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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputaco Pedroso dos Santos, pronunciado na sessão de 30 de maio, o que devera publicar-se a pag. 813 d'este Diario.

O sr. Pedroso dos Santos: — Se não occupasse uma posição especial n'esta casa, limitar-me-ía a votar em silencio o projecto em discussão, sem crear embaraço algum á votação, que elle ha de obter da camara. E todavia entendo que vae votar-se um projecto mau, e entendo assim, porque a primeira necessidade que tem um parlamento e a de fazer respeitar as suas leis, quando ellas são exequiveis. Se o não são, este prurido de querer reformar as leis, amontoando umas sobre outras, traz-nos gravissimos males, e não serve senão para pejar a collecção da legislação com providencias que se não cumprem nem executam (apoiados).

Quando está em vigor uma lei, que representa um systema de registo predial, bom ou mau, consentaneo ou não consentaneo, e os governos vem continuadamente pedir e obter prorogações repetidas para a execução das leis promulgadas, entendo que o parlamento até certo ponto se exautora, porque é o primeiro a reconhecer que as leis que elle faz nem são opportunas, nem convenientes, o primeiro a reconhecer que as leis que vota não estão nas condições de execução (apoiados),

A segunda rasão por que este projecto me parece mau, é porque, se o systema de registo em vigor é harmonico, se assenta sobre certos principios e certas bases que lhe servem de fundamento, é preciso não mutila-lo nem desfigura-lo. Desde o momento em que o legislador estabeleceu a instituição do registo da propriedade e seus encargos, e não podem derivar d'essa instituição as consequencias uteis, para que foi creada; se por um lado esse systema foi creado para garantir direitos e mobiliser o credito predial, e por outro lado o legislador está empenhado em prejudicar os effeitos salutares que d'essa instituição deviam resultar, é bem manifesta a rasão que me assiste para taxar de mau o projecto em discussão.

Demais, se a lei julga precisas as conservatorias e indispensavel o conservador; se creou novas funcções publicas e novas attribuições a um funccionario encarregado de escrever a historia da propriedade e dos seus encargos n'este paiz, é justo e consequente que ao trabalho correspondam os meios de vida honrada e honesta, para não succeder que ou o serviço soffra as consequencias da miseria, ou se force o servidor publico a resvalar pelo declive da indigencia até ás raias do abuso. Isto em these.

Apesar, porém, de todos os males e defeitos que resultam da continuação d'este estado de cousas, sendo approvado o projecto, eu não tenho duvida em o votar, desde que o governo vem dizer a esta casa, que periclitam os interesses da fazenda publica, os das corporações de mãe morta, os das camaras municipaes e as dos particulares, se o praso para o registo se não prorogar.

Em presença de uma somma tal de prejuizos em cuja realidade acredito eu, obedecendo e curvando-me ante a força das circumstancias, e este é o dever do homem politico, aceito resignadamente a nova prorogação. Mas provoco, não digo bem, peço e insto com o sr. ministro da justiça, para que declare categoricamente á camara, que da parte de s. ex.ª e do governo hão de

empenhar-se todos os esforços ao seu alcance, todos os meios possiveis e compativeis, dentro da esphera das suas attribuições, para que este praso seja o ultimo (apoiados), a fim de que os responsaveis para com a fazenda publica, as corporações de mão morta, e as camaras municipaes promovam activamente os competentes registos, que lhes dizem respeito, e o proprio governo não durma negligentemente sobre o caso.

Se eu sou obrigado a reconhecer que ás circumstancias especiaes do povo é devida a falta de titulos que justifiquem a propriedade para registo, e se por isso sou igualmente obrigado a aceitar e votar o projecto que se discute, é força confessar que muito se deve attribuir ao desleixo e á falta de fé, nas vantagens do systema do registo predial e hypothecario, que nem todos comprehendem, e que muitos olham avessamente. O não se ter cumprido a lei, deixando chegar á porta a ultimação do praso já prorogado, e confiando se que os governos hão de propor successivas prorogações (apoiados),

Sr. presidente, eu vi que em 20 de dezembro do anno passado, sendo presidente do conselho de ministros o sr. marquez d'Avila e Bolama, e ministro da justiça o nosso respeitavel collega e meu particular amigo, o sr. Saraiva de Carvalho, s. ex.ª, apresentando uma proposta de lei á camara sobre este assumpto, disse: que eram diversas as causas que se oppunham a que a instituição do registo predial correspondesse ao fim salutar a que era destinada.

Dizia s. ex.ª: «O praso para o registo dos encargos, que oneram a propriedade, nomeadamente das antigas hypothecas tacitas ainda se não encerrou, o que importa a incerteza da propriedade e com a incerteza a attenuação do credito. Confio entretanto em que terão termo as continuas prorogações no proximo mez de março; pelo menos o governo põe n'esse empenho a mais severa diligencia».

S. ex.ª então, em 20 de dezembro, acreditava que até ao proximo mez de março se venceriam todos os obstaculos; e todavia o governo, em fevereiro d'este anno, apesar das serias diligencias empregadas para debellar essas difficuldades, publicava um decreto dictactorial, prorogando o praso para o registo de varios onus reaes, e vem agora pedir um bill de indemnidade para esse acto de dictadura, limitando-se a dizer que subsistem as difficuldades, principalmente as que se referem á falta de relações authenticas para o registo se poder fazer.

A falta de relações authenticas, em vista das disposições do ultimo regulamento do registo predial que cortou por muitas difficuldades é facil de supprir, porque o registo dos fóros póde fazer-se inclusivamente sem titulos; em presença de declarações dos senhorios directos, em face das quaes se lança registo provisorio, fazendo-se depois os annuncios na folha official, e...

O sr. Visconde de Montariol: — Mas com sacrificio. Estas publicações no Diario do governo custam ás vezes 90$000 réis.

O Orador: — Nem tanto, mas seja o que for, em todo o caso ou não carecemos de uma lei de registo predial, ou não. Se precisâmos d'ella, façamos executar a que temos; se é desnecessaria, deroguemo-la totalmente.

Ou nós temos alguma cousa a esperar da lei de registo predial, ou para nada serve. No primeiro caso façamo-la cumprir; se não temos nada a esperar d'ella, acabemos com a instituição, acabemos com as conservatorias, deixemo-nos de registo da propriedade, não nos importemos com a mobilisação do credito real nem com as vantagens que d'ahi podem advir para a mesma propriedade. (Vozes: — Muito bem.)

Sr. presidente, o sr. ministro da justiça, obedecendo á necessidade imperiosa das circumstancias em que nos achâmos, esqueceu-se, e n'esta parte não posso deixar de lamentar o seu esquecimento, de apresentar, como s. ex.ª, o sr. Saraiva de Carvalho, havia feito, o projecto complementar do systema do registo predial, projecto que é indispensavel para que o registo produza as suas naturaes e consideraveis vantagens.

Não basta a certeza da propriedade, não basta o conhecimento completo dos encargos a que ella está sujeita; é necessario tambem saber se o individuo, que quer contratar sobre certa propriedade, tem ou não tem a capacidade legal e juridica para o poder fazer, e é necessario que a incapacidade ou interdicção conste dos livros de registo.