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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

trabalhar na constituição que depois se publicou em 1838; mas a commissão que apresentou o projecto das modificações que deveriam fazer-se na constituição de 1822 e na carta, não attingiu logo todo o remedio conveniente sobre o ponto que hoje se questiona, apesar de ser composta de nomes muitos respeitaveis, como eram é barão de Sabrosa, Derramado, Castro Pereira, conde da Taipa, Leonel, José Liberato, Julio Gomes, etc..

Pois no artigo 141.º propunha a mesma distincção do artigo 137.° da carta, acautelado todavia com o final do artigo 224.° da constituição de 1822: «Faltando o dito estabelecimento ou confirmação, cessa a obrigação de pagar».

A discussão e a reflexão apuraram melhor á obra. Viu-se que n'um paiz, onde as contribuições indirectas, abrangendo os redditos das alfandegas e varios outros artigos, constituem á melhor parte dos rendimentos publicos, não podiam considerar se permanentes, ficando como á disposição do poder executivo, sem que os representantes da nação lhes podessem pôr o seu veto annual, quando isso lhes fosse preciso para obrigar aquelle poder a conter-se dentro dos rasoaveis limites do interesse publico, e a prestar-se á discussão do orçamento e exame das despezas publicas, e a conformar se com todas os alterações, ou modificações tributarias e legislativas, que os representantes da nação considerassem uteis; reflectiu se tambem, que a verdadeira protecção do credito publico só podia derivar-se da boa e regular administração da fazenda publica, e que a ingerencia efficaz dos procuradores da nação para fiscalisar e providenciar definitivamente sobre todos os rendimentos publicos, infundiria muita mais confiança nos credores do estado, do que a esteril permanencia das contribuições directas ou indirectas consignadas para os mesmos credores; e então votou-se com firmeza o que se acha consignado nos artigos 131.° e seguintes da constituição de 1838.

Poucos annos se conservaram em vigor aquellas saudaveis disposições, porque a reacção bem depressa fez substituir á constituição o systema da carta; mas não tardaram tambem os mesmos abusos e embaraços, anteriores á revolução de setembro, e, cousa bem singular! não tardou que a opinião publica se apresentasse de novo irritada, e que desfechasse na revolução de 1845, que produziu as lutas e os estragos que todos conhecem; e se não fossem as protecções amigaveis de governos estranhos, e a dedicação profunda de alguns chefes, sabe Deus que desastres teria soffrido a dynastia?!

A reacção triumphante Apresentou em seguida a 1847 quasi os mesmos abusos e desatinos, que já tinham produzido duas revoluções! e como ás mesmas causas se seguem ordinariamente os mesmos effeitos, não tardou que em 1851 viesse uma terceira revolução para ver se punha cobro ás causas de tanta desordem.

Os legisladores mais consciencioso d'essa epocha julgaram então dever apresentar entre as outras providencias do acto addicional, o restabelecimento do artigo 131.° e seguintes da constituição de 1838, que foi quasi litteralmente transcripto no artigo 12.° e seus §§, e desde então ficou esta camara armada de um remedio efficaz, e de facil execução para obstar indirectamente aos abusos do poder executivo, ou ás imprudencias do poder moderador, quando quizesse obstinar-se em subtrahir-se á discussão das leis tributarias, e ao exame do orçamento, etc.; porque á camara dos deputados, não lhe auctorisando a cobrança dos impostos, deixa-o impossibilitado de governar, e se elle quizer precipitar-se fôra da orbita constitucional, terá de lutar com a resistencia legal dos contribuintes e dos tribunaes, que em poucos dias lhe quebrantarão toda a força!

Assim, fazendo esta camara uso das armas e das defezas que o acto addiconal lhe confere no artigo 12.°, pelo simples facto negativo de não approvar a auctorisação para a cobrança dos impostos e applicação das despezas, (facto em si facillimo, e inteiramente dentro das suas attribuições; porque como poder independente ninguem lhe póde determinar como e de que modo ha de resolver), vem, pela necessaria consequencia d'essa faculdade, a estorvar que o poder executivo ou moderador, se ache em circumstancias de realisar a dissolução, ou qualquer outra providencia, que embarace a discussão do orçamento ou algumas outras medidas, reclamadas pela opinião publica — estorvo indirecto mas providencial, que resulta das difficuldades ou impossibilidades legaes, em que o poder moderador não póde legalmente precipitar-se, porque lh'o veda a mesma lei fundamental de que se deriva todo o seu poder.

O sr. Presidente: — Peço licença ao sr. deputado para lhe observar, que as explicações só podem ter logar em nora de prorogação de sessão.

O Orador: — Sr. presidente, eu não estou a dar explicações, estou a fallar e a discutir sobre o artigo 8.°, para restabelecer as verdadeiras doutrinas constitucionaes; se me não tivessem transtornado a palavra, que tinha pedido sobre á generalidade do projecto, e estava proxima a chegar-me, já teria feito as demonstrações da verdadeira doutrina, como prometti quando teve logar a interrupção que fiz ao sr. presidente do conselho, agora estou discutindo sobre o artigo 8.° na especialidade: podia reservar-me para explicações na hora de prorogação; mas se mé compete o direito de o fazer n'este ponto, discutindo o artigo 8.°, que v. ex.ª poz em discussão na especialidade, peço que me permitta a continuação, que eu forcejarei quanto possivel por abreviar.

Para que fizeram os legisladores de 1851 este artigo 12.° do acto addicional, alterando e reformando os artigos da carta? Não foi senão para consignarem uma garantia efficaz, com que esta camara e o poder legislativo se defendessem contra qualquer excesso, ou procedimento menos conveniente dos outros poderes. D'aqui deriva se claramente, que a camara póde não approvar á lei de meios; creio, que ninguem lhe poderá disputar este poder; porque ella é independente e nenhum poder do estado a póde obrigar a fazer o que ella entender, que não é de interesse publico fazer-se, ou a resolver n'este ou n'aquelle sentido. D'este poder de não approvar a lei de meios, deriva se o poder de estudar indirectamente, que o governo a dissolva, ou que a não prorogue, para evitar a impossibilidade de governar, em que se constituiria sem os meios, etc.; e eis-aqui demonstrado, como disse na interrupção do sr. ministro, que a camara póde estorvar e impedir indirectamente certos actos dos outros poderes; por que esses actos os conduziriam á illegalidade que os mesmos poderes não têem direito de praticar e lhe ficam por isso sendo moralmente vedados.

Tenho ouvido dizer que não é assim que se tem praticado depois do acto addicional. Como tenho estado absolutamente separado dos trabalhos legislativos desde 1840 até 1870, não devo occupar-me do que se tem praticado; o que eu trato é de demonstrar o que a camara tem direito de fazer: e se entregando-lhe os legisladores do acto addicional uma defeza, e um remedio proveitoso para obstar á continuação das desordens que produziram tres revoluções successives; se as camaras posteriores não souberam, ou não quizeram empregar essa arma, isso póde contar-se como mais uma calamidade, porque a verdade é que os nossos gravissimos embaraços actuaes são essencialmente derivados d'estas condescendencias e irresoluções desgraçadas, ou d'este esquecimento dos direitos e deveres capitães dos procuradores dos povos; e quanto mais inveterado é o mal tanto maior é a necessidade de clamar pelo emprego do remedio, antes que uma quarta revolução venha duplicar os nossos embaraços, ou fazer estragos de maior alcance...

Na minha interrupção ao sr. presidente do conselho eu disse que a camara tinha direito e obrigação de embaraçar indirectamente, como já expliquei, quaesquer actos dos outros poderes, que estorvassem a discussão do orçamento e a votação das leis tributarias, etc.; demonstrei que ella póde; agora vou demonstrar que tem obrigação de o fazer.