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SESSÃO DE 4 DE JULHO DE 1890
Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho
Secretarios - os exmos. srs.
José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa
SUMMARIO
Tem segunda leitura e foi admittido um projecto do lei apresentado pelo sr. Cardoso Pimentel, auctorisando uma cessão de terrenos á camara municipal do concelho de Pombal.- O sr. Antonio de Azevedo Castello Branco queixa-se de não haver sido admittida a uma arrematação de artefactos para os alumnos marinheiros a penitenciaria de Lisboa.- O sr. ministro da fazenda, pondo em relevo as distinctas qualidades de funccionario que distinguem o sr. Azevedo Castello Branco, assegura que transmitirá as suas considerações ao sr. ministro da marinha.- O sr. Carrilho, apresentando uma emenda ao projecto de lei n.° 145, pede que seja dispensado o regimento para que o referido projecto entre desde já em discussão. Assim se resolve, fendo approvado conjunctamente com a emenda, depois dos srs. Palha e Arriaga, declarando que o votavam, haverem feito sobre elle algumas considerações.- Manda para a mesa um requerimento de interesse particular o sr. Pedro de Gouveia.- O sr. Palha, apresentando uma representação, discursa sobre o serviço da saude publica, bem como sobre as visitas sanitárias e as fabricas de torrefacção de ossos.- Responde-lhe o sr. ministro da fazenda.- Os srs. Cardoso Pimentel, Paulo Cancella e visconde de Tondella mandam para a mesa representações.- O sr. Fialho Machado falla sobre a necessidade de se concluir o raminho do ferro ao norte do Guadiana, e especialmente na. parte que vae de Pias a Barrancos.- O sr. ministro das obras publicas declara que prestará toda a sua attenção a esse assumpto.- O sr. Arriaga manda para a mesa uma proposta regulando a inscripção dos oradores, ácerca da qual entra em considerações, assim como no que só refiro a um processo de descaminho de direitos, e sobre o assumpto apresenta um requerimento.- Sobre o processo de descaminho de direitos dá explicações o sr. ministro da fazenda.- Os srs. Pinheiro Chagas. Antonio Ennes, barão de Paço Vieira, José Maria de Alpoim. Dias Costa e Mattozo Santos mandam para a mesa representações, algumas das quaes auctorisam a camara que sejam publicadas no Diario do governo.- O sr. Chagas declara desejar a comparencia do sr. ministro da marinha para o interrogar ácerca da pesca a vapor.- O sr. Ferreira de Almeida renova a iniciativa de um projecto de lei.- Os srs. Dias Costa e Francisco José Machado apresentam requerimentos de interesse publico.
Ordem do dia (primeira parte): discussão do projecto de lei n.º 140. É approvado sem discussão.
Ordem do dia (segunda parte): continuação da discussão do projecto de lei n.° 120.- O sr. Carrilho explica a necessidade que tem o governo de recorrer ao imposto, elogia a anterior administração de fazenda e defende o projecto com larga copia de argumentos.- O sr. Fuschini combate o projecto com grande numero de dados estatisticos, tendendo a provar a diminuição constante de impostos directos em favor das classes ricas, e o successivo augmento dos impostos indirectos com grave prejuizo das classes trabalhadoras.
Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.
Presentes á chamada 58 srs. deputados. São os seguintes:- Abilio Eduardo da Costa Lobo, Agostinho Lúcio e Silva, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Fialho Machado, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio Maria Cardoso, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Teixeira de Sousa, Aristides Moreira da Motta, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa, Augusto José Pereira Leite, Barão do Paço Vieira (Alfredo), Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Eugenio Augusto Ribeiro de Castro, Fernando Pereira Palha Osório Cabral, Fortunato Vieira das Neves, Francisco de Almeida e Brito, Francisco José Machado, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Jacinto Candido da Silva, João de Barros Mimoso, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Paiva, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Moreira, João de Sousa Machado, Joaquim Germano de Sequeira, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, José de Alpoim de Sousa Menezes, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Monteiro Soares de Albergaria, José Paulo Monteiro Cancella, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Julio Antonio Luna de Moura, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Manuel de Arriaga, Manuel Francisco Vargas, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Manuel Pinheiro Chagas, Manuel Vieira de Andrade, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Pedro Augusto de Carvalho, Pedro Ignacio de Gouveia, Thomás Victor da Costa Sequeira e Visconde de Tondella.
Entraram durante a sessão os srs.: - Abilio Guerra Junqueiro, Adriano Augusto da Silva Monteiro, Albino de Abranches Freire do Figueiredo, Alfredo César Brandão, Alfredo Mendes da Silva, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio Baptista de Sousa, Antonio Eduardo Villaça, Antonio José Arroyo, Antonio José Ennes, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Maria Jalles, Antonio Costa, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Maria Fuschini, Bernardino Pacheco Alves Passos, Bernardino Pereira Pinheiro, Caetano Pereira Sanches de Castro, Carlos Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Christovão Ayres de Magalhães Sepulveda, Eduardo Abreu, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Eduardo José Coelho, Feliciano Gabriel de Freitas, Fernando Mattozo Santos, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco Severino de Avellar, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João Marcellino Arroyo, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, José Antonio de Almeida, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocínio de S. Francisco Xavier Pinto, José Dias Ferreira, José Elias Garcia, José Estevão de Moraes Sarmento, José Frederico Laranjo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Julio Rodrigues, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Greenfield de Mello, José Maria Pestana de Vasconcellos, Julio Cesar Cau da Costa, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luciano Cordeiro, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz Virgílio Teixeira, Manuel Affonso Espregueira, Manuel d'Assumpção, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Matheus Teixeira de Azevedo, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro de Lencastre (D.), Pedro Victor da Costa Sequeira e Roberto Alves de Sousa Ferreira.
Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho da Cunha Pimentel, Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe. Augusto da Cunha Pimentel, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Conde do Covo, Conde de Villa Real, Eduardo de Jesus Teixeira, Elvino José de Sousa e Brito, Emygdio Julio Navarro, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Fidelio de Freitas Branco, Francisco Antonio da
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Veiga Beirão, Francisco do Barros Coelho e Campos, Francisco do Castro Mattozo da Silva Corte Real, Francisco José de Medeiros, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio José Franco, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alves Bebiano, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Simões Pedroso de Lima, Joaquim Simões Ferreira, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José de Azevedo Cabtello Branco, José Domingos Ruivo Godinho, José Freire Lobo do Amaral, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Latino Coelho, José Maria dos Santos, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Marianno Oyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.
Acta. - Approvada.
EXPEDIENTE
Officio
Do ministerio da instrucção publica, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Aristides da Mota, uma nota das cadeiras de instrucção primaria creadas pelo governo o das que não chegaram a ser providas, desde 1866 até 1 de julho de 1881.
Para a secretaria.
Segundas leituras
Projecto de lei
Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a conceder á camara municipal do concelho de Pombal todos os terrenos que, tendo outrora feito parte da antiga cerca do convento de Santo Antonio, sito n'aquella villa, se acham em volta do mesmo convento, que ha annos é propriedade da referida camara e que são limitados ao norte pelo ribeiro de Ponte Pedrinha, ao nascente pela estrada real n.° 63 e largo do Cardai, ao sul pelo convento e referido largo, ao poente pelo caminho de ferro e casa do padre Francisco José Pimenta, afim de poder a mesma camara aproveitai-os, não só para alargamento do largo do Cardai, para ajardinar e arborisar, mas para qualquer outro beneficio publico, como edificação da casa da escola, etc.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala da camara, 28 de junho de 1890. - O deputado pelo circulo 68, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel.
Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de fazenda.
REPRESENTAÇÕES
Da camara municipal de Peso da Regua, pedindo que no nosso regimen dos tabacos fiquem bem garantidos os interesses do cultivador.
Apresentada pelo sr. barão de Paço Vieira e enviada á commissão de fazenda.
Da camara municipal de Castro Daire, pedindo que não sejam approvadas as novas medidas tributarias.
Apresentada pelo sr. deputado Fernando Palha e enviada á commissão de fazenda.
Da camara municipal de Tondella, no sentido da antecedente.
Apresentada pelo sr. deputado visconde de Tondella, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
Da camara municipal de Pombal, no sentido das antecedentes.
Apresentada pelo sr. deputado Cardoso Pimentel e enviada á commissão de fazenda.
Da camara municipal de Oliveira do Bairro, no sentido das antecedentes.
Apresentada pelo sr. deputado Paulo Cancella, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
Das camaras municipaes de Tarouca e de Caminha, no sentido das antecedentes.
Apresentadas pelo sr. deputado José Alaria de Alpoim, enviadas á commissão de fazenda e mandadas publicar no Diario do governo.
Da camara municipal de Arouca, no sentido das antecedentes.
Apresentada pelo sr. deputado Dias Costa, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
Da junta de parochia da freguezia de Nossa Senhora da Conceição, concelho de Rio Maior, no sentido das antecedentes.
Apresentada pelo sr. deputado Mattozo Santos, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
Da commissão executiva da junta geral do districto de Santarem, no sentido das antecedentes.
Apresentada pelo sr. deputado Antonio Ennes, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
Dos empregados da administração dos correios e telegraphos do Porto, pedindo que esclareça a interpretação do artigo 6.° do decreto n.° 1 de 17 de julho de 1886, no sentido de ser-lhes contado para os effeitos da aposentação o tempo durante o qual serviram no exercito.
Apresentada pelo sr. deputado Pinheiro Chagas, enviada á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda.
REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO
Requeiro que, pelo ministerio dos negócios da fazenda, me seja enviada, com urgência, uma nota indicando a quantidade de trigo importado no continente, desde que vigora o direito de 16 réis por kilogramma, estabelecido por decreto de 27 de fevereiro do corrente anno.
4 de julho de 1890. = F. F. Dias Costa.
Mandou-se expedir.
Requeiro que, pela repartição do gabinete do ministerio da guerra, me seja enviada a correspondencia postal e telegraphica, que me consta ali existir, do consul de Portugal em Vienna de Austria, relativamente aos esclarecimentos pedidos para o fornecimento de oito milhões de cartuchos, e qual a resposta que do ministerio da guerra foi dada ao referido cônsul. - F. J. Machado.
Mandou-se expedir.
Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, me seja enviada, com urgencia, copia do despacho de pronuncia, o da sentença que o confirmou, do accordão que a final o annullou, e bem assim do parecer da procuradoria geral da corôa que, segundo se dias, opinou pela annullação do referido accordão, isto no processo de descaminho de direitos, instaurado contra a firma Abraham Bensaude & Ca. por denuncia de 27 de novembro de 1885. = O deputado, Manual de Arriaga.
Mandou-se expedir.
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REQUERIMENTO DE INTERESSE PARTICULAR
De J. J. Ferreira da Cruz, pedindo que a expropriação feita polo governo às fabricas do tabacos se estenda às do ultramar ou que a régie venda no ultramar pelos preços do reino, que a lei de sellagem vigore em absoluto no ultramar e que seja equiparado, pelo menos, o direito de entrada do tabaco em rama nas províncias ultramarinas, ao que a régie paga pela entrada do tabaco estrangeiro reexportado por ella.
Apresentado pelo sr. deputado Pedro Ignacio de Gouveia e enviada á commissão do ultramar, ouvida a de fazenda.
O sr. Antonio de Azevedo Castello Branco: - Pedi a palavra para tratar de um assumpto que teria melhor opportunidade só fosse tratado na presença do sr. ministro da marinha, assumpto que tambem carecia um pouco da presença do sr. ministro da justiça. Entretanto, começarei expondo o facto com toda a sua singeleza, e apenas apresentarei algumas considerações que o assumpto naturalmente suggere, mas que não farei por modo nenhum com azedume, como aliás podia fazer, sem despertar reparos e estranhezas.
No mez passado publicaram alguns jornaes um annuncio que dizia o seguinte:
«Corveta Duque de Palmella, escola de alumnos marinheiros de Lisboa.
«Perante o conselho administrativo desta escola se abre praça no dia 3 de julho, pelas onze horas da manhã, para se arrematar o fornecimento dos seguintes artigos, para os alumnos marinheiros:
«Calças de panno azul;
«Calças de brim crú, etc., etc.
Tendo conhecimento deste annuncio, e estando actualmente administrando a penitenciaria de Lisboa, entendi que era do meu dever concorrer á arrematação, como por outras vezes aquelle estabelecimento tem concorrido a outras, tanto para o exercito como para a armada, e ainda para diversos estabelecimentos publicos.
Aquelle mesmo annuncio dizia mais o seguinte:
«A licitação terá logar por proposta em carta fechada, apresentada ao concelho no acto da abertura da praça.»
Ainda dizia mais o annuncio que as amostras typos estavam patentes a bordo do navio escola.
Em virtude d'este annuncio, determinei que dois contramestres de officinas da penitenciaria fossem a bordo da corveta Duque de Palmella para examinar as amostras. Foram o contramestre dos sapateiros e o contramestre dos alfaiates, e chegados á corveta ali lhes disseram que não havia lá as amostras. Em consequencia disto vieram para o arsenal, porque, como já ali se tinham feito algumas arrematações, era possível que fosse n'aquelle estabelecimento que tivesse de se proceder ao exame das amostras.
Entrando no arsenal, não lhe foram apresentadas também, e depois de varias perguntas, disseram lhes que as amostras se encontravam em casa de um individuo que tem sido antigo arrematante, acrescentando-se que era um bom fornecedor e que não havia necessidade de fornecimento differente, porque o antigo era optimo!
Os empregados vieram para a penitenciaria, deram parte á secretaria do que se tinha passado, e em resultado d'isso dirigi um officio ao secretario do conselho administrativo, com data de 23 de junho, pedindo que fossem apresentadas as amostras, e os empregados da penitencia foram novamente a bordo da corveta e examinaram então as amostras.
Chegado o dia da arrematação, foi um empregado á corveta Duque de Palmella apresentar a proposta em conformidade com as condições do annuncio e estranhou aquelle empregado que ali não se encontrassem concorrentes. Dirigiu-se então ao capellão da corveta a pedir informações e entre um sargento informou que a arrematação se effectuava ali porque o sr. immediato tinha ordenado que estivessem preparados os papeis para a arrematação se verificar.
Correu tempo, e a arrematação não começava, nem se praticava acto algum que indicasse que tal concurso se havia de realisar ali. Em face disto o empregado retirou-se, desembarcando no arsenal de marinha, e quando lá chegou teve a noticia de que ali se tinha effectuado a arrematação, sem que se tivesse marcado aquelle local ou feito com publicidade a mudança d'elle.
Todas estas circumstancias constituem um facto, que parece dispensar commentarios. (Apoiados.) O que d'isto transparece é que se tinha em vista fazer uma arrematação subrepticia, de modo que a penitenciaria não podesse de forma alguma concorrer. Ora, quaes seriam as rasões determinantes d'este facto? Quaes seriam os motivos que determinaram que se arredasse a concorrencia da penitenciaria? Seria por se presumir que a penitenciaria deixasse de cumprir rigorosamente as condições do contrato? Não podia ser. Aquelle estabelecimento, sendo obrigado a um deposito, que fez, tinha de sujeitar-se a todas as condições a que se sujeitam os particulares. Se portanto não satisfizesse rigorosamente as condições do contrato, podiam ser-lho impostas as penas comminatorias, que o mesmo contrato estipulasse, exactamente como se applica aos particulares.
A administração da penitenciária não solicita, não deseja, não pretende favores de ninguém, e quando concorre é exactamente nas mesmas condições dos particulares.
Seria porque a penitenciaria não tenha satisfeito bem? Não teriam os operarios da penitenciaria e os contramestres, que lá dirigem o trabalho, a competencia necessaria para desempenharem as obras que iam arrematar?
Creio que seria grave injustiça fazer tal supposição.
Tratava-se de fazer roupas e calçado para os alumnos da corveta escola; e a penitenciaria fornece as roupas e o calçado para os alumnos da escola do exercito; fornece tambem as roupas e calçado para os alumnos do collegio militar; e alem disso, fornece, pelo menos, dez corpos do exercito, e isto sem reclamações. Já vários fornecimentos têem sido feitos para o arsenal de marinha, satisfazendo-se a todas as clausulas dos contratos, e por modo satisfactorio. Varios estabelecimentos publicos têem pedido, não só por meio de contratos particulares, como por meio de arrematação, se façam diversos objectos nas officinas d'aquelle estabelecimento, onde presentemente se estão fazendo os moveis para os tribunaes, que vão ser montados agora em Lisboa.
Portanto, não havia rasão absolutamente nenhuma para que se pretendesse afastar esta concorrencia, porque a penitenciaria tem satisfeito integralmente a todas as condições que lhe são impostas pelos seus contratos.
Ha, pois, outras rasões; e essas, a intelligencia de toda a camara póde comprehendel-as, sem que haja necessidade de as pôr em relevo. (Apoiados.)
São obvios, e bem diaphanos os factos occorridos, para deixarem entrever o que se pretendia, afastando a concorrência da penitenciaria.
O facto é grave.
Eu já tive occasião da me referir aqui á questão do trabalho na penitenciaria de Lisboa, a proposito de uma reclamação de industriaes e commerciantes de chapéus de sol, endereçada ao parlamento.
Queixaram-se alguns industriaes que na cadeia de Campolide se faziam artefactos cuja vendagem vinha influir nos lucros da sua industria, e até certo ponto pôr em perigo essa industria.
Já então demonstrei, ou pelo menos tentei apresentar as rasões tendentes a demonstrar esta these - que quem quer
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ter penitenciaria e réus penitenciados, ha de necessariamente fornecer-lhes trabalho.
Não se comprehende systema penitenciario sem trabalho. (Apoiados.)
Fallando n'este assumpto, é claro que não tenho por intuito facilitar a administração da penitenciaria.
É muito mais facil, muito mais simples, ter presos encerrados em cellas, do que tratar do seu ensino profissional, fornecendo-lhes trabalho constante e lucrativo para elles, para as famílias o para o estado.
Mas o trabalho no regimen penitenciario cellular não mira unicamente a estes resultados materiaes.
Tende principalmente a um fim muito mais alevantado, um fim mais nobre, a rehabilitação dos condemnados, insuflando habitos de trabalho e por consequencia a ordem o regra na sua conducta depois de expiada a pena, o que para muitos é indispensável elemento de regeneração, por terem sido victimas da sua vida dissipada, das suas tendencias para o ocio e para os vicios que na ociosidade germinam, levando-os á pratica de actos attentatorios da segurança dos cidadãos e da tranquillidade publica.
O assumpto prestar-se-ia a largas considerações, que, por terem sido feitas, como já disse, e por não ser necessario repetil as perante homens tão illustrados, com os que me estão escutando, não reproduzo neste momento, circumscrevendo me unicamente a narrar os factos concernentes á arrrematação a que alludi.
Repito: segundo parece, tentou-se obstar a uma concorrencia que podia ser util para o estado, não porque n'aquelle estabelecimento se possa fazer obra por um preço inferior áquelle que se faz cá fora, e se porventura se procedesse desta forma haveria justificado motivo para se dizer que a industria livre era altamente prejudicada; mas por o ser o próprio estado, que tirava uma parte do producto do trabalho dos presos, alem da certeza de que o trabalho seria exercido com toda a garantia para os interesses individuaes e do estudo, pois que, se porventura houvesse queixas ou reclamações, a administração da penitenciaria trataria de impor a responsabilidade, quer aos mestres, quer aos operários, para que tudo que ali se fabricasse satisfizesse plenamente às condições dos contratos.
Sob este ponto de vista offerecia, portanto, a penitenciaria duas garantias, uma tornar mais económico esse fornecimento, a outra fazer com que esse fornecimento se satisfizesse completamente.
Estou certo que depois das reclamações que, na qualidade de administrador d'aquelle estabelecimento vou fazer, a arrematação ha de ser annullada, que a penitenciaria ha de ser attendida na sua proposta e que se não repetirão estes factos, que são altamente attentatorios dos bons principios de administração publica, e profundamente prejudiciaes para o regimen penitenciario adoptado na nossa legislação penal.
Como já disse, não póde haver penitenciaria sem trabalho obrigatorio para os presos. É uma these já assente e uma verdade reconhecida por todos. Em toda a parte se tem levantado questão, relativamente á influencia do trabalho penitenciário sobre a industria dos particulares. É uma questão velha.
Muitos congressos penitenciarios têem tratado d'este assumpto, e ainda no congresso da Russia esta é uma das theses, que o estado deve ser o primeiro consumidor do trabalho dos presos, os quaes devem ser applicados principalmente a fabricar objectos de que o estado se serve, quer para o exercito, quer para a marinha, quer para os vários estabelecimentos públicos que podem offerecer um consumo grande.
E este consumo grande tem a vantagem de ser mais económico por um lado, e por outro lado tem a vantagem de garantir trabalho permanente e continuo, o que é difficil de conseguir, porque é preciso que a camara attenda que se recolhem na penitenciaria de Lisboa quinhentos homens
com diversidade de idades e de aptidões, e por consequência, se se tratasse de disseminar o trabalho, não haveria penitenciaria possivel. (Apoiados.) Era preciso quasi um mestre para cada individuo, com uma despeza extraordinaria e sem nenhuma vantagem. (Apoiados.)
o passo que, tendo um consumidor por grosso em larga escala, o trabalho está garantido, e por consequência os presos não têem que soffrer os inconvenientes moraes e physicos do ocio na clausura cellular, e offerece á sociedade uma garantia de que, quando sairem cá para fora, não buo incapazes de viver socialmente, deixando de se entregarem á ociosidade, que nada tem de moralisadora. (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco) : - Sinto deveras que o sr. ministro da marinha não esteja presente para ouvir as considerações apresentadas pelo illustre deputado e meu amigo, que mais uma vez se levantou para defender, não interesses seus, do seu circulo, nem do seu partido; (Apoiados.) mas para defender os interesses da instituição de que e digníssimo director, (Apoiados.) e um dos mais distinctos funccionarios d'este paiz, por extremamente zeloso e superiormente dedicado aos interesses do estado. (Muitos apoiados.) No emtanto se as considerações do illustre deputado, passando pela minha boca hão de perder bastante, porque não tenho, nem a competencia nem o conhecimento especial que s. exa. tem do assumpto, hei de não obstante, transmittil-as ao sr. ministro da marinha tão fielmente quanto possa, e elle não deixará de tomar em toda a consideração as observações apresentadas por um amigo tão dedicado do governo e sobretudo por um funccionario tão dedicado ao seu paiz. (Muitos apoiados.)
O sr. Carrilho: - Creio que todos os lados da camara estarão de accordo em que seja approvado o projecto de lei n.° 145, que tem por a III o estabelecimento de um cabo submarino entre a metrópole e os Açores.
Nesta conformidade eu desejava pedir a v. exa. que se dignasse consultar a camara para que, dispensando-se o regimento, podesse já entrar-se na discussão desse projecto. (Apoiados.)
Permitta-me tambem v. exa. que eu diga que, tendo ouvido apresentar algumas duvidas a respeito da base 2.ª do mesmo projecto, suppondo alguns cavalheiros que, em qualquer hypothose, se podia dar um augmento de tributação nos Açores sobre a da metrópole, entendeu a commissão que devia tornar precisa e clara a redacção dessa base 2.ª, de maneira que as duvidas desapparecessem completamente a similhante respeito.
Vou, pois, ler um additamento áquella base, additamento que mando para a mesa para ser discutido conjunctamente com o projecto.
Leu-se na mesa o seguinte:
Additamento
No final da base 2.ª acrescentar: «Fica muito expressamente declarado que, afora preceito de lei especial que assim o determine, as taxas tributarias nas ilhas dos Açores não podem, em caso algum, ser superiores às que recairem no continente sobre identica maioria ou acto collectavel. = A. Carrilho.
Dispensado o regimento entrou o projecto em discussão.
Leu-se na mesa e é o seguinte:
PROJECTO DE LEI N.° 145
Senhores. - A vossa commissão de obras publicas foi presente a proposta do governo, tendo por objecto ligar entre si e com a costa de Portugal, por meio de um cabo telegraphico submarino, as ires ilhas açorianas, S. Miguel, Terceira e Faial.
Inutil é dizer que esta proposta, a par da mais viva sympathia e interesse, mereceu toda a attencão da commis-
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são, não só pelo assumpto a que se refere, como pelo modo por que se pretende realisar tal commettimento.
A ligação telegrapbica entre os Açores e o continente é mais do que um melhoramento publico destinado a satisfazer as necessidades d'aquelles povos, e a estreitar e cimentar os laços que devera unir e unem, todos os membros da família portugueza, é o pagamento de uma divida de honra, que o paiz tem em aborto, apesar dos constantes e reiterados esforços empregados desde 1885 para a solver, mas que um conjuncto de circumstancias estranhas tem impedido realisar.
É por isso, e para não protelar por mais tempo a satisfação d'esta inadiavel necessidade publica, que o governo submette á approvação do parlamento a presente proposta que, deixando a cargo do estado o lançamento e exploração do cabo telegraphico, assegura e põe a coberto de quaesquer eventualidades a realisação da obra em praso relativamente curto.
E se esta circumstancia já de si é sufficiente para que o pensamento fundamental da proposta seja digno de merecer o applauso da commissão e, no seu parecer, a vossa approvação, não o é menos o facto de o governo, seguindo os bons principios da economia política e social, pondo de porte concessões e contratos com particulares, avocar a si um serviço publico, que nenhum mais caracteristicamente o é, do que o telegraphico. O que em nada prejudica ou contraria a adopção do principio, que a commissâo entende não dever ser posto de parte, sem a pratica demonstrar a sua improficuidade, de adjudicar a construcção, lançamento e conservação do cabo submarino a um fabricante de reconhecida competência, de entre os chamados a concurso limitado, cujas vantagens no caso presente são manifestas sobre o concurso aberto, desde o momento em que taes operações sejam, directa e devidamente, fiscalisadas pelo pessoal do governo.
Calcula o governo que, em vista de orçamentos existentes no ministerio das obras publicas, a realisação d'este importante emprehendimento dará logar a uma despeza, que póde variar entre 788:000$000 réis e 1.350:000$000 réis, suppondo por isso, com bom fundamento, que réis 1.200:000$000 serão bastantes para saldar o custo do estabelecimento da linha telcgraphica de Lisboa às tres capitães dos districtos açorianos, empregando-se um cabo submarino de sufficiente conductibilidade electrica e regular resistencia mechanica.
Suppondo este capital levantado a 5,5 por cento, juros e amortisação comprehendidos, serão os encargos annuaes que pesarão sobre o thesouro de 66:000$000 réis, quantia na realidade insignificante em compensação com o beneficio alcançado, mas que o governo pretende reduzir, se não de todo annullar, com as medidas financeiras, que fazem parto e completam a proposta, e cujo exame e apreciação não incumbo á vossa commissão de obras publicas, que todavia julga não exorbitar das suas funcções emittindo a opinião de que a differença do valor entre a moeda açoriana e a continental é uma anomalia, cuja conservação nenhum principio económico ou social póde impor ou justificar.
Pelas rasões que a vossa commissão de obras publicas succintamente deixa apresentadas, e de parecer que merece a vossa approvação e deve ter convertido em lei o seguinte projecto, de lei:
Artigo 1.º O governo mandará proceder, directamente por conta do cotado, ao lançamento e exploração de um cabo telegrapbico, que ligue o ponto mais conveniente das costas do continente do reino, na metrópole, com as costas das tres ilhas açorianas, S. Miguel, Terceira e Faial, nos termos das bases seguintes:
1.ª Para os effeitos d'esta lei é o governo auctorisado a realisar, pelos meios que julgar mais convenientes, as operações que forem necessarias para a mais rápida conclusão do lançamento do cabo e sua effectiva exploração.
2.ª A fim de se occorrer ao pagamento dos encargos resultantes d'esta lei, todos os impostos e mais rendimentos do estado, de qualquer ordem e natureza, nas ilhas dos Açores, serão pagos, a datar de 1 de janeiro de 1891, em moeda do continente, sem deducção alguma. Exceptua-se a contribuição predial de qualquer exercício, vencido e vincendo, e os demais impostos e rendimentos do estado liquidados e vencidos até 31 de dezembro de 1890, os quaes serão pagos com o desconto de 20 por cento da moeda açoriana.
3.ª A moeda legal nas ilhas dos Açores, a datar tambem de 1 do janeiro de 1891, será a mesma do continente do reino, nos termos da lei de 29 de julho de 1834, e demais legislação correlativa em vigor.
4.ª Todos os pagamentos em virtude de contrato ou ajustes anteriores á execução da presente lei, nos tres districtos do Angra do Heroismo, Horta e Ponta Delgada, serão feitos em moeda forte, na conformidade da base 3.ª, com o abatimento de 20 por cento.
5.ª O abatimento de que trata a base antecedente não é applicavel a quaesquer impostos, contribuições ou taxas do estado, com excepção do que vae preceituado na parte final da base 2.ª, os quaes serão satisfeitos sem deducção alguma.
6.ª Nos pagamentos em virtude de ajustes ou contratos, uns o outros legalmente celebrados, em que se houver estipulado o pagamento em numero expresso de patacas, águias, onças, libras ou de quaesquer outras espécies de moeda e em moeda forte, não haverá alteração em virtude do disposto n'esta lei.
7.ª Logo que estiver em exploração o cabo telegraphico de que trata esta lei e nos seus termos, todo o excesso de receita que resultar da applicação da base 2.º sobre os encargos effectivos do thesouro, pela construcção e exploração do cabo, será applicado, annual e successivamente, a diminuir a taxa dos impostos nas ilhas dos Açores, inserindo se essa diminuição na lei annual do orçamento.
8.ª Não é permittido ae governo conceder de futuro a qualquer empreza o direito de amarração de um ou mais cabos em qualquer ponto do archipelago dos Açores, seja qual for o seu destino, senão mediante o pagamento ao estado de uma quantia que represente tanto quanto possivel os encargos creados por esta lei, e bem assim com a clausula obrigatoria de uma taxa de transito importante.
9.ª O governo fica auctorisado a decretar todas as demais providencias que forem necessarias para a completa execução d'esta lei.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação contraria a esta.
Commissão de obras publicas, aos 30 de junho de 1890. - Manuel d'Assumpção = Pedro Victor da Costa Sequeira = J. P. de Avellar Machado = J. M. Greenfield de Mello - Arthur Hintze Ribeiro = José Maria Charters Henriques de Azevedo - Augusto Poppe - Antonio José Arroyo = Luciano Monteiro = Jacinto Candido = Adriano Augusto da Silva Monteiro - Manuel Francisco Vargas, relator.
Senhores.-A vossa commissão de fazenda concorda com o parecer da illustre commissão de obras publicas, approvando a proposta do governo relativa ao estabelecimento de um cabo telegraphico para os Açores e aos meios para fazer face ao encargo respectivo.
Esses meios são o pagamento em moeda forte de todos os impostos e rendimentos do estado no arcbipelago açoriano, a datar do 1.° de janeiro de 1891, sem deducção alguma. Representa esta providencia um augmento de receita, do 66:000$000 réis, visto como o augmento de tributo não recáe:
1.º Nos direitos pautaes, porque já são cobrados em moe-
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da forte, e as taxas da pauta geral não são modificadas por este projecto:
2.° Na contribuição predial, porque essa será reduzida de 20 por cento, isto é, nos termos da lei de meios do exercicio de 1890-1891, os contingentes d'essa contribuição, uma vez igualada a moeda nos Açores á da metrópole, serão:
Angra 47:000$000 réis, em vez de 58:750$000 réis.
Horta 24:000$000 réis, em vez de 30:000$000 réis.
Ponta Delgada 89:000$000 réis, em vez de 112:250$000 réis, que esses districtos pagam hoje em moeda insulana;
3.° Na contribuição de registo, porque sendo esta uma percentagem sobre o valor da propriedade; diminuído de 20 por cento como vae ser o numero indicativo do valor d'essa mesma propriedade pela redacção da moeda fraca a, moeda forte, não ha augmento de tributação.
Tambem não ha augmento de tributação pelos impostor, cm. divida em 31 de dezembro do 1890: os conhecimentos respectivos, extrahidos em moeda fraca, serão pagos em moeda forte, com o desconto de 20 por cento.
Todas estas providencias estão claramente prescriptas no projecto e merecem ser approvadas.
Sala da commissão de fazenda, aos 2 de julho de 1890. - Manuel Pinheiro Chagas = Antonio José Lopes Navarro - Antonio de Azevedo Castello Branco - Arthur Hintze Ribeiro - Antonio José Arroyo = Abilio Eduardo da Costa Lobo - Pedro Victor da Costa Sequeira = Campos Henriques - José de Castro - Sergio de Castro = Luciano Cordeiro - Antonio M. P. Carrilho, relator.
N.º 140-C
O estabelecimento de um cabo telegraphico submarino entre Portugal e o archipelago dos Açores torna-se de dia para dia do instante necessidade, a fim de acabar com o quasi isolamento em que pela falta de amiudadas e rapidas communicações se encontram os povos d'aquelle archipelago, com prejuizo, não só das relações officiaes, mas tambem e mormente dos interesses commerciaes, que tanto carecem do meio telegraphico para desenvolvimento e facilidade das suas transacções.
Este momentoso assumpto preoccupa ha muitos annos o governo. Ainda em Portugal não estava installada a telegraphia electrica, em 1800, e já entre o ministerio dos estrangeiros, o das obras publicas e o nosso ministro em Londres se trocavam officios ácerca do privilegio que o general Wilde pretendia para o estabelecimento de um cabo submarino que tocasse nas ilhas dos Açores.
Fizeram-se então varios projectos de contrato, e mais tarde assignou-se um contrato provisorio, que por deliberação das cortes, publicada no Diario de Lisboa, de 4 de junho de 1867, foi annullado.
Em 18 de outubro de 1870 é assignado outro contrato provisorio com C. Scott Stakes, o qual, não tendo sido cumprido, é derogado por decreto de 13 de outubro de 1873.
Celebraram-se em seguida novos contratos com George Frcderick Simith, sendo o ultimo destes datado de 13 de outubro de 1880, e que tambem não se tornou definitivo pela falta do deposito exigido, na importância de 20:000 libras.
Pensou-se, talvez, em fazer construir a linha por conta do estado; mas, entendendo-se então que não seria fácil nem pratico proceder a tal emprehendimento, procurou-se a solução do problema por um meio indirecto, que consistiria em impor a alguma empreza ou companhia que pretendesse lançar algum cabo da Europa á America (central ou do sul), o como pagamento do direito de amarração d'esse cabo nos Açores, o ónus da construcção e exploração da linha de Portugal aos Açores.
Em outubro de 1880 abre-se concurso para o estabelecimento do cabo ligando Portugal á America, mas sem resultado, como consta do competente auto, lavrado no ministerio das obras publicas, em 3 de novembro do mesmo anno.
Da concorrencia entre as differentes companhias que exploram os cabos transatlânticos, que actualmente attingem o numero de onze, resultaram em epochas successivas, directa ou indirectamente, differentes pedidos feitos ao governo no sentido que fica apontado, mas sem resultado favoravel.
Em 1882, pela carta de lei de 17 de maio, ficou auctorisado o governo a contratar directamente e sem dependência de concurso, o lançamento de quaesquer cabos que, partindo do continente ou da Madeira, se dirigissem a alguma ou algumas das ilhas dos Açores.
Immediatamente, em 31 do mesmo mez e anno, se firmava um contrato provisorio com M. Braam, contrato este que soffreu muitas e successivas modificações, convertendo-se em definitivo apenas em 7 de maio de 1883, com a obrigação de estar dentro de um anno, a contar desta data, estabelecido regularmente o serviço.
A M. Braam foram concedidas varias prorogações e ainda a transferencia a favor da companhia «american british and continental», a qual perdeu o direito á concessão por falta de cumprimento das suas disposições, por decreto de 18 de novembro de 1885.
Em 28 de novembro de 1885 celebrou-se novo contrato para o mesmo fim entre o governo e Bensaude & Ca., no qual se determinou que o cabo entre o continente e os Açores devia estar prompto a funccionar em 28 de novembro de 1886.
Obteve a firma concessionaria uma prorogação d'este praso até 28 de junho de 1887, e trespassou a concessão á «international cable company, limited», que por novas e successivas concessões devia ter ultimado os seus trabalhos, na secção do cabo até aos Açores, em 30 de junho do anno findo, o que não cumpriu, sendo considerado nullo tal contrato, e perdido em beneficio da fazenda nacional o deposito de garantia na importância de 45:000$000 réis, por decreto de 20 de junho de 1890.
Do que fica dito vê-se, pois, que numerosas e successivas tentativas se têem feito para levar a cabo a ligação telegraphica entre Portugal e o archipelago açoriano, mas, infelizmente, todas sem resultado.
Qual a rasão explicativa d'esta falta de exito?
Facil, parece, determinal-a.
Nas epochas em que se fizeram as primeiras concessões não tinha ainda a concorrência entre as em prezas de cabos transatlânticos attingido o seu período de máxima intensidade, mão tambem não existia entre estas cinprezas uma alliança tão completa como actualmente. Era, então, possivel, por meios que conciliassem os justos interesses do estado com os das emprezas, ter attrahido para tal emprehendimento uma companhia seria e poderosa. Foram, porém, tão exigentes as condições impostas às concessões feitas que todas caducaram.
Posteriormente às actuaes emprezas de cabos submarinos, fortemente unidas e ligadas, procuraram crear no mundo financeiro embaraços e difficuldades ao exercício de emprezas analogas, receiosas de que em epochas mais ou menos próximas podessem ter interesses oppostos aos seus.
Por outro lado o numero de cabos transatlânticos é muito grande, a concorrência entre as emprezas que as exploram tem attingido a máxima intensidade, de modo a trazer o receio a novas emprezas de natureza idêntica, se o trafico telegraphico total será suficiente para sustental-as.
Considerando que não ha justificação plausivel para que se não lance mão de processo definitivo que leve aos povos açorianos um beneficio que já é utilisado em quasi todos os outros dominios da corôa portugueza, e porque rasões de toda a ordem exigem a collocação e exploração rapida da linha dos Açores, terminando de vez com in-
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certezas, não trepida o governo diante do despendio de uma somma importante para se effectuar a ligação telegraphica do continente com o archipelo açoriano, e tem a honra de vir propor-vos que ella se faça directamente por conta do estado.
O custo do estabelecimento da linha de Lisboa às três capitães dos districtos açorianos, segundo orçamento feito com todo o cuidado e largueza, empregando-se um cabo de sufficiente conductibilidade electrica e a rasoavel resistencia mechanica, comprehendidas as estações, não deve exceder 1.350:000$000 réis, na hypothese mais cara. Mas tambem é verdade que no ministerio das obras publicas, coinmercio o industria, existem documentos que avaliam essa despeza apenas em 788:000$000 réis. A media entre estes dois extremos parece-nos tomada com toda a cautela se a fixarmos em 1.200:000$000 réis.
Ponderando, porém, que alguns dos cabos transatlânticos actuaes estrio attingindo quasi o limite da sua vida provável e que é reconhecida a necessidade de abrir novas vias de communicação telegraphica entre os dois mundos, e portanto se póde e deve prever que haverá num futuro mais ou menos proximo ensejo para alguma empreza estabelecer qualquer nova linha, em relação á qual seja importante o direito de amarração de um cabo nos Açores, poderão então os encargos ficar sensivelmente attenuados, se não eliminados; porquanto, o governo portuguez, livre de qualquer compromisso ou embaraço, imporá á empreza o que for rasoavel por esse direito de amarração, quantia que poderá ser sufficiente para fazer face a todos os encargos resultantes da construcção e exploração do cabo para os Açores, sem que todavia o deixe sair das suas mãos.
No entanto, emquanto essa hypothese se não dá, e para occorrer aos encargos immediatos que da presente proposta advém ao estado, basta igualar a moeda dos Açores á da metrópole, fazendo tambem com que as contribuições do estado, que hoje ainda são pagas em moeda insulana, o sejam em moeda do continente. Este augmento não se deve dar na contribuição predial, attentas as especiaes circumstancias em que se encontra a agricultura, que, por todas as formas, é forçoso levantar do abatimento ora que ella se debate.
Não se applica tambem o augmento aos impostos vencidos até 31 de dezembro de 1890, para não onerar mais os contribuintes que, não tendo podido pagar as suas collectas lios prasos legaes, têcm ua legislação vigente multas e juros que já compensam de certa forma o thesouro desse atrazo de pagamento.
[Ver tabela na imagem].
o que constitue o novo recurso para fazer face a este inadiavel melhoramento.
Suppondo que o estabelecimento do cabo custa cerca de 1.200:000$000 réis, como acima fica dito, o juro e amortisação d'essa somma a 5,5 por cento ao anno representam 66:000^000 réis, isto é, a receita novamente creada.
No entanto, como não são só as ilhas dos Açores mas todo o paiz que lucram com o melhoramento, é justo que todo o excesso de receita do thesouro que resultar da igualação dos tributos, sobre a despeza real e annual do estabelecimento e exploração do cabo, seja applicado integralmente a diminuir a tributação no dito archipelago.
Para facilitar o emprehendimento em questão, entende o governo que muito convirá, em principio, que a construcção e lançamento do cabo seja dado de adjudicação em empreitada geral, abrindo concurso limitado aos fabricantes mais afamados neste genero, sendo tudo fiscalisado directamente por engenheiros do governo.
As reparações do cabo tambem facilmente, se ajustarão por empreitada com a própria fabrica que tiver feito o lançamento, ou com outra competente.
Feito isto, a exploração do cabo é questão simples.
Tal é a unica solução que o governo considera acceitavel para o problema do cabo telegraphico dos Açores, e, por isso, temos a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° O governo mandará proceder, directamente por conta do estado, ao lançamento e exploração de um cabo telegraphico, que ligue o ponto mais conveniente das costas do continente do reino, na metrópole, com as costas das tres ilhas açorianas, S. Miguel, Terceira e Faial, nos termos das bases seguintes:
1.ª Para os effeitos d'esta lei é o governo auctorisado a realisar, pelos meios que julgar mais convenientes, as operações que forem necessárias para a mais rápida conclusão do lançamento do cabo e sua effectiva exploração.
2.º A fim de se occorrer ao pagamento dos encargos resultantes d'esta lei, todos os impostos e mais rendimentos do estado, de qualquer ordem e natureza, nas ilhas dos Açores, serão pagos, a datar de 1 de janeiro de 189J, em moeda do continente, sem deducção alguma. Exceptua-se a contribuição predial do qualquer exercício vencido e vincendo e os demais impostos e rendimentos do estado liquidados e vencidos até 31 de dezembro de 1890, os quaes serão pagos com o desconto de 20 por cento da moeda açoriana.
3.ª A moeda legal nas ilhas dos Açores, a datar tambem de 1 de janeiro de 1891, será a mesma do continente do reino, nos termos da lei de 29 de julho de 1854, e demais legislação correlativa em vigor.
4.ª Todos os pagamentos em virtude de contratos ou ajustes anteriores á execução da presente lei, nos três districtos de Angra do Heroísmo, Horta e Ponta Delgada, serão feitos em moeda forte, na conformidade da base 3,a, com o abatimento de 20 por cento.
5.ª O abatimento de que trata a base antecedente não e applicavel a quaesquer impostos, contribuições ou taxas do estado, com excepção da que vae preceituada na parte final da base 2.ª, os quaes serão satisfeitos sem deducção alguma.
6.º Nos pagamentos em virtude de ajustes ou contratos, uns e outros legalmente celebrados, em que se houver estipulado o pagamento em numero expresso de patacas, aguias, onças, libras ou de quaesquer outras especies
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de moeda e em moeda forte, não haverá alteração em virtude do disposto n'esta lei.
7.ª Logo que estiver em exploração o cabo telegraphico de que trata esta lei e noa seus termos, todo o excesso de receita que resultar da applicação da base 2.ª sobra os encargos effectivos do thesouro, pela construcção e exploração do cabo, será applicado, annual e successivamente, a diminuir a taxa dos impostos nas ilhas dos Açores, inserindo-se essa diminuição na lei annual do orçamento.
8.ª Não e permittido ao governo conceder de futuro a qualquer empreza o direito de amarração de um ou mais cabos em qualquer ponto do archipelago dos Açores, seja qual for o seu destino, senão mediante o pagamento ao estado de uma quantia que represente tanto quanto possível os encargos creados por esta lei, e bem assim com a clausula obrigatória de uma taxa de transito importante.
9.ª O governo liça auctorisado a decretar todas as demais providencias que forem necessárias para a completa execução desta lei.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação contraria a esta.
Secretaria d'estado dos negócios das obras publicas, commercio e industria, em 28 do junho do 1890. - João Ferreira Franco Pinto Castelo Branco - Frederico de Gusmão Corrêa Arouca.
O sr. Fernando Palha: - Em nome dos meus amigos politicos, tenho a honra de declarar a v. exa. e á camara que a opposição parlamentar não combate o projecto em discussão, por isso que não deseja praticar um acto de facciosismo politico, demorando a realisação de um melhoramento tão importante como este.
Não é licito a um paiz como Portugal, que deseja merecer o nome de nação illustrada, ter districtos tão importantes, como são os dos Açores, isolados, sem communicações telegraphicas com o resto do paiz. (Apoiados.)
Não está a opposição convencida de que as asserções que se encontram no relatório do parecer sejam perfeitamente exactas; entende, porém, que, sejam quaes forem as circumstancias do paiz, não é a despeza de 60:000$000, 70:000$000 ou 80:000$000 réis a fazer com este melhoramentos que importa, para que elle se não realise quanto antes, sendo, como é, tão impreterivel e necessario. (Apoiados.)
O sr. Manuel de Arriaga: - Louvo-me nas palavras que o sr. Fernando Palha acaba de proferir.
A minha linha de conducta nesta camara é combater todos os projectos que tragam augmento de despeza; mas as circumstancias especialissimas de eu ser filho dos Açores e o facto, aliás vergonhoso, d'aquellas ilhas terem estado até agora privadas de uma communicação rápida com o continente, levam-me a abrir uma excepção para este projecto, visto que se trata de um caso de força maior, perante o qual me curvo.
Dou, portanto, o meu voto ao projecta em discussão.
Não havendo mais quem pedisse a palavra foi posto á votação e approvado o projecto conjunctamente com o additamento.
O sr. Pedro Ignacio de Gouveia: - Mando para a mesa um requerimento de J. J. Ferreira da Cruz, pedindo que a expropriação feita pelo governo às fabricas de tabaco se estenda às do ultramar, ou que a régie venda no ultramar pelos preços do reino, e que a lei de sellagem do tabaco vigore em absoluto no ultramar e que seja equiparado, pelo menos o direito de entrada do tabaco em rama nas províncias ultramarinas ao que a régie paga pela entrada do tabaco estrangeiro reexportado por ella.
As considerações com que o requerente funda o seu pedido são bastante ponderosas para, segundo julgo, serem tomadas em consideração pela camara.
O requerente não pede privilegios; apenas o que se me afigura equitativo.
Do desenvolvimento da fabricação dos tabacos deriva naturalmente, mais cultura, e d'ahi poder-se-ha tornar Angola uma segunda Philippinas, o que é uma riqueza para aquella provincia e para o paiz.
O sr. Fernando Palha Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Castro Daire, contra o imposto addicional dos 6 por cento. (Apoiados.)
Não foi sómente para este fim que eu pedi a palavra.
Quem eu desejava ver presente era o sr. presidente do conselho e ministro do reino; mas... Quand on n'a pas ce que l'on aime, il faut aimer ce que l'on a.
A fórma por que os membros do actual governo são ministrados ao parlamento, faz-me lembrar aquella por que os venenos saem das pharmacias. (Riso.) Sem receita não vem.
arta-se a gente de pedir a comparência dos srs. ministros, e sem pedir uma e muitas vezes, não apparecem. (Apoiados.) Tal é o regimen.
Precisando de occupar-me de assumptos que dizem respeito á pasta do reino, tenho de pedir ao sr. ministro da fazenda, que está presente, o favor de prevenir o seu collega, e desejarei que s. exa. desta vez seja melhor moço de recados do que foi da outra em que pedi a attenção do sr. ministro dos negocios estrangeiros para a naturalisação forçada dos nossos concidadãos no Brazil, pois até hoje, que me conste, s. exa. não se dignou vir ao parlamento dizer alguma cousa a tal respeito.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Peço a palavra.
O Orador: - Dizem que o cholera renasceu em Hespanha das suas proprias cinzas; se assim foi, não o posso eu dizer, mas o que affirmo é que, a proposito do cholera, está a dictadura tambem renascendo em Lisboa das suas próprias cinzas, (Riso.) e uma dictadura que não tem absolutamente justificação. Eu não venho arguir o governo por este facto; pelo contrario, são tantos e tão bem instruídos os provarás do libello, que o paiz tem a formular contra os que se sentam n'aquellas cadeiras, que me parece inútil estar a atacal-os com suppostos crimes de intenção, quando sobram as accusações perfeitamente fundamentadas e verdadeiras.
Eu não argúo, pois, o governo; apenas só o sr. ministro do reino estivesse presente, pedir-lhe-ía que descesse, por alguns instantes, das regiões ethereas em que costuma viver, que deixasse por minutos de sorrir aos seus pensamentos intimos, para se rir francamente, e para reprimir os actos que os seus agentes, acobertados com a sua auctoridade, estão praticando em todos os pontos do paiz. (Muitos apoiado» da esquerda.)
Vem isto a proposito do modo como as auctoridades administrativas de Lisboa estão procedendo com os delegados e sub delegados de saude.
Como v. exa. e a camara sabem, a lei de 18 de julho de 1885 dá a faculdade ao governo de em circumstancias excepcionaes, assumir a direcção do serviço de saude, que em circumstancias normaes pertence á camara municipal.
O governo, e muito bem, usou dessa faculdade e assumiu na presente conjunctura a direcção dos serviços de saude e hygiene na capital; mas o que é extraordinario é que, a proposito disto assumiu, o sr. governador civil, habituado como está a usar dos poderes discricionaes que o acto addicional dá às auctoridades do ultramar, a dictadura, e seguindo o seu exemplo, o mesmo estão fazendo os commissarios de policia, com o unico fim, permitia-se-me a phrase um pouco chula, de frigir.
Não só se passou para o governo o serviço de saude e hygiene, mas poz-se completamente de parte a lei de 1885, e isso é que lei alguma faculta.
Eu bem sei que o governo, apesar desta lei ser filha do partido regenerador, não tem por ella grande amor, e tanto que já pediu e já obteve aactorisação para a engeitar.
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Ella é, com effeito, filha do partido regenerador; mas filha bastarda; nasceu do consorcio occasional e infeliz deste partido com o sr. Fuschini, e como o parto foi difficil, não me admira que não tenha despertado sympathias; mas emquanto não a engeitarem é necessario respeital-a.
A lei no artigo 80.° diz:
«No caso de epidemia, ou quando o julgar do utilidade e segurança publica, o governo poderá, por decreto motivado, avocar a directa e immediata direcção de todos os serviços geraes de saude e hygiene.»
E o § 2.° acrescenta:
«Se a junta de saude publica aconselhar qualquer medida de caracter geral ou permanente, o governo, se com ella se conformar, communical-a-ha ao conselho de saude e hygiene municipal, para que este a execute e faça executar.»
Ora é evidente que a avocação destes serviços não significa destruição, mas centralisação.
Num caso de epidemia não é conveniente que um puxe para um lado e outro para outro; é conveniente que não haja duplicação de serviços, e é bom centralisar. Dahi a disposição da lei.
Até em casos excepcionaes a lei entende que o governo, ouvida a junta de saude, tem de consultar o conselho geral de saude e hygiene para tomar qualquer deliberação. Ora querem v. exas. saber o que fez o governador civil de Lisboa? Acabou com o conselho de saude e hygiene!
Este conselho tem reuniões fixas; pois na ultima que se quiz convocar, quando os delegados de saude chegaram, já esse conselho não existia, porque por ordem superior ficam suspensas as suas sessões.
Ora isto é inaudito. (Apoiados.)
Os delegados de saude são verdadeiros magistrados, que têem de entender e de deliberar sobre assumptos gravíssimos e interesses não menos graves. (Apoiados.) O conselho de saude e hygiene é o tribunal de segunda instancia para aonde vão todos os recursos relativos a assumptos de hygiene e nomeadamente relativos a construcções.
Não existindo esse conselho, quem queira construir uma casa tem que estar á espera, sem andar para diante, porque a lei não permitte que as construcções se façam sem o conselho de saude e hygiene ser ouvido.
Quando eu tive a honra de ser eleito pela primeira vez presidente da camara municipal este facto coincidiu com a publicação da lei a que me refiro, e lembro-me que houve uma verdadeira crise de trabalho em Lisboa, porque os serviços de hygiene não estavam organisados, porque não havia delegados de saude suficientes. E como a lei era expressa e não permittia que se approvasse construcção alguma sem ir aquelle jubet domine, o resultado foi que durante algum tempo caiu na camara municipal uma celeuma constante de empreiteiros, mestres de obras e trabalhadores, porque as obras tiveram de parar por aquella causa. Está presente um delegado de saude, que se ha de lembrar deste facto, eu pelo menos lembro-me perfeitamente, porque tive de attender a todos, e não foram poucos os cuidados que de ahi me provieram.
Mas não é só isto. A auctoridade administrativa suspendeu tambem as consultas que os sub-delegados de saude de Lisboa são por lei obrigados a dar aos pobres.
V. exa. comprehende a gravidade que a suspensão deste serviço póde ter em casos de febres e de molestias infecciosas; o indigente, o indivíduo que não tem meios recorre às consultas gratuitas, faltam cilas, não tem a quem se soccorrer, e esta falta é mais perigosa do que o deixar de condemnar-se alguns kilogrammas de bacalhau avariado mais perigosa do que a falta de visitas sanitárias que o sub delegados andara fazendo, e a pretexto das quaes deixam de prestar os soccorros aos indigentes. (Apoiados.)
Ha mais. A auctoridade administrativa suspendeu tara bem o serviço da vaccina.
Estamos providenciando para que se não morra por causa do cholera, que está longe, mas permitte-se morrer de outra, doenças que, pela forma como se está fazendo o servido, encontram tudo preparado para se desenvolver. Isto não tem justificação.
Ainda me vou referir a uma falta, da qual já conheço a causa, a qual, embora não me satisfaça claramente, não posso deixar de confessar que tem alguma força.
Vi hontem num jornal, e repetido n'outro hoje, que um commissario de policia tinha ido com tres (!) sub-delegados de saude condemnar uma porção de bacalhau avariado. Parece-me que bastava que a auctoridade fosse, conforme manda a lei, com um só sub-delegado, e que, quando o tossuidor do género condemnado não se conformasse com essa decisão, então é que se devia nomear pelas vias comitentes uma commissão do sub-delegados para confirmar a não a primeira sentença. É o que manda a lei.
Sei que não houve sentença, e que isto foi motivado pelo escrupulo do funccionario que condemnou o genero, em quem fez peso o valor d'elle.
Este assumpto é muito digno de respeito, mas não ilesas circumstancias especiaes, em que, para alimentar este luxo de condemnar géneros com juntas se arriscam os pobres a morrerem sem soccorros medicos. E visto que estou fatiando da hygiene, lembrarei ao ministro do reino um assumpto que interessa altamente á hygiene e á salubridade de Lisboa.
S. exa. talvez não saiba que ha um sitio chamado Terramotos, bairro de Alcantara, onde existem fabricas de torrefacção de ossos, contra as quaes se têem constantemente apresentado muitas reclamações e feito muitos esforços para serem tiradas dali; e que, tendo acabado umas, outras ficavam e outras abriam.
Chamo attenção do sr. ministro do reino para este foco de infecção, que não deve ser por mais tempo permittido dentro da cidade.
Não sei que influencias nefastas tem protegido industria tão nocivas á saude publica, o que sei é que o actual sr. ministro dos estrangeiros apresentou na camara dos dignos pares, sendo opposição ao governo que presidia então aos negócios do paiz, reclamações sobre este ponto, e disse que quando o partido regenerador fosse ao poder ha vir de acabar com aquellas fabricas.
E parece-me que o sr. ministro da fazenda tambem n'esta casa, por occasião de apresentar uma representação, declarou que não havia motivo para se não acabar com aquellas fabricas.
Pois chegou agora a occasião de poderem como governo executar o que aconselhavam na opposição, e eu de novo chamo a sua attenção para este ponto, a fim de que se não consinta por mais tempo aquelle foco de infecção, que é muito mais perigoso e nocivo á saude, do que a existência de alguns kilogrammas do bacalhau avariado que tem melhor fiscal do que qualquer delegado do saneie, o nariz do consumidor.
Termino como comecei, repetindo que, fazendo estas reclamações, não me anima qualquer desejo de fazer opposição, qualquer interesse partidario, tão somente o desejo de denunciar ao governo irregularidades que devem ter um termo, factos que podem prejudicar gravemente o interesse de todos.
A representação teve o destino indicado a paginas 1008. O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - O illustre deputado e meu amigo o sr. Fernando Palha, queixou-se da não comparência do sr. presidente do conselho de ministros a esta sessão e ainda a outras. S. exa. é injusto porque não ignora que a presença do sr. Serpa Pimentel tem sido necessária na outra camara, em virtude da discussão do projecto do bill de indemnidade, projecto que não só tem caracter político, mas envolve medidas de que aquelle nosso collega tem a responsabilidade, e que não podiam ser discutidas sem que elle estivesse presente, como chefe do gabinete.
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Mas visto que o illustre deputado se queixou tambem de nós outros ministros não sejâmos bons moços de recados para transmittirmos ao sr. presidente do conselho as considerações que s. exa. apresenta, dir-lhe-hei que continue a ser tão bom moço de recados de s. exa., como o tenho sido, ha muitos annos, a esta parte.
S. exa. sabe que me honrei sempre de desempenhar esse cargo era seu serviço, e agora continuo a desempenhal-o do mesmo modo. E s. exa. não ignora que, ainda não ha muitos dias, me encarreguei de apresentar a um dos meus colegas, as considerações feitas pelo illustre deputado sobre a emigração para o Brazil.
O meu illustre amigo queixou-se do que o sr. presidente do concelho ainda não viesse conversar com s. exa. mas o que eu posso dizer é que chamei a attenção de s. exa. para o assumpto de que o illustre deputado se occupou, e estou certo que na primeira occasião em que o sr. ministro do reino venha á camara, mostrará que não só não tem desonrado o referido assumpto, mas que, pelo contrario, a maneira por que se tem occupado d'elle, é mais uma prova da muita competencia tom que aquelle cavalheiro trata dos negocios relativos à sua pasta, desempenhando-se sempre, com muita distincção, das funcções de que está investido.
Mais uma vez affirmo ao sr. Fernando Palha que transmittirei ao sr. ministro do reino as considerações que acaba de fazer.
Direi, com relação ao serviço de saude e hygiene, que, como vi n'uma das bancadas da maioria um sub-delegado de saude, dos mais distinctos, pedi à s. exa. algumas explicações ácerca de diversos assumptos tratados pelo illustre deputado, e d'ellas inferi que o sr. governador civil de Lisboa de forma alguma suspendeu, ou acabou, com as reuniões e trabalhos do conselho de saude e hygiene.
o que aquelle magistrado fez unicamente, e n'este ponto peço a attenção do illustre deputado, pois julgo poder satisfazer os seus desejos, mostrando que as suas apprehensões, n'esta parte, não suo fundadas, foi adiar uma das sessões do referido conselho, exactamente quando, em virtude de factos que não preciso repetir á camara, porque s à o conhecidos de todos, se accentuava a necessidade de se proceder, em toda a cidade, a visitas sanitárias de toda a ordem, e com a máxima actividade.
Foi, portanto, n'essa occasião que se entendeu dever preferir outros serviços, e se adiou a reunião do conselho; porque o que havia de mais urgente eram essas visitas a inspecções, a que parece não ligar, o sr. Fernando Palha, bastante importancia.
Tenho ouvido dizer, aos individuos competentes, que, de todas as medidas e cautelas que se devem empregar n'estas occasiões, a de recommendar aos differentes agentes, encarregados de fiscalisar os assumptos da saude publica, que as inspecções, são preferiveis a todos os outros expedientes, é a que deve sobrelevar.
O sr. Fernando Palha: - Eu não deixo de ter toda a consideração por esse serviço; o que desejo é que com elle se não prejudiquem outros que tambem são indispensaveis. Para circumstancias extraordinarias appliquem-se tambem meios extraordinarios; e creia s. exa. que se os serviços, de saude são necessarios e inadiaveis, não são menos, importantes aquelles que estão submettidos á fiscalisação do concelho de que se trata.
O Orador: - As actuaes circumstancias são extraordinarias, pelo que foi necessario empregar maior actividade nas visitas sanitar as, do que aquella com que ordinariamente se procede n'esse serviço.
Espero que em breve chegará occasiHo do conselho se ocoup.ar dos assumptos para que ellc foi creado.
Com relação á torrefacção de ossos, effectivamente apresentei, quando na opposição, uma represantação largamente fundamentada contra ella, nas condições em que actualmente se exerce em Lisboa.
Pareceu-me, n'essa occasião, que o sr. ministro do reino de então o daria providencias a esse respeito; e como tambem não vi que, n'esta conjunctura, os illustres deputados da maioria me coadjuvassem nos meus esforços junto do sr. Luciano do Castro, imaginei que o negocio tivesse ficado resolvido. Vejo agora que assim não succedeu, e por isso chamarei a attenção do sr. ministro do reino para o assumpto.
Cumpre me todavia declarar que não renego as minhas responsabilidades, nem as considerações que fiz quando apresentei a referida representação.
O sr. Elmano da Cunha: - V. exa. tem a bondade do me informar sobre que tempo falta para se passar á ordem do dia, e quantos cavalheiros estão inscriptos para fallarem nesta parte da sessão?
O sr. Presidente: - A hora para se passar á ordem do dia está quasi a dar.
A inscripção é a seguinte:
Srs. Cardoso Pimentel, Paulo Cancella, visconde de Tondella, Fialho Machado, Manuel de Arriaga, Pinheiro Chagas, António Ennes, Ferreira de Almeida, barão de Paço Vieira, José Maria de Alpoim, Dias Costa, Mattozo Santos e Francisco José Machado.
O sr. Elmano da Cunha: - Nesse caso, como não quero prejudicar nenhum dos cavalheiros inscriptos, reservo-me para expor amanha o que tenho a dizer.
O sr. Cardoso Pimentel: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do Pombal, a respeito de medidas de fazenda.
A representação teve o destino indicado a pag. 1008 d'este Diario.
O sr. Paulo Cancella: - Mando para a mesa tuna representação da camara municipal de Oliveira do Bairro, contra a proposta do addicional de 6 por cento.
Não faço considerações sobre ella, porque o projecto está em discussão.
Peço a v. exa. a fineza de consultar a camara sobre se consente que esta representação seja publicada no Diario do governo.
A representação teve o destino indicado a pag. 1008 d'este Diario, e foi auctorisado a sua publicação no Diario do governo.
O sr. Visconde de Tondella: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Tondella contra o addicional de 6 por cento.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada na folha official.
A representação teve o destino indicado a pag. 1008 d'este Diario, e foi auctorisada a sua publicação no Diario do governo.
O sr. Presidente: - A commissão de redacção não fez alteração alguma no projecto de lei n.° 145. Vae ser expedido para a outra camara.
O sr. Fialho Machado: - Chamou a attenção do sr. ministro das obras publicas para a necessidade de se concluir o caminho de ferro ao norte do Guadiana, e especialmente a parte que vae de Pias a Barrancos.
(O discurso será publicado na integra e em appendice quando que s. exa. o restitua.)
O sr. Ministo das Obras Publicas (Arouca): - Ninguem mais do que eu está convencido da justiça das reflexões apresentadas pelo illustre deputado; no entretanto s. exa. sabe perfeitamente que, a boa vontade de todos os ministros, que têem estado á testa d'esta pasta, tem, sossobrado diante das difficuldades que se têem levantado sempre, para se concluirem estas linhas ferreas.
O prolongamento do caminho de ferro de Pias para Barrancos é, a meu ver, de toda a importancia, não só pelas, considerações que o illnstre deputado fez, mas por causa, do desenvolvimento da industria mineira, que póde ser importantissima n'aquellas regiões, e tanto que eu, antes mesmo de se apresentar no ministerio das obras publicas um requerimento para o prolongamento do caminho de
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ferro até Barranros, mandei estudar essa linha, a ver se podia facilitar n'aquella região a exploração de similhante industria.
Tempo depois, apresentou-se no ministerio um requerimento, pedindo a concessão do prolongamento dessa rinha, requerimento a que dei o devido seguimento, e posso assegurar ao illustre deputado que hei de empregar todos os esforços para que o despacho se dê bom brevidade, a fim de se poder tomar uma resolução condigna aos desejos de s. exa. e em harmonia com o que é de toda a justiça.
O sr. Manuel de Arriaga : - Como a hora vae muito adiantada limitarei as minhas considerações a muito pouco ; no entretanto a camara verá a grande justiça que me assiste no que lhe vou expor.
V. exa. sr. presidente e bem assim a camara lerão observado a difficuldade, quasi impossivel de vencer, em que se encontra a minoria d'esta casa para garantir o uso da palavra na discussão de quaesquer projectos; basta haver uma levo combinação de alguns membros da maioria com alguns da minoria, para se inutilisar de todo o uso de um direito por assim dizer sagrado!
Quando foi da discussão do blll não me succedeu só a mim, mas a muitos, que tendo trabalhos preparados de antemão, despezas feitas, porque quem se habilita para fallar num parlamento, tem de estudar e de comprar livros, viram perdido o seu tempo e o seu trabalho, pois a uma certa altura da discussão a maioria deu a matéria por discutida.
E se o deputado no respeito d'estas formulas parlamentares discute um projecto na generalidade, como eu fiz na questão do bill, reservando-me para entrar na especialidade, o mais importante d'aquelle debate, vê tuna serie de discursos na generalidade invadindo a especialidade e vice-versa, que a certa altura, dada a matéria por suficientemente discutida, os trabalhos desapparecem; as nossas responsabilidades ficam por liquidar-se; as opiniões confundem-se; e não me parece que o paiz, cujos direitos e interesses vimos ou devemos vir aqui advogar, lucre com estes processos!
O alvitre que apresento á camara desejaria muito que fosse acceito,. apesar d'esta origem um pouco peccaminnsa da minha pessoa...
Eu leio a proposta que desejo mandar para a mesa.
(Leu.)
Como vêem adoptada ella o direito de todos ao uso da palavra fica perfeitamente garantido.
Peço a urgência para este assumpto grave, não digo para hoje, por ser já tarde mas para amanhã se resolver. V. exa. sr. presidente não presidia nesse logar, quando na sessão nocturna se abriu a inscripção dos oradores sobre o projecto em discussão dos 6 por cento, addicionaes, mas garanto debaixo da minha palavra de honra, e aqui ha testemunhas presenciaes do facto, que quando foi pedida a palavra sobre a questão, que se debate hoje, eu tive a cautela para garantir o meu direito, de ser do numero dos poucos que primeiro entraram nesta casa.
Pela maneira por que propositadamente pedi a palavra, em voz alta e clara, e pela prevenção previa que fiz na mesa antes de mim não podia haver um único sr. deputado inscripto.
Pela ordem por que pediram a palavra, posso garantir a v. exa. que eu seria o primeiro orador a fallar. Mas ha sempre umas taes combinações antemão feitas na mesa e difficuldades, que são ia vezes invencíveis, e que eu acato ha uns mysterios, em que não quero agora entrar e que a camara comprehende bem, que dão em resultado, que devendo ser o primeiro ou dos primeiros inscriptos, estou ahi no nono logar.
É possivel, que a camara vendo a minha inscripção n'aquella altura, tenha de antemão preparado as cousas para mais uma vez me privar da palavra!...
O que se passou n'essa mesa, sr. presidente, logo após o pedir da palavra, o aos olhos de nós todos, para disporem dos direitos dos oradoret, mais parecia roupa de francezes para me servir da phrase popular ainda hoje consagrada.
Taes scenas, e as consequencias que d'ellas derivam, não me parecem graves e verdadeiramente dignas de um parlamento!
E preciso por lhes cobro em nome dos interesses da nação, da nossa própria dignidade e decoro do parlamento permittam-me a dureza da phrase.
Ha grupos n'esta casa que têem ou devem ter as suas opiniões definidas; ha partidos que, para o serem, antes de tudo devem desfraldar e seguir uma bandeira, que nunca se confunda com as cores da bandeira inimiga, e aquella que eu sigo está n'estes casos, para qualquer grupo monarchico para onde me volte.
Se não levantarmos os nossos ideaes políticos e não nos mantivermos intransigentes na sua manutenção e nos processos a empregar, isto tudo cairá numa tal confusão, que o opportunismo proclamado d'aquelle lado da camara pelo sr. Oliveira Martins, trará como consequencia fatal o aniquilamento da dignidade parlamentar!...
Hoje, mais do que nunca, permitta-me o sr. Oliveira Martins que lho diga, a nação portugueza carece de abandonar as transigencias com os adversarios que nos têem trazido a este abatimento moral e político, em que infelizmente nos encontrâmos!...
O seu principio de que em política e em finanças, visto não haver hoje idéas definidas em qualquer assumpto, cada qual deve ceder às influencias do meio, tem-nos trazido a esta bancarota moral que ahi impera, e contra a qual têem fatalmente de reagir as nações fracas e pequenas como a nossa, que só podem prevalecer pelo culto do direito, da moral e da justiça.
Lamento que s. exa. d'aquelle lado da camara com o seu talento privilegiado viesse sanccionar um tão nocivo e lastimoso expediente de vida!...
Eu, que sigo princípios diametralmente oppostos, reconheço a necessidade, e tenho a certeza de ter do meu lado o paiz, de mantermos aqui as idéas e os processos que proclamámos lá fora por melhores.
Desde que ha já. quatro ou cinco grupos políticos, qualquer que seja o seu numero, é necessario que emittam os seus pareceres, para que todos saibam a responsabilidade que assumem e qual a marcha que desejam levar na administração do estado.
A minha proposta neste sentido parece-me, que resolverá as difficuldades até agora suscitadas e mantidas, o não encontrará opposição nos homens independentes e sinceros que haja nesta casa.
Como entrou na camara o digno ministro da fazenda, eu desejo fazer uma pergunta a s. exa., antes de mandar um requerimento para a mesa, sobre o assumpto em que o vou interrogar.
Sr. presidente, o parlamento tem visto a linha inflexivel do meu proceder n'esta casa, em não levantar questões irritantes, ou pcssoaes ou de interesse local. Questões pessoaes, questões locaes, ponho-as todas de parte: só trato aqui de questões de interesse geral.
Mas ha uma que me parece sobreleva a todas, é a questão da moralidade publica. Para este assumpto não ha fronteiras entre os partidos; não ha mesmo partidos.
Nos paizes livres a mais solida, a mais preciosa das propriedades, deve ser a honra do cidadão... sobretudo quando investido de cargos publicos.
A honra do cidadão em taes casos não é só propriedade d'elle, é acima de tudo propriedade da nação, que todos temos direito e obrigação de manter e zelar.
Quando sobre elle recáe uma arguição que o enodoa, devemos todos interessar-nos, começando pelos proprios arguidos, em que pelas vias legaes, cujas portas devem estar abertas a todos e não empecidas ou fechadas, se liquidem
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todas as responsabilidades, para que não soffra o innocente, e não se premeie o culpado. (Apoiados.)
A questão que vou levantar é uma d'aquellas que tem cruzado, francamente o digo, uma profunda impressão de desagrado no meu espirito.
Sr. presidente, v. exa. é perfeitamente sabedor do assumpto e o digno ministro da fazenda do mesmo modo.
Refiro-me áquella denuncia de descaminho de direitos em que está envolvida a firma Abrahão Bensaude & Ca.
Depois de um renhido debate nalguns jornaes independentes, e de uma serie de peripécias e expedientes em que eu níio quero entrar, parece ter-se suffocado na capital a opinião publica sobre este assumpto, mas é certo que uma corrente de opinião independente, que está fóra d'esta opinião convencional de certa imprensa, irrompe e segue no seu curso natural podendo ter formado um juizo pouco favoravel sobre a firma arguida.
Será fundada ou não? Não quero emittir ainda o meu parecer.
É todavia certo que se deram circumstancias tão extraordinarias, que o silencio artificial que se pretende fazer em volta d'este processo, não me parece que dê honra a ninguem, quer os indivíduos arguidos estejam innocentes, como de bom grado desejaria, quer estejam culpados como muitos os suppõem.
N'estas circumstancias desejava ouvir o digno ministro da fazenda que teve a coragem de já emittir parecer, com a integridade e independências próprias do seu caracter, quando exercia funccões de grande responsabilidade, e firmou ahi o seu nome, que rasões tem havido para o silencio guardado até agora sobre o accordão que subia á sancção ou revogação de ministro; e que distincção pretende s. exa. dar a este famoso, e desgraçado pleito, em que ainda hoje os quaixosos arguidores conclamam que têem pelo seu lado a verdade e a justiça e em que não será admissivel como desfecho ultimo a confusão e o silencio?!...
ha mais de um anno que o accordao onde s. exa. assignou vencido neste processo espera uma deliberação do ministro!...
Ha muito tempo que se diz em publico que a procuradoria, geral da corôa consultou desfavoravelmente ao processo arguido.
Nem o accordão nem o parecer da procuradoria são no emtanto até hoje do dominio publico.
Não é regular nem é plausivel este silencio.
Dêem-se a todos as franquias consignadas nas leis para que triumphe a verdade; se ha calumniadores que se punam; se ha innocentes arguidos, que se lhes garanta a reparação da honra; mas se ha culpados e os queixosos têem pelo seu lado a verdade, e com ella a justiça, que se lhes dêem guarida e protecção nos tribunaes.
Para orientar o meu espirito e formar juizo seguro do que se tem passado até agora, alem da resposta do sr. ministro, desejo que sejam enviados com brevidade os seguintes documentos.
Leu-se na mesa a seguinte:
Proposta
Para se regularisarem melhor as discussões parlamentares e dar-se às minorias garantia efficaz ao direito indiscutível que lhes assiste de intervindo nos debates e emittindo n'elles as suas opiniões, definirem perante o paiz as suas responsabilidades, proponho que: sempre que haja atropellamento no pedir da palavra, e se torne por isso difficil a inscripção pela verdadeira ordem por que fora pedida, seja a presidencia auctorisada a inscrever os oradores pelos grupos políticos representados nesta casa, intercallando successivamente grupo a grupo, seguindo-se os mais oradores no uso da palavra pela ordem por que a forem pedindo. - O deputado por Lisboa, Manuel de Arriaga.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Não tenho duvida, absolutamente alguma, era responder, da maneira a mais cabal e precisa, às perguntas que me dirigiu o illustre deputado.
O assumpto para que s. exa. chamou a minha attenção, é muito meu conhecido porque mais de uma vez tive de intervir como magistrado fiscal no andamento e nos termos d'este processo.
S. exa. perfeitissimamente sabe que um jornal se occupára mais de uma vez, largamente, d'este assumpto.
O processo foi julgado em 1.ª e 2.ª instancia. A 1.ª instancia absolveu, por maioria de votos, votando contra o auditor fiscal da 1.ª e na 2.ª instancia ficou formado o accordam da 1.ª por maioria de votos, assignando eu vencido, e fundamentando o meu voto.
Isto foi succedido em junho ou julho do anno passado; era ministro da fazenda o sr. Barros Gomes.
A lei que está em vigor determina que o accordão proferido pelo tribunal fiscal não possa ser executorio sem a confirmação do ministro. Foi por isso que seguiu para o ministerio da fazenda para que este deliberasse.
O sr. ministro da fazenda, consultou a procuradoria geral da corôa ácerca desse processo, a qual opinou pela sua annullação.
O processo voltou ao ministerio da fazenda, e quando tomei posse d'este encontrei ali o processo sem que se tivesse confirmado o accordam. A procuradoria geral da corôa foi tambem de opinião que o ministro não só podia conffirmar, mas podia julgar por si só.
Sem entrar na apreciação d'este parecer, vou, para definir a minha situação, responder precisamente ao illustre deputado, e considero uma fortuna o poder ser comprehendido por s. exa., que é um advogado distincto, e portanto conhecedor d'estes assumptos.
Fossem quaes fossem os fundamentos do accordão, eu entendo que um ministro n3o póde senão confirmal-o ou recusar a sua confirmação.
. exa. comprehende que eu, tendo votado contra, não podia dar a minha confirmação e portanto, como era natural, recusei a.
E s. exa. comprehende, que no caso contrario o ministro vinha a ser uma espécie de tribunal de cassação, sendo evidente que um juiz que tomou conhecimento de um assumpto em uma instancia, não póde depois tomar conhecimento delle na instancia superior.
A minha situação levava-me a recusar a confirmação, mas nesse caso o processo ficaria nessa situação emquanto o ministro da fazenda fosse, como sou, auditor de segunda instancia.
Demonstrado, como se acha neste caso, o vicio da lei, procurarei remedial-o em virtude da auctorisação que pedi para reformar o serviço das alfândegas. Se essa auctorisação me for concedida, eu, como entendo que os ministros não devem ter segredos, não tenho duvida em declarar que a minha opinião é favorável á reforma da lei actual, e que por essa reforma devem passar para o supremo tribunal de justiça as attribuições que hoje competem ao ministro.
O sr. Manuel de Arriaga: - Agradeço as explicações dadas por s. exa. o sr. ministro da fazenda, e faço votos para que s. exa. mantenha, como é de esperar, a mesma integridade e independencia, que o têem guiado até agora, nesta grave questão, e que esta chegue ao seu termo sem quebra da justiça, para ninguém.
O sr. Pinheiro Chagas: - Mando para a mesa uma representação dos empregados da administração dos correios e telegraphos do Porto, pedindo que se esclareça a interpretação do artigo 6.° do decreto n.° 1 de 17 de julho de 1886, no sentido de ser-lhes contado para o effeito da aposentação o tempo durante o qual serviram no exercito.
Peço nos srs. ministros presentes a fineza de communi-
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carem ao seu collega da marinha que eu desejo interrogal-o ácerca da pesca a vapor.
O sr. Antonio Ennes: - Mando para a mesa uma representação da commissão executiva da junta geral do districto de Santarém, contra as medidas tributarias.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobro se consente que esta representação seja publicada no Diario do governo.
A representação teve o destino indicado a pag. 000 d'este Diario, e foi auctorisada a sua publicação no Diario do governo.
O sr. Ferreira de Almeida: - Mando para a mesa uma proposta renovando a iniciativa do projecto de lei n.° 67 de 1889.
Ficou para segunda leitura.
O sr. Barão de Paço Vieira (Alfredo): - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Peso da Regua, pedindo que no novo regimen dos tabacos fiquem bem garantidos os interesses dos cultivadores.
A representação teve o destino indicado a pag. 1008 d'este Diario.
O sr. José Maria de Alpoim:- Mando para a mesa duas representações das camaras municipaes de Tarouca e de Caminha, contra o addicional de G por cento.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que estas representações sejam publicadas no Diario do governo.
As representações tiveram o destino indicado a pag. 1008 d'este Diario, e foi auctorisada a sua publicação no Diario do governo.
O sr. Dias Costa: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Arouca, reclamando contra o addicional de 6 por cento, e peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.
Mando tambem para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo, pelo ministerio da fazenda.
A representação teve o destino indicado a pag. 1008 d'este Diario, e foi auctorisada a sua publicação no Diario do governo.
A representação mandou-se expedir.
O sr. Mattozo Santos: - Mando para a mesa uma representação da junta de parochia de Nossa Senhora da Conceição, do concelho de Rio Maior, contra o addicional de 6 por cento.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.
A representação teve o destino indicado a pag. 1008 d'este Diario, e foi auctorisada a sua publicação no Diario do governo.
O sr. Francisco Machado: - Mando para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo, pelo ministerio da guerra.
O requerimento vae ser publicado a pag. 1008 d'este Diario, e mandou-se expedir.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Pedi a palavra para declarar ao sr. Pinheiro Chagas que transmittirei o seu pedido ao sr. ministro da marinha.
ORDEM DO DIA
O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto n.° 140.
Leu-se. E o seguinte:
PROJECTO DE LEI N.° 140
Senhores. - O governo transacto entendeu que era de uma urgencia indeclinavel crear em Lisboa um curso de pathologia e clinica ophtalmologica, e para o fazer teve de assumir poderes dictatoriaes, tomando providencias de caracter legislativo. O governo actual; para regularisar a situação, vem propor ao parlamento que formule una bill de indemnidade.
Parece á vossa commissão que esse bill se deve conceder para que não permaneça a irregularidade que o governo justamente deseja remediar, e tambem porque a medida que o governo transacto entendeu dever decretar se tivesse sido apresentada ao parlamento, mereceria a sua approvação, visto que satisfaz uma justa reclamação dê todos os que se interessam pelas sciencias medicas portuguezas.
Por isso propõe á vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É relevado o governo da responsabilidade em que incorreu pela promulgação do decreto de 8 de agosto de 1889, que creou na cidade de Lisboa um curso theorico e pratico de pathologia e clinica ophtalmologica.
§ unico. Continuarão em vigor, emquanto não forem por lei alteradas ou revogadas, as disposições do mencionado decreto.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 28 de junho de 1890. = P. Victor da Costa Sequeira = Aristides da Mota = L. Cordeiro = José B. Ferreira de Almeida = Marcellino Mesquita = Campos Henriques = Pinheiro Chagas, relator.
N.° 124-B
Senhores. - Em 8 de agosto de 1889 foi decretada a creação na cidade de Lisboa de um curso theorico e pratico de pathologia e clinica ophtalmologica, contendo o respectivo diploma varias disposições que necessitam da sancção legislativa. Têem por isso a honra de submetter á vossa illustrada apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É relevado o governo da responsabilidade era que incorreu pela promulgação do decreto de 8 de agosto de 1889, que creou na cidade de Lisboa um curso theorico e pratico de pathologia e clinica ophtalmologica.
§ unico. Continuarão em vigor, emquanto não forem por lei alteradas ou revogadas, as disposições do mencionado decreto.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Presidencia do conselho de ministros, 9 de junho de 1890. = Antonio de Serpa Pimentel = Lopo Vaz de Sampaio e Mello = João Ferreira Franco Pinto Castello Branco = Julio Marques de Vilhena = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Frederico de Gusmão Corrêa Arouca = João Marcellino Arroyo.
Não havendo quem pedisse a palavra, foi posto á votação e approvado.
O sr. Presidente: - Continua em discussão o projecto n.° 120, addicional de 6 por cento.
O sr. Carrilho: - Disse que se encontrava numa posição difficil por ter de responder a um cavalheiro de tão elevados dotes como o sr. Oliveira Martins; mas esperava que a camara o desculpasse, se não podesse desempenhar-se cabalmente do seu encargo.
Parecia-lhe que s. exa. tinha dito que o pensamento do partido progressista era a restauração do imposto de rendimento.
O sr. Oliveira Martins:- Declarou que o que tinha dito fora que o partido progressista tinha apresentado a proposta do imposto de rendimento, e que pessoalmente entendia que esta proposta devia ser restaurada.
O Orador:- Daria neste caso outra direcção às suas observações, e não leria parte do relatorio do sr. Marianno de Carvalho, em que se dizia que aquella proposta não devia ser restaurada, e que n'aquella epocha as contribuições não podiam ser alteradas.
As condições da Europa e do paiz tinham mudado de então para cá; o paiz já não nadava em dinheiro, e por isso o governo se via obrigado a recorrer a um imposto que não tivesse dificuldades,
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Até 1887 a administração fora felicissima, mas depois tinham começado os augmentos de despeza, augmentos que eram justos, mas imprudentes. Podia fali ar assim, porque votara contra elles.
Tinha o sr. Marianno de Carvalho prestado grandes serviços ao paiz, e mais prestaria se não tivesse sido contrariado, às vezes pelos seus proprios amigos. Se as idéas de s. exa. tivessem triumphado todas, as circumstancias do paiz seriam actualmente melhores.
Comparando o orçamento de 1887-1888 com o de 1890-1891, o orador sustentou que havia um augmento de receitas insignificante relativamente ao augmento das despezas.
Era por isto que o governo se via obrigado a recorrer ao imposto.
Explicou os augmentos de receitas e os augmentos de despezas, concluindo que ficavam 2.500:000$000 réis de deficit.
Como se havia de fazer face a este deficit, quando o sr. Marianno de Carvalho dissera o anno passado que não se podia fazer a remodelação dos impostos, e quando as circumstancias actuaes menos se prestavam a esta remodelação?
O meio era o addicional.
E o addicional não era fácil de fazer-se; não o fazia quem queria.
O addicional só se fazia, quando as circumstancias o justificavam, como agora.
Achava melhor que se pagassem 1.400:000$000 réis em occasião opportuna, do que se pagassem mais tarde 3.000:000$000 ou 4.000:000$000 réis, depois do paiz ter passado por vergonhas.
E o sacrificio não era tão grande como imaginavam algumas pessoas, porque as quotas eram relativamente insignificantes.
Por estas rasões dava o seu voto ao projecto.
Estava convencido de que o paiz não admittia uma remodelação de impostos ou um imposto novo, fosse qual fosse.
Analysando as verbas da defeza nacional e as alterações introduzidas no orçamento para lhes fazer face, sustentou que a situação tinha melhorado desde 11 de janeiro.
Não se referiria largamente á proposta relativa ao imposto de carga, que o illustre deputado combatera no seu pensamento principal; só diria que tinha presentes representações dos armadores e da associação commercial de Lisboa, concordando com o mesmo pensamento.
Pelo que respeitava ao imposto sobre a aguardente, felicitava o illustre deputado por s. exa. achar que a mesma proposta era um pouco melhor do que a actual legislação.
Talvez esse pouco produzisse mais do que o que está no orçamento.
Admirára-se s. exa. de que nas ultimas contas publicadas figurassem já 5:000 e tantos contos de réis para pagamento das fabricas de tabacos, quando no respectivo projecto de lei se tinham votado 7.200:000$000 réis.
Devia dizer que n'aquellas contas figuravam só os pagamentos effectuados, como não podia deixar de ser; o resto havia de figurar nas contas subsequentes.
Quanto ao imposto de consumo, se fossem verdadeiros os cálculos do sr. Oliveira Martins, Lisboa pagaria 6:000 e tantos contos de réis, isto é, mais do que todo o resto do paiz, o que era impossível.
Quanto às considerações que, a respeito de empréstimos fizera o sr. Oliveira Martins, o orador, depois de outros considerações, sustentou que não devia admirar que depois de três mezes, se não tivesse ainda obtido a cotação dos títulos do ultimo emprestimo, porquanto em circumstancias mais favoráveis fora preciso um praso maior para se obter uma cotação analoga.
Dissera s. exa. que não se deviam considerar como divida os 7.200:000$000 réis applicados ao distrate das fabricas de tabacos, porque as fabricas representavam um valor.
N'este caso esta doutrina devia applicar-se a caminhos de ferro e a outros melhoramentos que tantos beneficies têem produzido para o paiz; mas a final as quantias que com estes melhoramentos se tinham gasto é que tinham avolumado a divida publica.
Propozera o illustre deputado que o addicional de 6 por cento não recaísse sobre os direitos do assacar, do arroz, do chá, do café e do petróleo, sendo substituido nesta parte pela elevação do imposto de transito de 5 a 15 por cento.
Ainda que algumas rasões houvesse para se acceitar esta proposta, oppunha-se a esta aeceitação a legislação vigente.
Em todos os contratos feitos se tinha estipulado que o imposto de transito nunca podesse exceder 5 por cento, e para se construir a ponte do caminho de ferro do norte sobre o Douro concedêra-se á companhia que fosse ella que embolsasse o imposto de transito.
N'estas condições não se podia acceitar a proposta do illustre deputado.
(O discurso de s. exa. será publicado na integra e em appendice a esta sessão, quando o orador haja revisto as notas tachygraphicas.)
O sr. Fuschini: - É a seguinte a minha moção de ordem:
«A camara, considerando que o addicional em discussão accentuará mais profundamente as desigualdades do nosso systema tributario, e imporá ao contribuinte pesados encargos, que, em grande parte, não reverterão para o thesouro, rejeita o projecto da commissão e passa á ordem do dia. = Augusto Fuschini.
V. exa. bem vê, pelo caracter da minha moção, que vou occupar-me exclusivamente da questão do addicional.
Porei de parte a questão de fazenda, que tem sido discutida tão brilhantemente a propósito deste projecto; porei de parte a questão do deficit, bem calculado por um e outro lado da camara; porei, emfim, de parte a administração do sr. Marianno de Carvalho, que está actualmente em Zanzibar ou em Moçambique, e discutirei apenas o addicional de 6 por cento.
E, declarando que só discutirei este assumpto, devo dizer que discrepo da opinião, que já ouvi manifestar nesta camara, de que o addicional de 6 por cento se discutia em meia hora. Não me parece.
Tanto isto é mais exacto, quanto o projecto vem desacompanhado de quaesquor esclarecimentos, que tornem facil o seu estudo.
Sr. presidente, é lamentavel, effectivamente, que um projecto desta natureza, que altera a economia intima de quasi todos os impostos, pelo menos dos principaes, e envolve para o paiz um augmento de despeza calculado em 1.400:000$000 réis annuaes, não venha acompanhado de subsidio algum, que possa facilitar o estudo.
Este systema logogryphico de discussões parlamentares já ia sendo posto de parte entre nós. Os ministros anteriores, e principalmente os relatores, apresentavam sempre os elementos indispensáveis para o estudo das questões.
Não quero citar á camara senão o ultimo trabalho sobre a reforma das pautas do sr. Mattozo dos Santos; mas podia, felizmente, enumerar muitos outros, que constituem bons modelos parlamentares entre nós e mesmo lá fora.
É bom que esta puerilidade se não repita, e que os srs. ministros e relatores não julguem ficar possuidores dos argumentos de effeito, ou, pelo menos, não pensem que prejudicam por esta forma a clareza e a profundidade das discussões parlamentares.
Para dar uma lição ao sr. ministro, vou provar-lhe que tenho em meu poder todos os elementos de estudo, negados
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ao parlamento. Algumas horas de trabalho, que por ontra fórma seria mais utilmente empregado, proporcionaram-me todos os dados mysteriosamente escondidos na pasta ministerial, talvez mais alguns que lá não se encontrem.
O governo e a maioria que não se queixem depois dos discursos muito largos. A esta prova de incapacidade, que pretendem passar ás opposiçSes, têem estas de responder demonstrando a ingenuidade do processo, ou a má fé do systema.
Sr. presidente, o addicional de 6 por cento, proposto pelo governo, abrange cinco dos seis artigos, em que se classifica a receita ordinária orçamental, com varias excepções para cada artigo.
Artigo 1.º Impostos directos. - As exclusÕes são as seguintes:
1.ª A contribuição de decima de juros;
2.ª Os emolumentos consulares e judiciaes;
3.ª As collectas da contribuição predial até 1$000 réis inclusive;
4.ª As collectas da contribuição predial, que recairem, durante os primeiros seis annos, sobre predios devastados pelo phylloxera, e que entrem novamente em cultura;
5.ª As collectas da contribuição industrial de todos os officiaes de quaesquer artes ou officios;
6.ª As collectas da contribuição de renda de casas não superiores a 5$000 réis;
7.ª O imposto de rendimento sobre juros da divida publica;
8.ª As propinas dos exames, matriculas e cartas do curso.
Artigo 2.° Sêllo e registo. - Do sêllo apenas caem sobre a acção do addicional:
1.° O sêllo das loterias nacionaes;
2.° O sêllo das loterias estrangeiras.
O registo é completamente abrangido pelo addicional.
Artigo 3.º Impostos indirectos. - As exclusões são aã seguintes:
1.ª O producto da venda dos artefactos da administração do tabaco, ou da entidade que venha a substituil-a;
2.ª Os direitos da importação pobre mercadorias comprehendidas nos tratados em vigor;
3.ª O imposto do pescado.
Artigo 4.° Addicional de 6 por cento da lei de 27 de abril de 1882.
Artigo 5.° Compensação de despeza. - O addicioual incide apenas:
1.° Sobre os addicionaes para tribunaes administrativos;
2.° Sobre os addicionaes para estradas.
Assim classificadas a incidencia e as excepções do projectado addicional, é facilimo calcular o seu producto.
Evito á camara explicações sobre os processos da mais rudimentar estatistica, que empreguei para calcular as excepções. Dir-lhe-hei apenas que toda esta sciencia, tão cuidadosamente guardada pelos srs. ministro e relator, se obtém, com a arithmetica elementar, do orçamento proposto para 1890-1891, do Annuario estatistico das contribuições directas de 1885, das Contas geraes do estado e da Estatistica de Portugal de 1888, publicada pelo conselho geral das alfândegas.
São estes os livros sagrados, que o sr. ministro fez compulsar pelos seus amanuenses.
Em resultado de tudo isto, apresento á camara um quadro referido ás receitas cobradas em 1888-1889, sem distincção de exercicio, era que o producto do projectado addicional está calculado, para as receitas principaes, verba a verba. É este um dos segredos do sr. ministro.
Receita approximada do addicional de 6 por cento, segundo o projecto
(Em contos de réis)
[Ver tabela na imagem]
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[Ver tabela na imagem]
O producto do imposto será por artigos:
Artigo 1.º Impostos directos .... 302:000$000
Artigo 2.° Sêllo e registo .... 149:000$000
Artigo 3.° Impostos indirectos .... 878:000$000
rtigo 4.° Addicional de 27 de abril de 1882 .... 30:000$000
Artigo 5.° Compensações de despeza .... 21:000$000
1.380:000$000
O calculo do sr. ministro de 1.400:000$000 réis é, pois, exacto, visto que por minha parte não considerei senão as receitas principaes.
Observo desde já que esta somma é um mínimo, visto que os arredondamentos dos direitos aduaneiros, de que falla o projecto, deverão produzir receita attendivel para o thesouro.
É um minimo tambem, porque o contribuinte para fazer chegar 1.400:000$000 ou 1.500:000$000 réis aos cofres publicos, deixará pelas mãos de varios intermediários sommas avultadissimas, como a seu tempo procurarei demonstrar.
Como se vê por este mappa, que envolve 22 verbas, entre as quaes estão os nossos principaes impostos, um estudo minucioso sobre cada uma exigir-nos-ia sessões e sessões. Como é impossivel fazel-o, limitar-me-hei a uma analyse summaria sobre pontos, que me parecem principaes.
Por esta fórma contesto a opinião de quero affirmou que a discussão do addicional podia fazer-se em meia hora. (Apoiados.)
Não, certamente. O estudo methodico, minucioso e profundo do modo por que o addicional altera as condições de incidencia e repartição de cada imposto, a apreciação rigorosa dos inconvenientes, que introduz na economia particular dos contribuintes e na economia geral do paiz, eram assumpto para largas explanações, em que se encontrariam factos interessantes.
Não descerei a estas especialidades. O meu trabalho terá apenas em vista esboçar a questão em traços geraes, sufficientes para que os interessados possam comprehender bem a influencia deste. amável e innocente addicional, que o sr. Carrilho defendeu com um só argumento: e de ser o processo mais facil e rapido de cobrar largas sommas.
Isto posto, vou proceder com a maior simplicidade, propondo-me a resolução de differentes theoremas financeiros.
Antes, porém, de começar a pôl-os e a resolvel-os, como poder e souber, preciso fixar algumas idéas e alguns números, que me hão de servir repetidas vezes.
Trata-se de fixar a população do paiz (continente e ilhas) e a de Lisboa. Este elemento, como póde antever-se, é indispensável para o estudo da repartição do imposto.
Os ultimos censos da população são de 1864 e de 1878.
É lamentavel que elemento, tão importante para o estado de grande numero de questões sociaes, esteja assim antiquado e descurado.
Em regra, é necessario confessal-o francamente, trabalhamos nas mais serias questões sociaes e administrativas com poucos ou nenhuns, elementos estatisticos.
A nossa administração realisa-se em grande parte sobre presumpções mais ou menos vagas, mais ou menos acceitaveis, conforme a intelligencia e a experiencia individual do agente, quer seja ministro, quer seja deputado, ou simples empregado.
Conhecimento completo, tanto quanto o permittem as cousas humanas, dos phenomenos e factos economicos e sociaes, que constituem o modo de ser essencial do paiz e das suas differentes classes, não existe entre nós.
No estudo das variadas questões, que envolve a moderna administração dos povos, somos a cada passo detidos pelo desconhecido. As estatisticas não respondem á maior parte das duvidas, que se levantam em estudos conscienciosos.
O censo da população apenas existe incompleto e antiquado; os cadastros da propriedade o da industria estão por fazer; o regimen intimo das classes operarias, as questões de subsistencia, a fixação dos salários médios, a percentagem de mortalidade por industria, todos os elementos, emfim, que constituem a moderna estatistica do trabalho são desconhecidos no nosso paiz.
Assim, para uma parte importante da nossa população são por nós desconhecidas as condições sociaes e economicas das classes, quando as conhecemos soffrivelmente nas correspondentes dos paizes, que cuidadosamente, com preserverante esforço e sacrifício, organisam as suas estatísticas.
Ora, na realidade, a mim parece-me mais util toda a despeza, que se fizer com estas investigações, do que a que pretende realisar com quatro cruzadores...
Os censos da população dão-nos os seguintes elementos para o continente e ilhas adjacentes:
Censo de 1864 .... 4.343:935 almas
Censo de 1878 .... 4.745:124 »
para mais ........ 401:188 »
isto é, o crescimento medio annual de 28:656 habitantes no periodo de quatorze annos, ou 0,66 por cento da população total em 30 de dezembro de 1864.
A população do paiz duplica, pois, em cerca de 152 annos.
Em 1889, portanto, a população do continente e das ilhas adjacentes devia ser muito approximadamente de 5.060:000 habitantes.
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A cidade de Lisboa, propriamente dita, offereceu as seguintes populações:
Censo de 1864 .... 169:823 almas
Censo de 1878 .... 203:681 »
para mais ........ 33:858 »
isto é, o crescimento annual medio de 2:418 habitantes, ou 1,4 por cento da população total em 30 de dezembro de 1S64.
N'estas condições, a população da capital deverá duplicar em cerca de 71 annos.
Em 1886, todavia, foi annexada a Lisboa parte importantissima do extincto concelho de Belem; tomando em linha de conta esta annexação e o crescimento da população acima fixado, a população da cidade em 1889 devia sor, em numeros redondos, de 270:000 habitantes.
Teremos, pois, resumindo, os seguintes elementos, que me parecem muito admissiveis:
[Ver tabela na imagem]
O meu primeiro theorema financeiro é o seguinte: o systema da nossa tributarão tem sido o de sobrecarregar constantemente, e por forma vexatoria, os impostos indirectos, isto é, os de consumo.
Uma voz: - É esse o escandalo?!
Orador: - Não lhe chamei escandalo; não uso em pregar no parlamento essa palavra.
Aponto um facto, que mo parece irregular e chamo para elle attenção do paiz, para que lhe ponha correctivo, que eu lhe daria, se para tanto tivesse força.
Não me faço cargo, n'este momento, de demonstrar, o que é aliás um logar commum economico, que os impostos indirectos recaem principalmente sobre as classes pobres.
Para desenvolver a minha proposição, tomarei os principaes impostos directos: o bancario, o industrial, o predial e o de rendimento. Ponho de parte o de renda de casa, o sumptuario e o do decima de juros, porque estes incidem sobre manifestações de riqueza, que muitas vezes não a representam.
Dos impostos indirectos attenderei aos principaes também: o da importação para consumo, o de consumo de Lisboa, (imposto de barreira), o real d'agua (consumo geral no paiz), o do pescado e o dos cereaes.
Colligi em contos de réis o rendimento d'estes impostos desde 1880-1881 até 1888-1889.
Rendimento sem distincção de exercícios
(Em contos de réis)
[Ver tabela na imagem]
Esta serie de nove annos dar-nos-ha os seguintes resultados:
1.° Que os impostos directos se conservam sensivelmente estacionários. Era 1881-1882 montam a 4.832:000$000 réis, descem a 4.150:000$000 réis em 1882-1883, para subirem a 4.875:000$000 em 1888-1889.
A diminuição de cerca de 700:000$000 réis, observada no anno do 1882-1883, foi devida a modificações introduzidas, pelo regulamento predial de 1881, nas epochas de pagamento, o que produziu o adiamento de quasi um quarto do rendimento da contribuição, isto é, um verdadeiro beneficio para a propriedade.
2.° Que os impostos indirectos considerados sobem quasi sem oscillação de 1880-1881, em que produziram réis 10.180:000$000 a 16.243:000$000 róis, rendimento de 1888-1889.
O augmento é, pois, de 6.063:000$000 réis, ou seja 758:000$000 réis em media por anno.
A relação dos impostos directos para os indirectos, sendo em 1881-1882 de 1 para 2,31, attinge em 1888-1889 a relação de 1 para 3,33.
É, pois, evidente que n'este período o esforço do legislador foi o de aggravar as contribuições indirectas.
Para reduzir tudo a uma forma simples e clara, bastará determinar as capitações, isto é, o imposto total medio por cabeça, attendendo ao crescimento da população, ora estas capitações são:
[Ver tabela na imagem]
Isto é, a capitação dos impostos directos desce sensivelmente; quando, se se tivesse conservado constante, estes impostos deviam ter rendido em 1888-1889 mais cerca de 150:000$000 réis.
A capitação indirecta, pelo contrario, cresce consideravelmente; em 1888-1889 é mais 39 por cento do que era em 1881-1882.
Dir-se-ha que o augmento da capitação indirecta provém do desenvolvimento da riqueza publica, o que até certo ponto é exacto; mas provém igualmente da reforma pautal e da elevação dos direitos sobre os cereaes. Em todo o caso, se a riqueza publica augmenta para os impostos indirectos, não ha rasão alguma para que a mesma causa não tenha influencia sobre os directos.
Ora, se a relação de 1 para 2,31 de 1881-1882, entre os
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impostos directos e indirectos, se houvesse conservado, os directos haveriam rendido em 1888-1889 cerca de réis 7.000:000$000, isto é, mais 2.000:000$000 réis do que effectivamente renderam.
Este resultado obter-se-ia com a boa distribuição dos impostos, diminuindo os vexames dos contribuintes menos abastados.
Sr. presidente, estes raciocinios demonstram que o legislador entro nós, longe de attender a uma justa e equitativa proporção entre os impostos directos e indirectos, tem caido desapiedadamente sobre os contribuintes pobres, a massa proletaria taillable et corveable á merci do antigo regimen.
O addicional de 1882, lançado pelo ministerio Fontes, aggravou ainda estas desigualdades.
As reformas do sr. Marianno do Carvalho não só não augmentaram sensivelmente os impostos directos, exceptuando o do renda de casas, mas até diminuiram um - o sumptuario.
E escusado dizer que o addicional do sr. Franco Castello Branco, peior ainda do que o de 1882, porque este ao menos excluia dois impostos de consumo importantes - o de Lisboa e o do real de agua - accentua estas desigualdades de distribuição e mais onera os contribuintes pobres.
Esta desproporção é já por si uma injustiça flagrante; mas um estudo minucioso vae descobrir-nos novos e mais graves defeitos do nosso systema tributario.
Póde, effectivamente, affirmar-se que, se em geral os impostos de consumo tendem a ferir as classes mais pobres, entre nós, estes impostos, por defeito de incidencia, têem esta caracter accentuadissimo.
A demonstração d'esta proposição é facillima, estudando os principaes que são o de importação para consumo geral e os de consumo de Lisboa.
A importação para consumo, exceptuando cereaes, rendeu nos annos:
[Ver tabela na imagem]
As grandes desigualdades das capitações, sempre obtidas relativamente á população calculada para o anno respectivo, demonstram que o augmento de 3.787:000$000 réis foi devido á elevação dos direitos pautaes, em grande parte.
Todos sabem que n'este praso a reforma pautai do sr. Marianno de Carvalho alterarou estes direitos, sendo elaborada sob um ponto de vista fortemente proteccionista.
O que pouca gente sabe, porém, é que dos 322 artigos da nossa actual pauta, 106, e dos mais importantes, entram nos tratados commerciaes e não podem ser alterados os respectivos direitos, sem que estes tratados finalisem.
No seguinte mappa colligi, por classes da pauta, o valor e os direitos das mercadorias importadas em 1888, fora dos tratados e n'elles comprehendidas.
Importação para consumo em 1888
(Em contos de réis)
[Ver tabela na imagem]
Em 1888, o valor manifestado da importação foi de 33.000:000$000 réis, em números redondos, sendo réis 24.000:000$000 para as mercadorias fóra dos tratados e 9.000:000$000 réis para as sujeitas a tratados.
Os direitos correspondentes totaes, comprehendendo os cereaes, elevaram-se a 12.600:000$000 réis, produzindo us mercadorias livres 10.100:000$000 reis e 2.500:000$000 réis as sujeitas a tratados.
Note v. exa., sr. presidente, que os direitos das mercadorias fóra dos tratados são principalmente provenientes das seguintes classes da pauta:
4.º Algodão ......... 1.253:000$000
9.º Substancias alimenticias .... 6.227:000$000
7.480:000$000
Ora, exactamente, o que mais produz na classe 4.ª são os seguintes artigos, que renderam em 1888:
70. Algodões crus .... 428:000$000
71. Algodões brancos .... 354:000$000
782:000$000
de que se vestem as classes menos abastadas.
As substancias alimenticias da classe 9.a, exceptuando o bacalhau, o vinho e o vinagre, são todas livres.
No anno de 1888 renderam as principaes:
Artigos 200 e 201. Assucar .... 2.695:000$000
Artigo 187. Trigo ............. 1.557:000$000
Artigo 101. Arroz ............. 522:000$000
Artigo 208 Chá ................ 235:000$000
Artigo 206. Café .............. 214:000$000
Artigo 180. Manteiga .......... 203:000$000
5.426:000$000
Só estes oito artigos, das classes 4.ª e 9.ª, perfazem a
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somma de 6.208:000$000 réis, isto é, mais de 60 por cento dos direitos totaes pagos pelas mercadorias fóra dos tratados!
Ora, todas estas mercadorias o substancias alimenticias são elementos indispensaveis para o consumo das classes pobres, principalmente nos grandes centros de população.
Por outro lado, se percorrermos a pauta nas mercadorias sujeitas a tratados, as quaes não feriu o addicioal de 82, nem póde ferir o proposto pelo sr. Franco, a maior parte dos respectivos artigos pertencem ao consumo das classes ricas, exceptuando o bacalhau.
Assim os merinos, as flanellas, os chales, os tapetes, as sedas, os velludos, os tecidos de algodão mais custosos, os vinhos estrangeiros, os espelhos, os crystaes, as mobilias, as carruagens, etc., ficam completamente livres do qualquer augmento!
O addicional de 6 por cento, proposto pelo sr. ministro, vem ainda accentuar as intoleraveis injustiças já apontadas, e aggravar as condições economicas das classes proletarias. (Apoiados.)
Attenda-se a que o augmento dos direitos, em virtude d'este addicional, montam para toda a importação em cerca de 600:000$000 réis; pois d'estes serão pagos 372:000$000 réis por estes oito artigos das classes 4.ª e 9.ª da pauta, quando os impostos directos, esses que representam riqueza e bem estar, apenas produzem 302:000$000 réis!
No imposto de consumo especial de Lisboa, o das barreiras, estes phenomenos ainda se accentuam mais, se é possivel.
A pauta de Lisboa, como por mais de uma vez tenho dito no parlamento, parece feita para proteger o consumo rico e luxuoso. (Apoiados.)
Organisada sob o mais estreito ponto de vista fiscal, para bem mugir o contribuinte sem se importar com a proporcionalidade do imposto, a pauta de Lisboa incide sobre as subsistencias da primeira necessidade, sobre as carnes, os vinhos ordinarios e o azeite, e deixa completamente isentas todas as subsistencias do consumo rico o luxuoso.
Repito o que já disse uma vez á camara; obrigo-me a organisar luxuosos menus, que escapam quasi completamente ao imposto do consumo. Paga muito imposto quem se alimenta de carne, não paga imposto algum quem se banqueteia com aves finissimas...
(Dirigindo-se ao sr. ministro da fazenda) V. exa. responde depois, se quizer, o não por simples acenos de cabeça.
Eu era apoiado por v. exa. quando dizia isto d'esta tribuna, estando ahi o ministerio progressista. (Apoiados da esquerda.)
Os meus discursos estão publicados, porque não subtráio ao paiz nenhum dos que pronuncio; quando desenvolvia estas considerações, era apoiado d'ali (indicando o lado esquerdo da camara) e v. exa. tambem occupava uma d'aquellas cadeiras. (Apoiados da esquerda.) Mantenho-me no mesmo posto o repito o que disse, porque resumo hoje exactamente o que então desenvolvi (Apoiados da esquerda.)
Ha dois ou tres annos, em logar de se sentar o sr. Franco Castello Branco nas cadeiras do ministerio, achava-se ali o sr. Marianno de Carvalho, e eu sustentei, por occasião da discussão de alterações propostas a alguns direitos de consumo, a necessidade de uma larga reforma na pauta de Lisboa, até apresentei propostas a este respeito.
O sr. Castello Branco apoiava-me então; hoje... contesta a minha opinião de outrora! Parece que nas cadeiras ministeriaes os individuos mudam, mas as idéas ficam. (Apoiados.)
De resto, este imposto de caracter essencialmente local, cuja enormidade de capitação (em 1888-1889 de réis 7$855) apenas se defenderia com a exclusiva applicação ás necessidades da capital, é, em grande parte, applicado ás urgencias geraes do estado.
Effectivamente, em 1888-1889 a camara recebeu o excesso sobre o rendimento de 1884-1885 fixado em réis 1.503:000$000 réis, isto é, 618:000$000 réis, o mais a antiga consignação de 235:000$000 réis, ou era números redondos 853:000$000 réis; portanto, 1.268:000$000 réis do imposto de consumo, n'esse anno cobrado em Lisboa, entraram nos cofres publicos.
O addicional de 6 por cento vae augmentar este imposto em cerca de 127:000$000 réis, que corresponde a uma capitação de 470 réis por habitante de Lisboa.
Compare-se esta somma com a exigua capitação do augmento dos impostos directos, que apenas se eleva a cerca de 60 réis por habitante!
Sr. presidente, o terceiro theorema financeiro, que pretendo demonstrar á camara, é o seguinte: o nosso systema de tributação esmaga os contribuintes dos grandes centros.
Tomarei Lisboa para exemplo. Não é facil fazer para todos os impostos a destrinça do que paga Lisboa e o resto do paiz; mas póde fazer-se para alguns, admittindo que os restantes ferem igual e proporcionalmente a habitante da capital e o do resto do paiz.
Tomando em 1888-1889 os rendimentos dos seguintes impostos: bancario, industrial, renda de casas, predial, sumptuario, consumo de Lisboa e o real d'agua; as sommas dividem-se pela seguinte fórma:
Rendimento em 1888-1889
(Em contos de réis)
[Ver Tabela na imagem]
Pago pelos habitantes de Lisboa ........... 3.282:000$000
Pago pelos habitantes do resto do paiz .... 4.971:000$000
Abatendo a somma de 853:000$000 réis, recebidos pela camara de Lisboa, os habitantes da capital contribuíram nos impostos considerados com a somma de 2.429:000$000 réis.
Mas Lisboa tem 270:000 habitantes, emquanto o resto do paiz tem 4.790:000; as capitações serão, pois, as seguintes:
Em Lisboa ........... 8$996
No resto do paiz .... 1$037
Isto é, approximadamente de 8,67 por 1.
Emquanto o contribuinte fora de Lisboa pagou, por estes impostos, 1$000 réis, o de Lisboa pagou 8$670 réis!
Póde objectar-se a esta affirmação que o habitante de Lisboa, exactamente porque vive na capital, recebe maiores benefícios o commodidades publicas e é mais rico, relativamente.
Ora esta argumentação não é absolutamente verdadeira.
Se vive entre maiores commodidades locaes, tambem as paga no orçamento municipal; se é relativamente mais rico, restava ainda provar se a relação acima indicada é isenta de exagero, isto é, se representa tambem a relação da riqueza entre o contribuinte de Lisboa e os de fora de Lisboa.
Um simples raciocinio dar-nos-ha o valor d'esta duvida.
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O imposto de consumo em Lisboa rendeu em 1888-1889 a somma de 2.121:000$000 réis, o que representa a capitação de 7$835 réis por habitante. No mesmo anno, o imposto de consumo (real de agua) no resto do paiz rendeu 1.158:000$000 réis, que dá a capitação de 242 réis.
A capitação em impostos da mesma natureza é em Lisboa cerca de 33 vezes maior!
As classes operarias da capital recebem certamente salarios superiores, que chegarão ao dobro, se quizerem; mas não deixam de ser bem desigualmente feridos pelo imposto!
Incidindo sobre esta repartição desigual, é evidente que o addicional proposto será tambem desigualmente repartido.
Por calculos muito simples póde, pois, demonstrar se que, admittindo que os restantes impostos ferem igualmente o habitante de Lisboa e do resto do paiz, o que não acontece, o addicional do sr. ministro, calculado em réis 1.400:000$000, exigirá a Lisboa cerca de 240:000$000 réis, ficando para o resto do paiz 1.160:000$000 réis; assim as capitações d'este addicional serão approximada-mente:
Lisboa, por habitante em media .... $883
Resto do paiz, idem ............... $244
Será, portanto, o habitante de Lisboa sobrecarregado com uma boa parte do novo addicional.
Assim se demonstra o empyrismo da tributação por meio de addicionaes. Por esta fórma as desigualdades existentes são ainda accentuadas.
O addicional de 1882, mau como era, excluiu ainda assim o imposto de consumo em Lisboa. O sr. ministro, com as suas tendencias fiscaes, para ter um imposto productivo, tornou o iniquo.
Mas, sr. presidente, a estes já gravíssimos inconvenientes da tributação por addicionaes vem juntar-se outro, ainda mais importante.
É regra fundamental, para o lançamento de um bom imposto, que seja pequena a sua despeza do percepção, ou cobrança, e, principalmente), que as sommas pedidas ao contribuinte entrem por completo, quanto possível, no thesouro.
É certo que o systema addicional satisfaz ao primeiro preceito, visto que em nada deve augmentar a despeza da cobrança; mas contraria absolutamente o segundo.
Póde estabelecer-se como principio que o addicional do projecto arrancará ao contribuintes somma superior a réis 1.400:000$000; ficando este excesso nas mãos dos intermediarios e dos contribuintes, que podem passar para outros os seus respectivos encargos.
Em regra, como todos sabem, o primeiro cuidado do contribuinte é descarregar n'outrem o novo encargo. Ora, isto é tanto mais facil, quanto o cidadão é proprietario ou productor.
Indiscutivelmente, todo o homem é productor; mas, uns produzem pelo seu proprio trabalho, ou pelo trabalho assalariado, mercadorias commerciaes, outros apenas trabalho. É evidente que os primeiros terão melhor ensejo de transferir para o consumidar os encargos do novo imposto. Em regra é o consumidor, que apenas produz trabalho, o mais onerado relativamente pelo imposto.
É exemplo d'essa asserção o imposto predial em Lisboa. A simples apresentação d'este projecto dos 6 por cento addicionaes deu rasão plausivel na capital para consideraveis elevações de rendas de casas. (Apoiados.)
Mesmo as casas de renda interior a 50$000 réis, excluidas pelo projecto, não escaparam a estas consideraveis elevações.
Nas rendas superiores a 50$000 réis as elevações foram fortissimas; houve proprietario que as elevou de 20, 30 por cento e ainda mais!
Bem sei eu que podem responder-me que os senhorios elevam as rendas, porque encontram quem lhes alugue as casas. É certo.
Mas aproveitam o ensejo da elevação do imposto para cohonestarem augmentos consideraveis. É o que a experiencia tem demonstrado.
N'esta elevação o contribuinte, inquilino, soffre um imposto dezenas de vezes superior áquelle que arrecada o thesouro. Uma casa, por exemplo, avaliada no rendimento collectavel de 300$000 réis na matriz predial, paga actualmente do imposto respectivo 36$000 réis, approximadamente; o addicional de 6 por cento augmentará esta collecta em 2$160 réis. Não esperemos, porém, que o proprietario eleve a renda de 300$000 a 303$000 réis; a elevação será para os mais conscienciosos de 10$000 réis, isto é, perto do quintuplo do producto do novo addicional.
Pela sua parte o consumidor, ainda o inquilino, paga não só este excesso, grande parte do qual fica na mão do senhorio, mas tambem os 6 por cento sobre a propria collecta de renda de casas assim augmentada.
No imposto industrial podem fazer-se iguaes raciocinios. Os artefactos serão vendidos por um preço superior; o que é tanto mais facil, quanto o addicional, recaindo sobre a importação, torna a pauta mais proteccionista.
O mesmo succedêra com as mercadorias importadas para consumo e tanto mais acentuadamente, quanto maior for o numero de intermediarios.
N'este caso estão o assucar, o trigo, o chá, o café, isto é, em geral os generos de primeira necessidade.
O assucar, por exemplo, tem dois intermediários entre o productor e o consumidor.
Pela actual pauta o assucar pagou em 1888:
[Ver tabela na imagem]
Ora, o assucar superior a 20 de escala hollandeza paga, por kilogramma, 135 réis de direito, e o assucar não especificado, por kilogramma, 110 réis.
O addicional dará, pois:
Para o primeiro 143,1 para direito, ou, arredondando, 144 réis.
Para o segundo 116,6 para direito, ou, arredondando, 117 réis.
O producto do addicional será:
Primeira qualidade .... 31:000$000
Segunda qualidade ..... 145:000$000
176:000$000
Nas melhores condições, os dois intermediários elevarão 10 réis nos seus preços, vindo assim o kilogranuna de assucar, que hoje se vende pelo preço medio de 220 réis approximadamente, a custar 240 réis.
O primeiro intermediario, pagando o direito augmentado rio primeiro caso em 9 e no segundo em 7 réis, a quantia mais insignificante, em que podo elevar o preço, é a ultima moeda immediatamente superior.
É este um dos defeitos reconhecidos do augmento de tributação por fracções das ultimas moedas correntes.
O segundo intermediario elevará tambem o preço para se descarregar do addicional, que o fere n'outras manifestações da sua actividade. (Apoiados.)
Ora, sendo actualmente a capitação, ou o consumo médio por habitante, do assucar um pouco superior 5 kilogrammas, o paiz pagará 500:000$000 réis para que o the-
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souro arrecade pouco mais de 176:000$000 réis. É barbaro! (Apoiados.)
O mesmo raciocinio se póde fazer em relação a outras muitas substancias, quer do consumo geral, quer do consumo especial da cidade de Lisboa.
Póde, talvez, dizer-se que o lançamento d'este addicional custará mais 1.400:000$000 para os intermediários, quantia principalmente arrancada aos que não podem descarregar-se do imposto, porque só produzem trabalho, isto é, sobre os proletários e classes assalariadas.
É este talvez o mais grave inconveniente do addicional, que vae onerar e empobrecer as classes menos abastadas do paiz, arrancando-lhe uma somma importante, que em grande parte fica nas mãos dos intermediarios e de certas classes productoras e mais ricas.
Estes raciocinios parecem-me correctos. E aqui está, pois, o bonito caracter do addicional, reconhecido aliás em toda a parte, porque não ha financeiro mediocre, que lance hoje este imposto em paiz algum. (Apoiados.)
É conhecido pela experiência dos paizes, que sabem tributar-se, que os pequenos addicionaes levam necessariamente aos arredondamentos, como acabo de indicar; não feitos a favor do fisco, mas pelos intermediários, que arrancam sommas enormes ao consumidor, das quaes só uma parte relativamente pequena entra nos cofres do estado. (Apoiados.)
Faça o sr. ministro a synthese do que acabo de expor. O nosso systema tributario é crivado de desigualdades, os impostos de consumo ferem principalmente as classes pobres, nos grandes centros paga-se relativamente mais do que no resto do paiz, e diga-me s. exa. qual deve ser o effeito dos 6 por cento, que vae applicar sobre este monstruoso cumulo de desigualdades. (Apoiados.)
De resto, sr. presidente, mesmo nos actuaes impostos directos se observa esta tendência para collectar mais fortemente as ultimas classes sociaes, como succintamente ou expor.
Farei um estudo muito summario dos quatro impostos principaes: o predial, o industrial, o de renda de casas e o sumptuario.
Todos sabem que o imposto predial, o mais importante de todos os directos, é actualmente de repartição. A quantia, pois, de 3.107:000$000 réis é repartida por decreto entre todos os districtos do paiz. Tornar-se-ha de quotidade, quando o rendimento collectavel das matrizes se elevar em todo o paiz a 31.070:000$000, réis; a taxa de imposto será, então, de 10 por cento do valor dos predios.
Esta ultima disposição, regulada pelo sr. Barros Gomes, não só é sensata, mas do maior alcance e do mais honrado proposito. (Apoiados.)
Não entro agora na apreciação das monstruosas desigualdades da repartição, o que me levaria muito longe, faço apenas notar que por tal systema a elasticidade do imposto não acompanha o desenvolvimento da riqueza publica; traduz-se em diminuição de encargos para a propriedade.
Quando mesmo o imposto predial se transformar em imposto de quotidade, o que ha de ser moroso, porque dez annos decorreram já e as matrizes não attingiram o valor exigido, o seu rendimento ha de crescer pouco e offerecer desigualdades flagrantes de districto para districto, de concelho para concelho e até de proprietario para proprietário.
O vicio principal está no modo de organisar as matrizes. A leitura do artigo 48.° do regulamento é sufficiente para lançar completa luz sobre o assumpto: A inspecção directa dos predios será feita por freguesias e pelo pessoal, a quem o governo tiver por conveniente incumbir d'este serviço.
Escusado é dizer, sr. presidente, que os proprietários ricos, sendo as maiores forças eleitoraes locaes, dispõem destas nomeações, quando não actuam directamente sobre os pobres louvados mal remunerados, que procedem a estas inspecções directas.
É por isso que em occasiões da subida de novos governos, e principalmente de eleições, o paiz assiste, infelizmente impassivel, á contradança dos agentes fiscaes, que os mandões das localidades affeiçoam aos seus interesses, dando ao governo os seus favores eleitoraes em troca de certas vantagens, entre outras, de se eximirem aos impostos.
Nos grandes centros os processos são outros e não menos engenhosos e productivos: as combinações das declarações dos senhorios e inquilinos, nos prédios arrendados; a acção coerciva, ou de outra natureza, sobre os informadores-louvavados, escolhidos nas ultimas classes sociaes e mal remuneradas.
Em Lisboa, por exemplo, as grandes casas, habitadas pelo próprio proprietario, têem, em regra, diminuto rendimento collectavel, o que affecta o thesouro por dois lados: no imposto predial e no de renda de casas.
As propriedades de luxo em volta de Lisboa offerecem rendimentos collectaveis ridiculos, como tive occasião de observar mais de uma vez, sendo perito em victorias judiciaes para expropriações.
Como o imposto é de repartição, a diminuição de valor da grande propriedade traduz-se por augmento de encargos para a media e pequena propriedade.
A minha opinião é que o imposto predial carece de profunda reforma. Se não se adoptar o systema de cadastro, por ser despendioso e moroso, ao menos modifique-se a fórma de inspecção e avaliação da propriedade; organise-se uma corporação especial de peritos avaliadores, escolhidos entro os agricultores agronomos e engenheiros mais distinctos, e garanta-se força e estabilidade aos agentes fiscaes.
Será mais dificil, assim, trazerem os governos furtes maiorias á camara; mas ganharão a justiça, os pequenos proprietários e o thesouro.
Por varias tentativas procurei chegar a determinação do valor collectavel predial, rustico e urbano, no paiz e não me parece que este se possa considerar muito inferior a 50.000:000$000 réis, o que na taxa de 10 por cento (e muito mais paga em media a pequena propriedade actualmente) daria o rendimento predial de 5.000:000$000 réis, isto é, mais 1.800:000$000 réis do que o actual.
Tudo quanto acabo de expor, e o mais que vou dizer, anda na mente de todos, que se occupam d'estes assumptos. O sr. ministro, porém, que tem facilmente ao seu alcance recursos vastissimos, que eu não possuo, póde verifical-o rigorosamente; mande estudar nas matrizes os rendimentos collectaveis de certas casas de Lisboa, que são verdadeiros e luxuosos palacios; mande extrahir as collectas de muitos predios rusticos, conhecidos em todo o paiz, e reconhecerá as fraudes importantissimas, que se praticam n'este ramo dos rendimentos publicos.
Pelo que respeita ao imposto industrial observam-se as mesmas anomalias.
O imposto industrial envolve a contribuição bancaria, isto é, a que recáe sobre os dividendos liquides das operações dos bancos, companhias o sociedades anonynms.
Pois ha dez annos que este rendimento está estacionário, apesar do desenvolvimento indiscutivel deste ramo de riqueza publica!
Os bancos escapam-se, salvo excepções honrosas, quanto podem, ao imposto. Ha exemplos de tudo. Uns exageram as despezas, diminuindo assim a materia collectavel. Outros confundem e por tal forma difficultam as suas contas e delarações, que apresentam saldos negativos, dando dividendo aos accionistas!
Assim o rendimento d'esta contribuição póde considerar-se estacionaria, como o demonstra o segundo mappa que antecedentemente apresentei.
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Em 1888-1889 este imposto rendeu:
Em Lisboa ........... 80:000$000
No Porto ............ 15:000$000
No resto do paiz .... 68:000$000
153:000$000
A exiguidade d'estas verbas nos dois centros bancarios do paiz parece-me incontestavel, sem descer a mais minucioso exame.
A contribuição industrial, propriamente dita, manifesta a mesma fixidez de rendimento, como o demonstra tambem o mappa citado.
Em 1887-1888, talvez por effeito da reforma de 9 de maio de 1887, do sr. Marianno de Carvalho, o rendimento elevou-se sensivelmente, mas para diminuir logo no anno seguinte.
Todos sabem que esta contribuição comprehende dois grupos de taxas.
1.º Grupo (tabella A). - Taxas fixas, não sujeitas a repartição, para cada contribuinte sobre o rendimento presumido, ou conhecido, de certas industrias, profissões, artes e officios.
2.º Grupo (tabella B). - Taxas sujeitas a repartição pelos grémios, divididas em tres categorias.
1.ª (Tabella B, 1.ª parte). - Taxas variaveis em relação a dois elementos.
a) Ordem das terras (classificadas em seis ordens).
b) Importancia relativa (oito classes, em que se comprehendem todas as industrias).
2.ª (Tabella B, 2.ª parte). - Taxas variaveis apenas em relação á ordem das terras.
3.ª (Tabella B, 3.ª parte). - Taxas fixas, correspondentes ao numero total dos respectivos contribuintes, mas repartidas pelos gremios por cada um, segundo os lucros presumidos.
Em 1885, ultimo anno da estatistica publicada, as collectas lançadas, comprehendendo as bancarias, foram:
[Ver tabela na imagem]
Ora, a cobrança n'este anno, foi:
Industrial .... 1.120:000$000
Bancaria ...... 134:000$000
1.254:000$000
Isto é, entre o lançamento e a cobrança houve a differença de 244:000$000 réis, ou seja mais de 16 por cento do lançamento, o que prova, a meu ver, os graves defeitos, que envolve a cobrança d'esta contribuição.
Se das sommas cobradas abatermos as collectas dos officiaes de officio dos empregados, isto é, em regra das profissões que não podem ser rigorosamente consideradas industriaes, as duas contribuições, a bancaria e a industrial, não attingirão o rendimento de 1.100:000$000 réis.
Ora, sr. presidente, por pequena que seja a nossa industria, ninguem dirá que ella attinge, apenas, em todo o paiz 11.000:000$000 ou 12.000:000$000 réis, de lucros, ou rendimento collectavel.
Os defeitos no lançamento, na repartição pelos gremios e na cobrança d'esta contribuição, são conhecidos. Os elementos para a organisação da matriz são deficientissimos.
As matrizes do anno anterior, que servem de base para as do seguinte, vem eivadas de todos os vicios, que vou apontar.
As declarações, que devem ser feitas pelo regedor da parochia, agente eleitoral do governo e não remunerado, este não as presta na maioria das vezes, ou dá-as incompletas.
Temos, depois, as declarações dos senhorios, que são muitas vezes falsas ou incompletas. Em Lisboa, por exemplo, exercem-se nos andares superiores dos predios varias industrias, que escapam á acção fiscal, porque os senhorios dão as casas como de simples habitação.
As casas são até em alguns casos alugadas em nome da mulher, ignorando-se o nome do dono da casa e a industria ou profissão, que elle exerce.
As declarações apresentadas pelos contribuintes, tambem não podem merecer grande fé; muitos substituem as industrias por outras menos collectadas.
Os esclarecimentos, obtidos pelo escrivão de fazenda por meio de informadores louvados e dos presidentes das associações industriaes, peccam pelos defeitos já apresentados em relação aos informadores louvados prediaes, ou são insuficientes; porque, entre nós, todos se negam a dar informações ao fisco, quando não entendem até que é licito lezal-o e contribuir para tão meritorio fim.
Este quadro succinto, que o sr. ministro poderá completar consultando 08 numerosos agentes fiscaes, que estão sob suas immediatas ordens, prova o estado de anarchia, em que se encontra uma das mais importantes contribuições directas.
Em relação á contribuição de renda de casas, todos sabem que recáe sobre o valor locativo das habitações com as seguintes exclusões:
Terras de 1.ª classe, rendas de 20$000 reis e inferiores.
Terras de 2.ª classe, rendas de 15$000 réis e inferiores.
Terras de 3.ª e 4.ª classe, rendas de 10$000 réis e inferiores.
Terras de 5.ª e 6.ª classe, rendas de 5$000 réis e inferiores.
Nas ilhas adjacentes:
Terras de 3.ª e 4.ª classe, rendas de 15$000 réis e inferiores.
Terras de 5.ª e 6.ª classe, rendas de 10$000 réis e inferiores.
Os defeitos de lançamento são, exactamente, os que apontei nas contribuições anteriores.
As combinações entre os senhorios e inclinos diminuem o valor locativo das habitações alugadas.
Esta fixação baixa influe, como já disse, por um lado na contribuição predial e por outro na da renda de casas.
Emquanto ás casas habitadas pelos proprios donos a fixação das rendas pelos peritos-louvados é sempre muito modesta.
Não obstante esta contribuição tende a crescer.
Até 1884-1885, em que existia o concelho de Belém, o seu rendimento foi:
[Ver tabela na imagem]
O crescimento foi insignificantissimo.
De 1884-1885 até hoje, depois da annexação do concelho de Belem, o rendimento foi:
[Ver tabela na imagem]
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N'estes quatro annos o crescimento mais rápido faz-nos esperar que o rendimento se elevará successivamente.
O verdadeiro crescimento observa-se, porém, nas rendas medias e pequenas.
Em 1885, por exemplo, não havia em todo o districto de Lisboa, comprehendendo a cidade, mais do que as seguintes collectas:
De 500$000 a 700$000 réis, 231 no valor de 129:000$000
De 700$000 a 1:000$000 réis, 91 no valor de 72:000$000
De 1:000$000 réis para cima, 35 no valor de 47:000$000
Basta conhecer a cidade para ver como este numero é reduzido; todavia, em 1879, se me não engano na data, o numero de collectas superiores a 1:000$000 réis era de 33 no valor de 40:000$000 réis. N'este largo periodo as collectas maximas não cresceram muito em numero e importancia!
A contribuição sumptuaria offerece, pelo contrario, tendência pronunciada para baixar.
Em Lisboa, por exemplo, rendeu antes da annexação de Belem:
1881-1882 ...... 24:000$000
1882-1883 ...... 24:000$000
1883-1884 ...... 23:000$000
1884-1885 ...... 23:000$000
Annexado o concelho de Belem, cujo rendimento sumptuario era de 4:000$000 réis approximadamente, o rendimento em Lisboa continuou sendo:
1884-1885 ...... 24:000$000
1885-1886 ...... 23.000$000
1887-1888 ...... 23:000$000
1888-1889 ...... 23:000$000
Ora, esta contribuição recáe sobre creados, cavallos, trens e uso de brazões, isto é, manifestações de riqueza e de luxo.
Por aqui se vê como as classes ricas tendem a eximir-se ao imposto.
Se em toda a parte a grande propriedade e a grande industria tendem a eximir-se ao imposto, entre nós este facto é ainda facilitado pelas disposições das leis fiscaes. Magnifico era este campo para se exercer o talento do sr. ministro, que em vez disto preferiu lançar mão de um systema empirico, esmagador e digno apenas de qualquer mediocridade. (Apoiados).
Sr. presidente, comprehendo que, demonstradas estas desigualdades e estes defeitos, qualquer homem novo e talentoso, que se sente nas cadeiras ministeriaes, deseje vincular o seu nome a grandes reformas. Comprehendo que ousadamente corte com abusos inveterados e com transigencias criminosas para ligar o seu nome glorioso a reformas uteis para o paiz; mas não admitto que se apresente com o simples expediente de um addicional, que aggrava os defeitos do systema tributario e incide sem piedade sobre os consumidores) mais pobres! (Apoiados.)
Como v. exa. vê, sr. presidente, não posso seguir uma um os impostos, cuja economia intima vae ser alterada pela addicional. Careceria de dias e dias para explanar as suas opiniões.
Ainda algumas palavras sobre assumpto, que julgo importantissimo, e terminarei a minha longa exposição.
O actual sr. ministro da fazenda corrigiu o orçamento do seu antecessor no tocante aos direitos da importação dos cereaes; devia, porém, fazer mais alguma cousa.
Os direitos sobre a importação dos cereaes produziram em 1887-1888 a receita de 2.231:000$000 réis; em 1888-1889 os direitos correspondentes desceram a 1.293:000$000 réis; houve, pois, uma diminuição de cerca de réis 1.000:000$000.
Parece-me, todavia, que n'este ultimo anno a taxa do direito não foi inferior á do anterior...
(Interrupção do sr. ministro da fazenda.)
É possivel, mas em todo o caso houve diminuição importante na quantidade do trigo importado. É sobre este facto, que fundo os meus raciocinios.
Ora, esta diminuição poderia attribuir-se a tres causas geraes e economicas:
1.ª Ao augmento da producção nacional, quer pela cultura intensiva, quer pela extensiva;
2.ª Á producção extraordinaria no anno agricola de 1888-1889;
3.ª Á diminuição do consumo.
Todos, que se occupam d'estas questões, sabem que o augmento normal da producção não se deu, nem era facil de dar se em grau importante de um para outro anno.
A producção do anno agricola de 1888-1889 não foi tambem extraordinaria, embora fosse regularissima, ou mesmo boa.
Finalmente, a diminuição de consumo em alimento tão importante não é hypothese admissivel.
Nenhuma d'estas causas actuou, pois, sobre a importação do trigo, por fórma que possa explicar uma consideravel diminuição; logo outra causa existe, ou póde existir, que deu origem a este phenomono.
Qual seja, francamente, nem a vejo, nem mesmo a presinto.
Devo observar, todavia, á camara que anteriormente á lei, que hoje regula a entrada dos cereaes estrangeiros, o trigo nacional era todo consumido, embora os preços de venda não fossem remuneradores. É licito, pois, perguntar: se o paiz não produziu mais trigo, do que habitualmente produzia, se não consumiu menos, porque foi que em 1888-1889 se importou menos trigo estrangeiro?
Este assumpto deve ter sido apreciado pelo sr. ministro da fazenda; é natural que tão importante decrescimento de uma verba orçamental lhe indicasse a necessidade de estudos minuciosos.
Não basta, effectivamente, diminuir as receitas orçamentaes para corrigir e avolumar o deficit, é necessario investigar as causas dessa diminuição; aliás tudo se cifrará em pirraças financeiras de nenhum alcance administrativo.
De resto, estas questões passam-se entre ministros, effectivos e honorarios, e com ellas nada tenho eu que ver; tendo, aliás, muito que attender ás causas de diminuição de uma receita importante do estado.
A ultima lei, que votamos, sobre cereaes offerecia gravissimos perigos.
O sr. ministro sabe que, para a regulamentar, foi nomeada uma commissão numerosa, de que fiz parte até certo tempo; talvez ignore, porém, que essa commissão discutiu largamente a defeza contra o possivel contrabando dos cereaes em larga escala.
Entre os variados alvitres propostos, surgiu um, que pareceu o mais acceitavel: a organisação de uma zona na fronteira portugueza, em que a producção dos cereaes e o seu transporte ficassem sujeitos a fiscalisação particular.
Este plano, largamente discutido, foi abandonado, não sei porque rasões; mas o que posso affirmar a v. exa. é que a maioria da commissão, pô-lo menos, ligava a esta defeza grande importancia.
Apparece agora um facto importante, e para mim por emquanto inexplicavel, a consideravel diminuição da importação do trigo; parece-me, pois, rasoavel que se estude bem este ponto, para se conhecer se as previsões da commissão não tinham algum fundamento.
Ainda ha poucos dias me foi asseverado outro facto, que merece detida investigação.
Todos sabem que para o norte do paiz, da linha do Mondego para cima, o trigo é excepcionalmente cultivado; tão pequena é relativamente a sua producção que
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se consome nas proprias localidades. Ao contrario do que succede entre nós, a região de Salamanca é cerealifera por excellencia.
Ora, pessoa conhecedora do assumpto, affirmou me que as expedições de trigo para o Porto, natural centro da zona de consumo, decrescem singularmente.
A que attribuir esto facto? Por acaso os trigos de Salamanca serão nacionalisados sem pagamento do respectivo direito? (Apoiados.)
Não accuso alguem, aponto as duvidas que no meu espirito tem levantado esta questão importante, e indico, sobre tudo, ao sr. ministro a necessidade de um rigoroso inquerito e de um detido estudo sobre este assumpto.
Sr. presidente, pela minha parte estou disposto a soffrer os maiores sacrifícios, como contribuinte, para proteger a agricultura nacional, a melhor fonte da riqueza publica. Por ella estou prompto a dar até ao meu ultimo ceitil; mas não estou resolvido a contribuir com um só ceitil para engrossar os capitães dos ruía do trigo.
Foi sempre este o resultado, que eu temi na lei sobre cereaes, que actualmente vigora. Do alto desta tribuna disse-o francamente; queira Deus que não vamos crcar entre nós os famosos réis do trigo!
É possivel que tivesse uma previsão verdadeira, quando assim fallava.
Vale bem a pena esmiuçar esta questão e aprecial-a rigorosamente em todas as origens, por um principio de moralidade necessaria em todas as circumstancias e, principalmente, nas actuaes, quando em nome do orçamento desequilibrado pelo desfalque das receitas dos cereaes, entre outras, o governo vae arrancar ao contribuinte mais pobre o melhor de um addicional injusto e gravoso.
Isto posto farei apenas duas perguntas ao sr. ministro da fazenda ou ao sr. relator. S. exa. pede-nos auctorisação para arredondar os direitos: como se deve entender este arredondamento?
Se é para a unidade immediatamente superior pouca importancia póde ter, mesmo para as mercadorias de grande importação; por exemplo em relação ao assucar os arrendamentos serão de 0,9 e 0,4 de real; se é, porém, para 5 e multiplos de 5 a questão é mais gravo; os 6 por cento addicionaes podem transformar-se em percentagem bom mais superior.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Responderei logo. Peço a palavra.
O Orador: - Segunda pergunta. Constando-me que existem duvidas entre altos funccionarios aduaneiros sobre se o bacalhau importado, em parte pelo menos, é ou não mercadoria sujeita a tratado, desejo saber se póde incidir sobre os respectivos direitos e novo addicional?
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - A minha interpretação ò que não póde recair sobre elles o addicional.
Sempre assim o entendi o sempre assim se entendeu. Na pratica tem-se resolvido n'este sentido.
O Orador: - Agradeço a v. exa. e tenho concluido.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Presidente: - Hoje ha sessão nocturna. A ordem da noite é a mesma.
Está levantada a sessão.
Eram mais de seis horas da tarde.
Rectificação
A pag. 967, 2.ª col., lin. 1.ª, onde se lê: «... um relativamente insignificante empréstimo de 9:000 contos de réis em vez de levar a cabo a operação do porto de Leixões o caminho de ferro de Salamanca, a qual lhe deixou iniciada o ministerio transacto, e que lhe aliviaria de 430 contos de réis o orçamento, operação que feita pelo sr. Barros Gomes com a caixa geral de depositos lhe daria não menos e antes mais de 9:000 contos de réis.»
Leia-se:
«... um relativamente insignificante emprestimo de 9:000 contes de réis em vez do levar a cabo a operação do porto de Leixões e caminho de ferro de Salamanca, a qual lhe deixou preparada o ministerio transacto, e que lhe aliviaria de 430 contos de réis o orçamento. Esta operação e a importancia realisada pelo sr, Barros Gomes com a caixa geral de depositos dar-lhe-iam as duas não menos e antes mais de 9:000 contos de réis.
O redactor = Sá Nogueira.