O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1318 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

sumidora, e invocando-se os principios absolutos da mais ampla liberdade de commercio, não se vê, ou não se quer ver a questão por todos os lados; não se attende a que os verdadeiros interesses do paiz aconselham que se procure desenvolver e proteger a unica industria, que póde alimentar e sustentar as outras de somenos importancia, e de que em parte vive a classe consumidora.
Pois, francamente, o que valem as outras industrias em Portugal, relativamente á agricultura?
Responde eloquentemente a esta pergunta o mappa das exportações, onde se manifesta a importancia relativa do valor dos productos agricolas que exportâmos.
Se examinarmos esse mappa no anno de 1885, ahi veremos que o total da exportação foi de 25.000:000$000 réis, cifra redonda; tirando a importancia da moeda exportada, cujo valor foi de 845:000$000 réis, a industria manufactora figura apenas no valor de 734:000$000 réis. Tudo mais, e o resultado da industria agricola, ou antes, dos productos naturaes da terra.
Continuando no exame do mesmo mappa official, encontram-se outros factos, que não posso deixar de citar, porque vem em abono da causa que defendo.
O primeiro artigo que figura no mappa das nossas exportações é o que respeita a animaes vivos. Por elle se vê a importancia que ia tendo este ramo de industria agricola. Confrontando o valor da exportação deste artigo nos dois ultimos annos de 1884-1885, vê-se ainda a sua notável decadencia. Emquanto que em 1884 o valor da exportação de gados foi de 2.386:000$000 réis, cifra redonda, em 1885 foi apenas de 1.418:000$000 réis, quasi 1.000:000$000 réis menos!
É uma grandissima differença, que mostra bem o grave prejuizo por que está passando esta parte da agricultura.
E se essa differença foi grande entre aquelles dois annos, maior ainda acharemos, se os compararmos com o de 1886, ou com o actual, em que o preço do gado, principalmente do suino e vaccum, tem sido baixissimo.
O meu amigo e distincto collega, o sr. Teixeira de Vasconcellos, já se referiu proficientemente a este assumpto, mostrando a urgencia de se attender a elle, facilitando a saida pelo abaixamento do direito pautal, e pela conducção gratuita nos caminhos de ferro do estado do gado destinado á exportação.
Disse eu, e é um facto incontestavel, que na agricultura tem o nosso paiz a principal base da sua riqueza.
São três os elementos que, pela sua importancia, constituem, por assim dizer, a nossa agricultura; gados, cereaes e vinhos; depois vem as madeiras, e principalmente a cortiça, o azeite, e matérias vegetaes diversas.
Pelo que respeita aos gados, já v. exa. e a camara sabem o estado a que está reduzida esta parte da agricultura.
Os cereaes, que n'outras eras constituiam quasi que a nossa riqueza agricola, chegando não só para o consumo do paiz, mas ainda para uma larga exportação, estão sendo hoje a desgraça da nossa agricultura.
Nos reinados da primeira dynastia, abundavam tanto, e tornavam tão florescente a nossa agricultura, que no tempo de D. Fernando, aconteceu muitas vezes, segundo diz Mariz, acharem-se quatrocentos e quinhentos navios na barra de Lisboa, para exportarem os nossos productos agricolas, e principalmente os cereaes.
Circumstancias que são do conhecimento da historia, e portanto do de v. exa. e da camara, se deram depois, que, levando os nossos passados às conquistas e á navegação, se afastaram da agricultura, e dahi data o principio da sua decadencia.
Sem acompanhar a sua historia nas diversas evoluções por que tem passado a nossa agricultura, somos chegados a uma epocha calamitosa, em que ella se debate na lucta das maiores difficuldades. (Apoiados.)
A diminuição da producção, e a elevação do seu custo, dá pelo augmento de salarios provenientes da escacez de braços, já pelo augmento do preço de todos os generos necessarios á vida, já pelos impostos que sobrecarregam ,a propriedade e os generos que d'ella derivam, já pela falta de capital barato para explorações agricolas, e o diminuto preço dos generos agricolas, que não compensam o excessivo custo da producção, são os motivos, alem de outros, que produzem a crise angustiosa com que lucta a nossa agricultura.
Os feracissimos campos da America, e os vastos terrenos da Asia e de outras partes, inundam os mercados da Europa de cereaes produzidos em condições taes, que, os nossos não podem entrar em concorrencia com elles.
D'ahi redunda principalmente a barateza do preço dos nossos cereaes, que, não remunerando o trabalho agricola, traz a desgraça que está soffrendo a nossa agricultura.
Como remediar este mal? O que tem respondido o governo às reclamações sinceras e urgentes da classe agricultora?
Responde-lhe com o inquerito a que vae proceder-se; e promette lhe o derramamento do ensino agricola, como se isto só fosse sufficiente para conjurar o mal e vencer a crise que afflige a nossa agricultura.
Façam-se os inqueritos, e façam-se convenientemente, conscienciosamente; derrame-se a mãos largas o ensino theorico, e principalmente o ensino pratico, que muito carece d'elle a nossa agricultura rotineira.
Mas isto não é bastante; de mais promptas e mais inadiaveis providencias carece o estado grave que todos reconhecem. Não se afira o estado da riqueza publica, pelo facto occasional da elevação dos nossos fundos. Essa mesma desapparecerá ámanhã, quando se conhecer, que o principal elemento da nossa riqueza nacional tem sido e continua a ser esmagado pela imprevidência dos governos.
Mas qual o meio de attenuar de prompto os effeitos da crise agrícola? A protecção pela elevação dos direitos de entrada aos cereaes estrangeiros.
Receiam com isso levantar a guerra dos livre-cambistas; receiam que a agricultura portugueza, á sombra dessa protecção, eleve em demasia o preço dos seus géneros?
Esse receio deve desapparecer diante das providencias que podem acompanhar aquella protecção.
Quando se não queira como correctivo estabelecer a providencia de 17 de setembro de 1819, que approvou a consulta da real junta do commercio, que tinha proposto uma imposição sobre todo o trigo e mais cereaes estrangeiros, que viessem ao nosso mercado, não fixa e permanente, mas regulada por uma escala que a tornasse prohibitiva, quando o genero chegasse a certo grau de barateza, e que cessasse inteiramente quando subisse a certo ponto de carestia, fazendo nos preços medios tal equilibrio, que os nossos cereaes podessem sustentar a concorrencia; cerque-se então a elevação do imposto sobre os cereaes estrangeiros de outras garantias, que obstem a tornar o agricultor um monopolista, quando com a escacez da producção possa ser excessivo o preço dos cereaes.
Pelo que respeita á vinicultura, v. exa. e a camara sabem muito bem, que, n'estes ultimos annos, tem tomado grande desenvolvimento no nosso paiz.
Emquanto algumas provincias, e nomeadamente o Douro, têem visto desapparecer com a phylloxera a sua unica riqueza, noutras a producção do vinho tem augmentado extraordinariamente.
Estive ha poucas semanas no Douro, onde ha annos não tinha ido; e ao ver aquelle paiz em que nasci, senti a alma confranger-se de dor ao encarar a desolação e a miseria, onde dantes tanta riqueza e prosperidade havia! Parece que atravessou por ali o anjo do exterminio, assolando e destruindo aquellas verdadeiras construcções agricolas, trabalho de muitas gerações, deixando onde d'antes vecejava a vinha, os vestigios da desgraça que por ali passou! Triste,
immensamente triste!