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Discurso que devia ler-se na sessão n.° 13 d'este vol. pag. 191, col. 1.º, lin. 68.

0 sr. Victorino de Barros: — Sr. presidente, na presença das poucas explicações do sr. ministro, as quaes por nenhum modo me satisfizeram, vejo que o governo vae já em debandada n'esta questão.

O nobre ministro do reino acaba de observar que é este o primeiro motivo que tem para proceder ás mais minuciosas averiguações ácerca de um assumpto altamente importante e momentoso, que não só interessa todo o paiz, mas interessa principalmente o Douro e a agricultura da mais importante producção d'este paiz, que é o vinho do Douro.

Sr. presidente, ainda bem que a minha proposta foi o primeiro motivo para que o nobre ministro se explicasse a este respeito, porque disse s. ex.ª nenhuma corporação, nenhum individuo tinha representado sobre o objecto; mas note o governo e note a camara que estão representando agora n'este assumpto importantissimo todos os deputados da localidade, com quanto pertençam aos differentes lados d'esta camara, o que quer dizer que esta questão não é politica; e aproveitarei esta occasião para declarar que esta minha proposta não tem nenhum intuito politico, como o governo lhe quer attribuir, nem foi concertada lá fóra como acontece a outras que os amigos do governo frequentemente aqui apresentam. Felicito-me por ler feito e conseguido com que os meus illustres collegas do paiz vinhateiro do Douro possam ter verificado a sua interpellação na qual requeri para tomar parte logo que entrei n'esta casa em que eramos igualmente empenhados. Ha dois mezes que esta interpellação se tinha annunciado, e cerca de um que eu a linha renovado; mas, sr. presidente, se não fôra esta minha proposta tarde ou nunca a interpellação se verificaria.

Ora, sr. presidente, bastara tu ler conseguido isto para já ficar satisfeito, porque ao menos fica sabendo o paiz quaes as opiniões, desejos e votos dos deputados interpellantes, quaesquer que sejam as ulteriores resoluções do sr. ministro de reino, a respeito d'este gravissimo assumpto, o qual a camara tomou na devida consideração e altura pela benevolencia e justiça com que votou a urgencia da minha proposta.

Sr. presidente, tenho visto que as interpellações em geral são uma conversa, muitas vezes previamente ajustada entre os srs. deputados e ministros; porém esta, pelo seu elevado alcance, não podia ser assim. Era mister que o sr. ministro do reino désse explicações cathegoricas que podessem realmente satisfazer aos srs. deputados interpellantes e a camara, mas vê se que o sr. ministro não as deu ainda nem as póde dar, sem que justifique as portarias de 4 e 5 de dezembro; porém isso é o que duvido que o governo possa satisfactoriamente fazer, masque muito desejára ella fizesse por modo que não prejudicasse o credito dos vinhos do Douro.

Sr. presidente, as providencias adoptadas pelo nobre ministro do reino em portarias de 4 e 5 de dezembro, são altamente inconvenientes e inutilmente vexatorias ao commercio e agricultura dos vinhos do Douro. Eu faço justiça ao nobre ministro, porque fa-la-ía a qualquer outro cavalheiro que estivesse no logar de s. ex.ª, de que os seus intuitos foram nobres e elevados; os intuitos de s. ex.ª não podiam ser outros senão livrar os vinhos da colheita de 1857 do stygma de envenenados, stygma que boatos falsos lhe tinham imprimido

Mas antes de verificar a minha interpellação, peço licença ao nobre ministro, e espero que me attenda, para lhe dirigir algumas perguntas. S. ex.ª não me presta attenção? Esperarei que acabe de conversar para continuar. (Pausa) Permitta-me o illustre ministro que lhe dirija algumas perguntas, ás quaes ouso esperar s. ex.ª responderá satisfactoriamente. Como estas medidas propostas pelo nobre ministro dizem respeito principalmente ao ramo de administração sanitária, de que s. ex.ª é o primeiro chefe, porque, pelo que diz respeito á parte administrativa, não era a s. ex.ª a quem este negocio pertencia, mas sim ao nobre ministro do commercio e agricultura, e não concebo como na adopção d'estas medidas s. ex.ª se não associasse ao nobre ministro do reino; mas como estas providencias são essencialmente sanitarias, pergunto se o conselho de saude publica fui ouvido na adopção d'ellas, e tendo-o sido, qual o seu conselho ou opinião. Peço mais ao nobre ministro do reino que lenha a bondade de dizer quaes são as informações officiaes ou não officiaes que levaram s. ex.ª á adopção d'estas medidas, porque este ponto, aliás já igualmente tocado pelos illustres deputados que me precederam, parece-me que ainda não foi satisfeito por s. ex.ª

Ainda outra pergunta eu queria fazer, mas a essa já s. ex.ª satisfez; era a cifra de vinho que tinha sido analysado no Porto, e em virtude d'essa analyse, qual o que tinha sido achado tratado pelo protoxido de chumbo. A este respeito leu s. ex.ª uma participação, que mostra que tinham tido analysadas tres mil pipas, e cento e dezenove pequenas vasilhas, e que em toda esta porção de vinho analysado não se tinham achado vestigios das fezes de oiro. Foi então que eu disse por essa occasião á camara = ouçam = e disse-o, sr. presidente, porque estas declarações officiaes de s. ex.ª provam exuberantemente que é falso e destituido de base, como logo demonstrarei, o supposto envenenamento dos vinhos da colheita de 1857, que serviu de fundamento a estas providencias. Ainda uma outra pergunta dirijo a s. ex.ª, e é: quaes as medidas que s. ex.ª está resolvido a tomar n'este negocio, visto que muitos dos deputados da localidade do paiz vinhateiro do Douro unanimemente reclamam contra estas providencias; e impossivel que s. ex.ª não responda a isto.

Sr. presidente, este negocio tem uma historia, e historia que se traduz toda em factos. O desgraçado paiz vinhateiro do Douro, vendo-se ha quatro annos privado da sua quasi exclusiva producção, começou de ensaiar os enxoframentos das suas vinhas, na esperança de lerem algum vinho; porém a maior parte dos lavradores ainda o anno passado não enxofraram, muitos d'elles por não podérem, outros porque descriam da efficacidade do enxofre, e outros, até, porque reputavam que o enxoframento prejudicava as vinhas; póde dizer-se que apenas se fizeram limitados ensaios, sendo a maior parte d'elles feitos em epochas e por fórma menos conveniente, e regular; por isso é que o enxofre não deu o resultado que devia dar, se a operação do enxoframento se fizesse de um modo mais conveniente e methodico, como é de esperar se fará este anno. Ora eis-aqui um facto que espero não será contestado, isto é, que foram poucos os enxoframentos.

Ainda outro facto. Nem todos os vinhos enxofrados desenvolveram o mau sabor e cheiro do enxofre; a maior parte dos vinhos abafados, ou que não tinham passado pela fermentação alcoolica nenhum cheiro e sabor tinham ao enxofre, e entre aquelles mesmos que fermentarem, alguns houve quo igualmente nenhum gosto e cheiro tinham ao enxofre. Portanto não só a operação da enxofração das vinhas foi muito limitada, mas ainda nem todos os vinhos de uvas enxofradas tinham o sabor e cheiro do enxofre; e a prova de quo os vinhos enxofrados serviam para o commercio é que exportadores e especuladores os compraram quasi todos no acto da vindima sem que a condição de enxofrados ou não enxofrados influisse no seu preço, o que mostra a convicção e certeza que a maior parte já tinham de que os vinhos perdiam esse mau gosto e cheiro do enxofre sem ser preciso recorrer ás taes fezes de oiro ou a qualquer outro reagente chimico venenoso.

Fallo n'isto mais circumstanciadamente, para mostrar o nenhum fundamento que tiveram as rigorosas providencias das portarias de 4 e 5 de dezembro, e porque me julgo habilitado a dar estes esclarecimentos á camara, porque alem de ser lavrador do Douro, posto que pequeno, vivo no Peso da Regua, metropole do paiz vinicola do Douro, onde tive occasião de bem compulsar todas estas cousas.