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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

60.ª SESSÃO

EM 7 DE SETEMBRO DE 1909

SUMMARIO. - Lida e approvada a acta dá-se conta do expediente. - Teem segunda leitura alguns projectos de lei que são admittidos e enviados ás commissões respectivas. - O Sr. Moreira de Almeida faz diversas considerações de ordem geral a que responde o Sr. Presidente do Conselho (Wenceslau de Lima). - O Sr. Oliveira Simões refere-se aos acontecimentos de Porto de Mós, respondendo-lhe o Sr. Presidente do Conselho (Wenceslau de Lima). - O Sr. Rodrigues Nogueira apresenta um parecer e o Sr. Valerio Villaça e um projecto de lei. - O Sr. João de Menezes pede esclarecimentos sobre o caminho de ferro de Lourenço Marques, respondendo-lhe o Sr. Presidente do Conselho (Wenceslau de Lima). - Os Srs. Brito Camacho e Lino da Silva referem se a diversos casos de administração, respondendo-lhes os Srs. Presidente do Conselho (Wenceslau de Lima) e Ministro da Marinha (Terra Vianna). - Alguns Srs. Deputados enviam papeis para a mesa.

Ordem do dia. Projecto de lei n.° 37 (Subsidio aos lyceus da Povoa de Varzim e de Ponte de Lima). Usaram da palavra os Srs. João de Menezes, Arthur Montenegro, Abel Andrade, Rodrigues Nogueira, Queiroz Velloso, Costa Lobo, Queiroz Ribeiro, Alexandre Albuquerque, Ascensão Guimarães, José Tavares, Pereira de Lima e Presidente do Conselho (Wenceslau de Lima). É approvado o projecto.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. José Joaquim Mendes Leal

Secretarios - os Exmos. Srs.:

João José Sinel de Cordes
João Pereira de Magalhães

Primeira chamada - Ás 2 e 20 da tarde.

Presentes: - 9 Srs. Deputados.

Segunda chamada - Ás 2 e 50 da tarde.

Presentes: - 56 Srs. Deputados.

São os seguintes: - Abel Pereira de Andrade, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alfredo Pereira, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio de Almeida Pinto da Motta, Antonio Alves Oliveira Guimarães, Antonio Macedo Éamalho Ortigão, Antonio Rodrigues Costa ,da Silveira, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Tavares Festas, Antonio Zeferino Candido da Piedade, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Aurélio Pinto Tavares Osorio Castello Branco, Carlos Augusto Ferreira, Conde de Castro e Solla, Conde de Mangualde, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Emygdio Lino da Silva Junior, Francisco Miranda da Costa Lobo, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, João Duarte de Menezes, João Ignacio de Araujo Lima, João Joaquim Isidro dos Reis, João José Sinel de Cordes, João Pereira de Magalhães, João Soares Branco, João de Sousa Calvet de Magalhães, Joaquim Heliodoro da Veiga, Joaquim José Pimenta Tello, Jorge Vieira, José de Ascensão Guimarães, José Augusto Moreira de Almeida, José Bento da Rocha e Mello, José Cabral Correia do Amaral, José Jeronimo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim da Silva Amado, José Julio Vieira Ramos, José Maria Cordeiro e Sousa, José Maria Joaquim Tavares, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Oliveira Simões, José Maria Pereira de Lima, José Maria de Queiroz Velloso, José Mathias Nunes, José Paulo Monteiro Cancella, Luis Vaz de Carvalho Crespo, Manuel Affonso da Silva Espregueira, Manuel de Brito Camacho, Manuel Nunes da Silva, Matheus Augusto Ribeiro de Sampaio, Paulo de Barros Pinto Osorio, Rodrigo Affonso Pequito, Visconde de Coruche, Visconde de Ollivã.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque, Alfredo Carlos Le Cocq, Antonio Duarte Ramada Curto, Augusto de Castro Sampaio Côrte Real, Augusto Pereira do Valle, Diogo Domingues Peres, Eduardo Frederico Schwalbach Lucci, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, João Carlos de Mello Barreto, João Henrique Ulrich, José Ribeiro da Cunha, Manuel Telles de Vasconcellos, Vicente de Moura Coutinho de Almeida de Eça.

Não compareceram a sessão os. Srs.: - Abel de Mattos Abreu, Abilio Augusto de Madureira Beça, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Affonso Augusto da Costa, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alberto Pinheiro Torres, Alexandre Braga, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amadeu de Magalhães Infante de La Cerda, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Alberto Charulla Pessanha, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Bellard da Fonseca, An-tpnip Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Hintze Ribeiro, Antonio José de Almeida, Antonio José Garcia Guerreiro, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Antonio Sergio da Silva e Castro, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Augusto César Claro da Ricca, Augusto Vidal de Castilho Barreto e Noronha, Christiano José de Senna Barcellos, Conde da Arrochella, Conde de Azevedo, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia, Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Eduardo Burnay, Ernesto Jardim de Vilhena, Fernando de Almeida Loureiro e Vasconcellos, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Fernando de Sousa Botelho e Mejlo (P.), Francisco Joaquim Fernandes, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Xavier Correia Mendes, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachpreta, Henrique de Mello Archer da Silva, João Augusto Pereira, João do Canto e Castro Silva Antunes, João Correia Botelho Castello Branco, João José da Silva Ferreira Neto, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Tavares, Joaquim Anselmo da Matta Oliveira, Joaquim Mattoso da Camara, Joaquim Pedro Martins, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Antonio da Rocha Lousa, José Caeiro da Matta, José Caetano Rebello, José Estevam de Vasconcellos, José Francisco Teixeira de Azevedo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Malheiro Reymão, José Maria de Oliveira Mattos, José Osorio da Gama e Castro, José dos Santos Pereira Jardim, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luis Filippe de Castro (D.), Luis da Gama, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Francisco de Vargas, Manuel Joaquim Fratel, Manuel de Sousa Avides, Mariano José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Miguel Augusto Bombarda, Roberto da Cunha Baptista, Sabino Maria Teixeira Coelho, Thomás de Almeida Manuel de Vilhena (D;), Thomás de Aquino de Almeida Garrett, Visconde de Reguengo (Jorge), Visconde da Torre, Visconde de Villa Moura.

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SESSÃO N.° 60 DE 7 DE SETEMBRO DE 1909 3

ABERTURA DA SESSÃO - Ás 3 horas da tarde

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do Ministerio das Obras Publicas, remettendo esclarecimentos sobre o projecto do canal de navegação e irrigação destinado a ligar os rios Tejo, Sado e Guadiana, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado J. M, Pereira de Lima.

Para a Decretaria.

Do Ministerio das Obras Publicas, enviando copia da informação prestada pela Direcção dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste ácerca dos estudos do ramal de Sines, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado José Maria Feio Terenas.

Para a secretaria.

Do Ministerio das Obras Publicas, enviando, em satisfação á segunda parte dos esclarecimentos requeridos pelo Sr. Deputado Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque, uma nota do rendimento das linhas exploradas por companhias em 1908.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, enviando, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado Henrique de Mello Archer da Silva, copia do relatorio do inspector geral dos impostos João Alfredo de Faria, sobre o projecto de regulamento para melhorar o serviço de cobrança dos impostos.

Para a secretaria.

Da Camara Municipal do concelho, de Aljustrel, pedindo que não seja approvado o projecto do imposto de minas, a contribuir para os cofres dos municipios, apresentado pelo Sr. Deputado Eduardo Valerio Villaça.

Para a secretaria, e a publicar a representação no "Diario do Governo".

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - O actor Joaquim de Almeida, figura de excepção da scena portuguesa, um dos raros actores nossos que á semelhança de Ermete Zacconi em Italia, e de Guitry em França, continuando a tradição gloriosa de Antonio Pedro e de Taborda, tem trabalhado para conciliar a arte dramatica com a "vida", como Ibsen conciliou a literatura do theatro com a "verdade", está velho, enfermo e pobre. Os cincoenta e tres annos do seu trabalho em que avultam criações assombrosas, como por exemplo, a do Papá Lébonnard, de Jean Aicard, documento de uma organização artistica de maravilha, deram sem duvida assinalado esmalte ao theatro português que, legitimamente se desvanece de um tal cultor, mas não concederam ao actor illustre que assim prodigalizou o seu talento, para honra da arte nacional, a garantia de uma velhice de repouso. Ao passo que outros artistas mais no vos e, alguns d'elles, incomparaveis a Joaquim de Almeida, quer no merecimento quer nas condições materiaes da vida, estão hoje reformados, o grande actor, com mais de sessenta annos de idade e com o "activo" de uma carreira brilhantissima, ve se obrigado a trabalhar ainda não raro em circunstancias improprias do seu nome e da sua categoria, para não morrer de fome e para occorrer aliás com difficuldade, ao sustento de uma familia numerosa e querida.

Em 12 de maio de 1906, Jqaquim de Almeida, que ora classificado actor de 1.ª classe do Theatro de D. Maria II, por portaria de 27 de setembro de 1898, requereu a sua aposentação, allegando achar-se nas circunstancias do artigo 3.° da carta de lei de 7 de maio de 1878, que mantem os direitos de aposentação e reforma conceitos aos actores pelo decreto de 4 de outubro de 1860, contando-lhes todo o tempo de serviço que tivessem em qualquer theatro nacional, embora não administrado pelo Governo. Ouvidas, sobre o assunto, as estações competentes suscitaram-se duvidas com respeito ao deferimento o pedido allegando-se que a doutrina do artigo 3.° da carta de lei de 7 de maio de 1878 não era applicavel ao referido actor em virtude de Joaquim de Almeida não haver sido classificado pelo antigo Conselho Dramático, orno determinam os artigos 67.° e 72.° do decreto de 4 de outubro de 1860.

Todavia, tanto o commissario do Governo junto do Fheatro de D. Maria II, no seu officio de 17 de junho de 1906 dirigido á Direcção Geral de Instrucção Publica, orno o Conselho de Arte Dramatica, na sua sessão de 1 de agosto de 1906, convocada para dar parecer sobre o processo respeitante á reforma do actor Joaquim de Almeida, se pronunciaram a favor da aposentação extraordinaria do grande artista, tomando em consideração, não só o seu alto talento, mas tambem os relevantes serviços por largo tempo prestados á arte dramática nacional. O Conselho de Arte Dramática, na consulta a que acabo de me referir, chegou a dizer que "se estivesse na sua alada, recommendaria aos poderes publicos, calorosamente a causa deste eminente artista, já velho e cansado".

No decreto de 4 de outubro de 1860 referendado pelo Marques de Loulé, que modificou o de 22 de setembro de 1853, relativo a administração dos theatros, preceitua-se que os actores do "theatro normal" impossibilitados para o exercicio da arte scenica, teriam o direito á reforma quando pelos seus merecimentos e serviços distinctos, houvessem obtido uma qualificação honrosa, graduada pelas classes estabelecidas. Mais tarde, extincto o theatro normal, foi esse decreto substituido pelo de 7 de maio de 1878 que, mantendo o principio indicado, tornou extensivo o decreto ou o premio de reforma a todos os actores que tivessem prestado serviço em qualquer theatro nacional, embora não administrado pelo Estado. Reproduzo em seguida para completo esclarecimento, o artigo 3.° da referida carta de lei de 7 de maio de 1878, pelo que foi reformado o actor José Carlos dos Santos, "tendo em consideração os valiosos serviços por elle prestados á arte dramatica e attendendo ás excepcionaes circunstancias em que esse artista se encontrava":

"Artigo 3.° Os direitos de aposentação e reforma, concedida aos actores pelo decreto de 4 de outubro de 1860, são mantidos nos termos do mesmo decreto, e não obstante quaesquer disposições em contrario do decreto de 10 de outubro de 1869, contando-lhes todo o tempo de serviço que tiverem em qualquer theatro normal, embora não tenha sido administrado pelo Governo".

O actor Joaquim de Almeida allegou estar precisamente nas condições deste artigo da lei, visto ter exercido a sua arte ainda quando o Theatro de D. Maria II era administrado por conta do Estado. A unica objecção que se oppôs á sua reforma assim solicitada, foi a de que não existia junto ao processo documento algum official pelo qual se prove que o mesmo requerente foi classificado pelo antigo conselho dramatico, como determinam

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

os artigos 67.° e 72.° do decreto de 4 do outubro de 1860, unicos termos em que se poderiam invocar os direitos a aposentação expressos no artigo 3.° da carta de lei de 1 de maio de 1878. Essa todavia soffreu a contestação, que consta de um requerimento do interessado, de 20 de novembro de 1906, e a que allude o parecer da 3.ª Repartição da Direcção Geral de Instrucção Publica, de 9 de fevereiro de 1907, de que "nessa epoca não podia o requerente obter aquella classificação pelo facto de ter apenas dois annos de actor, visto ter iniciado a sua carreira em 1858." Como quer porem que o processo respectivo continue sem andamento e que as circunstancias do velho e glorioso actor sejam cada vez mais precarias, venho hoje chamar a vossa esclarecida attenção para o assunto pedindo-vos que useis da, vossa iniciativa, como um dos ramos do poder legislativo, no sentido de ser concedida a reforma ao actor Joaquim de Almeida, que por todos os titulos, a merece. Não seria essa a primeira resolução d tal natureza tomada pelo Parlamento Português. Citei-vos já a lei de 7 de maio de 1878, segundo a qual foi reformado o grande actor José Carlos dos Santos, attendendo-se ás "circunstancias excepcionaes em que esse artista se encontrava". Oito annos depois, em 26 de maio de 1886 o illustre Deputado, primoroso homem de letras Urbano de Castro, que todos recordamos com saudade apresentou n'esta Casa do Parlamento um projecto d'elle autorizando o Governo a reformar o actor Antonio Pedro, nos termos do decreto de 7 de maio de 1878.

Assinaram esse projecto de lei, alem do brilhante jor nalista, os illustres Deputados Fernando Caldeira e Antonio da Cunha Bellem, já fallecidos, Rodrigo Affonso Pequito e Antonio Candido. Toda a imprensa da epoca defendeu e apoiou calorosamente o projecto, tendo causado grande impressão os seguintes periodos finaes de um artigo de um jornal importante, O Dez de Março, de 3 de abril de 1886:

"As Côrtes não devera fechar sem ter votado este acto de justiça que é, ao mesmo tempo, um preito nacional rendido ao formoso talento do grande actor."

A Cortes fecharam porem inesperadamente: e a reforma de Antonio Pedro não pode ser votada n'esse anno Aberto o Parlamento em 1887, Urbano de Castro, secundado por Antonio Candido, renovou a iniciativa do seu projecto de lei, que obtivera parecer favoravel da com missão de fazenda, no qual figurava o nome de outro jornalista eminente, Carlos Lobo de Avila, e que foi finalmente approvado em agosto desse anno, convertendo sé em lei pela carta de 25 do mesmo mês publicada no Diario do Governo de 31. O que Urbano de Castro pedia em 1886 ao Parlamento do seu país, para o grande actor Antonio Pedro, ao Parlamento do meu país peço eu hoje para o grande actor Joaquim de Almeida. No relatorio que precede o seu projecto de lei de 26 de março de 1886 dizia o saudoso Deputado apresentante: "notarei mais, em segundo logar, que da reforma de Antonio Pedro não resulta em verdade o aumento de nenhuma verba no orçamento, simplesmente se conserva a que era destinada ao actor José Carlos dos Santos, ultimamente fallecido". Ainda neste ponto, as circunstancias de hoje correspondera ás de então, porque "da reforma de Joaquim de Almeida" não resulta em verdade, o aumento de nenhuma verba no orçamento; simplesmente se conserva a que era destinada ao actor Taborda ultimamente fallecido.

Assim pois, expostas nitidamente, como ficam, a situação em que Joaquim de Almeida se encontra e a justiça da sua causa, tenho a honra de submetter á vossa apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É concedida a reforma ao actor Joaquim de Almeida, applicando se a este artista as disposições do decreto de 7 de maio de 1878.

Art. 2.° O vencimento, a contar da data em que a reformafor concedida, será o de actor de primeira classe conforme o § unico do artigo 77.° do decreto de 4 de outubro de 1860.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da Camara dos Senhores Deputados, em 6 de setembro de 1909. = João Carlos de Mello Barreto.

Foi admittido e enviado ás commissôes de administração publica e de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - O decreto ditatorial de 10 de janeiro de 1895, no seu artigo 246.° estabelecia a composição do Supremo Conselho de Justiça Militar e nos §§ 1.° e 2.° do mesmo artigo admittia que o presidenta e vogaes fossem officiaes do activo ou reformados. Mais tarde, a carta de lei de 13 de maio de 1896, tambem no artigo 246.° e seus paragraphos estabelece a composição d'aquelle tribunal mas estatue que o presidente e vogaes devem ser officiaes do activo, com exclusão dos reformados. Para justificar esta substituição apresenta a commissão parlamentar razões muito para ponderar, é certo, mas não é menos certo, que o numero de officiaes generaes do activo e inferior ao exigido pelas commissões que lhe são adstrictas, que a situação da fazenda publica não comporta largos aumentos de despesa e que é avultadissima a verba applicada annualmente pelos vencimentos dos reformados.

Se do primeiro e segundo factos apresentados se conclue a impossibilidade de harmonizar o quadro do generalato com as necessidades previstas nas leis em vigor, do terceiro resulta a conveniencia de aproveitar, tanto quanto possivel, no desempenho de certos serviços, mais ou menos sedentarios, aquelles que, por terem attingido o limite de idade ou por incapacidade physica, foram afastados dos quadros do exercito activo.

Entre essas commissões sedentarias certamente se pode e deve incluir a de membro do Supremo Conselho de Justiça Militar, tanto mais que a experiencia fez-se desde que entrou em vigor o decreto acima citado até que produziu todos os seus effeitos o § 2.° do artigo 247.° da carta de lei de 13 de maio de. 1896 quanto aos vogaes, pois no que respeita ao presidente, ainda hoje este logar é desempenhado por um official reformado.

Entendo, porem, que se não ha inconveniente em que officiaes da reserva ou reformados desempenhem as funcções de membros d'aquelle tribunal, julgo, tambem que se deve estabelecer um limite de idade, alem do qual elles sejam obrigados a deixar essa commissão.

São por demais obvias as razões desta affirmativa, motivo porque me dispenso de as expor. Não traz esta medida acréscimo algum de despesa, pois não aumenta o numero das commissões.

Por tudo quanto deixo exposto tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:

Artigo unico. Os §§ 1.° e 2.° do artigo 246.° da carta de lei de 13 de maio de 1896 são substituidos pelos seguintes:

"§ 1.° O presidente será sempre um general de. divisão ou Vice-almirante, pertencendo á officialidade do serviço ou quadro de reserva ou reformado, que apenas tenha ido julgado incapaz de serviço activo pela junta militar de saude.

§ 2.° Os vogaes militares do Supremo Conselho de Justiça Militar serão officiaes generaes, tres do exercito e rés dá armada, pertencendo igualmente á effectividade do serviço ou quadro de reserva ou reformados, que apenas tenham sido julgados incapazes do serviço activo pela junta militar de saude.

§ 3.° Os officiaes do quadro da reserva ou reformados nomeados para os logares de presidente ou vogaes do Supremo Conselho de Justiça Militar deixarão o exerci-

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do desta commissão quando attingirem a idade de setenta e cinco annos".

Sala das sessões da Camara dos Senhores Deputados, 6 de setembro de 1909. = João Sinel de Cordes, Deputado pelo circulo de Faro.

Foi admittido e enviado á commissão de guerra.

O Sr. Moreira de Almeida: - Pedi a palavra, em primeiro logar, para mandar para a mesa um projecto de lei, que seguirá os tramites regimentaes e para que peço a attenção da respectiva commissão e tambem a attenção do Governo na parte em que lhe diz respeito.

Esse projecto tende a regularizar a situação de admissão dos professores dos nossos lyceus, quer effectivos, quer substitutos. Eu entendo que o regime de interinidade dos professores nos nossos lyceus, regime que se tem prolongado demasiadamente, com manifesto prejuizo do ensino, não pode subsistir por mais tempo.

Julgo de toda a conveniencia que nos lyceus haja um grupo de professores substitutos com concursos e nomeação, tendo dado as suas provas, e habilitados, que suppram o eventual impedimento dos professores effectivos, como se dá nas escolas superiores. Entendo que esta dis posição deve ser applicada ás escolas industriaes, e neste sentido redigi um projecto de lei que vae precedido de um relatorio que me dispenso de ler, para não tomar tempo á Camara.

O projecto é o seguinte:

(Leu).

Ao mesmo tempo, e visto estar no uso da palavra, devo dizer que eu e p meu collega Queiroz Ribeiro, que aqui representam a minoria dissidente, vimos com prazer uma proposta apresentada ha quatro dias, nesta Camara, pelo Sr. João de Menezes sobre a reforma eleitoral.

Como V. Exa. sabe, tem sido nosso empenho constante que se revogue a actual lei eleitoral, que não traduz de modo algum as aspirações do país, que não corresponde de nenhum modo á situação do nosso eleitorado e dá a esta Camara uma representação que não pode ter aquella genuidade que nos todos devemos exigir.

Desde muito tempo que a dissidencia vem reclamando essa reforma feita em bases democraticas e garantindo quanto possivel a veracidade do suffragio, mas, infelizmente, estamos quasi chegados ao fim d'esta legislatura e a Camara está arriscada a terminar os seus trabalhos sem se ter occupado de um assunto que, a meu ver, e na opinião do partido a que pertenço e dos nossos collegas que se sentam deste lado, deveria ser um dos assuntos mais vitaes e que mais primordialmente devia ter occupado a attenção da Camara. (Apoiados).

Comprehendia-se que se tivesse feito uma Camara pela lei vigente, absolutamente condemnada; comprehendia-se que assim se tivesse procedido, visto que não era possivel recorrer a um acto ditatorial, mas visto que esta Camara funcciona ha quasi duas sessões, devia já ter sido feito uma reforma d'essa lei.

O Sr. João de Menezes propôs que uma commissão fosse nomeada para se proceder a essa reforma, e a Camara mandou essa proposta á commissão de administração publica, o que quer dizer, enterrou-se mais uma vez a proposta do Sr. João de Menezefe, como se enterrará qualquer outra que tenha o mesmo fim.

Para obviar a esse inconveniente mando para a mesa uma proposta, que é do teor seguinte:

Proposta

Proponho que independentemente de parecer da commissão de administração publica seja nomeada desde já e funccione no interregno parlamentar a commissão proposta pelo Sr, Deputado João de Menezes, encarregada de elaborar um projecto de lei eleitoral, a qual será de 11 membros, com representações de todos os partidos politicos, e apreciar não só a proposta d'aquelle Sr. Deputado mas quaesquer outras que lhe forem presentes pelos membros d'esta Camara, devendo os seus trabalhos ser submettidos a esta no começo da proxima sessão legislativa. = J. A. Moreira de Almeida.

Estou convencido de que se a Camara approvar esta proposta, assim como já deu autorização para que funccionasse a commissão de inquerito parlamentar, nenhuma duvida terá tambem em que a commissão de reforma eleitoral funccione durante o interregno parlamentar. D'este modo qualquer dos membros da Camara pode ir á commissão apresentar as suas propostas, e a commissão poderá na proxima sessão elaborar um projecto que, a meu ver, não deve ter qualquer preoccupação partidaria, e simplesmente inspirar-se nos principios de uma legitima representação de todas as opiniões, e que possa ser submettida á Camara na proxima sessão legislativa.

Por ultimo, visto que estou com a palavra devo dizer ainda para não intervir na discussão do orçamento que não desejo, bem como o meu collega o Sr. Queiroz Ribeiro, que o nosso silencio nessa discussão seja interpretado, como uma adhesão a esse diploma e ás propostas modificações que a commissão entendeu dever introduzir.

Nós simplesmente partimos do principio de que nesta adeantada quadra, que nesta altura da sessão legislativa, seria muito preferivel que cada partido politico fizesse as suas declarações, resumisse as suas opiniões e o seu voto nas medidas orcamentaes, sem que um largo debate viesse protelar o andamento dos trabalhos.
Oro é isto que nos queremos dizer, e é esta a declaração que queremos fazer, respeitando absolutamente o modo de ver contrario não indo nisto a menor censura aos illustres membros d'esta Camara.

Nós nunca maguamos niguem, cumprimos a nossa promessa, e reservamo-nos o direito, de amplissima, completa e profunda discussão do orçamento do estado que deve ser apresentado no proximo mês de janeiro, de maneira que não tenha os inconvenientes que teve o orçamento actual.

N'esta altura da sessão, não quero de modo nenhum contribuir para uma discussão parlamentar absolutamente esteril.

N'estes termos, faço esta declaração, para que de modo nenhum fique a impressão de que nos approvamos o orçamento, ou ligamos a minima responsabilidade ao que está em discussão, mas simplesmente declaramos tambem que não queremos a responsabilidade de concorrer por qualquer forma para o desprestigio parlamentar.

Era esta a declaração que queria fazer, e mando para a mesa um projecto de lei, e bem assim a proposta.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Wenceslau de Lima): - De dois assuntos se occupou o illustre Deputado o Sr. Moreira de Almeida, sendo um d'elles referente tambem ao ensino, e que faz parte do projecto de lei da iniciativa de S. Exa. que foi enviado para a mesa.

O Governo sobre este assunto não tem que omittir opiniões, porque ainda o não conhece. Quando, for do conhecimento do Governo, não duvidarei dizer ao meu collega das Obras Publicas que de o seu parecer.

Parece-me que S. Exa. se referiu tambem á reforma do recrutamento de pessoal para o ensino, industrial, entendendo que a melhor seria aquella que se segue no ensino superior.

Devo dizer a V. Exa. e á Camara que me parece que a reforma de recrutamento adoptada no ensino superior, não será talvez a melhor para o ensino industrial.

Quanto á lei eleitoral, sabe V. Exa. muito bem quanto são variaveis as opiniões. Em Portugal, muito se tem dito,

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muito se tem falado, contra a actual lei eleitoral, que admitte os circulos plurinominaes com a representação das minorias.

Na Franca, actualmente, tem-se exactamente a opinião contraria; são pelos circulos plurinominaes com representação de minorias, e discute-se se a representação deve ser proporcional ou proporcionada.

Eu já hontem mesmo disse ao Sr. João de Menezes que, na proxima sessão legislativa, traria uma proposta de lei para reformar a actual lei eleitoral.

Acerca do orçamento, o Governo regista as declarações de S. Exa.

Tenho dito.

(O orador não reviu).

O Sr. Rodrigues Nogueira (por parte da commissão de fazenda): - Manda para a mesa uma copia do parecer relativo ao projecto n.° 41-B.

Devo declarar que mando uma copia, porque, tendo posto o original sobre a minha carteira, mais tarde não o encontrei.

Foi a imprimir.

O Sr. Oliveira Simões: - Sr. Presidente : na sessão de 26 de agosto, o Sr. Deputado Alexandre de Albuquerque fez algumas perguntas ao Governo, as quaes acompanhou de varias observações.

Referiu-se S. Exa. por exemplo, aos factos que, segundo as suas informações, tinham occorrido em Porto de Mós, pertencente ao circulo que tenho a honra de representar em Côrtes.

O illustre Deputado disse que os presos saiam da cadeia, que tinham para isso alluido os varões das janelas, que davam passeios pela povoação e que não se contentando com isto, promoviam ainda desordens, não havendo a força publica necessaria para manter a ordem, e para isso tudo pedia S. Exa. a attenção do Governo a fim de que melhorasse este estado de cousas.

Como é natural, por ha varios annos representar em Cortes aquelle districto, estou logo inclinado a suppor que algumas dessas informações não eram exactas e que o Sr. Alexandre de Albuquerque, repetindo as informações que lhe tinham sido dadas, não podia saber que ellas não eram a expressão da verdade dos factos.

Hoje possuo informações directas e fidedignas como taes as supponho, do que lá succedeu, e que podia contrapor ás observações de S. Exa., mas o meu fim é pedir ao illustre Presidente do Conselho, ao chefe do Governo, o favor de me dizer o que é que elle, como Ministro do Reino averiguou, o que elle soube pelas suas autoridades, com relação ao facto de que se queixou aqui o Sr. Alexandre de Albuquerque, nomeadamente, quanto aos presos sairem da cadeia e quando sairam, o que não é naturalmente responsabilidade ou culpa do Sr. presidente da Camara de Porto de Mós, nem do administrador do conselho, visto que os presos estão entregues ao poder judicial.

Tem havido ali casos de gravidade, ultimamente de perturbação da ordem publica. Quaes foram esses casos?

Houve realmente caceteiros, que fossem bater nos militares, o que era inverosimil, ou haveria algumas outras perturbações, que dessem origem a que a autoridade militar tomasse as providencias que o caso requer?

S. Exa. poderá dizer-me, e eu não contraponho outras informações.

Peço apenas ao chefe do Governo o favor de me dizer e á Camara o que realmente houve, e se no Porto de Mos se passam ou não factos tão desagradaveis como os que acabo de dizer.

Visto que estou com a palavra, lembrava a V. Exa., a proposta apresentada em 4 de março, pelo então Ministro da Guerra o Sr. General Sebastião Telles, proposta que se refere a um premio, a um galardão, pelos serviços relevantes prestados pelo illustre official de artilharia, honra da sua arma, um dos officiaes mais meritorios do exercito português, pelo seu trabalho constante, pelo seu espirito inventivo e pela abnegação com que tem trabalhado indefesamente ha muitos annos, o Sr. Xavier Correia Barreto, que teve a felicidade de dotar o seu país e o exercito com uma obra magnifica, perfeitamente comparavel com as melhores obras estrangeiras.

S. Exa. tem feito outros trabalhos, é por assim dizer um inventor graduado do exercito português, mas fez invenções e ninguém o recompensou ainda.

Por isso o Sr. Sebastião Telles apresentou uma proposta nesse sentido, proposta que eu desejava que não ficasse no olvido, porque representa uma justa consagração ao illustre official e aos merecimentos que elle possue.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Wenceslau de Lima): - Sr. Presidente: pedi a palavra para responder ás perguntas que me foram feitas pelo illustre Deputado Sr. Oliveira Simões.

Deseja S. Exa. que o Governo lhe responda ácerca do que se tem passado em Porto de Mos e particularmente se os presos saem ou não da cadeia; se ali se teem dado entre as autoridades administrativas e a população d'aquelle concelho factos anormaes que sejam merecedores de qualquer repressão.

Entende o illustre Deputado que as arguições aqui feitas n'esta casa do Parlamento peio illustre Deputado Sr. Alexandre de Albuquerque não são de todo o ponto correspondentes á verdade, por isso que as suas informações particulares lhe dizem que ellas são algum tanto exaggeradas, se não menos verdadeiras, por assim dizer.

Appella S. Exa. para a informação do Governo a fim de que decida sobre quaes das informações são ou não exactas.

Ora o illustre Deputado sabe muito bem que é facil colher informações particulares, que podem ser trazidas ao Parlamento, sem as responsabilidades de quem, sendo Governo, tem de proferir uma sentença entre o que um e outro diz.

Sr. Presidente: devo declarar a V. Exa. que ainda não tenho as informações indispensaveis de maneira ã poder dar ao Parlamento os esclarecimentos do que se passou.

A unica cousa que posso neste momento affirmar é que o delegado do ministerio publico do concelho já recebeu ordem superior, a fim de informar ácerca de quaesquer occorrencias que se tenham dado.

Estou certo que esse funccionario não deixará de dar todos os esclarecimentos sobre aquillo que se tenha passado.

Sob o ponto de vista da autoridade administrativa, à que o illustre Deputado se referiu, S. Exa. sabe perfeitamente que não tem sido possivel escolher um administrador do concelho fora da politica local, que possa dar absolutamente todas as garantias.

Ultimamente o Governo tem-se occupado na resolução deste assunto e parece-me que dentro em poucos dias irá para lá um administrador do concelho que satisfaça.

Feitas estas declarações, creio ter respondido ás considerações do illustre Deputado.

O Sr. Valerio Villaça: - Sr. Presidente: V. Exa. e a Camara sabem que alguns funccionarios publicos tinham pedido adeantamentos pela Caixa Geral dos Depositos. Estes adeantamentos não foram feitos como era devido.

Succede que esses funccionarios desejavam obter novos adeantamentos. A Caixa Geral retorquiu ao pedido feito pelos funccionarios publicos que não podia fazer mais

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adentamentos emquanto não estivessem de todo satisfeitas as dividas anteriormente abonadas.

Esta situação collocava os funccionarios em circunstancias angustiosas.

O Sr. Ministro da Fazenda publicou então o decreto de 2 de junho de 1909, autorizando a caixa a fazer novos adeantamentos, mas pagando um juro de 17 ou 20 annos.

Ora, Sr. Presidente, esta situação criada pelo decreto de 2 de junho era angustiosa por assim dizer para a vida dos funccionarios.

Para minorar quanto possivel as difficuldades a que me referi, permitta-me V. Exa. e a Camara que eu apresente o seguinte projecto de lei:

(Leu).

Já que estou no uso da palavra, Sr. Presidente, vou fazer ainda algumas considerações, mas muito singelas, a respeito de uma representação que recebi de Aljustrel, em que se protesta contra o projecto por mim apresentado numas das ultimas sessões, relativamente ao imposto de minas cobrado pelas camaras municipaes, sobre as diversas empresas mineiras.

Não. reconheço por que seja este protesto e não comprehendo que na lei portuguesa se permitta que as camaras municipaes possam cobrar impostos sobre industrias mineiras.

Sobre isto nada mais direi, limitando-me a fazer o meu protesto contra a representação.

Tenho dito.

(O orador não reviu).

O Sr. João de Menezes: - Tendo lido nos jornaes que o Governo da provincia de Moçambique pensa em arrendar por cinco annos ao Transvaal o caminho de ferro de Lourenço Marques, e sendo isto um caso muito grave, sobre elle não farei nenhuma consideração e limito-me a perguntar ao Sr. Presidente do Conselho se tem algum fundamento essa noticia.

Mais nada.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministreis, e Ministro do Reino (Wenceslau de Lima): - A minha resposta é muito simples e reduz-se a uma só palavra:

Nenhum.

O Orador: - Muito obrigado a V. Exa. Ainda bem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra é Sr. Deputado Pereira de Lima.

O Sr. Pereira de Lima: - Como o Sr. Brito Camacho pediu a palavra, desisto d'ella.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Brito Camacho.

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: eu tinha dito, hontem, que havia de apresentar, hoje, aqui, a representação dos habitantes de S. Thomé, e tinha dito ao Sr. Ministro da Marinha que desejava fazer algumas considerações em occasião em que S. Exa. estivesse presente. S. Exa. não está presente, e creio que a culpa é minha porque eu tinha tomado o compromisso de informar S. Exa. ácerca do objecto desta representação. Mas, como não me foi possivel dar-lhe essa informação, a tempo, entendeu S. Exa. naturalmente, que eu tinha resolvido não a apresentar hoje, e, por isso, mesmo tendo afazeres officiaes se dispensou de vir á Camara. Devo dizer isto porque poderia ser tomada a ausencia de S. Exa. como um acto de menos cortesia para commigo de que elle é absolutamente incapaz, ou como um acto, em summa, menos regular para com o Parlamento, visto que, tendo sido annunciado o pedido de um Deputado para a sua presença, S. Exa. não compareceu.

Mando para a mesa a representação dos habitantes de S. Thomé, e, visto que ella está nos termos devidos, peço a sua publicação no Diario do Governo.

Se estivesse presente o Sr. Ministro da Marinha, chamaria a sua attenção para esta representação, na qual se dizem cousas verdadeiramente justas e sensatas.

Queixam-se os habitantes de S. Thomé, como de rosto se queixam os outros colonos, de que estão sendo administrados no Terreiro do Paço, e de que deste facto resulta uma demasiada concentração burocratica.

Ora já era tempo de olharmos para este facto, cujas consequencias se produzem todos os dias, de lima maneira cada vez mais desastrosa.

De resto, já mais de uma vez se tem formulado aqui a reclamação de que o orçamento para as colonias deve ser presente ao Parlamento.

E isto não seria uma innovaçães porque, se formos ver a legislação anterior, encontramos a boa pratica sempre respeitada por um homem que tem a envergadura de Sá da Bandeira, de trazer ao Parlamento os projectos que dizem respeito á vida activa das colonias.

Parece que queria este o caso de fazermos um movimento de reacção, porque a reacção aqui seria somente proveitosa, limitava-nos a adoptar uma boa pratica e estou convencido de que com isso se fechava a porta a muitos abusos, sem esta deploravel pratica de os Ministros disporem como cousa inteiramente sua.

Não se teria dado o caso de se negociar com o Transvaal um tratado que o Sr. Presidente do Conselho se obstina a não submetter á approvação do Parlamento.

Já que estou com a palavra, chamo a attenção do Sr. Ministro do Reino para uma queixa que aqui mesmo me foi feita por uma professora de Matozinhos, cujos ordenados estão em atraso ha nada mais, nada menos, de dez meses e não recebe o dinheiro para expediente e limpeza da sua escola ha sete meses.

Isto é apenas um caso, mas ha muitos mais e peores do que este.

Feitas estas considerações, mando para a mesa- a representação de S. Thomé, pedindo, como disse, a sua publicação no Diario do Governo, porque ella está escrita em termos convenientes.

(O orador não reviu).

Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.

O Sr. Emygdio Lino da Silva: - Pedi a palavra para chamar a attenção do Sr. Presidente do Conselho para um facto que se deu ha dias e que é realmente para lamentar.

O vapor Funchal chegou ás 7 horas da noite, e, conforme o costume, é feita a visita da saude a bordo e immediatamente tem de dar-se livre pratica aos passageiros. Nesse dia não se deu a livre pratica e o vapor esteve até o dia seguinte á espera da visita da saude, porque se allegava que o vapor vinha de um porto sujo.

Ora devo dizer a S. Exa. que o unico ponto em que este vapor fez paragem foi na Ilha Terceira e que nessa ilha ha mais de tres meses que não ha um unico caso de peste.

Todos os médicos que tenho ouvido a este respeito, e que são autoridades no assunto, me dizem que esse prazo é mais do que sufficiente para provar p não isolamento do porto.

Portanto, peço providencias energicas para este caso.

Outro ponto para que chamo a attenção. do Sr. Presidente do Conselho é o que diz respeito ao sub inspector das escolas primarias em Angra do Heroismo.

Este homem, que foi nomeado não sei quando, está illegalmente ali collocado, porque não satisfaz ás condições da lei, que manda que o sub-inspector deve ter uma classificação pelo menos de bom nos seus diplomas para poder ser nomeado.

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8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Pois a nada disto satisfaz o seu diploma, que tem apenas a nota de sufficiente.

O Sr. Presidente do Conselho pode tomar nota destes factos e dar as providencias que o caso reclama.

E, já que estou no uso da palavra, vou mandar para a mesa um projecto de lei, que interessa ao districto de Angra do Heroismo.

Todos sabem que dura ha mais de quinze meses a peste na Ilha Terceira, e que foram grandes os prejuizos, não só de vidas, mas prejuizos materiaes, subindo a centenas de contos de réis.

Sobre esta calamidade enorme que atravessou a Ilha Terceira, acresce ainda estar imminente um anno agricola pessimo.

As cartas que recebi dizem que os campos não promettem cousa alguma e que as colheitas devem ser escassas.

Para attenuar este estado de cousas é que mando para a mesa o seguinte projecto de lei:

Não me parece que se não pratique um acto de justiça.

É preciso notar que a Junta Geral do districto de Angra do Heroismo recebe do Estado apenas 83 contos de réis e manda para Lisboa no contos de réis, isto é, manda mais proximo de 30 contos de réis do que aquillo com que fica. Não é muito, portanto, que destes no contos de réis, que veem para o continente, uma pequena parcela - e eu peço uma pequena parcela, a quinta parte - possa lá ficar para attenuar este estado de cousas.

Este projecto de lei visa a isso, não é uma esmola, mas antes um acto de justiça...

Mando para a mesa o projecto e peço a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que a representação seja publicada no Diario do Governo.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - O projecto fica para segunda leitura.

O Sr. Valerio Villaça (por parte da commissão dos negocios externos): - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que sejam aggregados á commissão dos negocios estrangeiros e internacionaes, os Srs. Deputados Jorge Vieira, José Maria de Oliveira Simões, Pinto da Motta e João Henrique Ulrich.

Sala das sessões, 7 de setembro de 1909. = E. Valerio Villaça.

Lida na mesa, foi approvada.

O Sr. João Ulrich: - Mando para a mesa o parecer da commissão dos negocios externos, fazenda e orçamento, sobre o projecto de lei n.° 47-D.

O Sr. Ministro da Marinha (Terra Vianna): - Pedi a palavra para dar uma explicação ao Sr. Brito Camacho. Cheguei tarde ao Parlamento por motivo de força maior, julgando que chegaria muito mais cedo.

Tenho estado no Ministerio com um despacho, que. até não conclui para poder -vir aqui, mas cheguei um pouco mais tarde do que tencionava.

E esta a razão da minha ausencia, mas tenho entre mãos a representação que vou ler e estudar.

O Sr. Brito Camacho: - Eu já tinha explicado a ausencia do Sr. Ministro.

O Orador: - Eu sabia que S. Exa. desejava dirigir-se-me e contava já com a sua pergunta; mas repito, cheguei tarde por um caso de força maior.

O Sr. Brito Camacho: - É apenas amabilidade de S. Exa. e nada mais.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Wenceslau de Lima): - Devo responder ao Sr. Brito Camacho e ainda ao Sr. Lino da Silva.

O Sr. Brito Camacho tratou do atraso no pagamento que se dá com os professores de instrucção primaria atraso que se dá não só nos vencimentos d'esses funccionarios do Estado, mas ainda no pagamento da renda de casas onde funccionam as escolas.

Eu já disse aqui qual a razão por que isso succede: falta de pessoal para dar destino ao necessario expediente.

Assim pelo Ministerio do Reino já começaram a funccionar os empregados auxiliares; por isso que a Repartição de Contabilidade não tinha o pessoal indispensavel para dar vazão ao enorme e grandissimo numero de processos. No orçamento, mesmo, contribui para que fosse inscrita uma verba para que esse serviço pudesse fazer se com mais presteza e celeridade. Por conseguinte desta forma julgo attender ao desejo de S. Exa.

Quanto ao caso especial que citou tomei nota, e ainda hoje ou amanhã chamarei a attenção do respectivo director geral, para saber o que ha a tal proposito.

Cumpre-me agora responder ao illustre Deputado Sr. Lino da Silva.

O iliustre Deputado não ignora que o desejo do Governo é contribuir, quanto couber nas suas faculdades, para que termine esta situação anormal.

Pelo que diz respeito ao projecto de lei apresentado pelo illustre Deputado. S. Exa. sabe muito bem que não cabe ao Governo resolver, mas ao Parlamento.

O Sr. João Pereira de Magalhães: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Insisto pela remessa, com brevidade, dos documentos que pedi na sessão de 30 de julho de 1909, pelo Ministerio dos Negocios do Reino. = João Pereira de Magalhães.

Mandou-se expedir.

O Sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia. Continua em discussão o projecto de lei n.° 37, subsidio aos lyceus de Ponte de Lima e Povoa de Varzim.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 37

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscrição. Vae ler-se o artigo 1.° para se votar.

O Sr. Zeferino Candido: - Peço a palavra para invocar o regimento.

O Sr. Presidente: - Vae votar-se primeiro o artigo 1.° do projecto e depois concederei a palavra a S. Exa. É lido e approvado o artigo 1.°

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Zeferino Candido.

O Sr. Zeferino Candido: - Agora já de nada serve V. Exa. conceder-me a palavra, porque, sé a pedi, era para requerer a contagem, a fim de se não poder fazer a votação do artigo 1.° Mas o regimento desta casa não serve para nada. Desisto, pois, da palavra.

O Sr. Presidente: - Falta ainda votar o artigo 2.° É lido na mesa o requerimento do Sr. Zeferino Candido.

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á contagem.

(Pausa).

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O Sr. Presidente: - Estando presentes sessenta Srs. Deputados, continua a sessão, e vae entrar em discussão o artigo immediato.

É lido na mesa.

O Sr. João de Menezes: - Declara que não o surprehendeu o que acaba de se passar.

Os que se oppõem a estes projecticulos são dois ou tres.

Lá fora, nos corredores, são todos, e até chegam a felicitar os que se oppõem á sua discussão, mas na Camara, em nome da disciplina partidaria, do caciquismo, de todos os interesses politicos, que prevalecem sobre os interesses do país, votam de maneira contraria.

É inutil o seu protesto e já está convencido que são inuteis todos os protestos de quem quiser conservar-se dentro de uma linha de correcção e serenidade, pois parece que tomam essa serenidade como cobardia. Enganam-se, porem.

Convencido de que não bastam palavras, protestos serenos, uma perfeita linha de correcção parlamentar, daqui por deante recorrerá à todas as violencias, mesmo as materiaes, importando-se pouco que o accusem de quebrar carteiras, de ser perturbador da ordem.

Já que as palavras não servem para nada será um obstruccionista, pois só assim poderá evitar que se esteja a deitar dinheiro pela janella fora.

E o que é mais vergonhoso ainda é que este projecto appareça á discussão quando de madrugada os Deputados eram despertados em sua casa para lhes ser entregue o projecto em que o Governo se autoriza a emittir obrigações para cobrir o déficit.

Votem o projecto, mas fique a responsabilidade exclusiva aos partidos monarchicos, que assim malbaratam os dinheiros publicos.

Quando hontem combateu o subsidio aos lyceus da Povoa do Varzim e Ponte do Lima não fez uma excepção; tem combatido e combaterá sempre os subsidios a estes pequenos lyceus, entendendo mesmo que algum d'elles devem, ser supprimidos, desde que se prova que a sua frequencia não compensa o sacrificio que se faz com a sua sustentação.

E o amor pela instrucção que leva a Camara a votar estes projecticulos? Não é, são os interesses politicos locaes.

Em Portugal do que se necessita não é destes pequenos lyceus que absorvem bastante dinheiro e que muito pouco produzem; o que é necessario é cuidar a serio da reforma da instrucção primaria e da secundaria.

Em França quando se quis fazer a reforma da instrucção secundaria tratou-se primeiro de saber o que pensavam a respeito desse regime de instrucção os professores, os paes dos alumnos e até alguns aluamos dos mais distinctos. Fez-se um inquerito, que é um documento notabilissimo, um inquerito que não foi inspirado pelo espirito de sectarismo e em que todos foram ouvidos, desde os livres pensadores até os ultramontanos. Esse inquerito forma cinco volumes, que são um verdadeiro monumento.

Em Portugal, entende elle, orador, é necessario proceder da mesma forma e porque assim entende manda para a mesa uma proposta e um requerimento.

Essa proposta, deve declará-lo, não tem intuitos politicos, não é uma armadilha feita á Camara, é um proposta honesta e que de ha muito já devia ter sido feita.

O requerimento e a proposta são os seguintes:

Proposta

Proponho a constituição de uma commissão parlamentar na qual estejam representados todos os partidos e agrupamentos politicos desta Camara, tendo por fim proceder a um inquerito ácerca do ensino primario e secundario, e devendo dar conta dos seus trabalhos em relatorio que possa servir de base, pelas informações colhidas, á reforma d'aquelles dois ramos de serviço. = João de Menezes.

Requerimento

Requeiro a V. Exa. a urgencia da discussão da minha proposta e requeiro a dispensa do regimento. = João de Menezes.

Approvado o requerimento., entrou a proposta em discussão, abrindo-se para tila inscrição especial.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta do Sr. João de Menezes.

Leu-se na mesa, sendo admittida.

O Sr. Presidente: - Sobre esta proposta, mandou o Sr. João de Menezes um requerimento pedindo a urgencia da sua discussão.

Vou consultar a Camara.

Consultada a Camara foi approvada a urgencia requerida, entrando immediatamente em discussão a proposta mencionada.

O Sr. Arthur Montenegro: - Sr. Presidente: em meu nome pessoal tenho a dizer a V. Exa. que voto contra essa proposta (Apoiados da direita), primeiro por que não acredito nada na efficacia d'ella, segundo porque acho que nas estações officiaes ha elementos para se fazer as reformas que precisam de ser feitas.

Julgo, por conseguinte, desnecessaria a votação dessa proposta.

Comprehende V. Exa. que a sua discussão immediata me surprehendeu.

Então, votei contra a sua urgencia, porque entendi que uma proposta do alcance desta devia percorrer os tramites regimentaes, sendo lida pela segunda vez na sessão seguinte e enviada, depois, ás commissões respectivas.

Assim se não fez.

Tambem tenho a dizer que o meu voto é pessoal, porque não representa, agora, a opinião do partido progressista.

Portanto, repito, eu voto pessoalmente contra o inquerito, porque ine parece que, sobre tal assunto, se devia proceder mais demoradamente, não requerendo a urgencia da proposta e permittindo que ella ficasse para segunda leitura.

Disse.

(O orador não reviu).

O Sr. Abel de Andrade: - Sr. Presidente: primeiro que tudo, tenho a declarar que considero muito o parecer do Sr. Conselheiro Arthur Montenegro, que é sempre respeitado (Apoiados) e que, portanto, nas considerações que vou fazer nada ha que possa invalidar o seu voto, que representa a opinião de um alto espirito acostumado a versar com muita proficiencia estas questões, porque pertence a uma corporação a que tenho a honra de tambem pertencer.

Entretanto, Sr. Presidente, eu direi que divirjo absolutamente do modo de pensar de S. Exa. e que dou incondicionalmente o meu voto a essa proposta pelas razões que vou dizer.

Bastará citar o exemplo da França, desse país latino como o nosso, que conseguiu sair do miseravel regime da instrucção secundaria, muito peor do que o nosso, por meio de um inquerito que fez e que é a base do seu regime actual.

Por este inquerito, a Franca ouviu as opiniões dos competentes, dos hygienistas e medicos, dos directores de collegios, dos estudantes distinctos - individuos de todas as religiões é de todos os partidos.

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A sciencia allemã que tem um certo desprezo pela pedagogia francesa, considera, porem, uma obra como um monumento que é citado com respeito e que é o inquerito francês.

A França conseguiu d'ahi por deante publicar um regulamento de instrucção puramente nacional, embora se baseie no que ha de mais essencial no regime allemão, que é o systema de classes que já existia na escola dos Padres Gouveia.

Eu creio, Sr. Presidente, que a critica que em Portugal se faz ao nosso regime de instrucção se baseia apenas na falta de preparação.

Não quero, Sr. Presidente, no momento actual estar a cansar a Guinara, mas o que é verdade é que quem lançou as bases essenciaes da nossa instrucção publicou um livro, uma verdadeira obra util nesse sentido, e foi o autor da lei da organização da nossa instrucção. O autor dessa lei foi Jayme Moniz.

A esse verdadeiro homem de talento devemos um regime sábio de instrucção em Portugal.

Esse regime tem tambem defeitos, unico meio pelo qual o seu autor podia chegar á melhor adaptação do ensino e fazer assim uma obra completa.

Eu nesta discussão sou insuspeito.

Já tive a honra de ser director geral de instrucção publica em 1905 e por isso tive occasião de observar que a reforma da instrucção secundaria era uma reforma exotica, porque, Sr. Presidente, se devia só attender a um outro defeito que porventura tivesse o regime em vigor.

Todos sabem a maneira como procedeu o director geral de instrucção publica e o Ministro do Reino dessa época.

Desejava-se um inquerito um tanto apertado, é verdade, mas era um inquerito que se podia fazer, que se podia realizar.

Essa proposta de inquerito, que podia ser uma verdadeira obra nacional, devia ser apreciada peio Parlamento, que se devia impor.

Foram ouvidos os professores mais distinctos dos lyceus, e as mais altas individualidades de ensino, os directores de varios estabelecimentos de ensino, não só publicos mas até particulares.

Era, Sr. Presidente, fazer tudo o que se podia fazer.

Mas, Sr. Presidente, no momento actual, faz-se proposta de inquerito, que a meu ver não pode ser mal recebida, porque o inquerito que se propõe não é um inquerito de syndicancia, é um inquerito para averiguações do que se passa.

Para a instituição do regime vigente fizeram-se sem duvida trabalhos muito importantes na Direcção Geral de Instrucção Publica.

Uma individualidade muito distincta pode assim, arranjar e organizar uma escola pedagogista: Jayme Moniz, que era nesse tempo o unico pedagogista que havia e com qualidades individuaes para o fazer. Por isso, Sr. Presidente, esse homem veio fazer uma verdadeira obra.

Eu não tenho competencia para dar um conselho ao Governo, mas entendo que &e o chefe do Governo acceitasse a proposta que está na discussão, prestaria assim um dos mais importantes serviços ao país.

Se Portugal necessita de uma reforma de ensino, faça-se, mas de uma forma cabal!

Na propria Allemanha, na propria Suissa e na propria Italia faz-se o inquerito dia a dia.

Nós podemos fazê-lo?

Não, porque não temos revistas de ensino: as revistas de ensino que apparecem defendem interesses, não defendem ideias.

Não temos relatorios de ensino, não temos estatisticas que se começam agora a fazer, os documentos que existem são em numero muitissimo limitado, pouco extensos, pouco completos e que não podem servir de base para uma reforma desta ordem.

Se ha nação que necessite de uma base desta ordem é Portugal, porque é a nação em que ha menos revistas de ensino na especialidade.

Não ha nação alguma, por mais limitado que seja o seu ensino, em que não se encontre em cada ramo de ensino, não uma revista, mas dezenas de revistas.
Ainda hoje recebi uma revista O Gymnasio de Humanidades da Allemanha, em que apparece tudo quanto se passa nos conselhos de ensino.

O que temos nós?

Absolutamente nada.

Portanto, voto a proposta do Sr. João de Menezes, mas lamento apenas que, pelo prestigio das instituições a que pertenço, a proposta não tivesse sido apresentada por este lado da Camara.

Os meus collegas da commissão do bill sabem que eu assim pensava.

Quando começaram os trabalhos dessa commissão defendi essa ideia e disse que o unico meio era annullar todos os decretos de ditadura sobre instrucção e proceder-se a um inquerito em que entrassem todos os partidos representados na Camara.

Portanto, voto a proposta e ficarei muito satisfeito se o Sr. Ministro do Reino, acceitando uma proposta verdadeiramente nacional, der uma satisfação efficaz, energica e decisiva a uma das grandes reclamações nacionaes.

Tenho dito.

(O orador não reviu).

O Sr. Rodrigues Nogueira: - Sr. Presidente: pedi a palavra nesta discussão, não porque seja contra o inquerito do ensino no nosso país, mas simplesmente contra a forma por que se propõe esse inquerito.

Propõe-se que se faça um inquerito á instrucção primaria e secundaria; mas o que é certo é que no país essa instrucção, na generalidade dos casos, serve de preparação para os cursos superiores ou cursos especiaes.

Pergunto: como posso preparar um individuo para uma cousa que desconheço?
O resultado é que muitas vezes os alumnos podiam ir melhor preparados, num determinado sentido, mas seguem uma carreira para a qual lhes falta por vezes uma conveniente preparação.

Tem-me acontecido, na pratica de professor, encontrar estudantes intelligentes, a quem falta uma parte aa preparação essencial para a vida que querem seguir.

Emquanto não fizermos no país uma remodelação do ensino superior, e mais uma vez repito o que disse, que nos temos uma universidade que não é universidade, porque é polytechnica de mais para ser universidade; emquanto não fixarmos o nosso ensino profissional superior e, por consequencia, partir depois d'ahi para a organização do ensino médio, do ensino secundario e superior, não poderemos ter uma boa organização do ensino.

O Sr. Abel Andrade: - No meu modo de pensar não tenho duvida em acceitar a indicação de S. Ex.a, que é estender o inquerito ao ensino superior.

O Orador: - Comove que nós poderemos apresentar uma remodelação do ensino primario e secundario para preparar um individuo sem sabermos o que elle pretende attingir?

Reputo essencial e indispensavel que todo o ensino superior, e especialmente o ensino technico superior, abrangendo mesmo as sciencias juridicas, que são muito deficientes, se fixe nesse objectivo e se desça d'ahi depois para fazer uma remodelação do ensino primario, secundario e medio.

Portanto, não voto contra o inquerito, mas acho que a proposta do Sr. João de Menezes, para dar um resultado

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completo e proficuo, só pode ter em vista a generalidade do ensino.

(O orador não reviu).

O Sr. Queiroz Vellozo: - Sr. Presidente : vou dizer muito poucas palavras, porque creio, para honra da Camara, que ella não deixará de acceitar a proposta do Sr. João de Menezes e que não precisa das minhas considerações para a acceitar.

No entanto, sempre quero dizer duas palavras para mostrar que na proposta de inquerito do Sr. João de Menezes não pode haver, nem ha, qualquer intuito de ordem politica (Apoiados), mas apenas visa a instrucção nacional.

Já os Srs. Abel Andrade e João de Menezes citaram esse verdadeiro monumento -levantado ao ensino secundario, que é o inquerito presidido por esse grande principe do ensino francês.

Todos sabem que a França era um dos países que mais deficiente tinha o ensino secundario e que elle só começou a ser uma cousa seria depois desse inquerito. (Apoiados).

Mas não é só nesse país que se fez esse inquerito; teem se feito em todos os países do mundo, dirigidos sempre pelo Parlamento, e todavia, esses inqueritos não teem, nem podiam ter de modo algum, caracter politico.

O inquerito feito em França, que começou em 1889 e terminou em 1902, foi um inquerito em que entraram todos os professores de todos os graus de ensino, todos os grandes escritores, todos os directores dos grandes collegios.

Na Inglaterra fizeram-se quatro inqueritos parlamentares ao ensino primario e secundario, e ainda ultimamente o inquerito feito ao ensino primario e secundario serviu de base á reforma do ensino.

Nos Estados Unidos da America do Norte a reforma do ensino secundario, resolvida por occasião da exposição de Chicago, foi incumbida a uma commissão que procedeu a dez inqueritos, por todo o país da America do Norte, os quaes serviram de base para a sua reforma do ensino secundario. (Apoiados).

É incontestavel que o nosso, ensino secundario, depois da reforma de 1895, tem progredido consideravelmente, e, por maiores que sejam as criticas a essa reforma, ella constitue um verdadeiro monumento que muito honra o trabalho feito pelo Sr. Jayme Moniz. Foi elle quem introduziu a verdadeira orientação moderna no ensino. Deve-se-lhe este louvor que é absolutamente justo. (Apoiados). Isto não quer dizer que o ensino secundario, primario e superior não precise de uma larga reforma, fazendo-o obedecer ás normas que hoje regem o ensino em "todos os seus graus, e que seja ao mesmo tempo uma reforma de ensino verdadeiramente nacional. E esse o caracter que deve ter.

O inquerito não é apenas dirigido ás repartições publicas ou aos funccionarios dos differentes estabelecimentos de ensino. Devem collaborar n'elle os professores de todos os graus de ensino, todos os homens de estudo, todos os grandes escritores portugueses, todos os directores de collegios, e até os proprios estudantes que teem tido boa classificação, emfim, todos que possam contribur para esclarecer este assunto. (Apoiados).

Declaro que não tenho duvida nenhuma em auceitar o additamento do Sr. Rodrigues Nogueira, a fim de que o inquerito não seja só para a reforma do ensino primario e secundario, mas tambem para o ensino superior (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Costa Lobo: - É de parecer que não se pode fazer uma reforma do ensino primario, secundario e médio, sem pensar ao mesmo tempo na modificação de todos os outros ramos de instrucção; e o projecto que numa das sessões passadas teve a honra de apresentar visa, unicamente, a melhorar a instrucção.

Ao pedir a palavra inscreveu se contra, não porque seja adverso a qualquer modificação que se pretenda introduzir no ensino, mas porque não comprehende a necessidade da nomeação de uma commissão especial.

Está nomeada, pela Camara, uma commissão de instrucção primaria e secundaria, a qual tem o direito de aggregar a si todos os membros que julgar conveniente. Ora, se já existe essa commissão eleita pela Camara, nas condições que elle, orador, acaba de apontar, satisfeitos estão os intuitos da proposta do Sr. João de Menezes.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Sr. Presidente: duas palavras apenas por que nem será preciso mais nesta altura da discussão. (Apoiados).

O partido progressista dissidente apoia em absoluto e com a maior sympathia a proposta de inquerito enviada para a mesa pelo Sr. Deputado João de Menezes.

Desnecessario é provar a V. Exa., ou á Camara, que a mera questão de forma que acaba de ser levantada não tem o minimo fundamento (Apoiados) para poder invalidar essa. (Apoiados prolongados).

Todos sabem que, em circunstancias especiaes como aquellas em que incontestavelmente se encontra a nossa instrucção, foram sempre nomeadas commissões para tratarem deste assunto e sobre elle procederem aos inqueritos que fossem necessarios.

Nesta questão, a commissão eleita aqui pela Camara para os assuntos de instrucção primaria e secundaria versa esses assuntos de um modo geral; e aquella a que se refere a proposta tem unicamente em vista estabelecer as bases indispensaveis para se proceder ás reformas, que todos reconhecem precisas, quer da instrucção primaria, quer da secundaria e ainda da superior. (Apoiados prolongados) .

Eu apoio a conveniencia de se estender esse inquerito á instrucção technica especial (Apoiados), e creio não ser indiscreto declarando a V. Exa. e á Camara que o autor da proposta acceita essa ampliação.

O Sr. João de Menezes: - Sim senhor.

O Orador: - Assim, S. Exa. não tem a menor duvida pela sua parte, e creio que tambem a Camara, em tornar extensivo aos outros ramos da instrucção o inquerito proposto.

Sr. Presidente: limito por aqui as minhas considerações por que não desejo tomar tempo á Camara, mas devo fazer notar que é da maior necessidade que se olhe a serio para os assuntos de instrucção, e, sem duvida, a commissão que sair desta Camara, escolhida em todos os partidos, poderá prestar ao país serviços de altissimo valor e que ha muito tempo se veem reclamando.

Tenho dito. (Vozes: - Muito bem, muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Alexandre Albuquerque: - Sr. Presidente: eu voto a proposta de inquerito, não que confie muito em inqueritos em Portugal, mas porque não desejo que alguem diga, em questões de instrucção, que por minha causa não se deu no nosso país um passo.

Voto a proposta do Sr. João de Menezes, com o additamento do Sr. Rodrigues Nogueira, tanto mais que ha muito tempo se grita contra a instrucção em Portugal.

Todos os partidos attribuem a decadencia do país á falta de instrucção.

N'estas circunstancias não podemos deixar de fazer tudo o que seja possivel a fim de collocar o nosso país ao lado das nações mais cultas.

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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Eu entendo ainda; Sr. Presidente, que o inquerito não pode ficar limitado á instrucção primaria; deve ir tambem á instrucção secundaria. (Apoiados).

Temos de fazer um rigoroso inquerito, não para inglês ver não é mais rigoroso que seja possivel, que substitua até as estatisticas, (Apoiados).

Faço minhas a§ palavras do Sr. Queiroz Velloso, quando S. Exa. disse que, numa questão como esta, não ha nem pôde haver politica. (Apoiados).

Sr. Presidente: a verdade é que sé torna preciso saber onde e em que pontos se pode substituir a educação que tem sido ministrada, pela educação profissional.

Precisamos fazer o estudo technico, no campo pratico; e, para isso, deve proceder-se a um inquerito, que faça uma remodelação completa no nosso ensino, devendo começar se pelas escolas superiores, indo depois ás escolas secundarias e por fim ás escolas primarias.

Nestas circunstancias apoio a proposta do Sr. João de Menezes com o additamento do Sr. Rodrigues Nogueira.

Tenho dito. (Vozes: - Muito bem, muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o additamento mandado para a mesa pelo Sr. Queiroz Ribeiro. Leu-se e foi admittido.

O Sr. Arthur Montenegro: - Sr. Presidente: não quero demorar este debate, e começo por dizei- a V. Exa. que desejo que a instrucção do meu país progrida, e praticamente tenho lhe dado do meu esforço o pouco que elle vale, mas muito dedicadamente.

Se suppusesse que do inquerito viria alguma vantagem, alguma cousa boa, se entendesse que do inquerito viriam luzes dos professores entendidos e conhecedores que illustrassem essa obra, eu daria o apoio, mas não lho daria numa discussão urgente, mas numa collaboração de todos os partidos, e quando esses partidos tivessem ponderado detidamente os termos em que se pede o inquerito, porque o inquerito que a Camara vae votar é tudo e não é nada.

O inquerito não dará nada, porque as reorganizações de ensino são trabalhos muito meticulosos e até muito technicos para sairem de uma commissão composta de partidos politicos, e, na ordem de ideias por mim apresentadas, esses resultados ficariam muito mais determinados, mais precisados, e muito mais proveitosos do que vão ser.

O illustre Deputado o Sr. João de Menezes, autor desta proposta que discutimos, deu o proprio exemplo quando ha poucos dias numa questão mais limitada apresentou uma proposta não para um inquerito mas para a nomeação de uma commissão que organizasse um projecto de reforma eleitoral.

E é neste momento, quando se discute a importantissima questão do orçamento, que exclusivamente devia prender a attenção dos representantes dá nação, que apparece um projecto desta ordem e tem. de discutir-se um projecto que a ninguem devia lembrar.

O meu desejo é que isso não vá reflectir-se nos trabalhos da commissão de inquerito, não permittindo que esses trabalhos sigam com á mais rigorosa ordem e impedindo ao mesmo tempo que os membros da commissão tenham tempo de pensar maduramente nos graves problemas que vão, ser submettidos ao seu exame.

É por isso que a minha opinião era de que a discussão dessa proposta merece ser feita nos termos regimentaes, porque estes termos devem servir como bases da discussão é são uma garantia para todos, ainda mais para as minorias do que para as maiorias. Os termos regimentaes devem ser respeitados perante um assunto que merece ponderação e Deus nos livre que esses termos não fossem respeitados. A maior parte das vezes encontrar-nos-hiamos então em grandes difficuldades para podermos apreciar uma determinada medida apresentada ao Parlamento.

Sr. Presidente: algumas palavras ouvi eu proferir nesta Camara pelo meu illustre collega Sr. Abel Andrade, ás quaes eu não quero deixar de me associar, não só porque nessa associação vae todo o impulso do meu coração, mas ainda porque eu quero dar-lhe toda a minha adhesão de justiça.

Quero referir-me ás nobres palavras que S. Ex;a aqui proferiu com respeito ao reconhecimento que pelo país é devido ao Conselheiro Jaime Moniz, esse trabalhador indefesso e incansavel da instrucção, que em 1895 deu ao país desinteressadamente o melhor da sua energia dos seus esforços e da sua sciencia. O nosso regime de instrucção secundaria passou a ficar em bases solidas e uteis, moldadas em formas mais ou menos avançadas.

A principal vantagem que dessa reforma veio ao ensino foi a organização por classes, que permitia ao alumno que aprenda bem a materia de um determinado ramo de instrucção. O regime de organização por classes tem uma relação e influencia efficaz, successivamente, porque durante sete annos não deixa porventura de ter um movimento regular e conduz melhor o espirito de maneira a poder fixar e comprehender com mais facilidade o estudo das differentes materias, porque o ensino de um anno para o outro tem uma ligação intima que faz aproveitar melhor o tempo aos alumuos, que desta maneira aproveitam numas é noutras cadeiras.

Este regime faz com que o estudante de uma determinada cadeira fique com a noção de que todas as doutrinas que aprendeu não são inuteis e que todas ellas constituem um conjunto que é necessario e que assim devia ser a sua instrucção, que tem um valor proprio como sciencia adquirida, que tem um valor absoluto e relativo como preparação para os cursos superiores.

Essa concatenação completa das disciplinas foi frisada na reforma de 1890, de uma maneira accentuada, e que constitue um manifesto progresso sobre as organizações antecedentes, que apresentavam os estudos espalhados, sem se saber a razão de ser, o porque, ou a que vinham essas disciplinas, quando muitas d'ellas, e acima de tudo, o latim, constituia, por assim dizer, uma refinadissima maçada, que não servia para cousa alguma.

Com effeito, nunca se ensinava á necessidade da aprendizagem d'aquella lingua morta, não havendo, portanto senão uma sobrecarga intellectual.

Ora, com tudo isto acabou a reforma de 1890;

Mas dizia eu: todos estes grandes beneficies que vieram á instrucção foram provenientes de uma reforma moldada em bases, que uns acceitaram e outros não, mas que foram rigorosamente defendidas.

Admiro-me que, tendo nos uma reforma de instrucção secundaria baseada em moldes incontestavelmente semelhantes ao que se faz nos países civilizados, não só na Allemanha, mas em outros países que teem bem organizados os serviços de instrucção primaria é secundaria, tendo essa reforma sido redigida por um homem tão particularmente competente, como foi o autor dessa reforma, e por consequencia a sua competencia dava garantia de que essa reforma se aproximaria do que em toda a parte se faz ácerca do problema da instrucção secundaria, nos queiramos já alterar essa reforma.

Entendo eu que, tendo nos uma reforma feita nestas circunstancias, a Camara não deveria votar um inquerito á instrucção secundaria sem ter visto se essa reforma daria bons resultados, porque a verdade é que grande parte do alcance que poderia ter a reforma de 1895, ainda não está conhecida, porque essa reforma ainda não foi completamente executada. Apesar da boa vontade de todas as pessoas que no assunto interveem, nunca pode ser executada com tal rigor, que se pudesse aquilatar bem dos remedios que essa organização carece, e ver quaes são os remedios

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que carece uma legislação vigente é o primeiro ponto para reformar uma organização.

Este systema é quasi sempre o principal defeito das reformas em Portugal.

Poucos países ha que tenham reformas de legislação tão frequentes como o nosso. Poucos países teem tantos volumes publicados de legislação como o nosso. (Apoiados).

Poucos países teem visto vinculados nas suas leis principios tão exactos, tão rigorosamente scientificos, tão a par do que mais modernamente se pensa nos países civilizados do que Portugal.

Mas na pratica tem havido os maiores defeitos.

A primeira necessidade que nos temos é um ponto de partida.

Emquanto este for o systema de legislar e de administrar nos não só não teremos nenhuma administração sequer, moldada em bases seguras, mas não estamos sequer habilitados a fazer nenhuma reforma porque não sabemos onde estão os defeitos.

Sr. Presidente: muitos dos meus collegas que são partidarios do inquerito a que se vae proceder entendem naturalmente que desse inquerito hão de resultar grandes cousas para a reforma que se vae iniciar.

Não tivemos ainda, que eu conheça, um inquerito como este que se vae executar, se a Camara o approvar, mas já tivemos um inquerito preciso, já se inquiriu muito do que pensavam os interessados a respeito da reforma de ensino, principalmente da reforma de instruccão secundaria.

Ha annos, e não ha muitos, um jornal da capital o Diario de Noticias propagou muito a necessidade de se reformar a instrucção secundaria. Não me lembro já bem se foi da iniciativa do jornal, se foi da iniciativa espontanea dos interessados que se celebraram varias reuniões chamadas reuniões de pães de familia. Propuseram se varios alvitres que foram reduzidos a escrita e levados ao conhecimento do Governo.

N'essas reuniões, como não eram á porta fechada, falou quem quis e quem entendeu dever dizer da sua justiça.

Disseram muitos pães de familia o que entendiam e esses alvitres foram apresentados ao Governo, que os considerou e ouviu naturalmente sobre elles as estações officiaes, que escudaram e disseram, ácerca d'elles, da sua justiça.

Do estudo da representação que foi feita em 1905 pelos pães de familia e de outros trabalhos semelhantes e da opinião dos directores do pessoal da secretaria e d opinião do Ministro, saiu uma reforma para o nosso ensino que foi uma reforma, vinda a titulo de provisoria, mas que, em todo o caso, procurava remediar, em grande parte, os defeitos que se encontravam n'aquella reforma.

O que eu vi é que os paes de familia o que principalmente pretendiam eram as taes facilidades para a aprendizagem, mas que não estavam de acordo com as necessidades do país.

A instrucção para ser digna deste nome e para ser proveitosa, de maneira a dar ao alumno um conhecimento médio de todas as sciencias e para o preparar para a instrucção superior, não pode deixar de ser, e cada vez mais a instrucção secundaria.

Quem deixar os alumnos da instrucção secundaria desconhecedores das grandes descobertas que a sciencia faz todos os dias nos diversos ramos em que se divide, evidentemente não presta a esses alumnos uma instrucção adequada para o ensino superior, nem proveitosa para a preparação do ensino medio.

A este ponto me acode á ideia um dos problemas q u tem levantado maior numero de reclamações, por parte dos interessados, e para o qual porventura seria chamada a attenção da commissão de inquerito, se tivesse bem determinado o assunto especial do seu trabalho.

Sr. Presidente: tem-se falado muito na questão dos prograramas.

Não digo que os programmas não sejam sempre susceptiveis de perfeição, mas a questão dos programmas é uma questão muito relativa e a maior parte das vezes um programma pode ser muito grande, mas reduzido na sua execução.

Um programma pode ser muito desenvolvido, é, todavia, não ser o que se chama um programma grande, é, pelo contrario, um programma muito resumido pode ser um programma muito grande, se o professor o desenvolver.

Lamento ter de falar tanto, mas desejaria falar ainda mais, se tivesse vindo com uma certa preparação, o que não pude, por não esperar a discussão d'este projecto; mas o que não estou disposto é a falar na ausencia doe meus collegas, que votaram a urgencia do projecto é sairam da sala aborrecidos.

(Pausa).

Fiz uma solicitação e espero o deferimento: ou não há numero para a Camara funccionar, ou ha, e então não estou disposto a falar na ausencia dos meus collegas que votaram a urgencia do projecto, para em seguida abandonarem a sala.

(Pausa).

Procede-se á contagem.

O Sr. Presidente: - Estão na sala 52 Srs. Deputados. Continua a sessão.

O Orador: - Ha um equivoco.

Não tinha pedido a contagem do numero de Srs. Deputados presentes.

O Sr. Presidente: - Não estava na sala, e, ao chegar, os Srs. Secretarios estavam procedendo á contagem, e por isso suppus que V. Exa. tinha perguntado quantos Srs. Deputados estavam na sala.

O Orador: - Não tinha o intuito de ser impertinente para a Camara, e a minha observação foi que não estava disposto a falar para uma Camara que estava absolutamente deserta.

Era perfeitamente justificada pela minha palavra que a Camara estivesse absolutamente só.

O Sr. Brito Camacho: - Não é pela palavra de V. Exa., mas pelo proposito.

O Orador: - Eu não tenho proposito nenhum, tenho estado a discutir um inquerito, um assunto muito importante, e, desculpe-me V. Exa. a immodestia, tenho a pretensão de pensar que cruo que não tenho estado á dizer cousas inuteis. (Apoiados).

Se este assunto tivesse vindo na hora propria, se este assunto não tivesse vindo no meio de um projecto com-pletamente estranho á materia, é natural que este assunto fosse muito mais ventilado do que é. Trata-se de um inquerito sem nenhuma orientação definida, a não ser a orientação que lhe ha de dar a competencia das pessoas que fizerem parte da commissão.

A Camara sabe-o muito bem, porque é muito illustrada mas não sé diz no sentido em que há de ser orientado; trata-se da instrucção secundaria, superior e especial e mais nada.

Acredite V. Exa., Sr. Camacho, que eu tenho estado a falar sem nenhuma intenção de encher tempo. Talvez a Camara se tenha enfastiado do que eu tenho dito, mas falo como eu entendo que é o interesse geral, importando-me pouco com que o que digo agrade ou desagrade.

Não estou a falar para encher tempo, envergonhar-me-hia de o fazer.

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Não é agora, quando já sou, não direi velho, porque tenho empenho na minha mocidade, mas quando já sou antigo nesta casa, quando tenho entrado em tantos debates e tenho tido tanta occasião de fazer politica, de encher tempo, que eu viria a proposito de um assunto desta ordem, encher tempo simplesmente com palavras, pois, muito pelo contrario, tenho bastante pena e a proposito d'este inquerito não poder dizer immediatamente, demoradamente o que penso ácerca d'elle, de não poder, com preparação de um estudo mais demorado, não elucidar a commissão, porque a commissão não precisava de muitas elucidações, não sei quaes os membros que a hão de compor, mas sejam quaes forem, sendo membros desta Camara, são pessoas muito illustradas, mas para poder definir o que seria a minha aspiração em cada um desses ramos da instrucção.

Desde que a Camara julgue necessario prejudicar a sua ordem do dia completa, do projecto dos lyceus e do orçamento, com a proposta de inquerito aos tres ramos de instrucção, pois achou o assunto de tal magnitude que decidiu a sua urgencia, eu tinha o direito de não approvar essa urgencia, porque tinha o direito de estudar o assunto, mas fui esmagado pela maioria que procedeu para commigo despoticamente, não me dando tempo para me preparar.

Depois disto e de eu estar a falar com manifesta fadiga e até doente, porque estou doente, quando falo por consequencia forçadamente, e sem o esperar.

A Camara que declarara urgente este assunto, porque o reconheceu de importancia, abandonava depois as suas cadeiras, mostrando um completo desinteresse, quando sabia que, desde que o considerara urgente, tinha de gastar com esse assunto o tempo que lhe dá o regimento.

Eu falei sobre esta questão, porque devia dizer o que pensava na minha situação official; não falei em nome do partido progressista, porque não houve o tempo indispensavel para o consultar.

Um assunto destes era muito grande para a commissão se poder desempenhar d'elle; isto era immenso e qualquer outra commissão que venha, segundo a propria forma de constituição da commissão de instrucção publica, tem de se fazer uma delimitação do inquerito.

Todos comprehendem, realmente, que um inquerito sobre instrucção primaria, secundaria e especial, sem se dizer mais nada, é uma cousa sem termos. Este assunto exige muito tempo para se tratar d'elle.

Para que servirá, pois, o inquerito; se ninguém saberá definir as attribuições da commissão que pretende nomear-se?

O Sr. João de Menezes (interrompendo): - Tambem ninguem sabia o que a commissão aos actos do ultimo rei nado tinha a fazer e nomearam-na.

O Orador: - Perdão! Estava lhe indicado o caminho a seguir...

O Sr. João de Menezes: - Tambem estavam indicados muitos caminhos a seguir e não se seguem...

O Sr. Presidente (para o Sr. Arthur Montenegro): - V. Exa. fala ha uma hora. Tem por consequencia mais um quarto de hora para terminar o seu discurso.

O Sr. João de Menezes (continuando): - Eu não proponho nenhum projecto de reforma da instrucção. Naturalmente quem fizer parte da commissão, ha de ficar com a responsabilidade dos seus actos.

Tanto os mais illustres como os menos...

O Orador: - Illustrados somos nós todos...

Não são os meus collegas que hão de dar ao inquerito o melhor do seu esforço e da sua intelligencia, creio mesmo na efficacia das commissões technicas, competentes para resolver os diversos assuntos.

(Interrupção do Sr. João de Menezes que não se ouviu).

O que vejo é que S. Exa. confia nos conselhos que hão de vir dos paes de familia.

V. Exa. sabe, Sr. Presidente, que ha um corpo technico de ensino, que se essa disposição estivesse em plena execução haveria um corpo composto de professores que podia muito bem propor uma reforma feita por technicos autorizados em a sua experiencia.

Circunstancias diversas impediram que se tivesse posto até agora em execução esse pensamento e essa disposição.

Como ainda ha pouco disse, fazem-se organizações de serviços que não se chegam a executar.

Apparecem defeitos, mas as organizações não se chegam a executar por completo.
As nossas organizações andam numa constante fluctuação.

A primeira cousa que deviamos fazer era executar completamente a nossa reforma de instrucção.

A reforma de 1895 nunca pode ser executada em todos os seus pontos, e o mesmo aconteceu á de 1905.

Não sabemos nada de positivo sobre ellas.

Apesar de tudo, eu devo dizer que a nossa instrucção, sem estar impecavel, não está tão mal como se diz.

Tenho algumas vezes ido a institutos de instrucção secundaria e tenho visto a competencia e dedicação com que os professores se dedicam ao ensino, lutando com muitas difficuldades é certo.

Tenho notado a differenca que ha entre essa instrucção e a que havia no meu tempo de estudante, e assim anseio que se vá tocar de mão leve na reforma da instrucção.

O que eu aproveitei no meu tempo da instrucção secundaria, e o que se aproveita hoje é muito differente.

Não pode todavia haver instrucção capaz, com os defeitos actuaes, como por exemplo os exames em outubro em que os alumnos se apresentam com uma completa falta de preparação.

Peço desculpa á Camara de lhe ter tomado tanto tempo assegurando que não o fiz com o proposito de protelar a discussão.

Podia tê-lo feito, mas não quis, lamentando unicamente que a Camara não me tivesse deixado entrar no debate com uma preparação que eu tinha o direito de exigir.

Tenho dito.

(Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. José Cabral: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda e da commissão de instrucção superior e especial sobre o projecto de lei n.° 31-A, que tem por fim extinguir à Escola Medico-Cirurgica do Funchal.

Foi mandado imprimir.

O Sr. Rodrigues Nogueira: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho para ser aggregado á commissão de obras publicas o Sr. Deputado Dr. Pereira de Lima. = A. E. Nogueira.

Foi approvada.

O Sr. Ascensão Guimarães: - Assim como o Sr. Arthur Montenegro, não deseja protelar o debate.

Vae simplesmente explicar o seu voto a favor do Sr. João de Menezes.

No anno passado, em 24 de agosto, apresentou elle, orador, uma proposta identica, dizendo que era indispen-

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savel nomear uma commissão, em que estava incluido o Sr. Dr. Arthur Montenegro, para fazer um inquerito ácerca da instrucção em Portugal, acrescentando que, se homens como o Sr. Dr. Montenegro, Moreira Junior e Bombarda, com a sua envergadura scientifica, nada fizessem, nada havia então a esperar.

Nestas circunstancias, não pode o seu voto deixar de ser favoravel á proposta do Sr. João de Menezes, com o additamento do Sr. Rodrigues Nogueira.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Rodrigues Nogueira: - Sr. Presidente: toda a gente sabe as boas relações de amizade que tenho com o Sr. Dr. Montenegro, assim como todos sabem a muita consideração que tenho pelo seu talento; mas, deixe-me S. Exa. dizer-lhe que é maior ainda a consideração que tenho pelo seu trabalho, porque intelligencias na nossa terra ha muitas, mas quem trabalhe ha pouco.

Nos temos maior deficit de trabalho na nossa terra do que temos de intelligencia.

(Interrupção de um deputado que se não ouviu).

Se é costume no seu partido dizer-se aquillo que se não pensa, eu não tenho esse costume.

O Sr. João de Menezes: - O Sr. Camacho falou em mentiras constitucionaes.

O Orador: - Eu não admitto duas mentiras.

O Sr. João de Menezes: - Eu nenhuma.

O Orador: - Um homem é só um. (Apoiados). Eu sou professor, sou Deputado, mas seja o que for, o que sou sempre é Rodrigues Nogueira.

Se em qualquer das manifestações da minha actividade, eu errei, quem é condemnado é o Rodrigues Nogueira.

O Sr. Brito Camacho: - Pois pode ser um mau Deputado e um bom professor, e um bom Deputado e um mau professor.

O Sr. Arthur Montenegro: - Quem veio fazer obstruccionismo foi S. Exa. com a sua proposta.

Vozes: - Ainda bem que se fez a proposta.

O Orador: - Se V. Exa. me deixasse proseguir, eu diria que não quis fazer obstruccionismo e que sou sincero em tudo que digo.

Disse o Sr. Montenegro que isto era um inquerito sem orientação. Ora, tendo eu generalizado esse inquerito, pareceu-me de toda a justiça defender-me. (Apoiados).

Quando eu tenho uma pessoa de familia doente, chamo o medico para a vir ver, e o medico só depois de estudar e perguntar é que forma o prognostico, e em seguida applica-lhe o tratamento adequado.

O que eu não tenho duvida em dizer é que o nosso ensino precisa de um inquerito, e eu vou citar um exemplo para confirmar a minha opinião.

Ha tres escolas que preparam para a Escola do Exercito. É a Academia Polytechnica do Porto, é Escola Po-lytechnica e a Universidade de Coimbra.

Pois para se poderem igualar os valores foi necessario estabelecer um certo coeficiente, isto só para a admissão.

O Sr. Abel Andrade: - Dá-se uma cousa parecida com o ingresso no professorado dos lyceus. O estudante que cursou a Universidade e que passou pela tangente pode ser professor sem concurso.

É ou não verdade que os estudantes da Universidade de Coimbra, só com 10 valores, passam pela tangente, podendo ser professores sem concurso? (Apoiados)

Hei de protestar em toda a parte contra isto. (Apoiados).

O Orador: - Ha cadeiras na Universidade em que os alumnos, se tiverem apenas 10 valores, não podem entrar na Escola do Exercito, e em outras podem passar com 10 valores.

O Sr. Arthur Montenegro: - Foi por causa disso que se propôs o inquerito...

O Orador: - Não digo isso. V. Exa. comprehende muito bem que o inquerito não é para isso.

V. Exa., apesar da sua grande illustração, e todos aquelles que, como V. Exa., se dedicam á instrucção, necessitam de materiaes para formar o seu conceito. Pela mesma razão para hoje se poder fazer uma revisão das pautas- aduaneiras é absolutamente necessario proceder-se a um inquerito ás diversas manifestações da actividade do país, a fim de ver até que ponto a nossa nacionalidade se integrou na civilização. (Apoiados).

Como é que certas industrias, que empregam o aço e o ferro, se podem desenvolver no nosso país, pagando estes mineraes 500 réis por kilogramma, segundo a pauta vigente? (Apoiados).

Portanto, precisamos de fazer um inquerito industrial, para com segurança nos podermos pronunciar e ficar com uma obra perfeita; (Apoiados).

Ora é necessario fazer-se uma remodelação no ensino da Universidade. A Escola do Exercito ainda chegam vestigios - permitia-se-me o termo - do ensino de outros tempos. Os alumnos deste estabelecimento nuns annos estudam muito optica e pouca electricidade, noutros muita electricidade e estudam pouco optica, de maneira que ao chegarem á Escola do Exercito uns sabem muita optica e não sabem electricidade, outros sabem electricidade e não sabem optica, quando hoje é indispensavel conhecer-se electricidade para todas as industrias. (Apoiados).

Ha ainda outros exemplos mais frisantes. Os alumnos que frequentam o curso de mecanica, pela Universidade de Coimbra, quando chegam á Escola do Exercito, no estudo das machinas, uns teem conhecimentos mais desenvolvidos de dynamica, outros, desconhecem por completo, ou quasi por completo, esta sciencia, etc.

Ora, pergunto eu, nestas circunstancias, impõe-se ou não o inquerito aos differentes ramos do ensino? (Apoiados). E o meu querido amigo e illustre correligionario Sr. Arthur Montenegro deve concordar com essa necessidade.

É claro que deve haver uma commissão especial para estudar a reforma da instrucção primaria, outra commisssão especial para estudar a reforma da instrucção secundaria e outra commissão especial para estudar o ensino superior. Estes tres graus de ensino constituirão o objecto de estudo de cada uma d'essas commissões parlamentares que dentro do seu ponto de vista, em relações mutuas umas com as outras, elaborarão uma reforma que faça cessar as anomalias a que acabo de referir-me.

Mas ha mais: V. Exa. sabe que actualmente ha uma grande tendencia para a especialização, porque se reconheceu que é humanamente impossivel, hoje estudar-se a engenharia toda. Eu vou citar a V. Exa. esta anomalia; na Escola do Exercito obrigam um alumno a estudar engenharia militar, engenharia civil e engenharia de minas. Eu admiro o trabalho violentissimo, intellectual e physico, que é indispensavel praticar para o alumno chegar ao fim do seu curso, mas chega extenuado e aquelle que não tiver a robustez precisa não o pode tirar. A grande intensidade de estudos que se deu durante muitos annos em uma determinada escola de França deu o seguinte resultado: é que os alumnos de ensino livre na vida pratica

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produziam melhores resultados do que aquelles que iam tão encombrés de premios e de valores que parecia ficavam afogados debaixo de tudo isso. Eu já mais de uma vez tenho visto; faz-se um programma, pensa-se em tudo, mas ás vezes esquecem-se de pensar nas, horas para o alumno comer; são pequenos detalhes que o legislador, mettido no seu gabinete, não pode attender.

O inquerito, tal como eu entendo que deve ser feito, não é um attentado, é perguntar ás differentes escolas o que é necessario e depois disso é que se faz o inquerito. Assim como para se construir um camiviho de ferro se vão yer as necessidades dos povos, assim se deve proceder com a instrucção, e exactamente para acabar com esses lyceus e em seu logar estabelecer institutos profissionaes onde 4pvam ser estabelecidos, porque o que é necessario é desenvolyer o mais possivel o ensino profissional no país.

Envio para a mesa a minha

Proposta

Proponho a constituição de uma commissão parlamentar, na qual estejam representados todos os partidos e agrupamentos politicos d'esta Camara, tendo por fim proceder a um inquerito ácerca do ensino primario, medio, superior e technico especial, e devendo dar conta dos seus trabalhos em relatorio que possa servir de base, pelas informações colhidas, á reforma d'aquelles ramos de ensino. = Abel Andrade = A. R. Nogueira.

Lida na mesa foi admittida e ficou em discussão com a materia.

(O orador não reviu).

O Sr. José Tavares: - Tendo uma opinião ácerca da proposta de inquerito, que parece extravagante, entendeu o seu dever não deixar de emittir a sua opinião sobre o assunto.

A sua opinião é contra o inquerito, e, no entanto, inscreveu-se a favor da proposta e votou até a sua urgencia.

É contra o inquerito, porque, sendo um inquerito, como não pode deixar de ser, apenas um pedido de informações ás classes mais interessadas, sabe que essas, respostas não hão de corresponder a verdade dos factos.

A faculdade pie direito tem sido a corporação mais atacada nos seus processos de ensino; e ainda hoje se diz que o ensino na faculdade de direito é retrogado e que os processos são archaicos. Quando se realizar este inquerito, as respostas hão de traduzir esta nota.

Generalizando, dirá que se as informações ácerca dos differentes ramos de ensino forem dadas com a sinceridade com que teem sido dadas as que dizem respeito á faculdade de direito, o inquerito, não pode deixar de ser falseado e não dará resultado algum;

Não pode, no entanto, deixar de reconhecer que os serviços de instrucção precisam de uma remodelação completa.

Pelas razões que acaba de apontar não podia deixar de approvar a proposta, embora, seja contra o inquerito.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas);

O Sr. Pereira de Lima: - Vota a proposta de inquerito á instrucção nacional feita pelo Sr. João de Menezes.

O seu voto, apresenta a sua opinião individual, porque em questões de instrucção, e de economia não ha disciplina partidaria nem partidarismo.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Wenceslau de Limaj: - Em materia de tanta valia como esta, não podia o Governo deixar que se votasse qualquer das propostas que foram apresentadas, sem assumir a responsabilidade do seu parecer e opinião.

Em nome do Governo, declara que, em principio, não é contrario ao inquerito proposto pelo Sr. João de Menezes e pelo Sr. Rodrigues Nogueira. Desde o momento em que a Camara resolva que se deve fazer um inquerito á instrucção publica do país, julga que mais conveniente; será que ella vote a proposta do Sr. Rodrigues Nogueira por ser mais completa.

Estimaria que essa proposta, a votar-se, tivesse já, por parte do Parlamento, uma definição mais precisa, porque receia que, em termos vagos, não de o resultado que seria de prever.

Se não emittiu já a opinião do Governo acerca d'esta questão, que é evidentemente aberta e em que os membros das diversas parcialidades politicas teem emittido o seu parecer pessoal por modo que até Deputados do mesmo partido teem sustentado opiniões diversas e oppostas, foi porque julgou que p Governo devia deixar correr serenamente a discussão, para não influir sobre a resolução que a Camara houvesse de tomar.

Feitas estas declarações e assegurando que, em principio, não é contrario ao inquerito proposto, a Camara resolverá como entender.

(O discurso será publicado na integra quando é orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta do Sr. João de Menezes.

O Sr. João de Menezes: - Peço a V. Exa. para consultar a Camara sobre se permitte que eu retire a minha proposta.

Consultada a Camara resolveu affirmativamente.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o additamento mandado para a mesa pelo Sr. Queiroz Ribeiro.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Peço a V. Exa. para consultar a Camara sobre se permitte que eu retire o meu additamento.

Consultada a Camara resolveu affirmativamente.

Foram lidas e approvadas as propostas dos Srs. Rodrigues Nogueira e Abel de Andrade.

O Sr. Abel de Andrade: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que a commissão seja constituida, por 17 Deputados nomeados, nos termos da proposta, pela Presidencia. = Abel Andrade.

Foi approvado.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o artigo 2.°

(Leu-se).

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Zeferino Candido: - Começa, mandando a mesa o seguinte

Additamento

Ao que lá está: "Fica revogada a legislação em contrario" acrescente-se "menos a resolução agora tomada de não serem votados por esta Camara n'esta sessão quaesquer projectos que aumentem as despesas do Estado. = Zeferino Candido.

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SESSÃO N.° 60 DE 7 DE SETEMBRO DE 1909 17

Quando se ia votar o artigo 1.° apresentou um requerimento que o Sr. Presidente, no seu alto saber e poder, entendeu não dever acceitar, nem mesmo quando elle, orador, fez a invocação do regimento.

O Sr. Presidente: - Quando se passava á ordem do dia, disse que estava esgotada a inscrição e se passava a votar o artigo 1.°, que o Sr. Secretario leu.

Nesta altura o Sr. Zeferino Candido pediu a palavra para um requerimento e elle, orador, inscreveu o para quando terminasse a votação. S. Exa. insistiu, dizendo que invocava o regimento para se fazer a contagem.

Entendeu não dever dar a palavra a S. Exa. para invocar o regimento, porque pedir para se fazer a contagem não é invocação do regimento.

Não houve da sua parte intuito de melindrar o illustre Deputado.

O Sr. Zeferino Candido: - Agradecendo as explicações do Sr. Presidente, contraria as suas considerações.

Tinha pedido a palavra para um requerimento porque o artigo 1.° era para elle, orador, um pouco monstruoso e queria que se evitasse a sua votação, para pedir explicações sobre o artigo 1.°

Confessa que se fosse o executor desta lei não sabia como a havia de executar; o artigo está redigido de tal forma que nada se percebe.

Na sessão legislativa passada votou-se um subsidio para o lyceu da Povoa do Varzim para o anno economico passado. Agora vem no projecto um subsidio ao mesmo lyceu, para sempre, para todos os annos. Para o anno vem outro projecto neste sentido; e dentro em pouco o lyceu da Povoa do Varzim virá a ser um lyceu que não tem bom ensino mas que, com certeza, é bem beneficiado pelo Estado.

Manda para a mesa um additamento ao artigo 2.°:

A commissão do orçamento do anno passado apresentou varias medidas tendentes a suspender o campanario durante a discussão do orçamento, de maneira que os projectos como o que agora se discute viessem no principio das sessões legislativas.

Este anno não succede assim e o regabofe tem sido muito maior. Deste modo, não se sabe o que se vae votar no orçamento.

Acha, pois, que deve ser approvado o seu additamento.

Foi admittida á discussão a proposta do Sr. Zeferino Candido.

Lê-se na mesa e é approvado o artigo 2.° do projecto.

É lido e rejeitado o additamento proposto pelo Sr. Zeferino Candido.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscrição. Vae ler-se para se votar o artigo 2.° Depois de lido foi approvado.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se para se votar o additamento do Sr. Zeferino Candido.

O Sr. Abel Andrade (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: é simplesmente para dizer que voto contra esse additamento, porque não sei se amanhã apparecerá uma proposta de aumento de despesa, mas de uma gravidade de tal ordem que eu não possa deixar de lhe dar o meu voto.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Como a hora vae adeantada, parece-me melhor dar por findos os trabalhos de hoje.

A proxima sessão é amanhã á mesma hora e com a mesma ordem do dia.

Está levantada a sessão.

Eram 6 horas e 45 minutos da tarde.

Documento enviado para a mesa nesta sessão

Representação

De diversos individuos e povo da ilha de S. Thomé, pedindo a maior observancia das leis e da constituição do país.

Apresentada pelo Sr. Deputado Brito Camacho e mandada publicar no "Diario do Governo".

O REDACTOR = Luiz de Moraes Carvalho.

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