1316 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
De Francisco Faria Villas Boas Salgado, aspirante da administração militar e thesoureiro do conselho administrativo do regimento de cavallaria n.° 10, pedindo que á sua classe seja conservada a gratificação de 5$000 réis, que actualmente percebe para falhas.
Apresentado pelo sr. deputado Eliseu de Serpa e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.
O sr. João Pinto Rodrigues dos Santos: - Sr. presidente, já tenho pedido algumas vezes a palavra para mo dirigir ao sr. ministro do reino sobre assumptos de instrucção publica, mas até hoje não me tem sido possivel usar della, porque s. exa. não tem comparecido n'esta camara. Hoje que me foi concedida, apesar de s. exa. não estar presente, como a sessão legislativa está já muito adiantada, vou fazer algumas considerações, de que s. exa. terá conhecimento pelo Diario das camaras e a que se dignará opportunamente responder, pois que o assumpto merece toda a attenção dos poderes publicos.
Sr. presidente, ha mezes uma commissão de professores de instrucção primaria dirigiu-se ao sr. ministro do reino, pedindo providencias para os pagamentos dos seus ordenados a cargo das camaras municipaes. S. exa. respondeu o seguinte:
(Leu.)
Vejo que chega o sr. ministro do reino, e como me estava referindo a s. exa., torno a repetir o que disse. S. exa. em abril, foi procurado por uma commissão de professores de instrucção primaria, que pediram a s. exa. que tornasse providencias para que es seus ordenados fossem pagos em dia, não havendo os atrazos que agora ha quasi em todo o reino.
S. exa. respondeu, segundo o que eu leio no jornal a Federação escolar, que ia tratar de examinar a questão, que se visse que as providencias estavam nas attribuições do poder executivo, tomal-as ia de prompto; que, se, pelo contrario, fosse precisa alguma medida legislativa, a proporia n'esta sessão ás côrtes.
N'uma das sessões passadas, creio que ha dois dias, o illustre deputado o sr. Simões Dias apresentou um projecto de lei, tendente a regular o pagamento dos ordenados dos professores a cargo das camaras municipaes.
Como s. exa. tinha promettido tomar providencias sobre este assumpto, do maior interesso para todos, eu pergunto, pois, se s. exa. tenciona perfilhar o projecto apresentado já n'esta camara, ou se apresentará um outro, ou se tomará providencias proprias do poder executivo.
Sr. presidente, o sr. Simões Dias, quando apresentou o seu projecto de lei, justificou-o com algumas considerações, que são de todo o ponto verdadeiras. Eu posso confirmar o que s. exa. disse, com respeito ao atrazo de pagamentos aos professores e em relação ás suas precarias circunstancias, pois que o tenho em meu poder algumas cartas que me foram entregues por uma commissão de Lisboa, nas quaes muitos professores das provincias se queixam do atrazo dos pagamentos dos seus ordenados, lamentando-se das tristes difficuldades em que os colloca esta incuria das camaras.
Do exame destas cartas vê-se que ha muitos professores a quem se deve mais de um anno de ordenado e a quem nunca se pagaram as gratificações a que teem direito por lei!
O sr. Simões Dias, notando e estygmatisando com justiça este desleixo das camaras, poz em relevo a importancia do prefessorado e estranhou que se não pagasse em dia a esta classe, que tem tanto direito aos cuidados do governo, como as outras classes de servidores do estado.
Ninguém desconhece a verdade d'esta affirmativa. A camara sabe bem a importancia social do professorado, e como não póde deixar de advogar a generalisação da instrucção, não póde tambem ser adversa a qualquer medida que tenha em vista melhorar a situação do professor, pois que sem isso não póde haver boa instrucção.
E, na verdade, sr. presidente, os professores de instrucção primaria deviam ter largas habilitações.
Emquanto que os professores de instrucção secundaria e de ensino superior leccionam individuos, cuja intelligencia tem já um certo desenvolvimento, de modo que, pelos seus estudos, podem supprir a deficiência do mestre, o professor de instrucção primaria ensina creanças que, pelo seu pouco desenvolvimento, acceitam como verdadeiro tudo o que o mestre lhes ensina, sem modificarem, sem reagirem contra os maus methodos de ensino e contra as noções erradas que lhes inoculam no espirito.
E por este motivo que os professores deviam ter largas habilitações, vencendo tambem um ordenado condigno.
Mas, já que se não pensa numa reforma tão completa, pelo menos que se paguem aos professores os 120$000 réis do seu ordenado, a fim de não terem que recorrer a outros meios e a outros trabalhos para subsistirem.
Eu queria que o sr. presidente do conselho tomasse providencias sobre este assumpto, ou por via do poder executivo, ou perfilhando o projecto de lei apresentado pelo sr. Simões Dias, ou apresentando á camara outro projecto.
Pelo poder executivo, podem tomar-se providencias, porque no orçamento está sempre consignada uma verba que é actualmente, creio, de 90:000$000 réis, para se auxiliarem as camaras municipaes no pagamento dos vencimentos dos professores de instrucção primaria.
Portanto, s. exa. póde mandar fazer uma syndicancia, ou exigir esclarecimentos dos governadores civis, a fim de saber quaes as camaras que estão em maior debito, e com os 90:000$000 réis do orçamento pagar aos professores a quem se deve mais.
Era uma medida que me parece se podia tomar de prompto e sem grande difficuldade. Mas, se s. exa. quizer obra mais radical e completa, póde fazer approvar o projecto do sr. Simões Dias, ou outro tendente a regular a maneira dos pagamentos aos professores dos seus ordenados e gratificações.
O que me não parece conveniente é que continuem as cousas pela forma actual, porque assim as camaras, como a experiencia o demonstra, em grande parte não pagam em dia aos professores, chegando algumas a dever-lhes os ordenados de mais de um anno, e o professorado que, alem de ser mal remunerado, não recebe com tempo os seus escassos vencimentos, lucta com gravissimas difficuldades para subsistir, com prejuizo manifesto para a instrucção.
Como o sr. ministro do reino está presente, pedia-lhe a fineza de dizer á camara se tenciona nesta sessão tomar medidas a este respeito por via do poder executivo, ou se adopta o projecto do sr. Simões Dias, ou se apresenta qualquer outro tendente a melhorar os inconvenientes que apontei.
O sr. Presidente do Conselho (Luciano de Castro): - Pedi a palavra para dizer ao illustre deputado que acaba de fallar, que concordo plenamente na justiça que s. exa. advogou perante a camara.
Sou o primeiro a reconhecer que não póde consentir-se que os professores de instrucção primaria, que são tão escassamente remunerados, nem ao menos sejam pagos em dia.
Quero tomar providencias sobre esse assumpto, e parece-me que, dentro das attribuições que lhe confere o codigo administrativo, o governo póde actuar sobre as corporações municipaes, para as obrigar a pagar pontualmente aos professores. Comtudo, visto que o sr. Simões Dias apresentou a esta camara uma proposta de lei a esse respeito, não duvidarei, depois da commissão a examinar, de concordar em algumas das suas disposições.
Dar-lhe-hei de boa vontade o meu apoio, mas afigura-se-me francamente que se não alcançará o desejo do auctor da proposta, nem o do illustre deputado que acaba de fallar sem que o governo torne sobre si o adiantamento