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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

d'esta minha convicção, offereço-vos, com a devida venia, o que já disse no relatorio, em 25 de maio de 1866, quando apresentei o projecto que tem o n.º 118; é o seguinte:

«Senhores. — A lei de 15 de julho de 1862 denomina estradas reaes directas as que partirem, de Lisboa para as capitães dos districtos administrativos e para os pontos principaes da fronteira, quer essas estradas comecem em Lisboa, quer partam de algum caminho de ferro que as ponha em communicação directa com a capital do reino.

«Denomina estradas reaes transversaes as que ligarem as capitães dos districtos e os pontos principaes da fronteira e do litoral entre si.

«Foi uma medida de occasião e de certa conveniencia para o paiz em geral, porque era preciso assentar e definir quaes estradas ficavam a cargo do governe, quaes a cargo dos districtos, quaes a cargo dos municipios; mas uma medida de injustiça relativa pelas rasões diversas e especiais que se davam da provincia a provincia, de districto a ditricto, pois se nem todos tinham caminhos de ferro, nem portos de mar que servissem da base para d'elles partirem, ou n'elles terminarem as estradas geraes directas ou transversaes, parece-me claro que as provincias e os districtos do litoral, e os que ja têem caminhos de ferro, tinham de ficar, nem podiam deixar da ficar, muito mais favorecidos do que as provincias e os districtos em que não havia uma nem outra cousa.

«Aonde estão, por exemplo, em Traz os Montes e na Beira Baixa os caminhos de ferro e os portos de mar que servissem de base á partida ou ao terminus das estradas reaes? Ainda ninguem os viu

«Tinham, é verdade, terras principaes da fronteira, mas aonde está a bitola para aferirmos o que eram terras principaes ou não principaes?

«De sorte que ha provincias que têem caminhos de ferro, portos de mar e terras principaes da fronteira; ha provincias que têem sómenta portos de mar e terras principaes da fronteira; ha provincias que têem só pertos de mar; e outras apenas terras da fronteira, principaes, ou não principães? Não sei.

«Sei, todavia, que foi d'esta base anomala e injusta que nasceu a classificação e tabellas das estradas reaes, districtaes e municipaes! E d'aqui derivou o beneficio com que umas provincias form attendidas, e a injustiça com que outras foram desconsideradas.

«Por outro lado a classificação das estradas foi feita quando a viação estava muito adiantada em algumas provincias e atrazadissima em outras! Isto é, depois da termos feito, em algumas provincias e districtos, caminhos de ferro, estradas reaes, districtaes e municipaes á custa do cofre geral do estado, fazemos a classificação e tabella geral das estradas reaes; démos a algumas provincias as poucas estradas a que lhes dava direito a base estabelecida; e dissemo-lhes —tudo que não for isso são estradas districtaes e municipaes, e hão de ser feitas á vossa custa! Mais claro ainda; vós tendes concorrido para os caminhos de ferro, estradas reaes e districtaes das outras provincias; nós tambem concorremos, (lá para as kalendas gregas) para algum caminho de ferro que porventura vos seja decretado, e para essas poucas estradas reaes que vos são concedidas; mas a vossa viação districtal e municipal, essa fazei-a vós, se a quizerdes ter, porque os outros districtos não têem nada com isso. Eis aqui o que está o que resulta da injustiça que presidiu á confecção da tabella geral das estradas reaes, no estado em que estavam as cousas quando se fez.

«E como se de uma base tão anomala, como a que serviu para a classificação da viação publica, não resultasse uma desigualdade sufficientememte revoltante, deixando-se a cargo de estado todas as estradas que n'aquelle tempo estavam em construcção, embora devessem ser classificadas como districtaes ou municipaes; e como se isto não fosse beneficio bastante para os districtos favorecidos, tem-se pegado nas verbas votadas para as entradas districtaes e municipaes de todo o reino, e feito com ellas estradas municipaes ás povoações privilegiadas para as ligar com os caminhos de ferro.

«Sei que podem dizer-me que eu, como membro da commissão de obras publicas e da camara electiva, concorri para essa injustiça; concorri de certo; mas venho hoje contricto e arrependido, entoar o penitet me peccati.

«Concorri, mas não sem ponderar no seio da commissão a injustiça da base escolhida para a classificação.

«Concorri, mas não sem propor aos meus collegas, que os rios navegaveis fossem equiparados ao litoral, para ponto de partida das estradas; o que tornava a base mais ampla, mais igual e menos injusta.

«Concorri, mas não sem ponderar a injustiça que resultava em favor dos districtos e provincias que tinham a viação mais adiantada, e contra aquellas que a tinham mais atrazada.

«Concorri, porque, como disse se principio d'este relatorio, era preciso adoptar uma base; e porque os meus collegas da commissão me fizeram reconhecer, como o honrado ministro, os inconvenientes de se fazer n'aquella occasião qualquer alteração nas bases propostas pelo governo; e alem d'isto porque me ficava, e a todos, o direito de iniciativa para propor nova classificação de estradas como fosse justo.

«É usando d'este direito, senhores, que venho hoje fallar-vos em favor da provincia transmontana, que foi a mais prejudicada de todas com a classificação feita em 1862, deixando-se-lhe para serem feitas como districtaes estradas na extensão de mais de 1:100 kilometros, cuja construcção importará em cifra superior a 4.000:000$000 réis, e alem d'estas todas as estradas municipaes que pelo pouco custarão 2.000:000$000 réis!

«Eis aqui, senhores, o que e deixou a cargo da pobre provincia transmontana; não por vontade do governo ou do parlamento, de certo, mas em consequencia da pouco justa base que se adoptou para a confecção da lei de 15 de julho de 1862.

«Senhores, se as provincias que têem portos de mar precisam de estradas para a communicabilidade de seus habitantes, para proteger a sua agricultura, o seu commercio, a sua industria, o que diremos das provincias que não têem portos de mar, esses elementos de prosperidade para os povos confinantes com elles, ou que d'elles se podem utilisar! São de certo as provincias a que faltam portos de mar as que têem mais urgente precisão de uma viação facil e em mais larga escala; no entanto têem ellas sido as menos consideradas, e offereço-vos para exemplo a provincia de Traz os Montes que quasi nada tem, e bem pouco se lhe promette, pela injustiça resultante das bases escolhidas para a classificação das nossas estradas.

«É mister pois, que, conhecendo as forças dos districtos e dos municipios, alarguemos o mappa das estradas reaes e encurtemos o das districtaes e municipaes; deixando a cargo do districto e do municipio sómente as estradas que estiverem em harmonia com as suas possibilidades, porque só assim, e depois bem definido o que a cada um cumpre fazer, e de estabelecida uma justa proporcionalidade de protecção governativa entre todos os districtos do reino, poderá ser proficua a acção do districto e do municipio, applicada aos melhoramentos de viação.»

Eram já estas as minhas convicções e as dos meus amigos, os srs. Augusto Cesar Falcão da Fonseca, Joaquim Pinto de Magalhães e José de Moraes Faria de Carvalho, em maio de 1866, quando sobre um projecte quasi identico ao que venho offereçer-vos, e que elles honraram com a sua assignatura, eu escrevi o relatorio supra.

Mais firme ainda na minha antiga convicção, insisto na obrigação que tem o estado de dar á região vinhateira do Alto Douro o que lhe é devido; isto é, o caminho de ferro e as estradas ordinarias que lhe são indispensaveis para a sustentação da sua custosissima industria agricola; insisto