SESSÃO DE 6 DE ABRIL DE 1888 997
de Fontes Pereira de Mello, e esses padrões, conforme tambem me consta, foram fabricados com lã merina.
Quer isto dizer que effectivamente se dão, com relação á industria nacional, os inconvenientes que por mim foram apontados.
Fica por consequencia de pé a questão, porque a verdade é que, embora nos annuncios não se tenha indicado clara e francamente a condição de serem os pannos fabricados com lá merina, esses padrões typos, adoptados ou estabelecidos por essa commissão, exigem o emprego de lã merina!
Fica a questão de pé, sr. presidente, porque, emquanto esses padrões forem os legaes, as fabricas que forem aos concursos para os fornecimentos de pannos para o exercito - ficarão obrigadas a fabricar os seus pannos com a lã merina.
Eu poderia até citar alguma fabrica, existente em Portugal e que emprega quasi exclusivamente na fabricação dos pannos a lã merina, com prejuizo das lãs portuguezas, mas não me demorarei sobre esse ponto, nem tão pouco procurarei averiguar se as fabricas excluem dos seus productos as lãs portuguezas exactamente por effeito da existencia dos taes padrões.
Já que estou com a palavra, aproveito a occasião para fazer algumas considerações sobre certos e determinados pontos, que têem sido apresentados no decorrer da discussão de differentes questões, que têem sido levantadas no parlamento no corrente anno.
Uma das cousas que me magôa mais, sr. presidente, é ver e ouvir n'esta camara, incidentemente e no decorrer d'essas discussões, um ou outro orador, que, com o fundamento de que pertence a uma certa e determinada escola philosophica ou politica, parece querer fallar ex cathedra apresentando uma ou outra opinião como intallivel e que está muito longe de o ser.
Sempre que se dá esse facto o meu desejo seria, se fosse possivel, responder de prompto para contestar; mas isso é impossivel, e até seria inconveniente, porque correria o risco de me tomar massador.
Por outro lado, dada a possibilidade de fazer o que indico, e posta de parte a apprehensão de me tornar massa dor, não teria forças para resistir ao trabalho de estar sempre com os ouvidos attentos e pedir a palavra sempre que se apresentassem idéas contrarias ás que eu sustento.
Explicada a situação, resta um unico recurso: corre ao deputado a obrigação, de ir tomando notas, de registar os factos, para, na occasião mais opportuna sustentar e affirmar as suas idéas e rebater as contrarias.
Foi isto é que já me succedeu na legislatura de 1882 a 1884, quando estive quasi dois annos e meio á espera de occasião propria para accentuar as minhas idéas sobre um dado ponto.
Agora não tem decorrido ainda dois annos e meio, mas com certeza já são passados mais de quinze dias, e, aproveitando o ensejo, referir-me-hei, em primeiro logar, ao sr. deputado Augusto Maria Fuschini, que sinto não estar presente, mas a quem vou reponder desafogadamente, porque as minhas palavras são sempre fielmente reproduzidas pelos srs. tachygraphos e mantidas no Diario da camara.
S. exa. logo no principio da sessão legislativa, se bem me recordo, e tambem mais modernamente, faltou sobre varios assumptos referentes especialmente á crise agricola, e disse que uma das causas, que tinha levado alguns individuos a levantarem a bandeira da crise agricola, fôra a circunstancia de que a esses individuos seria desagradavel passar de uma situação mais favorecida da fortuna para outra menos favorecida.
Sr. presidente, quando tal ouvi fiz, desde logo, o firme proposito de, na primeira occasião que se apresentasse, rebater esta idéa, porque não é exacta.
Não é exacta, sr. presidente, porque, percorrendo o paiz de norte a sul defrontâmos com uma caracteristica que talvez passe para muitos desapercebida, mas que representa para num um grande progresso, e é que de norte a sul do paiz toda a gente trabalha.
Sr. presidente, desde que o principio do trabalho está generalisado em todo o paiz, desde que cada um de per si e todos juntos os cidadãos portuguezes são obrigados a trabalhar, ainda que não queiram, ou para manter a sua condição social ou para occorrer ás necessidades da sua familia, não póde avançar-se no parlamento uma proposição como a que o sr. Fuschini apresentou!
Não se póde sustentar que meia duzia de individuos levantaram a questão agricola para manterem uma certa posição social.
Sr. presidente, os factos demonstraram que essa opinião do sr. Fuschini é errada.
O que se passou no primeiro congresso agricola em Lisboa, em fevereiro d'este anno, prova que não foram só alguns individuos, que levantaram tal questão.
Ao congresso agricola vieram individuos de todos os pontos do paiz, e lá se encontraram muitos de chapéu alto fino de seda, mas tambem muitos de chapéu baixo de abas largas e com jaqueta.
Prova isto que a questão não é do apanagio de meia duzia de individuos, mas interessa a todos e a todo o paiz.
Vamos a outro ponto.
S. exa. tem tido occasião de se referir tambem aqui e por mais de uma vez á questão social.
Ninguem ignora que s. exa. se apresenta sempre aqui como defensor das classes menos favorecidas pela fortuna e todos sabemos que s. exa. se apresenta sempre como um dos sustentaculos, com que ellas podem contar no parlamento.
Eu não sou ninguem; não sou socialista, na accepção que muitos dão a essa palavra; não tenho para muitos a auctoridade que s. exa. possue, mas direi que ba n'esta casa muitos individuos que, sem seguirem as doutrinas de s. exa. e que julgo são em parte partilhadas por alguns membros d'esta camara, pelo contrario, seguindo idéas diametralmente oppostas, não têem perdido a occasião, sempre que ella se lhes tem offerecido, de se apresentarem aqui para defender, nos pontos em que ellas devem e podem ser defendidas, não só essas classes dignas de serem attendidas, mas todas, porque todas são dignas de attenção, partindo, como parte, do principio de que em todo o paiz se trabalha de norte a sul. (Apoiadas.}
Na minha, opinião todas as classes devem ser defendidas porque todas trabalham.
Tambem passarei a rebater uma opinião apresentada ha poucos dias aqui na discussão do projecto de lei n.° 23, sobre a fabricação dos tabacos, pelo deputado o sr. dr. Moraes Carvalho.
O sr. dr. Moraes Carvalho, já o anno passado, quando se tratou da questão de pautas, aqui sustentou uma, certa ordem de idéas em relação á questão dos cereaes. Não levo a mal isso, porque entendo que cada um deve ter rasões, que levem o seu espirito a partilhar certa ordem de idéas na resolução de uma dada questão.
O que é certo é que o sr. dr. Moraes Carvalho sustentou, incidentemente na questão dos tabacos, a mesma ordem de idéas que sustentara era 1887, e disse que a questão agricola tinha sido erradamente apreciada por alguns individuos debaixo do ponto de vista de lucros para os mogeiros. Emprego o adjectivo que hoje tem fóros de official e de academico, porque não quero melindrar seja quem for.
Ê claro que eu não posso levantar agora esta questão com toda à altura do debate que merece, mas, desde o momento em que uma opinião, a meu ver, errada foi novamente aqui accentuada por um cavalheiro de illustração, sem contestação alguma, e que tem a sympathia de nós todos, o que já tambem aqui foi affirmado e especialmente pelo illustre relator do projecto do tabaco, o sr. dr. Vi-