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N.° 57

SESSÃO DE 16 DE ABRIL DE 1902

Presidencia do Exmo Sr. Matheus Teixeira de Azevedo

Secretarios - os Exmos Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Joaquim Mendes Leal

SUMMARIO

Approva-se a acta sem reclamação. - Por não haver expediente, é logo dada a palavra ao Sr. Presidente do Conselho, que responde as interrogações feitas pelo Sr. Queiroz Ribeiro, quando, na sessão anterior, realizou o seu aviso previo. - Dá-se conta da ultima redacção do projecto do lei n.º 19. - Mandam para a mesa: uma representação de photographos o Sr. Anselmo Vieira, e avisos previos os Srs. Pinto dos Santos, Antonio Cabral e Queiroz Ribeiro. - Explicações do Sr. Oliveira Mattos sobre uma referencia que lhe foz na sessão anterior o Sr. Alipio Camello. - Apresenta uma representação da Associação Commercial dos Logistas de Lisboa o Sr. Veiga Beirão, sobre o projecto do convenio, o Sr. Henrique Kendall outra da Liga dos Lavradores do Norte, e o Sr. Dias Ferreira tres. Resolveu-se que fossem todas publicadas no Diario do Governo. - Apresentam projectos de lei os Srs. Mazziotti e Lourenço Cayolla.

Na ordem do dia approvam-se sem discussão os pareceres n.ºs 33 e 36 (contas da Camara), e em seguida põe-se em discussão o projecto de lei n.º 49, sobre a industria e commercio de explosivos. Enceta o debate o Sr. Mathias Nunes, que justifica diversas emendas que manda para a mesa. Responde-lhe o Sr. Ministro da Guerra. - Apresenta um pareceu da commissão de fazenda o Sr. Pereira Carrilho. - Fala em seguida o Sr. Francisco Machado, a quem responde o Sr. Ministro da Guerra. - Segue-se o Sr. Alberto Botelho, que defende o projecto. For estar esgotada a inscripção, são postos á votação e approvados todos os seus artigos. - Apresentam pareceres de commissões os Srs. Custodio Borja, Motta Prego, Abel Andrade e Vaz Ferreira - Entra em discussão o artigo 1.° do projecto de lei n.° 53, sobre o onus de servidão nos terrenos proximos de fortificações. É combatido pelo Sr. Dias Ferreira, que apresenta uma proposta, o a quem responde o Sr. Ministro da Guerra, votando-se em seguida o projecto, sem prejuizo das emendas que vão á commissão. - Dá-se conta da ultima redacção do projecto de lei n.° 49, e levanta-se a sessão.

Primeira chamada - Ás 10 horas e meia da manhã.

Presentes - 6 Srs. Deputados.

Segunda chamada - Ás 11 horas.

Abertura da sessão - Ás 11 horas e 20 minutos.

Presentes - 53 Senhores Deputados.

São os seguintes: - Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto Botelho, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Alfredo Cesar Brandão, Alvaro de Sousa Rego, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio Barbosa Mendonça, Antonio Belard da Fonseca, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio de Sousa Pinto de Magalhães, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Augusto José da Cunha, Augusto Neves dos Santos Carneiro, Belchior José Machado, Carlos Malheiro Dias, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Francisco José Machado, Francisco José Patricio, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alfredo de Faria, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, João Marcellino Arroyo, Joaquim Antonio de Sant'Anna, Joaquim Pereira Jardim, José Antonio Ferro de Madureira Beça, José Coelho da Motta Prego, José da Cunha Lima, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Dias Galas, José Joaquim Mendes Leal, José Maria de Oliveira Mattos, José Mathias Nunes, Julio Ernesto de Lima Duque, Luciano Antonio Pereira da Silva, Luiz Filippe de Castro (D.), Marianno José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Matheus Augusto Ribeiro Sampaio, Matheus Teixeira de Azevedo, Rodolpho Augusto de Sequeira e Visconde de Reguengo (Jorge).

Entraram durante a sessão os Srs.: - Abel Pereira de Andrade, Affonso Xavier Lopes Vieira, Agostinho Lucio e Silva, Albino Maria de Carvalho Moreira, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alexandre José Sarsfield, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio Centeno, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José Boavida, Antonio Maria de Carvalho, Almeida Serra, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Maria Pereira Carrilho, Augusto Cesar da Rocha Louza, Carlos Alberto Soares Cardoso, Carlos Augusto Ferreira, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Donde de Castro e Solla, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia, Custodio Miguel de Borja, Domingos Eusebio da Fonseca, Eduardo Burnay, Filippe Leite de Sarros e Moura, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, João Augusto Pereira, João Pinto Rodrigues dos Santos, José Caetano Rebello, José Dias Ferreira, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Simões, José Maria Pereira de Lima, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Augusto Petra Vianna, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz José Dias, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Homem de Mello da Camara e Marquez de Reriz.

Não compareceram á sessão os Srs.: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alipio Albano Camello, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio de Almeida Dias, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Joaquim Ferreira Margarido, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Roque da Silveira, Antonio Tavares Festas, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Fuschini, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Carlos de Almeida Pessanha, Fernando Mattozo Santos, Francisco José de Medeiros, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico dos

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Santos Martins, Henrique Matheus dos Santos, Hypacio Frederico do Brion, Ignacio José Franco, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Joaquim André de Freitas, João Monteiro Vieira do Castro, João de Sousa Tavares, Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos, Joaquim Justino de Poças Leitão, José Adolpho de Mello e Sousa, José Caetano de Sousa e Lacerda, José da Gama Lobo Lamare, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José de Mattos Sobral Cid, Julio Maria de Andrade e Sousa, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Francisco de Vargas, Manuel Joaquim Fratel, Manuel de Sousa Avidos, Marianno Cyrillo de Carvalho, Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Paulo de Barros Pinto Osorio, Rodrigo Affonso Pequito, Visconde de Mangualde e Visconde da Torre.

Acta - Approvada.

Não houve expediente.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Sr. Presidente: o illustre Deputado o Sr. Queiroz Ribeiro desenvolveu hontem o seu aviso previo, acêrca do meu procedimento para com a administração municipal de Lisboa, e a esse respeito fez o illustre Deputado um discurso vehemente acompanhado de considerações energicas, não quero dizer violentas, para demonstrar que esse meu procedimento foi tudo quanto ha de mais arbitrario, de mais injustificado, de mais tumultuario.

Ora, o illustre Deputado, que é um espirito claro e lucido, e que, quando põe de parte o facciosismo, é sympathico e bom, estou certo que ouvindo as minhas razões, as razões que determinaram o meu procedimento, como homem do Governo, razões que não são puramente juridicas, se bem que o cumprimento da lei se impõe como um dever a todo o homem de Estado, mas que são tambem razões de conveniencia publica e de ordem social, estou certo, digo, que ouvindo essas razões, se S. Exa. quiser, no intimo da sua consciencia, ser verdadeiro, não direi que ma venha dar o seu applauso, mas não me negará a sua justiça.

Por muito que ao illustre Deputado pareça que o meu procedimento foi tumultuaria, illegal, violento, a verdade é que, expostos os factos, narradas as circunstancias que o determinaram, o meu procedimento apparece como tudo que ha de mais plenamente justificado, de mais prudente, de mais bom aviso.

S. Exa. fez um rol de perguntas; nada menos do que sete.

São as seguintes:

Porque não se effectuou uma sindicancia para se apurar a responsabilidade da ultima vereação de Lisboa, pelos crimes de que a accusam? Se esses crimes são verdadeiros, porque ficaram impunes; se são falsos, quaes as provas da falsidade? Por que motivo permanecem impunes os diffamadores? Porque tem sido vedado á capital do reino eleger os seus representantes? Até quando tenciona o Governo impedir que ella o faça? Em que disposições legaes se funda para isso? Como justifica a violação do artigo 204.° do Codigo Administrativo que manda proceder á eleição dentro de quarenta dias?

Ora, acontece com estas perguntas do illustre Deputado o mesmo que acontece com os Mandamentos da Lei de Deus, pois que todas as perguntas se reduzem a duas.

A primeira, porque se não mandou syndicar a administração municipal de Lisboa; a segunda, porque se não mandou ainda proceder á eleição da Camara Municipal de Lisboa.

Nestas duas perguntas está tudo.

Vamos á primeira, ou antes ao primeiro capitulo de accusações vibrantes que o illustre Deputado produziu contra mim.

Porque não mandei syndicar a Camara Municipal de Lisboa? Porque não mandei apurar os factos, se eram criminosos, porque não facultei os elementos á justiça para a sua punição, e se não eram? Porque não mandei instaurar processo contra os diffamadores? Eu vou responder, apreciando conjuntamente as considerações em que S. Exa. baseou as suas perguntas.

Disse S. Exa.: boatos instantes, successivos de escandalos na administração municipal de Lisboa se produziram, ha dois annos, sobretudo no que toca ao capitulo de beneficencia publica; publicou-se um folheto do vereador Dias da Silva, contendo arguições gravissimas a essa administração; reclamou-se uma syndicancia, e o Ministro do Reino em vez de attender aos clamores geraes, em vez de inquirir dos factos, em vez de facilitar a punição dos delictos, esquivou-se a isso, quererá o caminho legal e correcto, metteu-se numa dictadura, supprimiu a beneficencia, que estava a cargo da Camara Municipal, o com isto julgou ter posto termo á questão.

Toda esta argumentação é, como a torre de Piza, um pouco inclinada, e como tal, facil de ser derruida.

S. Exa. fundou-se em que eu procurei esquivar me ao cumprimento do meu dever, mettendo-me na dictadura, que consistiu em tirar a beneficencia da Camara Municipal para a entregar á Misericordia.

Ora, eu não fiz dictadura para isso: a transferencia dos serviços de beneficencia foi feita por uma lei largamente discutida pelo Parlamento o foi discutida não só aqui, onde dei razão plena e determinativa do meu procedimento, mas na Camara dos Dignos Pares, onde tinha ostento o que fora presidente da Camara Municipal, onde foram provocadas explicações da minha parte e onde toda a Camara ouviu, apreciou e julgou as razões d'esse procedimento. Em virtude do seu julgamento é que se publicou a lei que tirou da Camara Municipal os serviços de beneficencia.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Não era esse o meu pensamento. No que eu disse que S. Exa. fez dictadura, foi precisamente em ter alterado o numero dos vereadores e ter feito sair a vereação accusada, substituindo-a por uma commissão administrativa.

O Orador: - Veja S. Exa. como a sua paixão politica o levou a atraiçoar o seu pensamento. O illustre Deputado veiu falar nas accusações que levantaram acêrca da beneficencia publica, na obrigação moral e legal que, no seu entender, eu tinha de proceder sobre esses factos, relativos á beneficencia, porque era sobre elles que versavam as accusações, e eu mostrei ao illustre Deputado que não me servi para isso da dictadura e que pelo contrario trouxe a questão ao Parlamento.

Desde que não era este o pensamento do illustre Deputado, a accusação que me fez desapparece.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Pelo contrario, fica de pé; V. Exa. é que não quer responder a ella.

O Orador: - Eu respondo a tudo.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Até responde ao que eu não disse. A incomprehensão pode ser minha ou de V. Exa.

O Orador: - Ha de ser minha; mas eu hei de responder a tudo, se Deus me der tempo e paciencia.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Será muito responder.

O Orador: - Agora vamos propriamente a esta parte; á razão por que não syndiquei dos actos da Camara Municipal de Lisboa.

Não syndiquei por uma razão muito simples, o que vão seguramente calar no animo do illustre Deputado.

Quando um serviço está bem constituido, bem organizado, deve imputar-se a uma determinada entidade a sua responsabilidade, se elle é mal desempenhado. Syndicam-se os actos d'essa entidade, para ser substituida, se não for

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competente; mas quando, pelo contrario, esse serviço não está bem organizado ou não está bem commettido á entidade que o tem de desempenhar, então não se procede á syndicancia; reforma-se, esse serviço.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - E os crimes ficam impunes?

O Orador: - Não ficam. Para isso lá está a acção do Ministerio Publico.

Ora veja o illustre Deputado o que aconteceu com o Municipio de Lisboa. A lei de 18 de julho de 1885, como S. Exa. sabe, estabeleceu uma larga descentralização dos serviços administrativos constituindo o que até enteio se chamou a Communa de Lisboa. Commetteram-se ao Municipio, principalmente, tres grandes e importantes ramos de serviço: o da instrucção, o da saude e o da beneficencia. Cinco annos depois o decreto de 10 de março de 1890 auctorizava o Governo a reorganizar o Municipio de Lisboa, porque se tinha reconhecido na pratica que aquella larga descentralização era inconveniente e prejudicial, e por isso veiu o decreto de 26 de setembro de 1891 que tirou á Camara Municipal dois grandes serviços: o da instrucção e o da saude, passando-os para o Estado.

Pergunto: porque é que este decreto transferiu estes dois grandes e importantes ramos de serviço, o da instrucção e o da saude publica, do Municipio de Lisboa para o Estado? Evidentemente porque elles não eram bem desempenhados. Não implicava isto com as pessoas que d'elles estavam incumbidos, aliás quem publicou o decreto teria mandado syndicar; o fundamento d'elle era o reconhecimento de que havia um vicio organico, de que havia necessidade de remodelar esses serviços.

Não se syndicou porque se entendeu que o mal não estava nas pessoas, mas na forma como os serviços estavam organizados, entendendo se tambem que melhor garantido ficaria o seu pensamento passando-o para o Estado do que conservando-o a cargo do municipio. E questão de principios, e não de pessoas.

Foi isto precisamente o que se passou tambem com o serviço de beneficencia e por isso o remodelei, sem mandar proceder a syndicancia, pois que, na minha convicção, era que o mal não residia nas pessoas que desempenhavam esses serviços, mas sim que estes não estavam bem organizados, que havia nelles um vicio organico que era necessario corrigir; e essa correcção não estava na syndicancia, mas em serem confiados a quem, pela sua maior competencia, desse maiores garantias de que elles seriam melhor desempenhados.

Para isto não era necessaria uma syndicancia, repito; era necessaria uma reforma, e foi o que eu fiz.

Depois, perguntou-me o illustre Deputado: tendo-se feito accusações á Camara Municipal de Lisboa pela forma como eram desempenhados os serviços de beneficencia, porque é que eu os passei para o Estado? Não os passei para o Estado; passei para a Misericordia de Lisboa, estabelecimento que está ao abrigo da influencia dos Governos, os serviços propriamente de subsidios, que era o capitulo principal dá accusação contra a Camara; e passei a superintendencia dos serviços de beneficencia para o Conselho Geral de Beneficencia, que encontrei organizado e que mantive sem substituir nenhum dos seus membros, embora sigam uma politica que não é affecta á minha, por confiar na lealdade do seu caracter e tambem para demonstrar, que a reforma não obedecia a intuitos politicos, mas sim á necessidade de promover a boa execução d'esses serviços.

Ora aqui tem o illustre Deputado porque é que, em vez de fazer uma syndicancia, fiz uma reforma. É porque entendi que qualquer que fosse o resultado da syndicancia, o que se impunha, em todo o caso, era a remodelação do serviço de modo que pudesse ser devidamente desempenhado com todas as garantias, e desde que eu entendi que o que era necessario era uma reforma, não tinha que syndicar. Pois se eu tirava ás pessoas que o estavam exercendo esse serviço, para que havia de vexá-las? E não sou agente do Ministerio Publico.

Se este, em face dessas accusações, procedesse, estava na orbita das suas attribuições; mas eu que só tenho a parte administrativa, desde que me propunha fazer a reforma d'esse serviço, se fosse syndicar os actos das pessoas que deixavam de o desempenhar, isso é que não se comprehendia.

Aqui tem o illustre Deputado respondidas as suas primeiras perguntas, o 1.° mandamento da lei do illustre Deputado.

Não mandei syndicar porque reformei, e reformando não tinha que syndicar, como em 1891 não se syndicou.

Porque se fez a reforma? Porque os serviços estavam bem organizados, porque eram bem desempenhados, porque não careciam de correcção? Não, quando se reformou foi quando se conheceu o mal, quando se conheceu que o que existia era vicioso. Foi o que eu fiz, aliás não havia reforma.

Satisfação á opinião publica, dei-a eu remodelando esse serviço e entregando-o, no que toca á beneficencia, a uma instituição que está ao abrigo de toda a suspeita, e no que toca a subsidios entregando-o a uma corporação que não está na dependencia do Ministro.

Se eu tivesse passado esse serviço para uma corporação politica, em que mais ou menos directamente as influencias eleitoraes pudessem exercer pressão, poderia S. Exa. ter razão para me accusar; mas procedendo como procedi, não me parece que, com justiça, o possa fazer.

Posto isto, vamos ao segundo capitulo de perguntas.

Quer o illustre Deputado saber o motivo por que eu, sendo dissolvido a Camara Municipal, não mandei proceder á eleição dentro do prazo de quarenta dias, como determina o Codigo Administrativo; e ao mesmo tempo S. Exa. citou o artigo 204.º d'esse Codigo para demonstrar que eu faltei ao cumprimento da lei.

Foram tres as razões que determinaram o meu procedimento: a primeira é uma razão de ordem juridica, a segunda de ordem governativa e a terceira de ordem social.

Quanto á primeira razão, a de ordem juridica, disse o illustre Deputado que o artigo 204.° do Codigo Administrativo manda que, dissolvida a Camara, se proceda á eleição dentro do prazo de quarenta dias, disposição que eu não cumpri.

Está S. Exa. enganado; eu não dissolvi á Camara nos termos do Codigo Administrativo; se o tivesse feito, então não só tinha obrigação de cumprir o artigo citado por S. Exa., mandando proceder a nova eleição dentro do prazo de quarenta dias, mas deveria ter observado os tramites e formalidades exigidas pelo mesmo Codigo para a dissolução.

O artigo 17.° diz o seguinte:

«Os corpos administrativos, salvo o disposto para a commissão districtal, podem ser dissolvidos pelo Governo, sendo previamente ouvidos e precedendo consulta do Procurador Geral da Corôa»:

1.º Quando por culpa sua não submettam á approvação superior os seus orçamentos nos prasos e termos legaes;

2.° Quando, sem motivo justificado, não prestem contas das suas gerencias, em conformidade com a lei;

Tudo isto se liga quando se tem de fazer uma dissolução nos termos do Codigo Administrativo.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - O artigo 204.° não distingue.

O Orador: - Quando haja de proceder-se á dissolução de uma camara, é necessario fazer cumprir as formalidades legaes que já citei.

Quando ha motivo para syndicar ou apurar determina-

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factos prescriptos pela lei, independentemente da syndicancia em que tem de ser ouvida a corporação, deve haver consulta da Procuradoria Geral da Coroa.

Se ou tivesse procedido nos termos do artigo 204.° do Codigo Administrativo, então a accusação de S. Exa. deveria ter ido mais longe.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Então quis S. Exa. proceder fora da lei.

O Orador: - Ora ouça o illustre Deputado.

No artigo 204.º ha tres hypotheses: a da dissolução, a da annullação da eleição e a falta de eleição.

A dissolução da Camara Municipal de Lisboa não foi em virtude do que determina o Codigo Administrativo. Foi por virtude do decreto dictatorial que publiquei, que produziu os seus effeitos, mas que ficou sujeito á sancção do Parlamento.

Por esse decreto foi alterado o numero dos vereadores como alterado foi o proprio elenco das suas attribuições e feita esta reforma, era consequencia immediata o decretar-se a dissolução da Camara Municipal.

Portanto, repito, não foi dissolvida por effeito do Codigo Administrativo, foi dissolvida como consequencia da reforma dictatorial que se publicou e que, se representa um peccado, o Parlamento já absolveu d'elle o Governo approvando-a. (Apoiados}.

Mão estava, por consequencia, o Governo obrigado mandar proceder a nova eleição dentro dos quarenta dias.

Mas eu quero ner franco e sincero até ao fim da minha resposta.

Se tivesse só esta razão para proceder, como procedi eu não estará bem collocado perante a minha consciencia embora pelo Codigo não me reputasse obrigado a proceder á eleição.

Outras razões, como já indiquei, determinaram tambem o meu procedimento e eu vou expô-las ao Parlamento.

A primeira é a seguinte:

A Camara Municipal foi dissolvida por um decreto dictatorial que produziu os seus effeitos, mas teve de ser sujeito á sancção do Parlamento.

Ora, desde que trouxe ás Côrtes um bill de indemnidade...

(Interrupção ao Sr. Queiroz Ribeiro), Então S. Exa. censurou-me por não zelar as prorogativas parlamentares e agora censura tambem os meus zelos? (Apoiados).

Censura-me por todas as formas. (Apoiados). Como ia distendo, desde que eu trouxe um decreto dictatorial á apreciação das Côrtes e desde que a estas cabia a faculdade, tinha o pleno direito de modificar aquelle decreto, conforme entendesse, alterando, por exemplo, o numero de vereadores que se estabelecia pelo mesmo decreto para a gerencia do municipio, a boa razão aconselhava que não se fizesse a eleição e se aguardasse a resolução das Côrtes. (Muitos apoiados).

Para que se havia de estar a proceder a uma nova eleição, que podia ser inutilizada, desde que o Parlamento entendesse introduzir qualquer modificação no decreto? (Apoiados).

Desde que eu não tinha obrigação juridica de mandar proceder, dento de certo prazo, á eleição, mais sensato era aguardar que o Parlamento se pronunciasse sobre o decreto, approvando-o ou modificando-o.

Por consequencia, a homenagem devida ás prorogativas do Parlamento, impunha-me o dever de aguardar que as Côrtes tomassem uma solução definitiva, para assim, consoante essa resolução, eu mandar proceder á eleição. (Muitos apoiados).

Aqui tem o illustre Deputado a razão governativa que concorreu para determinar o meu procedimento. Mas a esta accresceu ainda uma outra de ordem social.

Quando eu dissolvi a Camara Municipal, havia um grande desvairamento na opinião publica; havia uma atmosphera pesada de suspeitas e de desconfianças, e, emfim, um estado de cousas que se não prestava a que a eleição fosse realizada nas devidas condições.

Se se fosse proceder á eleição dentro de quarenta dias, eu não tinha a garantia de que ella seria respeitada, recaindo em pessoas que melhor pudessem exercer e desempenhar proficuamente as funcções de vereadores. Entendi, por isso, que devia reservar para mais tarde a eleição, entregando, no entretanto, a administração municipal a uma commissão administrativa composta de individuos auctorizados, insuspeitos e competentes, para a gerencia dos negocios do municipio, e que effectivamente tem gerido com desvelo, bom criterio e de um modo superior a quaesquer suspeitas, com isenção e nobreza.

Foi a essa commissão que eu entreguei os negocios do municipio, dando-lhe tempo para regularizar a situação municipal, abrindo-se depois o periodo eleitoral, em harmonia com a resolução das Côrtes, com relação ao decreto da reforma.

Aqui tem o illustre Deputado expostas as razões do meu procedimento.

Não sei se S. Exa. me absolverá, mas se eu fosse consultar a Camara, estou certo de que toda ella me absolveria. (Muitos apoiados).

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Mas S. Exa. não disse ainda quando mandará proceder á eleição.

O Orador: - Eu quero ter todas as amabilidades para com o illustre Deputado, e não deixarei som resposta essa pergunta.

gora que o bill está approvado, mandarei proceder, o mais depressa possivel, á eleição da Camara Municipal de Lisboa.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

Tenho dito.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Mando para a mesa a seguinte

Nota do interpellação

Desejamos interpellar o Sr. Presidente do Conselho, Ministro do Reino, sobre as suas respostas ao aviso previo realizado hoje pelo segundo signatario. = F. J. Machado = Queiroz Ribeiro.

Mandou se expedir.

O Sr. Sergio de Castro: - Mando para a mesa a ultima redacção do projecto de lei n.° 19.

O Sr. Presidente: - Vão ser enviado á Camara dos Dignos Pares.

O Sr. Anselmo Vieira: - Mando para a mesa uma representação de varios photographos, pedindo que não sejam triplicados os direitos de importação das chapas de vidro sensibilizado para a photographia, e como essa representação está redigida em termos convenientes, peço seja auctorizada a sua publicação no Diario do Governo.

Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.

Vae por extracto no fim da sessão.

O Sr. Antonio Cabral: - Apresento o seguinte

Aviso previo

Pretendo interrogar o Sr. Ministro do Reino sobre o procedimento do administrador do concelho de Cintra, relativamente á escola elementar para o sexo masculino de Peropinheiro, freguesia de Montelavar, do referido concelho. = Antonio Cabral.

Mandou-se expedir.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Oliveira Mattos, mas previno V. Exa. que faltam apenas 5 minutos para se entrar na ordem do dia.

(Susurro).

O Sr. Oliveira Mattos: - Peço a V. Exa. que d'es-

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ses 5 minutos desconte 2, que são necessarios para estabelecer o silencio.

O Sr. Presidente: - Peço a attenção da Camara.

O Sr. Oliveira Mattos: - Pediu a palavra simplesmente para fazer uma declaração categorica, de caracter pessoal, a fim de evitar equivocos e novas insinuações.

Quando hontem, na discussão do projecto de lei n.° 19, o Sr. Alypio Camello respondia ao Sr. Pinto dos Santos, disso que elle, orador, não obstante oppor-se sempre a tudo quanto represente um augmento de despesa, tinha apresentado uma proposta para augmento do ordenado dos professores dos institutos e escolas industriaes. Interrompeu-o nessa occasião, dizendo que S. Exa. estava enganado, porque elle, orador, nunca apresentara proposta alguma nesse sentido, e esse Sr. Deputado promptamente rectificou a sua affirmação, declarando que o fizera por ter sido assim informado.

Não basta, porem, esta rectificação, e para evitar a qualquer outro Sr. Deputado o trabalho de uma nova citação errada, quer, muito positiva e terminantemente declarar, que nunca apresentou projecto, proposta ou emenda em que tal augmento se propusesse, não obstante reconhecer que os professores dos institutos o escolas industriaes não estão largamente retribuidos.

Isto não quer dizer que não levante, como tem levantado, a sua voz em favor de empregados que realmente recebem diminutos vencimentos, como são os professores de instrucção primaria, os escripturarios de fazenda e os empregados inferiores dos correios e telegraphos.

Contra o augmento de despesas que as circunstancias do Thesouro não permittem, nesta occasião, é que elle, orador, sempre se insurge.

Fique, pois, bem accentuado, para intelligencia de todos, que nunca propôs o augmento dos ordenados dos professores dos institutos e escolas industriaes.

(O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas}.

O Sr. Beirão: - Fui hontem procurado na Camara por uma representação da Associação Commercial dos Lojistas que me encarregou de apresentar nesta casa do Parlamento uma representação a proposito do projectado convenio com os portadores de titulos da divida publica externa.

Sr. Presidente: parece-me que esta representação está feita em termos convenientissimos e por isso eu pediria a V. Exa. que consultasse a Camara sobre se permitte que ella seja publicada no Diario ao Governo.

Entendo que nesta questão gravissima do convenio é bom e util que a Camara tome em consideração todas as representações que lhe forem enviadas, principalmente aquellas que representam classes e forças vivas na nação, como é a Associação dos Lojistas de Lisboa. Portanto, como a representação está feita em termos convenientes, peço a V. Exa. que consulto á Camara sobre a sua publicação.

Sr. Presidente: reservo-me fazer com respeito ás considerações constantes d'esta representação, assim como de outra que já mandei para a mesa e de que pedi tambem a publicação, as observações que me occorrerem, que julgar convenientes e opportunas quando este projecto entrar em discussão, porque naturalmente tenho de tomar parte nesse debate.

Foi auctorida a publicação no Diario do Governo, vae por extracto no fim da sessão.

O Sr. Presidente: - Deu a hora de se passar á ordem do dia.

Os Srs. Deputados que tenham papeis para mandar para a mesa, podem fazê-lo.

O Sr. Kendall: - Mando para a mesa duas representações contra as propostas dos Srs. Ministros da Marinha e Ministro das Obras Publicas. Estão redigidos em termos respeitosos, e por isso peço a V. Exa. que consulte a Camara sob se permitte a sua publicação no Diario do Governo.

Foi auctorizada a publicação.

O Sr. Presidente: - Declara que vae passar-se á ordem do dia o convida os Srs. Deputados que tiverem papeis á apresentar, a mandá-los para a mesa.

O Sr. Dias Ferreira: - Tem a mandar para a mesa duas representações; uma da Camara Municipal do Barreiro e outra da Camara Municipal de Alcochete. Em ambas se protesta contra uma das disposições da base 1.ª da proposta de lei apresentada pelo Sr. Ministro das Obras Publicas, no intuito de attenuar os effeitos da crise vinicola actual.

Prohibe-se nessa base, alem da plantação de novas vinhas, e neste ponto estão de acordo as municipalidades reclamantes, a replantação das vinhas existentes, sem excepção das que se encontram em terrenos successiveis a outros generos de culturas. Contra isto é que ellas reclamam e com justos fundamentos, como terá occasião de apreciar a respectiva commissão.

Elle, orador, não querendo antecipar a discussão de tão grave assumpto, limita-se a mandar para a mesa as duas representações a que se refere; e porque ellas se acham redigidas em termos respeitosos, pede que sejam publicadas no Diario do Governo.

Assim se resolveu.

Vão por extracto no fim da sessão.

O Sr. Pinto dos Santos: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Desejo chamar a attenção do Sr. Ministro das Obras Publicas a proposito dos artigos 9.° e 38.° do decreto de 24 de outubro de 1901, a fim de saber até que ponto os engenheiros civis podem ser prejudicados com a entrada no quadro dos engenheiros militares.

Sala das sessões, em 16 de abril de 1902. = O Deputado, João Pinto dos Santos.

Mandou-se expedir.

O Sr. Mazziotti: - Mando para a mesa um projecto de lei concedendo a Maria Angelina Parella de Brito a sobrevivencia na pensão de sua fallecida mãe D. Marianna Casimira Parella, pensão que lhe foi concedida por decreto de 27 de junho de 1860.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Lourenço Cayolla: - Mando para a mesa dois projectos de lei: um auctorizando o Governo a ceder á Camara Municipal de Castello de Vide as muralhas que circundam a mesma villa, na posse do Ministerio da Guerra; outro auctorizando o Governo a ceder á Camara Municipal de Campo Maior as muralhas e terrenos annexos que circundam esta villa.

Ficaram para segunda leitura.

ORDEM DO DIA

Parecer n.º 33, sobre as contas da gerencia da Camara

PARECER N.° 33

Senhores. - A vossa commissão de fazenda foram enviadas as contas da gerencia da commissão administrativa da Camara dos Senhores Deputados, relativa ao periodo decorrido de 10 de janeiro a 27 de maio de 1901.

Examinadas as referidas contas com a mais escrupulosa attenção, claramente reconheceu a vossa commissão que as receitas resultam das requisições feitas ao Ministerio da Fazenda de quatro duodecimos que por este foram satis-

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

feitos por conta da dotação da referida Camara e do saldo du gerencia da junta administrativa, pela forma seguinte:

Artigo 10.° - l.ª e 2.ª secções 10:323$800
Artigo 11.º..................... 883$300
Artigo 12.°..................... 6:457$66O
Artigo 13.°..................... 974$000

Saldo da gerencia da junta administrativa,
cujas funcções terminaram em 10 de
janeiro de 1901.............. 3:011$235 21:649$995

As despesas, conforme os 37 documentos
justificativos que acompanham as contas, foram:

Pelos artigos acima referidos.. 17:132$870
Saldo entregue no Sr. Thesoureiro
da junta administrativa 4:517$125 21:649$995

Reconhecido, pois, como esta, por este resumo de contas, que a receita se acha balanceada com a despesa; reconhecido ainda pelo exame dos documentos que as quantias recebidas foram applicadas a despesas devidamente auctorizadas e que se cumpriram as disposições legaes, é a vossa commissão de parecer que as mesmas contas devem ser approvadas, e, porque o respectivo resumo se acha contido neste parecer, ser elle, depois de approvado pela Camara, publicado no Diario do Governo.

Sala das sessões da commissão de fazenda, 18 de março de 1902. João M. Arroyo - Sousa Avides - Augusto Lousa -- M. Matheus dos Santos = Alberto Navarro - Manuel Fratel - Luiz G. dos Reis Torgal - Anselmo Vieira = Lopes Navarro - Abel Andrade = D. Luiz de Castro = Conde de Paçô-Vieira, relator.

O Sr. Antonio Cabral: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, não propriamente com a intenção de discutir o parecer que V. Exa. acaba de pôr em discussão, mas apenas para me dirigir ao Sr. Ministro da Justiça, visto que não pude faze-lo antes da ordem do dia, e chamar a attenção de S. Exa. para o facto que vou expor.

Tomarei apenas 2 minutos á Camara.

Quando foi criada no Porto a 4.ª vara civel, foram orçadas em diminuta quantia as obras a fazer no edificio do Tribunal de S. João Novo, para a installação da mesma vara e do 3.º districto criminal.

Como estas obras eram de conveniencia para o Estado, ordenou-se superiormente que se fizessem essas obras com urgencia.

Quando caiu o gabinete progressista, foram mandadas suspender essas obras que iam começar e cujo orçamento tinha sido mandado elaborar pelo Ministerio das Obras Publicas de acordo com o da Justiça, e o 3.º districto criminal continuou installado numa casa, pela qual se está pagando uma avultada renda. Os escrivães da 4.ª vara civel tambem então pagando, a sua custa, a renda das casas onde teem os seus cartorios.

Peço, pois, ao Sr. Ministro da Justiça, que, de acordo com o sou collega das Obras Publicas, remedeie esta situação, fazendo com que se proceda a essas obras, cujo custo não é excessivo, conseguindo assim que o 3.º districto criminal se possa installar no edificio de S. João Novo do Porto.

Despendendo-se uma pequena verba, deixa de se gastar a quantia de 600$000 réis, que actualmente se está pagando pela renda da casa do 3.º districto criminal. (Apoiados).

Evita-se tambem que os escrivães paguem a renda que estão pagando pelas rendas das casas dos seus cartorios, o que representa uma diminuição nos seus lucros, que já não são muitos.

Emquanto essa medida não se torna effectiva, os referidos escrivães pedem, num documento que tenho presente, que o Estado lhes adeante, em duas prestações semestraes, a quantia de 40$000 réis a cada um, para pagamento d'essas rendas, o que é de toda a justiça, podendo essa verba sair do rendimento do quintal do Tribunal de S. João Novo, que anda arrendado a um particular, e o resto do cofre do Juizo da comarca do Porto.

Quanto ao parecer em discussão, só tenho a dizer, que as contas estão, decerto, bem elaboradas, e que, portanto, nada tenho a oppor-lhe.

Tenho dito.

O Sr. Ministro da Justiça (Campos Henriques): - Sr. Presidente: pedi a palavra para responder ao illustre Deputado Sr. Antonio Cabral.

S. Exa. chamou a minha attenção para um facto que diz respeito á administração da justiça nos tribunaes do Porto, e eu devo dizer a S. Exa. que me merecem sempre a maxima attenção os assumptos d'essa natureza. O meu mais vivo desejo, o meu maior interesse é que os tribunaes judiciaes estejam montados em condições de satisfazerem o melhor possivel á sua elevada missão.

E este desejo e interesse, subiriam de ponto, se fosse possivel, tratando-se da cidade do Porto, onde nasci, onde me prendem relações que se não quebram.

Uma cousa, porem, devo dizer a S. Exa. Não depende de mim nem determinar as obras, nem suspendê-las. Não suspendi, portanto, nem podia suspender, nenhuma obra quando entrei no actual Ministerio; e, assim, a minha intervenção só pode ser no sentido de juntar as minhas instancias ás do illustre Deputado perante o director das obras publicas para que essas obras se realizem.

Devo ainda fazer outra reflexão.

É a seguinte:

O tribunal do 3.° districto criminal funcciona ha muitos annos numa casa áparte, e parece-me que não é possivel installá-lo em S. João Novo, porque se ahi ha capacidade para algum cartorio, não a ha para o tribunal de um districto.

Quanto aos escrivães da 4.ª vara civel da cidade do Porto, poderão elles estar effectivamente em desigualdade de circunstancias, no que respeita á falta de installação do cartorio; mas, estão em outras melhores condições do que os escrivães de todo o país, com excepção dos outros d'aquella cidade e dos de Lisboa, porque estes teem uma vara mais larga e mais rendosa.

Isto não quer dizer que eu não procure e solicite do nobre Ministro das Obras Publicas que elle mande fazer essas obras, não por se dever esperar que se realize a installação do 3.° districto, seria isso absolutamente impossivel, mas para que tenham ao menos os cartorios.

Por ultimo direi que se eu não obtempero ao pedido de S. Exa. para que se adeantem aos escrivães os 50$000 réis, é, em primeiro logar, porque não tenho para isso verba no Orçamento, e, em segundo logar, porque esses escrivães auferem maiores interesses.

Em todo o caso, satisfazendo ao desejo do illustre Deputado, instarei com o Sr. Ministro das Obras Publicas para que as obras a que S. Exa. se referiu, se façam com a maior urgencia possivel.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção, vae ler-se o parecer para ser votado.

Foi lido e approvado.

O Sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o parecer n.° 30 sobre as contas da Junta Administrativa da Camara.

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SESSÃO N.° 57 DE 16 DE ABRIL DE 1902 7

Leu-se o seguinte

PARECER N.° 36

Senhores. - Á vossa, commissão administrativa foram presentes as contas da junta administrativa da Camara dos Senhores Deputados, relativas ao periodo decorrido de 27 de maio de 1901 a 17 de janeiro de 1902, data em que cessaram as funcções da referida junta.

Feito um detido e meticuloso exame das referidas contas, reconheceu á vossa commissão que todas as receitas são provenientes dos duodecimos da dotação orçamental da Camara, requisitados mensalmente ao Ministerio da Fazenda pela seguinte forma:

Artigo 10.°, secções 1.ª e 2.ª (oito duodecimos).......... 20:690$200
Artigo 11.° (oito duodecimos)............................. 1:766$700
Artigo 12.° (oito duodecimos)............................. 12:915$340
Artigo 13.° (oito duodecimos)............................. 1:912$000

37:284$240

E dos saldos da gerencia da commissão administrativa,
cujas funcções terminaram em 27 de maio de 1901........... 4:517$125

41:801$365

As despesas, conforme os 47 documentos que justificam
as mesmas contas, foram:

Pelos artigos acima referidos............................ 38:094$265
havendo, portanto, um saldo de........................... 3:707$100
que addicionado á despesa dá um total de................. 41:801$365

igual ás receitas.

O saldo que inclue a quantia de 13$550 réis, abonada a um redactor da Camara fallecido, foi entregue ao Sr. Deputado thesoureiro da commissão administrativa, ficando aquella quantia em deposito para ser entregue a quem de direito pertencer.

Considerando a vossa commissão que as receitas se acham balanceadas com as despesas, e que estas foram superiormente ordenadas, tendo-se cumprido as disposições legaes, é de parecer que as contas devem merecer a approvação da Camara, e que, depois de approvadas, este parecer seja publicado no Diario do Governo, porque nelle se contém o resumo das alludidas contas.

Sala das sessões da commissão administrativa, em 22 de março de 1902. = Matheus Teixeira de Azevedo = H. Mntheus dos Santos = Jayme Arthur da Costa Pinto = Rodrigo Affonso Pequito = Amandio Eduardo da Motta Veiga.

Approvado sem discussão.

O Sr. Alberto Botelho: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

equeiro que se consulte a Camara sobre se deseja que entrem em discussão os projectos de lei n.ºs 49 e 53. - Alberto Botelho.

Foi approvado.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se para entrar em discussão o projecto n.° 49.

Leu-se na mesa. É o seguinte:

ROJECTO DE LEI N.º 49

Senhores: - Á vossa commissão de guerra foi presente a proposta de lei n.º 22-L, da renovação de iniciativa do Governo, a qual merece a vossa approvação pelas razões seguintes:

Sabido é de todos que desde 1819, descoberta do fulminato de mercurio, o fabrico e estudo dos corpos explosivos deixou o caracter empirico, que o revestia, para se tornar uma sciencia difficil, como é a chimica organica.

Desde então o numero de inventores e os respectivos productos teem crescido de uma maneira assombrosa, tornando-se por isso preciso regular não só o estabelecimento das fabricas e officinas, como o da venda de productos tão perigosos, que por vezes teem sido, alem do agentes criminosos, causa de desastres muito lamentados, mas para logo esquecidos.

Os diferentes diplomas, por onde a lei anda dispersa, são insufficientes e por vezes contradictorios; urge portanto aperfeiçoar e reunir num só diploma o que a moderna sciencia e a segurança publica aconselham.

É tambem grande o numero de officinas pyrotechnicas que escapam ao pagamento do respectivo imposto, prejudicando assim os interesses do Thesouro.

Por isso a commissão, de acordo com o Governo, vem apresentar ao vosso esclarecido exame o seguinte projecto, de lei:

Artigo l.° É livre o exercicio da industria e commercio das substancias explosivas, quando sejam satisfeitas as condições estabelecidas na presente lei.

Art. 2.° O estabelecimento de quaesquer fabricas, officinas e paioes para substancias explosivas só pode fazer-se precedendo licença, pedida na administração do concelho ou bairro respectivo, em requerimento acompanhado dos documentos por onde possa conhecer-se que são attendidas as necessarias condições de segurança, e que se fez o deposito de 20$000 réis a 200$000 réis, como caução provisoria.

Art. 3.° Não será concedida a referida licença sem que primeiramente tenham sido convocados por editos quaesquer interessados a reclamar contra o estabelecimento projectado.

Art. 4.º O processo será apreciado por uma commissão, intitulada Commissão dos Explosivos, que funccionará junto do Ministerio do Reino e consultará sobre os assumptos relativos a substancias explosivas.

§ unico. Esta commissão será presidida pelo general director geral do serviço de artilharia e composta de officiaes de engenharia e de artilharia, e de engenheiros do Ministerio das Obras Publicas, nomeados pelo Ministerio do Reino.

Art. 5.° Concedida a licença para o estabelecimento de fabricas, oficinas ou paioes de substancias explosivas, será fixada a caução definitiva, que responde pelas contravenções dos regulamentos, e que poderá ascender a 5:000$000 réis.

Art. 6.° A laboração ou utilização das fabricas, officinas o paioes só poderá começar depois de uma vistoria feita pela inspecção do serviço de artilharia da circumscripção militar em que estiverem situados esses estabelecimentos, e pela qual se reconheça que foram cumpridas as prescripções impostas no alvará de licença e adoptadas as devidas condições de segurança.

Art. 7.º As alterações na installação das fabricas, officinas e paioes, ou no processo do fabrico dos explosivos podem obrigar a nova habilitação para licença.

Art. 8.° Só poderão vender substancias explosivas as pessoas habilitadas com a devida licença, que será concedida pela administração do concelho ou bairro, quando satisfeitas as condições de segurança estabelecidas no respectivo regulamento.

Art. 9.º Só poderão vender-se as substancias explosivas constantes das tabellas publicadas no Diario do Governo.

§ unico. Os explosivos propriamente ditos só poderão ser vendidos a pessoas idoneas, mediante requisição por escrito.

Art. 10.° As fabricas, officinas e paioes serão obrigadas a ter em dia a escripturação do seu movimento, da qual

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8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

conste a quantidade dos productos fabricados, vendidos e em deposito.

Art. 11." É prohibido, nos estabelecimentos de venda, a existencia de mais de 15 kilogrammas de polvora e a de qualquer porção d'outros explosivos, devendo a armazenagem de maiores quantidades de polvora e bem assim a de explosivos satisfazer ás condições de segurança, que foram prescriptas.

Art. 12.º A applicação da dynamite, ou de outros explosivos propriamente ditos, só poderá fazer-se nos termos do respectivo regulamento.

Art. 13.º Nos casos de perturbação da ordem publica todos os depositos de substancias explosivas ficam á disposição do Governo.

Art. 14.º Serão punidas com a pena de prisão até seis meses e com multa que poderá elevar-se a 1:000$000 réis, segundo a importancia da fabrica, officina, paiol ou valor do transporte, e conforme a gravidade da falta, as transgressões da presente lei e respectivo regulamento.

Art. 15.º A laboração de qualquer fabrica ou officina em que se reconheça não existirem as necessarias condições de segurança, poderá ser suspensa provisoriamente.

Art. 16.º Continuam em vigor as licenças concedidas até a data d'esta lei, comtanto que os proprietarios das fabricas, officinas e paioes se façam inscrever, como taes, na administração do concelho respectivo.

Art. 17.º O Governo regulamentará a presente lei, estabelecendo: as formas do processo para a concessão, suspensão e annullação das licenças; as condições especiaes a que devem satisfazer as fabricas, officinas, paioes e depositos para a venda; os preceitos a observar no fabrico, transporte, armazenagem, emprego, inutilização, importação e exportação dos diversos explosivos; e, finalmente, a fiscalização que deve exercer-se para reprimir as infracções.

Art. 18.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de guerra, 7 de abril de 1902 - José Nicolau Raposo Botelho - Belchior José Machado - Ernesto Nunes da Costa e Ornellas - José Maria de Oliveira Simões = A. Rodrigues Ribeiro = C. A. Soares Cardoso = José Jeronymo Rodrigues Monteiro = Alexandre José Sarsfield - José J. Mendes Leal. - João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira - Alberto Botelho, relator.

Senhores. - A vossa commissão de legislação criminal concorda com o parecer da commissão de guerra.

Sala das sessões da commissão de legislação criminal, 7 de abril de 1902. = Conde de Paçô-Vieira - Sergio de Castro - Manuel Fratel = Antonio de Mendonça David = Conde de Castro e Solla = L. G. dos Reis Torgal - P. Lima = Alberto Navarro, relator.

Senhores. - Está de acordo a vossa commissão de administração publica com os pareceres das illustres com missões de guerra e de legislação criminal.

Sala das sessões da commissão, em 7 de abril de 1902. = João M. Arroyo - Alvaro Possollo = Conde de Paçô-Vieira - Manuel Fratel José J. Mendes Leal = J. A. Mello e Sousa - Mario Monteiro - Joaquim Pereira Jardim = Jayme Arthur da Costa Pinto.

N.º 5-J

Senhores. - Renovamos a iniciativa da proposta de lei n.º 22-L, apresentada na sessão de 15 de março de 1901, e que diz respeito á industria e commercio das substancias explosivas.

Secretaria do Estado dos Negocios da Guerra, 23 de janeiro de 1902.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mottozo Santos - Luiz Augusto Pimentel Pinto.

N.º 22-L

Senhores. - A industria das substancias explosivas e o commercio d'estes perigosos productos requer precauções e cuidados particulares, tanto pelos desastres pessoaes e damnos materiaes que podem dar-se na sua manufactura e transporte, como pelas applicações a que se prestam.

É de toda a conveniencia reunir a legislação que existe, dispersa e desharmonica, sobre este assumpto, e preencher as suas numerosas lacunas ou deficiencias, addicionando-lhe tambem as disposições mais essenciaes sobre os explosivos violentos que a chimica moderna tem fornecido á industria e que, nem sempre, são utilizados na obra da civilização e do progresso.

A industria dos explosivos não é uma industria ordinaria que possa ser submettida ás mesmas regras. Deve ter uma vida especial, visto ligar-se tão intimamente á ordem e á segurança publica. Por isso, em todos os paises se tem regulado o seu exercicio e promulgado regulamentos prescrevendo as normas por que deva exercer-se o commercio respectivo.

Julga o Governo que não deve permittir se o estabelecimento de fabricas, officinas e paioes ou depositos de quaesquer polvoras, explosivos propriamente ditos, artificios pyrotechnicos e cartuchame para armas do fogo, sem que previamente se reconheça que nesse estabelecimento se observam as precauções que a sciencia aconselha.

Julga igualmente que o transporte dos corpos explosivos se não deve fazer livremente, quer elle se effectue pelas vias ordinarias, quer em caminhos de ferro, mas obedecendo a determinadas regras, tendentes a attenuar os perigos da explosão.

Para augmentar a receita publica e fomentar a exportação das polvoras de commercio para as provincias ultramarinas, apresenta o Governo uma proposta de lei que o auctorize a acceitar propostas para o monopolio d'essas substancias explosivas. Nem todas, porem, se comprehendem no monopolio e é necessario por isso considerar umas e outras, definindo as attribuições das auctoridades que devam intervir ou superintender neste serviço, que tem uma parte technica importante e exige uma fiscalização cuidadosa, e fixando o processo de habilitação para o estabelecimento das fabricas, officinas e paioes.

Pareceu conveniente criar no Ministerio do Reino uma commissão technica para dar parecer sobre os explosivos que se pretenda introduzir, sobre os projectos de installação das fabricas, e mais assumptos correlativos, desempenhando papel semelhante ao que representam noutros paises commissões analogas.

É inspirada nestas idéas a proposta de lei que tenho a honra de apresentar, a qual deve contribuir para a regularização de um serviço digno da vossa attenção, pois tende a acautelar o publico contra desastres infelizmente frequentes, e a contribuir tambem para o augmento da receita do Estado.

Proposta de lei

Artigo 1.° É livre, nos termos da presente lei, o exercicio da industria e do commercio das substancias explosivas que não sejam polvoras negras e suas derivadas nitradas ou chloratadas, e bom assim o d'estas polvoras emquanto se não contratar o monopolio, quando sejam satisfeitas as condições estabelecidas na presente lei.

Art. 2.° O estabelecimento de quaesquer fabricas, officinas e paioes para substancias explosivas só pode fazer-se precedendo licença, pedida na administração do concelho ou bairro respectivo, em requerimento acompanhado dos documentos por onde possa conhecer-se que são attendidas as necessarias condições de segurança, o que se fez o deposito de 20$000 réis a 200$000 réis, como caução provisoria.

§ unico. Quando se trate de polvoras negras e suas de-

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rivadas, depois de concedido o monopolio, deverá produzir se documento provando que foi dada pelo concessionario a necessaria licença, se este não for o pretendente.

Art. 3.° Não será concedida a licença sem que primeiramente tenham sido convocados por editos os interessados a reclamar contra o estabelecimento projectado.

Art. 4.° O processo será apreciado por uma commissão, intitulada Commissão dos Explosivos que funccionará junto do Ministerio do Reino e consultará sobre todos os assumptos relativos a corpos explosivos.

§ unico. Esta commissão será presidida pelo general director geral do serviço de artilharia e composta de officiaes de engenharia e de artilharia, e de engenheiros do Ministerio das Obras Publicas, nomeados por proposta do Ministro do Reino.

Art. 5.° Concedida a licença para o estabelecimento de fabricas, officinas ou paioes de corpos explosivos, será fixada a caução definitiva que responde pelas contravenções dos regulamentos, e que poderá ascender a 5:000$000 réis.

Art. 6.° A laboração ou utilização das fabricas, officinas e paioes só poderá começar depois de uma vistoria feita pelo inspector do material de guerra da divisão militar a que corresponder a fabrica, officina ou paiol, pela qual se reconheça que foram cumpridas as prescripções impostas no alvará de licença e adoptadas as devidas condições de segurança.

Art. 7.° As alterações na installação das fabricas, officinas e paioes, ou no processo de fabrico dos explosivos, obriga a nova habilitação para licença.

Art. 8.° Só poderão vender para consumo substancias explosivas as pessoas habilitadas com a devida licença, que será concedida pela administração do concelho ou bairro, quando satisfeitas as condições estabelecidas no respectivo regulamento.

Art. 9.º Não poderão vender-se explosivos que não constem das tabellas publicadas no Diario da Governo, e formuladas pela Commissão dos Explosivos, e só se venderão explosivos propriamente ditos, a pessoas idoneas, mediante requisição por escrito.

Art. 10.° As fabricas, officinas e paioes serão obrigadas a uma escripturação do seu movimento, da qual conste a quantidade dos productos fabricados, vendidos e em deposito.

Art. 1l.° É prohibida, nos estabelecimentos de venda, a existencia de mais de 15 kilogrammas de polvora e a de qualquer porção de dynamite e explosivos analogos.

Art. 12.º Não poderá fazer-se applicação da dynamite, ou de outros explosivos propriamente ditos, sem conhecimento do administrador do concelho ou bairro.

Art. 13.° Nos casos de perturbação da ordem publica todos os depositos de corpos explosivos ficarão á disposição do Governo.

Art. 14.° Serão punidas com a pena de prisão até seis meses e com a multa até 1:000$000 réis, segundo a importancia da fabrica, officina, paiol ou transporte, e segundo a gravidade da falta, as transgressões da presente lei e do respectivo regulamento.

Art. 15.° O inspector do material de guerra tem o direito de mandar suspender provisoriamente a laboração de qualquer fabrica ou officina, onde reconheça que existe perigo eminente.

Art. 16.° Continuam em vigor as licenças concedidas até á data d'esta lei, comtanto que os proprietarios das fabricas, officinas e paioes se façam inscrever, como taes, na inspecção do material de guerra da respectiva divisão militar, podendo todavia retirar-se a respectiva licença ás fabricas e officinas que produzem polvoras negras e suas derivadas, quando se decrete a sua expropriação.

Art. 17.° O Governo fará os regulamentos necessarios para a execução da presente lei, estabelecendo nelles: as formulas dos processos para a concessão e para a annullação das licenças; as condições especiaes a que devem satisfazer as fabricas, officinas, paioes e depositos para a renda; os preceitos a observar no fabrico, transporte, armazenagem, emprego e inutilização dos diversos explosivos; e, finalmente, a fiscalização que deve exercer-se para reprimir as infracções.

Art. 18.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra, em 15 de março de 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henrique = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto.

O Sr. Mathias Nunes: - Sr. Presidente: o projecto que está em discussão, apesar de nelle se tratar de substancias explosivas, parece á primeira vista ser extremamente pacifico e não merecer que o combatam.

Devo porem dizer a V. Exa. que nelle se conteem germens de grandes violencias, que não são decerto comparaveis com a violencia de explosivos, mas que, em todo o caso, podem dar origem a prejuizos e embaraços na applicação d'estas tão uteis substancias ás industrias e ao serviço dos particulares, sem querer agora falar nos serviços publicos e nos militares, em que são empregadas tão extensamente.

No uso e applicação dos explosivos, assim como na sua fabricação, transporte e armazenagem, deve haver, sem duvida, todas as cautelas necessarias, mesmo as que pareçam mais indispensaveis; não deverá, comtudo, exagerar-se o perigo, pois que isso nada remedeia, nem impor-se uma regulamentação por tal forma apertada e cheia de exageros, que provoque e obrigue á transgressão.

Os relatorios que precedem a proposta e o projecto de lei, neste momento em discussão, justificam sufficientemente a apresentação do mesmo projecto e a conveniencia da sua discussão. Tem por fim, principalmente, servir de base á elaboração de um regulamento sobre as substancias explosivas. Preciso é pois que essas bases sejam bem estabelecidas, para se não levantarem duvidas na confecção do regulamento, e não se estabeleçam nelle disposições que briguem com a lei, como se nota em alguns dos regulamentos do nosso país sobre varios assumptos e serviços.

O projecto, no seu artigo 17.°, estabelece que o Governo fará os regulamentos necessarios para a execução da lei, introduzindo nelles as varias condições a que ficarão sujeitos o fabrico, uso e applicação, transporte e armazenagem dos varios explosivos.

Ora, a boa regulamentação de um tal assumpto, constitue uma d'essas necessidades impreteriveis que se impõe ao Governo, não só como dever, mas como obrigação. Mas, dever e obrigação é tambem do Governo não inserir nos regulamentos disposições que não estejam em harmonia com as necessidades, e que, no assumpto que se discute, não sejam reclamadas pela segurança dos individuos e da propriedade.

Pois o projecto em discussão encerra em si disposições demasiado apertadas que seguramente serão um entrave ao emprego das substancias explosivas que são hoje de tão util e tão geral applicação. Prohibir, por exemplo, que nas casas de venda exista qualquer porção de dynamite ou de outros explosivos a este comparaveis, por mais pequena que seja, é um d'esses entraves desnecessarios. Outros mais se encontram no projecto que eu apontarei quando examinar alguns dos seus diversos artigos.

Os aperfeiçoamentos e progressos no que diz respeito a explosivos não teem consistido nem consistem unicamente na descoberta de novos productos; consistem principalmente na transformação physica dos explosivos violentos, conhecidos de ha muito, a fim de os submetter, amoldar e apropriar aos differentes usos, de que eram excluidos por causa da sua instabilidade e perigos de manipulação. São exemplo do que affirmo, a nitroglycerina e o algo-

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dão polvora: estes dois explosivos, de energia tão extraordinaria em relação á polvora negra, estiveram quasi a ser abandonados, logo em seguida á sua descoberta, por causa da sua instabilidade, e do perigo do seu maneio. Mas a physuca e a industria dos explosivos encontram meio de aproveitar utilmente, e sem maior perigo, substancias de tanto prestimo: bastou que o algodão polvora fosse comprimido e conservado com, pelo menos, 20 por cento de humidade, e a nitro glycerina fosse aborvida por um substancia inerte, o kisselguhr. Constituindo assim o que se chama dynamite, para que estas duas substancias, sem perderem das suas altas qualidades, pudessem ser de emprego seguro.

A associação intima do algodão polvora, com a nitro-glycerina, formando a dynamite-gomma, constitue hoje um dos mais energicos explosivos, e dos menos perigosos de manipular.

A pólvora nem fumo, empregada hoje no armamento de todos os exercitos, constituida, ou só por nitro-celludose, ou por esta substancia associada á nitro-glycerina, pode dizer-se que é de manipulação quasi absolutamente inoffensiva. Estas duas substancias, que no seu estado primitivo são extremamente brisantes e perigosos, foram completamente dominada na sua impetuosidade explova pela sua reducção a um estado physico especial, o estado colloidal.

Ora, Sr. Presidente, as observações que acabo de fazer, não somente são baseadas na experiencia propria, pois que tenho por vezes manuseado alguns d'estes productos, mas baseiam-se igualmente nas affirmações feitas por chymicos o tratadistas distinctos, algumas das quaes passo a citar.

Assim Upaim e Mayer tratando do algodão polvora dizem:

«É menos perigosoq eu a polvora ordinaria; mettido em caixas ligeiras de pinho, arde e não detona. Quando impregnado com 20 a 25 por cento de agua não arde, ainda que mettido num incendio, como se provou em Cliff End e em Laragley com 1:000 kilogrammas a 20 por cento de humidade, lançados num incendio que durou duas horas».

Tratando do transporte da dynamite, dizem igualmente «que as prescripções relativas ao transporte d'esta substancia são em geral as mesmas que para a polvora ordinaria, o poderiam ainda ser menos severas que para esta ultima». As prohibições impostas no principio a esta substancia na Áustria, o que embaraçando e estorvando a extensão do seu emprego, não podiam senão augmentar o numero dos accidentes, pois que os transportes se faziam na maior parte dos casos subrepticiamente e sem declaração, foram ulteriormente revogadas; comtudo a dynamite deve ser accondicionada cuidadosamente sob a forma de cartuchos, e acompanhada de letreiros encarnados nos carros. Apesar de tudo, o seu maneio não deixa de exigir precauções. Devem evitar-se as temperaturas superiores a 40º, ou choques violentos e os attritos entre superficies metallicas.

Cody, ao seu tratado de explosivos, diz:

«A dynamite mettida em caixas de madeira supporta, sem perigo, as trepidações nos caminhos de ferro, nos carros orinarios, etc., e o manuseamento d'esta substancia é, com as precauções usuaes, menos perigoso que com outras materias explosivas, não exceptuando a polvora negras».

A respectiva das escorvas de percusão é sabido que a Camara de Commercio de Birminghan provou, com experiencias, que ellas não apresentam qualquer perigo no seu transporte quando mesmo pegasse fogo nos pacotes. Uma caixa com 50:000 escorvas ardeu sem explosão num forno de fundição. Pacotes ou caixas de 5:000 foram esmagadas por uma massa de ferro de 50 kilogrammas caindo de altura de 4 metros, sem produzirem nenhuma detonação violento. Numa porção de escorvas, percutindo algumas, e fazendo as detonar, as restantes ficam intactas.

Sendo pois assim, para que é difficultar, sem necessidade, a armazenagem, transporte e venda de tão uteis substancias?

Sejamos prudentes, moderados e cautelosos, mas não sejamos exagerados.

Citarei ainda uma salutar disposição do regulamento belga sobre explosivos, que consta do seu artigo 39.°, em que se diz:

«Quando as prescripções do presente regulamento parecerem demasiado rigorosas, a respeito de determinadas substancias explosivas, e do perigo que apresente o seu transporte, o Ministro do Interior terá a faculdade do auctorizar a respeito d'essas substancias as derogações ou abolições que julgar compativeis com a segurança publica».

Disposição analoga me parece deverá ser inserida no projecto em discussão, para não ser necessario fazer a cada momento lei ou regulamento novo.

Entrando propriamente na analyse dos artigos do projecto, farei algumas considerações, acompanhado-as de propostas, que a meu ver, poderão melhorar a lei que se tem em vista.

Começando pelo artigo 2.° do projecto tenho a notar o seguinte: é que para o estabelecimento de quaisquer fabricas, paioes ou officinas para substancias explosivas é necessario uma licença e para se obter essa licença é indispensavel fazer-se um deposito, que vão de 20$000 a 200$000 réis, como caução provisoria.
Eu não percebo bem a que vem esta caução provisoria, exigida a quem quer montar um estabelecimento qualquer do fabricação, de deposito, ou de venda do productos explosivos. Nem na lei sobre explosivos de 1879 e respectivo regulamento de 1880, nem no decreto de 21 de outubro de 1803 só exige qualquer caução, provisoria ou definitiva.

Para vender parece-me que bastaria pedir licença; caução não percebo para que seja necessaria. E, ligando este artigo com o artigo 5.°, vejo o seguinte, e é que, concedida a licença, se fixa uma caução definitiva, que responde pelas contravenções, diz o artigo, e que poderá ascender a 5:000$000 réis.

Não comprehendo tambem esta canção, nem a discuto, mas parece-me que ha aqui exagero era exigir-se caução a quem queira, por exemplo, vender na sua loja alguns explosivos, conjuntamente com outros quaesquer artigos, como de ordinario acontece.

Geralmente quem quer estabelecer uma loja de venda de quaesquer artigos, pede licença, mas não presta caução.

No artigo 5.° diz-se que esta canção á por causa das contravenções, ao passo que no artigo 14.° se fala em transgressões. Aqui são transgressões, no artigo 5.° são contravenções.

Eu não sei fazer a distincção entre as duas cousas, nem creio que seja cousa facil; mas o que vejo o que para o primeiro caso só applicam simplesmente multas, que vão até 5:000$000 réis, e para o segundo caso se estabelecem penalidades.

Pela transgressão esta penalidade é, alem da prisão, multa até 1:000$000 réis.

Para este artigo 14.° eu tinha redigido uma proposta para que o transgressor pudesse ser castigado só com uma d'aquellas penalidades.

Neste artigo impõem-se duas penas: a prisão o multa conjuntamente, e a mim parece me que bastaria em muitos casos ser só uma d'ellas, conforme a gravidade da transgressão. Como, porem, o Codigo Penal permitte remir a prisão a dinheiro, não merece a pena apresentar a substituição que tinha em mente fazer.

Na legislação anterior (decreto de 21 de outubro de 1863, artigo 45.°), as contravenções eram punidas com a multa de 10$000 réis pela primeira vez, e nas reincidencias com igual multa e dez dias de prisão. No regulamento do 1880 as transgressões são punidas

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SESSÃO N.º 57 DE 16 DE ABRIL DE 1902 l1

com 20$000 réis de multa e trinta dias de prisão. No projecto em discussão a pena é elevada até seis meses de prisão e 1:000$000 réis de multa! É de tremer!

Vou referir-me, agora, Sr. Presidente, ao artigo 4.°, que diz:

«Artigo 4.º O processo será apreciado por uma commissão, intitulada commissão dos explosivos, que funccionará junto do Ministerio do Reino, e consultará sobre os assumptos relativos a substancias explosivas».

Este artigo parece-me tambem que conviria ser um pouco modificado. Nos termos em que está redigido, parece que todos os processos, sem excepção alguma, relativos ao estabelecimento de quaesquer fabricas, officinas, armazens, casas de venda, etc., terão de ser apreciados pela commissão de explosivos, o que julgo, em muitos casos, constituir uma superabundancia de informação, e de qualquer forma uma difficuldade e demora ás concessões pedidas.

Ora, Sr. Presidente, na maioria dos casos, na grande maioria, a repartição por onde terão de correr os negocios relativos a estes assumptos, deve ter competencia para resolver ou informar o respectivo Ministro, sem previa consulta da commissão.

Por isso acho perfeitamente escusado que todos os processes sejam enviados á commissão chamada dos explosivos. É um trabalho que não terá utilidade alguma.

Não julgo necessario que a commissão tome conhecimento de todos os processos; de muitos d'elles basta que a repartição tome conhecimento.

A commissão deve simplesmente tomar conhecimento dos assumptos mais difficeis e intrincados, que possam suscitar duvidas ou contestações, e que o Ministro julgue precisarem de consulta.

Emquanto á composição da commissão, diz o § unico do artigo 4.° que será presidida pelo general director geral do serviço de artilharia e composta de officiaes de engenharia, de artilharia e de engenheiros do Ministerio das Obras Publicas.

Não estou absolutamente de acordo com a composição da commissão; precisa de mais alguma cousa.

Esta commissão, como o projecto a constituo, satisfará na maior parte dos casos aos serviços que lhe forem incumbidos, mas as difficeis questões de explosivos, questões principalmente de chimica organica, questões que offerecem por vezes muitas duvidas e contestações, será difficil tratar d'ellas no seio d'essa commissão, Se d'ella não fizerem parte especialistas dos mais insignes, que possam orientar a commissão, resolvendo as duvidas, e garantindo-a de não ser posta em cheque, quando se apresente qualquer contestação.

V. Exa. recorda-se bem da grande contestação que se levantou, sobre um caso de chimica organica, sobre a existencia ou não do acido salicylico nos vinhos expedidos do nosso país para o Brasil. (Apoiados}.

Pois no caso dos explosivos pode dar-se igualmente qualquer contestação, por isso que são substancias organicas difficeis de analysar e de perigosa analyse. (Apoiados).

É necessario que da commissão façam parte as mais altas capacidades em chimica, e os analystas mais distinctos e experimentados. (Apoiados).

Na contestação que se levantou sobre se existia ou não o acido salicylico nos vinhos expedidos do nosso país para o Brasil, e que foi resolvida tão brilhantemente pelo professor da Academia Polytechnica do Porto, o Sr. Ferreira da Silva, os resultados a que chegou este illustre chimico, gloria do nosso país, foram depois confirmados por chimicos estrangeiros, ficando elle victorioso e triumphante. (Apoiados).

Vê-se portanto, Sr. Presidente, que nos casos de duvida e de contestação se precisa da auctoridade das pessoas mais competentes.

A chimica dos explosivos requer altas competencias, e por isso eu não vejo motivo para que na constituição d'esta commissão se não faça o que se faz em França e Inglaterra, e em outros paises, onde se tem nomeado para taes commissões os chimicos mais abalisados, para orientarem e elucidarem os seus restantes membros com os seus altos conhecimentos.

E eu direi que entre nós ainda isso é mais necessario por não ser a chimica uma sciencia extremamente cultivada em Portugal. É por isso que eu proporei que alguns dos homens mais abalisados nesta sciencia façam parte da commissão.

Quando ha alguns annos foi necessario nomear uma commissão para a analyse e o estudo da polvora sem fumo Barreto, polvora que não tem outra que lhe seja superior, e isto não é fazer o seu elogio, mas simplesmente confirmar um facto, sabe V. Exa. e a Camara a quem o Sr. Ministro da Guerra recorreu para fazer a analyse chimica d'essa polvora, pois que a analyse balistica já estava feita?

S. Exa. recorreu ao Digno Par do Reino o Sr. Rebello da Silva, distincto professor de chimica do Instituto do Agronomia, e aos distinctos professores da escola do exercito, que lhe deram o parecer, para o habilitar a resolver sobre a adopção da mesma polvora.

Isto que se passou com a polvora sem fumo, pode servir igualmente para justificar o meu desejo, de ser a commissão de que se trata composta dos individuos indicados no projecto, e de um ou mais chimicos das escolas superiores, que certamente auxiliarão muito a commissão a resolver os grandes problemas que lhe possam ser apresentados. (Apoiados).

No Ministerio da Guerra e no das Obras Publicas não ba laboratorios de grande importancia; todos elles são muito limitados, como acontece aos da fabrica da polvora Barcarena e de Chellas, onde se não podem fazer grandes experiencias.

Nas escolas superiores do país é que ha laboratorios, onde se podem fazer as analyses, as mais difficeis.

Seria pois de toda a vantagem que fizessem parte da referida commissão um ou mais professores d'essas escolas, porque, nos casos de necessidade, essa commissão não iria a esses estabelecimentos fazer as analyses como hospede, e as corporações d'essas escolas, sempre a receberiam melhor, fazendo parte da commissão algum dos seus membros, porque apesar desses estabelecimentos serem da nação, os respectivos professores nem sempre gostam que estranhos se vão servir dos seus laboratorios.

O que se passou com as analyses de vinho, o que se passou com as da polvora sem fumo, e o que se passa lá fora no estrangeiro, serve para justificar a minha idéa, sobre a composição da commissão a que me estou referindo.

O Sr. Ministro da Guerra sabe que a commissão dos explosivos em França é composta de 8 membros titulares, e de mais 10 adjuntos, os quaes mão escolhidos entre os officiaes que especialmente se dedicam aos assumptos da chimica.

Os membros titulares são l membro da Academia das Sciencias; o director do deposito central das polvoras e salitres; o director da Fabrica da Polvora de Sévran- Livry; l official de artilharia de terra; l official de artilharia de marinha; l official de engenharia; l engenheiro de minas ou das pontes e calçadas, e l engenheiro das polvoras e salitres, secretario. - Em 1900, os membros titulares eram os seguintes, todos homens de sciencia, e altas capacidades em materia de explosivos: Berthelot, Sarrau, Morin, Lechien, Ricq, Cornu, Bertrand, Vieille e Liouville, nomes bem conhecidos no mundo scientifico e militar.

Ainda convem saber Sr. Presidente, que é Berthelot, o mais abalisado chimico, o presidente da commissão de substancias explosivas: é membro da Academia das Sciencias, e não tem graduação militar.

Esta commissão, em França, funcciona junto do Minis-

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terio da Guerra, e dá parecer sobre todos os assumptos que lhe são submettidos pelo Ministro.

Entre nós, não sei o que seria mais conveniente: que e a commissão que este projecto nomeia, funccionasse junto do Ministerio da Guerra, ou do Ministerio do Reino; mas, porque os assumptos das licenças e da saude publica corram pelo Ministerio do Reino, não ficará deslocada funccionando junto d'este Ministerio.

Em França, é o Ministerio da Guerra que resolve estas questões; na Inglaterra, procede-se por modo analogo. Ha uma commissão de substancias explosivas, que é composta de militares e de civis. Os technicos que fazem parte d'ella são sempre, os chimicos mais illustres do país, e que, não só pelas suas descobertas, mas tambem pelos seus altos conhecimentos e serviços scientificos, estão naturalmente indicados para o desempenho de tão importantee serviços.

Os nomes de Noble e de Abel teem figurado desde muitos annos como sendo dos mais importantes nestes assumptos, não só pelas suas descobertas e estudos relativos a explosivos, mas tambem pela sua elevada auctoridade na apreciação dos productos apresentados pelos industriaes que se acostumaram a respeitar as suas decisões.

Ainda ultimamente, haverá dois annos, em vista das inquietações que naquelle país produziam as duvidas sobre a conservação e estabilidade das duas substancias, a cordito e a lyddite e dos estragos que a primeira d'estas polvoras parece que produzia nas armas de fogo, tanto nas peças como nas espingardas, o Governo Ingles resolveu constituir novamente a commissão dos explosivos dando-lhe uma composição excepcional.

Esta commissão foi composta das notabilidades «cientificas mais em evidencia no Reino Unido, comprehendendo entre outros os seguintes individuos:

Lord Raleigh, governador do condado de Essex, conselheiro scientifico de Trinity House, physico e chimico eminente que tem o seu nome ligado ás investigações e ectudos sobre o argon e a liquefação do ar;

Sir Andrew Noble, o celebre chimico e artilheiro;

Sir William Roberts Austen, da Casa da Moeda, conhecido pelas suas experiencias sobre ligas, e a micro-photographia dos metaes;

Sir William Crooks, inventor do radiometro e bacterio-logista distincto e assas conhecido.

A revista Arms and Explosives criticou a composição d'esta commissão, que, com excepção de Sir Andrew Noble, era constituida por homens eminentes, sem duvida, mas cujas especialidades nada tinham que ver com as substancias explosivas.

O Times entendia pelo contrario que era uma preciosa garantia de imparcialidade para a nova commissão, ser esta composta de personalidades livres de qualquer ligação com a industria do fabrico dos explosivos.

Na Inglaterra a fabricação de substancias explosivas é muito estudada, e muito naturalmente os individuos que querem estabelecer o fabrico d'essas substancias recorrem a quem sabe do assumpto.

Geralmente os individuos militares ou civis, que se occupam principalmente d'estes estudos, são convidados pelos industriaes e auxiliarem-os no desenvolvimento das suas fabricas, associando se nos interesses.

Os individuos nomeados para esta commissão estavam longe de toda a suspeita.

A commissão a que me tenho referido, depois de um anno de estudos, acaba de propor uma modificação na composição da cordite, diminuindo a proporção do nitro-glycerina que entra na sua composição.

Não é só nestes serviços communs á industria, militar e que as commissões assim são constituidas. Em commissões puramente militares a França colloca addidos que não são militares, mas que são notabilidades na sciencia, para esclarecerem as mesmas commissões nas altas questões scientificas de que por vezes terão de occupar-se.

O comité d'artillerie em França tem, como adjunto, um membro do Instituto, para o estudo das questões scientificas.

E não obstante estas cautelas e cuidados na constituição das commissões, casos se podem dar em que as mesmas fiquem mal collocadas, ao ventilarem-se certas questões scientificas.

Como exemplo citarei o que se passou quando o sabio italiano, o senador Siacci, uma notabilidade na sciencia da mecanica e da balistica, em 1883, estabeleceu um theorema sobre os desvios dos tiros e respectivos eixos de grupamento.

A Revista de Artilharia francesa publicou o trabalho do Siacci, admittindo o theorema como uma novidade; mas um sabio professor da Universidade de Delft, o Sr. Schols, accudiu á Revista, provando que o mesmo theorema já fôra em França estabelecido por Bravais, em 1846.

Se admira que o sabio italiano desconhecesse a existencia d'aquelle trabalho de Bravais, mais admira que a Revista de Artilharia o desconhecesse tambem, a qual é publicação do Comité d'artillerie, a que está adjunto, como já disse, um membro do Instituto de França.

Este acontecimento deu logar a uma polemica scientifica, da qual se apurou que realmente o Sr. Sacci desconhecia absolutamente a existencia d'aquelle theorema, e o descobrira por si.

Siacci declarou então que o seu pesar tinha sido grande ao ver que tinha trabalhado em vão, mas que o trabalho não fôra completamente perdido, porquanto viera avivar uma cousa que estava perfeitamente esquecida, «Se o meu pesar foi grande, disse o proprio Siacci, não cheguei comtudo a cair em deliquio, como aconteceu a Lagrange, quando soube que uma formula que descobrira já antes havia sido descoberta por Leibnitz».

Tratado este ponto, pouco mais tenho a dizer, a não ser sobre o artigo 11.°, que prohibe implicitamente a venda, em detalhe, da dynamite, quando eu vejo que em todos os paises, e mesmo no nosso, se permitte a sua venda, abaixo de 5 kilogrammas, propriamente nas casas de venda.

Esta disposição do projecto de lei não deve nem pode subsistir.

Eu posso apresentar a V. Exa., Sr. Presidente, e á Camara o texto do regulamento belga, que diz, muito claramente, o seguinte no seu artigo 29.°:

«Os depositos ou estabelecimentos de venda de dynamite são divididos em tres categorias:

l.ª Os que conteem mais de 75 kilogrammas de dynamite;

2.ª Os que conteem de 5 a 75 kilogrammas;

3.ª Os que conteem menos de 5 kilogrammas».

E no artigo 30.° diz que os depositos e casas de venda da l.ª e 2.ª categorias são considerados estabelecimentos perigosos e insalubres, e portanto submettidos ás mesmas restricções. Comtudo não considera assim os de 3.ª categoria, e permitte aos vendedores terem nos seus estabelecimentos até 5 kilogrammas d'esta substancia e de outras analogas.

Nestas condições, eu peço ao Sr. Ministro da Guerra que considere este ponto como elle deve ser considerado, não difficultando a venda dos explosivos.

A dynamite é uma substancia que anda na mão da toda a gente.

O que deve haver, pois, é toda a recommendação sobre a maneira de usar d'essa substancia; porque, não é, geralmente, nem nos transportes, nem nos armazens, que se dão casos involuntarios e inesperados de explossão. As explosões são, quasi sempre, consequencia do mau manuseamento ou da falta de prudencia, que muitas vezes ss

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observa nos individuos que, querendo fazê-la detonar, e vendo que ella não detona promptamente, se precipitam sobre a mina, onde, por vezes, são victimas do seu acto imprudente.

Tenho ainda a dizer, que louvo a illustre commissão, por ter no artigo 7.° feito uma ligeira alteração que, a meu ver, é importantissima.

O artigo 7.º da proposta do Governo diz: «que as alterações nas installações das fabricas, officinas e paioes, ou no processo de fabrico de explosivos, obrigam a nova habilitação para licença». Em quanto que no projecto da commissão se diz: a que as alterações nessas installações podem obrigar a nova habilitação para licença».

O que estava na proposta era uma violencia; não se podia mudar uma galga ou o mais pequeno apparelho, que se não tivesse de pedir uma nova licença.

Entretanto, comprehende-se que, augmentando a producção pelo emprego de novos machinismos e de novos processos, que dêem mais lucro, se exija a habilitação para nova licença.

Mas a illustre commissão resolveu muito simplesmente este ponto, substituindo a palavra «obrigam» pelas palavras apodem obrigar», prestando com esta simples mudança um grande serviço; porque o artigo 7.°, como estava, era uma perfeita extorsão; bastaria, repito, mudar uma pequena peça de machina, para se ser obrigado a nova licença, sobretudo com essa nova raça de fiscaes, que hoje existe, invenção sublime do Sr. Ministro da Fazenda!

Sr. Presidente: parece-me que não é necessario fazer mais nenhuma observação sobre o projecto; as propostas que tenho a honra de mandar para a mesa, penso que facilitarão estabelecer o regulamento em melhores termos do que aquelles que resultariam de umas bases tão apertadas! (Apoiados).

E, antes de terminar, pedirei ao Governo que nas disposições do regulamento que haja de elaborar, sem comprometter de qualquer modo a segurança dos cidadãos e da propriedade, seja o menos draconiano possivel e use da maior belevolencia para com o emprego dos explosivos, que prestam ás industrias os maiores serviços, não esquecendo tambem que o foguetorio, principalmente no norte do país, e as bombas de grande estrondo, constituem uma das mais altas e mais importantes manifestações de culto externo da politica indigena.

Digne-se o Governo de usar tambem de certa benevolencia para com o emprego de dynamite nos casos de festança!

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi cumprimentado por muitos Srs. Deputados).

Leram-se na mesa as seguintes:

Propostas

Proponho que o artigo 4.° e seu § unico sejam substituidos pelos seguintes:

«Artigo 4.º Junto do Ministerio do Reino funccionará uma commissão intitulada commissão de explosivos, que consultará sobre todos os assumptos relativos a estas substancias, que o Ministro julgue conveniente submetter a seu exame.

§ unico. Esta commissão será presidida pelo general director geral do serviço de artilharia, e composta de officiaes de engenharia e de artilharia, de engenheiros do Ministerio das Obras Publicas e de lentes ou professores de chimica das escolas superiores, nomeados pelo Ministerio do Reino». = Mathias Nunes.

Proponho a eliminação do artigo 11.º do projecto de lei em discussão. = O Deputado, Mathias Nunes.

Proponho o additamento do seguinte artigo, a seguir ao artigo 17.º do projecto:

«Artigo ... Quando as prescripções do regulamento parecerem demasiado rigorosas a respeito de determinadas substancias explosivas e do perigo que apresente o seu transporte, o Ministro terá a faculdade de auctorizar, a respeito d'essas substancias, as derogações ou abolições que julgar compativeis com a segurança publica». = O Deputado, Mathias Nunes.

Foram admittidas.

O Sr. Ministro da Guerra (Pimentel Pinto): - Levanto-me para responder ao illustre Deputado e meu amigo, o Sr. Mathias Nunes, mais pela consideração pessoal que tenho por S. Exa., do que para contrariar as considerações, que a Camara acaba de ouvir, e com as quaes, na sua maior parte, eu estou tambem de acordo.

S. Exa., pode dizer-se, encontrou no projecto um defeito: que é a possibilidade de se estabelecerem regulamentos para esta lei, quando ella o chegue a ser, draconianos, que representam violencias para aquelles que pretendam fabricar explosivos.

Em 1895 ou 1896 nomeou-se uma commissão composta de militares, de empregados do Ministerio das Obras Publicas, do Ministerio das Fazenda e do Ministerio do Reino, o que mostra desde já que por minha parte eu não me opponho a que nos assumptos militares entrem individuos da classe civil, a fim de reunir a legislação dispersa sobre explosivos e de actualizar, digamos assim, porque nada havia regulado, ou pouquissimo, em relação ao transporte de explosivos, e pouco tambem ha com relação á fabricação dos mesmos explosivos. Essa commissão apresentou um regulamento, que eu vi em tempo, e de que não tenho hoje grande memoria, e d'esse regulamento se extrahiu a parte que era absolutamente necessaria, indispensavel trazer ao Parlamento, por constituir materia que tem de fazer parte de um diploma legislativo.

Posso affirmar ao illustre Deputado e meu amigo, o Sr. Mathias Nunes, que, em relação á publicação do regulamento, se este projecto for transformado em lei, haverá a maior attenção em que elle não insira disposição alguma que não seja pratica, ou que represente violencia perfeitamente injustificada.

A necessidade de regulamentação, em assumptos d'esta natureza, impôe-se a todos os espiritos, não só pelos perigos que ha no fabrico e no transporte, mas sobretudo no fabrico de explosivos.

Todos comprehendem que, sendo livre essa industria, como se assegura no projecto em discussão, e como realmente deve ser, é preciso todavia cercá-la de cuidados, por causa dos prejuizos que podem vir para a ordem publica do fabrico livre, e sem fiscalização, de substancias d'esta natureza.

Sr. Presidente: sobre a parte geral do parecer em discussão, nada mais tenho a dizer, porque o illustre Deputado, o Sr. Mathias Nunes, tambem se não oppõe de nenhum modo ao principio fundamental do projecto.

Na especialidade S. Exa. referiu-se ao artigo 2.°, dizendo que não percebe o fim da caução provisoria, e ao artigo 5.°, dizendo que não percebe tambem para que se exige uma garantia importante para se permittir o estabelecimento de fabricas.

Na nossa legislação existe, em relação a todos os estabelecimentos perigosos e insalubres, caução previa, quando se faz o requerimento. Esta caução é para garantir a seriedade d'esses requerimentos. Está assim na legislação das obras publicas e na legislação militar.

Repito, esta caução é unicamente para garantir a seriedade do pedido, porque quando não pode succeder que se façam pedidos,, sem ideia de os levar a effeito.

Essa caução é pequena, e tem até um limite de 20$000 réis, se me não engano.

O preceito do artigo 5.° está de acordo com a nossa le-

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gislação geral, que, para o estabelecimento de fabricas, ou de quaesquer estabelecimentos perigosos ou insalubres, manda que se faça, um deposito maior, para garantir a indemnização dos prejuizos que pousam dar-se, e alem d'isso para garantir as penalidades impostas na propria lei.

S. Exa. parece-me que achou que ha uma differença entre o que se estabelece no artigo 5.º e 14.º

O Sr. Mathias Nunes: - No artigo 14.° fala-se em transgressões, e no artigo 5.° fala-se em contravenções. É o que não comprehendo.

O Orador: - O artigo 5.º refere se á penalidade por contravenções, e o artigo 14.º prevê a necessidade de indemnizações por virtude de não se terem cumprido as disposições regulamentares.

Ao artigo 4.°, que diz qual a composição da commissão chamada de explosivos, e que deve dar parecer sobre a concessão de licenças, e sobre os processos para o estabelecimento fabricas de explosivos, fez S. Exa. duas observações; uma d'ellas é que na composição da commissão deviam entrar especialistas chimicos, como lá fora succede; a outra observarão é que essa commissão não devia ser ouvida sobre todos os assumptos que dizem respeito á especialidade.

O que se dia no artigo 3.º é o seguinte:

(Leu).

E o que se diz no artigo 14.º é o seguinte:

(Leu).

O regulamento deverá dizer quaes os assumptos relativos a substancias explosivas que teem de ser submettidos ao exame d'essa commissão.

Isso é disposição do regulamento, e estou de acordo com S. Exa. que não é a respeito de tudo quanto se queira fazer sobre explosivos que haja necessidade de ouvir a commissão. É claro que uma commissão consultiva é só para os casos que offerecem duvidas e sobre os quaes não haja precedentes.

O Sr. Mathias Nunes: - A redacção do artigo tal como está obriga a isso

O Orador: - O regulamento ha de determinar os assumptos relativos a substancias explosivas, que devem ser da competencia da commissão o quaes aquelles sobre que não haverá necessidade de consultá-la.

A segunda observação de S. Exa. foi sobre a composição da commissão.

Entende S. Exa., e a meu ver muito bem, que d'essa (commissão devem fazer parte especialistas que conheçam muito bem a chimica.

S. Exa. recordou-me um facto que mostra que, embora no artigo 4.º não se diga que da commissão devem fazer parte chimicos, impõe-se ao espirito de quem tenha de nomear a commissão a necessidade de que elles ahi fiquem, e o Ministro da Guerra que vier a nomeá-la pode proceder exactamente como S. Exa. me recordou que eu tinha procedido ha não sei quantos annos, nomeando o professor da 8.ª cadeira da Escola do Exercito que é chimico.

Não tenho duvida em acceitar, se a commissão estiver da acordo, que se diga expressamente no artigo 4.º que d'essa commissão devem fazer parte officiaes de engenharia, de artilharia, engenheiros do Ministerio das Obras Publicas e professores de chimica nomeados pelo Ministerio do Reino.

S. Exa. sabe que não haverá difficuldade para o Ministro dentro do que está contido neste artigo, nomear officiaes versados nessa sciencia.

Estarei o Sr. Oliveira Simões, que fez parte da commissão nomeada para dar parecer sobre a polvora sem fumo, o Sr. Achilles Machado, capitão de engenharia, que todos sabem que é um chimico abalisado, e o Sr. Tenente Simas, que pouco conheço, mas de quem ouço falar, citando-o como auctoridade reconhecida por todos. Assim não havia difficuldade de nas palavras que estão escritas neste artigo, nomear a commissão como S. Exa. deseja, mas melhor é que o artigo fique como está, porque d'ahi não poderão resultar inconvenientes, mas antes vantagens.

Referiu-se depois S. Exa. ao artigo 11.º que trata da venda em detalhe, o mostrou que no regulamento da Belgica, parece que foi, se permittia, até á quantidade de 5 kilogrammas, a venda livre da dynamite. Ora, Sr. Presidente, lendo o artigo 11.º e querendo achar nelle esta permissão, talvez ella ali se encontre, porque diz:

(Leu).

Podia talvez encontrar-se aqui, porque para as pequenas porções, satisfazendo as condições de segurança marcadas pelo regulamento, não ha prohibição de se exporem á venda. Mas...

O Sr. Mathias Nunes: - Eu pensei que havia a intenção de se excluir a dynamite das casas de venda, porque m'o disse em tempo o Sr. Oliveira Simões que era relator do projecto e nesse sentido mandei para a mesa uma emenda para que este artigo fosse eliminado, a fim de facilitar o trabalho do regulamento.

O Orador: - Eu mesmo disse, Sr. Presidente, que era preciso talvez forçar um poucochinho a interpretação para se entender que era permittida esta venda; mas desde que o illustre Deputado diz que o relator que foi do projecto, que melhor do que ninguem conhece o assumpto, declarou a S. Exa. que era intenção do projecto o prohibir absoluta e completamente a venda de qualquer porção de dynamite, eu julgo conveniente, por minha parte se indique neste artigo o limite até ao qual não é preciso senão a licença, quando satisfaça todas as condições de segurança, ou que a commissão então approve a proposta do illustre Deputado eliminando o artigo.

Sr. Presidente: S. Exa. referiu-se ainda ao artigo 7.°, dizendo que estava pela commissão redigido melhor do que estava anteriormente, e é verdade, e terminou o seu discurso pedindo que o Governo nos regulamentos que vier a publicar não seja draconiano. A esse respeito já disse ao illustre Deputado que na minha intenção estava exactamente o contrario, que não decretarei e determinarei cousa alguma que não seja pratico e que possa representar uma violencia para quem vive de transportar ou fabricar explosivos.

A razão que S. Exa. allegou para ser droconiano, essa não imperou no meu espirito. A circunstancia de ter um grande numero de empregos industriaes sim, mas o facto de servir para o culto externo da politica, não actuou no meu espirito para ser mais ou menos draconiano.

Sr. Presidente: o illustre Deputado, o Sr. Mathias Nunes mandou tres emendas para a mesa. Uma com relação ao artigo 4.° que estatue a composição da commissão; estou de acordo e penso que a commissão igualmente estava; outra com referencia ao artigo 11.°, propondo a eliminação do artigo; a commissão procederá como julgar melhor, conservando-o tal qual está, ou acceitando a proposta do illustre Deputado; o ainda outra acêrca do artigo 17.°; como se trata de uma attribuição concedida ao Governo, attribuição que acho justa e sensata, não é a mim que me incumbe dizer se acceito ou não; a Camara e a commissão é que se devem pronunciar.

Portanto a commissão apreciará e resolverá sobre as emendas apresentadas por S. Exa.

O Sr. Pereira Carrilho: - Mando para a mesa o parecer já impresso da commissão de fazenda, sobre a proposta de lei n.° 65-A, relativa á conversão da divida externa.

O Sr. Francisco José Machado: - Pedi a palavra, não para discutir o projecto, que já está sufficientemente esclarecido pelo meu illustre amigo, o Sr. Mathias Nunes que, pela sua posição e extraordinaria competencia nestes assumptos, disse a ultima palavra.

Sr. Presidente: sem querer melindrar ninguem, atrevo-me a dizer que, nem nesta casa, nem talvez lá fora, haja quem tenha mais saber, mais auctoridade e mais co-

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nhecimento, do que o meu illustre amigo o Sr. Mathias Nunes, para discutir este projecto, e portanto, depois de S. Exa. dizer a sua opinião, não seria eu que teria a pretenção de esclarecer o assumpto.

O illustre Ministro da Guerra respondeu tambem proficientemente ás observações apresentadas pelo illustre Deputado, concordando com as emendas de S. Exa. para melhorar o projecto, o que aliás não podia deixar de ser, porque o projecto que se discute não é politico, é militar, e tende a satisfazer algumas necessidades publicas.

O illustre Ministro da Guerra da melhor boa vontade declarou que acceitava as emendas do Sr. Mathias Nunes. Portanto, nesta questão, todos estamos de acordo, e não podia ser de outro modo, pois que nas questões militares, todos nós devemos pôr a politica de parte, o que eu sempre tenho feito, e tambem todos os meus illustres collegas (Apoiados), e apenas nos inspirarmos no bem do exercito, que é o mesmo que o bem da patria. (Apoiados}.

Apesar d'este modo de proceder, que tem sido por mim inalteravelmente seguido em todos os actos da minha vida publica, já houve uma lei que nos não deixou a nós, militares, vir á Camara, allegando-se para isso, que poderia aqui dar-se qualquer facto nas discussões parlamentares, quando se discutissem assumptos de caracter militar que se reflectisse na disciplina, que é necessaria manter em todos os actos da vida militar fora da Camara.

Tenho muitas vezes discutido assumptos militares, e nunca a disciplina perdeu com isso. (Apoiados).

Nunca das minhas palavras proferidas nesta casa no decurso da minha já longa vida parlamentar, a disciplina podia ser affectada, porque tive sempre a comprehensão dos meus deveres. (Apoiados).

Folgo, portanto, em ver a harmonia que existe entre nós todos, que pertencemos ao exercito, quando se trata de questões militares, que se teem aqui discutido sem preoccupações politicas.

Vou agora passar a referir-me ao assumpto para que especialmente pedi a palavra, e não farei quaesquer considerações sobre o projecto, porque realmente, depois do modo como o Sr. Mathias Nunes o discutiu, e o Sr. Ministro da Guerra respondeu, eu nada mais poderia accrescentar.

Servindo-me do precedente estabelecido pelo illustre Deputado e meu amigo, o Sr. Antonio Cabral, visto que não me tem sido possivel de modo algum obter a palavra antes da ordem do dia, aproveito esta occasião para tratar de um assumpto tambem militar e fazer algumas considerações sobre materia que diz respeito ao exercito, dirigindo ao Sr. Ministro da Guerra umas perguntas.

Não são descabidas as considerações que vou fazer, porque tratando-se de um projecto militar, de cousas tambem militares posso tratar, sem que isso possa merecer reparo.

Vi ha tempos, no Seculo, que a commissão encarregada de propor a mudança dos uniformes, alvitrara que se substituisse o linho pelo kaki, que, segundo me consta, não é fabricado no país.

A industria nacional, que fabrica os tecidos de linho, alarmou-se com esta noticia, e por isso desejo saber se o Sr. Ministro da Guerra já tem conhecimento das propostas feitas pela commissão dos uniformes, e só tenciona adoptar a mudança do linho pelo novo tecido.

Creio que esse tecido já foi usado em Inglaterra, mas não deu resultado e está hoje posto de parte, ao que me consta.

Quando estas novidades chegam ao nosso conhecimento, já muitas vezes, nos paises onde foram adoptadas, se reconheceu que não davam resultado e foram postas de parte, e assim, nós vamos aproveitar cousas que já são velhas e reconhecidas como inuteis.

Se se for adoptar esse producto, para vestir as nossas tropas, será mais uma importação que teremos que fazer, e, portanto, como a Camara comprehende, mais ouro que teremos de exportar, pois segando me informam, não se fabrica entre nós.

Era isto que tinha a dizer a este respeito, e não me alongo mais porque não quero tomar tempo á Camara, e mesmo porque quero saber qual a opinião do Sr. Ministro da Guerra; nada mais devo accrescentar.

Sr. Presidente: ha ainda outro assumpto para que desejo chamar a attenção do illustre Ministro da Guerra.

Foi publicada a lei do recrutamento dos officiaes para o ultramar e nessa lei determina-se o seguinte: que para fazer o recrutamento d'esses officiaes se separe todos os annos um numero de officiaes de cada posto, que provavelmente serão promovidos durante esse anno, e diz-se que esse numero seja a media da promoção nos ultimos cinco annos, sem excepção de nenhum dos postos.

Isto é razoavel, porque não se sabendo qual a promoção, não se deviam mandar esses officiaes para a Africa para lhes pertencer o posto durante esse periodo e o Estado ter de pagar o transporte de cá para lá e de lá para cá. Com a promoção dos alferes a tenentes não se dá o mesmo caso, porque são promovidos pela diuturnidade do serviço.

No posto de alferes sabe-se todos os annos, ao certo, quaes são os individuos que vão ser promovidos, porque em engenharia são promovidos no fim de um anno, em artilharia no fim de dois annos e em infantaria e cavallaria no fim de quatro annos.

Pode-se saber perfeitamente qual o numero de alferes que durante o anno são promovidos a tenentes. Neste posto não é necessario procurar a media.

Em dezembro do corrente anno serão promovidos ao posto de tenente 16 alferes, que estão ao abrigo da lei de promoções. Sendo assim, para que se reservam 85 alferes, de entre os quaes 69 só serão promovidos a tenentes em dezembro de 1904, isto é, quando os que seguirem viagem no presente anno tenham concluido a commissão de dois annos exigida pelo artigo 6.° da reforma do ultramar?

V. Exa. comprehende que os individuos que vão cumprir estas obrigações em Africa, quando voltam com o posto de tenente garantido, vêem encontrar no posto de alferes um grande numero de officiaes que não foram ainda promovidos, ficando, portanto á direita d'elles.

No relatorio que precede a lei da organização militar do ultramar diz-se o seguinte:

«Como estimulo e para compensar os incommodos e perigos do serviço no ultramar, é concedido aos officiaes e sargentos-ajudantes do exercito do reino, que ali forem servir nas guarnições das provincias ultramarinas e outros serviços equivalentes, o posto de accesso, com prejuizo, mas só d'aquelles que não tenham probabilidades de ser promovidos durante um anno».

Ora separaram-se 85 alferes, e d'estes sendo promovidos durante este anno apenas 16, em que situação ficam os restantes quando os seus camaradas, mais modernos, regressarem com o posto de tenente já vencido?.

Ficam á direita dos que não foram promovidos e que são mais antigos? Ficam á esquerda d'elles, quando teem o posto de tenente já vencido? São duvidas que se apresentam ao meu espirito e que desejava ver desfeitas, porque se não forem, hão de dar origem a futuras reclamações.

Sr. Presidente: os officiaes que foram separados e que não foram mandados para a Africa, e não tendo elles a culpa, hão de ficar nesta situação? Creio que não. Creio que a intenção da lei não é esta.

Parece-me que o Sr. Ministro da Guerra tem attribuições para resolver esta questão, que julgo equitativa e de justiça, separando apenas os officiaes que teem de ser

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promovidos durante o anno, e mandando para a Africa os officiaes d'ahi para baixo.

Acho isto perfeitamente regular e corecto; que fixemos o numero N media da producção dos ultimos cinco annos, para os postos onde não se sabe exactamente qual será a sua promoção, acho coherente, Para o posto de alferes não é necessario ir buscar essa media, porque se sabe exactamente qual é a sua promoção. Entretanto, desejava que o Sr. Ministro da Guerra declarasse qual era a sua opinião sobre este assumpto; ir para a Africa é uma grande violencia, a que todos se sujeitão applicando-se a lei com equidade e justiça; mas não sendo assim. V. Exa. compreende quanto pode ser prejudicial para os que ficam e para os que vão. (apoiados).

O Sr. Ministro da Guerra, que tem um grande espirito de justiça e um grande desejo de acertar, há de resolver, creio, esta questão de um modo equitativo. Apraz-me fazer esta justiça a S. Exa.

Tenho dito.

P Sr. Ministro da Guerra (Luiz Augusto Pimentel Pinto): - Vou responder ás perguntas feitas pelo illustre Deputado, o Sr. Francisco Machado.

Já hontem na outra Camara um Digno Par fez-me a mesma pergunta, que S. Exa. acaba de fazer, em relação á substituição dos tecidos de linho, em uso no exercito, por tecidos de algodão; e o que eu então ali respondi é o mesmo que devo dizer hoje na Camara dos Senhores Deputados.

É verdade que se pensa nessa substituição; mas, por emquanto, não tenho opinião assente sobre a sua conveniencia ou inconveniencia.

No Ministerio da guerra existem vários relatorios, não só de officiaes que commandaram forças em Africa, mas tambem de medicos, e todos dizem ser mais conveniente para a saúde dos soldados o uso de tecidos de algodão do que dos tecidos do linho, que actualmente se usam no exercito.

Em vista d'esses relatorios, mandei adquirir uma porção de tecido naki de varias côres, que foi distribuida por dois corpos da guarnição de Lisboa, para que os artigos feitos com esse tecido fossem distribuidos por 6 praças de cada um d'esses regimentos; e ao mesmo tempo mandei distribuir a outras 6 praças artigos feitos com tecidos de linho; isto, evidentemente, para que, tomando-se em attenção o custo relativo de cada artigo e a sua duração, se pudesse concluir qual d'elles era preferivel: se era mais caro o tecido de linho ou o tecido de algodão.

Determinei outrosim aos commandantes dos regimentos, onde se faziam as experiencias, que depois d'estas concuidas enviassem os seus relatorios ao Ministerio da Guerra.

Chegaram esses relatorios. Eu, mal os li; mas mandei ouvir sobre elles as Direcções Geraes das differentes armas sobre a conveniencia, vantagem ou inconvenientes da substituição que se propunha.

Quando hontem o Digno Par, o Sr. Baracho, falou na outra Camara sobre este assumpto, eu agradeci-lhe o haver chamado a minha attenção para um importante ponto de vista que não pode nem deve deixar de ser considerado, tratando-se da substituição que se pretende fazer: é o ponto de vista da nossa industria nacional.

É mais uma razão para que eu não tome de leve uma deliberarão que carece de ser muito pensada e reflectida, ponderando bem todas as vantagens e todos os inconvenientes que podem resultar da substituição dos tecidos de linho pelos de algodão; e é claro que, desde que se reconheça com toda a evidencia que d'essa alteração podem resultar inconvenientes graves e importantes para a industria nacional, eu não resolverei o assumpto com prejuizo dos interesses d'essa industria.

Repito: eu não tenho ainda opinião assente sobre o assumpto, porque, se por um lado há os interesses d'essa industria, por outro ha o interesse da saude do soldado e os do Thesouro; e se não se devem pôr de parte os interesses da industria nacional, não se devem tambem esquecer os da saude do soldado e os do Thesouro. (Apoiados).

Em relação á segunda pergunta vou dar a S. Exa. uma resposta completamente satisfatoria. S. Exa., lembrando á Camara o que está escrito na lei de promoções, que manda que os officiaes que vão para o ultramar venham occupar depois na escala um logar immediatamente inferior a N, que representa a media da promoção dos ultimos cinco annos, disse que em relação aos alferes que são promovidos por diuturnidade á tenentes, ha á certeza de qual d'elles e deve ser, e que por isso não precisamos recorrer á media, que nos não dá senão probabilidades.

Ora, tendo sido chamada a minha attenção para este assumpto, ha quatro ou cinco dias, eu ante-hontem informei-me no Ministerio da Guerra, e no uso do direito que tem o Poder Executivo de interpretar a lei, deliberei que se entendesse o artigo que S. Exa. citou, o artigo 6.°, pela forma como S. Exa. deseja, e com a qual estou du acordo.

Vozes: - Muito bem.

(O orador não reviu).

O Sr. Francisco Machado: - Agradeço a resposta que S. Exa. me deu.

O Sr. Alberto Botelho: - Pedi a palavra mais em nome da commissão de guerra do que para responder ao discurso do Sr. Mathias Nunes, porque a esse discurso respondeu já o Sr. Ministro da Guerra muito proficientemente, como sempre o faz, e tão bom tratado foi por qualquer dos dois oradores o assumpto, que não podia eu tratá-lo melhor, pois reconheço a minha insufficiencia para, perante dois vultos d'este tamanho, tratar unia questão tão technica, tão especial.

Em todo o caso consinta V. Exa. que eu profira muito poucas palavras, não roubo a attenção da Camara mais de 5 minutos; já o anno passado, a primeira vez que falei, disse que a minha divisa era o aphoriamo latino: esto brevis et placebis; é o unico modo porque poderei agradar; mas, Sr. Presidente, ao menos 5 minutos, não é muito!

O nobre Ministro da Guerra já disse ao illustre Deputado Sr. Mathias Nunes que concordava nas emendas por elle mandadas para a mesa, por isso e por outras razões que adegarei, tenho a honra do, em nome da illustrada commissão de guerra, dizer a V. Exa. e á Camara que ella acceitou as propostas de emenda que o illustre Deputado mandou para a mesa.

A commissão acceitou-as todas, não só porque lhe parece que ellas veem beneficiar o projecto em si, tornando-o mais claro, mas tambem porque nós não podemos deixar de corresponder ao procedimento do illustre Deputado que, como orador da opposição, deve ser tomado como modelo, senão com igual nobreza.

S. Exa. discutiu todos os assumptos friamente, sem se deixar nunca levar pela paixão politica (Apoiados), portanto apresentou as suas emendas com o fim unico de melhorar o projecto, e trabalhar conjuntamente comnosco para que elle saia tão bom quanto possivel, assim nós correspondemos a esta boa vontade com outra igual, acceitando as suas emendas todas, apesar de uma d'ellas, a meu ver, não me parecer absolutamente necessaria.

S. Exa., como eu já disse, é um orador correcto, um opposicionista correctíssimo, e, alem d'isso, um militar distinctissimoo (Apoiados) entre nós, os artilheiros, e em todo o exercito.

Por consequencia, saía da sua linha senão viesse discutir um assumpto d'estes sem a correcção, que é a norma de toda a sua vida. (Apoiados).

As emendas que dizem respeito aos artigos 4.º e 17.º, tornam effectivamente mais claro o espirito da lei e com-

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pletam melhor o pensamento do Sr. Ministro da Guerra e da commissão.

Com relação ao artigo 1l.°, S. Exa. disse que pedia a extincção d'elle, e que se desenvolvesse o seu pensamento no regulamento respectivo.

Neste ponto, francamente o digo, não concordo com S. Exa., mas sujeitando-me á opinião da commissão, voto a emenda, porque eu entendo que por melhor que seja a minha opinião devo marchar sempre de acordo com os meus collegas.

Não entendo que este artigo deva ser extincto, e digo a S. Exa. porquê.

É possivel que algum dos membros da commissão de guerra lhe dissesse que se tinha em vista, neste artigo, a prohibição completa da venda de dynamite nos pequenos estabelecimentos de venda.

Devo dizer que a minha intenção não era essa ao redigir, como está, o citado artigo. O que se desejava era que, fosse qual fosse a porção de dynamite ou explosivos existentes á venda, estivessem acondicionados como a sciencia aconselha, e portanto, a sua armazenagem estivesse sujeita ás prescripções do respectivo regulamento, o que é muito differente.

S. Exa. sabe bem que na França e na Belgica a quantidade de explosivos que se podem ter á venda não é determinada pelos regulamentos, mas sim pelos alvarás de licenças, e é nestes que se diz a quantidade de dynamite que deve existir e como deve estar armazenada, e, em geral, essa quantidade não deve exceder 5 kilogrammas nos logares habitados, pois, este artigo 11.° fui redigido com este mesmo fim.

Senão quer S. Exa. ver?

Neste artigo diz-se o seguinte:

«É prohibida nos estabelecimentos de venda a existencia de mais de l5 kilogrammas e de qualquer porção de outros explosivas». Se se não dissesse mais nada, poder-se-hia tirar a conclusão que S. Exa. tirou; mas seguidamente lê-se: «devendo a armazenagem de maiores quantidades de polvora e bem assim a de explosivos, satisfazer as condições de segurança que forem prescriptas».

Armazenagem, onde? Claro está que é nos estabelecimentos de venda; e armazenagem de quê?

De quantidades de polvora superiores a 10 kilogrammas e tambem a de qualquer explosivo.

E, portanto, bem claro o que o artigo quer dizer: isto é que qualquer porção de explosivos não pudera existir á venda senão convenientemente armazenada, e não que só prohiba por completo a venda de explosivos.

Isto seria absolutamente impraticavel pois que todos sabemos o emprego vulgarissimo da dynamite, da polvora de minas, nitro-glycerina, etc.

Mas S. Exa. quer a eliminação do artigo e que as condições de armazenagem e venda se prescrevam no respectivo regulamento.

O Sr. Mathias Nanes: - A eliminação do artigo 11.° facilita á commissão estabelecer graduação nas armazenagens.

O Orador: - Tambem o artigo em questão. Mas não ha duvida nenhuma em que o regulamento pode mais detalhadamente estabelecer as condições de venda.

Se este artigo está aqui no projecto, e talvez a razão por que S. Exa. o Sr. Ministro da Guerra trouxe ao Parlamento o presente projecto de lei, é porque o regulamento estabelece penalidades e multas, o que não se pode fazer sem a existencia de uma lei que o auctorize São estas as razões por que eu, individualmente, approvando as duas primeiras emendas, rejeitaria a que se refere ao artigo 11.°; mas, a commissão de guerra, não só porque entende que o projecto melhora com esta emenda, e alem d'isso por deferencia para com S. Exa., a quem todos tanto consideramos, julga devê la acceitar e eu nas mesmsa ideias voto-a tambem.

Terminando, Sr. Presidente, não posso deixar de louvar o Sr. Ministro da Guerra por ter trazido este projecto de lei ao Parlamento, pois que é mais um ponto luminoso no rasto brilhante que S. Exa. deixa na sua passagem pelo Ministerio da Guerra, tão assignalada pelos serviços por S. Exa. prestados ao exercito, serviços que o collocam á altura de um dos maiores e melhores Ministros da Guerra que Portugal tem tido.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Sr. Presidente: - Como não ha mais ninguem inscripto vae votar-se.

Foram em seguida lidos e successivamente approvados todos os artigos do projecto, com as emendas do Sr. Mathias Nunes.

O Sr. Custodio Borja: - Mando para a mesa o parecer da commissão do ultramar, que tem por fim contar, para os effeitos da reforma, ao capitão Francisco Xavier de Brito, o tempo que residiu em Moçambique como alferes, sem prejuizo da antigüidade.

O Sr. José da Motta Prego: - Mando para a mesa um parecer da commissão de legislação civil acêrca do projecto de lei n.° 26-A, que tem por fim desannexar da comarca de Portalegre as freguesias de Gaffete e Monte da Pedra, e incorporá-las á comarca do Niza.

A imprimir.

O Sr. Abel Andrade: - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda, sobre o projecto n.º 79, de 1901, que tem por fim isentar o Real Gymnasio Club Português, do pagamento de todas as contribuições.

A imprimir.

O Sr. Vaz Ferreira: - Mando para a mesa, um parecer das commissões de administração publica e de legislação.

A imprimir.

O Sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto de lei n.° 53, sobre a renovação de iniciativa da proposta de lei n.° 22-N, que altera as disposições do decreto de 10 de janeiro, em relação ao onus de servidão sobre os terrenos proximos das fortificações, fabricas, paioes, etc.

Leu-se na mesa. «É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.º 53

Senhores. - O decreto de 10 de janeiro de 1895, que estabeleceu e impôs regras concernentes ao onus de servidão a que devem estar sujeitos os terrenos proximos das fortificações, fabricas, paioes, depositos de polvora e outros explosivos de guerra, não encerra explicitamente disposições applicaveis ás fortificações maritimas e é demasiadamente exigente nalgumas das suas prescripções, sem que d'ahi provenha a maior vantagem para a boa utilização e segurança d'aquellas construcções e estabelecimentos militares.

Já em 1897 havia demonstrado a experiencia a necessidade de serem alteradas as disposições do referido decreto no sentido de se preencher a lacuna relativa ás obras militares maritimas e de suavizar os rigores que, a bem da defesa do país, sempre foi preciso impor á propriedade tanto publica, como particular, quando situada nas proximidades das fortificações e dos estabelecimentos contendo polvoras e outros explosivos de guerra. Num projecto que naquelle anno foi presente ás Camaras, tendo obtido parecer da commissão de guerra, mas não chegando a ser convertido em lei do Estado, procurava obviar se aos inconvenientes apontados.

Foi vasada nos mesmos moldes e tinha aquelle mesmo objectivo a proposta de lei n.° 22-N, submettida á apreciação da Camara na sessão passada, a qual não chegou a ser discutida, nem mesmo obteve parecer da respectiva commissão de guerra. A presente proposta ministerial, que é a renovação de iniciativa d'aquella, foi devidamente

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apreciada pela vossa commissão de guerra, que se conformou com ella em todos os seus artigos.

Nestas condições, esta commissão vem sujeitar á vossa apreciação, julgando-o digno do approvação, o seguinte projecto de lei:

TITULO I

Da zona das fortificações

CAPITULO I

Extensão da zona de fortificações

Artigo 1.º Em todas as praças de guerra e mais pontos fortificados de caracter permanente a zona das fortificações pertence, em regra, ao dominio do Estado. A sua propriedade é inalienavel e imprescriptivel.

§ unico. Presume-se sempre a favor do Estado a posse dos terrenos que constituem a zona das fortificações, excepto quando quaesquer particulares ou corporações apresentem titulo legal, pelo qual justifiquem a posso legitima de taes terrenos.

Art. 2.° Entende-se por zona das fortificações:

a) Nos fortes isolados, todo o terreno comprehendido dentro do perimetro exterior da respectiva explanada.

b) Nas praças de guerra do systema abaluartado, todo o terreno comprehendido entre o perimetro exterior da explanada e o perimetro interior da rua militar, bem como os terrenos exteriores annexos onde estejam ccnstruidas quaesquer obras avançadas.

c) Nos campos entrincheirados, pelo que respeita:

l.º Ao entrincheiramento, todo o terreno comprehendido entre o perimetro exterior da explanada e o limite interior da via de reparo, bem como o terreno occupado pelas estradas ou linhas ferreas do cintura e serviço do campo entrincheirado;

2.º Aos fortes apoios e demais obras fechadas, todo o terreno comprehendido dentro do perimetro exterior da respectiva explanada;

3.º As baterias intermedias e demais obras abertas, todo o terreno comprehendido entre o perimetro exterior da explanada e a linha de golla da obra.

d) Nas fortificardes maritimas:

1.º Quando sejam obras fechadas, todo o terreno comprehendido dentro do perimetro exterior da respectiva explanada;

2.° Quando sejam obras abertas, todo o terreno comprehendido entre o perimetro exterior da explanada e a linha de golla da obra.

§ unico. Quando não seja possivel determinar o perimetro exterior da explanada, será este perimetro substituido, para os effeitos da presente lei, por uma linha traçada a cerca de 40 metros de distancia da crise da explanada, no caso do haver fosso, ou a cerca de 60 metros de distancia da linha de fogo mais avançada, no caso de o não haver.

CAPITULO II

Das ruas e estradas militares

Art. 3.° O perimetro interior da rua militar é definido por uma linha traçada parallelamente, e a 8 metros de distancia das gollas dos baluartes, e do pé do talude, ou muro de supporte do terrapleno das cortinas, ou do respectivo parapeito quando não tenham terrapleno.

§ 1.° Em casos especiaes, e precedendo informação favoravel da commissão das fortificações do reino poderá ser supprimida a rua militar, ou reduzida a sua largura, quando haja vias parallelas que a possam substituir, ou quando da reducção não provenha inconveniente para o serviço.

§ 2.° Os edificios e muros actualmente existentes na sua militar que, por qualquer causa, venham a ser demolidos no todo ou em parte, não poderão ser senão obedecendo ao alinhamento da mesma rua.

§ 3.° A circularão pela rua militar, bem como pelas estradas de cintura e do serviço dos campos entrincheirados, é permittida ao publico, conformando-se com os regulamentos da policia militar e civil.

CAPITULO III

Da explanada

Art. 4.° Na explanada de uma fortificação, ainda que o respectivo terreno não esteja na posse ou na fruição do Estado, é expressamente prohibido:

a) Fazer construcções de qualquer natureza, quer subterraneas ou enterradas, quer fixas acima do solo.

b) Alterar permanentemente, de qualquer forma, por meio de escavações ou aterros, o relevo e disposição do solo.

c) Estabelecer quaesquer vedações, mesmo como divisorias de propriedade, que não sejam de sebe morta.

d) Fazer depositos, permanentes ou temporarios, de materiaes de qualquer natureza, com excepção dos adubos a que se refere o alinea d) do artigo 5.°

e) Realizar quaesquer culturas que não sejam, arvenses ou de vinha rasteira.

f) Estabelecer machinas de vapor de qualquer natureza, fixas, semi-fixas ou moveis.

Art. 5.° Ficam expressamente dependentes de licença previa do governador da praça ou respectivo commandante militar, a qual será somente concedida quando d'ella não resultar inconveniente para a defesa:

a) O estabelecimento de barracas moveis cuja superficie horizontal não poderá exceder para cada uma 6 metros quadrados, e que deverão ser construidas com materiaes combustiveis.

b) A realização das alterações temporarias da superficie do solo exigidas pelas culturas admittidas pela alinea e) do artigo 4.°

c) O estabelecimento de vedações de sobe morta.

d) O estabelecimento de deposito de adubos exigidos pelas culturas admittidas pelo alinea e) do artigo 4.°, os quaes, ainda assim, terão o caracter temporario e constituirão a unica excepção do alinea d) do mesmo artigo.

e) A construcção de muros de supporte indispensaveis para a sustentação das terras, os quaes, ainda assim, só poderão ser permittidas quando d'elles não resultarem novos ou mais vantajosos abrigos para o atacante.

f) A plantação de arvores ou arbustos, quer isolados quer agrupados por qualquer forma.

g) A execução de quaesquer levantamentos de plantas ou trabalhos topographicos.

TITULO II

Das zonas de servidão militar

CAPITULO I

Da servidão concernente ás fortificações

SECÇÃO l

Natureza e extensão da servidão militar

Art. 6.° Nos terrenos que circumdam as fortificações a propriedade territorial fica sujeita á servidão militar nos termos da presente lei.

Art. 7.º Os terrenos que circumdam as obras de fortificação dividem-se, no que respeita á servidão militar, pela forma seguinte:

a) A primeira zona, que vae do perímetro exterior da explanada até um polygono, cujos vertices serão marca-

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dos sobre as capitães da fortificação a uma distancia de 600 metros, medidos horizontalmente, a partir da crista da explanada.

b) A segunda zona, que vae do perimetro exterior da primeira zona até um polygono, cujos vertices serão marcados sobre as capitães da fortificação a uma distancia de 1:000 metros, medidos horizontalmente, a partir da crista da explanada.

c) A terceira zona, que vae do perimetro exterior da segunda zona até um polygono, cujos vertices serão marcados sobre as capitães da fortificação a uma distancia de 3:000 metros, medidos horizontalmente, a partir da crista da explanada.

§ 1.° Nos campos intrincheirados ha tambem a zona interior, que vae desde a golla das obras abertas, e do perimetro interior da via do reparo dos lanços de entrincheiramento, até á distancia maxima de 600 metros, medidos harizontalmente, a partir d'estes limites.

§ 2.° Quando não exista fôsso, censiderar-se-ha substituida a crista da explanada, para os effeitos da presente lei, pela linha de fogo mais avançada.

§ 3.° Quando a bissectriz de um saliente da magistral não coincidir com a do saliente do respectivo caminho coberto, considerar-se-ha como capital, para os effeitos da presente lei, a linha que une os vertices dos dois indicados salientes.

§ 4.° Com relação ás obras de traçado curvilíneo, considerar-se-hão como capitaes, para os effeitos da presente lei, as normaes á linha de fogo principal.

SECÇÃO II

Da primeira zona exterior e da zona interior de servidão

Art. 8.° Na primeira zona exterior de servidão, e bem assim na zona interior, é expressamente prohibido:

a) Fazer construcções subterraneas, com excepção das galerias de mina a que se refere a alinea a) do artigo 9.°

b) Fazer construcções enterradas, quer descobertas, quer cobertas, com excepção dos poços, tanques para lavagem e depositos de agua para rega, a que se refere a alinea b) do artigo 9.°

c) Fazer construcções acima do solo compostas de materiaes incombustiveis, sendo, porem, licito o emprego do ferro em ligeiro esqueleto facilmente demonstravel, e o de alvenaria em soccos ou lareiras que se não elevem mais de Om,30 acima do solo, quer estes materiaes se empreguem isoladamente, quer entrem, numa construcção composta de materiaes combustiveis.

d) Explorar pedreiras, caleiras, barreiras, saibreiras ou areeiros que não satisfaçam ás condições impostas pela alinea d) do artigo 9.°

e) Fazer extensos aterros ou excavações, taes como: vallados, vallas, diques, fossos, canaes de irrigação ou navegaveis, com excepção dos vallados e valias, a que se refere a alinea e) do artigo 9.°

f) Estabelecer quaesquer vedações, mesmo como divisorias de propriedade, constituidas por sebes vivas, muros de alvenaria (incluindo os de pedra sêcca), muros de pasta granitica com as juntas tomadas de argamassa, ou grades de ferro que não sejam facilmente desmontaveis.

g) Fazer depositos permanentes de materiaes não combustiveis ou do combustivel mineral, bem como depositos temporarios dos mesmos materiaes que tenham mais de 1m,20 de altura.

h) Estabelecer machinas de vapor fixas ou semi-fixas.

Art. 9.° Ficam expressamente dependentes de licença previa do governador da praça ou respectivo commandante militar, a qual somente será concedida quando d'ella não resultar inconveniente para a defesa:

a) A abertura de galerias de mina para exploração de aguas que ficam exceptuadas da prohibição imposta pela alinea a) do artigo 8.°, comtanto que a sua minima distancia á crista da explanada seja superior a 300 metros e que as dimensões da respectiva secção não excedam l metro por 0m,80.

b) O estabelecimento de poços, tanques para lavagem e depositos de agua para rega, que ficam exceptuados das prohibições impostas pelas alineas b) e c) do artigo 8.º, comtanto que não tenham cobertura ou que, tendo-a, o emprego de matemos incombustiveis fique nesta sujeito ás condições fixadas na alinea c) do mesmo artigo.

c) A realização de construcções fixas acima do solo, comtanto que o emprego de materiaes incombustiveis esteja nellas sujeito ás condições fixadas na alinea c) do artigo 8.°

d) A exploração do pedreiras, caleiras, barreiras, saibreiras ou areeiros, a qual somente poderá ser permittida com as seguintes condições:

1.ª Que a sua distancia á crista da explanada seja superior a 300 metros;

2.ª Que a arca da exploração simultanea nunca seja superior a 100 metros quadrados;

3.ª Que as escavações d'ella resultantes sejam successivamente aterradas, por forma que nunca excedam a area em que se permitte a exploração simultanea, devendo ficar a superficie do solo nas condições em que estava antes da exploração.

e) A construcção de vallados com menos de Om,50 acima do solo, bem como a abertura de vallas indispensaveis para o esgoto das aguas que ficam exceptuadas da prohibição imposta pela alinea e) do artigo 8.°, comtanto que não tenham mais de Om,60 de profundidade.

f) O estabelecimento, mesmo como divisorias de propriedade, de vedações constituidas por grades de ferro facilmente desmontaveis, tapumes continuos ou grades de madeira, e vedações mixtas de madeira e fio do arame, muros de pasta granitica, comtanto que as juntas não sejam tomadas de argamassa, bem como o de vedações do sebo morta, cuja distancia minima á crista da explanada seja inferior a 300 metros.

f) O estabelecimento dos depositos temporarios de materiaes incombustiveis ou de combustivel mineral que não tenham mais de lm,20 de altura, bem como a criação dos depositos permanentes ou temporarios de materiaes combustiveis, com excepção dos depositos de adubos a que se refere a alinea d) do artigo 10.°

h) A plantação de arvores ou arbustos constituindo bosque, mota ou qualquer outra forma de agrupamento, plantação que somente será consentida quando d'ella não resultar abrigo contra o tiro da fortificação.

i) O estabelecimento de machinas de vapor moveis.

j) A construcção de muros de suppprte necessarios para a sustentação das terras, os quaes, ainda assim, só poderão ser permittidos quando d'elles não resultarem novos ou mais vantajosos abrigos para o atacante.

k) A execução de quaesquer levantamentos de plantas ou trabalhos topographicos.

Art. 10.° Ficam dependentes de licença previa:

a) O estabelecimento de barracas moveis construidas com materiaes combustiveis, cuja superficie horizontal não exceda 6 metros quadrados, contanto que estejam isoladas ou que o grupo por ellas formado não exceda uma area superior a 100 metros quadrados.

b) A realização das alterações temporarias da superficie do solo exigidas pelas culturas ou plantações, contanto que estas ultimas se contenham nos limites impostos pela alinea h) do artigo 9.°

c) O estabelecimento de vedações de sebe morta, contadto que a sua minima distancia á crista da explanada seja superior a 300 metros.

d) O estabelecimento dos depositos de adubos exigidos pelas culturas e plantações permittidas.

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20 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SECÇÃO III

Da segunda zona de servidão

Art. 11.° Na segunda zona de servidão é expressamente prohibido:

a) Fazer construcções subterraneas, com excepção das galerias de minas a que se refere a alinea a) do artigo 12.°

b) Fazer construcções enterradas, cobertas com matames incombustiveis, cuja disposição se não ajuste ao preceituado na alinea c) do presente artigo, sendo, porem, licito o emprego, mesmo abaixo do solo, de pavimentos do madeira assentes em vigamentos de madeira ou de ferro.

c) Fazer construcções acima do solo em que as paredes do alvenaria, taipa ou adobes tenham espessura superior a Om,35, em que os soccos se elevam a mais de Om,30, sobre o terreno natural, ou em que se empreguem abobadados de qualquer natureza, com excepção dos exigidos pelo estabelecimento de fornos a que se refere a alinea d) do artigo 12.º

Art. 12.º Ficam expressamente dependentes da licença previa do Governador da Praça ou respectivo commandante militar, a qual somente será concedida quando d'ella não resultar inconveniente para a defesa:

a) A abertura de galerias de mina para a exploração de aguas que ficam exceptuadas da prohibição imposta pela alinea, a) do artigo 11.°, contanto que as dimensões da respectiva secção não excedam l metro por Om,80.

b) O estabelecimento do quaesquer construcções enterradas, as quaes somente poderão ser consentidas quando sejam descobertas, ou quando as suas coberturas ou pavimentos se ajustem ao preceituado nas alineas b) e c) do artigo l1.º

c) A realização de construcções fixas acima do solo, quer isoladas, quer em grupos, ficando entendido que o emprego de materiaes incombustiveis será em todas sem pre sujeito ás condições fixadas na alinea c) do artigo 11 .°, com excepção dos fornos, das paredes dos tanques para lavagem e depositos de agua para rega, bom como das chaminés de casas ou fabricas, nas quaes se poderão admittir espessuras superiores.

d) O estabelecimento de fornos quer para cozer pão, quer para o fabrico de cal, telha ou tijolo.

e) A exploração de pedreiras, caleiras, barreiras, saibreiras ou areeiros, a qual somente poderá ser permittida com as seguintes condições:

1.ª Que a area da exploração simultanea nunca seja superior a 100 metoos quadrados;

2.º Que as escavações d'ella resultantes sejam successivamente aterradas, por forma que nunca excedam a area em que se permitte a exploração simultanea, devendo ficar a superficie do solo nas condições em que estava antes da exploração.

f) A construcção de extensos aterros ou escavações, taes como vallados, vallas, diques, fossos e canaes de irrigação ou navegaveis, com excepção dos vallados e vallas a que se refere a alinea f) do artigo 13.°

g) O estabelecimento, mesmo com divisorias de propriedade, de vedações constituidas por sebes vivas, muros de alvenaria (incluindo os de pedra sêcca), muros de pasta granitica com as juntas tomadas de argamassa, grades de ferro que não sejam facilmente desmontaveis e tapumes continuos de madeira.

h) O estabelecimento de depositos temporarios ou permanentes de quaesquer materias combustiveis ou incombustiveis, o qual somente poderá ser consentido quando do taes depositos não resulte abrigo contra o tiro da fortificação, com excepção dos depositos de adubos a que se refere a alinea e) do artigo 13.°

i) A plantação de arvores ou arbustos constituindo bosque, mata ou qualquer outra forma de agrupamento, plantação que somente será consentida quando d'ella não resultar abrigo contra o tiro da fortificação.

j) O estabelecimento de machinas de vapor fixas ou semi-fixas.

k) A construcção de maros de supporte para sustentação de terras, os quaes, ainda assim, só poderão ser permittidos quando d'elles não resultarem novos ou mais vantajosos abrigos para o atacante.

1) A execução de quaesquer levantamentos de planta ou trabalhos topographicos.

Art. 13.º Ficam independentes de licença previa:

a) O estabelecimento de barracas moveis construidas com materiaes combustiveis, comtanto que estejam isoladas, ou que o grupo por ellas formado não cubra uma area superior a 200 metros quadrados.

b) A realização das alterações temporarias da superficie do solo exigidas pelas culturas ou plantações, comtanto que estas ultimas se contenham nos limites impostos pela alinea i) do artigo 12.°

c) A construcção de vallados com menos de Om,50 acima do solo, bem como a abertura de valias que não tenham mais. de Om,60 de profundidade, comtanto que o aterro e a escavação não sejam contiguos, formando um mesmo obstaculo.

d) O estabelecimento de vedações constituidas por sobes mortas, grades do ferro facilmente desmontaveis, muros de pasta granitica, comtanto que as juntas não sejam tomadas de argamassa, grades de madeira e vedações mixtas de madeira e fio de arame.

e) O estabelecimento dos depositos de adubos exigidos pelas culturas e plantações permittidas.

f) O estabelecimento de machinas de vapor moveis.

SECÇÃO IV

Da terceira zona de servidão

Art. 14.° Em toda a terceira zona ficam expressamente dependentes de licença previa do governador da praça ou respectivo commandante militar, a qual somente será concedida quando d'ella não resultar inconveniente para a defesa:

a) A execução de quaesquer levantamentos de plantas ou trabalhos topographicos.

b) A construcção de caminhos de ferro, estrados ordinarios ou canaes (navegaveis ou do irrigação), a abertura de novos caminhos carraçoaveis, o lançamento de pontes de caracter permanente ou o estabelecimento de viaductos e, e em geral, a introducção de modificações de caracter permanente nas vias de communicação existentes.

c) A execução, a menos de 2:000 metros de distancia da crista da explanada, de quaesquer construcções que possam dar novas vistas sobre o interior da fortificação, sendo, porem, exceptuadas d'esta restricção as chamins das fabricas e os moinhos de vento, quer para elevação da agua, quer para usos industriaes.

Art. 15.° Em determinados tractos do terreno, contidos na terceira zona e visivelmente demarcados pela auctoridade militar, que terão a designação de polygonos reservados, ficam expressamente dependentes de licença previa do governador da praça ou respectivo commandante militar, a qual somente será concedida quando d'ella não resultar inconveniente para a defeza:

a) O estabelecimento, a menos de 2:000 metros de distancia da crista da explanada, de construcções enterradas ou de construcções fixas acima do solo, ou de muros de supporte que somente serão prohibidos, quando possam, offerecer vantajoso abrigo ao atacante ou occultar ás vistas da fortificação vias de communicação ou posições importantes e, em geral, qualquer parte aproveitavel do campo de tiro, quer terrestre, quer fluvial ou maritimo, das fortificações que determinam a servidão.

b) A plantação de arvores em bosques ou matos, que

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somente será prohibida quando occultem ás vistas da fortificação importantes vias do communicação, obstaculos naturaes do terreno, passagens de linhas de agua ou posições de consideravel vantagem para o ataque, bem como qualquer parte aproveitavel do campo de tiro, quer terrestre, quer fluvial ou maritimo, das fortificações que determinam a servidão.

c) O corte raso de bosques ou florestas que pertençam ao Estado ou sejam de logradouro commum, quer districtaes, quer municipaes ou parochiaes, córte raso que somente será permittido quando d'elle não resultar alteração prejudicial para as condições da defesa.

d) A modificação consideravel da forma ou natureza do solo, tal como o corte de montes ou cabeços, a inundação de terrenos, o dessecamento de pantanos ou lagoas, a canalização de esteiros ou o estabelecimento de diques, sendo comtudo estas prescripções somente applicaveis aos terrenos na posse do Estado e aos de logradouro commum, quer districtaes, quer municipaes ou parochiaes.

CAPITULO II

Da servidão concernente ás fabricas, paioes e depositos de polvora ou outros explosivos de guerra

SECÇÃO I

Natureza e extensão da servidão militar

Art. 16.° Nos terrenos que circumdam os estabelecimentos onde se fabricam, manipulam ou guardam polvoras ou outros explosivos de guerra, a propriedade territorial fica sujeita á servidão militar nos termos da presente lei.

Art. 17.º Os terrenos que circumdam os estabelecimentos militares, a que se refere o artigo antecedente, dividem-se, no que respeita a servidão militar, pela forma seguinte:

a) A primeira zona, que é limitada de uma parte pelo muro de vedação da fabrica, deposito ou paiol, e do outra parte par um polygono traçado parallelamente áquelle muro e d'elle distante 26 metros.

b) A segunda zona, que é limitada de uma parte pelo perimetro exterior da primeira zona, e de outra parte por um polygono traçado parallelamente áquelle perimetro e distante do limite interior da primeira zona 50 metros.

c) A terceira, zona, que é limitada de uma parte pelo perimetro exterior da segunda zona, e de outra parte por um polygono traçado parallelamente áquelle perimetro e distante do limite interior da primeira zona 500 metros.

SECÇÃO II

Da primeira zona de servidão

Art. 18.º Na primeira zona de servidão é expressamente prohibido:

a) Fazer construcções de qualquer natureza, subterraneas, enterradas ou acima do solo.

b) Explorar pedreiras, caleiras, barreiras, saibreiras ou areeiros.

c) Estabelecer quaesquer vedações de madeira ou sebe morta, mesmo como divisorias de propriedade.

d) Estabelecer depositos de substancias explosivas ou inflammaveis.

e) Plantar arvores ou arbustos constituindo bosque, mata ou qualquer outra forma de agrupamento.

f) Estabelecer machinas de vapor de qualquer natureza, fixas, semi-fixas ou moveis, bem como fornos, forjas ou quaesquer outras officinas providas de fornalhas com ou sem chaminé.

g) Estabelecer canalização de gaz ou fios transmissores de electricidade para illuminação ou fins industriaes.

k) Conservar os terrenos com mato.

i) Caçar, lançar foguetes, fazer fogueiras ou queimadas e bem assim praticar quaesquer outros actos que possam provocar a inflammação das substancias contidas nos recintos das fabricas ou armazens.

j) Transitar pelas estradas e caminhos contidos nesta zona a cavallo ou em viaturas, em outro andamento que não seja o passo, bem como fumar, accender phosphoros e faiscar.

Art. 19.° Fcam expressamente dependentes de licença previa da auctoridade competente, a qual somente será concedida quando d'ella não resultar perigo:

a) A construcção de galerias de minas para exploração de aguas, que ficam exceptuadas da prohibição imposta pela alinea a) do artigo 18.°, contanto que nos trabalhos de abertura se não empreguem explosivos.

b) O estabelecimento de poços, tanques para lavagem e depositos de agua para rega, que ficam exceptuados da prohibição imposta pela alinea a) do artigo 18.°, contanto que não tenham cobertura ou que, tendo-a, esta seja de materiaes incombustiveis.

SECÇÃO III

Da segunda zona de servidão

Art. 20.° Na segunda zona de servidão é expressamente prohibido:

a) Fazer construcções com materiaes facilmente incendiavais.

b) Estabelecer fabricas ou depositos de substancias explosiveis ou inflammaveis.

c) Estabelecer quaesquer vedações de madeira ou sebe morta, mesmo com divisorias de propriedade.

d) Estabelecer machinas de vapor de qualquer natureza, fixas, semi-fixas ou moveis, bem como fornos, forjas ou quaesquer outras officinas providas de fornalhas com ou sem chaminé.

e) Conservar os terrenos com mato.

f) Caçar, lançar foguetes, fazer fogueiras ou queimadas, bem como praticar quaesquer outros actos que possam provocar a inflammação das substancias contidas no recinto das fabricas ou dos armazens.

Art. 21.° Fica expressamente dependente de licença previa da auctoridade competente, a qual somente será concedida quando d'ella não resultar perigo, a exploração de pedreiras, caleiras, barreiras, saibreiras ou areeiros, que unicamente será permittida quando para ella se não empreguem explosivos.

SECÇÃO IV

Da terceira zona de servidão

Art. 22.° Na terceira zona de servidão é expressamente prohibido:

a) Estabelecer fabricas ou depositos de substancias explosivas ou inflammaveis;

b) Estabelecer machinas de vapor de qualquer natureza, fixas, semi-fixas ou moveis, bem como fornos, forjas ou quaesquer outras officinas providas de fornalhas com ou sem chaminé;

c) Conservar os terrenos com mato;

d) Caçar, lançar foguetes, fazer fogueiras, e bem assim praticar quaesquer outros actos que possam provocar a inflamação das substancias contidas no recinto das fabricas ou dos armazens.

Art. 23.° Fica expressamente dependente de licença previa da auctoridade competente, a qual somente será concedida quando d'ella não resultaa perigo, a exploração de pedreiras, caleiras, barreiras, saibreiras e areeiros que unicamente será permittida quando para ella se não empreguem exclusivos.

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TITULO III

Do estabelecimento e restricções da servidão militar

CAPITULO I

Da applicação da servidão militar

Art. 24.° Quando seja mandada construir uma nova fortificação, ou outro estabelecimento militar, a que, pela presente lei, corresponda servidão, será esta logo especificadamente decretada, e proceder-se-ha em seguida á demarcação das respectivas zonas no terreno.

§ unico. A servidão militar considerar-se-ha existente desde a data da publicação do decreto que a estabelecer.

Art. 25.° Para as fortificações e mais estabelecimentos militares já existentes, ou em construcção, será fixada por decretos especiaes a servidão que, nos termos da presente lei, lhes corresponda.

§ unico. Emquanto não forem publicados os decretos a que se refere o presente artigo, continuará a applicar-se a legislação anterior sobre servidões com relação ás alludidas fortificações e estabelecimentos militares.

Art. 26.º Desde a data da publicação do decreto que estabelecer uma determinada servidão militar, ficam os proprietarios dos terrenos a esta sujeitos, ipso facto, obrigados a mandar demolir, destruir ou remover as construcção, plantações, depositos, vedações ou quaesquer alterações da superficie do solo, effectuadas posteriormente ao decreto referido, restituindo o terreno ás condições anteriores, quando, por occasião da passagem ao estado de defesa das fortificações a que a servidão corresponder, assim lhes for determinado pela competente auctoridade militar o em prazo por ela marcado.

§ unico. O encargo resultante das prescripções d'este artigo não dá direito para os proprietarios dos terrenos a indemnização de especie alguma.

Art. 27.º Ficam sujeitos a servidão militar completa, nos termos da presente lei, os terrenos dominados pelas obras de fortificação ou faces de obras, contra as quaes seja possivel realizar as operações abaixo mencionadas:

a) Ataque por surpresa ou viva força.

b) Bombardeamento, com investimento ou bloqueio.

c) Sitio em regra.

Art. 28.º Poderá ser reduzida a servidão, pela forma abaixo especificada o procedendo o parecer favoravel da commissão das fortificações do reino, com relação ás obras de fortificação ou faces de obras:

a) Que não sejam susceptiveis de ataque proximo, quer por surpresa ou viva força, quer por sitio em regra.

b) Que não sejam susceptiveis do bombardeamento e ataque de artilharia a distancia, nem do sitio em regra.

c) Que não sejam susceptiveis de sitio em regra.

d) Que sejam somente destinadas a atirar contra embarcações.

§ unico. Poderá tambem reduzir-se, até ao minimo de 30 metros, a largura da zona interior da servidão dos campos entrincheirados, ou do parte d'esta zona.

Art. 29.° Aos terrenos dominados pelas obras de fortificação ou faces de obras comprehendidas na alinea a) do artigo antecedente não serão applicadas as prescripções relativas á primeira e segunda zonas, devendo a servidão militar, com relação a essas obras ou faces, obedecer ás regras estabelecidas para a terceira zona, a partir do limite exterior da explanada.

Art. 30.° Aos terrenos dominados pelas obras de fortificação ou faces de obras comprehendidas na alinea b) do artigo 28.° não serão applicadas as prescripções relativas á segunda e terceira zonas, devendo a servidão militar, com relação a casas obras ou faces, terminar no limite exterior da primeira zona.

Art. 31.° Aos terrenos dominados pelas obras de fortificação ou faces de obras comprehendidas na alinea c) do artigo 28.° não serão applicadas as prescripções relativas á segunda zona, devendo a servidão militar, com relação a essas obras ou faces, obedecer ás regras estabelecidas para a terceira zona, a partir do limite exterior da primeira.

Art. 32.° Com relação ás obras de fortificação ou faces do obras comprehendidas na alinea d) do artigo 28.° somente será sujeito a servidão militar, alem da respectiva explanada, o terreno comprehendido entre as direcções dos tiros extremos d'essas obras ou faces, o limite exterior da mesma explanada e a linha marginal ou orla maritima. Ao espaço assim delimitado serão applicadas as prescripções relativas á terceira zona, ficando expressamente determinado que a sua totalidade será considerada como um unico polygono reservado.

Art. 33.° Poderão ser parcialmente excluidos das restricções impostas pelas servidões militares, estabelecidas na presente lei, limitados tratos de terreno, nos quaes, quer pelas condições especiaes do respectivo perfil, quer pela geral arborização do solo, quer por fazerem parte de povoações ou importantes grupos de construcções já existentes, deixem de ser perigosas para a defesa construcções, plantações ou alterações do solo que, no caso geral, seriam prohibidas.

§ unico. A demarcação dos tractos de terreno a que se refere o presente artigo, bem como a fixação das regras especiaes a cada um d'elles applicaveis, será feita por decreto, precedendo parecer fundamentado da commissão das fortificações do reino.

Art. 34.º Quando se sobreponham no mesmo terreno zonas de servidão de diversas obras de fortificação ou faces de obras, ficam nelle prevalecendo as prescripções relativas ás zonas que as tiver mais onerosas.

Art. 35.° Com relação ás antigas praças de guerra e mais pontos fortificados que, embora tenham sido desclassificados, se conservem na posse do Estado, a applicação da presente lei considerar-se-ha reduzida ás respectivas explanadas; no caso, porem, de occuparem posições para novas fortificações, continuarão a gozar da servidão militar que impunham antes da desclassificação.

§ unico. Quando no interior de antigas praças do guerra existam castellos ou cidadellas, a servidão militar a elles correspondente terá por limites os da respectiva explanada, cujo perimetro exterior poderá approximar-se até uma distancia minima de 30 metros do pé de suas muralhas.

Art. 36.° Com relação aos paioes e mais depositos do polvoras ou outros explosivos de guerra que, pela sua construcção, estejam á prova do tiro de artilharia, estabelecer-se-ha simplesmente a primeira zona de servidão.

§ unico. Não será imposta servidão alguma com relação aos simples depositos regimentaes de cartuchame de armas portateis.

CAPITULO II

Disposições relativas ás construcções preexistentes ao estabelecimento da servidão

Art. 37.° Nas zonas de servidão estabelecidas pela presente lei, as construcções existentes á data da sua publicação, comprehendidas no numero das que são prohibidas, ou somente permittidas mediante auctorização superior, ficam sujeitas á condição de poderem ser mandadas demolir em tempo de guerra o mediante indemnização, quando d'ellas resulte prejuizo.

§ unico. Quando estas construcções já estivessem incursas nas prohibições estabelecidas pela legislação anterior, a sua demolição não será motivo de indemnização alguma.

Art. 38.° São igualmente applicaveis as disposições do artigo 37.º ás construcções que já existissem nos terrenos onde seja imposta servidão determinada pela edificação ul-

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terior de fortificações ou de outros estabelecimentos militares, a que se refere a presente lei.

Art. 39.° Nas construcções a que se referem os artigos 37.° e 38.°, ficarão subordinadas:

a) Ás ampliações ou reconstrucções, ao determinado na presente lei com relação á zona de servidão em que se encontrem.

b) Os trabalhos de conservação, á condição de nelles se empregarem unicamente materiaes da mesma natureza dos existentes, ou outros não prohibidos dentro da respectiva zona.

§ 1.° Nenhuma das obras de conservação, reconstrucção ou ampliação, a que se refere o presente artigo, poderá executar-se sem previa licença da competente auctoridade militar.

§ 2.° Não poderá invocar-se o facto de terem sido auctorizadas quaesquer obras de conservação, reconstrucção ou ampliação nas construcções, a que se refere o presente artigo, como fundamento para que seja augmentada a indemnização prevista no artigo 37.°

TITULO IV

Das licenças e contravenções relativas á zona das fortificações e á servidão militar

Art. 40.° As licenças relativas á zona de fortificações e á servidão militar não poderão ser concedidas pelos governadores ou commandantes militares das praças de guerra e demais pontos fortificados, senão nos termos da presente lei, e mediante parecer favoravel do respectivo inspector de engenharia.

Art. 41.° Para os effeitos do artigo anterior, será o pedido de licença dirigido ao governador ou commandante militar, que d'elle dará immediato conhecimento ao respectivo inspector de engenharia, a fim de este informar se ha inconveniente na concessão solicitada e, não o havendo, formular as condições a que deverá submetter-se.

Art. 42.° Das decisões dos governadores das praças ou commandantes militares a que se referem os artigos 40.° e 41.° da presente lei, terá o interessado sempre recurso para o Ministerio da Guerra, que resolverá em ultima instancia, ouvido o commandante geral da engenharia, e mediante consulta da commissão das fortificações do reino.

Art. 43.° Nenhuma obra de qualquer natureza, publica ou particular, poderá ser decretada ou auctorizada dentro das zonas de servidão de uma praça de guerra ou ponto fortificado, senão nos termos da presente lei.

§ unico. Para os effeitos d'este artigo, a Secretaria de Estado, da qual dependam as obras a que o mesmo artigo se refere, só poderá decretar ou permittir a sua execução, depois da ouvida a Secretaria da Guerra, e quando esta tenha informado, mediante consulta do respectivo governador ou commandante militar, prestrada nos termos dos artigos 40.° e 41.°, não resultar de tal construcção inconveniente algum para a defesa.

Art. 44.º Considerar-se-hão contravenções previstas pela presente lei:

a) Com relação á zona das fortificações, os actos praticados em prejuizo da propriedade do Estado, bem como a violação das prescripções contidas na presente lei e nos regulamentos de policia militar concernentes á mesma zona.

b) Com relação á servidão militar, a violação das prescripções contidas na presente lei a ella relativas, bem como a falta1 de observancia das condições com que hajam sido concedidas as licenças que a mesma lei faculta.

Art. 45.° Cumpre aos inspectores de engenharia e seus delegados velar pelo exacto cumprimento d'esta lei, e rigorosa observancia das condições em que foram concedidas as licenças que a mesma lei faculta, tanto no que diz respeito aos terrenos comprehendidos na zona das fortificações como relativamente aos que estejam sujeitos a servidão militar.

Art. 46.° Considerar-se-hão delegados do inspector de engenharia, para os effeitos da presente lei, os officiaes da mesma arma que se achem servindo na respectiva inspecção, bem como o pessoal auxiliar para esse effeito designado, o qual deverá prestar juramento perante o tribunal da comarca onde haja de exercer funcções.

Art. 47.° Incumbe ao governador ou commandante militar informar o respectivo inspector de engenharia dos factos de que tenha conhecimento, occorridos na praça de guerra ou ponto fortificado do seu governo ou commando, que impliquem falta de cumprimento da presente lei, ou inobservancia das condições em que foram concedidas as licenças que a mesma lei faculta.

Art. 48.° A informação a que se refere o artigo anterior será directamente transmittida ao inspector de engenharia, excepto quando residir na localidade, onde o facto se der, algum official da mesma arma seu delegado, a quem neste caso, será dirigida a informação.

§ unico. Quando haja conhecida urgencia em providenciar relativamente a um facto occorrido em localidade onde não resida nem o inspector de engenharia, nem official da mesma arma seu delegado, o governador da praça ou commandante militar, sem prejuizo da informação acima alludida, que será immediatamente enviada, determinará que o pessoal auxiliar da estação tome do occorrido conhecimento directo, a fim de proceder sem demora dentro da sua alçada.

Art. 49.° Logo que chegue ao conhecimento do inspector de engenharia ou de um seu delegado a existencia de alguma contravenção prevista na presente lei e occorrida na area da respectiva jurisdicção, cumpre ao inspector ou a esse delegado avisar immediatamente o contraventor:

1.° Para que suspenda, sem demora, a continuação dos actos que importam contravenção;

2.° Para que restitua ao estado anterior o terreno ou local onde a contravenção occorreu, num prazo, que será fixado no acto do aviso, tendo-se em vista o tempo necessario para executar os trabalhos exigidos.

Art. 50.° Se o contraventor deixar, no todo ou em parte, de obedecer ao aviso a que se refere o artigo anterior, o inspector de engenharia ou o seu delegado procederá ao levantamento do auto de contravenção, remettendo-o em seguida ao agente do Ministerio Publico na respectiva comarca, a fim d'este promover immediatamente o embargo suspensivo dos trabalhos que importam contravenção, e todo o outro procedimento judicial que houver logar.

Art. 5l.° Sempre que, para o levantamento de um auto de contravenção, for necessario entrar num predio vedado, negando-se o proprietario a dar o seu consentimento, o inspector de engenharia ou o seu delegado, a quem incumbe o levantamento do auto, solicitará da auctoridade administrativa as necessarias providencias para fazer cessar a opposição.

Art. 52.° O auto de contravenção faz fé em juizo pelos factos a esta relativos, competindo ao contraventor apresentar prova em contrario.

Art. 53.° Logo que o inspector de engenharia tiver conhecimento official de haver sido definitivamente julgado um processo de contravenção, mandará avisar o contraventor para o immediato cumprimento da respectiva sentença.

§ 1.° Se o contraventor se negar a demolir, nos termos da sentença, os trabalhos que a motivaram, o inspector de engenharia requisitará do agente do Ministerio Publico que promova pelo juizo competente que lhe seja dada execução, podendo ser empregado na demolição o pessoal seu subordinado, e recorrendo-se pelas vias legaes ao emprego da força publica, se necessario for.

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§ 2.º As custas do processo do contravenção, bom como as despesas feitas com quaesquer demolições ou mais trabalhos necessarios para a fazer cessar, serão a cargo do contraventor.

Art. 51.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão, 8 de abril de 1902. = José Nicolau Raposo Botelho = Alberto Botelho - João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira = A. Rodrigues Ribeiro - Carlos Alberto Soares Cardoso - José Maria de Oliveira Simões. - Alfredo Mendes de Magalhães Carvalho - Alfredo de Albuquerque = Ernesto Nunes da Costa e Ornellas - Alexandre José Sarsfield = José Jeronymo Rodrigues Monteiro.

N.º 5-I

Senhores. - Renovamos a iniciativa da proposta de lei n.° 22-N, apresentada na sessão de 15 de março de 1901, e que diz respeito á servidão dos terrenos adjacentes ás fortificações e ás fabricas, paioes e depositos de polvora e outros explosivos de guerra.

Secretaria do Estado dos Negocios da Guerra, 23 de janeiro de 1902. - Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro - Luiz Augusto Pimentel Pinto - Manuel Francisco de Varqas.

N.º 22-N

Senhores. - A presente proposta de lei pouco mais é do que a renovação de iniciativa de outra que em 1897 chegou a ter a approvação da commissão de guerra da Camara dos Senhores Deputados.

A experiencia demonstrou que o decreto de 10 de janeiro de l895, que veiu, aliás, dar satisfação a uma imperiosa exigencia da legislação militar moderna, com relação ao onus de servidão dos terrenos adjacentes ás fortificações e ás fabricas, paioes e depositos de polvoras e outros explosivos de guerra, carecia do ser modificado, para melhor se estabelecerem regras fixas que acautelassem e definissem os direitos do Estado e os interesses dos proprietarios circumvizinhos das fortificações e estabelecimentos militares.

Ora, a experiencia que aconselhou a apresentação da proposta de lei de 1897, que não chegou a ser convertida em lei do Estado, é a mesma que hoje me conduz a submetter á vossa apreciação a presente proposta, depois do reflectidamente estudada pela commissão das fortificações do reino, e de feitas as alterações que a mesma commissão julgou necessario introduzir e com as quaes plenamente concordei.

Com a presente proposta de lei procura-se attenuar, tanto quanto possivel, e dentro dos limites impostos pelo direito de defesa do país, o ónus de servidão dos terrenos comprebeudidoH nas zonas estabelecidas, facilitando vedações, permittindo explorações de pedreiras, saibreiras, construcções em determinadas circumstancias e todas as plantações de que não resulte prejuizo para os pontos fortificados.

Por estas razões, senhores, tenho a honra de submetter ao vosso esclarecido exame a seguinte proposta de lei:

É identica ao projecto de lei publicado a pag. 18.

Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra, em 15 de março de 1901. - Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Luiz Augusto Pimentel Pinto. - Manuel Francisco de Vargas.

O Sr. Dias Ferreira: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a mesa umas emendas ao projecto que está em discussão, as quaes não importam prejuizo nem para o orçamento nem para o Estado, e visam apenas a livrar de grandes vexames os proprietarios vizinhos dos fortes militares.

Não posso concordar com o projecto, nem nos principios, nem nos fundamentos, e para deixar bem assentuadas as minhas opiniões precedo de alguns considerandos as referidas propostas.

Como já tive occasião de dizer nesta assembleia, ha bem poucos dias desde que reconhecem a constituição e as leis o direito de propriedade em toda a sua plenitude, não tem o Governo competencia, nem pelo Ministerio da Guerra nem por qualquer outro Ministerio, para demarcar lima zona de servidão, ou seja 3 kilometros ou tres metros, restringindo o direito de propriedade, sem indemnização previa do proprietario.

Pelos processos e pelos principios do Governo podem amanhã ser espoliados, os proprietarios vizinhos dos fortes, de todos os direitos que constituem a propriedade plena.

Sei a facilidade com que nas diversas repartições do Estado se legisla sobre o direito de propriedade.

No Ministerio da Fazenda, Repartição das Alfandegas, bastou uma simples portaria para constituir servidão na propriedade alheia!

Na proposta pendente basta lançar os olhos para o § unico do artigo 1.° para ver como o proprietario pôde ser desapossado sem mais cerimonia do propriedades, que estejam ha longos annos na sua posse e na de seus antepassados, simplesmente por falta de titulo escrito!

Ainda se comprehendia a disposição do decreto de 1895 que não deixava prevalecer a posse, por mais longa que fosse, sobre o direito do Estado ás propriedades por elle adquiridas quando se construisse a fortificação.

Mas essa disposição foi supprimida.

É melhor substituir outra vez a substituição, sob pena de se consummar um grave attentado contra a propriedade particular. Desde que não temos registo do dominio obrigatorio senão no Ultramar, é um perigo estabelecer a presumpção legal da posse a favor do Estado.

As difficuldades com que luta o proprietario, vizinho de uma fortificação, não apenas compensadas com a gloria da vizinhança!

No meio de tudo ninguem é mais transigente do que eu, que aliás sou adversario á outrance de um projecto que sem indemnização previa espolia o cidadão do seu direito de propriedade.

Na lei allemã não ha nem pode haver cousa parecida com o systema da proposta.

Este systema é nosso e só nosso!

Então na Trafaria, com um desnivelamento de 80 a 90 metros entre a povoação ou os terrenos a povoar e o forte, só no vexame dos cidadãos pode fundar-se semelhante servidão!

O cidadão, dentro da zona de 3 kilometros do forte, se quiser fazer um rego, ou abrir um poço, ou simplesmente pôr uma nora em poço já aberto para tirar agua de beber, não lhe basta ser dono da propriedade. Ha de pedir licença para estas insignificantes e inoffensivas obras, e ha de pedi-la á auctoridade militar!

Emdim, como já noutro dia tive occasião de dizer, até as nossas prerogativas parlamentares estão á mercê do Ministerio da Guerra, porque nem um caminho de ferro approvado por lei pode ser construido sem o beneplacito do commandante do forte!

A auctoridade militar do forte numa zona de 3:000 metros é mais um poder do Estado, e superior a todos os outros poderes politicos que a Constituição reconhece.

A exigencia da certidão da Conservatoria e da matriz predial para verificar se as construcções podem prejudicar a defesa de uma praça de guerra, é unicamente ditada pelo appetite de incommodar o proprietario vizinho! Agora o Ministerio da Guerra até exige plantas para edificações, como as camaras municipaes; e o proprietario fica sem saber o que ha de fazer quando não for aprovada a mesma planta pelas duas entidades officiaes!

Até aqui eram as camaras municipaes quem fixava as condições de construcção das propriedades urbanos e as fiscalizava depois. Agora tambem o Ministerio da Guerra, se mette nestes actos de administração municipal!

E se uma for a planta approvada, pela Camara Munici-

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pal e outra a planta approvada pelo Ministerio da Guerra, o que se faz?

O que se faz é ficar o proprietario sem casa e sem dinheiro!

Assim, para o caso de ficarem de pé os attentados consignados no parecer contra o direito de propriedade, peço ao Governo que ao menos seja humano na pratica d'esses attentados, já com isso terá prestado relevante serviço ao país. (Apoiados).

Nesse intuito mando para a mesa as minhas propostas:

«Considerando que a constituição da servidão militar, que hoje vae até 3 kilometros como pudera ir amanhã até 30, sem previa expropriação e indemnização do proprietario, representa um ataque ao pacto fundamental da nação e aos direitos individuaes dos cidadãos portugueses;

Considerando que a servidão militar, especialmente nas margens do Tejo, no districto de Lisboa, não sendo restricta ás necessidades da guerra, prejudica fundamentalmente o desenvolvimento da propriedade urbana com gravissimo damno para a economia publica, porque sujeita os proprietarios a prejuizos perpetuos para casos de guerra externa que não ameaçam a nossa nacionalidade, e sem utilidade real para o Estado, porque nem as fortificares podem com o ataque externo feito pela artilharia moderna nem as taes edificações resistiriam minutos á demolição;

Para o caso, porem, de vingar o projecto em discussão, proponho o seguinte:

Artigo 1.° A ninguem é permittido construir plantas ou fazer quaesquer movimentos de terra dentro da zona das fortificações, sem o participar ao commandante do forte.

Art. 2.° Se a obra dever ser absolutamente reprovada, ou puder ser auctorizada com condições, o commandante fará no primeiro caso intimar o participante para que desista da obra, e dará no segundo licença para os trabalhos mediante planta com previa assignatura do termo em que o participante se obrigue a cumprir essas condições.

Art. 3.° Na concessão da licença a nenhuma outra circunstancia a auctoridade militar pode attender alem das necessidades da guerra. = Dias Ferreira».

Foi admittida.

O Sr. Ministro da Guerra (Pimentel Pinto): - O Sr. Dias Ferreira vota, em principio, contra o projecto em discussão, por entender que os inconvenientes que resultam para o proprietario, vizinho das fortificações, não são sufficientemente compensados pela honra d'essa vizinhança. Neste ponto estou perfeitamente de acordo com S. Exa.; mas, pense-se bem, que não se trata de estabelecer cousa nova: o projecto trata de definir até onde vae o direito do proprietario e onde começa o direito do Estado. (Apoiados}.

Disse tambem S. Exa. que não pretende que o Ministro lhe responda; mas sim apenas que as suas propostas de emenda sejam attentamente ponderadas pela commissão de guerra e pelo Ministro. Posso affirmar a S. Exa. que as propostas que S. Exa. mandou para a mesa hão de ser vistas não só com attenção, mas até com especial boa vontade, na parte em que ellas se referem ao direito de propriedade, assumpto era que S. Exa. tem auctoridade e competencia especial, como jurisconsulto distinctissimo, que é. (Apoiados).

Serão, examinadas com a merecida attenção e desejo de acertar, para que na lei não fique qualquer disposição que offenda os direitos dos proprietarios, cerceando-os ainda alem do que é justo e necessario exigir. (Apoiados).

Mas, para que a Camara veja tambem que o Sr. Dias Ferreira na sua argumentação feriu a nota do exagero, attribuindo ao projecto defeitos que não tem, permitta-me V. Exa., Sr. Presidente, que eu recorde á Camara as palavras de S. Exa. que acabei de ouvir.

S. Exa. disse que nem uma simples roseira podia o proprietario plantar na sua propriedade sem auctorização ou permissão do governador da praça ou fortificação!

Ora, Sr. Presidente, para que se veja até onde vae o exagero, e é conveniente dizel-o para que se não supponha que este projecto não foi visto, não foi pensado por pessoa alguma, nem pelo Ministro da Guerra que o trouxe ao Parlamento, nem pelas commissões que sobre elle deram parecer este anno, como já o tinham dado o anno passado, eu vou ler o que está escrito no artigo 8.° do projecto, aquelle onde estão definidos expressamente os onus mais violentos impostos ao proprietario.

Trata-se neste artigo dos onus impostos na primeira zona exterior e na zona interior de servidões.

Diz-se nelle o seguinte:

«a) Fazer construcções subterraneas com excepção das galerias de mina a que se refere a alinia a) do artigo 9.°»

Plantar uma roseira é fazer uma construcção subterranea?

«b) Fazer construcções enterradas, quer descobertas quer cobertas, com excepção de fossos, tanques para lavagem e depositos de agua para rega a que se refere a alinia b) do artigo 9.°»

Plantar uma roseira é fazer uma construcção enterrada?

«c) Fazer extensos aterros ou escavações, taes como vallados, vallas, diques, fossos, canaes de irrigação ou navegaveis, com excepção dos vallados e vallas a que se refere a alinea e) do artigo 9.°»

Plantar uma roseira é fazer extensos aterros?

São estes os mais pesados onus que por este projecto se impõem ao proprietario, limitados á primeira zona exterior e á zona interior de servidão.

A Camara não pode deixar de reconhecer que o illustre Deputado exagerou os rigores do projecto, dizendo que por elle é prohibido plantar uma roseira!

Digo isto unicamente para que se não supponha que antes de trazer ao Parlamento este projecto, o Ministro tinha enlouquecido ou que a commissão de guerra da Camara dos Senhores Deputados, a d'este anno e a do anno passado, eram capazes de dar um parecer sobre um facto tão absurdo, como seria o de prohibir o proprietario de plantar uma roseira!

Termino, por aqui, as minhas considerações por não ser preciso dizer mais nada, desde que estou de acordo em acordo em que as propostas de S. Exa. sejam submettidas á commissão de guerra e desde que eu asseguro a S. Exa., com a certeza de não me enganar, que, a commissão, sob o ponto de vista em que S. Exa. tem auctoridade especial, que é a juridica, ha de procurar acceitar as suas propostas em tudo quanto possa ser para beneficio dos proprietarios e melhoramentos do projecto.

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vae ler-se o artigo para se votar.

O Sr. Rodrigues Monteiro: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que o projecto em discussão seja votado independentemente das emendas que serão enviadas á commissão. = José Jeronymo Rodrigues Monteiro.

Approvado este requerimento, foram successivamente lidos e approvados todos os artigos do projecto.

O Sr. Sergio de Castro: - Mando para a mesa a ultima redacção ao projecto n ° 49.

O Sr. Presidente: - A primeira sessão é na sexta feira de manhã, sendo a primeira chamada ás 10 1/2 horas e a segunda ás 11. A ordem do dia é mesma que estava dada e mais os projectos n.ºs 9, 14, 15, 17, 21, 22, 23, 25, 28, 29, 30, 31, 32, 34, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 44,

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47, 48, 51, 52, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 6O, 61, 62, 63, 64, 65 e 67.

Está encerrada a sessão.

Eram 2 horas e 10 minutos da tarde.

Documentos enviados para a mesa nesta sessão

1.° Da Camara Municipal do concelho de Proença-a-Nova, districto de Castello Branco, pedindo que não seja approvada a proposta de lei n.° 19-D, na parte em que dispõe que sobre as taxas do real de agua não poderão incidir percentagens dos corpos administrativos.

Apresentado pelo Sr. Deputado João Pinto dos Santos, enviado á commissão de fazenda e mandado publicar no Diario do Governo.

2.º De varios photographos, pedindo que não sejam triplicados os direitos de importação das chapas do vidro sensibilizadas para photographia.

Apresentado pelo Sr. Deputado Anselmo Vieira, enviado á commissão de fazenda e mandado publicar no Diario do Governo.

3.° Da Camara Municipal de Castello de Vide, contra a proposta de lei n.º 20-D, que prohibe a plantação e replantação da vinha no continente do reino.

Apresentado pelo Sr. Deputado Lourenço Cayolla, enviada á commissão de agricultura e mandado publicar no Diario do Governo.

4.º Do syndicato agricola de Castello de Vide, pedindo que não seja approvada a proposta que prohibe a plantação da vinha durante tres annos.

Apresentado pelo Sr. Deputado Lourenço Cayolla, enviado á commissão de agricultura e mandado publicar no Diario do Governo.

5.º Da liga dos lavradores do Douro, pedindo profundas modificações na proposta que regula o commercio de vinhos nas provincias portuguesas em Africa, e contra a proposta que prohibe a plantação da vinha durante tres annos.

Apresentado pelo Sr. Deputado Henrique Kendall, enviado á commissão de agricultura e mandado publicar no Diario do Governo.

6.° Da Associarão Commercial dos Lojistas de Lisboa, pedindo que não seja approvado qualquer acordo no convenio, que exceda as forças do Thesouro.

Apresentado pelo Sr. Deputado Veiga Beirão, enviado á commissão de legislação civil e mandado publicar no Diario do Governo.

7.° Da Junta de Parochia da freguesia de S. Tiago da villa do Entrados, pedindo para continuar a pertencer á Camara de Almodovar e não á de Ourique.

Apresentado pelo Sr. Deputado Ravasco, enviada á commissão de legislação civil e mandado publicar no Diario do Governo.

8.º Da Camara Municipal do Barreiro, pedindo que não seja approvada a proposta de lei do Sr. Ministro das Obras Publicas na parto que prohibe a replantação das vinhas.

Apresentado pelo Sr. Deputado Dias Ferreira, enviado á commissão de agricultura e mandado publicar no Diario do Governo.

9.° Da Camara Municipal do concelho de Alcochete, contra a proposta de lei do Sr. Ministro das Obras Publicas na parte que prohibe a replantação das vinhas.

Apresentado pelo Sr. Deputado Dias Ferreira, enviado á commissão de agricultura e mandado publicar no Diario do Governo.

Participações

Participo á Camara que lancei na caixa das petições um requerimento em que noventa e oito habitantes da freguesia de S. Miguel de Machado, concelho de Evora, pedem a isenção do pagamento de contribuição de registo pelo aforamento de 208 courelas de l hectare cada uma na herdade da Toura. = Marianno Prezado.

Para a acta.

Declaro que lancei na caixa das petições um requerimento em que o ex mestre de musica do regimento de infantaria n.º 6, Pio Isaac Lhansol, pede melhoria de reforma. = O Deputado, Alfredo de Albuquerque.

Para a acta.

Declaro a V. Exa. e á Camara que lancei na caixa das petições um requerimento de D. Maria Angelina Parrella de Brito, pedindo que lhe seja concedida a sobrevivencia na pensão de sua fallecida mãe. - Jayme Arthur da Costa Pinto.

Para a acta.

O redactor = Affonso Lopes Vieira.

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