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SESSÃO DE 5 DE ABRIL DE 1886

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho (supplente)

Secretarios os exmos. srs.:
Henrique da Cunha Matos de Mendia
Joaquim Augusto Ponces de Carvalho

SUMMARIO

Leu-se um officio do ministerio do reino, remettendo, em satisfação a um requerimento do sr. Santos Viegas, um exemplar impresso dos «Programmas de cada uma das classes em que se dividem as escolas centraes do municipio de Lisboa». - O sr. Santos Viegas apresentou, em nome do sr. Filippe de Carvalho, quatro projectos de lei: 1.° Para que a todo o cidadão que receber vencimento mensal do thesouro comece o seu vencimento desde o dia 1 do mez seguinte ao do seu despacho, sendo os dias anteriormente decorridos sómente contados para os effeitos de aposentação, promoção e reforma; 2.° Auctorisando o governo a lançar um pequeno imposto addicional a todas as propriedades que, a titulo de privilegiadas e portanto não vendaveis, andam fóra do commercio de compra, venda e hypotheca; 3.° Abolindo os passaportes para o estrangeiro; 4.° Fixando o imposto especial no consumo dos phosphoros. - Por proposta do sr. Sebastião Centeno, que foi considerada urgente e approvada, foram aggregados á commissão de emigração os srs. Germano de Sequeira e Agostinho Lúcio. - A requerimento do mesmo senhor foi auctorisada a publicação no Diario do governo, mesmo no intervallo da sessão parlamentar, das peças do processo do ultimo concurso para o logar de contador geral da junta do credito publico. - Foi approvada uma proposta apresentada pelo sr. Carrilho, para que a mesa fique auctorisada a gratificar os empregados das repartições da camara, que a mesma mesa entenda serem merecedores d'essa recompensa pelos serviços prestados nas ditas repartições. - Foi approvado o parecer da commissão de fazenda que approva o contrato para a illuminação a gaz da cidade do Porto. - A requerimento do sr. Germano de Sequeira entrou em discussão o projecto n.° 46, que faz algumas modificações no artigo 66.° do codigo do processo civil, mas depois de alguma discussão, em que tomaram parte os srs. Castro Matoso, Marçal Pacheco e ministro da justiça, não chegou a approvar-se, e foi interrompida, para se entrar na ordem do dia.
Na ordem do dia continuou a discussão do projecto n.° 41 (lei de meios) que a final foi approvado, depois de algumas considerações dos srs. Ferreira de Almeida, Consiglieri Pedroso, Fuschini, ministro da fazenda e Carrilho. - Também depois de breve discussão foi approvado o parecer da commissão de fazenda e saude, sobre a proposta do governo para este ser auctorisado a pôr em vigor algumas disposições das leis de 1854 e 1885, que têem por fim impedir a invasão do cholera no paiz, caso isso se torne necessario. - No fim da sessão o sr. Avellar Machado chamou a attenção do sr. ministro da fazenda para o que se refere num jornal de Abrantes, quanto a arbitrariedades que ali se estão praticando no imposto do real de agua, por parte da fiscalisação externa das alfandegas. - Respondeu-lhe o sr. ministro da fazenda. - Apresentaram-se justificações de faltas dos srs. Souto Rodrigues, Eduardo Pinto Basto, Mazziotti, Alves Matheus, Cardoso Valente e visconde de Reguengos.

Abertura - Ás tres horas e meia da tarde.

Presentes d chamada - 65 srs. deputados.

São os seguintes: - Adolpho Pimentel, Agostinho Lucio, A. da Rocha Peixoto, Alfredo Barjona de Freitas, Silva Cardoso, Sousa e Silva, Antonio Baptista, Antonio Candido, Garcia Lobo, Lopes Navarro, Cunha Bellem, Pereira Mazziotti, Carrilho, Santos Viegas, Seguier, A. Hintze Ribeiro, Urbano de Castro, Fuschini, Pereira Leite, Neves Carneiro, Bernardino Machado, Conde de Thomar, E. Coelho, Emygdio Navarro, Sousa Pinto Basto, Fernando Caldeira, Filippe de Carvalho, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Francisco de Campos, Castro Matoso, Guilherme de Abreu, Matos de Mendia, Baima de Bastos, Franco Frazão, Melicio, Ponces de Carvalho, Joaquim de Sequeira, J. J. Alves, Simões Ferreira, Avellar Machado, Correia de Barros, Azevedo Castello Branco, Ferreira de Almeida, Elias Garcia, Laranjo, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano, Oliveira Peixoto, Lourenço Malheiro, Luciano Cordeiro, Luiz Jardim, Manuel d'Assumpção, Marçal Pacheco, Mariano de Carvalho, Guimarães Camões, Miguel Dantas, Pedro de Carvalho, Gonçalves de Freitas, Barbosa Centeno, Dantas Baracho, Visconde de Ariz, Visconde de Balsemão, Visconde de Reguengos e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Antonio Centeno, Pereira Borges, Moraes Sarmento, Fontes Ganhado, Jalles, Almeida Pinheiro, Barão do Ramalho, Conde da Praia da Victoria, Ribeiro Cabral, Elvino de Brito, Goes Pinto, Barros Gomes, Sant'Anna e Vasconcellos, Scarnichia, D. Jorge de Mello, Luiz Dias, M. J. Vieira, M. P. Guedes, Pinheiro Chagas, Martinho Montenegro, Miguel Tudella, Santos Diniz, Rodrigo Pequito, Pereira Bastos, Tito de Carvalho, Vicente Pinheiro, Visconde das Laranjeiras e Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Moraes Carvalho, Garcia de Lima, Albino Montenegro, Torres Carneiro, Pereira Côrte Real, A. J. da Fonseca, Antonio Ennes, Moraes Machado, A. M. Pedroso, Sousa Pavão, Pinto de Magalhães, Augusto Barjona de Freitas, Augusto Poppe, Avelino Calixto, Barão de Viamonte, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Albuquerque Calheiros, Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Conde de Villa Real, Cypriano Jardim, Estevão de Oliveira, Fernando Geraldes, Vieira das Neves, Correia Barata, Mártens Ferrão, Wanzeller, Frederico Arouca, Silveira da Mota, Costa Pinto, J. A. Pinto, Augusto Teixeira, J. C. Valente, Franco Castello Branco, Souto Rodrigues, João Arroyo, Teixeira de Vasconcellos, Ferrão de Castello Branco, Sousa Machado, J. Alves Matheus, J. A. Neves, Oliveira Martins, Teixeira Sampaio, Amorim Novaes, Borges de Faria, Dias Ferreira, Lobo Lamare, Pereira dos Santos, Ferreira Freire, José Maria Borges, Simões Dias, Pinto de Mascarenhas, Luiz Ferreira, Reis Torgal, Luiz Osorio, M. da Rocha Peixoto, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, Aralla e Costa, Pedro Correia, Visconde de Alentem, Visconde de Pindella e Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio do reino, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Santos Viegas, um exemplar impresso dos Programmas de cada uma das classes em que se dividem as escolas centraes do municipio de Lisboa.
Á secretaria.

Requerimento

Requeiro que se consulte a camara, sobre se permitte que sejam publicados no Diario do governo os documentos a que se referem os meus requerimentos apresentados nas sessões de 16 e 20 de marco proximo findo, documentos relativos ao concurso para o logar de contador da junta do credito publico, a que ultimamente se procedeu. = O deputado, Barbosa Centeno.
Approvado.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Declaro que, por motivo justificado, não compareci á sessão de sabbado 3 do corrente. = E. Pimo Basto.

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2.ª Declaro a v. exa. e á camara que não compareci ás duas ultimas sessões por motivo justificado. = A. M. D. Pereira Chaves Mazzioti.

3.ª Participo a v. exa. e á camara que o nosso collega distincto e meu particular amigo o sr. Alves Matheus, me incumbiu de declarar que por motivo de saude ainda não poderá comparecer a mais algumas sessões.= Luiz José Dias.

4.ª Declaro que o deputado Cardoso Valente, tem faltado e continuará faltando ás sessões por motivo justificado. = 0 deputado, Antonio Sarmento.

5.ª Declaro a v. exa. e á camara que por motivo justificado tenho deixado de comparecer ás ultimas sessões. = Visconde de Reguengos.
Para a acta.

O sr. Presidente: - Participo á camara que o illustre deputado e primeiro secretario, o sr. Souto Rodrigues, não tem podido comparecer a algumas sessões, e não comparecerá a outras, por motivo de doença.
O sr. Barbosa Centeno: - Mando para a mesa um requerimento para que sejam aggregados á commissão de emigração os srs. Joaquim Germano Sequeira e Agostinho Lucio.
Aproveito a occasião de estar com a palavra para apresentar outro requerimento, pedindo que sejam publicados no Diario do governo os documentos a que me referi nas sessões de 16 e 20 do mez passado.
O sr. ministro da fazenda prometteu enviar á camara as copias de varias peças do concurso para o logar de contador geral da junto do credito publico, ultimamente verificado.
Não as mandou ainda, provavelmente por falta de tempo, e é possivel que eu não tenha a satisfação de as ver publicadas antes que a camara se encerre.
Como não posso desistir d'essa publicação, pela qual continuarei a insistir em todos os campos e de todos os modos, julgo da maior conveniencia que a camara se pronuncie a este respeito, auctorisando desde já a publicação dos mencionados documentos, embora esta só tenha de fazer-se depois de encerradas as sessões.
Requeiro, por isso, a urgencia do meu requerimento.
O sr. Presidente: - O illustre deputado em duas sessões successivas pediu que a camara auctorisasse a publicação dos documentos do concurso de contador da junta do credito publico.
Como estivessem na mesa os documentos originaes, o sr. ministro da fazenda pediu que fossem enviados ao seu ministerio, para ali serem tiradas copias d'esses documentos, mas estas ainda não foram remettidas.
Consulto a camara se permitte a publicação na folha official, logo que á secretaria sejam enviadas as copias.
Foi auctorisada a publicação.
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Por parte da commissão de emigração proponho que a esta commissão sejam aggregados os srs. deputados Joaquim Germano de Sequeira e Agostinho Lucio. = O secretario da commissão, Barbosa Centeno.
Foi approvada.

O sr. Carrilho: - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda, que approva o contrato da illuminação a gaz da cidade do Porto.
Pedia a v. exa. que consultasse a camara sobre se, dispensando o regimento, consente que este parecer entre desde já em discussão.
Aproveito a occasião de estar com a palavra para mandar para a mesa uma proposta tendente a gratificar, como nos annos anteriores, os empregados d'esta camara, que têem prestado serviços extraordinarios.
Esta proposta não augmenta despeza alguma, visto que ha de ser paga das sobras da tabella de despeza d'esta camara.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta proposta entre desde já em discussão.
Foi dispensado o regimento e leu-se na mesa.
É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 49

Senhores. - A vossa commissão de administração publica, examinando a proposta do governo, n.° 33-B, e julgando attendiveis as rasões allegadas no relatorio que a precede, é de parecer que seja convertida em lei nos termos seguintes:
Artigo 1.° E approvado para os devidos effeitos o contracto celebrado em 18 de março de 1886, entre a camara municipal do Porto e a companhia portuense de illuminação a gaz, para a illuminação d'aquella cidade.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da commissão, em 26 de março de 1886. = Marçal Pacheco = A. Neves = Manuel Pinheiro Chagas = Adolpho Pimentel = Pereira Leite = Franco Cas-tello Branco = Guilherme de Abreu = A. M. da Cunha Bellem = Neves Carneiro, relator.

N.° 33-B

Senhores. - Devendo terminar em 1 de setembro de 1889 o contrato celebrado pela camara municipal do Porto com a companhia portuense de illuminação a gaz, approvado pela carta de lei de 20 de abril de 1874, ajustou a mesma camara com a actual companhia fazer desde já, e nos termos que constam do adjunto instrumento de escriptura publica, uma novação d'aquelle contrato, que considera deficiente em geral e especialmente no modo pratico de liquidar as contas finaes. Por este motivo, e considerando que da novação resulta importante abatimento do preço da illuminação publica e particular, a camara municipal pede a approvação immediata do contrato, como é mister para que possa começar a executar-se nos termos da respectiva clausula 36.ª
Parece ao governo que o referido contrato se acha em termos de ser approvado pelo poder legislativo, e por isso tenho a honra de submetter á vossa illustrada consideração a seguinte, proposta de lei:
Artigo 1.° E approvado para os devidos effeitos o contrato celebrado entre a camara municipal do Porto e a companhia portuense de illuminação a gaz, em data de 18 de março de 1886, para a illuminação da mesma cidade.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 26 de março de 1886.= José Luciano de Castro.

Municipalidade do Porto. - 1.ª repartição. - Copia.- Saibam os que esta escriptura virem, que sendo no anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1886, aos 18 dias do mez de março, n'esta cidade do Porto e paços do concelho, onde se achavam, de uma parte o exmo. Alexandre Carneiro de Vasconcellos, na qualidade de vice-presidente, servindo de presidente, e representante da exma. camara municipal, na conformidade da lei, e da outra Francisco Pinto de Miranda, na qualidade de director da companhia portuense de illuminação a gaz, devidamente auctorisado pela assembléa geral da mesma companhia em sessão de 17 do corrente mez, pessoas reconhecidas pelas proprias de mim, escrivão, e das testemunhas abaixo assignadas, do que dou fé; ahi pelo exmo. vice-presidente da exma. camara municipal outorgante foi dito que, tendo a camara municipal reconhecido a conveniencia de se renovar o contrato com a companhia por-

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tuense de illuminação a gaz, contratara com o segundo outorgante Francisco Pinto de Miranda, como director e representante d'aquella companhia, com as seguintes condições:
1.ª A companhia portuense de illuminação a gaz obriga-se a conservar a sua actual fabrica, com todas as suas dependencias, e a estabelecer e a conservar á sua custa os novos fornos, gazometros, canalisações e fabricas que venham a tornar-se-lhe necessarias para fornecer a illuminação a gaz publica e particular da cidade do Porto, e da estrada da Foz, no espaço comprehendido entre a sua actual fabrica, sita no logar do Oiro, e o rio de Gondarem na estrada de Carreiros, conforme lhe for requisitado pela camara municipal, pela junta geral do districto, pelas juntas de parochia, pelas auctoridades ou directores de estabelecimentos do estado, pelas administrações dos estabelecimentos de beneficencia e de caridade, e pelos particulares, na fórma estipulada n'este contrato.
§ 1.° Para os effeitos deste contrato, entende se por «cidade do Porto» o conjuncto de vias publicas, praças, largos, jardins e mais logares publicos actualmente existentes ou que, durante a vigencia d'este contrato, vierem a existir dentro da superficie limitada por linhas encarnadas na planta, que ficará archivada no cartorio da municipalidade, depois de assignada pelas partes outorgantes na escriptura, e d'essa planta se poderão extrahir copias authenticas para uso de qualquer das partes contratantes.
§ 2.° A illuminação publica comprehende:
1.° Os candieiros, que nas vias publicas, praças e largos, funccionem sem interrupção desde o occaso do sol até ao seu nascimento;
2.° Os candieiros destinados a illuminar as sentinas e ourinatorios publicos durante toda a noite;
3.° Os candieiros que nas vias publicas, praças e largos, sómente funccionem desde o anoitecer até á meia noite.
§ 3.° Alem do gaz necessario para a illuminação publica e particular, nos termos d'esta condição, é a companhia obrigada a fornecer todo o gaz que para usos domesticos e industriaes, assim diurnos como nocturnos, lhe for requisitado dentro da superficie definida no § 1.°, na fórma estipulada n'este contrato.
§ 4.° Póde tambem a companhia fornecer o gaz que para illuminação extraordinaria lhe for requisitada, comtanto que de tal fornecimento não resulte transtorno ou prejuizo para a illuminação permanente publica ou particular, nem para o fornecimento de gaz destinados a usos domesticos ou industriaes.
§ 5.° O fornecimento do gaz para a illuminação publica e particular é obrigatorio, em todas as epochas do anno, desde o occaso do sol até ao seu nascimento, para o que é a companhia obrigada a conservar sempre dentro das suas canalisações uma pressão nunca inferior a Om,020.
2.ª O gaz fornecido pela companhia será exclusivamente extrahido da hulha, e terá tal força illuminante que um bico que em uma hora consuma 105 litros de gaz, sob a pressão de Om,002 a Om,003 de agua, dê uma luz igual á produzida por uma lampada Carcel, regulada de modo que, no mesmo espaço de tempo, consuma Ok,042 de oleo puro de colza.
§ 1.° Para se verificar a pureza do gaz, bem como a sua força illuminante, observar-se hão fielmente as disposições da instrucção pratica sobre o processo a empregar para a verificação diaria da força illuminante, e da pureza do gaz, da companhia parisiense, elaborada em 12 de dezembro de 1860, pelos chimicos os srs. Dumas & Regnault, tudo conforme o respectivo regulamento e instrucções praticas que ficarão fazendo parte d'este contrato, sendo para este fim assignado um exemplar d'ellas por ambas as partes, a fim de ficar archivado para os devidos effeitos.
§ 2.° A verificação da pureza do gaz e da sua força illuminante será feita todos os dias, a saber: nos mezes de abril a setembro inclusive, desde as oito ás onze horas da noite, e nos mezes restantes desde as seis ás nove horas tambem da noite.
§ 3.°- Para se verificar a pureza do gaz e a sua força illuminante empregar-se-ha o apparelho descripto na já citada instrucção pratica dos srs. Dumas & Regnault de 12 de dezembro de 1860, ainda hoje empregado na verificação do gaz fornecido á cidade de Paris, não podendo tal apparelho ser posto em serviço sem ser previa e contradictoriamente verificado pelos delegados technicos da camara e da companhia, e approvado pelos primeiros.
§ 4.° Este apparelho será adquirido, custeado e conservado em estado de bem funccionar, pela companhia e a expensas suas, e tambem a expensas suas collocado na sua fabrica do Oiro em local apropriado e escolhido por accordo entre os delegados technicos da camara e os da companhia, de modo que todo o gaz fornecido á cidade possa ser convenientemente verificado.
§ 5.° O accesso ao recinto, em que funccionar o apparelho photometrico, sómente será permittido aos delegados technicos da camara e da companhia que tiverem a seu cargo as respectivas verificações.
§ 6.° Alem do posto photometrico de que trata esta condição, estabelecerá a companhia, a expensas suas, tantos outros quantas forem as novas fabricas de gaz, que vier a estabelecer, para poder cumprir as obrigações que este contrato lhe impõe, de modo que em epocha alguma possa qualquer quantidade de gaz ser fornecida, sem que a sua pureza e força illuminante possam ser devidamente verificadas.
3.ª O processo para a verificação da força illuminante do gaz, e o photometro para esse fim empregado, poderão ser os que estão em uso em Londres para a verificação oficial do gaz fornecido áquella cidade, devendo um bico de gaz que consuma 141 litros de gaz n'uma hora, dar luz igual á de 12 velas de spermacete, cada uma das quaes consuma ao mesmo tempo Oc,007785.
§ unico. As verificações da força illuminante do gaz serão feitas conforme as instrucções praticas adaptadas em Londres, e regulamento especial que ficará fazendo parte d'este contrato; sendo para este fim assignado um exemplar d'ellas por ambas as partes, a fim de ficar archivado para os devidos effeitos.
4.ª Ficam a cargo da companhia todas as despezas do fabrico, purificação, conducção e distribuição do gaz que é obrigada a fornecer. Para isso construirá, adquirirá, collocará e conservará sempre em estado de bem funccionar, todos os fornos, apparelhos, gazometros, canalisações e mais material, que, para o cabal e completo desempenho das suas obrigações, lhe seja ou venha a ser necessario.

.ª A fabrica da companhia continuará a ser, como actualmente é, no sitio chamado o Oiro, na freguezia de Lordello do Oiro, nos terrenos de que já é proprietaria a mesma companhia.
§ 1.° Fica porém a companhia obrigada a adquirir á sua custa os terrenos precisos para alargamento da sua actual fabrica, ou para o estabelecimento de outra ou de outras, logo que tal alargamento ou novos estabelecimentos lhe sejam necessarios para poder cumprir as obrigações que este contrato lhe impõe, e isto tanto no local, em que está situada a sua actual fabrica, como em qualquer outro ponto da cidade ou de seus suburbios, ficando em todo o caso a escolha do local ou locaes sujeita á approvação da camara e das auctoridades sanitarias.
§ 2.° O governo declarará de utilidade publica e urgente a expropriação do terreno ou terrenos a que se refere o paragrapho anterior, logo que a sua escolha haja sido approvada pela camara e pelas auctoridades sanitarias e a companhia assim o requerer.
6.ª É permittido á companhia a serventia do caes era toda a frente do seu actual estabelecimento no Oiro, para

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o embarque e desembarque de carvão, tubos de canalisação, machinas, apparelhos, e em geral da todo o material necessario para o seu fabrico, comtanto que não cause o minimo embaraço ou impedimento ao transito publico.
§ 1.° Para este effeito poderá a companhia collocar pontilhões, guindastes, trilhos de ferro, ou pontes sobre a via publica, comtanto que previamente solicite e obtenha as indispensaveis licenças da camara e mais auctoridades que hajam de superintender no assumpto.
§ 2.° Se a companhia não obtiver as licenças, de que trata o § anterior, ou se, depois de obtidas, lhe vierem a ser cassadas, nem por isso poderá de modo algum eximir-se ao inteiro e fiel cumprimento das obrigações que este contrato lhe impõe, nem pedir indemnisação alguma.
7.ª A companhia poderá, precedendo licença da camara oficialmente impetrada e concedida, levantar o pavimento de qualquer via publica com o fim de collocar, reparar ou substituir as suas canalisações, competindo á mesma companhia toda a responsabilidade nos termos da lei civil ou criminal, por todos os damnos que causar ao municipio ou a terceiros.
§ 1.° Em casos imprevistos e urgentes poderá a companhia levantar o pavimento das vias publicas, para os fins indicados n'esta condição, sem licença prévia da camara, uma vez que immediatamente de parte á mesma camara das obras a que procedeu, e das circumstancias que as tornaram urgentes.
§ 2.º No uso da faculdade concedida n'esta condição, conformar-se-ha a companhia com as disposições do codigo de posturas, e mais disposições municipaes em vigor ao tempo em que as obras se realisarem, a fim de causar o minimo embaraço e perigo ao transito publico.
§ 3.° Todos os pavimentos que a companhia levantar serão desde logo e á medida que a tubagem for sendo collocada, substituida ou reparada, repostos no seu anterior estado pela mesma companhia e a expensas suas.
§ 4.° Estas obras serão sujeitas á fiscalisação e approvação da camara, a qual terá o direito de mandal as fazer por operarios seus, mas á custa da companhia, quando esta se recuse a fazel-as, ou quando depois de parcial ou totalmente feitas, se negue a emendal-as de modo que possam ser approvadas e acceites pelos empregados technicos da municipalidade.
§ 5.° Dado o caso previsto no § anterior, a camara deduzirá a importancia das obras que houver mandado fazer por operarios seus, no primeiro pagamento que tiver de fazer á companhia.
§ 6.° As obras de que trata esta condição e seus paragraphos poderão, quando para isso haja o indispensavel accordo, ser mandadas executar pela camara, sendo pagas pela companhia por metro quadrado, e ficando n'este caso a companhia isenta de toda a responsabilidade pela sua execução.
8.ª Os candieiros da illuminação publica, os braços ou columnas em que assentam, bem como a canalisação e os candieiros das sentinas e ourinatorios publicos, serão fornecidos pela companhia, á qual ficarão pertencendo.
§ 1.° Os candieiros da illuminação publica continuarão a ser feitos de chapa de cobre e assentarão sobre braços ou columnas de ferro fundido, tudo conforme com os modelos depositados na camara, ou de outro qualquer padrão proposto pela companhia e acceite pela municipalidade.
§ 2.° Se a camara em qualquer epocha mandar alterar o padrão adoptado para os candieiros, braços ou columnas, será a alteração feita pela companhia, mas á custa da camara, que tambem será obrigada a pagar o excesso de custeio, que porventura demande o novo typo de candieiros adoptado.
§ 3.° Se, porém, os novos candieiros, braços ou columnas, forem fornecidos pela camara e por ella mandados collocar, a companhia não poderá oppor-se á substituição, mas terá o direito da fiscalisacão a fim de evitar que perigue a segurança publica e haja fugas de gaz.
§ 4.° Os candieiros destinados a iluminar as sentinas e ourinatorios publicos, serão do padrão proposto pela companhia e approvado pela camara, e ser-lhe-hão em tudo applicaveis as disposições d'esta condição e seus §§ 1.°, 2.° e 3.°
§ 5.° Todos os candieiros collocados nas vias publicas, largos e praças, serão numerados, e tanto elles como os braços ou columnas em que assentarem, serão pintados, pelo menos uma vez, em cada periodo de dois annos.
§ 6.° Em todos os largos e praças, bem como em todas as ruas, cuja largura for pelo menos de 10 metros, o nas quaes os passeios tenham a largura minima de 1m,50, serão candieiros assentes sobre columnas.
9.ª Quando nos termos da condição 1.ª § 1.° d'este contrato, a camara requisitar illuminação para alguma via publica nos termos do n.° 1.° do § 2.° da condição 1.ª, a companhia fará á sua custa as necessarias canalisações, e da mesma fórma collocará os respectivos candieiros, comtanto que, salvos os casos previstos no paragrapho seguinte a cada 45 metros de canalisação corresponda pelo menos um candieiro.
§ 1.° Se na via publica, que se pretender illuminar, houver travessas ou cruzamento de ruas, dispostas de fórma que o candieiro mais proximo deixasse, quando fosse observado o preceito relativo a distancias, estabelecido n'esta condição, de dar luz para a rua transversal, poderá aquelle candieiro collocar-se por fórma que, entre elle e o precedente medeiem 50 metros lineares de canalisação; continuando, porém, dali em diante a collocar-se os outros de modo que, pelo menos, corresponda um a cada extensão de 45 metros lineares de canalisação.
§ 2.° Se á camara convier em qualquer tempo alterar a collocação de alguns candieiros, será a mudança feita pela camara, sob a fiscalisação gratuita da companhia, comtanto que, salvos os casos previstos no § anterior, a cada extensão de 45 metros de canalisação fique correspondendo, pelo menos, um candieiro, devendo a companhia prestar á camara operarios habilitados para esse serviço, mediante o salario que cada um d'elles receba da companhia, quando empregado no seu serviço.
10.ª O serviço de accender, apagar, limpar, numerar, pintar, reparar os candieiros da illuminação publica, e os respectivos braços ou columnas, será feito pela companhia e a expensas suas.
§ 1.° Todos os candieiros da illuminação publica estarão accesos e serão apagados ás horas marcadas na tabella actualmente em vigor, approvada em sessão de 31 de dezembro de 1874, emquanto não for revogada ou alterada por accordo das duas partes contratantes.
§ 2.° O serviço de accender os candieiros da illuminação publica deverá começar vinte minutos antes da hora marcada na tabella, e estará concluido vinte minutos depois da mesma hora.
§ 3.° O serviço da extincção dos candieiros começará dez minutos antes da hora marcada na mesma tabella.
§ 4.° O itinerario de cada lampeanista para o serviço de accender e apagar os candieiros de illuminação publica, será submettido pela companhia á approvação da camara, e do mesmo modo procederá de futuro quando julgue necessario
alteral-o.
11.ª A canalisação e distribuição do gaz continuará a ser feita em tubos de ferro fundido, de capacidade sufficiente para satisfazer todas as exigencias do serviço da illuminação publica, bem como para fornecer lodo o gaz para consumo nocturno o diurno dos particulares.
§ 1.° As actuaes canalisações poderão continuar a servir, mas irão sendo substituidas ou augmentadas á medida que se forem deteriorando, ou mostrando-se insufficientes para satisfazer cabalmente os preceitos d'esta condição, e as demais prescripções d'este contrato.

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§ 2.° No improrogavel praso de cento e vinte dias, a contar da data de qualquer requisição de gaz, quer para a illuminação publica ou particular, quer para usos domesticos ou industriaes, é a companhia obrigada a ter effectuado as modificações na parte respectiva da canalisação, ou a collocação dos novos tubos necessarios para poder effectuar o fornecimento requisitado.
12.ª Continuará a ser adoptada para a illuminação publica a fórma de chamma designada por luz de leque, salvo accordo em contrario entre a camara e a companhia, e será cada luz inteiramente conforme com o modelo, que ficará depositado na camara.
§ 1.° Cada luz da illuminação das vias publicas, praças ou largos terá as dimensões necessarias para consumir 141 litros de gaz por hora.
§ 2.° Cada uma das luzes das sentinas ou ourinatorios publicos consumirá 70 1/2 litros por hora.
13.ª A companhia obriga-se a adoptar os processos mais aperfeiçoados para a distillação e purificação do gaz, e em todos os demais particulares da sua industria, de modo a prevenir, não só todos os accidentes, mas tambem a observar todos os preceitos da hygiene, para o que obedecerá escrupulosamente ás leis e regulamentos policiaes e sanitarios em vigor, assim como a todas as que durante a vigencia do contrato vierem a publicar-se.
14.ª A illuminação publica será paga pela camara á companhia pelos preços seguintes:
1.° Por cada candieiro, nos termos da condição 12.ª § 1.° e do n.° 1.° do § 2.° da 1.ª condição, 14$500 réis por anno;

.° Por cada candieiro, nos termos da citada condição 12.ª § 2.° e do n.° 2.° do § 2.° da 1.º condição, 7$25O réis por anno;
3.° Por cada candieiro, nos termos da condição 12.ª § 1.° e do n.° 3.° § 2.° da 1.ª condição, 9$500 réis por anno.
§ unico. O pagamento da illuminação será feito em prestações mensaes, pagas dentro dos primeiros quinze dias do mez immediato áquelle a que a prestação corresponder.
15.ª A camara poderá impor á companhia as multas seguintes:
1.ª De 20$000 réis por cada noite em que pelos ensaios feitos, conforme o regulamento, se provar que o gaz não é puro, ou tem menos força illuminante do que a estabelecida, nas condições 2.ª e 3.ª d'este contrato, conforme for o photometro de que se fizer uso;
2.ª De 160 réis por noite e por cada candieiro da illuminação publica que for encontrado apagado durante as horas em que devia estar acceso;
3.ª De 100 réis por cada candieiro da illuminação publica que for acceso depois ou apagado antes das horas marcadas nos §§ 1.°, 2.° e 3.° da condição 10.ª;
4.ª De 100 réis por noite por cada candieiro a que falte algum vidro, que não esteja cuidadosamente limpo, ou a que falte o respectivo numero;
5.ª De 100 réis por noite por candieiro, cuja luz não tiver as dimensões necessarias para consumir as quantidades de gaz respectivamente estabelecidas nos §§ 1.º e 2.º da condição 12.ª
16.ª Não incorre em penalidade alguma a companhia nos seguintes casos:
1.° Quando algum candieiro deixe de ser acceso por estar collocado em predio vedado por tapumes, por estar em obras, ou quando temporariamente lhe não podér chegar o gaz em consequencia de obras no respectivo cano;
2.° Quando algum candieiro seja apagado por effeito de temporaes ou vendavaes, ou por se achar collocado sob algum caleiro, ou, finalmente, quando a companhia podér provar que foi apagado por malevolencia;
3.° Quando a companhia não possa receber a hulha em consequencia de guerras, bloqueios ou pirataria;
4.º Quando se der qualquer outro caso de força maior, devidamente comprovado.
§ unico. Fica, porém, expressamente declarado que ascheias do rio Douro,
ou de qualquer affluente seu, ou a interrupção do serviço da barra por tempo inferior a noventa, dias consecutivos, não poderão em tempo algum ser allegados pela companhia como casos de força maior, para se desculpar de não ter a hulha necessaria para fabricar todo o gaz que por este contrato é obrigada a fornecer, nem tão pouco poderá nunca a circumstancia de ser parcial ou totalmente invadida a sua actual fabrica pelas aguas do rio Douro, ou de qualquer de seus affluentes em occasião de cheias, ser allegada pela companhia como caso de força maior, e para se eximir á obrigação de diariamente fabricar todo o gaz que, nos termos d'este contrato, é obrigada a fornecer, nem ás penalidades estabelecidas na condição 15.ª quando por tal motivo deixe de cumprir aquella obrigação.
17.ª A camara, ou em seu nome os empregados de serviço da illuminação publica, participarão á companhia no primeiro dia util seguinte áquelle em que qualquer falta houver sido encontrada, a penalidade que, nos termos d'este contrato, lhe houver sido applicada.
§ unico. A companhia poderá contestar a legitimidade das penalidades impostas, com o depoimento escripto de duas testemunhas que sejam praças do corpo de policia civil ou da guarda municipal do Porto, durante os dez dias seguintes áquelle em que lhe for communicada a applicação das mesmas penalidades.
18.ª Se, por um accidente imprevisto, e proveniente de algum caso de força maior, o serviço de illuminação publica for parcial ou totalmente interrompido, a companhia substituirá immediatamente, e a expensas suas, emquanto a interrupção durar, a illuminação a gaz, publica, pela de azeite ou petroleo, para o que é obrigada a ter sempre em deposito o numero necessario de candieiros.
§ 1.° No improrogavel praso de vinte e quatro horas, depois da interrupção, justificará a companhia perante a camara, que tal interrupção proveiu de caso de força maior, que nem podia ter sido previsto nem obviado.
§ 2.° Na falta de tal justificação, bem como quando a interrupção haja sido proveniente de não ter podido a companhia fabricar o gaz necessario para consumo, nos termos feitos, conforme o regulamento, só provar que o gaz não é; d'este contrato, por ter sido a fabrica total ou parcialmente invadida pelas aguas do rio Douro
ou de algum de seus affluentes, mesmo em occasião de cheias, fica a companhia sujeita não só á obrigação de substituir á sua custa a illuminação a gaz publica, nos termos d'esta condição, mas tambem á multa de 160 réis por candieiro e por noite de interrupção, estabelecida sob o n.° 2.° da condição 15.ª
19.ª É da exclusiva competencia da camara estabelecer a fiscalisação, que julgar conveniente, sobre a execução d'este contrato.
§ 1.° A camara e os seus agentes fiscaes sómente poderão impedir os operarios e os empregados da companhia de exercer as suas funcções quando de tal exercicio resulte a violação de alguma das clausulas d'este contrato, ou damno para a saude, ou perigo para a segurança publica.
§ 2.° A camara fará apresentar os seus agentes fiscaes á companhia, para que esta e os seus delegados os reconheçam como taes.
20.ª Ainda quando a camara tenha de futuro a lançar algum novo imp+osto municipal sobre o carvão mineral, ou sobre qualquer das materias primas empregadas pela companhia no seu fabrico, não pagará a companhia, emquanto durar a vigencia d'este contrato, pela quantidade de taes generos que consumir no seu fabrico, nenhum outro imposto municipal, alem dos que actualmente oneram aquellas materias primas.
§ unico. Durante o praso estabelecido na condição 36.ª, não poderá a camara lançar imposto novo algum sobre o gaz fabricado pela companhia, nem sobre os mais productos resultantes do fabrico do mesmo.
21.ª Durante o praso estabelecido na condição 36.ª, ne-

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nhuma outra companhia ou particular poderá fornecer gaz para a illuminação, quer esta seja publica, quer particular, dentro do perimetro a que se refere a condição 1.º d'este contrato, e dentro dos limites da freguezia de S. João da Foz do Douro.
§ 1.° Caducará, porém, este exclusivo logo que a companhia deixe de cumprir o que dispõe a condição 1.ª e seus §§ 3.°, 4.° e 5.°, a condição 11. a § 2.°, e a condição 22.ª § 2.°
§ 2.° Fica resalvado a qualquer particular o direito de estabelecer gazometros para seu uso particular e exclusivo.
22.ª Alem da illuminação publica que a companhia fica obrigada a fornecer, obriga-se ella tambem a fornecer todo o gaz que lhe for requisitado para edificios publicos e particulares na cidade do Porto, e isto tanto para a illuminação como para quaesquer usos domesticos ou industriaes, nocturnos e diurnos.
§ 1.° Para os effeitos d'este contrato entender-se-ha por edificios publicos todos aquelles em que funccionarem repartições ou estabelecimentos do estado, da junta geral do districto, da municipalidade, das juntas de parochia, bem como todos aquelles em que funccionarem instituições de caridade ou de beneficencia.
§ 2.° A companhia póde, se lhe convier, levar a canalisação fóra dos limites estabelecidos no § 1.° da 1.ª condição; quando, porém, usar d'esta faculdade, sem sair dos limites do municipio do Porto, contrahe logo a companhia, com relação ao logar ou logares a que levar a canalisação, todas as obrigações a que está sujeita com relação á superficie designada no citado § 1.° da 1.ª condição.
23.ª A companhia obriga se a fazer, e a reparar á sua custa, as canalisações parciaes desde os canos geraes até á entrada dos edificios publicos ou particulares, cujos proprietarios, administradores ou inquilinos requisitarem o fornecimento do gaz para illuminação, ou outros usos domesticos ou industriaes, uma vez que á companhia se garanta um consumo de tres mezes, pelo menos, comtanto que cada canalisação parcial não tenha mais de 10 metros de extensão.
§ 1.° Quando uma canalisação parcial tenha mais de 10 metros de extensão, será pago o custo correspondente ao excesso por quem houver requisitado o fornecimento do gaz.
§ 2.° As canalisações parciaes, de que se trata n'esta condição, serão de ferro fundido batido, de chumbo, ou de qualquer outra materia que offereça as indispensaveis garantias de segurança e de duração.
§ 3.° Será feita e reparada á custa dos consumidores a canalisação interior dos predios, assim como serão tambem por elles adquiridos, collocados e reparados os lustres, candieiros, bicos, fogões e tudo o mais que para se utilisarem do gaz lhes seja necessario, ficando, porém, as collocações, reparações e alterações sujeitos á fiscalisação e approvação da companhia.
§ 4.° Se a fiscalisação da companhia não for acceite pela pessoa que houver requisitado o gaz, poderá a companhia recusar o fornecimento requisitado, ou retiral-o ainda quando houver sido já concedido.
§ 5.° A companhia póde, querendo, vender ou alugar a quem preferir tratar com ella, canalisações interiores, lustres, candieiros, bicos, fogões, bem como mandar proceder, por operarios seus, ás respectivas collocações e reparos.
24.ª O fornecimento do gaz para a illuminação, bem como do que se destinar a outros usos domesticos ou industriaes, será feito por avenças celebradas entre a companhia e os particulares ou por metro cubico.
§ 1.° Durante os primeiros dez annos que vigorar o presente contrato o preço do gaz para illuminação não excederá a 55 réis per metro cubico; no quinquennio immediato a 50 réis por metro cubico; e no ultimo quinquennio a 47 1/2 réis por metro cubico.
§ 2.º O gaz que fôr consumido nos fogões ou em usos industriaes não custará mais de 40 réis por metro cubico.
§ 3.° Sómente se considerará applicado a usos industriaes o gaz que for empregado como motor ou que for consumido em apparelhos industriaes, com exclusão de tudo quanto for applicado a illuminação.
§ 4.° A companhia póde reduzir quanto quizer o preço marcado nos paragraphos anteriores em favor de uma determinada industria; igual concessão, porém, será desde logo obrigada a fazer a todos os industriaes que exercerem a mesma industria.
25.ª Quando entre a companhia e o consumidor não houver avença, será o consumo do gaz contado por contadores de systema proposto pela companhia e approvado pela camara, cada um dos quaes será officialmente aferido na occasião em que houver de ser collocado.
§ 1.° Os consumidores podem, querendo, comprar onde lhes convenha os contadores para seu uso, uma vez que sejam do systema approvado pela companhia, e que sejam officialmente aferidos antes de serem collocados, e que fiquem a seu exclusivo cargo os gastos de aferições, concertos e substituições occasionados pelas deteriorações provenientes do uso.
§ 2.° Os consumidores, que assim o preferirem, podem alugar os seus contadores á companhia, a qual é obrigada a fornecel-os pelos preços seguintes, nos quaes se ineluem as despezas de aferições, concertos e substituições motivadas pelas deteriorações provenientes do uso:
Um contador de 2 luzes, por mez 150 réis, por anno 1$800 réis;
Um contador de 3 luzes, por mez 180 réis, por anno 2$160 réis;
Um contador de 5 luzes, por mez 210 réis, por anno 2$520 réis;
Um contador de 10 luzes, por mez 240 réis, por anno 2$880 réis;
Um contador de 20 luzes, por mez 400 réis, por anno 4$800 réis;
Um contador de 30 luzes, por mez 500 réis, por anno 6$000 réis;
Um contador de 50 luzes, por mez 600 réis, por anno 7$200 réis;
Um contador de 60 luzes, por mez 900 réis, por anno l0$800 réis;
Um contador de 80 luzes, por mez 1$000 réis, por anno 12$000 réis;
Um contador de 100 luzes, por mez 1$250 réis, por anno 15$000 réis;
Um contador de 150 luzes, por mez 1$600 réis, por anno 19$200 réis;
Um contador de 200 luzes, por mez 2$150 réis, por anno 25$800 réis;
Um contador de 300 luzes, por mez 2$880 réis, por anno 34$560 réis.
26.ª O consumo do gaz será pago mensalmente, salvo ajuste especial celebrado entre a companhia e o consumidor, podendo a companhia exigir do consumidor um fiador idoneo, ou um deposito permanente de quantia equivalente ao consumo approximado de tres mezes.
§ 1.° Este deposito sómente será restituido ao consumidor quando terminar o seu contrato, e depois de saldadas todas as suas contas com a companhia.
27.ª Uma vez em cada mez, quando o consumo do gaz for pago mensalmente, irá um delegado da companhia tomar nota do consumo do gaz registado pelo contador, convidando sempre o consumidor a assistir e a verificar a leitura que fizer, e deixar-lhe-ha sempre, ainda quando elle haja assistido á leitura, uma nota por escripto do consumo registado pelo contador, lançada em um livrete especial

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para isso fornecido pela companhia a cada um dos consumidores, ou em um papel avulso assignado pelo delegado respectivo, quando o livrete não seja apresentado pelo consumidor.
§ 1.° Se no praso de tres dias depois de cumprido o que dispõe esta condição, o consumidor não reclamar contra o consumo registado pelo contador, considerar-se-ha para todos os effeitos provado aquelle consumo e tornar-se-ha obrigatorio para o consumidor o pagamento integral da respectiva importancia.
§ 2.° Se porém dentro do referido praso de tres dias o consumidor reclamar perante a companhia contra o consumo registado pelo contador, aquella mandará immediatamente substituir o mesmo contador, e este será logo officialmente verificado em presença do consumidor ou de um delegado seu se elle assim o exigir.
§ 3.° Se da verificação official do contador resultar que a reclamação do consumidor era fundada, serão as despezas resultantes da substiiuição, verificação e concerto do contador pagas pela companhia, se for d'ella o mesmo contador, e far-se-ha ao volume do gaz, erradamente registado, a reducção correspondente ao excesso de contagem que se houver verificado.
§ 4.° Se pelo contrario da verificação official se verificar que não tinha fundamento a reclamação, tornar-se-ha desde logo obrigatorio para o consumidor o pagamento de todo o volume de gaz, contra o qual havia reclamado, e bem assim as despezas da substituição e a aferição do contador, embora elle seja propriedade da companhia.
§ 5.° No citado praso de tres dias, depois de cumprido o que determina esta condição, póde tambem a companhia notificar ao consumidor que se não conforma com a contagem do contador.
§ 6.° Feita esta notificação, procederá immediatamente a companhia como dispõe o § 2.° d'esta condição.
§ 7.° Se da verificação official do contador resultar que elle effectivamente contou menos do que devia contar, a companhia acrescentará ao consumo anteriormente registado, o que se tiver verificado que o contador contou de menos, e n'essa conformidade apresentará a sua conta ao consumidor, a cargo do qual ficarão tambem as despezas da substituição, verificação e concerto do contador se for elle o seu proprietario.
§ 8.° Quando, sem que tenha cessado o consumo do gaz durante o mez, succeda que o contador não haja marcado cousa alguma, regular-se-ha o consumo do gaz pelo de igual mez do anno anterior, ou pelo do mez anterior, augmentado ou diminuido 1/10, conforme os dias vierem crescendo, se acaso um anno antes ainda o consumidor, de que se trata, não recebesse gaz, e o contador será immediatamente substituido, concertado e officialmente aferido á custa da companhia ou do consumidor, conforme for d'aquella ou d'este a propriedade do contador.
§ 9.° Alem da aferição official obrigatoria, prescripta na condição 25.ª, podem os consumidores e a companhia exigir uma aferição official em cada anno, conforme for d'esta ou d'aquelles a propriedade dos contadores respectivos.
§ 10.° Os gastos resultantes das aferições, de que trata o § anterior, recairão sobre a companhia ou sobre os consumidores, conforme for d'aquella ou d'estes, a propriedade dos contadores.
§ 11.° Alem d'estas aferições podem os consumidores e a companhia exigir quantas queiram, mas os gastos respectivos recairão sobre quem as tiver exigido.
28.º Em caso algum poderá a companhia exigir de um inquilino ou proprietario de em predio, ou de qualquer esbelecimento industrial ou mercantil, o pagamento de qualquer quantia que lhe tenha ficado a dever outro inquilino ou proprietario do mesmo predio ou estabelecimento.
29.ª A companhia só poderá deixar de fornecer gaz a qualquer pessoa que lh'o requisite, quando:
1.° Se não garanta o consumo de tres mezes, pelo menos;
2.° Se não dê a fiança, ou não faça o deposito de que trata a condição 26.ª;
3.° Se dê o caso previsto no § 4.° da 23.ª condição.
30.ª A companhia sómente poderá retirar o fornecimento do gaz a um consumidor em qualquer dos casos seguintes:
1.° Quando o consumidor se haja tornado insolvente;
2.° Quando se recusar ao pagamento de uma conta de fornecimento de gaz, contra a qual não tenha reclamado no praso e nos termos da condição 27.ª § 1.°;
3.° Quando, tendo reclamado e havendo-se verificado a hypothese prevista no § 4.° da condição 27.ª, o consumidor respectivo se recusar aos pagamentos preceituados no mesmo § da citada condição.
4.° Quando se verificar no tocante a reparos ou alterações nas canalisações interiores a hypothese prevista no § 4.° da condição 23.ª
31.ª Todas as condições geraes do fornecimento de gaz, e muito nomeadamente as disposições das condições 24.ª 25.ª, 26.ª, 27.ª, 28.ª, 29.ª e 30.ª e seus respectivos paragraphos, serão exaradas nas apolices de cada contrato de fornecimento de gaz, celebrado entre a companhia e cada um dos seus consumidores.
32.ª A importancia de todo o gaz fornecido para illuminação publica e particular ou para quaesquer usos domesticos ou industriaes, será sempre paga em moeda legal corrente n'estes reinos com exclusão de notas, ainda que venham a ter curso forcado.

3.ª Se durante o tempo em que vigorar o actual contrato se descobrir algum systema de illuminação superior ao do gaz, e se a cidade de Lisboa ou qualquer outra cidade da Europa, de população não inferior á do Porto, a tiver adoptado, a camara poderá renunciar á illuminação a gaz e adoptar a nova luz, porém a companhia gosará do direito de preferencia em igualdade de circummstancias, precedendo concurso publico para a exploração do novo systema de illuminação.
§ unico. Dado o caso previsto n'esta condição, ficam subsistindo todas as mais obrigações impostas á companhia e direitos a ella concedidos por este contrato.
34.ª Se da execução de qualquer obra municipal resultar a necessidade de em qualquer ponto da cidade, se alterar a canalisação já existente, a companhia não poderá oppor-se a tal alteração, mas as despezas d'ella resultantes serão pagas pela camara.
§ unico. Nos termos das leis, poderá a companhia exigir, de quem competir, o pagamento de quaesquer reparações, a que seja obrigada, por effeito de qualquer obra de construcção ou reparação que venha a fazer-se na cidade.
35.ª São applicaveis as condições 23.ª, 24.ª, 25.ª e 27.ª e seus respectivos paragraphos, ao fornecimento de gaz para usos municipaes, sempre que o consumo houver de ser verificado por contador, como succede nos jardins, mercados, bibliotheca, escolas, laboratorio chimico, etc.
§ unico. O preço do metro cubico de gaz a que se refere esta condição será de 40 réis.
36.ª O presente contrato vigorará por espaço de vinte annos, contados do primeiro dia do mez immediatamente seguinte aquelle em que for promulgada a lei que o approvar; applicando-se, porém, os preços n'elle estipulados para a illuminação publica na condição 14.ª, a partir do 1.° de janeiro de 1886 inclusive.
§ 1.° Para este effeito deduzir-se-ha a cada um dos pagamentos, que a camara houver de fazer á companhia durante os mezes de 1886, posteriores á promulgação da lei, que approvar o contrato, uma parte do que lhe houver sido pago a mais nos mezes anteriores, e que seja sufficiente para que com o pagamento correspondente ao mez de dezembro do citado anno de 1886, fique a camara com-pletamente embolsada do excesso que houver pago.

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§ 2.° Findo o praso estabelecido n'esta condição, caducará este contrato, se um anno antes qualquer das partes contratantes communicar á outra que não quer continuar.
§ 3.° Se um anno antes da expiração do contrato nenhuma das partes contratantes fizer a communicação de que trata o paragrapho anterior, considerar-se-ha o contrato renovado nas mesmas condições por periodos do tres annos, no fim de cada um dos quaes caducará, se uma das partes contratantes communicar um anno antes á outra que não quer continuar.
37.ª Em qualquer epocha dentro da vigencia do contrato, poderá a companhia, precedendo consentimento da camara, arrendar por todo o tempo restante ou por uma parte d'elle, as suas fabricas e canalisações, contratando com o arrendatario o fornecimento de todo o gaz para illuminação publica e particular, e para usos domesticos industriaes nos termos e segundo as condições do presente contrato.
§ unico. Ainda quando venha a effectuar-se o arrendamento de que trata esta condição, ficará sempre até á expiração do contrato a companhia responsavel para com a camara pelo inteiro e fiel cumprimento de todas as condições e clausulas do mesmo contrato.
38.ª Emquanto vigorar o presente contrato, as fabricas da companhia com todos os seus pertences, bem como todas as suas canalisações, os candieiros e os braços ou columnas em que assentam, e em geral todas as machinas, apparelhos e utensilios pertencentes á companhia, serão especialmente, e com preferencia a tudo, obrigados á indemnisação das perdas e damnos causados pela companhia á municipalidade por effeito das obras que effectuar, e dos processos que empregar no fabrico e distribuição do gaz.
§ unico. Todos os objectos descriptos na presente condição reverterão para a plena e inteira posse da municilidade sem indemnisação alguma para a companhia, logo que esta, abandonando o fabrico, deixe de fornecer o gaz, que por este contrato é obrigada a fornecer durante todo o tempo da vigencia do mesmo contrato.
39.ª Expirado que seja este contrato, e ainda quando a camara contrate com outrem o fornecimento da illuminação publica da cidade do Porto, terá a companhia a faculdade de conservar durante dez annos, sob as vias publicas, as canalisações que para o cumprimento do contrato houver collocado, e a servir-se d'ellas para fornecer todo o gaz que para illuminação e outros usos particulares lhe for pedido, e que poderá continuar a fabricar nas suas fabricas.
§ unico. Como compensação obriga-se a companhia a pagar á municipalidade por cada um d'esses dez annos, 2 por cento da sua receita bruta total annual.
40.ª Findo o praso de dez annos, fixado na condição 39.º, poderá a camara expropriar á companhia, ou amigavelmente ou nos termos das leis de expropriação, as suas fabricas e canalisações, e em geral todo o material empregado no fabrico, depuração e distribuição do gaz.
§ unico. Emquanto a camara não quizer usar da faculdade concedida n'esta condição, poderá a companhia conservar as suas canalisações e fabricas, e servir-se daquellas e d'estas para produzir e distribuir o gaz, que para usos particulares lhe for pedido, pagando á camara, por cada anno em que usar d'esta faculdade, a compensação estabelecida no § unico da condição 39.ª
41.ª Para que a companhia possa usar das faculdades concedidas na condição 39.ª e § unico da condição 40.ª, continuarão a vigorar as condições 6.ª e 7.ª, durante os prasos estabelecidos na citada condição 39.ª e § unico da condição 40.ª
42.ª Todas as questões que venham a suscitar-se entre as duas partes contratantes sobre a interpretação ou applicação de qualquer das condições ou estipulações d'este contrato, serão decididas ex equo et bono por um tribunal de cujas decisões não haverá appellação nem recurso.
§ 1.° Este tribunal será composto de cinco membros.
§ 2.° Cada uma das partes contratantes nomeará dois arbitros, que serão pessoas de reconhecida competencia e respeitabilidade, e inteiramente estranhas á corporação que as nomear.
§ 3.° Estes quatro arbitros escolherão por accordo entre si, um quinto, que presidirá ao julgamento arbitral, e que em caso de empate resolverá a questão, e é obrigado a adoptar o parecer formulado por um dos lados, na conformidade do disposto no artigo 56.° do codigo do processo civil.
§ 4.° Quando os quatro arbitros, de que tratam os §§ 2.° e 3.°, não possam chegar a accordo para a nomeação do 5.° arbitro, será o tribunal arbitral presidido pelo juiz presidente do tribunal do commercio da cidade do Porto, o qual, no caso de empate, resolverá a questão, adoptando o parecer formulado por um dos lados, nos termos do citado artigo do referido codigo.
Fica revogado o contrato celebrado entre a camara municipal do Porto e a companhia portuense de illuminação a gaz, por escriptura de 1 de setembro de 1874, logo que principie a vigorar o presente contrato, nos termos da condição 36.ª
O que sendo ouvido pelo segundo outorgante Francisco Pinto de Miranda, foi por elle confirmado e acceite.
Assim o disseram, outorgaram e acceitaram de parte a parte na minha presença e das testemunhas José Maria Pinto Barbosa e Antonio Maria Pinto, empregados d'esta municipalidade, os quaes todos vão assignar depois de lhes ter sido lida por mim Antonio Augusto Alves de Sousa, escrivão e tabellião privativo da camara municipal, que a subscrevi e assigno, inutilisando uma estampilha do imposto do sêllo de 500 réis, que fiz collar n'esta escriptura, e resalvo a entrelinha = empregado como motor ou que for = a fl. 40.ª, na lin. 22.ª = Alexandre Carneiro de Vasconcellos, vice-presidente = Francisco Pinto de Miranda = José Maria Pinto Barbosa = Antonio Maria Pinto.
(Logar da estampilha acima mencionada.) = Antonio Augusto Alves de Sousa, escrivão e tabellião.
Está conforme. - Porto e paços do concelho, 18 de março de 1886. = O escrivão da camara, Antonio Augusto Alves de Sousa.
Foi approvado.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que a mesa fique auctorisada a gratificar os empregados das repartições d'esta camara, que a mesma mesa entenda serem merecedores d'essa recompensa, pelos serviços prestados nas ditas repartições.
Sala das sessões, 5 de abril de 1886. = A. Carrilho.
Foi admittida.

O sr. Santos Viegas: - O anno passado foi apresentada n'esta camara uma proposta em termos identicos, e por essa occasião eu perguntei á presidencia se tencionava gratificar todos os empregados, quaesquer que fossem as suas repartições e as suas categorias.
Foi dito n'esta occasião pela mesa que havia de incluir todos os empregados, incluindo tambem os praticantes de tachygraphia, conforme as suas graduações.
Pergunto a v. exa. se porventura está n'essa disposição, ou se então permitte que eu mande para a mesa uma proposta que signifique as minhas idéas de hoje, iguaes ás do anno passado.
O sr. Presidente: - V. exa. póde mandar para a mesa as propostas que entender convenientes.
Eu, por parte da mesa, não posso tomar compromissos em qualquer sentido sobre a distribuição das gratificações, mas sei que hei de proceder com a maior justiça e equidade.
Não sei como a mesa procedeu o anno passado com re-

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lação aos empregados da secretaria e tachygraphia, mas hei de informar-me, hei de proceder, repito, com a maior justiça e equidade.
O Orador: - N'esse caso não envio para a mesa a proposta, pois confio no caracter de v. exa., e portanto na justiça que ha de presidir á distribuição.
Já que estou com a palavra, mando para a mesa, em nome do sr. Filippe de Carvalho, os seguintes projectos de lei:
1.° Para que a todo o cidadão que receber vencimento mensal do thesouro comece o seu vencimento desde o dia 1 do mez seguinte ao do seu despacho, sendo os dias anteriormente decorridos sómente contados para os effeitos de aposentação, promoção e reforma;
2.° Auctorisando o governo a lançar um pequeno imposto addicional a todas as propriedades que, a titulo de privilegiadas, e portanto não vendaveis, andam fóra do commercio de compra, venda e hypothecas;
3.° Abolindo os passaportes para o estrangeiro;
4.° Fixando o imposto especial no consumo dos phosphoros.
Ficaram para segunda leitura.
Foi approvada a proposta apresentada pelo sr. Carrilho.
O sr. Germano de Sequeira: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se admitte que entre desde já em discussão o projecto n.° 40, que tem por fim modificar o artigo 66.° do codigo do processo civil.
Consultada a camara, dispensou o regimento e entrou em discussão o projecto n.° 46.
É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 46

Senhores. - A vossa commissão de legislação civil foi; presente a proposição de lei n.° 45-A, vinda da camara dos dignos pares, e que modifica algumas disposições do artigo 66.° do codigo de processo civil.
O bem elaborado relatorio que precede o projecto, e o parecer da illustrada commissão dos dignos pares, compendiaram muito substancialmente as rasões de conveniencia e necessidade para que seja alargado o praso das ferias, a que a ordenação, livro 3.°, titulo 18, chamou de colhimento de vinho e pão, e que já então eram de dois mezes, dadas pelos julgadores, segundo a disposição e neces-sidade das terras, com repartição do tempo ás sazões, e em prol commum do povo, segundo a phrase da mesma ordenação.
Effectivamente o praso que decorre desde 15 de agosto a l5 de outubro é propriamente aquelle, o das sazões, a que se refere aquella ordenação, e aquelle em que actua a força das colheitas de vinho e pão.
E sendo incontestavel que a cultura de vinho e cereaes tem consideravelmente augmentado n'este paiz, é tambem força concluir que no interesse dos povos se torna recommendavel o não serem elles afastados do serviço agricola e vinicola.
O projecto não augmenta o tempo das ferias, mas apenas altera a epocha d'ellas, supprimindo as do Natal e parte das da Paschoa, pois que n'esta epocha ficam apenas feriados os dias que decorrem desde o dia de Ramos a domingo de Paschoa.
Com esta alteração lucrará indubitavelmente o serviço publico com vantagem para os povos, para a expedição dos negocios forenses, e para o andamento e conclusão dos pleitos e processos, sem inconveniente para os casos em que leis especiaes fixam o mez de outubro para certos e determinados actos, porque a tudo o projecto providenceia com substituição pelo periodo que decorre desde 16 de outubro a 16 de novembro.
Sem querer alongar-se em mais considerações, o que seria, alem de inutil, tedioso, a vossa commissão, abundando nas idéas da dos dignos pares, que tem a honra de adoptar, e com accordo do governo, é de parecer que seja approvado o projecto a fim de ser levado á sancção real.
Sala das sessões da commissão de legislação civil, 3 de abril de 1886. = A. Neves Carneiro = Fernando Affonso Geraldes = Eduardo José Coelho = Pereira Leite = Martinho Camões = Joaquim Germano de Sequeira, relator.

Projecto de lei n.° 45-A

Artigo 1.° Os actos judiciaes não podem ser praticados:
1.° Nos dias santificados;
2.° Nos dias feriados;
3.° Durante as ferias.
§ 1.° São dias santificados os domingos e os dias santos, que a igreja manda guardar.
§ 2.° São feriados os dias de entrudo, de quarta feira de cinza, os de grande gala e os que forem declarados taes por decreto especial.
§ 3.° São de ferias os dias que decorrem desde l5 de agosto exclusive, até 15 de outubro inclusive, e desde domingo de Ramos a domingo de Paschoa.
§ 4.° Durante as ferias e nos dias santificados ou feriados, podem comtudo ter lugar as arrematações, e bem assim os actos indispensaveis para interromper a prescripção ou evitar qualquer damno irreparavel.
§ 5.° Durante as ferias, e nos dias feriados, que não forem santificados, podem instaurar-se e proseguir os processos que tiverem distribuição orphanologica ou especial, e quaesquer outros exceptuados por leis especiaes, e póde tambem proceder-se a vistoria e avaliação nas acções de expropriação por utilidade publica.
Art. 2.° Em todos os diplomas officiaes, nos quaes esteja designado o mez de outubro para qualquer acto de expediente ou julgamento judicial, será este periodo substituido pelo que decorre de 16 de outubro a 16 de novembro.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Palacio das côrtes, em 2 de abril de 1886. = A. M. da Fontes Pereira de Mello - Francisco Simões Margiochi, par do reino secretario.

O sr. Matoso Côrte Real: - Sr. presidente, pedi a palavra sem nenhuma idéa de convencer a camara sobre o assumpto de que trata o projecto.
Desejo sómente manifestar o meu voto e dar as rasões por que me não posso conformar com o parecer da illustre commissão de legislação.
Sr. presidente, eu não vejo que se alleguem no relatorio, que precede o projecto, rasões que possam convencer-me da necessidade de reformar a legislação vigente sobre ferias judiciaes. (Apoiados.)
Sr. presidente, eu considero que a alteração do praso das ferias, que se propõe no projecto, é altamente prejudicial ao regular andamento dos processos e aos legitimos interesses de grande numero de funccionarios judiciaes. (Apoiados.)
No projecto diz-se que acabam as ferias do Natal e da Paschoa, e eu sustento que, em vista das disposições do projecto em discussão, essas ferias não acabam inteiramente, e afigura-se-me mesmo, que continuarão como até agora. (Apoiados.)
Devo declarar a v. exa. e á camara que, nas considerações que estou fazendo, não sou movido por interesse proprio, nem desejo ser desagradavel a pessoa alguma. Procuro apenas desempenhar-me dos meus deveres de membro d'esta casa do parlamento. (Apoiados.)
Sr. presidente, no codigo do processo civil encontram-se disposições muito sensatas e muito expressas sobre ferias nos tribunaes judiciaes.
Eu vejo que com o projecto que se discute se vão alterar completamente essas disposições. E não posso deixar de notar que isto se faça por iniciativa da camara dos dignos pares do reino, onde sempre tem encontrado a mais

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decidida opposição os projectos tendentes a alterar as disposições dos nossos codigos. (Apoiados.)
Sr. presidente, parece-me que a ninguem aproveita que seja convertido em lei este projecto, a não ser aos magistrados superiores do ministerio publico do supremo tribunal de justiça e aos das relações, a cujo numero tenho a honra de pertencer.
Com respeito aos juizes de primeira instancia e empregados subalternos, eu posso assegurar á camara, sem receio de a enganar, que soffrerão muito nos seus interesses, que já são bem diminutos, se este projecto for convertido em lei. Parece-me que não serei exagerado dizendo que por esse modo ficarão reduzidos á fome muitos dos funccionarios, que não têem outros recursos alem d'aquelles que lhes provém do seu trabalho. (Apoiados.)
Sr. presidente, eu já disse e repito-o agora. Não é meu intento convencer esta camara da injustiça e inconveniencia d'este projecto.
O que eu desejo é que fiquem bem consignados os motivos, por que o não posso approvar. (Apoiados.)
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Eu nem vou discutir o projecto, nem consumirei com o que tenho a dizer muito tempo á camara. Este projecto não é de iniciativa do governo, mas sim de um digno par do reino, que o apresentou na outra casa do parlamento, como era do seu direito. Na respectiva commissão de legislação fui consultado sobre se estava ou não de accordo com elle. Eu respondi que estava de accordo com a materia do projecto, e esta não era opinião minha nova, se não já antiga, que até creio haver formulado por occasião da discussão do projecto do codigo do processo civil. Creio que o projecto não é de tantar importancia, que mereça as honras de largo discurso. É simples e claro e dispensa commentarios.
Apesar d'isso não posso, deixar de dirigir algumas palavras ao illustre deputado, e meu amigo o sr. Matoso.
S. exa., se bem ouvi, disse que este projecto a quem aproveitava era aos tribunaes superiores, emquanto, que os empregados dos juizes inferiores ficavam reduzidos á miseria. Eu, concordando com a materia d'esse projecto, o digno par que o apresentou, as commissões que o approvaram, e a camara dos dignos pares, acceitando essa doutrina, não tiveram em vista commodidade alguma particular para este ou aquelle tribunal, mas a conveniencia publica e geral, que entenderam dever d'elle resultar. Deizendo isto não faço senão inteira justiça ás intenções de todos.
Por ultimo, observarei que a proposta se limita a substituir as ferias da Paschoa e Natal, pelos ultimos quinze dias do mez de agosto, e pelos primeiros de outubro. Nada mais. Advertirei que é verdade ficar ainda de ferias a semana maior, mas lembro que d'esta semana dois dias são santificados, e por isso só ficam, alem d'estes, a segunda, terça quarta e sabbado, feriados.
Repito, este projecto não é da iniciativa do governo, mas concorda com a sua materia, e dito isto, não tenho mais a expor á camara.
O sr. Marçal Pacheco: - Abundo nas palavras sensatas que acaba de proferir, a proposito d'este projecto, o meu distincto amigo, o sr. Francisco Matoso.
V. exa. e a camara sabem os inconvenientes que ha na interrupção dos actos judiciaes em qualquer epocha do anno.
Este projecto tem por fim conceder mais feriados, e por consequencia os inconvenientes sobem de ponto.
Parece me que não haverá n'esta camara pessoa alguma que se lembre de imaginar que os actos dos tribunaes administrativos ou das secretarias d'estado são mais urgentes do que os actos judiciaes.
Em vista das declarações do sr. ministro da justiça, e não querendo causar lhe a menor difficuldade, não tenho duvida em votar o projecto em discussão, se s. exa. se compromette, pela sua parte, a acceitar a proposta que vou mandar para a mesa, e que passo a ler.
(Leu.)
Se a camara, no seu profundo bom senso, entender que este prejecto não deve ser approvado, eu retiro immediatamente a minha proposta; mas, se, por qualquer circumstancia, o sr. ministro da justiça insistir no proposito de convencer a camara da justiça d'este projecto e ella o votar, então insisto pela discussão e votação da minha proposta.
É escusado dizer que este assumpto é do conhecimento de nós todos, e por tal fórma intuitivo, que não desejo gastar muito tempo occupando a attenção da camara para mostrar os inconvenientes que resultam da approvação do projecto, inconvenientes que já foram apontados pelo sr. Francisco Matoso, que é um dos ornamentos mais distinctos da magistratura portugueza. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu.)
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que os dias considerados feriados por este projecto de lei para os tribunaes judiciaes, o sejam igualmente para os tribunaes administrativos e secretarias d'estado. = Marçal Pacheco.
Foi admittida.

O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Pedi novamente a palavra para declarar que não tenho que applicar qualquer principio com referencia a este projecto.
A intervenção do governo limita-se unicamente a dizer que concorda com a materia; tudo o mais é uma questão aberta com a camara, que a decidirá como lhe approuver.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Sobre este projecto de lei, cuja importancia não contesto nem defendo, vejo que vae levantar-se uma larga discussão, porque já estão inscriptos muitos oradores, e sendo urgente a approvação da lei de meios, peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que continue desde já a discussão da lei de meios, ficando para depois a discussão d'este projecto.
O sr. Presidente: - Eu já estava na intenção de interromper a discussão d'este projecto, para se continuar na discussão da lei de meios, e vae, portanto, passar-se á ordem do dia.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 41 (lei de meios)

O sr. Ferreira de Almeida: - Era intenção minha, tomando parte na discussão d'este projecto, propor um additamento em que se consubstanciassem os dois projectos de lei ultimamente apresentados a esta camara sobre a abolição do imposto do sal. A necessidade, porém, de dar andamento rapido a este projecto, faz com que eu desista da apresentação d'essa emenda, esperando e confiando muito que as commissões respectivas darão o devido parecer para a camara se pronunciar ainda n'esta sessão sobre similhante assumpto.
Uma camara, que assignál-a a sua passagem na historia parlamentar com uma magnanimidade munificente, auctorisando o pagamento das dividas da corôa pela alienação de bens nacionaes, na importancia de 1.000:000$000 réis nominaes, e este anno com a dadiva de 100:000$000 réis para festas reaes, póde muito bem dar 270:000$000 réis ás industrias mais pobres e precarias do paiz, abolindo de vez o imposto do sal. (Apoiados.)
Estâmos n'um periodo tal de harmonia e socego geral pela expectativa de um acontecimento auspicioso, que é necessario que as boas condições de vida e as alegrias in-

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timas venham desde o paço dos reis até á casa do pobre, e que a par de fartas doações haja umas migalhas para os que trabalham e contribuem, para os que luctam com os rudes labores da vida. (Apoiados.)
Repito, só considerações politicas e de deferencia pessoal me levaram a desistir de apresentar o additamento á lei que se discute, mas espero e confio muito que esta camara, que tão magnanima tem sido em liberdades, com os dinheiros contribuintes, e os valores nacionaes, tenha alguma contemplação com o mesmo contribuinte, aliviando-o do iniquo imposto do sal, que, alem de incidir sobre uma industria pobre, se reflecte duramente sobre a mais penosa de todas ellas, a da pesca.
A diminuição de 270:000$000 réis nas receitas do estado é tanto mais acceitavel, quanto se póde provar que as despezas publicas estão exageradas em muitos capitulos e n'outros duplicadas.
É assim que apparece, por exemplo, no orçamento do ministerio da fazenda, no artigo 35.°, a despeza com navios da esquadrilha do Algarve, que ha dois annos deixaram de existir, por terem sido desmanchados.
No artigo 34.º figuram de chefes de districtos commandantes de vapores que apparecem novamente no fim do artigo 35.º
Alem d'isto, a despeza com a esquadrilha da costa, está duplicada quasi completamente, porque, emquanto a respeito de soldos, se diz, que são pagos pelo ministerio da marinha; as gratificações, as comedorias e as despezas de material, figuram nos dois orçamentos sem designação alguma de annullação ou compensação; e até com a circumstancia notavel de figurarem, nos documentos que acompanham o orçamento do ministerio da marinha, com a designação de
«desenvolvimento do capitulo 2.°» os navios da esquadrilha da fiscalisação, sem declaração alguma especial, e com a mesma nota dos demais navios da marinha de guerra, de que as despezas do material vão incluidas na verba commum do orçamento da marinha, havendo tambem no da fazenda verbas correspondentes!
Podia indicar ainda outras reducções não com respeito a marinha como á administração colonial, onde só para passagens de funccionarios se consignam 80:000$000 réis; mas desde que annui, a não apresentar o additamento, abolindo o imposto do sal, para não alongar o debate, a analyse que fizesse agora das condições da nossa administração publica, podia acarretar os mesmos inconvenientes, vista a necessidade que o governo tem, que seja approvado o projecto em discussão.
Entretanto renovo as minhas instancias, para que a commissão de fazenda ou outra qualquer, a quem esteja affecto o projecto de lei sobre a abolição do imposto do sal, dê o seu parecer favoravel, para que esta camara complete a sua acção magnanima, com uma medida justa por mais de um titulo.
Bom é que a sua munificencia não seja só para a corôa; e se a despeza votada para o casamento do Principe Real, não vae alem do valor de uma estapilha de 25 réis por capitação, como já foi affirmado, não deixa de ser uma doação por uma vez de 100:000$000 réis, alem do augmento de 20:000$000 réis da dotação permanente; emquanto que o contribuinte, com a supressão dos 270:000$000 réis do imposto do sal, obtem apenas um bonus de 60 réis! (Apoiados.)
Assim, os auspiciosos acontecimentos que se esperam, não pertenceriam só á historia, gravar-se-íam no coração do povo, com a recordação associada de uma medida de generosidade que se recommenda por todos os titulos. (Apoiados.)
O sr. Consiglieri Pedroso: - Sr. presidente, se não fosse o excessivo zelo ministerial de um collega meu progressista que muito préso e estimo, o sr. Luiz José Dias, é provavel que a esta hora eu não fizesse uso da palavra, porque para o que eu tinha a dizer em resposta ao sr. ministro da fazenda bastariam apenas alguns minutos na sessão anterior.
Como, porém, este meu collega se esqueceu de seguir o conselho que um personagem, cujo nome agora não me lembro, dava constantemente aos seus servidores : et surtout pas trop de zèle! aconteceu que a sua impaciencia, para que esta discussão acabasse, só conseguiu protrahil-a mais! (Riso.)
Pouco é, ainda assim, o que eu tenho que responder.
A replica que me deu o sr. ministro da fazenda dispensava-se até de toda e qualquer resposta se n'ella não fossem feitas duas asserções que não posso deixar passar sem o devido correctivo.
O sr. ministro da fazenda limitou a defeza do procedimento do governo a tres pontos.
Em primeiro logar disse que eu não tinha comprehendido a declaração que s. exa. fizera na sessão de 6 de fevereiro, compromettendo se a empregar todos os esforços para que o orçamento fosse discutido n'esta sessão legislativa, com largueza.
Em segundo logar, o sr. Marianno de Carvalho declarou que o governo não póde, por fórma alguma, tomar a responsabilidade de consentir na discussão de um orçamento que não foi por elle elaborado.
Em terceiro logar affirmou o sr. ministro da fazenda que o governo não quer prescindir da lei de meios, por isso que se a não apresentasse se manifestaria uma crise politica de resultados incalculaveis.
(Pausa.)
Como o sr. ministro já me póde ouvir, continúo nas minhas considerações.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Eu costumo ler com os olhos e ouvir com os ouvidos. Estou ouvindo perfeitamente o illustre deputado.
O Orador: - Folgo com esta pericia do sr. ministro da fazenda; é mais uma prenda que lhe reconheço, (Riso.) e pela qual não posso deixar de o felicitar! (Riso.) Como não é essa, porém, uma qualidade muito commum nos ministros, e como alem d'isso destôa dos habitos d'esta casa, facil é de comprehender o meu reparo e a minha estranheza pelo facto de s. exa. não prestar attenção ás poucas palavras que eu estava proferindo.
Acabei de indicar á camara os tres pontos a que o sr.ministro entendeu dever reduzir a defeza do seu procedimento.
Com relação ao primeiro ponto direi apenas ao sr. ministro da fazenda que, por um recurso oratorio e parlamentar, muito usado por sua exa. n'esta sessão, mais uma vez me attribuiu a falta de não ter comprehendido as suas declarações, apesar de, segundo s. exa. diz, sempre timbrar em fazel-as tão claras que não seja facil haver illusões a respeito do sentido d'ellas.
Sem embargo d'esta asserção, que não é extremamente lisongeira para a agudeza do meu espirito, (Riso.) eu mantenho que s. exa. prometteu que empregaria todos os esforços para que se discutissem com largueza, note bem v. exa. com «largueza» o orçamento na presente sessão legislativa.
O orçamento não se discutiu. Mas diz-nos s. exa.: eu empreguei todos os esforços para que tal discussão se realisasse. Não duvido! Mas para me convencer esqueceu-se o sr. ministro da fazenda de mencionar que esforços tinham sido esses.
Acredito que seriam esforços tão herculeos como os do heroe da mythologia grega (Riso.) Mas declaro que fiquei perplexo qundo me recordei das declarações feitas pelo sr. Manuel d'Assumpção na sessão de hontem. Se houve embaraços para a discussão do orçamento deviam elles ter partido dos collegas do sr. Marianno de Carvalho que provavelmente queriam ser coherentes com as declarações que tinham feito no anno passado! (Apoiados.)
Da parte da maioria não, porque, conforme a declaração

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feita pelo illustre ex-ministro da justiça regenerador, a maioria acha inopportuna e inconveniente a apresentação da lei de meios, o que quer dizer que ella só accedeu, e ainda assim de má vontade, a votar a proposta ministerial, para não crear difficuldades ao governo, deixando-lhe comtudo toda a responsabilidade da apresentação de similhante documento.
N'estas circumstancias, como vem pois o sr. ministro dizer que empregou, para cumprir a sua promessa, todos os esforços e que só para evitar uma crise de resultados incalculaveis é que não levou por diante o proposito de fazer discutir o orçamento? Não comprehendo. Mais uma vez, na minha qualidade de beocio, e sirvo-me d'este euphemismo historico, visto que já hoje se fallou aqui em gregos (Riso.) não posso acompanhar o sr. ministro da fazenda na finura das suas respostas! (Riso.) O motivo allegado pelo governo não é portanto o verdadeiro. Se o sr. ministro da fazenda teve, repito, de empregar esforços para demover alguem, esse alguem não devia ser a maioria, mas os seus collegas no ministerio, que o anno passado opinavam em sentido diametralmente opposto, conforme as declarações terminantes, categoricas e expressas que hontem li á camara.
O segundo ponto da defeza do sr. ministro da fazenda, é que o governo não póde tomar a responsabilidade de consentir na discussão de um orçamento que não foi por elle formulado.
Mas, sr. presidente, eu offereço ao governo o ensejo de se apresentar para o anno n'esta casa como o salvador das nossas finanças arruinadas! E senão, vejamos: aceitava agora as verbas do orçamento, que a camara votasse, como um maximum de auctorisações, e depois, naturalmente o sr. Marianno de Carvalho com o seu programma de economia, dentro d'esse maximum realisava todas as eliminações de despeza que entendesse, e que já deve ter estudadas, visto que tanto clamou contra os desperdicios dos orçamentos regeneradores, apresentando para o anno, talvez pela primeira vez na nossa historia financeira, um orçamento rectificado de despeza menor que o correspondente orçamento de previsão. Offereço este meio ao governo para acrescentar a sua gloria (Riso.) e elle recusa-o!
E aqui está a replica ao que me respondeu o sr. ministro da fazenda; nada mais allegou s. exa. em sua defeza e portanto nada mais tenho a acrescentar ao que disse hontem. Pela primeira vez, creio que em sua vida, o sr. Marianno de Carvalho recuou perante a clareza das declarações do sr. presidente do conselho e ministro da justiça. Não tentou explical-as pela maneira que, não ha muito, n'uma discussão, já hoje celebre nos fastos parlamentares portuguezes, quiz interpretar umas conhecidas palavras do sr. ministro das obras publicas. E fez bem! Em certos casos o silencio é o unico recurso salvador; mesmo porque ha accusações que é melhor ouvil-as de cabeça baixa, tão grande é a sua força de evidencia!
A declaração do sr. presidente do conselho é uma d'essas; não ha habilidade dialectica que seja capaz de transformar-lhe o sentido! (Apoiados.)
Vou sentar-me, sr. presidente, mas como talvez seja esta a vez ultima que tenho a honra de fallar n'esta camara, direi ainda ao sr. ministro da fazenda, porque não desejo, sair daqui com o labéu de invejoso das felicidades alheias, que eu não sou «desmancha prazeres» como s. exa. disse. (Riso.)
Eu não desmacho os prazeres de ninguem e muito menos aquelles que derivam do auspicioso (é agora o termo consagrado para estes enlaces.) (Riso.) consorcio do governo com esta maioria. (Riso.)
Não tenho que ter ciumes, porque nunca requestei a noiva! (Riso.)
O sr. Marçal Pacheco: - Quem é a noiva? (Riso.)
O Orador: - Ora quem é?! É a maioria! (Riso.)
O governo hoje é o ditoso varão, apesar de ter já sido tambem noiva o anno passado, por um singular caso de hermaphroditismo politico! (Riso. - Apoiados.)
Não requestei nunca a noiva, repito, e portanto posso presencear as suas felicidades sem inveja e sem ciumes; oxalá que sejam tão felizes como merecem. (Riso), pois são dignos um do outro! (Riso.)
Uma voz: - E que tenham muitos filhos. (Riso.)
O Orador: - Isso não é provavel, porque estes casamentos hybridos são sempre infecundos! (Riso.)
Já hontem mesmo o requerimento de materia discutida do nosso collega, Luiz José Dias, foi um verdadeiro aborto! (Riso.)
Uma voz: - Alteri tempi.
O Orador: - Alteri tempi, alter pensière, assim dizia não ha muito o sr. José Luciano de Castro! Mas esqueçamos isso! Não quero lançar hoje, pela ultima vez que fallo, nota alguma funebre n'este coro de harmonias progressisto-regeneradoras, que é um verdadeiro epithalamio! (Riso.) Bem basta o que basta! Pois infelizmente parece que começa já a apparecer pelo ceu azul d'esta ventura conjugal os primeiros e fatidicos signaes de proxima borrasca, não só fóra, mas na propria casa do ministerio, como se póde deprehender da eloquente sessão de hoje.
(Interrupção.)
Também isso acontece ás vezes! Por causa de amores illegitimos fóra do lar domestico, perde-se não raro a tranquillidade que deve existir no seio da familia! (Riso.)
E afigura-se-me que ha desgostos na familia progressista!... (Riso.)
Emfim continuem, se podem a viver, n'este doce enleio. Oxalá que os correligionarios da provincia lh'o consintam! Riso.)
Eu só lhes lembro duas cousas. Em primeiro logar que, para a honestidade dos partidos, vale a pena reflectir um pouco no velho aphorismo que exige que a mulher de Cesar nem sequer seja suspeita. Ora, o governo se ainda não é César, prepara-se pelo menos para sel-o. E por isso talvez faça mal em abrir tão descuidadosamente os braços a quem não ha muito tempo ainda assoalhava por essas gazetas e jornaes, como impudica Messalina... politica!
A segunda cousa que eu lembro á maioria e ao governo, é que se este casamento é d'aquelles que se chamam de paixão, devem estar muito prevenidos, porque ás vezes as uniões assim acabara por um ruidoso divorcio, com separação de pessoa e bens! (Riso.)
E depois lá virão os frios e as neves de janeiro, que hão de forçosamente accalmar este ardor! (Riso.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Não entro n'uma discussão com o illustre deputado ácerca das espirituosissimas apreciações feitas por s. exa. a respeito do accordo perfeitamente sensato e patriotico feito entre o governo e a maioria sobre a melhor maneira de encaminhar os negocios publicos na actual conjuntura.
Responderei apenas a dois argumentos adduzidos por s. exa. O primeiro é que não teve noticia de eu ter feito muitos esforços para conseguir que se discutisse o orçamento.
Devo dizer a s. exa. que muitos dos phenomenos mais portentosos da natureza realisam-se muitas vezes sem menor ruido. A terra move-se em torno do seu eixo e em torno do sol, e em roda d'este astro se move igualmente todo o systema planetario sem nenhum ruido.
Posso assegurar ao illustre deputado que fiz diligencias para se discutir o orçamento, mas que perdi a esperança de o poder conseguir, e no ponto em que s. exa. parecia querer a discussão do orçamento, tal discussão era inutil.
A discussão do orçamento devia servir principalmente para reduzir as despezas.
O sr. deputado achava uma verba qualquer do orçamento excessiva; o governo declarava que estava de accordo, e votava-se a verba como se fosse o maximo. Todos concordavam em que se gastava de mais, mas manti-

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nha-se a verba como o maximo a que a despeza podia attingir, e as cousas continuavam no mesmo pé.
Por consequencia, na altura em que está a sessão, o governo entendeu que era impossivel deixar de pedir ao parlamento a votação da lei de meios, e é o que fez.
O sr. Marçal Pacheco: - Por parte da commissão de fazenda e de saude publica mando para a mesa o parecer sobre a proposta de lei destinada a pôr em vigor algumas das disposições das leis de 1854 e 1855 no tocante ao cholera.
Peço a v. exa. que consulte a camara se permitte a dispensa do regimento para que, logo que termine esta discussão em que estamos empenhados, se discuta o parecer que mando para a mesa.
E visto que estou com a palavra, permitta-me v. exa. que eu diga algumas palavras de explicação em resposta a outras do meu particular amigo o sr. Ferreira de Almeida.
Disse s. exa. que esta camara que tinha sido magnanima em doações ao soberano, o devia ser tambem em relação ao povo.
Ora eu não me levanto para defender a maioria nem para dar explicações por parte d'ella porque não tenho incumbencia para isso. Fallo em meu nome por ter approvado alguns dos projectos a que evidentemente se referiram aquellas phrases de s. exa.
Votei o anno passado o projecto respeitante a uma venda de inscripções da casa real, não como uma doação á casa real, mas como uma medida de mera administração, e este anno votei o projecto apresentado pelo governo, não como doação ao soberano, mas como medida de conveniencia para o paiz, porque um paiz que é monarchico tem obrigação de pagar o fausto, as despezas de representação para o brilho e prestigio das instituições monarchicas. (Apoiados.)
Quem quer reis paga-lhes. Eu que sou monarchico entendo que aquelle projecto representa uma verdadeira necessidade publica. (Apoiados.)
Por minha parte declaro, pois, que não fiz a minima doação nem ao soberano verdadeiro nem ao soberano da canna verde, como quiz insinuar o illustre deputado que nós chamavamos ao povo; (Riso); votei, como entendi na soberania da minha consciencia e na liberdade da minha apreciação, aquelle projecto por entender que representava um principio de justiça e de conveniencia social.
O facto, porém, de eu fazer justiça ás instituições monarchicas não me impediu de fórma alguma de fazer justiça ao povo, que não é uma cousa separada da monarchia; porque igualmente votei o anno passado uma diminuição no imposto do sal, e na commissão de fazenda até propuz a sua abolição, entendendo, como o illustre deputado, que aquelle imposto é vexatorio para as classes desvalidas, sobre as quaes principalmente incide e a quem mais directamente diz respeito.
Esta distincção entre nós, os monarchas e o povo, é inteiramente falsa. Monarcha, nós e povo, constituimos uma só collectividade que se chama a nação portugueza. (Apoiados.)
O sr. Fuschini: - (O discurso será publicado quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Carrilho: - Sr. presidente, eu não tenho necessidade de defender o parecer, mas careço de explicar a rasão por que o assignei. Assignei-o, não pelas rasões apresentadas n'esta camara pelo illustre meu collega e amigo e distincto parlamentar o sr. Manuel d'Assumpção de que julgava desnecessaria e inconveniente, na presente conjunctura e na altura em que vae a sessão, a apresentação da lei de meios. A lei de meios foi apresentada no ultimo dia do praso normal de sessão legislativa e o chefe do partido regenerador concordou em que não se podia deixar de dar ao governo actual os meios indispensaveis para elle poder governar constitucionalmente.
A proposta foi apresentada, mutatis-mutandis, nos mesmos termos em que as dos exercicios anteriores tiveram a approvação das côrtes, e eu acceitei-a e approvei-a exactamente como o faria ao partido regenerador; acceitei-a, porque entendi que, na altura em que vae a sessão e nas circumstancias especiaes em que o meu partido se encontra em face do governo, era de necessidade urgente approval-a nas mesmas condições em que a approvaria, ao governo, saido do campo regenerador.
Se eu entendesse que a proposta era desnecessaria e inconveniente, dou a minha palavra de honra a v. exa. e á camara que a não tinha acceitado, porque não voto cousas que sejam desnecessarias e inconvenientes na administração do estado.
Quanto á rasão por que, apresentado o orçamento, não foi elle discutido de preferencia á lei de meios, sem explicar a rasão porque a maioria tem collaborado com o governo na votação de todas as providencias indispensaveis para o andamento dos negocios publicos, não as dou porque já foram dadas pelo sr. conselheiro Fontes Pereira de Mello.
Acceitei n'este caso as indicações do chefe e indicações perfeitamente conformes com as necessidades.
Parece-me que a maioria se tem comportado como devia n'estas circumstancias, attendendo exclusivamente aos verdadeiros interesses do paiz e seguindo o caminho, o unico que devia seguir, o que muito o honra e demonstra a sua abnegação ,e patriotismo.
Dito isto, nada mais teria a acrescentar se não tivesse que oppôr uns reparos á observação feita pelo sr. Ferreira de Almeida, que accusou no orçamento de 1886-1887 uns erros que, ou já estão corrigidos, ou que n'elle não existem.
Disse s. exa. que havia uma duplicação na despeza com a esquadrilha fiscal, e que estava inscripta no ministerio da marinha e no da fazenda.
Perdoe-me s. exa. que lhe diga achar-se laborando em erro.
No ministerio da fazenda estão inscriptos todos os encargos que por elle hão de ser pagos com o pessoal da fiscalisação maritima, e no ministerio da marinha estão inscriptos os vencimentos ordinarios dos officiaes e praças de pret da competencia do mesmo ministerio, que funccionam na dita esquadrilha.
Em cada orçamento está pois descripta a verba competente sem duplicação.
Emquanto aos navios que s. exa. disse que já não estavam em serviço, já um documento official, presente a esta camara, corrigiu o erro que se encontrava no orçamento de 1886-1887.
Esse erro foi corrigido no parecer do orçamento rectificado, que esta camara discutiu e que diz o seguinte:
«Artigo 32.° A esquadrilha da costa. - Declarar que se compõe actualmente das canhoneiras Tavira, Faro e Lagos e de um deposito em Faro.»
Portanto, o erro que estava no orçamento geral do estado para o anno futuro e que tinha sido impresso muito antes da apresentação d'este parecer, esse erro já está corrigido, pelo menos desde o dia 9 de fevereiro ultimo.
Nada mais acrescentarei, porque a camara quer votar o projecto e eu não desejo demorar essa votação.
O sr. Ferreira de Almeida: - Desculpe-me a camara que, por necessidade de dar-lhe algumas explicações, eu volte a tomar a palavra.
Não pretendi fazer censuras á camara por ter votado determinadas medidas, nem a presidencia m'o permittiria, nem eu era capaz de similhante falta de delicadeza, para quem tão bem me tem recebido.
A camara, na sua plena soberania, tem votado diversos subsidios para occorrer ás necessidades da representação do systema que nos rege, e que eu acompanho com toda a consideração,

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É necessario que se dê todo o esplendor e todo o brilho aos representantes das instituições que nos regem, porque é essa a fórma de se imporem ao respeito das massas; mas não é menos certo, que muito ganham essas instituições, e o prestigio dos seus representantes, sempre que, alem do respeito que se impõe pela hierarchia e pelo fausto, se póde conquistar o amor dos povos por meio de medidas de justiça e de reparação, dos males, que os affligem, e dos vexames que soarem; e desde que esta camara pôde occupar-se das necessidades do fausto e prestigio idos grandes, desde que esta epocha vae ser assignalada na historia por um acontecimento auspicioso que determinou algumas d'essas medidas, justo e, e necessario, no interesse das instituições, que a camara se occupe tambem das necessidades e condições da vida do contribuinte, e faça gravar no coração de cada um esta data memoravel, com uma medida de reparação, e, agora mais que nunca, de equidade. (Apoiados.)
Então esta camara, que reconstituiu, em parte, o pacto fundamental e as finanças da corôa, terá bem merecido da patria, por lhe conquistar o amor do povo, com a abolição de um imposto iniquo e vexatorio.
Tenho dito.
O sr. Presidente: - Como não ha mais ninguem inscripto vae votar-se o projecto.
Leu-se na mesa a moção apresentada na ultima sessão pelo sr. Consiglieri Pedroso, e foi rejeitada.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se quer votação nominal sobre o projecto.
Consultada a camara resolveu negativamente.
Posto a votação o projecto n.° 41, foi approvado.
O additamento ao § 4.° do artigo, apresentado pela commissão, foi approvado.
o sr. Presidente: - O sr. deputado Marçal Pacheco mandou há pouco para a mesa, por parte das commissões de fazenda e de saude, um parecer e requereu a dispensa do regimento a fim de entrar hoje mesmo em discussão.
Vou consultar a camara.
Consultada a camara, decidiu affirmativamente.
Leu-se na mesa o parecer.
É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 50

Senhores. - Ás vossas commissões reunidas de fazenda e de saude foi presente a proposta de lei n.° 46-A, tendente a pôr em vigor algumas das disposições das leis de 10 de janeiro de 1854 e 5 de julho de 1855. Ás vossas commissões, attendendo á importancia e gravidade do assumpto, são de parecer que a proposta do governo deve ser approvada e convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Continuam em vigor até ao fim do anno economico futuro as disposições dos artigos 2.° e 3.° da carta de lei de 10 de janeiro de 1854, e as dos artigos 1.°, 3.° e 4.°, que a elles se referem, da lei de 5 de julho de 1855.
Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações que lhe são concedidas.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 5 de abril de 1886. = José Azevedo Castello Branco = L. Cordeiro = Francisco de Castro Matoso = M. d'Assumpção = E. J. Coelho = Carlos Lobo d'Avila = A. M. da Cunha Bellem = A. Carrilho = Adolpho Pimentel = Agostinho Lucio = Antonio Freire Garcia Lobo = Arthur Hintze Ribeiro = Marçal Pacheco, relator. = Tem voto do sr. F. de Carvalho.

N.º 46-A

Senhores.- Finda em 30 do mez de junho proximo a auctorisação que a lei de 27 de junho de 1885, pondo em vigor as disposições das cartas de lei de 10 de janeiro de 1854 e de 5 de julho de 1855, deu ao governo para tomar as extraordinarias providencias sanitarias que fossem indispensaveis para preservar o reino da invasão da cholera morbus, ou para a debellar, se não se podesse evitar a invasão.
A persistencia de tão horrivel flagello na Europa, o legitimo receio de que tome incremento na estação calmosa, e o risco resultante da nossa posição geographica, demonstram incontestavelmente a necessidade de nos precavermos contra tamanho perigo.
Por esse motivo, e para que se possa continuar aproveitando diversas medidas para tal fim adoptadas, carece o governo de que lhe seja prorogada aquella auctorisação na parte respectiva ás faculdades extraordinarias a que se referem aquellas leis, propondo-se abrir successivamente, nos termos do artigo 51.° do regulamento geral da contabilidade, quaesquer creditos extraordinarios que se tornem indispensaveis, pelo que temos a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° Continuam em vigor, até ao fim do anno economico futuro, as diposições dos artigos 2.° e 3.° da carta de lei de 10 de janeiro de 1854, é as dos artigos 1.°, 3.° e 4.°, que a elles se referem, da lei de 5 de julho de 1855.
Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações que lhe são concedidas.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 1 de abril de 1886. = José Luciano de Castro = Francisco Antonio da Veiga Beirão = Marianno Cyrillo de Carvalho = Visconde de S. Januario = Henrique de Macedo = Henrique de Barros Gomes = Emygdio Julio Navarro.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Sr. presidente, a hora está adiantada e o assumpto que vae discutir-se é bastante importante para que o votemos sem previo exame e estudo. Está ainda na memoria de todos o debate que em duas sessões legislativas consecutivas um assumpto analogo levantou n'esta casa do parlamento.
Alem d'isso não vejo que haja urgencia immediata da votação d'este projecto na sessão de hoje.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Este projecto é urgente.
O Orador: Desde que um membro do gabinete declara que é urgente a votação deste projecto, não me opponho a que entre em discussão desde já, deixando no entretanto ao governo a responsabilidade de tão grave declaração!
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Pedi a palavra para confirmar a minha interrupção.
O governo considera este projecto o mais urgente possivel, por isso que todas as informações officiaes dizem que o cholera reappareceu em Hespanha, e portanto é necessario que o governo fique auctorisado a empregar as medidas sanitarias que forem convenientes.
O sr. Consiglieri Pedroso: - N'esse caso peço a palavra sobre o projecto, e rogo a v. exa., sr. presidente, o favor de me mandar o original que está sobre a mesa, a fim de o lor ao menos, visto que a camara acaba de dispensar a impressão.
O sr. Presidente: - Vae ser satisfeito o pedido do illustre deputado.
(Pausa.)
O sr. Consiglieri Pedroso: - Acabo de passar rapidamente pela vista a proposta de lei do governo, acompanhada do respectivo parecer das commissões de fazenda e de saude publica, e, sem querer protrahir a votação de um assumpto que já foi reputado urgente, direi comtudo algumas palavras com o fim de justificar o meu voto.
Com espanto meu não vejo inserida n'este projecto uma clausula que tão calorosamente foi reclamada por toda a

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opposição progressista d'esta camara era duas sessões consequtivas.
O governo não pede uma imitação de verba para as despezas a fazer. De fórma que vamos caír nos mesmos abusos em que caímos em 1884 e 1885, e que tão censurados aqui foram.
Tendo então a maioria votado ao governo os meios para fazer face aos indispensaveis gastos com as medidas contra o cholera, encontramo-nos no primeiro anno com uma despeza de 472:000$000 réis, pouco mais ou menos.
No segundo anno as despezas ascenderam, conforme todos sabem, a 1:260:000$000 réis no orçamento rectificado!
Não quero adiantar-me em mais considerações a este proposito, sem que o sr. ministro da fazenda, no caso de não ser exacta a maneira como eu interpreto o pedido do governo, destrua o equivoco em que estou laborando por virtude da leitura rapida que fui obrigado a fazer d'este documento.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Eu respondo duas cousas muito singelas. Em primeiro logar eu attendi á posição reciproca em que se encontra a maioria e o governo. O governo tem sempre de ter em attenção não melindrar a maioria. A segunda rasão é que o governo só se póde comprometter a gastar o que for strictamente indispensavel e ficar muito áquem do que se gastou n'essas epochas; fixar desde já o que se ha de gastar, não posso fazer de maneira nenhuma.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Sr. presidente, é difficil em verdade a quem não está iniciado no segredo d'estes melindres da maioria, saber quando ella se escandalisa ou não! (Riso.)
Agora a resposta favorita e predilecta do sr. ministro da fazenda, que parece estar arrematando para si as funcções de todo o ministerio, é a constante desculpa com a posição reciproca do governo e da camara: «eu não posso», eis as palavras fatidicas, (Riso.) «para não melindrar a maioria, propor uma cousa que não seja do seu agrado». E n'isto se cifra tudo!
Depois das mostras inequivocas de toda a maioria se empenhar em não promover attritos ao governo, não se comprehende bem esta permanente ceremonia!
O que seria se as relações não fossem tão amigaveis! (Riso.)
Demais, sr. presidente, a resposta que acaba de dar o sr. ministro da fazenda, de que se compromette a não gastar senão o strictamente necessario, não póde satisfazer-me.
Se s. exa. me perguntar se eu acredito pessoalmente na sua palavra como homem, digo-lhe que sim; mas como ministro o caso é diverso, pois, na minha qualidade de deputado de opposição aberta ao ministerio, não posso acceitar de ministro algum taes promettimentos.
Recordo-me dos micobrios de variadas fórmas e feitios, que alimentaram em vez de destruirem os 472:000$000 réis de 1884, e os 1.260:000$000 réis de 1880. (Riso.)
Longe de mim o dizer que o governo não tenha immediatamente que combater o flagello do cholera, se porventura elle se approximar, como o anno passado, da nossa fronteira; mas, sr. presidente, a natureza humana é fallivel e esta harmonia em que estão gregos e troianos não me faz muito bem augurar do resultado das economias promettidas. (Riso.)
Abstenho-me de fazer mais considerações, mesmo porque começo a estar cansado. O sr. ministro da fazenda deve estar fatigado tambem de me repetir sempre as mesmas respostas... que nada respondem, e a mim não me é extremamente agradavel passar sessões inteiras a dirigir ao governo sempre as mesmas perguntas!
As minhas palavras têem sido, alem d'isso, sufficientemente claras para que n'este ponto não possa haver equivocos.
É inutil continuar a insistir n'ellas com mais calor ou com mais vehemencia.
No entretanto fique bem consignado que era exactamente assim que respondiam os ministros regeneradores!
Em todo o caso pergunto ao governo se tem duvida em acceitar uma limitação de quantia, que eu proponha como additamento a este projecto.
(Interrupção.)
Bem sei que a camara approva o que quer, mas o governo acceita ou não acceita a limitação proposta?
(Interrupção.)
Se a proposta já estava combinada de antemão...
(Interrupção.)
Nós não estâmos aqui unicamente para effeitos theatraes, e por isso eu contento me, com esta pergunta, que deixo feita ao governo.
Se elle responder no sentido affirmativo, então formularei a minha proposta.
O governo fará aquillo que entender, na certeza de que a responsabilidade é toda sua.
Pelo que me toca tenho a minha posição bem definida n'este assumpto.
E para o partido que represento é isso por agora quanto basta. Vejo, porém, com mágua que as cousas seguem o mesmo rumo ; e a não ser que o interregno parlamentar nos traga alguma surpreza, ou novidade, é caso de repetir melancolicamente os versos de uma conhecida opereta:

Não valia, por vida minha, a pena, não,
Mudar de governo a nação! (Riso.)

Tenho concluido.
O sr. Marçal Pacheco (relator): - Por parte das commissões de fazenda e saude publica tenho a declarar a v. exa. e á camara que não posso acceitar a proposta verbal feita pelo sr. Consiglieri Pedroso.
Entendemos que em face de um perigo ,d'esta ordem, de uma ameaça tão terrivel, como é a da invasão do cholera, não devemos limitar a acção do governo.
Como v. exa. vê o projecto das commissões reunidas termina dizendo que o governo dará conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação. O illustre deputado, como digno membro que é d'esta camara, no uso da sua iniciativa parlamentar terá de certo occasião de perguntar ao governo o que fez da auctorisação concedida pelo parlamento, e de lhe tomar strictas contas pela maneira porque elle despendeu os dinheiros publicos.
Deixemos ao governo toda a liberdade, ficando-lhe toda a responsabilidade.
Por isso nada importa que nós marquemos qualquer cifra.
Creio que n'esta parte o governo não é contradictorio com o seu procedimento dos do anno passado, quando os seus membros se sentavam nas cadeiras da opposição.
N'essa epocha desejavam s. exas. que a verba fosse limitada a 100:000$000 réis, mas não tinham duvida, se bem me recordo, em dar auctorisação ao governo para levantar successivamente creditos na importancia que fosse necessaria para occorrer ás despezas. (Apoiados.)
O governo em vez de pedir auctorisação para gastar 100:000$000 ou 150:000$000 réis, limita-se a pedir auctorisação para pôr em pratica medidas extraordinarias, colhendo os meios necessarios com creditos extraordinarios, successivamente abertos, nos termos do regulamento geral de contabilidade. (Apoiados.)
O governo talvez para querer ser coherente com o seu procedimento o anno passado limitou mais a sua acção; mas declaro a v. exa., em nome das commissões reunidas, que se elle não fizesse esta restricção e quizesse formular o mesmo pedido que fez o governo que geria então os negocios publicos, votar-lho-íamos da mesma sorte, porque, em presença de um perigo, de uma necessidade d'esta ordem, não devemos estar a embaraçar a acção do governo, assu-

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mindo assim a responsabilidade do governo não ter a sua acção prompta e liberrima para poder combater o mal na hypothese funesta de uma invasão. (Apoiados.)
Creio, pois, que tudo se reduz, quando muito, a uma pequenissima incoherencia de pedir mais ou pedir menos. Mas isso é uma questão tão pequena em face da magnitude do assumpto, que eu invoco o patriotismo do illustre deputado para escolher melhor e mais azada occasião para confrontar as idéas do governo com as que tinham os seus membros quando opposição.
Para se confrontar as idéas do governo e as idéas da opposição, as idéas que se têem na opposição e que se professam nos bancos do poder, ha sempre tempo.
N'este momento é mais do que inopportuna.
Para pensar assim não é preciso imaginar accordos e allianças que o illustre deputado está a ver a cada passo, e que eu, que estou dentro d'essa alliança, não vejo.
Basta sómente e unicamente que qualquer de nós se inspire nos conselhos da prudencia e bom senso para votar este projecto de lei tanto a este governo como a qualquer outro.
Deu-se conta da ultima redacção do projecto n.° 41. Foi approvada.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Não era necessario que o illustre deputado, que acaba de fallar, invocasse o meu patriotismo a proposito d'esta questão. S. exa. sabe que, embora firme nas minhas idéas e nos meus propositos, nunca procurei fazer questão partidria de nenhum assumpto que interessasse verdadeiramente ao nosso paiz. (Apoiados.) Não é tambem necessario que o illustre deputado me lembre, que não é esta a occasião propria nem o momento opportuno para vir fazer escavações nos annaes parlamentares, a fim de confrontar as opiniões actuaes dos srs. ministros com as opiniões que s. exas. tinham em outro tempo.

enho demonstrado á camara e aos proprios srs. ministros, e serão elles os primeiros a confirmar a verdade das minhas palavras, que só faço essas escavações em ultimo caso, e quando são strictamente indispensaveis.
Não é por querer alludir ás opiniões que eram apresentadas n'esta camara o anno passado, com o proposito de accentuar quaesquer incoherencias, que eu por vezes as invoco. Não tenho culpa de ter feito a minha iniciação parlamentar ao lado de um grupo politico que sustentou certas e determinadas doutrinas, que elle proprio renegou, mas que eu continuo a considerar como as mais justas!
Conservo-me no meu posto; se alguem mudou não fui de certo eu!
Diz o illustre deputado que o governo, aparte uma pequena incoherencia com relação ao seu proceder na sessão passada, seguiu as normas indicadas para uma questão d'esta ordem. Deixo á camara e ao governo o calcularem as proporções que assumiria, na boca do sr. Marçal Pacheco esta delicada e amoravel expressão pequena incoherencia, se porventura não vigorasse o regimen do novo accordo! (Riso.)
Mas, para voltar á questão que nos occupa, direi ainda que não comprehendo a teima do governo.
O systema mais facil, mais proprio, e principalmente mais parlamentar, era o seguinte: o ministerio pedia uma auctorisação limitada para dentro d'essa auctorisação fazer as despezas que julgasse indispensaveis; depois o regulamento de contabilidade publica determina as formalidades a cumprir para se abrirem creditos supplementares, no caso de serem infelizmente precisos. Era este o bom caminho!
Voto, pois, contra a não limitação dos creditos, mas não, entenda-se bem, contra a necessidade do governo se armar com todos os meios que julgar necessarios para combater o flagello do cholera, se elle ameaçar o paiz. Fique este ponto bem consignado. Não voto contra a necessidade dos creditos; nunca recusaria isso a qualquer governo, pois seria um crime de leso-patriotismo, de leso-interesse
publico, proceder de similhante fórma. Voto simplesmente contra a não limitação da verba dentro da qual o governo tenha de fazer as despezas.
Tenho dito.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - O illustre deputado tem estado a laborar n'um equivoco. O governo não pede nenhuma auctorisação para gastar qualquer quantia. Para isso não é preciso esta lei. O que o governo pede é que lhe seja concedida a faculdade de poder tomar providencias administrativas, especiaes e extraordinarias para este caso.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Mas o sr. ministro, quando pela primeira vez me respondeu, disse que o governo pedia auctorisação financeira, dando depois conta ás côrtes do uso que d'ella fizesse.
O Orador: - Eu tenho por costume responder só áquillo que me perguntam. O illustre deputado perguntou se eu acceitava a limitação da verba. E o governo respondeu que não a acceitava por dois motivos. Primeiro, por que não queria praticar um acto que reputava uma indelicadeza para com a maioria. Isto não é o resultado de factos, nem de cousa alguma occulta, porque a não ha. Tudo é bem patente, leal e franco. O governo não pede senão o necessario para poder governar, e a maioria não concede senão isso.
O segundo motivo, foi que o governo daria conta ás côrtes das providencias que tomasse, e que para as executar gastaria o menos possivel. Nada mais respondia, porque s. exa. nada mais perguntava. E de mais a mais isto era n'uma interrupção a s. exa.
Agora repare bem o illustre deputado para a redacção do preambulo e do artigo 1.°
(Leu.)
Quer dizer que, se para combater o cholera o governo entendesse que bastavam as faculdades ordinarias de administrador, não traria esta proposta de lei, porque para isso estava auctorisado pelo regulamento geral de contabilidade. Mas como o governo calcula, o todos os illustres deputados calcularão, que, alem das providencias ordinarias e administrativas é necessario adoptar providencias extraornarias sem pedir auctorisação para as adoptar.
Não pede para abrir creditos extraordinarios porque não precisa de auctorisação do parlamento para isso para casos d'estes. E aqui é que está a confusão do illustre deputado.
Para que servia praticamente fixar á camara a quantia de 100:000$000 réis, por exemplo? Isso seria uma perfeita puerilidade, permitta-me s. exa. que lh'o diga, sem idéa de o melindrar nem de o offender.

s estações officiaes, quando encontram limites n'uma verba, entendera que podem gastar tanto, embora não seja necessario.
O anno passado, quando era menos perigosa a invasão do cholera do que actualmente, porque está hoje mais proxima da nossa fronteira e até em subditos portuguezes, dizia-se ao governo: ou limite os creditos, ou contente-se com os recursos que lhe dá o regulamento geral de contabilidade. E o governo com a consciencia da sua responsabilidade e a responsabilidade das suas acções, não quiz acceitar este alvitre.
Este anno o actual gabinete para não melindrar a maioria, não acceita aquillo que a maioria o anno passado rejeitou, e acceitou a segunda parte da questão.
O governo não pede auctorisação para gastar nenhuma cousa fóra dos limites marcados no regulamento geral da contabilidade publica; simplesmente pede auctorisação para tomar providencias administrativas extraordinarias, e nada mais.
Aqui é que está a differença.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Urbano de Castro: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara se quer que entre em discussão o projecto n.° 47.

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O sr. Presidente: - Eu não posso consultar a camara sobre o requerimento do illustre deputado emquanto não terminar a discussão do projecto que está pendente. (Apoiados.)
O sr. Urbano de Castro: - Em findando esta discussão.
O sr. Presidente: - Em findando esta discussão consultarei a camara.
O sr. Bernardino Machado: - Disse que ouvira a alguns dos senhores ministros que a discussão do projecto era urgente, porque em Hespanha recrudescera novamente o cholera; sendo assim, o projecto tinha uma applicação immediata, e na sua opinião, o primeiro credito devia ser estabelecido pela lei, ficando ao governo o recurso dos creditos extraordinarios para occorrer ás necessidades supervenientes.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - É urgente estar armado com os recursos extraordinarios.
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barros Gomes): - A urgencia nasce das circumstancias em que se encontra o governo e a camara, na presença do adiantamento dos trabalhos parlamentares, e de se não póde fechar a camara sem que o governo esteja munido de certas faculdades que entende indispensaveis para tomar providencias nos casos que ellas sejam reclamadas pela necessidade.
Quanto á questão da coherencia de doutrinas affirmadas pelos membros do partido progressista, quando opposição e quando governo, direi ao illustre deputado que, para o parlamento, as maiores garantias são as que se dão no projecto do governo; nós não pedimos 30:000$000, 40:000$000 nem 100:000$000 réis. Se amanhã for necessario abrir um credito de 5:000$000 réis, limitâmos a essa verba unica e exclusivamente o pedido. Levamos o credito extraordinario ao conselho d'estado e damos conta ao publico, publicando no Diario do governo o respectivo credito, e assim o parlamento e o publico irão sabendo o que se gasta, podendo por este modo fazer-se a fiscalisação, mesmo na ausencia do parlamento.
N'estes termos, para que servia fixar-se já uma verba, não se sabendo qual ella deveria ser? Damos mais garantias para a fiscalisação dos dinheiro pelo processo que propomos, que é o que se conforma mais com o regulamento da contabilidade.
Parece-me que tenho satisfeito ás perguntas do illustre deputado o sr. Bernardino Machado.
O sr. Fuschini: - (O discurso será publicado quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Carrilho: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara se quer prorogar a sessão, se for preciso, até se votar este projecto.
Consultada a camara, resolveu affirmativamente.
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barros Gomes): - Responderei em breves palavras ás considerações do illustre deputado.
O governo não trata aqui de pedir auctorisação para consultar o conselho d'estado. Do que se trata é de pedir auctorisação ao parlamento para abrir creditos extraordinarios. A fórma por que os ha de abrir está prescripta no regulamento geral de contabilidade. O governo pede auctorisação para pôr em pratica medidas extraordinarias; mais nada.
Se, porventura, o sr. Fuschini quer agora entrar n'uma discussão ácerca da utilidade ou inconveniencia de para a abertura d'estes creditos, ser ouvido o conselho d'estado, vamos deslocar a questão...
O sr. Marçal Pacheco: - O meu distincto amigo e collega, sr. Fuschini, quer ser mais ministerial do que o ministerio, receiando que este derive de si a responsabilidade para o conselho d'estado. Mas, francamente, não me parece que as rasões que s. exa. deu auctorisem a isso.
Eu entendo que em caso algum este governo, ou outro qualquer, póde cobrir-se com uma consulta do conselho d'estado; (Apoiados.) nem me parece que as consultas, ou votos consultivos, tenham a natureza que o illustre deputado lhes attribue.
Se assim fosse não existiriam agora nas leis as juntas consultivas da camara municipal de Lisboa, que foram constituidas sob inspiração do sr. Fuschini, que tantos inconvenientes lhe acha agora.
Em tempo algum os corpos consultivos aliviaram da responsabilidade a pessoa que os consulta e resolve depois como quer.
Este receio de s. exa., de que a consulta do conselho d'estado póde considerar-se como um estorvo, é infundado; porque nem este governo, e eu estou argumentando em conformidade com os preceitos constitucionaes, nem qualquer outro, se lembrará nunca de se isentar da sua responsabilidade, invocando a doutrina de qualquer consulta. Isto seria uma jurisprudencia nova que destruiria pela base todo o systema parlamentar. (Apoiados.)
O sr. Fuschini: - Nunca viu isso?
O Orador: - Nunca vi. Um ministro diz muitas vezes a rasão que teve para proceder d'este ou d'aquelle modo, d'esta ou d'aquella fórma.
Essas rasões são muitas vezes extrahidas do parecer da junta consultiva de obras publicas, da consulta da procuradoria geral da corôa, dos actos do conselho d'estado; nunca, porém, ninguem se lembrou de dizer que essas consultas cobriam a responsabilidade do governo. Bem pelo contrario, sempre tenho ouvido sustentar que os ministros respondem pelos seus actos, embora os corpos consultivos tenham consultado contrariamente.
E é esta a correcta doutrina constitucional.
Portanto, a fallar a verdade, estes receios, que tão subitamente tomaram agora o meu collega e distinctissimo amigo o sr. Fuschini, ácerca dos embaraços que podem constituir á acção do governo os corpos consultivos parecem-me simplesmente pueris.
O governo quer ser auctorisado para pôr em pratica medidas extraordinarias, pede essa auctorisação ao parlamento, e no tocante aos meios levanta-os pelos creditos extraordinarios, e estes têem de ser abortes em conformidade com o regulamento geral de contabilidade publica.
Todas as considerações que o iliustre deputado possa adduzir ácerca da conveniencia ou da inconvenienca dos corpos consultivos não têem, pois, cabimento.
Repito, não ha governo nenhum que se lembre de cobrir-se com qualquer parecer ou opinião puramente consultiva do conselho de estado, para eximir-se á responsabilidade dos seus actos. E direi mais. Estou convencido de que nem o conselho d'estado, composto, como é, de homens de provada gravidade, de irreprehensivel compostura,, de reconhecida experiencia dos negocios publicos, em face de uma crise, de um perigo serio que ameaça o paiz, se lembraria de negar esta auctorisação, nem a este governo nem a nenhum outro.
Concluindo, creio que a camara presta um bom serviço ao paiz e á causa publica votando o projecto tal qual está, sem se importar com quaesques embaraços causados pelos corpos consultivos, que realmente são de receiar principalmente no momentoso assumpto de que se trata. (Apoiados.)
O sr. Bernardino Machado: - Disse que não quizera imputar incoherencia ao seu amigo o sr. Barros Gomes, mas observar que, assim como não era exacto o sentido dado pelo sr. ministro da fazenda ao projecto, quando declarou que elle se modelava pelos precedentes, e a este respeito diria que era curioso que o governo entendera, que,, para não melindrar a maioria, se devia substituir na confiança d'ella ao governo regenerador; tão pouco era exacto que o projecto servisse para se tomarem precauções immediatas contra o cholera, como se inferíra

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das primeiras palavras do seu amigo, o sr. ministro das obras publicas.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Vou explicar lealmente á camara qual é o pensamento do governo relativamente ao projecto em discussão.
Na ultima lei do anno passado, que auctorisava esta despeza, ha duas partes - uma relativa ás providencias e faculdades extraordinarias, conferidas ao governo; e a outra relativa á despeza. Eu eliminei a parte referente á despeza, applicando-lhe a regra commum do regulamento geral de contabilidade, e limitei-me a pedir as providencias extraordinarias que foram conferidas ao governo pelas leis de 1884 e 1885.
Peço ao nobre deputado e meu amigo o sr. Bernardino Machado que não confunda quanto á questão da despeza, porque não ha despeza alguma urgente a fazer agora.
Para as despezas que houver de fazer está o governo auctorisado pelo orçamento rectificado e pela lei de 1855...
O sr. Bernardino Machado: - Eu estou plenamente satisfeito.
O Orador: - Então não tenho mais nada que dizer ao illustre deputado.
Foi approvado o projecto na generalidade e bem assim todos os artigos na especialidade.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Avellar Machado, que a tinha pedido para antes de se encerrar a sessão.
O sr. Avellar Machado: - Chamo a attenção do sr. ministro da fazenda para um assumpto que se me afigura grave.
N'um jornal de Lisboa vi transcripta uma local, de outro que se publica em Abrantes, e que não póde ser suspeito ao governo, porque elle se diz «orgão do partido progressista», asseverando que á fiscalisação externa das alfandegas tem praticado n'aquelle concelho abusos, irregularidades e violencias.
Devo dizer, em homenagem á verdade, que, sendo o pessoal approximadamente o mesmo, que o ora existente, nos ultimos cinco annos, apenas tive conhecimento de uns quatro ou cinco abusos praticados pelo pessoal inferior da fiscalisação nos concelhos que formam o circulo 86, sendo punidos os culpados, logo que os chefes apuraram a exactidão das queixas.
O caso mais grave deu-se em Constancia com um chefe de secção, que não só vexou um honrado negociante d'ali, e meu amigo, o sr. Antonio Alves de Meira, mas chegou ao ponto de lhe exigir indevida e irregularmente uma certa quantia de dinheiro. O empregado foi aposentado, mas o negociante vexado não recebeu ainda o seu dinheiro. O processo respectivo estava quasi prompto para despacho do ministro, quando o meu honrado amigo sr. conselheiro Hintze Ribeiro deixou os conselhos da corôa.
Pelas relações de boa camaradagem que tenho mantido n'esta casa com o sr. ministro da fazenda, logo que s. exa. tomou posse do cargo, pedi-lhe com instancia para que désse solução breve ao processo.
Assim m'o prometteu, e sei que tem cumprido a sua palavra, esperando que em poucos dias este se conclua, e que o honrado negociante a que me refiro seja embolsado do seu dinheiro.
Devo francamente dizer á camara que não tenho conhecimento pessoal da serie de violencias a que se allude, porquanto as cartas que ainda hoje recebi de amigos meus d'aquelle concelho nada me dizem a este respeito.
Affirmando o tal jornal que até inclusivamente se reunira a commissão executiva do centro, para levar essas violencias e irregularidades ao conhecimento do governo, é de suppor que sejam muito graves; porquanto centros, e centros d'esta ordem, não se reunem, sem duvida, senão para tratarem de assumptos condignos á sua elevada representação.
Peço, portanto, ao sr. ministro da fazenda que indague se as noticias da referida gazeta tão verdadeiras, e, no caso de o serem, que tome as providencias mais adequadas e sem delongas.
Não acredito que só pelo facto de haver subido ao poder o actual governo, os empregados da fiscalisação externa começassem a praticar violencias extraordinarias; estes factos só poderiam realisar-se se tivessem a certeza de que ficariam impunes os seus abusos, ou se estes fossem praticados em virtude de ordem superior.
Qualquer das hypotheses me repugna acceitar. O chefe da divisão fiscal em Abrantes é um honrado e zeloso empregado, que recebe de seu pae os exemplos da mais inquebrantavel dignidade e honestidade. A segunda tambem a não acceito porque julgo o sr. ministro da fazenda incapaz de praticar ou mandar praticar, com conhecimento de causa, qualquer violencia no concelho de Abrantes, ou n'outro, com o proposito de vexar os povos.
Não tenho conhecimento particular, repito, das occorrencias a que alludo, mas desde o momento em que um jornal que se diz «orgão do partido progressista» affirma que ellas existiram, pedia a s. exa. que se informasse sem demora do que ha de verdade nas accusações feitas aos delegados do governo, e que, apurada a veracidade d'essas accusações, se dignasse tomar as providencias mais convenientes, como em outros assumptos tem até aqui praticado.
E se o não fossem, ficasse illibado o procedimento de empregados do estado, que não conheço, com excepção do digno chefe de divisão em Abrantes, mas que têem direito á minha consideração, emquanto se não provar que abusaram da sua posição para vexarem o povo de um concelho que é exemplar no cumprimento dos seus deveres civicos.
Tenho dito.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Dou muita consideração ao que diz a imprensa, e tenho muito respeito pelos jornaes, não fazendo, no exercicio das minhas funcçÕes, distincção n'esse respeito e n'essa consideração entre jornaes progressistas ou outros quaesquer.
Não tenho noticias de Abrantes a respeito de vexames praticados pela fiscalisação na cobrança do real de agua.
Indagarei dos factos, e, se alguma cousa houver de verdade, procederei com severidade contra os empregados que vexaram o povo.
Como não posso deixar de ter em vista os interesses da fazenda, procederei com igual severidade contra os que não tiverem pago o que devem ao fisco.
O sr. Presidente: - Não houve alteração na ultima redacção do projecto de lei n.° 50.
Deu a hora.
A ordem do dia para amanhã é a continuação da discussão do projecto de lei n.° 46, e mais a discussão dos projectos de lei nos. 40, 42, 43, 44 e 45.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarde.

Discurso proferido pelo sr. presidente do conselho de ministros, José Luciano de Castro, na sessão de 2 de abril de 1886, e que devia ler-se a pag 774, col. 2.º

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Vou dar breves explicações ao illustre deputado e meu amigo o sr. Bernardino Machado, que me dirigiu algumas perguntas ácerca da instrucção secundaria.
Começo por declarar que estou perfeitamente de accordo com as ideas que s. exa. expoz á camara; ambos nós concordamos nos males de que enferma a instrucção secundaria, com quanto possamos divergir no modo de applicar os remedio.
Quanto aos remedios a applicar, devo dizer com toda a franqueza que ainda não tenho formuladas as propostas que hei de apresentar á camara.

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SESSÃO DE 5 DE ABRIL DE 1886 813

Concordo em que a lei de instrucção secundaria de 1880 carece de ser reformada. O tempo que tem decorrido desde a sua execução até agora, dá bastantes subsidios para essa reforma; mas não negará s. exa., mesmo porque foi o primeiro a confessal-o, que essa lei importa um progresso importante no ensino secundario. A experiencia, porém, que tem sido feita, ainda que essa lei não foi perfeitamente executada, habilita já os poderes publicos a poderem propor a sua reforma nos pontos em que se póde ajuizar com segurança que a lei não alcançou o fim que se tinha em vista.
Mas na reforma eu tenho não só a attender ás minhas opiniões pessoaes, mas á opinião e ao voto do conselho superior de instrucção publica.
Sei que ha no ministerio do reino um projecto de reforma da instrucção secundaria, approvado pelo conselho superior de instrucção publica; tenciono ouvir a opinião de algumas pessoas que julgo muito habilitadas sobre o assumpto, principalmente o relator que foi da lei de 1880, o sr. Simões Dias, cavalheiro muito illustrado e muito experimentado n'estas materias, e depois de madura reflexão hei de trazer aqui as propostas que julgar mais consentaneas aos interesses da instrucção, de accordo com as forças do thesouro.
Quanto aos professores provisorios, tambem estamos de accordo em que é necessario acabar essa lepra da instrucção secundaria. É impossivel ter instrucção como a requer o decoro do estado, desde que a escolha dos professores se faça por interesses politicos, e por indicações partidarias.
Portanto, estou perfeitamente de accordo com o sr. Bernardino Machado, e muito folgo com a opinião de s. exa. n'este sentido, porque a sua voz é muito auctorisada, e o seu conselho tem muito prestigio, e n'elle posso achar a força indispensavel para vencer quaesquer resistencias que em opposição ao meu pensamento se levantarem. Agradeço, pois, a s. exa. a sua cooperação n'este empenho, e peço-lhe que continue sempre a incitar-me para que eu não desista do meu proposito. Digo mais, se algum dia eu esmorecer n'esta idéa, se eu desmaiar no meu empenho, peço-lhe que me advirta, que me censure mesmo se for preciso, porque é necessario que todos nós envidemos as nossas forças para acabar por uma vez com este grandissimo defeito do ensino secundario.
Perguntou o illustre deputado se eu mandava abrir concursos para o provimento dos professores de instrucção secundaria.
Eu não posso mandar immediatamente abrir concurso, em primeiro logar porque estou cuidando de reformar a legislação do ensino secundario, e este trabalho parece-me que deve preceder a todos os outros, e em segundo logar porque não está feito o regulamento da lei de 14 de julho de 1880, na parte respeitante ao concurso dos professores. Eu, sem este regulamento, nada posso fazer; e parecia-me que seria melhor tratar preliminarmente da reforma da legislação actual da instrucção secundaria, cuidando depois de elaborar os regulamentos necessarios para se fazerem os concursos para o provimento dos professores.
O sr. Bernardino Machado: - Apoiado.
O Orador. - Folgo muito com o apoiado do illustre deputado porque me dá a certeza de que concorda com o methodo que pretendo adoptar nos trabalhos a que estou procedendo.
Quanto aos programmas estou perfeitamente de accordo em que póde haver n'elles muito que emendar, que corrigir, e que alterar.
O proprio regulamento da lei de 1880 não dava duração aos programmas senão por cinco annos, o que dá a bem entender que o auctor do regulamento suppunha que durante cinco annos podiam dar-se necessidades taes que pedissem a sua alteração, ou modificação.
E possivel, que nos programmas que foram adoptados haja alguma cousa, que acrescentar, e muitas a emendar; mas s. exa. comprehende perfeitamente, que só depois de reformada a legislação actual sobre a instrucção secundaria é que podemos tratar d'este assumpto, que eu considero mais regulamentar do que legislativo.
Fez-me tambem s. exa. algumas perguntas, a respeito da instrucção do sexo feminino.
Eu já uma vez, não me lembro quando, não como ministro, mas como deputado, tive occasião de affirmar os meus sinceros desejos de que os poderes publicos voltassem a sua attenção para este assumpto que julgo da primeira importancia.
A questão unica que póde preoccupar-nos aqui é a questão financeira; todavia estimarei muito poder descobrir alguma solução que sem grandes encargos para o thesouro possa satisfazer esta principalissima necessidade do ensino publico. Na sociedade actual não podemos deixar o sexo feminino sem instrucção secundaria, principalmente depois que acabaram os conventos.
Eu creio que s. exa. apresentou uma proposta sobre propinas. Eu tinha já conversado com s. exa. a este respeito e tinha-me conformado com a sua opinião: se a commissão convier n'essa proposta, eu não tenho duvida em a acceitar.
Não sei se satisfiz a todas as indicações do illustre deputado: se me esqueceu dar resposta sobre algum ponto espero que s. exa. me faça a mercê de novamente me lembrar o assumpto, que eu darei outras explicações.

Discurso proferido pelo sr. presidente do conselho de ministros, José Luciano de Castro, na sessão de 2 de abril de 1886, e que devia ler-se a pag. 775, col. 2.ª

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Pedi a palavra para responder á pergunta que me fez o illustre deputado o sr. Rocha Peixoto.
S. exa. perguntou-me, e ao meu collega da justiça, se nós podiamos prometter que não seria encerrada a actual sessão legislativa sem se discutir a questão do conflicto com o revdo. bispo de Coimbra. Respondo que excede as attribuições do governo dar uma resposta satisfactoria á pergunta do illustre deputado.
Nós podemos declarar que estamos promptos e habilitados para responder a essa interpellação, na occasião em que a presidencia ou a camara julgar opportuno marcar dia para a discussão. Podemos dizer ainda mais, que não temos nenhum receio de nos apresentarmos perante o parlamento e expormos francamente o procedimento do governo n'esta questão e as idéas em que está de manter sem quebra as prerogativas da corôa; mas responder ao illustre deputado que nos obrigâmos a que a camara se não feche sem que seja discutida essa interpellação, isso seria por um lado invadir as attribuições do poder moderador, porque equivaleria a obrigal-o a prorogar indefinidamente a sessão, ou obrigar o governo a aconselhar-lhe a prorogação; e seria por outro lado invadir as attribuições das presidencias das duas camaras, que têem a seu cargo o fixar dia para as interpellações.
Até onde nós podemos chegar é a declarar ao illustre deputado que não nos oppomos a que a interpellação se realise, quando a presidencia de qualquer das duas camaras o julgar conveniente.
Quanto á questão em si, devo dizer francamente ao illustre deputado o seguinte. S. exa. não quer affirmar uns certos principios, porque elles tenham relação com o objecto que se discute; o que s. exa. quer ê forçar á discussão de um assumpto especial, que está comprehendido n'uma interpellação annunciada pelo illustre deputado.
Foi o que s. exa. quiz, pois não se propoz nem a acrescentar, nem a melhorar por qualquer modo o projecto; quiz, apenas, aproveitar o ensejo para resolver antecipada-

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814 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mente um assumpto, que faz objecto de uma interpellação. E desde o momento em que o illustre deputado tem a franqueza de assim o declarar positivamente, parece-me que o procedimento da camara deve guiar-se pela sinceridade das suas declarações.
A proposta de s. exa. não tem relação com o projecto que se discute. Póde ser enviada á commissão respectiva, e póde ser considerada como outra qualquer proposta para seguir os termos do regimento. O que é fóra de duvida é que ella não se refere ao assumpto do projecto.
Ora, eu devo dizer francamente a s. exa., que quanto ao, principio que o illustre deputado affirma na sua moção, não posso deixar de declarar que é tambem esse o principio que o governo professa.
O principio do que a inspecção superior de ensino pertence ao governo, nenhum de nós o póde combater, nem votar contra elle. Acceita-o o gabinete, e creio que o acceita toda a camar; é perfeitamente axiomatico, como disse o illustre relator da commissão.
Quanto, porém, ao processo a seguir com respeito á proposta do illustre deputado, a camara fará o que melhor entender. Por mim já tive a honra de indicar os diversos alvitres que podem ser adoptados.
Tenho concluido.

Redactor = S. Rego.

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