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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Só por circumstancias especiaes elle subiu nos dois annos de 1876 e 1877, para logo depois baixar de novo; gosando nós do enorme vantagem n'aquelle paiz, não tirámos proveito d'ella.
E porque? Por uma rasão muito simples; os nossos vinhos não entram no mercado francez em condições de terem consumo. São caros, e nem sempre são bons, nem se conservam.
A verdade é que as nossas exportações do vinhos, que podem augmentar extraordinariamente, o espero em Deus que augmentem, por ora apresentam, relativamente á superficie do terreno proprio e ás condições facillimas do boa e abundante producção vinicola que temos, productos muito caros o em quantidade e qualidade inferiores ás exigencias do consumo externo.
Em 1876 o 1877 a nossa exportação do vinhos para França augmentou, como disse; mas de então para cá a tendencia tem sido para diminuir. Nós, como disse, produzimos muito caro. A primeira de todas as protecções para os nossos vinhos é o produzir barato. Alem d'isso, para que os nossos vinhos possam ser exportados, é necessario que se proceda no fabrico d'elles de maneira que não se estraguem nas viagens.
Para produzir barato, é preciso que os processos do cultura, como os da França, dêem mais abundante producto por superficie. As variedades de cepas, o tratamento destas, o amanho das terras, a occasião da vindima, emfim, mil circumstancias, que não é para aqui indicar, podem tornar mais barata a producção.
E qual é a condição para que se não estraguem os vinhos nas viagens? E que não se exportem senão depois de estarem feitos, e do estarem limpos. E preciso que passem o seu tempo de gestação nas vasilhas, ao abrigo das grandes variações do temperatura, e sendo constantemente limpos.
É assim que os vinhos de Bordéus, apesar de menos alcoólicos, conseguem não ficarem deteriorados pelas viagens.
Não se póde esperar que os pequenos productores possam fazer tão longa operação antes da venda. Para isto se alcançar seria preciso, ou que os proprios productores de cada circumscripção vinhateira podessem associar-se, formassem sociedades com um syndicato, e se encarregassem do preparo e venda dos seus vinhos, ou que houvesse capitalistas que, em logar de mandarem fabricar vinhos á Hespanha, se reunissem e applicassem o seu dinheiro a melhorar os vinhos nacionaes. Era rasoavel, era pratico, era lucrativo, o sobretudo era muito mais patriotico. (Apoiados.)
Não é só á exportação dos vinhos que se deve attender na apreciação do tratado com a França, o de suas consequencias.
Outros productos, importantes em relação á nossa industria agricola o ás nossas colonias, dão logar a uma exportação consideravel, tão consideravel, como a dos vinhos. O figo do Algarve, o café, a cera em rama, o olco de palma, ou sementes oleaginosas, etc, tem constante e valiosa exportação para França, desde que está em vigor o tratado.
Quando o vinho exportado subia a valores que annualmente oscillavam entre 27:000$000 réis e 60:000$000 réis, isto é, de 1865 a 1873 a exportação do figo subiu a réis 109:000$000 réis, a 112:000$000 réis, a 140:000$000 réis, a 175:000$000 réis em varios annos. Quando a exportação do vinho cresceu, nos ultimos quatro annos, diminuiu muito a do figo: foi a epocha calamitosa para o Algarve. Os annos das vaccas gordas para o vinho foram os annos das vaccas magras para o figo.
Fallo do vaccas magras o de vaccas gordas, porque é agora de uso fallar d'ellas no parlamento, cada vez que se trata de comparar a prosperidade com a miseria. Tambem o café tem tido, como o vinho, augmento de exportação nos ultimos annos, com excepção do anno passado.
Em 1866 a exportação do café foi do 90:000$000 réis, proximamente; baixou a 12:000$000 réis em 1870, mas em 1875 foi de mais de 360:000$000 réis; em 1876, de mais de 226:000$000 réis; em 1877, de quasi 300:000$000 réis.
A cera em rama é exportada n'um valor que, em muitos annos, tem excedido muito 100:000$000 réis; e já chegou, em 1876, a 363:000$000 réis. A exportação do olco de palma é tambem valiosa, e o mesmo se póde dizer das sementes oleaginosas.
É, pois, evidente que o tratado nos não interessa só por causa dos vinhos, como se procura fazer suppor. Interessa-nos muito mais pelas tarifas que se applicam a outros productos; interessa-nos por manter constantes, e sem grandes oscillações, as nossas relações commerciaes com a França.
Estas considerações, estes motivos me levaram a acceitar a proposta do governo francez.
Sinto que a prorogação não possa ir alem do ultimo de dezembro; mas tenho a bem fundada esperança do que alcançaremos outra prorogação, se chegarmos a negociar novo tratado, para que as relações commerciaes regulares se não interrompam até esse tratado estar votado pelas camaras, e haver sido ratificado.
O governo francez não póde deixar de fixar um termo unico, conforme a todos os tratados actualmente em vigor; a isso se obrigou perante o parlamento, a isso se comprometteu nos pactos que fez com diversas potencias.
É esta a causa, e não outra, de se fixar para termo da prorogação o ultimo dia de dezembro proximo. Mas o mesmo motivo que leva a França a prorogar o tratado, isto é, não perturbar as relações commerciaes entre os dois paizes, levará o governo d'aquelle paiz a concordar em nova prorogação até estar em vigor um novo tratado.
Repito o que ha pouco disse, e que parece ter deixado algumas duvidas no espirito do illustre deputado o sr. Pereira de Miranda.
Esta negociação, alterando n'um ponto essencial o tratado em vigor, tem de ser apresentada ao parlamento. Este tem do a julgar. Como a camara sabe, este acto internacional tem de ser julgado em sessão secreta; mas como eu não vejo inconveniente em que elle seja discutido em publico, por isso fiz estas considerações em resposta ao illustre deputado. Disso, me pareço, o que entendo indispensavel para esclarecer a camara e o publico. Ainda assim posso acrescentar que recommendei ao sr. Mendes Leal nosso ministro em Franca que, no caso de não poder obter melhores condições em, relação aos Vinhos, assignasse a convenção nas bases propostas. Ainda me pareço preciso explicar bem a idéa que preside á negociação.
Existe um tratado com a França, que termina em julho. A sua terminação brusca traria grande perturbação ao commercio. Na rainha opinião o que era mais para desejar era a prorogação do tratado até se negociar outro, se assim o julgassem os dois paizes necessario. Não póde a França acceder a esta idéa, propoz a prorogação até ao fim de dezembro, e a modificação da tarifa dos vinhos, para a igualar á tarifa da nação mais favorecida: hoje da Hespanha. Podíamos acceitar ou não a proposta franceza; e, não a acceitando, propor a negociação de uma convenção sobre a base pura e simples, da nação mais favorecida.
Havia, pois, duas hypotheses. Ou acceitar a proposta do governo francez, ou então dizer: não acceitâmos essa condição da tarifa dos nossos vinhos: façamos uma convenção, pura e simples, sobre a base da nação mais favorecida.
Havia ainda uma terceira hypothese; o era quebrar todas as negociações, e depois de 30 de junho entrarem, uma e outra nação, nas condições da pauta geral em cada uma d'ellas.
Se seguissemos este ultimo alvitre, o inconveniente para as mercadorias portuguezas seria enorme. O commercio