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1174 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

gorias, constitue uma excepção única na Europa, na America, e em toda a parte do mundo.
Hoje não póde ser considerada senão como camara de empregados publicos, visto que por meios de fortuna ninguem ahi póde entrar, senão tendo um rendimento não inferior a 8:000$000 réis annuaes, provado pelas respectivas matrizes de contribuição predial, ou por títulos de divida publica fundada, devidamente averbados com tres annos de antecipação pelo menos, liquido e livre de quaesquer encargos, ou tendo pago ao estado, em cada um dos ultimos tres annos, como industrial ou commerciante, réis l:400$000 de contribuição industrial ou bancaria.
Não é minha opinião que as camarás sejam composta: só do lavradores. Todas as classes sociaes devem estar representadas nas assembléas legislativas, sem excepção dos empregados públicos. Mas deste principio liberal exclusão quasi systematica do lavrador vae um abysmo.
Pois quantos proprietarios haverá no paiz com um rendimento nas matrizes não inferior a 8:000$000 réis?
Quantas casas haverá fóra de Lisboa e Porto com o rendimento predial liquido de 8:000$000 réis? Não ha cincoenta de certo. (Apoiados.)
Na Inglaterra ou na Italia seria admissível a oxigenei de 8:000$000 réis para a categoria de fortuna. Mas em Portugal similhante exigencia é um verdadeiro desproposito político.
Mesmo em Hespanha, nação muito mais rica do que a nossa, exigem-se apenas 7:500 pesetas.
Exigir 8:000$000 réis de rendimento para ser par do reino o proprietario é excluir d'aquella assembléa política exactamente os cidadãos que mais interesse podem ter na marcha da administração publica.
Por isso as ultimas fornadas, as fornadas posteriores á lei das categorias de 1878, por excepção têem comprehendido alguns proprietários, porque infelizmente é excepção, e excepção rarissima, proprietario com 8:000$000 réis de rendimento nas matrizes.
No Minho, que passa por ser a província mais rica do paiz, quantos lavradores haverá que tenham 8:000$000 réis de rendimento liquido nas matrizes? (Apoiados.) Não ha duas duzias de certo. (Apoiados.)
Não bastava que a camara dos dignos pares tivesse perdido as condições, em que assentara a sua instituição primordial, em rasão da desamortisação e da desvinculação da terra; veiu ainda a lei de 1878 excluir da outra casa do parlamento os elementos que em toda a parte lhe dão o caracter de camara ponderadora!
Dos homens de grande fortuna, dos grandes proprietarios, por partidarias que sejam, não é fácil esperar votações politicas, que ponham em perigo as finanças do estado, e portanto a fortuna dos lavradores.
E possível fazer da camara dos dignos pares do reino o que ella era em 1834 e 1835? É possível reconstituil-a para ficar nas condições do parlamento inglez ou do parlamento italiano? Não.
Não ha, pois, outro remedio senão liquidar de vez a instituição, e remodelal-a sobre bases profundamente liberaes, do mudo que aquella assembléa vá, como a nossa, buscar a auctoridade do seu mandato ao suffragio popular.
Pôde fazer-se esta reforma radical, sendo todavia forçoso reconhecer que os corpos collectivos, como os indivíduos, têem innato o instincto do amor á vida e do horror á morte.
Todavia ninguém póde com rasão queixar-se de uma reforma, que o habilita para a vida gloriosa de ir buscar á urna um diploma, em que quatro ou cinco mil cidadãos lhe confiam a defeza dos seus interesses no seio da representação nacional.
Não deixa de ser honrado o mandato, que vem da prerogativa da coroa, porque emana tambem das disposições da lei. Mas não póde comparar-se a honra da carta regia com a honra da procuração do povo. Já eu tive occasião de dizer n'esta casa, e repito agora, que mesmo no antigo regimen, no tempo dos tres estados, os fidalgos com direito a ter assento no segundo braço iam para o terceiro estado, quando ahi os levava a eleição popular.
Estas singelas considerações não diminuem em cousa alguma o meu respeito por aquella assembléa e pelos cavalheiros que a compõem.
Tudo o que deixo dito é em cumprimento de um dever impreterivel. Se assim não fôra, eu, que estou agora de espada na mão, podia liquidar as minhas contas, porque eu já ali fui no anno passado desfavoravelmente apreciado, por um orador distincto, e na minha presença! (Riso.)
Mas eu estou aqui advogando os interesses do paiz, sem me preoccuparem as amarguras ou os desgostos que possa trazer-me o desempenho da minha obrigação. Estou cumprindo um rigoroso dever, que me impõe o mandato que dos povos recebi.
Tenho a convicção profunda, não de hoje, nem de hontem, mas de largos annos, de que é absolutamente indispensavel uma reforma radical na outra casa do parlamento, de modo que ambas as camaras sejam filhas do suffragio popular.
Já lá vae a epocha em que a attitude imponente da camara dos dignos pares era correctivo ás demazias da camara popular.
O tempo, em que na outra casa do parlamanto naufragavam as medidas odiosas approvadas n'esta assembléa, já passou.
V. exas. hão de lembrar-se de que ainda na ultima sessão foi approvado por aquella assembléa, contra todas as tradições nacionaes, contra todas as praxes parlamentares, o augmento de vencimentos a empregados publicos, na lei de meios!
É facto sem precedente em Portugal!
Eis-aqui uma occasião solemne para aquella respeitável assembléa exercer o seu direito de resistencia aberta a uma proposta funesta para os interesses públicos, e perigosa para as finanças do estado.
Pois a proposta passou! O caso é symptomatico!
Portanto eu, desviando do meu exame tudo o que possa ter cunho de pessoal, e manifestando sempre o mais profundo respeito por todos e por cada um dos membros que constituem aquella assembléa, não posso deixar de pugnar por uma reforma não parcial, mas radical da nossa camara aristocratica.
O reformador não deve tremer nem recuar diante de considerações individuaes, quando chega a pôr mão em questões tão importantes como são aquellas de que dependem a prosperidade e a salvação publica. A energia do reformador não deve ter outros limites, senão os princípios de justiça e as conveniencias publicas.
E a reforma proposta pelo governo nem satisfaz ás exigencias do direito publico moderno, nem contenta as aspirações populares.
Como esclarecimento á proposta para as reformas constitucionaes vou eu fallar do celebre accordo ha quinze mezes realisado entre o governo e o partido progressista. Se as reformas são a terra da promissão, é o accordo a chave da porta por onde se ha de entrar n'essa terra abençoada.
Nem na sessão legislativa do anno passado, nem durante este anno, eu soltei uma palavra destinada á apreciação n'aquelle memoravel accordo, já por motivos essencialmente políticos, já por dever de cortezia pessoal.
Em primeiro logar eu era inteiramente estranho ao accordo e ás suas consequencias; e os contratos abrangem só os pactuantes. Os terceiros, estranhos, que não intervieram nas clausulas e estipulações dos contratos, devem guardar a respeito d'elles as reservas, que lhes são impostas elos seus direitos e pelos interesses publicos.
Por outro lado eu, que não assisti ao começo da repre-