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N.° 56

SESSÃO DE 13 DE ABRIL DE 1896

Presidencia do exmo. sr. Antonio José da Costa Santos

Secretarios-os exmos. srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Eduardo Simões Baião

SUMMARIO

Approvada a acta, apresentam representações os srs. Francisco Patricio, Mendes Lima, Victor dos Santos e Mello e Sousa.- Os srs. Simões Baião, Cabral Moncada, Mello e Sousa e Adriano da Costa mandam para a mesa pareceres de commissões, e os srs. Carneiro de Moura e Motta veiga declaram ter lançado na caixa varios requerimentos de interesse particular.- Justifica faltas o sr. Francisco Patricio, e insiste n'um pedido de esclarecimentos o sr. Mendes Lima.- A requerimento do sr. Santos Viegas, depois de dispensado o regimento, é approvado, som discussão, o projecto n.º 40.- O sr. presidente do conselho apresenta uma proposta de lei, para que pede a urgencia, reunindo-se em seguida, a requerimento do sr. Teixeira de Sousa, depois de interrompida a sessão, a commissão de fazenda para dar sobre ella parecer. Reaberta a sessão, é o parecer approvado.

Na ordem do dia, continuação da discussão do orçamento, usam da palavra os srs. Dias Ferreira e presidente do conselho.

Abertura da sessão - Ás tres horas da tarde.

Presentes á chamada, 63 srs. deputados. São os seguintes:- Aarão Ferreira de Lacerda, Abilio Augusto de Madureira Beça, Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Adriano da Costa, Antonio de Almeida Coelho de Campos, Antonio Candido da Costa, Antonio José Boavida, Antonio José da Costa Santos, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Teixeira de Sousa, Antonio Velloso da Cruz, Carlos de Almeida Braga, Conde de Anadia, Conde de Pinhel, Conde de Valle Flor, Conde de Villar Secco, Francisco José Patricio, Francisco Rangel de Lima, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Jacinto Candido da Silva, Jacinto José Maria do Couto, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, João Alves Bebiano, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Lopes Carneiro de Moura, João da Mota Gomes, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Rodrigues Ribeiro, José Adolpho de Mello e Sousa, José Bento Ferreira de Almeida, José Coelho Serra, José Eduardo Simões Baião, José Freire Lobo do Amaral, José Gil Borja Macedo e Menezes (D.), José Joaquim Aguas, José Mendes Lima, José Pereira da Cunha da Silveira e Sousa Junior, Julio Cesar Cau da Costa, Luiz Filippe de Castro (D.), Manuel Augusto Pereira e Cunha, Manuel de Bivar Weinholtz, Manuel Bravo Gomes, Manuel Joaquim Ferreira Marques, Manuel Joaquim Fratel, Romano Santa Clara Gomes, Theodoro Ferreira Pinto Basto, Thomás Victor da Costa Sequeira, Visconde do Ervedal da Beira, Visconde da Idanha, Visconde de Leite Perry e Visconde de Palma de Almeida.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho da Cunha Pimentel, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio d'Azevedo Castello Branco, Antonio Hygino Salgado de Araujo, Arthur Alberto de Campos Henriques, Eduardo Augusto Ribeiro Cabral, Fidelio de Freitas Branco, Ignacio José Franco, João Marcellino Arroyo, Joaquim do Espirito Santo Lima, José Dias Ferreira, Licinio Pinto Leite, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Maria Pinto do Soveral, Luiz de Mello Correia Pereira Medello, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Marianno Cyrillo de Carvalho, Miguel Dantas Gonçalves Pereira e Visconde de Nandufe.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adriano Augusto da Silva Monteiro, Agostinho Lucio e Silva, Alfredo de Moraes Carvalho, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio Barbosa de Mendonça, Antonio de Castro Pereira Côrte Real, Antonio José Lopes Navarro, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Dias Dantas da Gama, Augusto Victor dos Santos, Bernardino Camillo Cincinnato da Costa, Conde de Jacome Correia, Conde de Tavarede, Diogo José Cabral, Diogo de Macedo, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jayme Arthur da Costa Pinto, Jayme de Magalhães Lima, Jeronymo Osorio de Castro Cabral e Albuquerque, João José Pereira Charula, João Maria Correia Ayres de Campos, Joaquim José de Figueiredo Leal, José Antonio Lopes Coelho, José Correia de Barros, José Joaquim Dias Gallas, José Luiz Ferreira Freire, José Marcellino de Sá Vargas, José Maria Gomes da Silva Pinheiro, José dos Santos Pereira Jardim, José Teixeira Gomes, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz de Sampaio Torres Fevereiro, Manuel Francisco Vargas, Manuel José de Oliveira Guimarães, Manuel Pedro Guedes, Manuel de Sousa Avides, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Polycarpo Pecquet Ferreira dos Anjos, Quirino Avelino de Jesus, Visconde do Banho, Visconde de Tinalhas e Wenceslau de Sousa Pereira de Lima.

Acta - Approvada.

Não houve expediente.

O sr. Francisco José Patricio: - Sr. presidente, mando para a mesa uma representação dos ex-arbitradores da comarca da Povoação, da ilha de S. Miguel (Açores), contra o decreto de 15 de setembro de 1892, que revogou o artigo 37.° do decreto de 29 de julho de 1886 e o regulamento de 17 de março de 1887.

Peço a v. exa. se digne dar a esta representação o destino que tem dado a outras de igual natureza que têem sido enviadas a esta camara.

Mando tambem para a mesa uma declaração justificativa das faltas do sr. Alfredo Moraes Carvalho.

Publicam-se, por extracto, no fim d'esta sessão. O sr. Carneiro de Moura:- Participo á v. exa. lancei na caixa de petições trinta requerimentos de officiaes do exercito, pedindo que o numero de annos de serviço exigidos para a reforma militar passe de trinta e cinco para trinta annos.

eputo as allegações que fundamentam os requerimentos dos officiaes do exercito bastante justas, tanto mais que para os outros funccionarios do estado exige um

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numero menor do annos para a reforma, e os officiaes do exercito não trabalham menos que os outros funccionarios do estado. Pelo contrario, o seu trabalho é mais arduo e exige mais forças. Julgo, portanto, de todo o ponto justo o pedido que os officiaes do exercito fazem á camara dos senhores deputados.

Participo tambem a v. exa. que lancei na caixa alguns requerimentos do officiaes inferiores do exercito, pedindo que seja modificado o regimen actual que concede um subsidio para rancho.

Não tenho bem presente na memoria a legislação que se refere a este assumpto, mas pela leitura que fiz dos requerimentos vejo que elles concluem por pedir que o subsidio concedido para rancho seja tambem dado áquelles que têem familia, de modo que os sargentos que não podem arranchar não continuem a ficar em peiores condições de vencimento.

Considero bastante justo este pedido dos officiaes inferiores, por isso peço á camara e á commissão que tem de dar parecer sobre estes requerimentos que os tomem na devida consideração, como é de justiça.

O sr. Mendes Lima: - Mando para a mesa uma representação dos recebedores do districto de Beja sobre as medidas de fazenda que exigem, como caução a onerar a primeira, a decima parte de toda a cobrança realisada durante o anno, e peço a v. exa. que lhe dê o destino devido.

Como estou com a palavra, pergunto a v. exa. se já vieram os documentos que requeri pelos ministerios da fazenda e da justiça.

O sr. Presidente: - Ainda não vieram.

O Orador: - N'esse caso, peço a v. exa. que inste novamente pela sua remessa, porque desejo fazer algumas considerações, que não posso fazer sem ter esses documentos.

O sr. Presidente: - Vou renovar o pedido de v. exa.

O Orador: - Agradeço a v. exa.

O sr. Simões Baião: - Mando para a mesa, por parte da commissão de legislação civil, o parecer sobre a proposta de lei n.° 36-B, que regula o processo de despejo de inquilinos de predios urbanos arrendados aos mezes.

Foi mandado imprimir.

O sr. D. José Gil: - Mando para a mesa uma justificação de faltas.

O sr. Motta Veiga: - Declaro que lancei na caixa um requerimento de Simplicio da Graça Barros, porteiro aposentado da secretaria do governo geral da provincia do Cabo Verde, pedindo que lhe seja contado o tempo, para o effeito da aposentação, que serviu como praça da antiga bateria de artilheria d'aquella provincia.

Parece-me justo esse pedido, agora renovado, pois em 1894 já foi mandada identica petição ao parlamento.

Chamo, pois, a attenção da commissão que tiver do resolver esse assumpto, para a justiça do pedido.

O sr. Carlos Braga: - Mando para a mesa uma justificação de faltas.

O sr. Mello e Sousa: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre a proposta de lei n.º 5, relativa ao imposto do fabricação e consumo.

Aproveito a occasião de estar com a palavra, para mandar tambem para a mesa uma representação dos empregados do quadro do serviço interno das alfandegas.

O parecer foi a imprimir.

A representação vae, por extracto, no fim da sessão.

O sr. Cabral Moncada: - Por parte da commissão de fazenda mando para a mesa um parecer, applicando a Luiz Maria Teixeira do Figueiredo, ex-chefe da repartição technica do material da extincta direcção geral dos telegraphos e pharoes, o disposto no artigo 7.°, § 2.°, do decreto n.° l, de 17 de julho de 1886.

A imprimir com urgencia.

O sr. Victor dos Santos: - Mando para a mesa uma representação dos escrivães dos juizes de paz das comarcas de Lisboa e Porto.

Vae por extracto, no fim da sessão.

O sr. Santos Viegas: - Peço a v. exa. consulto a camara sobre se dispensa o regimento, a fim de poder entrar já em discussão o projecto de lei n.° 40.

O sr. Presidente: - Os srs. deputados que dispensam o regimento a fim de entrar já em discussão o projecto de lei n.° 40, que foi distribuido no dia 11 do corrente, tenham a bondade de se levantar.

O sr. Ferreira de Almeida: - O projecto de lei o que é?

O sr. Presidente: - Vão ler-se.

PROJECTO DE LEI N.°40

Senhores: - A commissão de fazenda, tomando em consideração as rasões allegadas no projecto de lei, apresentado n'esta camara, na sessão de 4 de fevereiro ultimo, pelo sr. deputado Santos Viegas, é de parecer que deve ser convertido em lei, de accordo com o governo, com a condicção de revertern para o estado o edificio o pertences, quando deixem de ter a applicação que se lhes designam.

É o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São concedidas ao recolhimento e asylo de infancia desvalida do Menino Deus, legalmente estabelecido na villa de Barcellos, districto do Braga, o edificio, igreja, cerca e mais dependencias, onde actualmente se acha installado, e que pertenciam ao antigo recolhimento do Menino Deus, da mesma villa.

§ unico. O edificio, igreja, cerca e mais dependencias reverterão para o estado, logo que deixem de ter a applicação designada n'este artigo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Teixeira de Vasconcellos = Manuel Fratel = C. Moncada = Adriano da Costa = Mello e Sousa = Polycarpo Anjos = Augusto Dias Dantas da Gama = M. F. de Vargas = Teixeira de Sousa, relator.

N. 4-A

Senhores: - As necessidades de ordem moral, a que deve acudir-se com efficazes e energicos remedios, fazem sentir-se, e avolumam-se tanto mais quanto maior é a civilisação de um povo. Assim o ensinam todos os pensadores, e assim o praticam todas as nações. Portugal, que no exercicio da sublime virtude da caridade, tem ido sempre na vanguarda, ufana-se do haver creado institutos do beneficencia, onde educa os pobres do fortuna, e distribue soccorros ás variadas miserias que affligem a sociedade.

Continuando as suas tradições gloriosas, a villa de Barcellos, por tantos titulos nobre, creou, ha pouco, um asylo para a infancia desvalida, denominando-o "recolhimento e asylo da infancia desvalida do Menino Deus", estabelecido no edificio que tinha o nome de recolhimento do menino Deus ou das Beatas, que havendo sido util á religião e á patria em tempos findos, não o era, ha pouco tempo ainda, nem á sociedade nem á religião, reclamando profunda reforma.

Alguns cavalheiros d'aquella localidade, a quem junto aqui a homenagem do meu respeito, convencidos da necessidade de remediar e prevenir os males, que vem da falta de educação moral, deram áquelle recolhimento uma organisação conforme o fim a que o destinaram, alimentando, instruindo e educando ali creanças do sexo feminino, agasalhando-as e dando-lhes os meios precisos para serem uteis a si e á sociedade.

Funcciona desde 1893, e está este instituto legalmente constituido com estatutos approvados pela auctoridade competente.

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Nasceu da iniciativa particular esta instituição, que a caridade publica tem sustentado, e o governo do Sua Magestade por mais de uma vez tem subsidiado, concorrendo assim para a educação e morigeração das desgraçadas creanças, que ali recebem o pão do corpo e do espirito.

Succede, porém, que a casa, onde existe o recolhimento, igreja, cerca e dependencias, não pertencem á administração do asylo, mas ao estado, e assim não gosa este instituto das garantias de segurança, emquanto lhe não pertencerem de facto e de direito.

Por este motivo, e por que o estado deve proteger e auxiliar a acção benefica de instituições d'esta natureza, tenho a honra de submetter á vossa consideração e exame o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São concedidas ao "recolhimento e asylo de infancia desvalida do Menino Deus", legalmente estabelecido na villa de Barcellos, districto de Braga, o edificio, igreja, cerca e mais dependencias, onde actualmente se acha installado, o que pertenciam ao antigo recolhimento do Menino Deus, da mesma villa.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 4 de fevereiro de 1896. = O deputado pelo districto de Braga, Santos Viegas.

Não havendo quem pedisse a palavra foi posto a votação e approvado.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Hintze Ribeiro): - Sr. presidente, em vista do parecer da commissão de fazenda, mandado para, a mesa pelo sr. deputado Mello e Sousa, tenho a honra de apresentar á camara a seguinte:

Proposta de lei n.°51-B

Senhores.- Convindo garantir os interesses de industrias nacionaes, que podem ser lesados na concorrencia commercial, por importações feitas com isenção de regimen tributario, emquanto se não resolve sobre o parecer agora apresentado pela commissão de fazenda d'esta camara, ácerca do imposto a lançar sobre a fabricação dos oleos concretos e vélas para illuminação, tenho a honra de pedir a vossa approvação para a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° Pelas mercadorias abaixo designadas serão cobradas, no acto de despacho, a partir do dia da publicação d'esta lei no Diario do governo, as seguintes taxas equivalentes ao imposto de fabricação estabelecido no projecto de lei respectivo:

Oleos concretos vegetaes, com excepção do oleo de palma, peso liquido - 8 réis por kilogramma.

Vélas, de qualquer qualidade e fórma, para illuminação, stearina em massa e productos analogos, podendo ser immediatamente empregados na formação de vélas para illuminação - 30 réis por kilogramma.

Art. 2.° A cobrança d'estes impostos far-se-ha por deposito, até que as côrtes resolvam definitivamente sobre o referido projecto.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 13 de abril de 1896. =Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

Sr. presidente, como v. exa. vê, este assumpto é de sua natureza summamente urgente, por isso vou mandar esta proposta de lei para a mesa, chamando a attenção da camara para a sua urgencia.

O sr. Teixeira de Sousa: - Por parte da commissão de fazenda peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que a commissão de fazenda se reuna durante esta sessão, para dar parecer sobre a proposta de lei que acaba de ser mandada para a mesa pelo sr. presidente do conselho.

Consultada a camara, assim o resolveu.

O sr. Presidente: - Tenho a communicar á camara que a commissão de redacção não fez alteração alguma ao projecto de lei n.° 40 que acaba de ser approvado.

Como a commissão de fazenda tem de dar parecer acerca da proposta de lei que foi mandada para a mesa pelo sr. presidente do conselho, e como não ha mais nenhum lutado inscripto para antes da ordem do dia, interrompo a sessão até a commissão apresentar o parecer.

Esta interrompida a sessão.

Eram tres horas e um quarto da tarde.

A sessão reabriu ás tres horas e vinte e cinco minutos da tarde.

O sr. Mello e Sousa: - Por parte da commissão de fazenda mando para a mesa o parecer sobre a proposta apresentada pelo sr. presidente do conselho, e requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que se dispense o regimento a fim de entrar desde já em discussão.

O sr. Santos Viegas: - Por parte da commissão do orçamento do ministerio do reino, mando para a mesa uma proposta que por ser de execução permanente envio n'esta occasião. Esta proposta faço-a na qualidade de relator do orçamento do ministerio do reino e visto que é de execução permanente tem de ser incluida na lei orçamental, e 10 artigo a que respeita.

O sr. Presidente: - Talvez que seja logar mais proprio para a apresentação d'essa proposta quando se tratar a discussão do orçamento.

O sr. Santos Viegas: - Creio que a camara vae discutir agora a proposta de lei do sr. presidente do conselho, mas não é sobre ella que eu pedi a palavra. Pedi-a para enviar a proposta, que já está na mesa, e que se refere á despeza de execução permanente do ministerio do reino.

Proposta

Proponho que, pelo serviço determinado no artigo 143.° do projecto do codigo administrativo que foi approvado por esta camara, seja abonada uma gratificação, nos mesmos termos e pela mesma importancia em que é abonada a gratificação de que trata o § 2.° do artigo 146.° do referido codigo. = O relator da sub-commissão do orçamento do ministerio do reino, Santos Viegas.

Admittida.

O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o parecer relativo á proposta apresentada pelo sr. presidente do conselho.

PARECER N.° 52

Senhores: - A commissão de fazenda, tendo apreciado devidamente a proposta de lei apresentada na sessão de hoje pelo illustre presidente do conselho de ministros e ministro da fazenda, tendente a fazer pagar por deposito, desde ja, no acto do despacho, o imposto de consumo proposto pela commissão de fazenda sobre os oleos vegetaes concretos, e as vélas de qualquer qualidade e fórma para illuminação, de fabricação estrangeira, reconhece que a adopção urgente de tal providencia se impõe, a fim de acautelar não só os interesses do thesouro, como os da industria nacional, que cumpre pôr ao abrigo de quaesquer especulações, especialmente quando se lhe exigem novos sacrificios. Tem, pois, a commissão a honra de vos propor que seja approvada a proposta de lei tal qual se acha redigida. = Manuel Francisco Vargas = Adolpho Pimentel = Manuel Fratel = Adriano da Costa = Cabral Moncada = Teixeira de Sousa = Teixeira de Vasconcellos = Luciano Monteiro = José Lobo = Mello e Sousa, relator.

Dispensado o regimento, foi em seguida approvado o parecer sem discussão.

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ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do capitulo 1.° do projecto n.º 39 (orçamento)

O sr. Mello e Sousa: - Por parte da commissão do orçamento mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que as propostas apresentadas na discussão do projecto de lei sobre o orçamento sejam enviadas á commissão respectiva para as apreciar e sobre ellas dar o seu parecer. = O deputado, Mello e Sousa.

Admittida, e approvada sem discussão.

O sr. Dias Ferreira: - Chama a attenção da camara para a situação financeira e economica do paiz, que julga muito grave. Não censura o governo por entender que ella tem melhorado muito, mas não pensa do mesmo modo.

Não quer com isto dizer que o paiz não esteja em circumstancias mais desafogadas do que aquellas em que esteve, quando se manifestou a crise; mas a crise não foi do momento, levou largos annos a elaborar-se, resultando dos processos de administração adoptados, e principalmente do facto de se viver, durante quarenta annos, no regimen de juros, e não menos das condições em que foram realisados os successivos emprestimos.

O paiz não podia desenvolver se bastante para poder occorrer aos encargos do todos estes emprestimos.

Ninguem se deve illudir a respeito do estado do paiz. Lembra que ainda está de pé a medida que determinou as deducções nos ordenados dos funccionarios publicos, que se suspenderam as amortisações no banco de Portugal, que é grave para um paiz a emissão successiva de notas, e que, finalmente, se tem augmentado a divida fluctuante no estrangeiro.

A proposito, declara que é contrario á divida fluctuante fóra do paiz, porque ella representa um perigo grave, preferindo que o governo se aproveitasse da conta corrente com o banco de Portugal.

Todos estes factos sito graves, quer isoladamente, quer no seu conjuncto, sobretudo por se darem depois de uma reducção violenta de juros.

Não censura ninguem. Falla assim, porque deseja que todos se preoccupem com o estado do paiz.

Não se pode dizer que o desapparecimento ou a diminuição do deficit representa uma situação lisonjeira, porque o facto resulta apenas da redacção dos juros.

O augmento da divida fluctuante indica um deficit, e os deficits successivos, depois de uma reducção do juros, podem levar-nos a uma situação insoluvel.

Observa mais o orador que tendo o governo encontrado as despezas publicas computadas em 44:000 contos de réis, no orçamento actual elevadas a 49:000 contos de réis.

Não sabe se o paiz tem recursos para tanto.

verdade que tambem as receitas augmentaram, vindo calculadas igualmente em 49:000 contos de réis, mas este augmento, que é constituido pelo producto dos direitos sobre os cereaes, pelo augmento do rendimento da contribuição de registo, e pelo augmento de rendimento do imposto de sêllo, não representam de certo o desenvolvimento do paiz. O que tudo isto significa é que o paiz paga hoje mais.

As despezas são certas, e as receitas podem ser falliveis, porque grande parte d'ellas não corresponde ao augmento da riqueza publica.

Entende que foram os optimismos que nos levaram ao estado um que estamos.

Pela sua parte receia quo as despezas cheguem, no exercicio de 1896-1897, até ao ponto de determinarem acontecimentos analogos aos de 1890-1891.

Contra o que tem ornado dizer, a sua opinião é que a propriedade não póde pagar mais, porque já paga réis 10:000 contos de réis. Alem do contingente votado annualmente pelas côrtes, paga os addicionaes para as corporações locaes, e sobre ella pesam ainda a contribuição de registo por titulo oneroso, a maior parte da decima de juros e o imposto do real de agua.

O orador entra depois na apreciação de alguns dos factos occorridos em 1892, relativamente aos credores externos.

O sr. Presidente: - Observa, em cumprimento do artigo 128.° do regimento, que já decorreu uma hora desde que o orador começou a usar da palavra, mas que póde continuar o seu discurso, tendo de o concluir no praso de quinze minutos.

Vozes: - Falle, falle.

O Orador: - Em vista da manifestação da camara, que agradece, vae continuar nas suas considerações, mas não abusará. Apenas deseja mostrar que não lhe pertencem algumas responsabilidades que lhe são attribuidas.

Nota que das cinco nações interessadas na questão dos credores, só a Allemanha protestou contra o pensamento de se reduzirem os juros, e explica os motivos por que estabeleceu o pagamento do terço em oiro.

O governo, depois de dizer que estavam na memoria de todas as reclamações dos credores externos, reclamações que ninguem conhece, porque não foram publicadas, apesar das suas repetidas instancias, attribuiu ao decreto de 13 de junho de 1892 por elle, orador, publicado, as reclamações que se levantaram, e que motivaram o convenio posteriormente feito.

Esta asserção não a póde deixar sem reparo, porque não é a expressão exacta de como os factos se passaram. Para o comprovar, historia as negociações feitas com os credores externos, concluindo que o decreto de 19 de maio de 1893 nada tem de commum com o de 13 de junho de 1892.

A questão dos credores nunca foi discutida; por duas vezes o tentou fazer, e de ambas apanhou descompostura, sem nada lhe responderem. Fallaram sobre o assumpto, uma vez o sr. Fuschini, e outra o sr. Lobo d'Avila, mas sem nada dizerem a respeito da questão especial dos credores.

Não quer tambem agora discutir quem fez melhor ou peior; o que quiz foi simplesmente mostrar que a lei de 19 de maio de 1893 não se relaciona immediatamente com o decreto de 13 de junho de 1892.

(O discurso de s. exa. será publicado na integra em appendice a esta sessão, guando restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Hintze Ribeiro): - Sr. presidente, começo no desempenho da minha palavra por mandar para a mesa o contrato Hersent, que o illustre deputado o sr. conselheiro Marianno de Carvalho outro dia pediu.

Eu disse a s. exa. que exprimisse o seu desejo n'um dia, que no outro o contrato estaria na camara. É esta a primeira sessão depois da minha declaração e o contrato cá está.

Agora, sr. presidente, vou responder ao illustre deputado o sr. Dias Ferreira.

O discurso de s. exa. teve duas partes perfeitamente distinctas, uma que se refere á apreciação da situação da fazenda publica, e outra á liquidação de responsabilidades, no que toca á resolução dada á divida externa.

Em ambos os assumptos acompanharei o illustre deputado por fórma que, nem ácerca de um, nem ácerca de outro, s. exa. possa dizer que pela terceira vez se alevantou para liquidar responsabilidades, sem encontrar quem precisamente lhe respondesse.

Começarei pela situação da fazenda publica, que o illustre deputado acha grave, muito grave, indo até ao ponto de, na sua expressão, dizer que nós caminhavamos verti-

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ginosamente para um desastre financeiro, expressão predilecta do illustre deputado, sempre que se discute o orçamento do estado, mas expressão que me esforçarei por demonstrar que é n'este momento absolutamente inapropriada.

S. exa., porém, ao mesmo tempo que dizia isso, não deixava de reconhecer, atraves do seu pessimismo, porque como pessimista se apresentou, que a situação financeira, apesar de tudo, tem melhorado effectivamente, era necessario negar a luz do sol para negar isso, que hoje é uma verdade clara que a todos se impõe, absolutamente incontestavel.

O illustre deputado entendeu que nem só o deficit é uma indicação da situação financeira do paiz. É certo. O illustre deputado argumentou com o passado, foi á accumulação dos deficits e dos emprestimos com que se creou uma situação realmente embaraçosa e difficil, o que não contesto, reivindicando a sua parte na culpa, que é de todos.

Notou o illustre deputado que, durante annos a seguir, caminhavamos com deficit de 13 a 14:000 contos de réis, levantando supprimentos sobre supprimentos de divida fluctuante e consolidando-os mais tarde nas condições que o illustre deputado repetia como as encontrou no meu relatorio de fazenda. Tambem não o nego.

Se o illustre deputado, porém, quizesse reflectir no que, ha tres annos para cá nos temos feito, com encargos, ainda importantes, concernentes á nossa divida publica, com largos pagamentos em oiro a effectuar no estrangeiro, e não só os do estado, mas tambem os coupons que temos pago da camara municipal e todas essas despezas que realmente têem pesado sobre o thesouro, e em que, áparte a venda de titulos, na importancia de 2:160 contos de réis, que não foi o illustre deputado que o descobriu, mas eu que a apontei, como aponto o augmento da divida fluctuante, que eu logo mostrarei ao illustre deputado qual é, mas que, em todo o caso, não é elevada, nem tão consideravel como v. exa. quiz mostrar, havia de ver que ha tres annos satisfizemos encargos que representam 36:000 contos de réis, e que, todavia, nem o augmento da divida fluctuante, nem os recursos aos emprestimos ou a venda de titulos, perfaz sequer uma somma que d'esta quantia se approxime.

S. exa. fez o confronto, e apesar de notar que tudo se pagava á custa do credito, vendo que nos temos governado com a prata da cosa, com os nossos proprios recursos, e que, não obstante tão largos pagamentos no estrangeiro, não tomos aggravado as condições financeiras, antes as temos melhorado, s. exa. reconhecerá a somma de esforços que todos no paiz têem empregado para que realmente possamos resgatar-nos de um passado que foi oneroso e crear um futuro que nos seja mais propicio.

Diz s. exa. que a situação é ainda muito grave, que nós estamos vivendo do banco de Portugal, que foi, e é, um auxiliar poderoso, e que comtudo as amortisações do banco estão suspensas e as deducções nos vencimentos publicos continuam. É certo, Pois eu disse, porventura, ou alguem, que o periodo da lucta viva, accesa, para nos redimirmos dos passados erros, de encargos gravosos, pesados, sobre o thesouro, tinha passado?

Pois quando eu venho ao parlamento ainda propor recursos novos, chamar a sua attenção para as verbas do orçamento, para que fiquemos tão só nas despezas indispensaveis ; pois quando ha tres annos não fazemos outra cousa senão liquidar incessantemente, já liquidando reclamações insistentes, já afastando questões internacionaes, que eram outros tantos estorvos á nossa regeneração financeira, já procurando reducções, diminuindo despezas, rectificando o orçamento, augmentando impostos, mantendo sacrificios; pois n'este periodo de lucta disse eu, ou alguem, ao illustre deputado, que a situação não era grave e que podiamos já voltar aos tempos antigos em que, de animo leve, nos lançavamos nas aventuras de um futuro que, forçosamente, havia de vir carregado de sombras quando quizessemos fazer a liquidação?

Nunca o disse ao illustre deputado, e s. exa. é perfeitamente injusto, quando não reconhece a parte de trabalho, de esforço e de perseverança que n'este ultimo tempo o paiz tem empregado para que nós possamos chegar a uma situação, que eu vou demonstrar, com numeros, como é melhor do que aquella que s. exa. nos deixou.

Não vou fazer isto para pôr em cheque o illustre deputado, que eu estimo, considero e respeito; não vou fazer isto para o apresentar ao paiz como um financeiro desastrado e inconsciente, porque sei bem o valor moral de s. exa., a robustez da sua intelligencia, a larga experiencia da sua vida publica; venho fazel-o por uma unica rasão, e é porque, do confronto que eu vou apresentar, nos seus termos claros e precisos, ha uma cousa que resalta e vale mais que a reputação financeira do illustre deputado, que aliás ha muito tempo está estabeledida, e seguramente muito mais do que a minha, que nada vale. O que resulta dos numeros e está acima de qualquer confronto ou liquidação do responsabilidades entre mim e s. exa., é o renascimento da prosperidade do paiz e por consequencia o levantamento do seu credito. (Apoiados.)

Não digo isto para exaltar a minha administração, como tendo d'ella resultado o que o paiz tem ganho, porque isso é devido ao esforço, á tensão, á actividade de todos os dias, em todos os nossos ramos, do commercio, da agricultura e da industria, de todos os elementos que entram na lucta da vida.

O illustre deputado accusou-me de, tendo uma conta corrente com o banco de Portugal, aberta gratuitamente até uma cifra importante, em voz de recorrer a essa conta preferir ir augmentar as contas correntes e os supprimentos no estrangeiro, quando era precisamente de ahi que vinha o grande mal, o grande perigo e o grande risco, que já uma vez tinha ameaçado subverter-nos e que ainda alguma vez podia pesar sobre nós como uma mão ferrea, da qual não nos podessemos livrar. Fiquei aterrado, julgando que fosse grande o meu erro, com a idéa de que s. exa. tivesse encontrado, não sei aonde, um augmento nos supprimentos da divida externa, e por consequencia das responsabilidades contrahidas no estrangeiro, de tal maneira grave, que podesse pôr em risco a nossa situação, e encontrei que, sendo a importancia dos supprimentos no estrangeiro de 1:500 contos de réis, quando s. exa. deixou de ser ministro, hoje não passa de 2:890 contos de réis, o que significa que esse augmento dentro de tres annos foi apenas de 1:390 contos de réis. Quantos milhares de contos temos nós pago no estrangeiro sem que com isso, repito, tivessemos aggravado as condições financeiras?

Diz o illustre deputado: reduzir os juros da divida publica e continuar com os deficits, que é isso senão preparar o sorvedouro para onde caminhamos. Mas o que fez o illustre deputado, sem que eu queira com isto liquidar responsabilidades ou desmerecer era nada o valor e a efficacia dos esforços de s. exa. quando ministro?

Quando é que s. exa. reduziu os juros ? Reduziu-os em junho de 1892, não é verdade? Muito bem. Parece que effectivamente não se comprehende, no dizer do illustre deputado, que feitas as redacções nos juros, se continue com o deficit; mas o illustre deputado, tendo em junho de 1892 reduzido a divida externa, e tendo pela lei de 26 de fevereiro reduzido o juro da divida interna, devia apresentar o orçamento de 1893 para 1894, que era o que se seguia, saldado. Mas que orçamento apresentou o illustre deputado? Veiu á camara e declarou que, apesar da redacção dos juros da divida publica externa e interna, effectuada pela lei de 26 de fevereiro de 1892 e pelo decreto de 13 de junho de 1892, o deficit, que toda a gente suppunha ter acabado com a redacção dos juros, de 1892 para 1893, havia de ser de 5:062 contos de réis. Aonde

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ficou a sua theoria, feita a redacção do juro? Qual é o futuro que s. exa. preparava?

Pois reduzia quanto pôde o juro da divida, veiu ao parlamento apresentar um orçamento com um deficit de 5:000 e tantos contos de réis, e vem increpar-me hoje, porque em seguida á redacção dos juros não desappareceram os deficits?

Quer o illustre deputado saber o que depois aconteceu? S. exa. depois da redacção dos juros, previa que para 1893-1894 havia de apparecer um deficit superior a 5:000 contos de réis, mas como saiu do governo, deixando o orçamento em aberto, procedemos á sua rectificação, cortamos quanto podemos nas despezas do estado, fizemos as economias que nos foram possiveis, e apresentámos depois á camara um orçamento, em que o deficit total só reduziu a 1:555 contos de réis, ao contrario do que sempre se dava, em que o deficit calculado no orçamento, era sempre muito inferior ao que realmente se apurava das contas. (Apoiados.)

No anno de 1893 e 1894, em que o illustre deputado previa que o deficit devia ser superior a 5:000 contos de réis e que nós calculámos ainda, que se reduziria a 1:545 contos de réis, saldámos as contas, absolutamente sem deficit nenhum!

Foi isto resultado dos esforços do illustre deputado?

Diz s. exa.: o deficit diminuiu, é verdade, mas diminuiu porque os juros se diminuiram? Um simples calculo de arithmetica.

De quanto era o deficit?

O deficit anterior fôra de 14:000 contos de réis.

Emquanto julga o illustre deputado que se cifra a reducção dos juros? Em 7:000 contos do réis? Então a eliminação do deficit foi devida aos 7:000 coutos de réis de redacção nos juros ? Isto deu já para metade, mas a outra metade onde foi buscar-se? Foi buscar-se ao desenvolvimento dos recursos da nação, ao sacrificio dos contribuintes e aos esforços de uma administração, quanto possivel, perseverante e economica. (Apoiados.) A isso é que foi devido aquelle resultado.

Agora vejâmos.

Diz o illustre deputado "qual será o deficit n'estes ultimos tres annos?" Vou dizer-lhe com os numeros exactos e precisos. O illustre deputado fallou-nos muito nas receitas e nas despezas; disse-nos, e é verdade, que por um lado, as despezas têem crescido em 9:000 contos de réis, e por outro lado se inscreveram no orçamento, como sendo receita, verbas que o não são, que não correspondem a rendimentos do estado!

Disse-nos, por exemplo, que 2:000 contos de réis que se vão basear aos cereaes representam receita proveniente da fome.

Quando é que se deixou de ir buscar receita á importação dos cereaes? Quando é que o illustre deputado viu o paiz tão rico de producção cerealifera, que chegasse por completo para o seu consumo e que tomasse desnecessaria a importação ?!

É de agora, que a importação dos cereaes vem saldar o deficit da producção do paiz ? É isto que s. exa. diz ser o augmento da fome?

O illustre deputado sabe que, se ha paiz onde a producção cerealifera esteja garantida, é entre nós. Se a cultura cerealifera não dá o sufficiente para o consumo, a importação é uma necessidade, mas o que não é, é uma restricção imposta pelo governo, que aniquile essa producção ou impeça o seu desenvolvimento.

A propriedade, diz o illustre deputado, está hoje por tal fórma sobrecarregada, não só com o imposto predial, mas tambem com a contribuição de registo e real de agua, que não é á propriedade que podemos buscar o saldo da receita sobre a despeza Onde é que s. exa. viu, em proposta do governo, outra cousa que não fosse o desejo de tornar mais facil a liquidação do rendimento collectavel
da propriedade? Viu uma remodelação do systema de tributar a propriedade, mas o que não viu foi um augmento tributario que podesse esterilisar o seu desenvolvimento.

Disse ainda o illustre deputado que no orçamento que vamos votar não estão despezas que já existem. Peço perdão, o augmento que se votou acerca da policia está no orçamento; as despezas resultantes das pensões concedidas estão tambem no orçamento; não sei, portanto, quaes são as despezas que ali não estejam descriptas.

Diz s. exa. que ha ainda a acrescentar as despezas que resultam dos jubileus, é a palavra consagrada de s. exa. e que por ser já tão nossa conhecida se deve tirar-lhe o chapéu, dos jubileus da caixa geral de depositos e do pessoal de fazenda.

a caixa geral de depositos onde é que s. exa. viu augmento de despeza?

Encontra um quadro perfeitamente similhante ao que existia, com umas ligeiras modificações.

No pessoal de fazenda ha de certo augmento de despeza, mas economias como s. exa. fez com esse pessoal, não sei eu fazer. Ir ao pessoal de fazenda, deitar metade fóra, tornar impossivel o cumprimento do serviço relativo ao lançamento da contribuição directa, sem que haja de lhe acudir com despezas extraordinarias, sob pena dos cofres não se abrirem em tempo competente, francamente, d'estas economias não sei fazer.

Comparemos a receita e despeza, e note-se que eu não quero comparar a receita extraordinaria. As despezas comparo-as todas, mas as receitas não quero comparar senão as normaes do estado.

Em 1891-1892 a receita foi de 37:609 contos de réis; e em 1894-1895, de 47:893 contos de réis; ha por consequencia 10:284 contos da réis no augmento das receitas em tres annos.

Agora as despezas. No que toca ás despezas dos ministerios, aquellas onde as economias se podem mais facilmente produzir, em 1891-1892 importaram em 26:322 contos de réis. Em 1894-1895, pensariam todos que iria achar-se um augmento extraordinario, visto o que s. exa. nos descreveu, porque é evidente que crescendo as receitas, a não ser que as despezas cresçam ainda mais, não caminhamos para aquelle sorvedouro a cuja beira o illustre deputado nos descreveu. Não só, porém, não ha augmento de 1891-1892 para 1894-1895, na totalidade das despezas ordinarias e extraordinarias dos ministerios, mas ho uma diminuição de 1:696 contos de réis.

Ágora interrogo eu a propria consciencia da camara. Se n'estes ultimos tres annos da nossa administração as receitas ordinarias cresceram em 10:284 contos de réis, e as despezas dos ministerios, onde as economias se podem effectuar, diminuiram 1:696 contos de réis, é para um sorvedouro que caminhamos, para um desastre financeiro que vamos ?

É isso o que s. exa. vê diante de si?

Então s. exa. vê imminente um desastre financeiro,, um abysmo que o aterra, de que já mal podemos afastar-nos, e não se aterrava quando em 1891-1892 encontrava em confronto d'essa receita com essa despeza 14:653 contos de réis de desequilibrio, e em 1894-1895 encontra um saldo positivo de 29 contos de réis.

Diz o illustre deputado: "Mas para isso como temos nós vivido? Temos vivido quasi unica e exclusivamente do banco de Portugal, que foi, tem sido e é o nosso unico auxiliar". Pois bem, vamos ás contas do banco de Portugal.

O illustre deputado encontrou, em 27 do janeiro de 1892, pouco depois de tomar á presidencia do conselho de ministros, na conta do banco de Portugal, por contratos, 13:931 contos de réis, e, em 22 de fevereiro de 1893, quando saiu, a importancia do debito do governo ao banco por esses contratos era de 22:257 contos de réis; augmentou, portanto, esse debito durante os doze ou treze mezes da sua gerencia, em 8:326 contos de réis.

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A conta corrente encontrou-a o illustre deputado em 5:645 contos de réis, e deixou-a em 10:151 contos de réis, augmentando-a, por consequencia, em 4:506 contos de réis.

O debito do thesouro durante a gerencia do illustre deputado, cresceu, portanto, para com o banco de Portugal 13:332 pontos de réis.

Deduzindo d'esta verba 4:198 contos de réis de bilhetes do thesouro que o illustre deputado amortisou, fica o augmento do debito para com o banco de Portugal, por contrato, conta corrente e bilhetes do thesouro, em 9:134 contos de réis 'n'um anno.

Nós entrámos em 22 de fevereiro de 1893 e a situação que encontrámos foi a seguinte:

(Leu)

N'estes tres annos o augmento de todo o debito do governo para cota o banco, por contrato, contas correntes, bilhetes do thesouro e tudo, é de 2:319 contos de réis, tendo pago aos bancos do Porto 2:453 contos de réis.

Isto mostra que a situação da fazenda publica, que tão gravosa foi durante a gerencia do illustre deputado, deve ter singularmente melhorado n'estes ultimos tempos.

O augmento do debito do governo para com o banco elevou-se a 8:054 contos de réis, mas com a transferencia das contas das classes inactivas para o banco de Portugal, é natural que esse augmento desappareça.

E a circulação fiduciaria! O illustre deputado contesta que a situação economica do paiz tenha melhorado, mas eu não preciso, para o demonstrar, melhor testemunho do que o do illustre deputado.

O illustre deputado não era só presidente do conselho, geria a pasta da fazenda, e quando fez o contrato com o banco de Portugal, na negociação d'esse contrato escreveu estas palavras memoraveis:

(Leu.)

O illustre deputado promettia aqui propor ao parlamento que a circulação fiduciaria se podesse elevar tanto quanto necessario fosse para occorrer aos encargos e ao desequilibrio entre as receitas e as despezas até 30 de junho de 1894. Cumpriu a sua palavra, trazendo á camara a proposta de lei, que é a seguinte :

(Leu.)

Quer dizer, que em janeiro de 1893 o illustre deputado presumia que era necessario que a circulação fiduciaria se elevasse a 72:000 contos de réis, para se poderem equilibrar todos os encargos até 30 de junho de 1894. Estamos em abril de 1896, e a circulação fiduciaria está em 53:000 e tantos contos de réis!

(Vozes: - Muito bem.)

Segundo o illustre deputado, feita a reducção dos juros, ou o governo não tinha computado bem essa reducção, e se havia enganado, decretando aquillo que o paiz não podia pagar, ou os definis deviam desapparecer.

O illustre deputado fixou no decreto de 13 de junho o montante a pagar pela divida externa; parecia, portanto, que o deficit devia desapparecer, ou s. exa. se tinha enganado no decreto que publicou. O decreto é de 13 de junho de 1892, e em janeiro de 1893 vinha s. exa. pedir que a circulação fiduciaria podesse ser elevada a 72:000 contos de réis, só para occorrer aos encargos até ao fim do anno de 1893-1894. A reducção dos juros desapparecia ante a enormidade do deficit que s. exa. previa, a não ser que augmontasse a circulação até áquelle limite extremo com que só podia contar, porque só com o banco se tem vivido hontem e hoje, e com elle se viverá ámanhã.

Para que me fez s. exa. recordar estas cousas que eu não queria trazer á camara!

Não é a sua administração financeira que eu quero censurar, creia-o s. exa. Eu sei bem, por experiencia, que quem está n'estes logares, e tem estas se não faz melhor é por que não póde. Quem tem, porém, responsabilidades pesadas, quem geriu n'uma epocha difficil, quem lactou com embaraços grandes, e, apesar d'isso, depois de ter reduzido os juros da divida, deixou continuar a subsistir os deficits em tão larga escala, appellando, como recurso extremo, para o augmento da circulação fiduciaria, não deve vir increpar os seus successores, quando os deficits desapparecem e a circulação fiduciaria se conserva nos limites em que está. (Apoiados.)

Vamos agora á divida fluctuante.

O illustre deputado veiu dizer-nos que no mappa annexo ao meu relatorio de fazenda eu dava a divida fluctuante em 31 de dezembro de 1892 como sendo de 27:000 contos de réis, e porque em 30 do junho se reduzia a 18:000 contos de réis, que era necessario que a camara attentasse em que esta diminuição não era este governo que a tinha feito, porque quando elle entrou em 22 de fevereiro de 1893 estava a divida fluctuante era 18:000 contos de réis.

Parecia, ao ouvir o illustre deputado, que elle queria chamar para si a conquista, do largo alcance, de ter elle no curto espaço, que medeou de 31 de dezembro a 23 de fevereiro, reduzido a divida fluctuante de 27:000 a 18:000 contos de réis. Sabe a camara como elle a reduziu? Reduziu, levantando um emprestimo no banco de Portugal de 8:000 contos de réis para consolidar os escriptos do thesouro, divida do governo ao banco que estava envolvida n'aquelles 27:000 contos de réis, e então, é claro, que reduziu a divida de dezembro e fevereiro na epocha em que as entradas são muito maiores, porque é então que se arrecadam as contribuições directas.

Desde que s. exa. levantou um emprestimo para consolidar ou amortisar a divida fluctuante, é claro que com as entradas que recebeu dos impostos directos, e com os 8:000 contos de réis do emprestimo, reduziu a divida fluctuante de 27:000 a 18:000 contos de réis.

Foi bem, foi mal, não sei; mas o que de certo não foi, foi uma conquista financeira.

Mas, agora façamos a conta muito singelamente, e, repito, isto não é para aggravar o illustre deputado, nem desmerecer os seus bons esforços como ministro da fazenda, nem para o melindrar em cousa alguma, porque sou o primeiro a prestar inteiro preito e homenagem da alta consideração em que tenho as qualidades de estadista que todo o paiz lhe reconhece, mas são os factos, e os factos a cuja enumeração não posso faltar, desde que é s. exa. que a isso me obriga.

Ora, os factos são estes. S. exa. entrou em 1892. Em 31 de dezembro de 1891 a divida fluctuante era de 21:858 contos de réis; havia em cofre 1:836 contos de réis; portanto, a divida fluctuante, feita a deducção d'este dinheiro em caixa, era do 20:022 contos de réis. Em 22 de fevereiro de 1893 era de 18:413 contos de réis; havia em cofre 2:342 contos de réis; portanto, a divida fluctuante era de 16:071 contos de réis.

Quem olhar para estes simples numeros diz: que excellente administração! Em pouco mais de um anno reduziu a divida fluctuante a 3:951 contos de réis! Recebeu-a em 20:000 contos de réis e deixou-a em 16:000 contos de réis!

Vamos a ver como isto foi. Foi levantando 8:000 contos de réis do banco de Portugal, a que já me referi, para com elles amortisar a divida fluctuante, e fazendo outras operações na importancia de 4:539 contos de réis, o que dá uma totalidade de 12:539 contos de réis.

D'aqui resulta que o augmento liquido da divida fluctuante, durante a administração inteira do illustre deputado, foi de 8:588 contos de réis. Foi isto por que s. exa. não empregasse todo o seu zêlo, actividade e intelligencia em amparar os recursos do estado, minorar as despezas e sustentar a situação financeira? Não.

Se eu poder demonstrar que, durante todo o tempo da nossa administração, a esses 8:588 contos de réis de augmento da divida fluctuante em dois annos tem succedido um augmento realmente, pequeno na mesma divida, terei conseguido provar a unica cousa que tenho em vista, a

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vem a ser que o paiz prospera e a situação financeira é muito melhor do que era. (Apoiados.)

Nós encontrámos com effeito em 22 do fevereiro de 1893 os 18:403 contos de réis da divida fluctuante; deduzidos 2:342 contos do réis, tomos um total liquido de 16:061 contos de réis. Em 20 de fevereiro d'este anno, já vê que vou até bem perto, a divida fluctuante estava em 27:074 contos de réis, existindo em cofre 3:500 contos de réis, e havendo por consequencia um augmento do 7:513 contos de réis, o que, addicionando-se a venda do titulos na importancia de 2:250 contos de réis, perfaz 9:708 contos do réis. Pagamos o seguinte:

(Leu.)

Portanto, em tres annos 3:788 contos de réis, o que não admira, porque n'outros tres annos a primeira parto é relativa a um anno em que o deficit foi de 6:000 e tantos contos de réis, aquelle em que o illustre deputado deixou de ser ministro e nós assumimos a dictadura, havendo ainda uma parte que esta correndo, de 30 de junho até 20 de fevereiro, que é de um anno ainda não apurado e até 31 de dezembro, exactamente a parte mais gravosa d'esse anno, porque o primeiro semestre do anno economico é sempre aquelle em que as despezas estão em peior confronto com as receitas.

Se s. exa. fizesse a comparação nitida, havia de achar que nos doze ou treze mezes da sua gerencia a divida fluctuante se elevava a 7:638 contos de réis. Descontando mesmo o coupon, em tres annos, a divida fluctuante augmentou n'aquillo que póde representar desproporção entre a receita e a despeza, 3:788 contos de réis, dos quaes tuna parte corresponde aos annos em que houve deficit.

Parece, portanto, que s. exa., com o seu espirito justiceiro, com aquella imparcialidade que lhe é caracteristica, não poderá deixar de reconhecer que a situação financeira é hoje consideravelmente melhor do que era na gerencia de s. exa.

Posto isto, como a hora está adiantada e ou não desejo levar a palavra para casa, passo á segunda parte, a liquidação das responsabilidades.

e o illustre deputado se tivesse limitado a defender-se a si proprio de quaesquer aggressões que julgasse serem-lhe imputadas, eu deixava-o na sua defeza, mas s. exa. começou por dizer que era sestro meu insinuar as cousas mais desagradaveis contra os seus actos de administração, quando, pelo contrario, a camara tem visto a inteira justiça que tenho feito ao illustre deputado. (Apoiados.) Digo mais, insinuações não posso fazer nunca, porque não estão nos meus habitos; cito factos, tiro conclusões e digo a verdade real e clara, mas franca e lealmente. Não escondo, mas não insinuo. Quando entender que o illustre deputado commetteu um erro, digo-lh'o, mas digo-lh'o desprendido de tudo.

Simplesmente, não sei porque, o illustre deputado vive n'uma constante desconfiança de tudo e do todos, que até foi buscar a palavras do meu relatorio de fazenda sentidos e intenções que absolutamente n'ellas se não contêem. Vão ver.

O que o illustre deputado fez, o que se poderia ter liquidado por uma pergunta, a que corresponderia uma resposta singela da minha parte, foi trazer para a discussão factos, em que me obriga absolutamente á liquidação de responsabilidades minhas, e á demonstração do que s. exa. fez quanto á divida externa, e do que nós fizemos. A culpa d'isso, não é minha. Vamos, pois, a este ponto.

O illustre deputado doeu-se porque no meu relatorio de fazenda encontrou a seguinte phrase:

" Inovada a negociação do convenio, ingrata e laboriosa como foi, até á sua conclusão, não o confirmou o governo de então, publicando o decreto do 16 de junho de 1892, que, ato ulterior resolução das côrtes, reduziu a um terço em oiro o pagamento dos juros da divida externa."

E mais nada contém este periodo.

Pergunto, ha aqui alguma insinuação?!

Ha porventura outra cousa que não seja a exposição do facto?

Póde o illustre deputado doer-se, porque eu lh'o cite? Só se é o proprio facto que lhe dóe. Todavia eu podia dizer mais; eu podia dizer que, francamente, teria achado muito preferivel, desde que s. exa. se convenceu, porque então já tinha todos os dados financeiros na mão, de que o paiz não podia pagar o terço, ou aquillo a que o convenio obrigava, que era muito mais regular, não direi mais correcto, porque correcto é sempre o illustre deputado, mas mais conforme com a maneira porque eu procederia se estivesse no logar do illustre deputado, dizer - Não estou de accordo.

Deixar, porém, correr todas as negociações até ao ponto da assignatura do contrato, quando tudo já estava completo e perfeito, para só então renegar as responsabilidades d'aquelle acto e dizer que não approvava, francamente, pareceu-me cruel para quem, com tanto esforço seu e com sacrificio da sua saude, bem ou mal, tinha ido prestar serviço importante ao paiz. (Apoiados.)

Mas não era só o negociador que teria, porventura, rasão para se doer do procedimento do illustre deputado, eram os proprios credores. Quer o illustre deputado ver? Quer v. exa. ver como a culpa é sua? Esta, por certo, não é minha.

Em 13 de maio de 1802, pouco depois do illustre presidente do conselho de então, por isso que discordara da maneira de proceder do seu collega Oliveira Martins, ter assumido a gerencia da pasta da fazenda, mandava um telegramma ás nossas legações em Londres, Haya, Paria e Berlim, em que se dizia:

(Leu.)

Era o illustre deputado que, por parte do governo, annunciava que, na falta do convenio, os credores externos seriam absolutamente equiparados aos credores nacionaes e que em 13 de junho publicava um decreto pelo qual pagava aos credores externos um terço em oiro e aos nacionaes 70 por cento.

S. exa. achava isto consentaneo com a fórma de proceder que melhor se podia insinuar no espirito d'aquelles que tinham vindo concorrer com o seu dinheiro aos emprestimos levantados para satisfazer as exigencias da nossa administração.

Prosegue o illustre deputado e lê mais um periodo que diz o seguinte: "Então bem presentes á memoria do todos as reclamações que esse decreto despertou, tão vivas e instantes ellas foram por parte dos credores estrangeiros e de seus governos". E diz o illustre deputado, mas onde estão essas reclamações? Quando vieram? Quando s. exa. os trouxe, pois na commissão da fazenda que se reuniu n'aquella epocha dava conta da existencia d'essas reclamações.

Se ainda hoje s. exa. disse que houve uma reclamação grave, violenta, da parte do governo allemão; como se admira que eu falle das reclamações que o sou decreto provocou?

Mas, diz o illustre deputado, o que se segue a este periodo é ainda peior.

"De todas essas reclamações, o fundamento persistente, acrimonioso, ora que o governo portuguez, por acto exclusivamente seu, sem audiencia e conformidade dos interessados, lhes impunha uma resolução arbitraria o injusta, estabelecendo para os credores nacionaes condições muito mais vantajosas; ao passo que os portadores da divida interna recebiam 70 por cento dos seus jurus, aos da divida externa se concedia apenas um terço, 33,3 por cento do seu coupon, em oiro é verdade, mas sem que o agio cambial, embora então gravoso, perfizesse a differença, e, por tanto, a explicasse."

O illustre deputado contesta o facto? Assevera quo não é este o fundamento das reclamações? Se não assevera, o

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que é que encontra n'este periodo que porventura o possa molestar? A isto, porém, contrapõe o illustre deputado um argumento, que é o seguinte.

O governo publicando o decreto de 13 de junho de 1892 deu a faculdade de converter os titulos externos em internos e ahi estava a equiparação. A equiparação? Então aos credores externos que gosavam de umas certas garantias e sobretudo da cotação nas praças estrangeiras, que os internos não tinham, é que o illustre deputado offerecia a conversão em titulos internos julgando que elles prefeririam essa conversão a estarem ao abrigo da protecção dos seus governos e a terem titulos que tinham nas bolsas a que concorriam cotação especial que os internos não tinham!

O que mais revolta, porém, o illustre deputado é ainda um periodo que se segue. Parece que cada periodo é um golpe fundo que eu vibro ao illustre deputado. Esse período diz:

"E assim, muito a custo, conseguiu o governo actual fazer acceitar, como meio immediato de conciliação, o regimen que se acha consignado na lei de .20 de maio de 1893, dando-se aos credores externos um terço em oiro, e abrindo-se-lhes partilha, por metade, na differença que para menos de 22 por cento se obtivesse, de futuro, no encargo da transferencia de oiro para pagamento da parte do coupon destinado ao estrangeiro, e no que as receitas aduaneiras, tabacos e cereaes exceptuados, produzissem a mais de 11:400 contos de réis, até que por estas participações se desse, no pagamento de juros, completa equiparação de credores internos e externos, revertendo para todos, desde então, o que mais se apurasse; sempre a equiparação de todos os credores do estado, como deside-ratum de justiça, para que se devia caminhar."

É isto que o illustre deputado não consente; nem que possa dizer se que foi a custo que o governo conseguiu fazer acceitar a lei de 1893, nem que esta lei foi um meio immediato de conciliação. Porque? Porque, diz o illustre deputado, o governo durante todo o tempo que mediou entre 22 de fevereiro, quando veiu ao poder, e a promulgação da lei de 1893, tergiversou, ora offerecendo um quarto, ora fallando em titulos da divida differida para a final de contas vir a cair na lei de 1893, que ha de ser uma mina para o governo.

Deixe-me dizer ao illustre deputado; que se comece n'uma negociação por offerecer um quarto, depois se fixe terço e ainda vantagem n'um melhoramento futuro da situação da fazenda publica, exactamente para os credores verem que a garantia é seria e que o paiz está disposto a pagar tudo que razoavelmente possa pagar para sustentar a honra e o brio dos seus compromissos financeiros, comprehende-se; o que eu não comprehendo, o defeito é talvez da minha intelligencia, é que s. exa. tendo annunciado que dava 50 por cento, porque os não acceitaram, julgasse que podia impor pela força um terço. Isso quando se lida com credores estrangeiros, que têem a fé dos nossos contratos e a protecção dos seus governos, é que provocou as reclamações violentas que pesaram sobre nós. Não fui eu que as provoquei.

Muito a custo, diz s. exa. Muito a custo, é certo. Pedimos o adiamento das côrtes porque achámos uma situação insustentavel em relação á nossa divida externa, que era necessario liquidar. Achar uma solução que se impõe como acto de força dentro do paiz, ainda póde ter alguma efficacia; mas em relação áquelles que têem a protecção dos governantes estrangeiros, que vêem sobre nós com reclamações e nos causam embaraços na vida interna e até na necessidade instante que tem o nosso commercio de nas suas transacções recorrer ás praças estrangeiras, é que, francamente, um governo que medianamente reflectisse n'este estado de cousas, não podia deixar passar.

A verdade é que nós estavamos n'uma situação desesperada, viamos as dificuldades, os embaraços e a falta de recursos e de meios para occorrer aos encargos da nossa divida.

Em virtude do rompimento, começaram as animadversões mais intransigentes, os doestos os mais violentos, as apreciações os mais desagradaveis na imprensa estrangeira ácerca do estado das nossas cousas. Tinhamos a certeza de que assim não podiamos sair das dificuldades em que nos encontravamos e que emquanto não achassemos uma solução, não podiamos descansar um minuto.

E sabe a camara qual foi o nosso erro, o nosso grande erro, no dizer do illustre deputado? Eu ouvi-o, e ainda me parece impossivel, tão estranho acho a sua doutrina e tão paradoxal a sua affirmação.

Permitta-me o illustre deputado, que lhe diga, que achei extraordinaria e funambulesca a sua declaração.

O grave erro, foi termos resolvido a questão da divida externa, a correr, logo em 1893!

Ora, em primeiro logar, sabe o illustre deputado quem foi o primeiro culpado d'esse grande erro que praticamos? Foi s. exa.

Quer ver como ?

O illustre deputado publicou o decreto de 13 de junho, e com a sua auctoridade de ministro d'estado, que representa o governo de uma nação, ante os credores estrangeiros, declarou no artigo l.º o seguinte:

" Artigo 1.° Os juros dos títulos da divida publica fundada externa, tanto consolidada como amortisavel, que se vencerem, a datar da publicação d'este decreto, serão pagos pelas actuaes agencias do governo nos paizes estrangeiros na rasão de um terço da respectiva importancia. Esta providencia é provisoria, subsistindo assim até ulterior resolução do poder legislativo na primeira reunião das côrtes geraes."

Pois o illustre deputado, com a auctoridade que lhe imprime o seu caracter de presidente do conselho e ministro a fazenda, faz a affirmação clara e peremptoria de que o pagamento de um torço era só até que as côrtes resolvessem, na sua primeira reunião, e nós nem sequer ficava-mos com o decreto de 13 de junho, que o illustre deputado tinha dito, que não caducava!

Mas eu não preciso da responsabilidade do illustre deputado e prescindo até da affirmação que fez. É sua a responsabilidade, fique com ella. Eu tenho as minhas e essas as liquido tambem.

Que o illustre deputado, porém, tivesse ou não dito isto no seu decreto, para mim era exactamente o mesmo.

Desde o momento em que eu encontrara uma situação fazendaria afflictiva. porque o era, em presença de reclamações que nos vinham de cinco nações estrangeiras com as quaes precisavamos viver em boa harmonia e precisando nós liquidar essa questão para que tivessemos credito e podessemos desenvolver as nossas transacções, activar a nossa vida commercial e industrial, o nosso movimento, a nossa acção, emfim, queria s. exa. que adormecessemos sobre uma situação assim pungente, pozesse-mos de parte uma questão tão apertada, e reabrissemos o parlamento, sem ao menos podermos dizer como se resolvia a questão da divida externa? É esse o pensamento de s. exa.? Oh! sr. presidente, que estranha revelação veiu fazer o illustre deputado!

Como toda a gente comprehendo o que teria succedido-se elle tivesse continuado na gerencia da pasta da fazenda! Ainda até hoje, tendo decorrido tres annos, estaria a questão da divida externa sem solução.

Quer s. exa. saber, e com isto termino, qual foi o resultado do grave erro que praticamos de ter resolvido a questão da divida externa? Foi que ao acabar a sua gerencia, em fevereiro de 1893, os nossos fundos cotaram-se lá fóra de rastos, a 21 31/32 e 20 17/32 e hoje cotam-se a 27, com esperanças de alta. Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi muito comprimentado.)

(S. exa. não reviu o seu discurso.)

Página 984

984 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

sr. Adriano da costa: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda modificando o regimen aduaneiro cm vigor para o milho produzido em Cabo Verde.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a mesma que vinha para hoje e mais os projectos n.os 44, 45, 46 e 47.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e vinte minutos.

Documentos enviados para a mesa n'esta sessão

Representações

Dos ex-arbitradores judiciaes da comarca da Povoação, ilha de S. Miguel, contra o decreto de 15 de setembro de 1892, que revogou o artigo 37.° do decreto de 20 de julho de 1886 e regulamento de 17 de marco de 1887.

Apresentada pelo sr. deputado F. J. Patricio, e enviada á commissão de legislação civil.

Dos recebedores do districto de Beja, pedindo que não seja convertida em lei a nova caução, da decima parte de toda a cobrança realisada durante o anno.

Apresentada pelo sr. deputado Mendes Lima, e enviada á commissão de fazenda.

De empregados do quadro do serviço interno das alfandegas, pedindo que seja alterado o artigo 73.° do decreto de 27 de setembro de 1894, no sentido de continuarem a ser garantidos aos empregados aduaneiros, com direitos adquiridos, as diversas classes de aposentações, servindo de base para o calculo das pensões, no que toca a emolumentos, os que correspondem ao vencimento de categoria, e no que toca a ordenado os preceitos do decreto n.º 1, de 17 de julho de 1886.

Apresentada pelo sr. deputado Mello e Sousa, e enviada á commissão de fazenda.

Dos escrivães dos juizes de paz das comarcas de Lisboa e Porto, pedindo que seja promulgada uma lei em que, estabelecendo-se a fórma do processo para despejo, estes sejam da competencia dos juizes de paz.

Apresentada pelo sr. deputado Victor dos Santos, e enviada á commissão de legislação civil.

Justificações de faltas

Encarregou-me o illustre deputado o sr. Alfredo de Moraes Carvalho de participar que por motivo justificado não tem podido vir ás sessões, e que ainda por alguns dias não lhe será possivel comparecer. = O deputado, F. J. Patricio.

Tenho a honra de participar a v. exa. e á camara que por motivos justificados faltei ás ultimas sessões. = O deputado, Carlos Braga.

Participo a v. exa. e á camara que faltei a algumas sessões por motivo de doença. = O deputado, Adolpho Guimarães.

Declaro a v. exa. que faltei a sessão do dia 11 de por motivo justificado. = O deputado, Ferreira da Cunha.

Participo a v. exa. e á camara que por incommodo de saude faltei ás ultimas quatro sessões. = O deputado, D. José Gil Borja Macedo e Menezes.

Participo a v. exa. que faltei a algumas sessões por motivo justificado. = O deputado, Albino de Figueiredo.

Participo a v. exa. algumas sessões. = O deputado, Visconde de Nandufe.

Para a secretaria.

O redactor = Sá Nogueira.

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