiados.)

E vou agora ler outra a que deu logar um officio do governador civil do districto da Guarda. (Leu.)

Hypothese identica: outra prorogação de prasos por meio de portaria. (Apoiados.)

Então resolviam-se estes negocios por meio de portarias, agora estranha-se que se remedeiem estes inconvenientes por meio de um projecto de lei!

O ar. Dias Ferreira disso que o governo devia respeitar a deliberação do conselho de districto, que é uma especie de tribunal da relação.

Mas pergunto ou: porventura, deixou o governo de respeitar essa deliberação?

O que resolveu o concelho de districto? Resolveu annullar a eleição o pedir providencias ao governo.

O governo tanto respeitou a deliberação d'aquelle respeitavel tribunal, que veiu pedir ás camaras a providencia que entendeu regular.

O sr. Dias Ferreira, depois de divagar pelas regiões da administração, entendeu que o conselho de districto, e n'esse ponto concordo plenamente com s. ex.ª, não devia existir tal como está, e que deviam algumas das suas attribuições especialmente as do contencioso passar pára o poder judicial, onde existe effectivamente mais independencia e saber, porque o conselho de districto tinha o vicio do origem, por isso que era obra do governador civil e por consequencia seu escravo.

Do sorte que, perdoo me o illustre deputado a, s. ex.ª rasgou a beca áquelles desembargadores de Leiria, afivelou-lhes uma cabeçada, jungiu-os depois uns aos outros, e entregou a arreata ao governador civil para os conduzir por aquella senda escabroza do contencioso administrativo. (Risadas e vozes: - Muito bem.)

Eu não quero notar contradições em s. ex.ª, que as não teve, porque uma cousa e jurè constituto, outra cousa é jurè constituendo; mas devo dizer que s. ex.ª na sua argumentação achou aquelle tribunal muito respeitavel, e depois esquecendo-se talvez do que tinha dito primeiro, disse que elle não podia ser respeitado, porque tinha o vicio da origem. (Apoiados.)

O que assustou os illustres deputados foi o artigo 2.º do projecto que diz: é o governo auctorisado. Apenas leram este artigo disseram aqui ha mistério. Mas não ha nada d'isto.

É o governo auctorisado a quê? A quê, sempre que na operações de recenseamento deixarem de ser effectuadas no tempo marcado, possa abrir para ellas novos prazos; mas de modo que essas operações sejam concluidas até 30 de junho.

Se houver recursos para o poder judicial o levarem muito tempo a decidir para isso é que o projecto altera os prasos, mas com a restricção do que as operações eleitoraes estejam concluidas até ao dia 30 de junho.

S. ex.ª fallou de casos omissos, e disse que era inutil vir para o parlamento, e que melhor seria ir para o supremo tribunal administrativo.

Eu não pude perceber quaes eram os casos omissos e os direitos adquiridos a que s. ex.ª se referiu!

Caso omisso é aquelle para que não ha lei. O sr. Dias Ferreira, um dos mais distinctos, senão o mais distincto jurisconsulto portuguez, sabe perfeitamente que os direitos provem: 1.°, da propria natureza do homem; 2.°, do facto e vontade propria, independente da cooperação de outrem; 3.°, do facto e vontade propria, e do outrem conjunctamente; 4.°, do mero facto de outrem; e 5.°, finalmente, da mera disposição da lei.

Ora, é claro, que no caso que se discute a questão refere se aos direitos pessoaes, que são os provenientes da 5.º origem das que ficam expostas, porque as outras quatro respeitam ao antigo jus in re.

Se o caso omisso se dá por falta de lei, como póde haver direitos adquiridos quando não ha lei d'onde provenham? Naturalmente ha falta de comprehensão da minha parte, mas não pude perceber o que s. ex.ª quiz dizer. Eu tomei apontamento das palavras de s. ex.ª; o illustre deputado disse: «Ha casos omissos, é necessario salvar os direitos adquiridos.» Não percebo.

Não desejo alongar a discussão. Peço desculpa á camara do tempo que lha roubei, e agradeço-lhe a benevolencia com que me tratou, o poço ao sr. Dias Ferreira o ao sr. Van-Zeller desculpar-se, porventura, fui inconveniente em alguma phrase, pois ella foi devida do corto ao calor que tomei na discussão, no desempenho e cumprimento do meu dever em sustentar este projecto.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Na commissão de administração assignei vencido o parecer que se discute. Escuso da declarar a v. ex.ª e A camara que esta circumstancia, muito especialmente n'um projecto d'esta natureza, não podendo significar opposiçâo politica ao goxerno, e muito menos desejo do me pôr em contradicção com os membros da commissão de que tenho a honra do fazer parte, significa realmente a convicção intima o profunda em que me encontro, de que este projecto é absolutamente inutil para o presente, o altamente inconveniente para o futuro.

Para Pombal dispensa-se e em o dispensar ha vantagem; e me medida futura e providencia geral, o projecto é illegal, é pessimo e absurdo.

Eu fallo, não o occulto nem disfarço, principalmente para o meu, antigo e nobre amigo o sr. Antonio Rodrigues

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Sampaio. Se eu tiver a fortuna de o convencer da inconveniencia do actual projecto, se s. ex.ª concordar em que elle volte á commissão para ser de novo considerado, tenho esperança de evitar á camara uma responsabilidade que lho não póde do fórma alguma ser agradavel nem gloriosa, e a meu ver não é pequena a responsabilidade em que incorrem todos os que, tendo algum conhecimento dos principios geraes de direito, approvem o actual projecto, que se encarrega de contrariar absoluta e radicalmente esses principios.

Para ser justo devo declarar á camara que na minha opinião o nobre ministro do reino teve no actual projecto tanta iniciativa e tanta responsabilidade, como eu tenho ou como tem qualquer dos meus illustres collegas que impugnam o parecer.

Vê-se perfeitamente que isto é prenda de secretaria, um d'aquelles mimos com que os empregados superiores ou inferiores costumam brindar os ministros, dispondo da sua excessiva condescendencia, para, a pretexto de se remediar um inconveniente que se lhos afigura grave, mas que é apenas imaginario, obrigarem os conselheiros da corôa a affirmar no parlamento a sua fecundidade legislativa e as vantagens da iniciativa ministerial.

Peço a v. ex.ª o favor de me informar, se o nobre ministro do reino acaba de pedir a palavra.

O sr. Presidente: — Sim, senhor.

O Orador: — Naturalmente s. ex.ª sacrifica-se o vae tomar toda a responsabilidade do projecto, talvez mesmo a de o ter meditado e de o ter redigido!

Já estou habituado a essas praticas, já sei o costume do nobre ministro do reino; é um systema que eu deveras lamento. Já aqui fez o mesmo em relação a umas celebres portarias, que altamente o comprometterem, e que teriam compromettido completamente a justa reputação que o sr. Antonio Rodrigues de Sampaio conquistou á custa dos seus incontestaveis e superiores merecimentos, (Apoiados.) se acaso essa reputação não estivesse inabalavelmente firmada na opinião de todos os homens intelligentes d'este paiz, que professam pela intelligencia o pelos meritos de s. ex.ª um verdadeiro culto, o maximo respeito, a maior admiração. (Apoiados.)

Deixe o sr. Sampaio a outros e triste recurso d'estas malicias parlamentares; não assuma responsabilidades que não tem, que não póde ter; não cubra com o seu nome um descuido de secretaria, que, se não comprometto, protesta contra o justissimo prestigio de um nome respeitavel e justamente respeitado.

Este projecto não póde ser feito, não póde ter sido escripto pelo sr. Antonio Rodrigues Sampaio, que, meditando cinco minutos no assumpto, reconheceria immediatamente a inconveniencia d'estas disposições em relação ao futuro, o a sua absoluta inutilidade com relação ao caso de Pombal.

Não é, nem póde ser este projecto, do sr. Antonio Rodrigues Sampaio.

Por mais que s. ex.ª proteste, mais alto que todos os protestos politicos, mais forte que todo o sacrificio official do illustre ministro, protesta em sentido contrario a intelligencia privilegiada o verdadeiramente superior que todos reconhecem no cavalheiro que actualmente gere a pasta do reino. (Apoiados.)

Eu digo o que sinto,. E bem sei que n'esta parte não faço discurso politico de opposição, o que pouco me imporia quando faço e quero fazer justiça a quem a merece.

Vou analysar o projecto tal qual está; primeiro em relação ao caso importantissimo de Pombal, que o nobre ministro do reino teve a bondade de declarar que remediaria por qualquer outro modo, se por acaso alguem lhe fornecesse meio de dar remedio á calamidade que está soffrendo aquelle innocente e exemplar concelho, que tanto se interessa pelas operações de recenseamento, que as executa com tanta perfeição e que as fiscalisa com tanto cuidado e zêlo!

Mas em primeiro logar seja-me licito perguntar ao nobre ministro do reino que calamidade publica é esta e que inconveniente póde resultar para o paiz d'este simples caso pombalense?

Está, porventura, a patria em perigo?

Corro, por acaso, grave risco a administração geral do paiz?

Agita-se a nação e perturba-se a ordem publica? Nada d'isto vejo, o se por acaso o concelho de Pombal ficasse um anno sem recenseamento, pela unica e simples rasão de não ter querido fazel-o, esquecendo ou infringindo voluntariamente, de proposito ou sem proposito, as disposições legaes cujo cumprimento basta a todos os concelhos, e bastaria a Pombal para ter recenseamento, não sei que isto seja motivo para fazer lei nova a Pombal, quando apenas o póde ser para lhe fazer applicar as disposições legaes anteriores, que punem a negligencia, a omissão, ou a fraude, todas as vezes que ao cumprimento da lei se substituo o arbitrio.

As leis não se fazem para as cumprir só quem as quer cumprir. É, creio eu, para serem respeitadas e cumpridas obrigatoriamente; e a este principio convem não substituir legislativamente o principio opposto, no qual se baseia o projecto em discussão.

Dar a um concelho o que elle teria e não podia deixar de ter, se cumprisse a lei que era obrigado a cumprir, é principio novo e original, que o meu voto não sancciona, nem o meu silencio auctorisa.

Acresce ainda que o remedio, se fosse justo, seria inutil. Este parecer está a discutir-se em epocha em que, pela sua inversão em lei, não ha já o tempo para marcar os prasos, de fórma que o recenseamento esteja completo, como deveria estar, até 30 de junho. Logo que haja recurso, não ha tempo, e, portanto, a lei é completamento inutil para Pombal.

Mas como se passaram os factos em Pombal? Devemos sabel-o.

E notavel que um caso a que se quer dar e dá tanta importancia, que para elle se faz lei especial, não viesse acompanhado de uma copia ou do uma amostra do recenseamento do Pombal.

Dizem que no recenseamento de Pombal não se designou quaes eram os quarenta maiores contribuintes. Eu pergunto: que faltava no recenseamento de Pombal? Era apenas, na casa competente, a designação ou á classificação de certos e determinados individuos, como maiores contribuintes?

Era isto o que apenas faltava no recenseamento do Pombal, ou é mais alguma cousa?

O sr. Visconde do Rio Sado: — V. ex.ª sabe que, como ordena a lei de 1859, não se abriu uma casa para n'ella se inscrever a classificação de «maior contribuinte.»

O Orador: — Portanto veja a camara tudo o que faltava no recenseamento de Pombal: toda a falta resume-se em não abrir a casa competente para a inscripção ou declaração dos maiores contribuintes, ou, tendo a casa aberta, em não escrever n'ella quaes oram esses maiores contribuintes.

O sr. Adolpho Pimentel: — Essa é que e a questão toda.

O Orador: — A questão lhe mostro ou, o não ha de tardar muito. A casa que falta ou aquella em que se não escreveu, é uma casa especial em que pela lei de 1859 se escrevem unicamente as palavras: «maior contribuinte», por extenso, ou as iniciaes «M C.»

Eu tenho visto muitos recenseamentos. Actualmente sou presidente de uma camara municipal, cuja administração anterior o desde muitos annos póde servir de exemplo e de modelo. E n'estas questões não venho fazer philosophia, emprego argumentos.

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Estas questões silo praticas, o eu, se pelos meus estudos o habilitações scientificas tenho competencia para interpretar as leis theoricamente, tenho alem d'isso o principalmente a pratica de ler intervindo em recenseamentos o do os conhecer ha muito tempo.

Pela lei de 1859, ha em todos os recenseamentos uma columna,. onde se inscreve em relação a certos individuos, á designação do «maior contribuinte.»

O sr. Filippe de Carvalho: — Não ha.

O Orador: — Vamos a ver se ha ou não ha para o sr. Filippe de Carvalho. Para mim ha e tambem ha de haver para v. ex.ª (Riso.) que eu muito respeito e com quem tenho a infelicidade de estar quasi sempre em desaccordo.

Eu vou ler, e em voz alta, o artigo da lei de 1859, a que me referi, e depois passo o ás mãos do sr. Filippe de Carvalho, para s. ex.ª se certificar de que eu li bem: «§ 1.° do artigo 7.° Para esse fim (para recensear os quarenta maiores contribuintes) se abrirá mais uma casa no livro do recenseamento original, e se tirará uma copia que se affixará com a dos eleitores o elegiveis na porta da igreja.»

Aqui tom o sr. Filippe de Carvalho a lei, para por leitura propria se desenganar de que ha o existe o que eu affirmei.

É esta a falta que existe no recenseamento de Pombal e que o sr, ministro do reino quer reparar por meio de lei especial.

Não haveria outro meio, simples, facil, legal e intuitivo?

Não haveria outro remedio? Então para que serve o § 1.° do artigo, 29.° do decreto do 1852, que manda inscrever expressamente em relação a todos os recenseados a quota da sua contribuição? A questão é saber isto, e não 0 tratar questões juridicas, praticas e de lei expressa, como quem está a fazer, versos. (Riso.)

O decreto eleitoral do 30 de setembro de 1852, no artigo 29.° § 1.º diz: No dito livro adiante de cada nome se abrirão casas, nas quaes se designe: 1.º a quota de decima ou contribuições que paga o recenseado.

Se no recenseamento de Pombal, argumento eu, apenas falta, como acaba do ser declarado pelo digno relator da commissão, a casa especial em que apenas se escrevem as iniciaes = M C = ou as palavras = maior contribuinte =, forçosamente existe a outra casa em que, por simples inspecção, necessariamente se encontram as quotas de contribuição que paga cada um dos cidadãos inscriptos no mesmo recenseamento. E se em harmonia com essas collectas e com fundamento n'ellas e que na casa especial se faz a classificação, de = maior contribuinte --ó de primeira intuição, que, encontradas n'uma casa as quarenta maiores collectas dos bens no concelho, estão por força encontrados os quarenta maiores contribuintes.

(Interrupção)

Os que estão fóra do concelho não sorvem para eleger no concelho, o isto é lei expressa. Dispensem a imaginação e leiam as leis, se querem interromper-me com algum fundamento.

Realmente, sr. presidente, é preciso ver bem o que fazemos, e como queremos legislar.

Eu chamo ás cousas pelo seu nome, e quero ver se poupo a camara á vergonha de votar uma lei d'esta ordem; e, se não puder poupar a camara, hei do poupar-me a mim, porque, esteja eu o tempo que estiver na vida publica, ha alguma cousa que quero salvar, e como a trouxe quero levar d’aqui sem que fique compromettida; é o conceito que me não custou pouco a adquirir, tanto no foro como em trabalhos juridicos, é uma certa reputação de examinar as questões com reflexão e alguma intelligencia, e de as avaliar com certa clareza de entendimento.

(Aparte.)

Eu deixo todas as vantagens de tal modestia a quem as appetecer e quizer tomar para si. Para mim não ha modestia que me obrigue a declarar-me ignorante ou imbecil quando tenho a convicção do que o não sou, o a obrigação do e não ser. (Apoiados.)

O que faço é deixar a todos que me escutam a maxima liberdade de me condecorarem com a classificação que a mim proprio não confiro e contra a qual protesto. (Riso. Apoiados.)

Voltemos ao assumpto. No recenseamento do Pombal falta apenas a declaração de maiores contribuintes, mas estão as collectas relativas a cada um dos recenseados. O conselho de districto invocou portanto um pretexto especioso e falso, um motivo verdadeiramente contraproducente para decidir como decidiu, porque o recenseamento contem todos os elementos para se conhecer o declarar quaes eram os maiores contribuintes, embora faltasse a declaração privativa na casa especial.

A designação dos quarenta maiores contribuintes não tem logar em janeiro, faz-se em virtude do recenseamento que anteriormente fica ultimado em 30 de junho, para servir do 1.° de julho em diante.

Á organisação d'este recenseamento assiste o administrador do concelho.

O recenseamento é publicado, e tem as reclamações abertas e patentes a todos.

O administrador do concelho, assistindo á organisação do recenseamento, no qual faltava a designação de maiores contribuintes, tinha não só o direito mas a obrigação do recorrer todas as vezes que visse que não se cumpria a lei. (Apoiados.)

O que fez' aquelle administrador de concelho? Viu, o não podia deixar de ver, porque assiste a estas operações, porque é fiscal, porque tem obrigação de fiscalisar, (Apoiados.) porque para isso, para velar pelo cumprimento da lei é nomeado pelo ministro do reino, porque para isso é que a camara municipal lhe paga; o administrador viu, que o recenseamento se fazia sem uma formalidade legal, e, apesar de não só poder recorrer mas tambem ter obrigação do recorrer, todavia não recorreu, antes consentiu e concordou na falta que hoje se argue.

E a auctoridade que n'esta falta consentiu e d'ella tomou toda a responsabilidade, seis mezes depois de estar em vigor o recenseamento, que tinha sido principiado um anno antes, vem recorrer para o conselho do districto com o pretexto do que o recenseamento não designava quaes eram os maiores contribuintes.

(Interrupções que não se perceberam)

Se o recurso não foi interposto pelo administrador do concelho, e foi motivado pelo protesto de um eleitor, é isso indifferente em relação á importancia juridica do facto e a minha argumentação fica sendo a mesma, porque o administrador do concelho é o delegado do ministerio do reino, e sobre o governo, responsavel pelos seus agentes, pésa toda a responsabilidade.

Em todo o caso, o administrador do concelho tendo deixado de fiscalisar o recenseamento, entregou-o assim ao conselho de districto, onde o secretario geral exercia a qualidade do fiscal; e o conselho de districto em vez de mandar devolver o recenseamento tal qual estava feito, deixando a quem competia as designações que n'elle faltavam e eram faceis de supprir pela simples inspecção das collectas do cada recenseado, resolveu invadir attribuições alheias e annullar a eleição por illegitimidade dos eleitores, e ao mesmo tempo declarar a impossibilidade em que estava para resolver por quem havia de ser feita a nova eleição.

Não tem, porventura, o recenseamento prasos marcados dentro dos quaes póde contra elle reclamar-se, e, findos os quaes, toda a reclamação é impossivel? Não é principio estabelecido que no acto eleitoral vota quem está inscripto no recenseamento ainda que devesse não ter sido inscripto em tempo?

E não é este, do certo, o unico caso em que se acceita o

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recenseamento lai qual se acha, porque contra elle se não reclamou na epocha propria.

Para que se foi ferir arbitrariamente um principio até hoje fixado por lei e pela pratica constante? Pois, se o recenseamento ha de servir para o mais, porque não ha do servir para o menos?

Dizia-se que não havia no recenseamento a declaração do quaes eram os maiores contribuintes. Já mostrei que estando no recenseamento descriptas as quarenta maiores collectas, estavam ipso facto affirmados os quarenta maiores contribuintes, embora lhos faltassem as letras M. C. ou as palavras Maior contribuinte.

M.13 suppondo, que não havia nada d'isto; que devemos abandonar a pratica invariavel; que estamos encarregados do inverter todos os principios de direito até hoje conhecidos: suppondo quanto quizerem suppor, as operações do recenseamento fazem-se em todos os concelhos, podendo reclamar contra ellas todo o cidadão eleitor; houve o maior cuidado em facilitar o recurso; impoz-se obrigação de reclamar á auctoridade administrativa; ha penas estabelecidas para áquelles que não cumprem o seu dever; por isso, para se dar um caso d'esta ordem, o que será preciso? E preciso, é indispensavel que as auctoridades se combinem para infringir a lei ou deixar de a cumprir, e que todos os eleitores do concelho se congreguem na culpa ou na indiferença para deixarem de exercer um direito ou uma iniciativa que pela lei não só lhes é facultada, mas cujo exercicio se lhes tornou o mais facil possivel.

Se apparecer um concelho n'estas condições, em que a auctoridade não quer cumprir a obrigação imposta por lei, e em que ao mesmo tempo todos os eleitores não querem exercer um direito, a consequencia necessaria, justa e logica não é que um ministro qualquer, o actual ministro do reino, ou outro, se encarregue de apresentar ao parlamento uma lei especial para sanar os defeitos que resultam, não da lei anterior, mas exclusivamente da violação ou não cumprimento d’essa lei que existia: a consequencia unica é punir a infracção, ou a negligencia.

Pois não é principio de direito geralmente reconhecido que a ignorancia da lei a ninguem aproveita?

Queremos nós inverter este principio verdadeiro no principio opposto de que a violação da lei aproveita tanto como o seu cumprimento?

É a isto que nos conduz o systema do projecto.

Um concelho não cumpre a lei, e o sr. ministro do reino encarrega-se, por uma lei especial, de lho facultar os mesmos direitos que esse concelho teria se tivesse cumprido a lei, que arbitrariamente violou!

Isto não póde ser, é absurdo e altamente immoral.

Eu disso na commissão, em breves palavras, que não viria mal nenhum, nem perigo de nenhuma especie, ao paiz se o concelho do Pombal ficasse um anno som revisão do recenseamento, quando a culpa tinha sido tanto das auctoridades como dos eleitores do Pombal: disse que me parecia mais justo punir os culpados d'este facto do que revalidar as faltas ou violações da lei praticadas por elles. Alem d'isso, não havia perigo nenhum para o concelho de Pombal, porque o recenseamento anterior vale emquanto não estiver prompta, acabada e legal, a revisão que constituo o recenseamento seguinte.

Esta pratica tem sido geralmente seguida. E a doutrina do todas as portarias do governo, portarias que pouco me importam quando eu considero qualquer assumpto como deputado, ou quando elle é considerado perante os tribunaes judiciaes; é tambem a doutrina que tem sido adoptada aqui, n'esta casa, em relação á eleição de deputadas, todas as vezes que se demonstra não existir, ou não se ter ultimado, a revisão do recenseamento.

A prorogação das funcções nas corporações electivas tem sido adoptada na lei, e ninguem duvida de que essas corporações exercem as suas funcções até que legalmente são substituidas.

Portanto, se não podiam fazer a eleição da commissão do recenseamento, lá tinham a commissão do recenseamento anterior; mas era facil fazel-a, ou antes, estava feita pela simples inspecção das maiores collectas, como demonstrei ã v. ex.ª e á camara, e encontrava-se logo que se procuras, sem, em vez da designação do maiores contribuintes, ás maiores collectas descriptas no recenseamento.

Preferiram trazer a lei nova e provocar esta discussão, impertinente e inutil; ahi lêem o que é, esta proposta, que se não recommenda para honra, para proveito, nem para gloria, a nenhuma, assembléa legislativa!

Agora o segundo artigo, do projecto, esse o verdadeiramente fabuloso!

Não só querem remediar no concelho, do Pombal a falta commum do que são cumplices as auctoridades e todos os eleitores, mas pretendem ainda auctorisar em relação á todos os outros concelhos do paiz á facilidade de violar á lei!

Em vez do se lhes, fazer cumprir e executar á lei, em voz do se lhos dizer que é preciso, concluir estás operações nos prazos fataes, diz-se-lhes que não correm o menor risco, porque o governo, está prompto a conceder, como bulias sanatorias, novos prasos e facil o prompto remedio.

Este artigo é simplesmente um incentivo, um convite á todos os concelhos do paiz para que deixem, de fazer ás operações dos recenseamentos nos prasos que a lei marca, e que ella considera necessarios o fataes; é uni convite á todos os concelhos para não fazerem caso da legislação vigente, afirmando-lhes a caricatura da penalidade estabelecida.

Pois isto não é o mesmo que declarar a todas as commissões de recenseamento do paiz que quando não quizerem cumprir a lei o governo está prompto a dar-lhes a lei nova?

As leis eleitoraes tanto, do 1852 como de 1859 impõem penas aos que não cumprem as suas disposições, o pergunto, é justo, é racional, vir o governo dizer ao paiz inteiro: «ha uma lei que estabelece penas para quem não fizer certas operações eleitoraes n'um dado praso, mas aqui está outra lei para quem quizer infringir a primeira: em vez da penalidade eu disponho da revalidação dos actos como premio á illegalidade».

Digam o que disserem, procurem evasivas ou subterfugios, esta contradicção de leis e de principios é uma vergonha publica.

Veja bem a camara o que vota, e veja principalmente o sr. ministro do reino o que quer que ella voto. Para impor taes votos é necessario tratar com muito desamor uma maioria que, na minha opinião, deve merecer ao governo grande consideração. A maioria é grande pêlo numero, e maior pela dedicação ao governo. Não os censuro por isso; pelo contrario, felicito-os reciprocamente; parece-me, porém, que é tratar com ingratidão, desamor, e pouca consideração a maioria, obrigal-a a votar uma medida de que não ha exemplo em annaes parlamentares.

O sr. ministro do reino deveria ter remorsos do obrigar a maioria a votar similhantes principios do direito e de administração.

O sr. Adolpho Pimentel: —A maioria não sé queixa.

O Orador: — Tambem eu ainda não disso que a maioria se queixasse, riem mesmo affirmei que o voto lhe custasse muito, e com isto respondo ao sr. deputado que me interrompeu.

O sr. Adolpho Pimentel: — V. ex.ª disse que o projecto era uma vergonha, e isso é uma censura que faz á quem o approva, o é uma vergonha para a commissão.

O Orador: — O illustre deputado veiu á está casa tarde pára ensinar a fallar quem é mais antigo; e se tivesse vindo mais cedo, creio que o resultado, sem differença sensivel, seria o mesmo.

O sr. Adolpho Pimentel: — Póde ser.

O Orador: — Não é póde ser; era o mesmo com cer-

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teza. Não se metta nunca a imaginar offensa pessoal na analyse generica de uma lei que vão votar-se. Não se faz isso em parlamento algum. Ha um sentimento pessoal que obriga as pessoas que têem os conhecimentos do illustre deputado a proceder de modo diverso.

Nunca receiei questões pessoaes, mas não admitto que se queira considerar pessoal o que estou tratando debaixo do ponto scientifico e juridico; e digo o repito que scientifica o juridicamente são uma vergonha disposições d'esta ordem.

N'um paiz em que houvesse e fossem lidos jornaes de jurisprudencia, como acontece em França, o governo que apresentasse esta lei e a camara que a votasse estavam ir remissivelmente perdidos no conceito publico, porque ninguem contraria impunemente os principios da justiça e da rasão humana, nem os principios absolutos de uma sciencia qualquer.

E cousa que só diga ou que se legislo impunemente, a par de uma lei que tem prasos fataes para o cumprimento de certas obrigações com sancção de certas penas, vir com outra lei dizer; aquém não quizer cumprir a primeira, aqui tem a segunda», pela qual a primeira não existo, ou existo só para ser violada e escarnecida?

Pois o que é isto? E, ou não é, um convite a quem não quizer cumprir a lei a que deixe de a cumprir? Isto não é vergonhoso para todos que; leviana ou impensadamente, acceitarem similhante doutrina? Eu entendo-o assim; o tanto que queria desviar o nobre ministro do reino, meu antigo amigo, da responsabilidade pessoal de similhante obra. Entendam os outros o que quizerem. Eu digo a minha opinião, não a sua.

E para que se faz isto? Para que se quer legislar o absurdo, quando a medida, longo de util, é da mais absoluta inutilidade, porque todas as vezes que em um concelho qualquer, abertas as operações da revisão do recenseamento, a auctoridade cumprir o seu dever, ou qualquer eleitor, um só eleitor, quizer usar dos recursos que pela lei lho são facultados e facilitados, é absolutamente impossivel darem-se factos iguaes ou parecidos com aquelle de Pombal a que se refere este projecto do lei?

E haverá, ou não haverá, alguma rasão politica para que o nobre ministro do reino devesse ser o primeiro a oppor-se á votação d'este projecto? Digo á camara sinceramente que julgo haver, pois creio que a votação de um projecto d'esta ordem póde trazer graves complicações.

Sr. presidente, nós todos, os que tomámos parte nas luctas eleitoraes, todos sabemos que as commissões de recenseamento hoje são a unica garantia seria o importante que têem os eleitores de um circulo qualquer. Para resistir ás pressões, violencias e a quaesquer outros excessos do poder, empregados pelas auctoridades, a commissão de recenseamento é a unica garantia seria e importante que habilita ainda hoje os circulos a reagir, ou antes, a eleger. (Apoiados.) Se entregarmos a formação das commissões de recenseamento á auctoridade ou á influencia do governo, e tanto me refiro agora a este governo, como a qualquer outro que possa ámanhã estar rio poder e a que eu preste o meu apoio, entregamos ipso facto á auctoridade administrativa, a unica garantia que ainda tom a liberdade eleitoral n'este paiz.

N'este caso do Pombal, eu não tenho conhecimento da localidade, nem da especialidade dos factos, mas parece-me descobrir, sem difficuldade de investigação, indicios que justificam os receios que ou venho do expor á camara. Desde que a classificação dos maiores contribuintes é feita pela commissão de recenseamento com os mesmos recursos estabelecidos na lei para todos os eleitores e elegiveis, quando a. commissão do recenseamento desattendo qualquer reclamação justa, o recurso é para o poder judicial, é para o juiz do direito, para a relação do districto e d'ahi para O supremo tribunal de justiça. Por consistência em relação á capacidade eleitoral o recurso está sempre estabelecido de fórma que offerece garantia a todos os partidos e a todas as parcialidades; mas em relação á eleição da commissão de recenseamento, apesar dos nossos esforços no anno passado, não ha recurso para o poder judicia; o recurso é para os conselhos de districto, corporações em regra tão independentes como imparciaes, que todos os meus collegas conhecem, e que eu não quero offender nem defender, {prescindindo de discutir a conveniencia da applicação do certos adornos com que o illustre relator da commissão justa ou injustamente os minoscou.

(Interrupção do sr. Visconde do Rio Sado)

As cabeçadas foram lembradas pelo illustre deputado n'uma imagem que póde ser propria ou impropria, mas que em todo o caso é feliz.

A respeito da eleição das commissões do recenseamento, o recurso é para o conselho de districto, e do conselho do districto para o supremo tribunal administrativo.

E aqui vejo em talvez veja mal, como póde explicar se que não tendo em Pombal reclamado ninguem, nem auctoridade nem eleitor, contra a falta de designação dos maiores contribuintes, reclamação que a ter sido feita seria necessariamente julgada pelo poder judicial, poder imparcial o independente, descobriram tardo o a más horas meio do requerer, quasi um anno depois, não da falta de designação, mas da, illegalidade da eleição da commissão. do recenseamento, confundindo-se de proposito a capacidade eleitora! com a legalidade do acto eleitoral.

Eu não vejo outro meio do explicar este phenomeno. Podiam recorrer legalmente para o poder judicial: ninguem recorreu, os mezes passaram, e todos citavam concordes e contente.

Decorre quasi um anno.

Recorre-se para o conselho do districto, que acceitou o recurso o que o julgou, quando era absolutamente incompetente para o acceitar e julgar.

Disse que o julgou; elle não julgou, aquillo não é julgar o tribunal nenhum julga d'aquella fórma: o conselho do districto não julgou, o conselho de districto destruiu, suspendeu, impediu, sustou, impossibilitou absolutamente a organisação da commissão de recenseamento. Pois isto é julgar? Nunca foi. Destruir o que está, e decidir que nada fica, nem póde fazer-se; declarar-se simultaneamente competente para destruir e incompetente para substituir o que estava feito, é do um lai desproposito que ninguem o encobre a pretexto de julgamento.

E este é para mim o ponto gravo da questão. Aqui está a liberdade eleitoral á mercê das auctoridades e corporações administrativas.

O conselho do districto do Leiria, a pretexto de julgar a eleição, julgou a qualidade dos eleitores; em vez de apreciar o acto eleitoral da commissão de recenseamento, julgou a capacidade eleitoral dos quarenta maiores contribuintes, capacidade por lei expressamente reservada ao julgamento do poder judicial.

Aqui tem a camara e o governo a rasão, porque o conselho do districto não descobriu em si competencia para edificar; era simplesmente porque tambem a não tinha para destruir e apesar d'isso destruirá.

O conselho de districto não podia admittir o recurso ou protesto, e muito menos attendel-o.

A qualidade de eleitor, de elegivel, do maior contribuinte, em caso algum póde ser apreciada o menos decidida pelo conselho de districto. Esta é a lei.

O fundamento do protesto era já risivel. Appello para o digno relator da commissão, distincto peles seus conhecimentos, e que tom funccionado como juiz em diversos annos, e sempre muito distinctamente, na comarca de Lisboa. Pôde alguem admittir que seja admissivel o protesto para ser julgado e decidido como decidiu o conselho do districto? Admitte-se em algum tribunal alguem allegar como direito a sua propria culpa? Alguém que possa oppor aos direitos alheios a sua propria illegalidade, o seu acto commettido com manifesta infracção do lei? Pois o que é isto?

Sessão de 21 de março da 1879

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A lei tinha sido infringida no Pombal na organisação do recenseamento, não só pela auctoridade administrativa, mas por todos os eleitores daquelle concelho: a auctoridade porque tinha obrigação de reclamar e não reclamou, e eleitores porque podiam reclamar; e nenhum o quiz fazer Vem depois, um d'elles, um dos cumplices, seja auctoridade ou um dos eleitores, dizer: «Reclamo agora contra a omissão ou illegalidade em que consenti». Quem admitte tal protesto ou reclamação? Quem a admitte, principalmente, quando, em assumpto reservado ao poder judicial, passaram ha muito os prasos estabelecidos para se interpor o recurso? Existem para isto 03 conselhos de districto.

Não póde ser. Não ha tribunal algum no mundo que julgue por esta fórma. Mas, quando dispensássemos o primeiro inconveniente, que é já grande e enorme, vinha o segundo. Pois, porventura, é julgar, dizer. «Eu annullo o que se fez o declaro que não sei o que se ha de fazer»? E absolutamente absurdo, é impossivel. Se, por acaso, o conselho de districto dissesse: «Annullo esta eleição da commissão do recenseamento; sirva a anterior ou outra que seja composta pelas maiores collectas, se o não póde ser pelas letras ou pela designação escripta na casa especial»; então o conselho julgaria, bem ou mal, na minha opinião illegalmente, mas, em todo o caso, tinha julgado. Agora, com a resolução que tomou, fez tudo, menos julgar. E, se continuar por esta fórma, não poderá protestar contra a justiça ou a conveniencia da applieação, a que se referiu o digno relator da commissão.

Resumindo, eu creio que votar esta lei, e chamo para este ponto a attenção do nobre ministro do reino, não dá remedio algum a Pombal.

E mesmo não ha risco algum em relação ao Pombal, deixando de reparar a falta em que elles incorreram. Eu não creio que tenhamos proximas eleições; mas ainda que as haja podem fazel-as pelo recenseamento anterior. E isto o que é valido e regular. A doutrina do projecto em relação aos outros concelhos é um pessimo precedente; é auctorisal-os a violar a lei ou dispensal-os do seu comprimento pela certeza que se lhes dá de que tem um remedio n'esta santa igreja ministerial, onde eu não desejo ver remedio que possa influir em eleições principalmente em relação á commissão de recenseamento.

Sobretudo não desejava, francamente o declaro, que figurasse na legislação do paiz, e assignada com o nome do meu antigo mestre e amigo o sr. Rodrigues Sampaio, uma lei de similhante natureza.

Declaro que não me anima n'esta questão intuito algum politico, e desejaria que o projecto voltasse á commissão. Voltará se o nobre ministro entender que deve voltar, mandando vir tambem o recenseamento de Pombal, que ninguem ainda viu, bem como o accordão do conselho de districto, por isso que são elementos indispensaveis para se poder apreciar bem este assumpto.

Todavia, apesar da minha declaração franca, tendente a tirar a este assumpto todo o caracter politico, não proponho que o projecto volte á commissão; qualquer dos illustres membros da maioria o fará, se o sr. ministro como já disse o julgar conveniente.

Vou terminar declarando que é sempre com pezar e sentimento que me separo dos meus illustres collegas da commissão, onde conto amigos, alguns collegas desde largos annos, e outros entre áquelles que formam pela primeira vez parto d'ella, nos quaes eu reconheço o maior merecimento. E n'este numero folgo de incluir o sr. Adolpho Pimentel, cuja recente irritação nada me incommoda. Eu gosto de temperamentos irritáveis, e estimo que s. ex.ª manifestasse um defeito, se defeito é, no qual eu incorri por muito tempo n'esta casa, e de que ainda não posso julgar-me completamente isento.

Se é defeito, como é meu, estimo as pessoas que n'elle me acompanham; direi, porem, ao illustre deputado que a experiencia lho ha de abrandar depressa o animo, e fazer-lhe descer bastante a temperatura do sangue. (Riso.)

Não faço com isto mais do que communicar-lhe o resultado da experiencia em mim feita.

Não sei se depois terá mais ou menos vantagem nas discussões e mesmo na cordialidade de relações com os seus collegas; em todo o caso é esta uma consequencia fatal da acção do tempo o da pratica parlamentar.

Se eu não desejava contrariar a commissão, a que me honro de pertencer, muito menos queria desgotar o nobre ministro do reino, que ha muito tempo o por todos os titulos eu respeito.

A lucta não nos é desconhecida e ambos para ella tomos propensão. A luctar tomámos relações, e eu considero-o e respeito-o ainda como meu mestre.

Confesso que do pouco que sei hoje, deve-lhe a maior parte.

Com saudade recordo sempre a epocha já distante, em que eu, não tendo ainda entrado na vida politica o sentindo até decidida disposição para não entrar n'ella, sustentei na imprensa a respeito de um ponto de direito publico constitucional, larga discussão com o sr. Sampaio, que eu não tinha ainda a honra de conhecer.

Bem depressa tive de reconhecer á minha custa o risco a que me tinha sujeitado, medindo-me com tal adversario. Tive de estudar, e estudei quanto podia, e tudo foi preciso, se não foi pouco ainda. Melhor que qualquer outro posso eu avaliar os vastos recursos de tão esclarecida e privilegiada intelligencia.

D'ahi resultou para mim, com a amisade do sr. Sampaio que eu muito aprecio, grande e muito proveito que agradeço sempre muito e muitissimo ao meu antigo mestre, actual ministro do reino.

Tenho dito.

O sr. Ministro da Marinha (Thomas Ribeiro): — Mando para a mesa duas propostas de lei que deviam ser apresentadas pelo nobre presidente do conselho de ministros e ministro da guerra, mas s. ex.ª está na outra casa do parlamento, e pediu-me para eu as apresentar.

Referem-se á fixação da força do exercito para o anuo economico proximo.

São as seguintes:

Proposta de lei n.º 90-E

Artigo 1.° A força do exercito é fixada, no corrente anno, em 30:000 praças de pret de todas as armas.

Art. 2.° Será licenciada toda a força que poder ser dispensada sem prejuizo do serviço.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 18 de março de 1879. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello.

Proposta de lei n.º 90-F

Artigo 1.° E fixado em 2:000 recrutas o rosto do contingente para o exercito no anno de 1878, distribuidos pelos districtos administrativos do continente do reino e ilhas adjacentes.

§ unico. Do mesmo modo serão exigidos e distribuidos mais 10:800 recrutas em que é fixado o contingente do anno de 1879, sendo 10:000 recrutas destinados para o serviço do exercito e 800 para o da armada.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 18 de março de 1879. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = Thomás Antonio Ribeiro Ferreira.

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Mappa da população legal dos districtos administrativa do

reino e ilhas adjacentes, apurada no censo de 1 de janeiro de 1864

“Ver Diario Original”

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 18 de março de 1879. = O director geral, D. Antonio José de Mello.

O sr. Visconde da Azarujinha: — Mando para a mesa, por parte da commissão de agricultara, uma proposta para que lhe sejam aggregados os srs. Lopes Mendes e Nobre do Carvalho.

O sr. Ministro do Reino: — Estou elevado á altura de funccionario, irresponsavel; querem-me dar até, creio eu, a inviolabilidade; tenho já as prerogativas de soberano, e cáe rigorosa justiça sobre os empregados da secretaria do reino!

Não posso declinar a responsabilidade, o desejo antes sujeitar-me ás varas da justiça, ainda que seja a de Fafe (Riso), que é para mim a mais amavel de todas as justiças. Quasi que deseja a gente ser castigado! (Riso.).. Creio que ha falta de intelligencia entre nós n'este assumpto.

Eu não venho trazer aqui um projecto absoluto e anti-constitucional;, commetto. apenas uma falta, e é a de vir pedir ao parlamento um direito, de que, se fosse menos escrupuloso, poderia usar, sem a approvação d'elle! Se isto é crime, devo ser castigado, mas rigorosamente.

Não desejo ser castigado por um amigo; não quero tambem ser castigado pelos adversarios, que seriam benevolos para commigo, mas por um executor, que não tenha nem piedade, nem compaixão. (Riso.)

Pois eu sou castigado por trazer ao parlamento um ponto para decidir, quando elle tem sido decidido por diversas formas por differentes governos, o sou de mais a mais combatido, porque desejo marcar os prasos, que até outros ministros, sem escrupulo, com muita intelligencia marcaram? (Apoiados.)

Eu vou ler uma nota que tenho aqui d'essas differentes providencias.

Esta nota é que é da secretaria:

«Houve tempo em que se auctorisava a alteração dos prasos fixados para as operações do recenseamento eleitoral.

«Portaria de 18 de janeiro de 1865 (duque de Loulé), que mandou convocar a assembléa dos quarenta, maiores contribuintes para dia diverso do da lei, por ter havido duvidas na contagem dos votos, na eleição a que se procedeu no dia legal. — Coll. pag. 528.

«Portaria de 1 do março de 1866 (Aguiar), que mandou

marcar novos prasos para as operações do recenseamento, porque a commissão as não concluiu nos prasos legaes. -— Coll. pag. 75.

«Posteriormente seguiu-se a jurisprudencia, de que os prasos não podiam ser alterados, que os recenseamentos feitos fóra dos prasos legaes eram nullos, o que em taes casos se devia fazer obra pelos recenseamentos anteriores.

«Portaria de 6 de junho de 1868 (conde d'Avila). — Coll. pag. 232.

«Portaria de 18 do junho de 1868 (conde d'Avila). — Coll. pag. 210.

«Portaria de 27 de março do 1869 (bispo de Vizeu). — Inédita.

«Portaria de 7 do maio de 1869 (bispo de Vizeu). Portaria, de 2 do março de 1870 (Loulé). — Coll. pag. 141.

«N.B. Esta portaria recommenda que se deixe á commissão proceder como entender.

«Portaria de 26 de junho áe 1871 (Avila).d

Nem dava opinião o governo; proceda como entender; tanto era o escrupulo de que o governo interviesse no recenseamento, que deve ser todo popular.

Uma ultima portaria não preciso cital-a, porque está de accordo, e póde ser suspeita.

Ora, o que houve em Pombal? Houve um recenseamento o anno passado; esse recenseamento não foi feito segundo a lei.

Se houvesse reclamação, era, como disse o illustre deputado, o poder judicial que havia de decidir.

Mas não se foz isso. De quem é a culpa? Para o acto legislativo importa isso pouco. Eu não procuro ir castigar um empregado ou uma commissão innocente ou culpada; não é esse o meu fim; o meu fim é remediar para o futuro o mal existente.

O illustre deputado vê que o governo altera e marca prasos. Eu não quero que o governo o faça; e, comtudo, sou accusado de querer influir no recenseamento. Pelo contrario, ha do me perdoar o meu illustre adversario, a accusação é injusta, injustissima; se ha quem goste de alargar o poder eleitoral e entregai-o ao povo, sou eu. (Apoiados.)

Tenho violado talvez a lei. Mas eu antes quero os males da liberdade do que a tranquillidade da escravidão; não gosto d'ella. (Apoiados.) Mallo periculosam libertatem quam quietam servitium.

Porque sou accusado? Quer o parlamento declarar-se incompetente? Pois declaro se; e eu então irei ás praticas dos meus antecessores.

Não respondo por que eu seja mais cordato do que a representação nacional; acho que ella é mais sabia.

Em Pombal...

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Parece-me que não expliquei bastante o meu argumento.

Eu não quero, como membro do poder legislativo, vir fazer eleições de commissões do recenseamento para Pombal; os eleitores que as fizessem, tinham na lei todos os meios de as fazer; cumprissem a lei; não a quizeram cumprir, eu invoco o latim do sr. ministro, fiquem fóra d'ella.

O Orador: — Mas quem é que soffre? Valha-mo, sr. Adriano Machado, com o seu latim: Quidquid delirant reges pletuntur Achivi.

São os eleitores, e não os que não quizeram fazer a eleição, quem é punido.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Qualquer dos eleitores podia reclamar; ninguem reclamou; associaram-se todos aquella bonita, obra, que a gosem agora.

O Orador: — Valha-me Deus! Houve uns homens que faltaram ao seu dever, pois seja castigado um concelho inteiro, innocente..

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Qualquer dos eleitores podia reclamar, ninguem reclamou; tiveram o recenseamento em reclamação e publicado por editaes, nin-

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guem reclamou contra elle, todos o acharam bom; por consequencia que se contentem com o que fizeram.

O Orador: — O illustre deputado, que não tem achado uma alta sabedoria nos conselhos do districto, queria achal-a agora nos pobres eleitores.

A fallar a verdade, eu não esperava que tratasse com tanta injustiça os eleitores, muitos dos quaes nem saberão ler talvez.

(Aparte do sr. visconde de Moreira de Rey.) Fossem reclamar!... Mas não foram, o não houve recenseamento dos quarenta maiores contribuintes.

Fez-se a eleição; e fez-se, creio eu, segundo o que o illustre deputado deseja, porque s. ex.ª deseja que os povos se a venham como poderem, isto é, façam o que quiserem.

Não me parece tambem boa uma tal liberdade. Eu tendo que se devo fazer o que a lei determina. (Apoiados.)

Fez-se, pois, a eleição como lá a quizeram lazer, como entenderam. D'essa eleição houve recurso para o conselho do districto. O conselho do districto resolveu que essa eleição estava nulla, e quando ía marcar dia para nova eleição observou o seguinte.

«Accordão os do conselho em annullar a eleição da commissão do recenseamento a que no dia 7 do corrente se procedeu em Pombal, reservando-se para em tempo opportuno fixar dia para nova eleição, o que não póde. fazer já, como determina o artigo 11.° da carta de lei do 8 de maio ultimo, visto não haver quem n’ella possa legalmente votar.»

O sr. Van-Zeller: — V. ex.ª diz-mo a data d'esse accordão?

O Orador: — Digo, sim senhor. A data é de li de janeiro de 1879..O caso é este.

O conselho do districto quiz marear novo dia para a eleição; mas, se não havia corpo eleitoral, por quem havia de mandar eleger?

Devia mandar eleger pelos quarenta maiores contribuintes, mas não os havia, ou não estavam designados!'

O sr. Visconde da Moreira de Rey: — Havia as maiores collectas.

O Orador: — A lei 6 que não diz isso. (Apoiados.) As, maiores collectas! Isso é para a commissão do recenseamento incluir devidamente os que as pagam, (Apoiados.) não 6 para o conselho de districto ir recensear. (Apoiados.)

Isso era fazer com que cartas pessoas fizessem o recenseamento. E n'este ponto o illustre deputado bem sabe ao que eu me quero referir, e por isso escuso de me explicar mais.

Queriam que certas pessoas fizessem o recenseamento? isso não podia ser. Então é que era confundir as jurisdições.

O conselho do districto só póde conhecer da validade da eleição; (Apoiados.) não póde conhecer do mais cousa nenhuma. (Apoiados.) Não póde estar a indicar que façam d'esta ou d'aquella fórma.

Disse-se aqui hontem: o delegado do governo devia recorrer para o supremo tribunal administrativo da decisão do conselho do districto.

Pois, se ou acho legal, legalissima a decisão do conselho de districto, havia do mandar recorrer? Seria um contra-senso.

Se na decisão do conselho da districto eu visse alguma cousa contra a legalidade, então sim, então é que se devia mandar recorrer.

Os tribunaes não podem tambem fazer o recenseamento. Então quem o ha do fazer?

E accusam o governo por querer fazer por lei, aquillo que outros governos Icem feito por portarias. (Apoiados.)

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — - Se v. ex.ª me dá licença o não o incommodo, dir-lhe-hei que não poderam em Pombal eleger a commissão de recenseamento para a revisão do novo recenseamento, e por consequencia não o revirara, e não ha já tempo para fazer essa operação no praso conveniente, do fórma que vigore de julho em diante, e portanto, segundo a jurisprudencia estabelecida e seguida geralmente, deve vigorar o ultimo recenseamento, e em janeiro que vem podem entrar no caminho da lei.

O Orador: — Mas isso não é com relação aos maiores contribuintes, porque as eleições e o recenseamento regulam do julho a junho.

O illustre deputado quer que passado o tempo não se renovem os prasos, como se renovavam até aqui, e assim ficam os mortos a dominar os vivos.

Eu creio que o governo póde fazer leis até absurdas, mas não as deve fazer, e acredito que ainda quando tivesse de se fazer lei nova, fizessemos uma obra que bem merecesse da nação. Creio que a nação não nos devia agradecer, se, podendo nós renovar os corpos populares todos os annos, os conservássemos permanentes.

Eu creio que a jurisprudencia que queremos seguir, é a mais racional, e não condemno por isso, os ministros que fizeram o contrario, mas eu tendo do escolher, prefiro o que é mais constitucional o mais liberal.

Não hei de tirar aos vivos um direito, deixando-o aos mortos, que não podem usar d'elle. Por mais que façamos, elles não vêem cá; (e ás vezes vêem)!... (Riso.) mas não devem vir.

Ora, o sr. visconde de Moreira de Rey, pegando na lei, disse «a lei diz que se faça isto», mas não se fez. Nos cadernos ha uma casa para a designação dos maiores contribuintes, mas a casa estava sem habitadores, não tinha nada...

O sr. Visconde de Moreira de Rey. — Lá linha a outra.

O Orador: — E a outra para que servia? Queria que o conselho do districto fosse fazer o recenseamento por ella?

O sr. Visconde do Moreira de Rey: — Nós estamos em equivoco. A lei manda inserir nas casas das collectas da todos os recenseados a importancia do que cada um paga, com a sua designação, e na outra casa simplesmente a designação da maior contribuinte.

Esta designação não prova nada, quando não esteja provado na outra casa onde a collecta existe. Quem decide a este respeito não é o conselho de districto, quando ha reclamação, é o juiz, a relação, e o supremo tribunal; e nós vamos, em relação a este caso, encarregar a decisão não ao juiz, á relação, ou ao supremo tribunal, mas ao conselho de districto, ao qual o sr. relator da commissão applicou uma amabilidade que eu ainda não usei para com elle. Eu ainda não emittiu opinião a esse respeito; quem a omittiu foi o sr. visconde de Rio Sado, relator da commissão. * O sr. Visconde de Rio Sado: — Não fui eu, foi o sr. Dias Ferreira...

O Orador: — E bom que nós, que somos povo soberano, porque reside em nós a soberania, nos abstenhamos de espesinhar os pequenos e humildes e tão honrados como nós...

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Isso é para o sr. Barros o Cunha, para mim não serve.

O sr. Barros e Cunha: — Peço a palavra.

O Orador: — Eu não sei para quem é, o que sei é que nós representámos o povo, e, se elle é mau não creio que os seus representantes possam ser bons. Sabe Deus o que elle dirá tambem de nós!

E bom saber se elle tem rasão ou não.. E digno de attenção, porque tem direitos tambem a respeitar e interesses a salvaguardar. Merece todas, as nossas attenções. -

Pôde dizer-se o que dizia um embaixador a certo rei que lhe dirigiu um motejo.

«O que eu sei é que representei a vossa magestade.»

Tambem rebaixamos o nosso povo, e depois dizemos que somos dignos representantes d'elle.

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

A fallar a verdade não sei porque o representado ha do ser menos do que o representante. Não póde ser.

Pediu providencias o presidente da commissão do recenseamento...

(Interrupção.)

Isso não e só aqui Essas portarias são todas sobre casos analogos.

Quereis auctorisar o governo para que tome essas providencias? Quereis dar-lhe essa auctorisação? Dão-lh'a. Quereis deixar ao governo, pela confiança que vos merece, arbitrio para que tomo outras providencias? Embora o façaes.

Mas para mim era mais conveniente deixar essas providencias aos representantes da nação. Se eu mereço essa confiança agradeço-a, mas não a posso acceitar, porque trata-se aqui dos interesses do paiz e não se trata da confiança que se possa ter em mim.

É preciso abrir um caminho, Qual é elle? O das commissões anteriores? Esse é velho, e isto não é do illustre deputado que é homem do progresso.

Agora se voem que o governo póde abusar tomem todas as precauções para que elle não abuse.

Se querem, porem, deixar ficar sem providencias este caso o tantos outros de que estão cheias as collecções da nossa legislação, deixem-no, não façam nada.

Queria sómente dar estas explicações sobre a jurisprudencia que se tem seguido. E se isto levasse a nação ao abysnio, nenhum de nós estava aqui, estavamos já ha muito lá. Ora eu não creio que haja abismo, nem que tenhamos de caír n’elle.

Deixemos passar esta medida para acabar com a legislação confusa, sobre a qual se reclamam' providencias.

Diz-se: o administrador do concelho póde abusar.' Parece que o administrador do concelho é um animal damninho. Eu não o inventei. Muitos que hoje servem já lá estavam. Então eram pessoas muito capazes. Hoje queixam-se d'elles. O melhor seria, que a opposição nomeasse alguns delegados seus, os quaes o governo encarregasse da execução d'essas medidas mais perigosas. Eu acceitava. Não tinha duvida alguma em entregar ao mais ferrenho opposicionista o uso d'esta delegação. N'este ponto entregava-lhe tudo.

Que tempo querem que se fixo para esse praso, que deve ser sempre muito proximo para que as operações se façam o acabem dentro do tempo legal?

Eu tambem não creio que o Concelho de Pombal perca a sua existencia, se acaso esta lei não for adoptada para este anno; mas deve-se aproveitar para os outros, por que se este acaso fosse o unico deixasse-se morrer o concelho de Pombal.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Não morre.

O Orador: — Bem sei que não morre, mas tambem por uma má administração não morrem os paizes: pois, então por este principio' deixe-se do administrar bem.

Não digo mais nada.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã e a continuação da que estava dada para hoje. Está levantada a sessão. Eram cinco horas e meia da tarde.

Discurso do sr. deputado Julio de Vilhena, pronunciado na sessão do 8 de março, o que devia ler-se a pag. 717, col. 2.º

O sr. Julio de Vilhena: — Obedecendo ás antigas tradições do parlamento, começo por comprimentar o illustre deputado e meu amigo, o sr. Laranjo, que fez a sua estreia na questão que se debate.

Não o felicito pela excellencia das doutrinas que proclamou; não o felicito pelos principios de administração colonial que desenvolveu, como sendo os mais adequados ao progresso das nossas possessões no ultramar; não o felicito pelo tom apaixonado que assumiu, nem pela maneira aggressiva com que intentou dirigir os seus ataques contra o gabinete; felicito-o, porque, sendo s. ex.ª um membro da geração moderna, á qual tendo tambem a honra de pertencer, sendo s. ex.ª filho exclusivo do seu trabalho e da sua intelligencia, tem direito ao meu respeito, á minha consideração e á minha sympathia. (Apoiados.)

Qualquer que seja a diversidade da principios que nós professemos, qualquer que seja a diversidade das escolas em que nos achemos filiados, os homens da geração nova devem entrar desassombradamente em todos os debates parlamentares, e devem ter sempre uns para os outros um franco e sincero aperto de mão e um abraço de fraternidade. (Apoiados.)

Os estadistas actuaes de cada uma das escolas hão do desapparecer da vida publica, deixando um nome brilhante na historia do seu paiz, o as tradições d'elles hão de ser perpetuadas pelos homens da geração nova que hoje se sentam nas cadeiras d'esta assembléa legislativa.

Felicito, pois, o illustre deputado; felicito-o, porque o conheço ha muito tempo, porque sou sou amigo ha muitos annos, e porque sei que os seus talentos não se podem apreciar pelo discurso que proferiu hontem, mas pelos seus trabalhos scientificos e pelas suas excellentes prelecções nas cadeiras da universidade. (Apoiados.)

Vou entrar sem mais preâmbulos na questão que se debate.

O illustre deputado interpellante, quando lançou os lineamentos d'esta discussão, disse que era esta uma questão vasta: que era uma questão economica para a provincia do Moçambique, uma questão geral de administração ultramarina, uma questão politica, o por fim uma questão legal.

Declaro sinceramente a v. ex.ª e á camara que senti que o illustre deputado interpellante, cujo talento robusto eu respeito e admiro, apertasse uma questão do tanta magnitude nos limites acanhados do campo legal.

Hoje, que a questão da Africa está attrahindo as attenções da Europa; hoje, que não só na Europa, mas tambem na America, se trata de ir procurar ao centro da Africa um novo meio para o exercicio da actividade commercial e industrial, que está atravessando uma crise nos dois continentes; hoje, que se procura estabelecer na Africa um novo centro de operações para o trabalho humano,"para a producção e para o consumo, o illustre deputado interpellante traça em volta do si um circulo estreito, e falla sómente da legalidade do acto do governo!

Sr. presidente, uma questão d'esta ordem não se trata, não se póde tratar em parlamento nenhum, perguntando ao sr. ministro da marinha, que distancia vae de Teto ao Zumbo? O que é exploração? O que silo machinas aperfeiçoadas?

Pois o illustre deputado, talento vigoroso da opposição, em vez de erguer aqui a bandeira do seu partido, em vez do affirmar aqui os principios da administração colonial do seu credo, limita-se a dizer que o acto do governo é contra a lei do 4 do dezembro de 1869!

Não imagine o illustre deputado, nem imagine a opposição, que eu ou a maioria d'essa casa nos recusemos a tratar esta questão em qualquer campo: acceitâmos esta questão no campo legal, no campo economico, no campo politico, no campo da moralidade, acceitâmol-a, emfim, em todos os terrenos em que os illustres deputados a queiram collocar. (Muitos apoiados.)

Mas consinta a opposição que eu lamente e que eu sinta a direcção que se tem dado a este debate (Muitos apoiados.); e assim como a opposição se arroga o papel de criticar a maioria, consinta tambem que a maioria se arrogue o direito do criticar a opposição, por isso que a collocação da questão e a delimitação do debate estão muito abaixo da dignidade parlamentar! (Apoiados.)

Sr. presidente, não imagino a opposição, repito, que nos recusamos a tratar a questão no campo legal; aceittâmol-a ahi, e vou demonstrar ao illustre deputado interpellante que todos os argumentos que s. ex.ª apresentou contra o

Sessão de 21 da março de 1879

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