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SESSÃO DE 21 DE JUNHO DE 1887 1357

dadosamente ao projecto em discussão, e só tratar das condições do tratado. Direi apenas, e de passagem, que não sou tão partidario da alienação de territorios coloniaes como o illustre deputado, por isso que as colonias que hoje não remuneram os sacrificios feitos por ellas podem remunerai-os ámanhã, e porque aquellas que são apenas padrões de glorias, sem remuneração utilitaria, correspondem tambem a necessidades moraes dos povos, que não vivem só de pão.
Inclino-me antes a uma politica. prudente e circumspecta que, não dilatando demasiadamente, desproporcionadamente, o nosso dominio colonial, não nos prive tambem de dar ás colonias, ás provincias ultramarinas, o fomento, a cultura, a civilisação que têem direito de esperar de nós, e que nós lhes devemos até por interesse da metropole.
Não sou, repito, partidario da alienação das colonias, até porque similhante proceder offenderia o sentimento publico, a que todos devemos respeito; comtudo, de bom grado me associaria ao sr. deputado Castello Branco n'uma propaganda que convencesse as pessoas, que se occupam dos negocios do ultramar, de que não devem estar sempre a olhar para a historia e para os mappas. Olhem tambem para os orçamentos do estado, para os recenseamentos da população, para os quadros do exercito e da armada, para o estado do nosso pessoal administrativo, considerem nas estatisticas do commercio e da industria, porque em todos esses documentos e em todas essas ordens de factos se encontram subsidios indispensaveis para o estado sisudo e util das questões do ultramar.
V. exa. sabe, sr. presidente, que ultimamente tem-se caído entre nós no erro de isolar demasiadamente os assumptos ultramarinos dentro da administração do estado, fazendo-se até uma politica ultramarina estranha, quando não hostil, á politica geral, a que compete attender conjuncta e harmonicamente os diversos e divergentes interesses publicos; esse erro, que já está tendo consequencias ruinosas, é que precisa uma correcção energica.
Hoje, mais do que nunca, era necessario até que o ministerio do ultramar estivesse dentro do ministerio da fazenda, e bem de paredes meias com o ministerio das obras publicas, commercio e industria, e é por isso que eu tenho sustentado na imprensa e sustento aqui hoje, que não nos convém dilatar os dominios ultramarios senão tanto quanto for absolutamente indispensavel á sua segurança e ás condições essenciaes da sua prosperidade. E professando esta doutrina, não me parece que possa ser accusado de desamor para com as possessões ultramarinas; devo antes ser comparado com um chefe de familia pobre, que não quer ter mais filhos, para elles não virem tirar o pão aos filhos que já tem.
Sr. presidente, feita esta curta digressão, como desafogo de um certo sentimento de reluctancia, que me inspira a idéa da alienação de territorios portugueses, prometto á camara e a v. exa. não me tornar a desviar dos pontos principaes da questão que se discute.
O illustre deputado, na apreciação que fez das negociações e da convenção que d'ellas resultou, collocou-se n'um ponto de vista no meu entender falso; por isso é que s. exa. viu cedencias onde as não houve, e condescendencias desairosas no que melhor se deve considerar como troca de concessões.
Sr. presidente, este tratado tem diversos aspectos e admitte apreciações diversas, conforme se entende que os territorios que elle deixa na posse da Allemanha eram ou não inquestionavelmente pertencentes á corôa de Portugal. A questão do estado do nosso dominio na Africa Austral não póde decidir só por si, e hei de logo proval-o, do merito ou demerito, da vantagem ou desvantagem, do tratado; entretanto, reconheço que é importantissima para quem tem de julgal-o, e por isso desejaria que o sr. deputado que me precedeu no uso da palavra tivesse começado o seu discurso por provar que Portugal tinha direito a esses territorios, que s. exa. accusou o governo de ter cedido, e cedido gratuitamente, a uma potencia estrangeira.
Mar essa comprovação não era facil.
(Interrupção.)
Já prevejo que a opposição irá buscar armas á contradicção que parece existir entre as opiniões do meu relatorio e as do sr. ministro dos negocios estrangeiros, que durante as negociações sustentou, em face do gabinete de Berlim, que a fronteira meridional da provincia de Angola era o parallelo do Cabo Frio; devo observar, porém, que é muito possivel que o nobre ministro se limitasse apenas, n'este ponto, a sustentar as premissas estabelecidas pelo seu antecessor, o sr. conselheiro Bocage, que chegou até a reclamar, por via diplomática, contra uma carta official allemã que marcava a mencionada fronteira no 18° do meridiano da costa.
A tal supposta contradicção, de mais, está exigindo de mim uma declaração muito peremptoria.
Já ouvi n'esta camara, na discussão da concordata, e começo a ouvir outra vez, empregar contra o sr. ministro dos estrangeiros os argumentos que s. exa. ou os seus agentes nas negociações diplomaticas empregaram junto dos governos estrangeiros, ou para se auctorisarem a não acceitar as propostas d'esses governos ou para os determinarem a acceitar as propostas portuguezas. Ora, esta pratica parece-me inconvenientissima, tão inconveniente até que, se chega a radicar-se no parlamento, teremos de voltar ao uso de discutir em sessões secretas as convenções internacionaes, e de acabar com a publicação do Livro branco. Colloca os ministros, aqui, na situação de não poderem muitas vezes defender-se e justificar-se sem faltarem a deveres imprescriptiveis de delicadeza, e tolhe-lhes, emquanto negoceiam, a liberdade de espirito. Eu proprio, que não tenho responsabilidades diplomáticas, ver-me-ía agora embaraçado se precisasse explicar mais claramente á camara porque é que se devem considerar irresponsaveis as opiniões que os ministros emittem, perante as chancellarias estrangeiras, ácerca dos projectas de tratados que pretendem rejeitar ou desejam melhorar; felizmente que similhante explicação é desnecessaria. Está no espirito de todos; sabe dal-a o mais rudimentar bom senso. O sr. deputado Castello Branco, se ouvir o seu creado de mesa, no acto de apreçar um ananaz, dizer ao vendedor que o fructo é pêco, que está combalido, que é insalubre n'esta estação, certamente que não despede o zeloso propugnador dos seus interesses, accusando o de ter comprado um ananaz por elle proprio considerado como ruim e deteriorado. Bem sei que a comparação é em todos os sentidos remotissima; mas dispensa explanações menos discretas. Não fallemos mais n'isto! Não fallemos mais n'este assumpto escabroso, mas fique entendido que não me prendo, de modo nenhum, com as apreciações que o sr. conselheiro Barros Gomes acaso fez da sua obra, para uso externo, emquanto andou empenhado em aperfeiçoal-a ainda mais. Desejo que os argumentos com que defender o tratado sejam apreciados em si e pelo que valerem, e não pela sua conformidade com os de que usou o sr. ministro dos estrangeiros, n'uma situação que lhe impunha obrigações e lhe prescrevia intuitos inteiramente differentes dos meus intuitos e das minhas obrigações.
Posto isto, sr. presidente, vamos á questão cujos termos já enunciei. O sr. deputado Castello Branco, partindo do principio de que o dominio portuguez na Africa se dilatava, de direito, até ao parallelo do Cabo Frio, considera a presente convenção como um acto pelo qual o governo cedeu á Allemanha todos os territorios comprehendidos entre esse parallelo e os cursos do Cunene e do Cubango; eu, impugnando o principio fundamental do meu illustre adversario, vejo n'esse tratado apenas um accordo pelo qual Portugal e a Allemanha repartiram entre si os territorios inoccupados, que se entendiam entre a provincia portugueza de Angola e a possessão allemã de Angra Pe-