O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 975

SESSÃO DE 3 DE ABRIL DE 1888

Presidencia do ex.mº sr. Francisco de Barros Coelho e Campos (vice-presidente)

Secretarios os srs.
Francisco José de Medeiros
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral

SUMMARIO

Um officio do ministerio da fazenda, acompanhando alguns documentos requeridos pelo sr. Moraes Carvalho. - Segunda leitura e admissão de quatro projectos de lei, sendo um do sr Oliveira Matos, tornando applicaveis a bibliotheca publica da universidade de Coimbra as disposições dos alvarás de 12 de setembro de 1805, 30 de dezembro de 1824 e 28 de maio de 1834; outro do sr Ferreira de Almeida, estabelecendo pensões para os alumnos das escolas de marinheiros que forem dados por incapazes, em consequencia do accidente ou desastre occorrido em serviço; outro do mesmo sr. deputado, auctorisando o governo a proceder á installação de estações e postos de soccorros a naufragos, e a despender até á quantia de 10.000$000 réis annunes com a installação das mesmas estações e postos, e com o seu custeio annual; e, finalmente, um do sr. conde de Castello de Pana e Antonio Maria de Carvalho, determinando que a igreja, coros, ante-coros e suas dependencias, paramentos e alfaias, reliquias e imagens de santos, e mais objectos de culto, do extincto convento de Arouca, sejam concedidos á junta de parochia da freguezia de S. Bartholomeu d'aquella villa, e que a casa denominada «dos Padres» e quintal adjunto, pertença do mesmo convento, sejam concedidos á irmandade da misericordia da mesma villa - Representação da camara municipal do concelho de S Pedro do Sul, apresentada pelo sr. Fuschini. - Requerimentos de interesse publico mandados para a mesa pelos srs Jacinto Candido e Antonio Maria de Carvalho, e um de interesse particular apresentado pelo sr. Alfredo Brandão - Justificações de faltas dos srs. Francisco de Medeiros e Sá Nogueira.- O sr. Carlos Lobo d'Avila apresenta dois pareceres a commissão dos negocios externos. - O Br. Baptista de Sousa refere se novamente ás accusações feitas ao escrivão de fazenda de Santa Martha de Penaguião e á respectiva commissão do recenseamento, no sentido de que não são exactas as informações recebidos pelo sr deputado Antonio de Azevedo Castello Branco - O sr. Santos Crespo participa a constituição da commissão de saude publica, e propõe que lhe seja aggregado o sr Martinho Tenreiro A camará approva - O sr. Jacinto Candido insta novamente com o governo para que acuda com providencias promptas. Relativamente ,á epidemia da variola que está grassando na ilha Terceira; occupa se em seguida de outros assumptos de interesse para os Açores. Responde-lhe detidamente o sr ministro da marmita. - O sr. Arroyo pede explicações ao sr. ministro da fazenda sobre uma noticia dada no jornal O popular, com respeito ao emprestimo destinado á conclusão da rede de estradas reaes e districtaes Responde-lhe o sr. ministro da fazenda - Por concessão da camara, usa novamente da palavra sobre o assumpto o sr. Arroyo, respondendo-lhe ainda o mesmo sr. ministro - O sr. Franco Castello Branco pergunta se o governo terá duvida em mandar á camara copias dos boletins mensaes dos rendimentos geraes dos ceraes e tabacos que as alfandegas de Lisboa e Porto remettem á administração geral das alfandegas Responde o sr. ministro da fazenda. - O sr. Fuschini pede, e a camara approva, que seja publicada no Diario do governo uma representação que mandou para a mesa.
Na ordem do dia continua o seu discurso, começado na sessão anterior, o sr. Arroyo, que combate com diversas considerações o projecto de lei que estabelece a régie para o fabrico dos tabacos. Fica com á palavra reservada.

Abertura da sessão - Ás duas horas e tres quartos da tarde.

Presentes á chamada 45 srs. deputados. São os seguintes: - Alfredo Brandão, Alfredo Pereira, Baptista de Sousa Mazziotti, Augusto Pimentel, Santos Crespo, Miranda Montenegro, Augusto Ribeiro, Bernardo Machado, Lobo d'Avila, Conde de Villa Real, Almeida e Brito, Francisco de Barros, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Gabriel Ramires, Sá Nogueira, Candido da Silva, Pires Villar, José Pina, Franco de Castello Branco, Izidro dos Reis, João Arroyo, Sousa Machado, Silva Cordeiro, Simões Ferreira, Barbosa Colen, Pereira de Matos, Ferreira de Almeida, Eça de Azevedo, Santos Moreira, Abreu e Sousa, Julio Graça, Julio de Vilhena, Vieira Lisboa, Poças Falcão, Bandeira Coelho, Manuel José Correia, Manuel José Vieira, Britó Fernandes, Marianno de Carvalho, Martinho Tenreiro, Miguel Dantas, Pedro Victor e Estrela Braga.

Entraram durante a sessão os srs. : - Moraes Carvalho, Mendes da Silva, Anselmo de Andrade, Alves da Fonseca, Sousa e Silva, Antonio Castello Branco, Campos Valdez, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Ribeiro Ferreira, Gomes Neto, Pereira Borges, Antonio Maria de Carvalho, Fontes Ganhado, Jalles, Pereira Carrilho. Barros e Sá, Augusto Fuschini, Conde de Castello de Paiva, Eduardo José Coelho, Elizeu Serpa, Madeira Pinto, Feliciano Teixeira, Mattoso Santos, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Castro Monteiro, Francisco Ravasco, Severino de Avelar, Frederico Arouca, Guilherinino de Barros, Sant'Anna e Vasconcellos, Baima de Bastos, Santiago Gouveia, Vieira de Castro, Rodrigues dos Santos, Alfredo Ribeiro, Joaquim da Veiga, Oliveira Martins, Jorge O'Neill, Avellar Machado, Dias Ferreira, Abreu Castello Branco, Laranjo, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhás, Alpoim, Oliveira Matos, José de Saldanha (D.), Pinto Mascarenhas, Lopó Vaz, Luiz José Dias, Manuel Espregueira, Manuel d'Assumpção, Marçal Pacheco, Marianno Prezado, Pedro Monteiro, Vicente Monteiro, Visconde de Monsaraz, Visconde de Silves, Wenceslau de Lima e Consiglieri Pedroso.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello, Serpa Pinto, Antonio Candido, Oliveira Pacheco, Antonio Ennes, Guimarães Pedrosa, Tavares Crespo, Moraes Sarmento, Simões dos Reis, Hintze Ribeiro, Victor dos Santos, Barão de Combarjúa, Conde de Fonte Bella, Eduardo de Abreu, Elvino de Brito, Emygdio Julio Navarro, Goes Pinto, Estevão de Oliveira, Fernando Coutinho (D.), Freios Branco, Francisco Mattoso, Fernandes Vaz, Lucena e Faro, Soares de Moura, Guilherme de Abreu, Casal Ribeiro, Cardoso Valente, Souto Rodrigues, Dias Gallas, Menezes Parreira, Teixeira de Vasconcellos, Correia Leal, Alves Matheus, Oliveira Valle, Joaquim Maria Leito, Jorge de Mello (D.), Amorim Novaes, Alves de Moura, Ferreira Galvão, José Castello Branco, Ruivo Godinho, Elias Garcia, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, José de Napoles, Ferreira Freire, José Maria de Andrade, Barbosa de Magalhães, Rodrigues de Carvalho, José Maria dos Santos, Simões Dias, Santos Reis, Julio Pires, Mancellos Periz, Pinheiro Chagas, Matheus de Azevedo, Miguel da Silveira, Pedro de Lencastre (D.), Sebastião Nobrega, Dantas Baracho e Visconde da Torre.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Alberto Antonio de Moraes Carvalho, notas dos tabacos, por especie, despachados, saídos e existentes nas fabricas de Lisboa e Porto, nos annos de 1886-1887.
Para a secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - Por fallecimento da ultima freira do convento de Arouca, ficou este extincto e seus bens encorporados nos proprios nacionaes.

56

Página 976

976 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Entre esses bens, que faziam parte ou eram pertença do mesmo convento, existe a respectiva igreja e suas dependencias, que com os paramentos e alfaias, relicarios e imagens de santos e mais objectos do culto, foi pedida pela junta de parochia da freguezia de S. Bartholomeu, d'aquella villa, e pela irmandade da Rainha Santa Mafalda, ali erecta, para igreja matriz da primeira o para exercicio do culto e desempenho dos demais encargos do compromisso ou estatutos da segunda d'aquellas corporações.
E bem assim existe, separada do mesmo convento, uma casa, denominada «dos padres», com um quintal junto, onde residiam os capellães e os procuradores das respectivas freiras, que foi pedida pela irmandade da misercordia, da mesma villa, para seu hospital, bem como, para uso d'este, todas as roupas de cama do mesmo extincto convento.
E porque, com effeito, como allegam aquellas corporações, a actual igreja matriz, por pequena e pobre, nem sequer póde conter todos os fieis que pretendem assistir aos officios divinos, e mal se presta ao exercicio do culto, ao passo que a igreja do convento, ampla e magestosa, se presta vantajosamente a tal fim, pelo que é de toda a conveniencia que se faça a concessão indicada aquellas corporações, que, ao mesmo tempo que se aproveitem d'aquelle templo e mais objectos para os fins indicados, d'elle cuidem e o conservem, como é preciso, e de que é garantia segura o numero e qualidade das pessoas, que formam a dita irmandade;
E porque a dita casa «dos padres» e respectivo quintal que a misericordia pede para seu hospital, bem como as roupas que pede para uso do mesmo,, não podem ter applicação mais util e humanitaria, habilitando assim aquella corporação a augmentar o numero das camas para doentes, com a economia do aluguer da casa, em que, embora em pessimas condições, tinha até agora o dito hospital, por falta de meios para obter outra nas condições para tal fim exigidas, tenho a honra de submetter á vossa alta apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° A igreja, coros, antecoros e suas dependencias, paramentos e alfaias, relicarios e imagens de santos, e mais objectos do culto, do extincto convento de Arouca, é concedida á junta de parochia da freguezia de S. Bartholomeu, d'aquella villa, para sua igreja matriz, e á ir mandado da Rainha Santa Mafalda, na mesma igreja erecta, para exercicio do culto e desempenho dos demais encargos do seu compromisso, ficando a cargo d'esta ultima corporação a guarda e administração dos ditos paramentos e mais objectos acima referidos.
Art. 2.° A casa, denominada «dos padres», e quintal adjunto, pertença que foi do mesmo extincto convento, é concedida á irmandade da misericordia da mesma villa, para seu hospital, bem como, para uso do mesmo, as roupas de cama do mesmo extincto convento.
Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala das côrtes, em 2 de abril de 1888. = Conde de Castello de Paiva == Antonio Maria de Carvalho.
Lido na mesa, foi admitttdo e enfiado á commissão de fazenda, ouvidas as de administração publica e de negocios ecclesiasticos.

Projecto de lei

Artigo 1.° São applicaveis á bibliotheca publica da universidade de Coimbra as disposições dos alvarás de 12 de setembro de 1805, de 30 de dezembro de 1824 e de 28 de maio de 1834.
Art. 2º Ficam revogadas quaesquer disposições em contrario.
Sala das sessões, 2 de abril de 1888.= 0 deputado, José Maria de Oliveira Matos.
Lido na mesa foi admittido e enviado á commissão de instrucção superior.

Projecto de lei

Senhores.- A profissão maritima é de todas a mais ardua e perigosa, não só pelos trabalhos normaes, mas pelas luctas com o tempo contrario e revolto; e alem de exposta mais que nenhuma outra, nos casos de accidente de fogo, de fome, e de epidemia, no meio restricto e limitado em que ella se exerce, tem de ordinario por complemento, quando se julga chegado o terminus do trabalho, e ao almejado descanço, todas as desventuras que então se accumulam, se o navio accosaado pelo temporal, for desmantelar-se contra os baixeis, ou contra as rochas escarpadas da costa.
Não basta á navegação o regular ou bom allumiamento das costas, e dos parceis, que lhe sirva de referencia ou para corrigir erros de calculos, ou para orientar a derrota em caso de desvio por accidente extraordinario da corrente e abatimento; é preciso, e minto, acrescentar a estas condições de protecção, os essencialmente complementares para os casos de accidente do força maior, em que o navio é lançado á costa pelo temporal, ou por causa do nevoeiro, ou ainda para evitar sossobrar, quando tendo agua aberta.
Ê para occorrer a estes casos que a philantropia devidamente auxiliada pelos poderes publicos, nos paizes cultos, que comprehendem o grande serviço que a navegação tem prestado, nãoo só á civilisaçâo dos povos, mas ao desenvolvimento dos differentes ramos da actividade humana, tem organizado, por meio de associações com variável área de jurisdicção, segundo os recursos de que dispõem, estações e postos de soccorros a naufragos.
É n'este momento, que se acha justamente sobresaltado o espirito publico com o desastre do incendio de um theatro, onde pereceram mais de setenta pessoas, que primeiro succumbiram a asphyxia produzida pelos gazes deleterios, e depois esmagados pelas derrocadas e carbonisados pelo incendio, que e justo lembrar, quanto é mais angustiosa a situação d'aquelles que no desempenho de uma funcção utilíssima á sociedade, a navegação, vêem approximar-se o perigo do naufragio, como no recente caso do brigue inglez Canadá, na barra da Figueira, e sentindo o choque das primeiras pancadas do casco de encontro ao fundo, vêem encapellar-se ao mar os rolos de ondas, que em golpes sucessivos lhe derrubam a mastreação, esmagando uns, e submergindo outros, para só depois de todas estas torturas e angustias mordes e physicas, sobrevir a morte peia asphyxia por submersão!
São antigos os estudos de algumas commissões nomeadas para resolver e preceituar sobre o assumpto, sendo notavel o relatorio da commissão nomeada a 20 de novembro de 1879, onde se encontra uma nota por si mais eloquente que qualquer outra ordem de argumentos; menciona se ali, que emquanto em 8 annos houveram em Portugal 224 naufragios conhecidos, perecendo 229 pessoas, n'um só anno, os 269 barcos salva-vidas inglezes pertencentes ás suas 269 estações de soccorros a naufragos, salvaram 885 pessoas.
Como iniciação é preciso que entre nós o governo dê o impulso, não só na organisação de uma sociedade ou sociedades similhantes ás que existem n'outros paizes, mas ainda que as subsidie n'um justo limite, até que uma bem dirigida propaganda, possa insinuar no espirito publico o alcance, necessidade, e justiça de similhantes instituições, e portanto quanto ellas são merecedoras do seu obulo espontaneo.
Está calculada em 137:000$000 réis a installação de trinta estações de soccorros, e trinta e dois postos secundarios, e em 4:598$000 réis a despeza de custeamento annual.
Uma outra commissão organisada em 1883 pedia a subvenção de 30.000$000 réis annuaes durante cinco annos, para se estabelecer as sessenta e duas estações e postos de soccorros a naufragos.
Parece-nos que um subsidio annual de 10:000$000 réis como base de qualquer operação auctorisada pelo governo, e d'onde saísse a annuidade para juro e amortisação da operação feita, e bem assim a verba do custeamento proporcional e crescente com as installações, póde, sem

Página 977

SESSÃO DE 3 DE ABRIL DE 1888 977

grande onus para o thesouro, ser a base de uma medida legistiva, que a camara e o governo adoptem, para um fim tão justo, sympathico e philantropico.
Se considerarmos que ha no orçamento geral do estado consignadas verbas que não têem applicação effectiva, como succede com a verba de 5.000$000 réis inscripta na secção unica do artigo 4.° do capitulo e do orçamento especial do ministerio da marinha, despeza esta auctorisada pelo § unico do artigo 4 ° da carta de lei de 23 de julho de l885, verba que até agora não tem sido preciso applicar, e agora se torna desnecessaria, por estarem proximo de completar o curso grande numero de aspirantes a facultativos navaes, que preencherão as vagaturas do quadro de saude naval, a transferencia d'essa verba para a despeza das estações de soccorros a naufragos, deixa apenas a descobeito 5:000$000 réis nos encargos totaes do orçamento em relação á proposta que temos a honra de fazer.
Um recurso, porém, tem o governo, emquanto a iniciativa particular não acudir em auxilio da instituição de que se trata, e consistiria elle, em exigir que todos os compromissos maritimos, mesericordias e estabelecimentos pios não subsidiados pelo estado, concorressem com um subsidio até 2 por cento da sua receita geral, para o cofre dos socorros a naufragos.
Um ponto importante carece ainda consignar n'esta ordem de considerações preliminares, e diz respeito ao pessoal, que deve ser escolhido das praças do corpo de marinheiros com baixa do serviço, por o terem completado, tendo bom comportamento, e que pelo menos tivessem chegado á categoria de marinheiros de 1.ª classe.
Exposta e analysada a questão para que chamâmos a attenção da camara, nos termos restrictos que suggeriu a inspiração de momento, e confiando o estudo d'esta materia, no seu mais vasto desenvolvimento, á apreciação da camara, temos a honra de propor o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a proceder a installação de estações e postos de soccorros a naufragos ou por administração directa ou por meio de uma associação convenientemente organisada para esse fim, nos termos da consulta dada pela commissão nomeada em 20 de novembro de 1879
Art. 2.° Fica o governo auctorisado a despender até á quantia 10:000$000 réis annuaes com a installação de estações e postos de soccorros a naufragos e seu custeamento annual.
Art. 3.° Dentro dos limites da verba fixada no artigo 2.°, e comprehendendo todos os encargos n'elle consignados, pôde o governo fazer ou auctorisar qualquer opperação de credito por meio da qual se anticipe a acquisição de material e installações correspondentes, para as estações e postos de soccorros a naufragos.
Art. 4.° Os estabelecimentos pios e misericordias não subsidiados pelo estado e bem assim os compromissos maritimos são obrigados a concorrer com um subsidio annual até 2 por cento da sua receita geral para os cofres do estado com applicação especial ao encargo consignado no artigo 2.°
Art. 5.° O pessoal graduado das estações e postos de soccorros a naufragos será especialmente escolhido do entre as praças com baixa, do corpo de marinheiros, com bom comportamento e aptidão reconhecida, e que pelo menos tenham chegado á categoria de marinheiros de l.ª classe.
Art. 6.° Fica revogado o § unico do artigo 4.° da carta de lei de 23 de julho de 1885, que reorganisou o quadro do pessoal dos facultativos navaes, e bem assim qualquer legislação contraria á d'este projecto!
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 2 de abril de 1888.= J. B. Ferreira de Almeida.
Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de marinha, ouvida a de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - A lei de 27 de julho de 1882, que reorganisou as escolas de alumnos marinheiros, estabelece no seu artigo 7.° que os alumnos approvados, quando transferidos para o corpo de marinheiros, terão ali a praça de grumetes de l.ª classe, podendo d'aqui inferir-se que, salvas as condições especiaes da sua situação, elles têem a categoria equivalente a grumetes de 2.ª classe, emquanto pertencem ás respectivas escolas.
O regulamento vigente para o serviço das escolas, approvado por decreto de 19 de fevereiro de 1886, dando largo desenvolvimento e explanação ás disposições da lei organica, prevenindo todas as circumstancias que podem dar-se com o alumno na escola, inclusive a de ter baixa pela junta por inutil, deixou a mais extraordinaria lacuna sob o ponto de vista da reciprocidade de obrigações contrahidas pelo estado para com o alumno, desde que este se mutilise em serviço, como é o da instrucção, em que, por caso similhante, um grumete de 2.ª classe do corpo passa á divisão de veteranos nos termos do § 2.° do artigo 3.° do decreto de 17 de dezembro de 1868.
São sem duvida largas as condições de resguardo que se empregam nas escolas, para acautelar desastres, taes como o estabelecimento de redes, ou a collocação dos toldos nos vergueiros, por occasião dos exercicios de apparelho; mas todas estas precauções não excluem o accidente da queda, e d'esta incidir sobre qualquer dos supportes d'esses meios de defeza.
Não tem sido felizmente grande o numero dos desastres, apesar de existir a primeira das escolas ha mais de dez annos; entretanto deram-se no anno preterito dois accidentes, que reclamam providencia de diversa ordem, por que diversas foram as consequencias; e parece legitimo regular definitivamente similhante assumpto, porque desde que devam ser tomadas em consideração estes casos singulares, mais conforme com a justiça é não especiahsal os, mas generalisar e definir as providencias para caso similhantes que possam dar-se.
Os accidentes foram um na escola do Porto, estabelecida a bordo da corveta Sagres, e outro na de Lisboa a bordo da corveta Palmella.
O primeiro caso deu se com o alumno Manuel Antonio da Abrunhosa, filho de Miguel Maria de Abrunhosa, pastor, absolutamente pobre, comprovado por attestado, com quinze annos de idade, natural da freguezia de Areloso, concelho da Mêda, districto da Guarda, e que se matriculou a 7 de janeiro de 1886, com o n.° 40/49: approvado no primeiro anno do curso, passou ao segundo, e em l5 de abril de 1887 baixou ao hospital da terceira divisão militar, em consequencia de uma quéda que deu do cesto da gavea de proa, estando a enfiar cabos, para se envergar o panno.
Em 3 de fevereiro de 1888 teve baixa do serviço por opinião da junta militar do saude, saindo do hospital completamente paralytico das pernas e com grandes perturbações intestinaes e na bexiga; tendo portanto estado em tratamento no hospital duzentos e noventa o quatro dias. N'estas condições ficou completamente impossibilitado de prover por qualquer fórma ás necessidades da sua vida.
O segundo caso, menos grave, deu-se a bordo da corveta Palmella com o alumno n.° 52/295 José Freire, filho de Antonio Freire e Balbma das Dores, natural de Mafra, com 17 annos de edade e que foi admittido na escola a 13 de dezembro de 1886; deu baixa ao hospital a 14 de janeiro de 1888, tendo alta a 9 de março do mesmo anno, em que foi inspeccionado pela junta, que o deu por incapaz de todo o serviço, por effeito de lesão contrahida no mesmo serviço. A lesão consiste no esmagamento de dois dedos externos do pé direito, porque, tratando da remoção dos linguados de ferro do lastro, para beneficiação do porão, um linguado lhe caiu e esmagou os dedos do pé, na Occasião em que o alumuo se occupava em removel-o.

Página 978

978 DIARIO D CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

É fóra se duvida que este caso significa incapacidade para o serviço militar, mas não impossibilita o alumno do prover por qualquer fórma ás necessidades da sua vida.
A lei arbitra aos alumnos uma ração de generos calculada em 185 réis diarios, e um pret de 300 réis por mez aos do primeiro anno, 600 réis por mez aos do segundo; alem d'isto a fazenda nacional fornece a cada alumno maca, colchão, manta e sacco, que entregam quando têem baixa, segundo o disposto no artigo 51.° do regulamento escolar, mas recebem sem desconto emquanto estão na escola os uniformes, artigo 53.° tabella 4.º, que no seu conjnncto com os prets supracitados e estatuidos pelo artigo 44.° do regulamento importam para a fazenda uma despeza equivalente ao pret de um grumete de 2.ª classe, que a lei de 29 de maio de 1884 estabelece na tabella C, artigo 42.°, sujeitas a desconto do fardamento segundo o § 3.° do mesmo artigo.
Se os alumnos marinheiros pela categoria com que são admittidos no corpo de marinheiros, e pelo encargo equivalente que dão ao estado, emquanto alumnos, podem e devem ser equiparados aos grumetes de 2.ª classe, que se inutilisarem em serviço, e que têem direito à passagem a veteranos, deve identica disposição ser applicavel aos mesmos alumnos, ou pelo menos decretar umas disposições especiaes correspondentes às condições de inutilisação em que ficarem.
Subordinado a esta ordem de idéas os que, inutilisando-se completamente, fiquem incapazes de prover por quaesquer meios á sua subsistencia deverão vencer, a titulo de pensão vitalícia, a ração diaria a dinheiro, e o pret respectivo, o que n'um caso, e segundo os preços correntes seria de 180+10, ou 195 réis diarios, e no outro de 185+20 ou 205 réis diarios, o que para regularidade poderá reduzir-se á pensão fixa de 200 réis diarios, no caso de impossibilidade absoluta, qualquer que seja o anno do curso em que se ache o alumno, quando o accidente se der.
Quando a inutilisação porém, como no caso da Palmella, torna o alumno incapaz do serviço militar, sem comtudo o privar absolutamente de prover aos meios da sua subsistencia, a pensão poderá ser metade da anterior, ou 100 réis diarios, durante oito annos, tanto é o tempo a que por lei esse alumno era obrigado a servir o estado, § 4.° do artigo 4.° da carta de lei de 27 de julho de 1882.
Em quaesquer dos casos estes ex alumnos não serão contados para nenhum effeito nas companhias de veteranos, não terão direito a qualquer outro abono, seja de que titulo for, e para facilidade e liberdade na escolha da residencia deverão as pensões de que trata este projecto ser pagas por meio de um titulo de renda vitalícia ou temporaria, como n'elle deverá mencionar-se.
As rasões de caridade e equidade que inspiram esta proposta, são por si mesmo tão recommendaveis, que não carecem de mais larga justificação para fundamentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Os alumnos das escolas de alumnos marinheiros que forem dados por incapazes do serviço pelas juntas officiaes de saude, em consequencia de accidente ou desastre occorrido em serviço, deverão ser pelas mesmas juntas classificados em duas categorias.
1.° Incapazes do serviço militar, e de prover por si ás suas necessidades de vida.
2.° Incapazes de serviço militar, mas podendo prover á satisfação das suas necessidades de vida.
Art. 2.° Os alumnos com baixa pelas juntas officiaes de saude vencem:
§ 1.° A pensão diária e vitalícia de 200 réis quando comprehendidos nas disposições do § 1.° do artigo 1.°
§ 2.° A pensão diaria de 100 réis durante oito annos, quando comprehendidos nas disposições do § 2.° do artigo 1.°
Art. 3.° As pensões de que trata o precedente artigo serão pagas por meio de um titulo, valido em qualquer recebedoria do concelho; não dão direito a outro qualquer abono, seja de que especie for, com fundamento haa lesão soffrida, e não impõe restricção alguma quanto ao ponto de residencia dentro do território na metropole.
Art. 4.° As pensões de que trata o artigo 2 ° caducam: as do § 1.º d'esse artigo, por morte do pensionado, sem transmissão; e as do § 2.° do mesmo artigo, por morte dentro do período dos oito annos sem transmissão, e findo o período; e em ambos os casos por saída do reino.
Art. 5.°- transitorio. - As disposições da presente lei são applicaveis aos alumnos n.° 49/49 Manuel Antonio da Abrunhosa, do concelho da Mêda, districto da Guarda, e que pertenceu á escola estabelecida a bordo da corveta Sagres, tendo-se matriculado a 7 de janeiro de 1386; e bem assim ao alumno n.° 52/295 José Freire, do concelho do Mafra, districto de Lisboa, e que se matriculou na escola estabelecida a bordo da corveta Palmella, a 14 de dezembro de 1886.
Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 2 de abril de 1888.= J. B. Ferreira de Almeida.
Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de marinha, ouvida a de fazenda.

REPRESENTAÇÃO

Da camara municipal do concelho de S. Pedro do Sul, pedindo a approvação de um projecto de lei sobre a consstrucção do caminho de ferro pelo valle do Sul e pelo valle do Paiva, no Douro.
Apresentada pelo sr. deputado Augusto Fuschini, e enviada á commissão de obras publicas e mandada publicar na Diario do governo.

REQUERIMENTOS DE INTERRESSE PUBLICO

Requeiro que, pelo ministerio da justiça, me seja enviada uma nota dos concorrentes ás igrejas da Conceição, S. Bartholomeu e Quatro Ribeiras, da diocese de Angra, na ilha Terceira. = O deputado, Jacinto Candido.

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam remettidos a esta camara, copias das propostas ou outras communicações que, ácerca do emprestimo de 1.600:000$000 réis para estradas, tenham sido feitas ao governo. = O deputado, Antonio Maria de Carvalho.
Mandou-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

De D. Maria Joanna Alves Ribeiro, filha do fallecido fiel da casa da moeda, Raymundo Ildefonso Alves Ribeiro, pedindo que a pensão concedida por morte de seu pae, á requerente, sua mãe e sua irmã, lhe seja dada agora, na totalidade, visto que das tres pensionistas é a unica sobrevivente.
Apresentado pelo sr. deputado Alfredo Brandão e enviado á commissão de fazenda.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

Declaro quo faltei ás ultimas sessões por motivo justificado. = Francisco de Medeiros.

Por motivo justificado, faltei á sessão de hontem. - Sá Nogueira.
Para a secretaria.

O sr. Carlos Lobo d'Avila: - Mando para a mesa, por parte do meu amigo e collega o sr. Antonio Ennes, que não póde comparecer á sessão, dois pareceres da commissão de negocios externos, sendo um sobre a proposta

Página 979

SESSÃO DE 3 DE ABRIL DE 1888 979

de lei do governo n.° 162-C, que approva a convenção assignada em Bruxellas, aos l5 de março do 1886 para a troca immediata do jornal official e das publicações parlamentares, e outro sobre a proposta de lei n ° 162-F, approvando a convenção assignada em Bruxellas a 15 de março de 1886, para a permutação internacional de publicações scientifico-litterarias.
Mandaram-se imprimir
O sr. Baptista de Sousa: - Sr. presidente, não estava presente na sessão de 23 de março, quando antes da ordem do dia o illustre deputado e meu velho amigo sr. Antonio de Azevedo Castello Branco reproduziu varias informações, que lhe foram fornecidas por alguns dos seus correligionarios do concelho de Santa Manha de Penaguião, insistindo nas suas queixas e accusações contra a commissão do recenseamento e escrivão de fazenda d'aquelle concelho.
Sr. presidente, disse s. exa. que o escrivão de fazenda não passava as certidões que lhe pediam cidadãos regeneradores a fim de instruirem as suas reclamações eleitoraes, e que o mesmo escrivão allegava como mero pretexto, que não podia passar de prompto essas certidões porque tinha que passar outras pedidas anteriormente áquellas.
Sr. presidente, como deputado por aquelle circulo recebi informações, que são completamente oppostas áquellas. Não são só os regeneradores do concelho do Santa Martha que têem direito a pedir certidões por aquella repartição: todos os cidadãos o podem fazer; (Apoiados.) e aconteceu, realmente, que alguns dos requerimentos apresentados por individuos pertencentes ao partido da opposição foram precedidos de outros dos apresentados por progressistas, não sendo assim possivel attender áquelles de preferencia a estes.
Se não se seguisse a ordem numerica haveria violação dos direitos dos cidadãos, que tinham pedido certidões anteriormente áquelles, que informaram o illustre deputado.
Não houve pretexto, pois o facto era justamente motivo de demora para os que só mais tarde usavam do seu direito de requerer.
Emquanto á parte em que s. exa. se referiu ao recenseamento dizendo que tinha havido falsificação, cumpre-me responder que tenho informações, que acho dignas de toda a fé, corroboradas por uma certidão, que tenho presente, das quaes se vê que é de todo imaginaria tal falsificação.
Sr. presidente, não leio esse documento, porque não desejo cansar a camara com negocios que pouco a interessam, tendo outros assumptos que lhe devem merecer mais a sua attenção. Limito-me a fornecel-o a s. exa., que está assentado a meu lado prestando-me a honra da sua attenção.
Parece-me que a falsificação não se poderia sequer suppor verosimil desde que a minoria da commissão, que é regeneradora, assistiu ás sessões, tomou parte nos trabalhos, e rubricou todas as folhas do recenseamento.
Dizem-me, que nunca no concelho houvera recenseamento mais escrupulosa e imparcialmente confeccionado, sendo de cinco por freguezia a media das alterações no numero dos inscriptos, e ficando dos quarenta maiores contribuintes cidadãos regeneradores que de outros concelhos transferiram para aquelle o seu domicilio politico.
Emquanto ao facto da annullação de parte das collectas, nada tem com isso a commissão revisora do recenseamento, porque a lei não manda deduzir para os effeitos da capacidade eleitoral as quantias annulladas.
Eu não concordo com a lei.
Já fóra do parlamento, n'um jornal que por annos redigi em Villa Real, e que ainda me pertence, o Progresso do Norte, a censurei n'esta parte, porque a garantia da independencia, que se procura na percentagem do imposto dos quarenta maiores contribuintes dos concelhos, exige a deducção não só das quantias annulladas mas de todos os encargos, que reduzam o patrimonio ou rendimentos do contribuinte. (Apoiados.)
Mas não é porque seja meu desejo que a lei se reforme n'esse sentido, que ella assim se ha de interpretar. (Apoiados.)
E como agora não se trata de defender a lei, mas a commissão do recenseamento, não ha senão a louvar a mesma commissão por ter cumprido a lei, embora má, pois lhe não competia desacatal-a nem com o intento de a corrigir ou emendar nos seus defeitos. (Apoiados.)
Com respeito ao processo instaurado na comarca do Peso da Regua contra o escrivão de fazenda, entendo que, vista a independencia do poder judicial, devemos simplesmente aguardar a sua decisão.
Sc tivessemos de discutir aqui os factos e o direito, seria o meu parecer, que o processo devia ser mandado archivar por falta de base.
A final se conhecerá se aquelle funccionario procedeu mal, ou se o processo accusará somente a má vontade e infundadas queixas d'aquelles, que, estando acostumados a dominar por favor das auctoridades e funccionarios publicos, não tiverem ainda tempo de se resignar com um regimen de justiça distribuitiva.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Santos Crespo: - Por parte da commissão de saude publica, mando para a mesa a seguinte:

Participação

Participo a v. exa. e á camara, que está constituída a commissão de saude publica, tendo escolhido para presidente o sr. Fernandes Vaz, e para secretario a mim, participante, havendo relatores especiaes. - Augusto Faustino dos Santos Crespo.
Mando tambem a seguinte:

Proposta

Proponho que seja aggregado á commissão de saude publica o illustre deputado, sr. Martinho Tenreiro. = 0 secretario da commissão de saude publica, Augusto Faustino dos Santos Crespo.
A participação foi para a acta; a proposta foi approvada.

O sr. Jacinto Candido: - Pedi a palavra ainda uma vez antes da partida do vapor para os Açores, a fim de solicitar do governo providencias para combater e atte-nuar a terrivel epidemia de variola que grassa na ilha Terceira.
O sr. ministro da fazenda, que estava presente quando da outra vez fallei sobre este assumpto, e que agora vejo tambem n'aquellas cadeiras, disse que o sr. ministro do reino já tinha tomado medidas a este respeito, e que estava prompto a tomar todas as demais que lhe fossem pedidas. É certo que o sr. ministro do reino tomou algumas providencias, mas não foram as bastantes, nem aquellas que principalmente reclama o mal que afflige aquella terra.
Não são tanto necessarios os recursos medicos, os tubos de vaccina, e cousas similhantes, como occorrer de prompto á falta de cemiterios. Isto é o mais urgente; este o ponto mais importante, a que é indispensavel acudir.
E tão momentoso me pareço este facto, sr. presidente, que eu n'elle concentro as minhas considerações. Estas não as providencias que eu hoje somente peço ao governo, porque creio que a ser exacto o que me dizem, logo que sejam tomadas, a epidemia perderá porventura o seu principal elemento de força.
Os cemiterios que existem não são sufficientes para comportarem os enterramentos, a que é forçoso proceder. É, pois, preciso que novos cemiterios se façam.
Não trato de discutir agora aqui a possibilidade legal de

Página 980

980 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

funccionarem os cemiterios já construidos, mas embargados; não quero saber, nem me importam as questões pendentes sobre elles. O que sei é que é preciso infelizmente enterrar os mortos, que a epidemia vae victimando. As questões entre juntas de parochia e particulares não são para aqui, nem importam ao caso. Tempo de mais têem já durado, e muito mais poderão durar ainda, e os mortos não podem esperar insepultos. As lei ha disposições que habilitam a auctoridade administrativa a proceder, e é necessario que proceda com a urgencia que este caso exige.
No dia 5 parte o paquete para os Açores. Encarecidamente peço a v. exa. que tome na devida consideração estas reflexões, e que se digne transmittil-as ao sr. ministro do reino, para que s. ex.º dê as suas instrucções ao seu delegado no districto de Angra.
Este é um dos taes casos em que se justificam todas as medidas energicas, ainda quando arbitrarias e despoticas.
É indispensavel que este mal cesse.
Está-se a revolver a terra nos cemiterios onde ainda se encontram despojos humanos por consumir.
Isto é que, alem de uma profanação revoltante e de uma irreverencia profunda, é principalmente a causa determinativa da intensidade que a epidemia tem assumido, uma das maiores de que ha memoria pela sua mortalidade.
Chegaram a morrer cincoenta pessoas por dia, segundo me dizem, o que é verdadeiramente assustador para urna população tão limitada como a d'aquella ilha.
Não garanto a verdade dos factos; mas elles vem narrados na imprensa periodica, e cartas particulares m'os relatam.
Infelizmente é de crer que sejam verdadeiros. Em todo o caso que vão as instrucções ao governador civil. Se não houver verdade no que me dizem, melhor será dispensar-se-ha a sua execução.
Eu, sr. presidente, chamo a particular attenção do governo para este gravissimo assumpto.
Cumpro o meu dever, e demitto de mim a responsabilidade unica que me podiam pedir, qual seria a de não ter posto o governo ao facto do que existe.
Espero que o ar. ministro do reino cumprirá tambem o seu, e ordenará as providencias precisas para se pôr cobro a este lamentavel estado de cousas.
Alem das medidas officiaes que o sr. ministro do reino deve ordenar, eu tenho tenção, sr. presidente, para occorrer ás duras e crueis necessidades d'aquelles povos, de pedir aos meus illustres collegas da maioria, tambem deputados pelo mesmo circulo, que tenho a honra de representar n'esta casa, a fineza de se constituirem commigo em commissão, e de solicitarmos do sr. presidente do conselho o favor de impetrar de Sua Magestade a Rainha uma audiencia a fim de implorarmos de Sua Magestade, em favor dos desgraçados a quem a epidemia lançou na miseria, mais uma manifestação da sua inexgotavel caridade e dos seus elevados sentimentos humanitarios. (Apoiados.)
Mas independentemente d'isto, que é a caridade particular, é indispensavel o soccorro official, e esse, repito, é agora occasião de o prestar, visto a demora que ha nas communicações com os Açores.
N'estes assumptos, digo-o ainda uma vez, não quero, nem devo fazer questão politico-partidaria.
Peço aos meus illustres collegas o seu auxilio, e ao governo a sua boa vontade.
Aproveitando a occasião de estar com a palavra, fallarei ainda, sr. presidente, de outros assumptos, de que me tenho occupado já mais de uma vez, mas que continuam a merecer-me ainda a mesma importancia, e que sempre m'a hã de merecer.
É o primeiro d'elles a illuminação das costas dos Açores.
Sei que ha uma commissão nomeada, e que os seus trabalhos se acham n'algum adiantamento.
O que é facto, porém, é que nada ha a final feito, e que na camara não apparece projecto algum que cuide de tão instante questão, e vão-se succedendo os naufragios, vão continuando as desgraças e os sinistros, e accumulam-se mortes e prejuízos importantissimos.
E a causa d'estas catastrophes tem sido manifestamente a falta de illuminação das costas dos Açores, e a falta do estabelecimento do serviço de soccorros a naufragos convenientemente organisado.
A propOsito d'este, não posso deixar de me associar ás considerações, que na sessão de hontem, foram apresentados n'esta casa pelos srs. Ferreira de Almeida e Miguel Dantas.
Ambos estes meus dois collegas fizeram sentir a necessidade do governo organisar de prompto este importante ramo de serviço publico.
Desejaria, visto que o governo está representado por dois dos seus membros, por cujas pastas mais directamente corre este negocio do estabelecimento das estações e postos de soccorros a naufragos, os srs. ministros da marinha e da fazenda; desejaria, digo, saber se o governo está no proposito de estabelecer com a maior rapidez possivel o serviço d'estes soccorros em ordem a evitar, ou, pelo menos, remediar, quanto possivel, as desgraças que são tão frequentes, tanto no continente, como nos Açores.
O projecto do sr. Ferreira de Almeida creio que satisfaz completam ente ás exigencias d'esta ordem de serviços; mas quando não satisfaça, desejaria saber se o governo tem tenção de apresentar alguma proposta de lei de sua iniciativa, e olhar para este assumpto com a seriedade que elle merece.
Ha uma commissão nomeada, supponho eu, pelo sr. dr. Bocage, e que já emittiu o seu parecer. Este parecer correu as estações superiores; mas os pareceres sobre assumptos d'esta ordem dormem descansadamente, até que os acontecimentos se vão succedendo e estejam chamando de novo a nossa attenção para a necessidade de providencias a tal respeito.
Desejaria tambem que o governo dissesse, de uma maneira precisa e clara, se effectivamente está resolvido a apresentar n'esta sessão, como o anno passado me prometteu, n'esta casa, solemnemente o sr. ministro das obras publicas, a proposta para a construcção do porto de abrigo de Angra.
Creio que já tive occasião de declarar aqui, que soube que s. exa. mandou proceder a estes estudos, que já o engenheiro competente fez o projecto, e que já inclusivamente a junta consultiva de obras publicas lhe deu parecer favoravel. Mas o facto é que a sessão já vae no terceiro mez e ainda a proposta de lei não appareceu n'esta camara.
Lembrava isto ao governo e pedia-lhe que a proposta viesse o mais cedo possivel, em ordem a realisar-se o compromisso tomado pelo sr. ministro das obras publicas e a poder o mais breve possivel entrar em via de construcção aquelle melhoramento tão importante para os Açores, e em especial para a ilha Terceira.
Desejava ainda referir-me ao projecto de lei, cuja iniciativa renovei o anno passado, e já este anno, e está esquecido na commissão do saude publica, projecto que tende a equiparar o ordenado do guarda mor da estação de saude de Angra ao da de Ponta Delgada.
Não ha rasão alguma que justifique esta differença de ordenados entre dois funccionarios de igual categoria, encarregados de identicos serviços, e que não têem differença alguma nas funcções que exercem. Por consequencia, este projecto, que já foi aqui apresentado em tempo, já teve voto favoravel da commissão de saude publica, passou aqui, e não se converteu em lei por lhe faltar apenas a approvação na camara dos dignos pares, por não haver tempo para isso, este projecto, digo, que em taes condições se acha, parece, que deve merecer a attenção da camara, e da respectiva commissão.
Eu chamo, pois, a attenção da illustre commissão de

Página 981

SESSÃO DE 3 DE ABRIL DE 1886 981

saude, para este assumpto, e rogo-lho que se digne apresentar quanto antes o seu parecer, como entender de justiça.
Sr. presidente, diversas vezes n'esta sessão, e na do anno passado, pedi documentos, pelos ministerios da fazenda é das obras publicas, e eu desejava que v. exa. instasse junto d'esses ministerios para que os documentos fossem enviados á camara.
Por ultimo mando para a mesa um requerimento.
Vae publicado na secção respectiva, a pag. 978.
O sr. Ministro da Marinha (Henrique de Macedo): - Quando pediu a palavra, propunha se especialmente responder ás observações do illustre deputado, o sr. Jacinto Candido, relativas ao estabelecimento de postos e estações de socorros a naufragos; mas como s. exa., occupando se de outros assumptos, estranhos ao ministerio da marinha, mostrou empenho em que sejam communicadas as suas reflexões aos ministros ausentes, a cujas pastas respeitam directamente esses assumptos, quer antes de tudo declarar ao illustre deputado que o seu desejo será satisfeito e que os srs. ministros do reino e das obras publicas terão conhecimento d'essas observações.
Pelo que respeita á illuminação das costas de Portugal continental e das ilhas adjacentes toma a liberdade de rectificar uma indicação de s. exa. que elle, orador, não considera absolutamente exacta.
Parece-lhe salvo erro de memoria, que ha uma lei que auctorisa o governo a estabelecer a completa mas successiva illuminação das costas do continente e Açores, á medida que se forem fazendo os respectivos projectos e dentro de uma certa verba annual, destinada para esse fim.
Naturalmente, rasões de administração levaram a estabelecer pharoes em alguns outros pontos, primeiro do que nos Açores.
O sr. ministro das obras publicas poderá dizer o motivo especial que teve para applicar de preferencia á construcção de uns certoa pharoes as verbas destinadas para esse melhoramento em um determinado anno economico.
O sr. Jacinto Candido: - V. exa. dá me licença para uma ligeira observação?
Eu, quando me referi á illuminação das costas foi porque o sr. ministro das obras publicas mandou ultimamente estudar as costas dos Açores para escolher os pontos onde deviam ser collocados os pharoes. A commisaão nomeada para esse fim está funccionando no ministerio das obras publicas e elaborando o respectivo parecer.
E, como o sr. ministro prometteu apresentar á camara esse parecer para promover com rapidez a illuminação d'aquellas costas, eu pedia que elle activasse os trabalhos da commissão para se resolver com brevidade este assumpto.
O Orador: - Declara que depois das explicações que acaba de dar o illustre deputado, lhe cumpre a communicar ao seu collega os desejos, alias fundados e justos de s. exa.
Pelo que respeita ao estabelecimento de postos e estações de soccorros a naufragos, assumpto que mais especialmente pertence ao ministerio a seu cargo, vae expor á camara o pouco que até hoje pôde fazer, a rasão por que não tem podido fazer mais e como é que propriamente não cabia nas suas attribuições fazel-o.
Antes d'isso, porém, precisa narrar os antecedentes d'este negocio.
Uma commissão numerosa e illustrada, nomeada em 1878, estudou a fundo esta questão do estabelecimento do postos e estações nos diversos pontos da costa continental e insulana. D'esse estudo resultou um bem escripto relatorio, em que se indicava a necessidade de serem estabelecidas, salvo erro de memoria, doze estações e quatorze postos.
Nas estações de soccorros deveria haver, no entender d'essa commissão, barcos salva vidas e tripulações constantes, adoptando-se ao mesmo tempo nos portos outros meios e processos de prestar soccorros, menos dispendiosos do que
os barcos salva-vidas, como, por exemplo, apparelhos de lançar cabos e outros de igual natureza.
Mais tarde, em 1882, se bem se recorda, o sr. Bocage nomeou uma outra commissão, com o encargo de estudar a melhor maneira de organisar uma associação de soccorros a naufragos, assim como de indicar a verba de subsidio com que o governo deveria concorrer para que essa associação podesse realisar a sua santa missão.
Faziam parte d'ella muitos cavalheiros notaveis da nossa politica e outros que lhe eram estranhos. Lembra-se, por exemplo, do sr. Miguel Dantas, que está presente, do sr. visconde de S. Januario, do sr. Pereira de Miranda, do então presidente da associação commercial, do sr. duque de Palmella e de alguns officiaes de marinha distinctissimos.
Ora, esta commissão, n'um bem elaborado relatorio, dizia que, organisada a commissão de soccorros os a naufragos cumpriria ao governo concorrer immediatamente para o estabelecimento de postos e de estações com uma quantia não interior a 30:000$000 réis, e que deveria, alem d'isso, entrar annualmente com a verba necessaria para o pagamento do pessoal essencialissimo para este serviço; verba que era calculada pela mesma commissão em 72$900 réis por posto, e 100$000 réis por estação, o que representava annualmente para o estado um despendio de alguns contos de réis.
Depois d'este relatorio, delegou-se no ministerio da marinha de accordo com o do reino, a quem mais directamente incumbe intervir n'estes actos de beneficencia, o encargo de formular uma proposta de lei, mas que não chegou a ser presente ao parlamento.
Ha dias teve elle, orador, occasião de ver que n'essa proposta se estabeleciam as bases, de accordo com o relatorio da commissão, para o estabelecimento das estações de soccorros.
Parece que o sr. Bocage teve duvidas na apresentação d'essa proposta, não porque não considerasse bem feito o trabalho da commissão ou porque não reconhecesse que o estabelecimento de postos e estações de saude eram uma necessidade; mas sim pelo despendio que elle trazia comsigo
Pela sua parte, pouco tempo depois de ter tido a honra de assumir a gerencia da pasta da marinha, algumas providencias tomou, entendendo dever estabelecer, em pequena escala, alguns postos e algumas estações de soccorros, servindo-se para isso da pequena verba descripta no ocamente do mesmo ministerio, com applicação ao material das capitanias dos portos, e fazendo cumprir algumas disposições do regulamento de pilotagem, que tem força de lei e que estavam sem execução, como succedia em relação ao artigo do mesmo regulamento que obriga a corporação dos pilotos dos corpos de Lisboa e Setubal a ter em bom estado um barco salva-vidas e a pagar á respectiva tripulação.
Com respeito ao porto da Figueira, é de notar, acrescenta o orador, que nem a commissão de 1879 aconselhou a que não se estabelecesse ali uma estação de soccorros, mas simplesmente um posto, nem a corporação dos pilotos d'aquella barra, pela exiguidade das suas receitas, podia attender ás despezas do estabelecimento de um salva vidas.
Mandou, por isso, elle orador, dar principio aos trabalhos necessarios para que ali se estabeleça um posto e ao mesmo tempo adquirir, pela verba ornamental destinada a material das capitanias de portos, dois pequenos apparelhos de salvação. Esses apparelhos já vieram; mas como n'essa occasião não havia n'aquelle porto um capitão, official de marinha, e estava por isso funccionando o director da alfandega, como capitão interino, entendeu que mais conveniente seria esperar pela nomeação de um official, para então serem remettidos os mesmos apparelhos, por ser esse funccionario o mais competente para dirigir a sua installação e a instrucção do respectivo pessoal.

Página 982

982 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Alguem poderá perguntar-lhe a rasão porque o porto da Figueira tem estado até agora sem capitão. O motivo d'essa falta harmonisa-se com outras idéas que ali tem expendido a respeito da armada real.
O numero de officiaes disponiveis da marinha portugueza não é por vezes sufficiente para accudir a todas as commissões de serviço. Por isso, n'algumas occasiões, se tem verificado a hypothese do substituição prevista na lei, sendo encarregado o respectivo director da alfandega de exercer interinamente as funcções de capitão do porto.
Ha poucos dias, porém, nomeou um official para este logar, a fim de inquirir se houve alguma falta occulta da parte da corporação dos pilotos na horrivel catastrophe de que todos têem conhecimento, sendo ao mesmo tempo encarregado esse official de levar comsigo os apparelhos de salvação, e de dirigir o pessoal que tem de trabalhar com elles.
A camara deve comprehender que não é possivel estabelecer postos e estações de soccorros em todos os pontos da costa onde se tornam necessarios, porque é diminuta a verba destinada no orçamento para capitanias de portos.
Não obstante, como ministro da marinha, tem feito tudo quanto podia fazer; mas acceitará gostosamente a inserção de uma verba no orçamento que o habilite a cumprir o seu desejo e que é ao mesmo tempo um dever sagrado.
Não se pronuncia desde já sobre o organismo do projecto que sobre este assumpto foi apresentado, porque não conhece os seus detalhes, e mesmo porque a sua analyse incumbe principalmente ás respectivas commissões, como incumbe ao seu collega da fazenda apreciar quaesquer modificações que se lhe possam fazer, visto que se trata do augmento de verbas de despeza, a que terá de fazer-se face com um determinado imposto.
Como ministro da marinha o que lhe cumpre dizer é que acceitaria gostosamente, como já declarou, a inserção no orçamento de uma verba destinada para o estabelecimento de estações e portos de soccorro. Assim poderia, com maior largueza, satisfazer a uma necessidade, cuja importancia reconhece.
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu.}
O sr. Jacinto Candido: - Agradeço, em meu nome e no d'aquelles a quem esta instituição vae beneficiar, as explicações que s. exa. se dignou dar-me e as boas intenções que manifestou.
O sr. Arroyo: - Pediu a palavra para chamar a attenção do sr. ministro da fazenda para um assumpto a que já hontem se referiu, antes da ordem do dia.
Perguntara a s. exa. se por ventura já se tinha realisado qualquer contrato do emprestimo, para ser applicado á conclusão da rede das estradas reaes e districtaes, e o sr. ministro respondeu-lhe que não.
Perante esta resposta peremptoria entendeu elle, orador, que n'esse momento se devia abster de fazer quaesquer considerações.
Hoje, porém, tendo lido uma noticia n'um jornal affecto á situação e particularmente ao sr. ministro da fazenda e que por isso lhe devia ser inteiramente insuspeito, esse facto obriga-o a tomar de novo a palavra sobre o assumpto e dirigir uma pergunta a s. exa.
No Diario popular de hoje, na revista financeira, falla-se do emprestimo e a primeira phrase que ahi se lê parece confirmar a resposta do sr. ministro, mas as explicações que se seguem ao primeiro periodo estão, na opinião d'elle, orador, em contradição com o que s. exa. disse na camara.
O articulista, depois de dar a simples noticia do emprestimo para a conclusão da rede das estradas reaes e districtaes, explana-se n'um desenvolvimento tão detalhado e preciso, com promenores tão decisivos; entra em tantas especialidades e emprega taes expressões, que pareço tratar de um emprestimo já realisado. (Apoiados.}
Se isto partisse de outra qualquer folha, elle, orador, respeitando e acatando a declaração do sr. ministro, esperaria que, ou por via official ou por via officiosa, podesse ter noticia segura de, se haver realisado esse emprestimo, para então pedir os documentos que entendesse necessarios; mas não, é n'um jornal, mais particularmente affecto a s. exa., que se encontra a indicação do juro da emissão, ou a indicação da quantia total do emprestimo, a indicação da fórma como hão de se feitos os pagamentos semestraes, as indicações muito especiaes sobre o modo como se executa o systema da adjudicação do premios, emfim, indicações de tal fórma detalhadas, que só se podem saber depois do emprestimo realisado.
Achando, pois, um tanto extraordinario este facto, pedia ao sr. ministro da fazenda a fineza de lhe dizer alguma cousa, que podesse conciliar a declaração peremptoria e categorica, feita por s. exa. na camara, de que não havia ainda emprestimo algum realisado, com a noticia que vem hoje no jornal a que se tem referido.
(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Em primeiro logar, direi ao illustre deputado o sr. Jacinto Candido, que já depois de s. exa. ter faltado o outro dia n'esta casa, eu fallei com o sr. ministro do reino sobre a questão dos cemiterios na ilha Terceira.
S. exa. disse-me que ia estudar a questão; em todo o caso creia o illustre deputado que ainda hoje lembrarei novamente a s. exa. este negocio.
Quanto á pergunta do sr. Arroyo, declaro-a s. exa. que respondo pelo que digo e não pelo que dizem os jornaes, que não quero saber se me são ou não affectos.
Hontem s. exa. perguntou-me se estava concluido algum emprestimo sobre estradas e eu respondi: «por ora não.»
Hoje não tenho que alterar na minha resposta.
Havia negociações? Havia.
Estava concluido algum contrato? Por ora não estava.
Não ha mais nada senão isto, digam os jornaes o que quizerem.
O sr. Arroyo: - Peço a v. exa. que consulte a camara se me permitte que use da palavra para responder ao sr. ministro da fazenda.
Assim se resolveu.
O sr. Arroyo: - Pouco tempo me demorarei no uso da palavra.
Não comprehendo a insistencia da parte do sr. ministro da fazenda em dar um caracter irritante ás mais simples perguntas que partem d'este lado da camara. (Apoiados.)
Por fórma alguma estranhei a noticia do Diario popular, unica e simplesmente tinha direito, visto que toda a gente conhece as relações estreitissimas que ha entre aquelle jornal e s. exa., que é seu director politico, (Apoiados.} tinha direito, digo, a notar, como notei em termos muito cordatos e urbanos, (Apoiados.} o caracter extraordinario e a discordancia grave, que se observa entre as declarações feitas n'esse jornal e as palavras por s. exa. proferidas, ainda hontem, n'esta casa.
E o sr. ministro da fazenda é que não tinha direito algum de estranhar que eu fallasse em jornal affecto a s. ex.º, porque é uma verdade que ninguem ignora. (Apoiados )
E1 curioso! Um deputado da opposição, ou faz uma accusacão em termos severos e a maioria accusa-o de ser demasiadamente aspero, ou se dirige ao governo em termos os mais cordatos e urbanos, e são então os proprios ministros que dão um caracter irritante á discussão!
Pois o que disse eu? Limitei-me a lembrar á camara que o sr. ministro da fazenda declarara hontem n'esta casa que não havia emprestimo nenhum realisado, e que

Página 983

SESSÃO DE 3 DE ABRIL DE 1880 983

hoje o Diario popular, jornal que e partidariamente affecto a s. exa., e creio que com isto não o offendo, trouxe uma noticia com todos os detalhes e promenores sobre uma operação, não como para ser realisada, mas como se já o estivesse definitivamente.
Pedi, portanto, algumas explicações a este respeito e o sr. ministro da fazenda levanta-se immediatamente, respondendo com um mau humor, perfeitamente inexplicavel, n'um tom acrimonioso e brusco, dando ás minhas perguntas um caracter irritante! (Apoiados.)
Declaro á camara que protesto contra essa maneira de responder.
S. exa. não responde aqui pelo que escrevem os jornaes, mas é claro que ha uma ligação estreitíssima entre esse jornal e s. ex.º; (Apoiados.) é claro que os promenores que n'elle se lêem são muito detalhados e precisos, e que s. exa. por fórma alguma podia estranhar que eu por isso fizesse estas considerações naturalissimas em referenda ao, Diario popular. (Apoiados.)
Protesto, repito, contra tal fórma de responder, o declaro que sempre que se derem taes casos, sempre que o Diario popular contrariar as declarações que o sr. ministro da fazenda aqui fizer, eu hei de pedir-lhe explicações, sem me importar com os modos bruscos de s. exa.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Não respondi com modos bruscos nem com descortezia. (Apoiados.)
O illustre deputado tinha uma declaração minha e um artigo de um jornal, e veiu perguntar me o que era que prevalecia, dizendo que o Diario popular me era particularmente affecto e pensando portanto que podiam as minhas palavras ser desmentidas pelo Diario popular.
Eu respondi-lhe que não tinha nada com o que diziam os jornaes e que só respondo aqui pelo que digo aqui e pelo que faço, sem querer saber se os jornaes me são affectos ou desaffectos.
Perguntou me hontem o sr. deputado se estava feito algum emprestimo, e eu respondi lhe que por ora não, declaração que mantenho. Não sei que n'isto haja descortesia para ninguem.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Franco Castello Branco: - Não foi para faltar sobre o incidente levantado pelo sr. Arroyo quo eu pedi a palavra; mas visto que vem a talhe de fouce, como se costuma dizer, aproveito a occasião para declarar que estou no proposito firme de fazer uso, nas discussões d'esta casa, de dois jornaes que se publicam em Lisboa, as Novidades e o Diario popular, referindo-me aos seus artigos, quando conheça pelo estylo, porque o estylo é o homem, que elles são escriptos pelo sr. Emygdio Navarro ou pelo sr. Marianno de Carvalho.
Bem sei que estes jornaes têem redactores muito capazes de tomarem a responsabilidade inteira do que ali se escreve; e se em qualquer d'elles apparecesse contra mim alguma aggressão directa, alguma aggressão de caracter pessoal, eu de certo que não viria aqui tomar a responsabilidade aos srs. ministros; mas fóra d'este caso, e sempre que os artigos sejam evidentemente dos srs. ministros, eu entendo que estou no pleno direito de me referir a elles, discutindo-os.
Realmente, não havia nada mais commodo e melhor do que irem s. ex.ªs para os seus jornaes defender os seus actos, e commentar as nossas accusações, sem nós podermos responder-lhes aqui.
Os srs. ministros têem a este respeito uma opinião e eu tenho outra. A minha ahi fica bem accentuada.
Agora vou dirigir me ao sr. ministro da fazenda para lhe fazer um pedido; e foi exactamente para isto que pedi a palavra.
Como s. exa. estará lembrado, quando no anno passado se tratou da reforma pautal, ou da nova pauta das alfandegas, eu discuti largamente este assumpto, e uma das proposições que avancei, foi que, d'essa reforma, tal como ia ser feita, resultaria não um acrescimo, mas uma diminuição de receita.
A nova pauta começou a vigorar em l de outubro, e de então para cá tem-se travado polemica na imprensa sobre este ponto, sustentando uns que houve diminuição e outros augmento de receita.
Quando chegar a discussão do orçamento rectificado, será esse o melhor ensejo para então só discutir este assumpto, e apurar a verdade; peço por isso ao sr. ministro da fazenda, que me sejam enviadas copias dos bolletim que mensalmente são apresentados á administração geral das alfandegas, pelas direções das alfandegas de Lisboa e Porto, e nos quaes vem determinado, sob a denominação de receita geral, o rendimento havido este anno e o anno passado, desde que entrou em execução a nova pauta, principalmente no que diz respeito a tabacos e cereaes.
Pela confrontação d'esses rendimentos, no actual anno e no anno passado, parece-me que poderemos sem sophismas, nem hesitações, já que se quer entrar n'essa discussão, apurar se effectivamente, da execução da nova pauta resulta um consideravel beneficio para o thesouro, ou se pelo contrario, os vaticínios dos deputados da opposição se têem realisado, ainda que para infelicidade do paiz, e do criterio com que o sr. ministro da fazenda julgou dever reformar a pauta das alfandegas.
Não me parece que deva haver difficuldades para a satisfação d'este meu pedido; porque os boletins do passado e d'este anno são faceis de copiar.
Espero portanto que o sr. ministro da fazenda, que deve ter a peito não recusar quaesquer elementos de argumentação, perfeitamente justificados, para que possa ser bem apreciada a sua administração financeira, não terá duvida alguma em dar as suas ordens, para que quanto antes me sejam enviados esses boletins; elles devem existir nas administrações das alfandegas, e é claro que eu não os podia pedir ás direcções das alfandegas de Lisboa e Porto.
(O orador não reviu.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Sr. presidente, com a primeira parte do discurso do illustre deputado não posso eu concordar, mas não quero renovar a discussão. E parece-me que a opinião de s. exa. não é partilhada por todos os deputados da opposição. Eu respondo pelos meus actos como ministro, e pelas minhas declarações na camara, e não pelo que diz qualquer jornal, seja elle qual for.
Quanto aos esclarecimentos pedidos pelo illustre deputado, a partir de que data os quer s. ex.ª?
O sr. Franco Castello Branco: - De l de outubro em diante, por isso mesmo que foi quando entrou em execução a nova pauta.
O Orador: - O ponto obscuro para mim era exactamente a data.
O sr. Franco Castello Branco: - São unicamente os boletins em que vem descriminada a receita dos tabacos e cereaes.
O Orador: - Pois esses boletins, relativos a tabacos e cereaes, e desde l de outubro, serão promptamente remettidos ao illustre deputado.
O sr. Fuschini: - Pedi a palavra unicamente para mandar para a mesa uma representação da camara municipal do concelho de S. Pedro de Sul, pedindo que seja approvado um projecto de lei para a construcção do caminho de ferro pelos valles do Sul e do Paiva, no Douro.
Parecem-me attendiveis as rasões que fundamentam esta representação e para que todos as possam apreciar devidamente, requeiro que ella seja publicada no Diario do governo.
Consultada a camara resolveu-se afirmativamente.

Página 984

984 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 23, estabelecendo que a fabricação dos tabacos no continente do reino seja feita exclusivamente por conta do estado, sendo expropriadas as fabricas existentes.

O sr. Arroyo: - Continua o seu discurso, começado na sessão anterior, contra o projecto em discussão, ficando ainda com a palavra reservada para a sessão immediata.
(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.}
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarde.

Redactor = S. Rego.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×