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o importante, e que carecia de uma prompta solução, preparavamo-nos para lh'a dar quando o barometro do Douro annunciou borrasca, e o projecto foi para a gaveta (riso. — Apoiados.)

Em Inglaterra o barometro tinha subido, cá a pressão atmospherica da demarcação fê-lo descer, e... e o projecto sumiu-se (riso. — Apoiados.)

Ha porém uma differença, e vem a ser que em Inglaterra o parlamento tornou a reunir-se, compenetrou-se da gravidade do assumpto, arrostou com as difficuldades que se offereciam, e sem embargo d'ellas levou por diante a reforma. O governo lá associou-se á camara, poz-se á frente da reforma sem lhe importar os obstaculos que tornava critica a sua posição. Nós cá... é o que se está vendo. Creio que estamos observando com cuidado se o barometro de Villa Real sobe ou desce (riso). Achámos isto mais regular.

O sr. Carlos Bento: — Mais regular, não.

O Orador: — Concordo, mas se não é o mais regular, é de certo o mais commodo (apoiados).

Em Inglaterra sir Robert Peel dizia: «Façamos reformas para evitarmos as revoluções ». Nós cá dizemos: « Não façamos nada para evitarmos os meetings (muitos apoiados).

Um illustre deputado, que tenho sempre visto n'esta casa associado comigo, e com todos os que defendemos aqui os bons principios, o meu illustre amigo, o sr. Coelho do Amaral, disse aqui, quando fallou n'este assumpto, com aquella proficiencia que todos lhe reconhecemos, que =a resolução da questão do Douro era não só de interesse economico, mas mesmo de grande conveniencia politica = (apoiados). O illustre deputado disse a verdade. É sempre de grande conveniencia politica tratar das graves questões de interesse publico, encarar sem receio, e levar ao cabo sem hesitação, as grandes reformas que dizem respeito a assumptos de importancia, e que a opinião publica reclama (apoiados).

O que porém não é de conveniencia politica é trepidar diante de qualquer obstaculo, recuar diante de qualquer resistencia, não aproveitar o ensejo para resolver as questões importantes, e não satisfazer as exigencias da opinião publica, nem confiar nella (muitos apoiados).

O que não é de conveniencia politica é, na presença das reclamações, feitas por longo tempo, e por todas as formas, em favor de uma reforma importante, deixar discutir o assumpto até á saciedade no parlamento e nos meetings, na imprensa e na tribuna, não querer tomar uma resolução, e adoptar o expediente mais deploravel, mais desgraçado, e de mais funestas consequencias, que é não dar solução nenhuma (muitos apoiados).

E porque é, sr. presidente, que nós não discutimos a questão do Douro? Desejava saber a rasão.

E porque ainda não está madura? Mas se um seculo não foi bastante para a fazer amadurecer; se nem o calor das discussões dos meetings foi capaz de a fazer chegar a um estado de maturação, é melhor discuti la mesmo verde, do que esperar mais tempo inutilmente.

Será porque ainda não está estudada? Mas eu creio, e n'isto parece-me que todos estão de accordo, que já não ha mais nada que dizer. Cento e dezesete annos de estudo é estudo bastante, e a circumstancia de todos os interessados, por um e outro lado, terem dito tudo quanto tinham a dizer é prova manifesta de que o estudo está concluido.

Será porque a opinião publica não está disposta para esta reforma, nem está accorde sobre a conveniencia d'ella? Por certo que não. A prova de que a opinião publica exige esta reforma é que de todos os lados se clama por ella. Emquanto os lavradores vinicolas de todo o paiz pedem e supplicam que se resolva este assumpto no sentido da liberdade, os lavradores do Douro declaram que o systema actual não serve, não pôde continuar assim (apoiados), e que é necessario reforma-lo, e quanto antes. Ora quando todos estão de accordo em pedir a revogação ou reforma da legislação existente, allegando a urgencia das circumstancias e a importancia do assumpto, não tomar resolução nenhuma. e adiar este negocio, é o mais funesto e deploravel de todos os expedientes de que se poderia lançar mão,(muitos apoiados).

Espera-se acaso que todos os interessados aceitem de bom grado a reforma, e que ninguem reclame contra ella?

O sr. José de Moraes: — Não é possivel.

O Orador: — Não é possivel, decerto; e tal esperança, se existe, é completamente infundada, e admira até que haja quem a conceba. Pois pôde porventura esperar se que os monopolistas, que gosam do privilegio de só elles exportarem os seus vinhos pela barra do Porto, cedam expontaneamente d'esse monopolio, e deixem de reclamar contra a lei que lh'o tirar? Por certo que não.

Demarcae nos olivedos de Santarem um certo espaço de terreno, e concedei aos proprietarios d'elle o privilegio de só elles exportarem azeite pela barra de Lisboa; dizei aos proprietarios dos campos de Coimbra, que só elles podem exportar cereaes pela barra da Figueira; dae aos habitantes de certas localidades do Algarve o porto de Villa Nova de Portimão para só elles por lá exportarem figos, e vereis que todos elles acham isso uma cousa magnifica, optima e excellente. É se lhes quizerem acabar com esses privilegios elle? hão de reclamar e gritar que lhes atacam os seus interesses.

Os monopolistas do Douro estão no mesmo caso. Os que esperam que elles venham dizer estamos, de accordo em que se nos acabe o privilegio enganam se redondamente (apoiados). Emquanto a lei lhes garantir o monopolio, elles hão de achar isso optimo e excellente; não ha dialectica por mais subtil que seja, nem argumentos ainda os mais fortes, que sejam capazes de os convencer do contrario. O que custa a comprehender é que haja ainda quem espere outra cousa (apoiados).

Espera se porventura que os espicheiros, os batoqueiros, os provadores, os traficantes de guias não reclamem contra a reforma, que destroe o systema excepcional, á sombra do qual elles auferem lucros? Mas esses hão de gritar sempre como têem (gritado sempre todos os que se têem achado em iguaes circumstancias, em todas as reformas que se têem feito,

Os copistas, do seculo XV acharam pessima a invenção da imprensa. Os emprezarios de toda a casta de vehiculos e transportes gritaram contra os caminhos de ferro como grandemente prejudiciaes. Os do Douro que acabei de enumerar, e que fazem parte do estado-maior da protecção, estão nas mesmas circumstancias.

Se espera para resolver a questão do Douro, que ninguem reclame contra a reforma proposta, então é preciso esperar até ás kalendas gregas, o que equivale a dizer que a reforma nunca se faz.

Sr. presidente, os interesses do Douro até o ponto em que elles são legitimos, e em que os poderes publicos os devem attender, não são atacados pelo projecto da liberdade; os outros não devem ter-se em vista, nem servir de obstaculo a uma reforma da maior importancia e de grande alcance, não só para os interesses do Douro, mas do paiz todo (muitos apoiados).

E esta reforma, para cujo adiamento não ha pretexto plausivel, é que é urgente que se faça e quanto antes, porque os interesses do paiz assim o exigem. O que não pôde continuar a existir é esse velho e anachronico monopolio do Douro, tão absurdo como prejudicial, que não tem hoje rasão de ser, nem motivos que o justifiquem, e ao qual só falta para desapparecer que os poderes publicos sanccionem a condemnação, que ha muito lhe lavrou a opinião publica (muitos apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Sr. presidente, sinto não ver presente um nosso illustre collega, e o mais notavel defensor do systema excepcional do Douro, o sr. Affonso Botelho, porque queria dar a s. ex.ª os parabens pelo ver seguir o bom caminho, e ir adoptando alguns principios que nós tambem proclamámos.

S. ex.ª, sempre que falla ou escreve relativamente á questão do Douro, chama mais proselytos para a causa da liberdade, e fornece aos defensores d'esta mais argumentos.

Alguns dos principios que s. ex.ª expendeu são tambem os nossos. E eu noto com prazer esta circumstancia, porque é mais rasão para tratarmos de resolver a questão. Pois se ex.ª já está de accordo comnosco em tanta cousa, porque não havemos de entrar na discussão do assumpto?

A ausencia do illustre deputado faz com que eu não possa, bem a meu pezar, responder ás differentes proposições que o illustre deputado aqui avançou; farei só algumas ligeiras observações sobre alguns pontos, e isto mesmo na ausencia de s. ex.ª, não só porque elle já tambem assim o tem feito, mas tambem porque, referindo-se a pontos de doutrina, nenhuma duvida tenho em as fazer, mesmo não estando s. ex.ª presente.

S. ex.ª disse nos que = a questão não era especial do Douro, mas que interessava todo o paiz =. Não só não contesto, mas estou de accordo, e é porque assim a considero que desejo que ella se resolva em harmonia com os interesses do paiz e no sentido da liberdade, que é em que todos estão conformes (apoiados).

O illustre deputado tambem nos disse que =era util e conveniente equilibrar a producção com o consumo, e que as leis excepcionaes e regulamentares do Douro tinham isso em vista =.

Sr. presidente, o equilibrio da produção e do consumo é uma cousa excellente, mas o meio mais racional e mais facil de o conseguir é deixar as industrias e o commercio em perfeita liberdade, porque o interesse de umas e outro faz com que procurem e encontrem esse desejado equilibrio. A intervenção artificial e legal quasi nunca é proveitosa, e quasi sempre dá resultados differentes d'aquelles que se esperam e que se têem em vista (apoiados).

Mas o systema seguido no Douro para conseguir o tal equilibrio é admiravel e original. Eu não me admiro de que mr. Michel Chevalier, ouvindo da bôca de um nosso distincto homem de sciencia, com quem se encontrou na exposição de Londres, a narração e explicação do systema excepcional por que se rege o Douro, lhe dissesse, que = não sabia da existencia de um tão singular systema, que não conhecia nada tão absurdo e original, e que não sabia que houvesse em paiz algum do mundo cousa que se lhe podesse comparar =.

Quem examina bem o tal systema adquire logo a mesma convicção que o economista francez.

O meio de equilibrar a producção com o consumo é dar toda a liberdade á producção para poder crescer e desenvolver-se á vontade, e pôr todos os obstaculos ao consumo 1! Não só se não põe embaraços á producção, mas os privilegios que se concedem na legislação excepcional são um incitamento para ella crescer, não fallando nas disposições de algumas leis, que indirectamente concorreram para o augmento d'ella. Pelo que respeita porém ao consumo todo o fim do tal systema é obstar ao seu desenvolvimento.

O estudo das molestias que podem atacar a industria vinicola e o desejo de lhes applicar o remedio conveniente fez com que os proteccionistas, defensores do systema, descobrissem que nos annos de producção abundante uma molestia terrivel era a obstrucção do mercado, e para lhe obstarem entenderam que o remedio mais conveniente era fazer refluir o vinho para as adegas, o que dá em resultado serem estas atacadas de hidropisia (riso). De maneira que, por este judicioso e previdente systema e com a applicação de remedios tão apropriados á industria vinicola, está livre das taes obstrucções do mercado, mas é victima da hydropisia de adegas. Escapa da molestia, mas morre da, cura (riso).

O que é verdade é que com taes meios e depois de ensaiadas todas as combinações não tem equilibrado nada. É no fim de contas, postos em praticas todos os regulamentos, ensaiados todos os expedientes, empregados todos os, meios artificiaes, a industria vinicola fica e está em posição precaria, e os poderes publicos são sempre incommodados com as supplicas e pedidos, que por parte d'ella lhes são feitos para que lhe acudam nas suas necessidades e nas crises que periodicamente se succedem (apoiados).

Ha cem annos que se ensaia, modifica e altera toda a especie de regulamentos. Ha cem annos que se empregam todos os meios artificiaes para proteger a industria vinicola e tudo o que lhe diz respeito, e ella cada vez a peior, e levada a uma posição precaria. Como aquelle medico que assistia a Sancho Pansa, quando governava a ilha Barataria, que, querendo evitar que elle comesse tudo o que lhe podesse fazer mal, acabava por o matar á fome; assim os protecionistas, á força de quererem proteger por todas as fôr mas a industria vinicola, acabam por dar com ella em terra (hilaridade).

O sr. Affonso Botelho disse-nos que = a questão estava abandonada no campo dos principios e que era necessario estuda-la no campo dos factos =. Ainda bem que veiu esta declaração, já se conseguiu alguma cousa. A questão está abandonada no campo dos principios, porque ahi não ha já que dizer por parte do Douro, e reconhece se finalmente que os bons principios condemnam o systema que lá se segue. Mas no campo dos factos creio que não ficará melhor. Oxalá que a questão se discutisse, porque então se veria na presença dos factos, e com os dados estatisticos na mão, que pelo systema restrictivo nunca se conseguirão os fins que tiveram em vista, e que em vez de util só tem sido prejudicial. Ensaiado de differentes formas, applicado de differentes modos só tem servido para collocar a industria vinicola n'uma posição precaria, e para promover a sua decadencia.

E o peior é que as suas consequencias não affectam só o Douro, mas tambem as outras regiões vinicolas. Em virtude do tal systema, não só o vinho das outras partes do paiz não pôde ser exportado pela barra do Porto, mas alem d'isso aquelle vinho produzido na demarcação que, em virtude dos regulamentos, não pôde saír para fôra, fica no paiz fazendo concorrencia ao nosso, e concorrendo para o seu maior consumo.

Chamo para este ponto a attenção dos illustres deputados, especialmente d'aquelles que representam aqui as regiões vinicolas.

O nosso vinho não pôde saír; o d'elles, que pelas leis regulamentares não pôde Ser exportado, fica cá. Vejam as consequencias d'isto, e digam-me no fim se querem ainda deixar durar por mais tempo um tal systema.

E não se pense que isto é cousa de pouca importancia; os dados estatisticos fallam mais claro do que todas as observações que se poderiam fazer.

Não direi nada de epochas remotas, não tenho tempo para isso, e espero que ainda hei de ter occasião para o fazer. Vamos a epochas mais proximas. Quer V. ex.ª, sr. presidente, saber quaes foram as consequencias da famosa lei de 1843, cujas disposições muita similhança tinham com a de outros tempos? O thesouro portuguez deu cada anno a uma companhia, encarregada de regular e proteger a industria vinicola do Douro, 150:000$000 réis. E querem saber por que se deu um tão avultado subsidio? Para, nos. nove annos que vigorou a tal lei, ser habilitada para exportação apenas pouco mais de um setimo da producção!

Foram taes as consequencias d'aquelle singular systema, que foi necessario que para a industria agricola mais importante e valiosa, pagasse este pobre paiz 1.000:000$000 réis no periodo que decorreu até que acabou a tal lei de 1843. Vão no fim a ver-se os resultados, habilitado apenas um setimo, da producção!

Todos sabem o que aconteceu; no fim d'este periodo a crise - era terrivel, a industria e commercio vinicola estavam agonisantes, e recorria-se, como sempre, aos poderes publicos a pedir soccorro e providencias.

Querem saber os resultados do systema no periodo que decorre desde a lei de 1852, que foi muito mais liberal, até o fim do anno de 1862?

Nos annos que decorreram desde 1853 até 1862 inclusivè, produziu a demarcação do Douro, segundo consta dos arrolamentos, 391:032 pipas de vinho. Nos mesmos annos foram approvadas para exportação 256:774 pipas: N'este periodo houve, como todos sabem, colheitas escassíssimas em consequencia do oidium, pois apesar d'isso ainda ficaram no mercado nacional a fazer concorrencia aos outros vinhos 134:258 pipas, que tanto é a differença entre o que foi produzido e o approvado para exportação!

Este anno o nobre ministro das obras publicas não seguiu as tradições lá do Douro, e commetteu uma grande falta que. foi não fazer, côrte..

O sr. Carlos Bento: — Não commetteu falta nenhuma, fez muito bem.

O Orador: — Eu digo falta no sentido das maximas que se seguem no Douro; os protecionistas é que o hão de accusar por s. ex.ª deixar saír todo o que foi approvado para isso, não é esta a pratica que se costuma seguir; isto junto ás declarações que o nobre ministro já aqui expendeu, creio que fará com que s. ex.ª já não seja por lá tido em grande cheiro de santidade (hilaridade). Pois apesar d'este procedimento do nobre ministro, querem saber quanto vinho do produzido na demarcação cá nos fica, porque em vista dos regulamentos não pôde saír? Nada menos que 24:020 pipas. A producção foi de 82:866 1/2 pipas; o habilitado para exportação foi 58:846 pipas, temos por conseguinte 24:020 pipas, que cá ficam para consumo interno.

Alegrem-se os lavradores vinicolas, e dêem graças ao go-