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SESSÃO NOCTURNA DE 4 DE JULHO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho

Secretarios - os exmos. srs.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa

SUMMARIO

Não houve expediente.

Na ordem da noite (primeira parte), entra em discussão o projecto de lei n.° 134, applicando aos parochos o direito de aposentação. - Apresentam emendas o sr. Jacinto Candido, relator, e os srs. Alfredo Brandão e Santos Viegas. São acceitas pelo sr. ministro da justiça, e seguidamente é approvado o projecto com essas emendas.

Na ordem da noite (segunda parte), continúa em discussão o projecto de lei n.º 120, que augmenta em 6 por cento o addicional ás contribuições do estado, e usa largamente da palavra o sr. ministro da fazenda em resposta ao discurso do sr. Fuschini, pronunciado na sessão diurna.- Responde o sr. Eduardo José Coelho ao sr. ministro, sustentando uma moção de ordem, e apreciando a gerencia do actual governo em sentido desfavoravel. A moção é admittida, e levanta-se a sessão.

Abertura da sessão - Ás nove horas da noite.

Presentes á chamada 58 srs. deputados. São os seguintes: - Agostinho Lucio e Silva, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Alfredo Cesar Brandão, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Fialho Machado, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio José Arroyo, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Costa, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa, Augusto José Pereira Leite, Bernardino Pacheco Alves Passos, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Eduardo José Coelho, Eugenio Augusto Ribeiro de Castro, Fidelio de Freitas Branco, Fortunato Vieira das Neves, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Jacinto Candido da Silva, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Paiva, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Moreira, João de Sousa Machado, Joaquim Germano de Sequeira, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, José de Alpoim de Sousa Menezes, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José Bento Ferreira de Almeida, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Paulo Monteiro Cancella, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Julio Antonio Luna de Moura, Julio Cesar Cau da Costa, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Manuel Francisco Vargas, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Matheus Teixeira de Azevedo, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro Augusto de Carvalho, Pedro Victor da Costa Sequeira e Thomás Victor da Costa Sequeira.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adriano Augusto da Silva Monteiro, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio Baptista de Sousa, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Maria Jalles, Antonio Maria Pereira Carrilho, Aristides Moreira da Motta, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Maria Fuschini, Bernardino Pereira Pinheiro, Carlos Roma du Bocage, Christovão Ayres de Magalhães Sepulveda, Fernando Mattozo Santos, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João Alves Bebiano, João Marcellino Arroyo, José Elias Garcia, José Estevão de Moraes Sarmento, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Luiz Virgilio Teixeira, Manuel de Arriaga, Manuel Pinheiro Chagas e Roberto Alves do Sousa Ferreira.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Abilio Guerra Junqueiro, Adolpho da Cunha Pimentel, Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Alfredo Mendes da Silva, Antonio José Ennes, Antonio Maria Cardoso, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto da Cunha Pimentel, Augusto Vidal de Castilho Barreto e Noronha, Barão de Paçô Vieira (Alfredo), Caetano Pereira Sanches de Castro, Carlos Lobo d'Avila, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Condo do Côvo, Conde de Villa Real, Eduardo Abreu, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Eduardo de Jesus Teixeira, Elvino José de Sousa e Brito, Emygdio Julio Navarro, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Feliciano Gabriel de Freitas, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco de Castro Mattozo da Silva Côrte Real, Francisco José de Medeiros, Francisco Severino de Avellar, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Frederico Ressano Garcia, Henrique da Cunha Matos de Mendia, ignacio José Franco, Jayme Arthur da Costa Pinto, João de Barros Mimoso, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Simões Pedroso de Lima, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, Joaquim Simões Ferreira, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Antonio de Almeida, José de Azevedo Castello Branco, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Dias Ferreira, José Domingos Ruivo Godinho, José Frederico Laranjo, José Freire Lobo do Amaral, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Julio Rodrigues, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Greenfield de Mello, José Maria Latino Coelho, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria dos Santos, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Monteiro Soares de Albergaria, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luciano Cordeiro, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Manuel Affonso Espregueira, Manuel d'Assumpção, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Manuel Vieira de Andrade, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Pedro Ignacio de Gouveia, Pedro de Lencastre (D.), Sebastião de Sousa, Dantas Baracho, Visconde de Tondella e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Acta - Approvada.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DA NOITE

Projecto de lei n.° 134

O sr. Presidente: - Vae ler-se para entrar em discussão o projecto de lei, relativo á aposentação do clero parochial.

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1032 DIARIO DA CAMAUA DOS SENHORES DEPUTADOS

PROJECTO DE LEI N.º 134

Senhores. - Á vossa commissão dos negocios ecclesiasticos foi presente a proposta de lei n.° 7-H, respeitante á aposentação do clero parochial do continente do reino e ilhas adjacentes, trazida a esta camara, em sessão de 10 de maio de 1889, pelo sr. conselheiro Beirão, que n'aquella epocha geria a pasta da justiça, e cuja iniciativa foi renovada, em sessão de 12 de maio d'este anno, com o n.° 109-A, pelo illustre e digno ministro actual, o sr. conselheiro Lopo Vaz.

Juntamente com esta proposta teve tambem a vossa commissão de examinar o projecto de lei, tendente ao mesmo fim, n.° 100-F, apresentado n'esta camara, em sessão de 14 de maio do anno corrente, pelo sr. deputado Simões Ferreira.

Este projecto, no dizer do seu auctor, é o resultado do trabalho da commissão dos negocios ecclesiasticos da camara transacta, sobre a proposta do sr. Beirão, de que foi relator o sr. Simões Ferreira; e, das considerações, com que este illustre deputado precedeu a sua apresentação, mostra-se que traduz as idéas correntes sobre o assumpto, e em que todos haviam accordado no seio da commissão.

Por completo concorda a vossa commissão nas considerações, que constituem o relatorio da proposta, e são a rasão da lei, demonstrando a sua opportunidade, e, mais do que isso, a sua urgencia.

E na verdade, de todas as classes de servidores do estado a mais descurada, nos ultimos tempos, quer na remuneração do seu trabalho, quer nas providencias attinentes a garantir-lhes a subsistencia no ultimo quartel da vida, tem sido por sem duvida a do clero parochial.

Ninguem ha que o desconheça, e nas duas casas do parlamento, repercutindo-se as vozes do paiz, constantemente se têm levantado protestos energicos contra este estado de cousas, e instantes pedidos para que os poderes publicos prestem a devida attenção aos clamores d'esta digna e respeitavel classe social, tão pouco desculpavelmente abandonada, deferindo-se e satisfazendo-se as suas legitimas pretensões.

Maior relevo ainda tem dado a este abandono a constante melhoria de situação, que, successivamente, tem sido concedida a outros funccionarios publicos. Do confronto resulta, a toda a luz da evidencia, a injustiça relativa, de todas a que mais fere e doe.

Por outro lado, as importantissimas funcções sociaes, que desempenha o clero parochial, imo sómente sob o ponto de vista do culto religioso, mas tambem da educação, moralisação e progresso dos povos, do que são pastores e guardas espirituaes, e ainda as onerosas attribuições, de natureza meramente civil, que lhe são commettidas pelas leis do estado, com irresistivel imperio, obrigam a acudir de prompto aos males, de que tão fundamentadamente, e do tão longa data, se queixa.

É certo que, com justiça igual, se impunham, a conveniencia de prover de remedio á insufficiencia da dotação, e a necessidade do providenciar sobre a falta absoluta de aposentação do clero parochial; mas com muito diversa urgencia.

A dotação, embora irregular, deficiente e má, existe; a aposentarão, falta. Durante as primeiras quadras da vida, quando ha robustez e saude, soffrem-se privações, que são verdadeiramente intoleraveis, quando a velhice e a doença invadem a existencia.

O exercicio do ministerio parochial, essencialmente beneficente e caritativo, mal póde compadecer-se com as economias previdentes, só possiveis ainda assim em limitado numero do parochias, porque a grande maioria das congruas não chega para a decente sustentação dos parochos, quanto mais para só acautelarem contra privações futuras.

Por isso, na impossibilidade actual da cuidar, ao mesmo tempo, das duas providencias, muito bem, e com todo o acerto, entendeu o governo que devia começar por estabelecer a que mais urgia, e esta é, manifestamente, a da aposentação.

Não carece de demonstrar-se que, logicamente, a reforma da dotação devia preceder o estabelecimento da aposentação, e que, sómente depois de regularisadas as parochias e as congruas, poderiam, com rigor, determinar-se as pensões de aposentação.

Mas porque difficuldades insuperaveis de momento impedem que se trate já da reforma da dotação, não devia o governo pôr de parte o seu proposito firme e serio de melhorar as tristes condições do clero parochial, concedendo-lhe o direito de aposentar-se. Assim, servirão de base para determinar as pensões, emquanto novas congruas se não estabelecem, as que actualmente existem.

E para remediar o mal, que adviria de conceder-se a aposentação com pensões verdadeiramente insufficientes, quaes seriam as de quantia inferior a 180$000 réis, tomou a vossa commissão esta importancia como o minimo, em que podem fixar-se, seja qual for a congrua. Da mesma fórma, e porque se entendeu, que não podem os parochos decentemente prover á sua sustentação com rendimento inferior a este, se isentaram do pagamento das quotas para a caixa, de aposentação, aquelles, cujas congruas não excedessem esta quantia. A fim de regularisar o mais possivel, e com toda a equidade, a determinação do quantitativo das quotas, se estatuiram os preceitos dos §§ 3.° e 20.° Finalmente, para o calculo das pensões foi buscar-se a lotação dos rendimentos parochiaes, feita no ministerio da fazenda para o pagamento dos direitos do mercê, em vez de tomar-se simplesmente a importancia da congrua.

Com este complexo de medidas se procurou supprir a falta de uma dotação regular, e estabelecer a aposentação em condições rasoavelmente vantajosas.

Alem d'estas alterações na proposta primitiva, outras se fizeram, igualmente fundamentadas, todas de accordo com o governo, que são feceis de ver pelo confronto com este projecto, e todas inspiradas nos bons desejos de attender os justos interesses e legitimas aspirações do clero parochial.

Referil-as aqui, uma por uma, e dar a rasão d'ellas, pareceu á vossa commissão desnecessaria tareia, que o illustrado criterio da camara dispensa, e que só lograria tomar-lhe tempo e cansar-lhe a attenção.

A proposta do sr. Beirão, o projecto do sr. Simões Ferreira, e a renovação de iniciativa do illustre ministro da justiça actual, são factos caracteristicos e demonstrativos da urgencia d'esta medida legislativa, que está no animo de todos, não só pela justiça, que a exige, como pela respeitabilidade da prestantisssima classe, a cujas legitimas reclamações vae attender.

Por todas estas rasões a vossa commissão, de harmonia com o governo, é de parecer que a proposta de lei n.° 7-II, apresentada a esta camara, na sessão de 10 de maio de 1889, pelo então ministro da justiça, o sr. conselheiro Francisco Antonio da Veiga Beirão, e cuja iniciativa foi renovada pelo actual ministro da justiça, o sr. conselheiro Lopo Vaz de Sampaio e Mello, deve ser convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° O direito de aposentação concedido aos empregados e funccionarios civis, pelo decreto com força de lei, n.° 1.°, de 17 de julho do 1886, é, nos mesmos termos, ampliado aos parochos canonicamente instituidos nas igrejas parochiaes do continente do reino e das ilhas adjacentes; salvas, porém, as declarações e alterações prescriptas nos paragraphos seguintes.

§ 1.° É facultada a aposentação ordinaria:

a) Aos parochos que tiverem completado setenta annos de idade, sem dependencia de qualquer outra condição para obtel-a.

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b) Aos parochos que, contando mais de sessenta annos de idade e trinta de serviço effectivo, se mostrarem completamente impossibilitados, physica ou intellcetualmente, de continuarem no exercício do ministerio parochial.

c) Se os parochos, que estiverem nas condições da alinea b), ou nas da alinea a), acrescendo a circumstancia da absoluta impossibilidade physica ou intellectual de continuarem no exercicio do seu ministerio, não solicitarem a aposentação, poderá o governo determinal-a sobre parecer e proposta do prelado da respectiva diocese.

d) A aposentação, nos precisos termos da alinea a), só póde ser concedida a requerimento dos parochos.

§ 2.° Os parochos, cujas congruas não tiverem sido lotadas, para o pagamento dos direitos de mercê, em quantia superior a 180$000 réis, ficam dispensados de contribuir com qualquer quota para a caixa de aposentação, sem que por este facto deixem de ter igual direito a serem aposentados, quando reunirem as outras condições indispensáveis para a aposentação ordinaria ou extraordinaria.

§ 3.° Os parochos, cujas congruas não tiverem sido lotadas em quantia superior a 300$000 réis, pagarão para a caixa do aposentação a quota correspondente sómente ao excesso da lotação sobre 180$000 réis. Aquelles, cujas congruas tiverem sido lotadas em quantia superior a réis 300$000, e inferior a 400$000 réis, pagarão a quota correspondente ao excesso da lotação sobre 100$000 réis. Os que tiverem congruas lotadas em quantia superior a réis 400$000, pagarão a quota correspondente á totalidade da lotação.

§ 4.° As pensões de aposentação ordinaria concedidas aos parochos serão iguaes á totalidade das suas congruas, conforme a lotação feita para o pagamento dos direitos de mercê.

a) As pensões de aposentação extraordinaria serão fixadas proporcionalmente á importancia das congruas, segundo a mesma lotação para o pagamento dos direitos de mercê, quando attingirem, ou excederem, 180$000 réis, porque, sendo de quantia inferior, o computo da pensão referir-se-ha sempre a esta importancia do 180$000 réis.

b) Em caso algum, porém, a pensão de aposentação, quer ordinaria, quer extraordinaria, poderá ser superior a 1:000$000 réis, nem a pensão da aposentação ordinaria poderá ser inferior a 180$000 réis, seja qual for a lotação das congruas.

§ 5.° A congrua, que serve de base á pensão de aposentação, é a arbitrada á igreja em que o parocho estiver collado, quando tiver de aposentar-se, se a sua collação n'essa igreja tiver durado por mais de cinco annos. De contrario, servirá de base, para a determinação da pensão, a congrua arbitrada á igreja em que anteriormente tenha servido.

§ 6.° Nenhuma aposentação poderá ser concedida, com excepção do disposto no § 2.°, sem que o parocho tenha contribuido para a caixa de aposentação, nos termos d'esta lei, pelo menos durante cinco annos.

§ 7.° Os parochos, que á data da publicação d'esta lei estiverem nos casos das alineas a) e b) do § 1.°, poderão adquirir de prompto o direito á sua aposentação, pagando as respectivas quotas para a caixa de aposentação relativas a cinco annos, ou por uma só vez, ou em cinco prestações annuaes, á sua escolha, devendo, no segundo caso, o pagamento effectuar-se por deducção na pensão de aposentação.

§ 8.° Os parochos, a quem, á data da publicação d'esta lei, faltarem para reunirem as condições das alineas a) e b) do § 1.° d'este artigo, tempo de serviço ou idade inferior a cinco annos, podem adquirir o direito á aposentação, logo que completem esse tempo ou essa idade, se, emquanto não completarem um ou outra contribuirem para a caixa de aposentação com as quotas devidas e relativas ao tempo decorrido, e se, depois de completa a idade ou tempo do serviço, pagarem o que faltar para a contribuição de cinco annos do quotas, ou por uma só vez, ou annualmente, á sua escolha, devendo, no segundo caso, o pagamento fazer-te por deducção na pensão de aposentação.

§ 9.° São applicaveis as disposições dos dois paragraphos antecedentes á aposentação prevista na alinea c) do mesmo § 1.º d'este artigo, não sómente durante os primeiros cinco annos da vigencia d'esta lei, mas permanentemente, para os parochos que tiverem ficado isentos de contribuir para a caixa de aposentação, por não quererem gosar d'este direito, como lhes é permittido pelo § 21.°

§ 10.° Os soccorros provisorios que, por mero titulo de renda vitalicia, tiverem sido concedidos aos parochos aposentados, cessam logo que elles comecem a receber a pensão de aposentação.

§ 11.° A impossibilidade physica ou intellectual será, em regra, verificada, nas sedes das dioceses, por tres facultativos para esse fim nomeados pelo ordinario, o qual depois enviará os respectivos processos de aposentação, com o seu parecer, ao ministerio dos negocios ecclesiasticos e da justiça, para seguirem os devidos termos.

a) Quando a aposentação não tiver sido requerida pelo parocho, será elle sempre mandado ouvir no processo, e ser-lhe-ha permittido recorrer do parecer dos facultativos, que o tiverem julgado incapaz, para uma nova junta medica composta de dois facultativos nomeados pelo governo, e dois nomeados por elle d'entre os professores de qualquer das escolas medicas do paiz, presidida por um empregado superior da direcção geral dos negócios ecclesiasticos do respectivo ministerio, que fornecerá todos os esclarecimentos precisos. Se esta junta confirmar o primeiro parecer, serão pagos pelo recorrente os honorarios dos facultativos, que a compozerem.

b) Quando se dê o recurso previsto no paragrapho anterior, se o parocho recorrente pertencer a alguma das dioceses do continente, a junta de revisão reunir-se ha em Lisboa; se, porém, o parocho for de alguma das dioceses das ilhas adjacentes, a junta reunir-se-ha na séde do districto, a que pertencer o parocho, será presidida pelo juiz de direito da comarca da cabeça do districto, e os medicos nomeados por elle serão dos que houver na localidade.

c) Quando se mostrar que o parocho não póde comparecer na séde da diocese ou do districto, por motivo justo, poderá o primeiro exame medico verificar-se na parochia da sua residencia.

§ 12.° Cessando a impossibilidade, e verificado este facto pela fórma estabelecida no artigo antecedente, se o parocho não tiver renunciado o seu beneficio, ou se, tendo feito a renuncia, o beneficio se achar ainda vago, a elle será logo reconduzido. Se, porém, o beneficio estiver já provido, será apresentado e collado, na primeira opportunidade, em qualquer outra igreja, beneficio ou emprego.

Em qualquer d'estes casos o pagamento das pensões de aposentação só terminará quando os parochos forem investidos no seu cargo.

§ 13.° Para o effeito da aposentação não será contado o tempo, em que os parochos estiverem suspensos das ordens sacras ou do exercicio do seu ministerio, nem aquelle em que deixarem de residir em seus beneficios sem legitimo impedimento ou auctorisação competente. Será, porém, levado em conta todo o tempo de serviço no exercicio das funcções parochiaes, como collado ou encommendado, e o que tiverem prestado em alguma commissão de serviço publico devidamente auctorisada.

§ 14.° Decretada a aposentação, ou por determinação regia, ou por solicitação do parocho, não poderá, comtudo, tornar-se effectiva, nem se pagará a pensão concedida, emquanto se não satisfizerem as condições seguintes:

1.ª Ser o processo remettido á direcção geral da contabilidade publica, para verificar se ha, ou não, cabimento dentro do fundo de que trata o § 18.°, e para os effeitos do § 7.° do artigo 1.° da lei de 19 de junho do 1889.

2.ª Apresentar o parocho a certidão, a que se refere o

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§ unico do artigo 11.° do decreto de 14 de outubro de 1886, quando tenha pago as quotas para a caixa de aposentação, nos termos d'esta lei, devendo vir esta certidão junta ao processo, quando for remettido á direcção geral da contabilidade publica.

3.ª Apresentar o parodio certidão do termo de renuncia do seu beneficio, ou, na hypothese do paragrapho seguinte, participação official do prelado diocesano de ter sido removido o parocho do exercicio do ministerio parochial, em que estava.

4.ª Cumprimento do preceituado nos § 2.º e 3.° do artigo 10.° do decreto com força de lei, n.° 1.°, de 17 de julho de 1886, devendo a remessa do processo para o tribunal de contas ser feita por intermedio da direcção geral da contabilidade publica.

§ 15.° Quando o parocho aposentado se recuse a renunciar voluntariamente o seu beneficio, ou não possa, por qualquer circumstancia, verificar a renuncia, o prelado diocesano o removerá do exercicio do ministerio parochial, e nomeará para o substituir um encommendado, percebendo este a congrua arbitrada á respectiva igreja, e aquelle a pensão que lhe tiver sido concedida.

§ 16.º O pagamento das quotas, com que contribuirem os parochos das freguezias do continente para a caixa das aposentações, será feito nas recebedorias das comarcas respectivas, e a importancia d'ellas será remettida por estas repartições á sobredita caixa, pela qual serão satisfeitas as pensões aos parochos aposentados.

As quotas dos parochos das dioceses das ilhas adjacentes serão descontadas nas folhas das congruas, pagas directamente pelo estado, e a sua importancia será tambem remettida á caixa das aposentações.

§ 17.° Em tudo o mais, que se referir ao pagamento de quotas, ficam os parochos sujeitos ao disposto, para a aposentação dos funccionarios civis, nos artigos 4.° a 7.° do decreto de 14 de outubro de 1886.

§ 18.° É creado, na caixa das aposentações, com escripturação propria e independente, um fundo especial, unicamente destinado á aposentação do clero parochial, nos termos d'esta lei, composto das seguintes verbas:

1.ª Do juro de 1.300:000$000 réis nominaes de inscripções de 3 por cento, com o coupon do 1.° de julho de 1890, proveniente dos rendimentos dos bens das corporações religiosas extinctas ou supprimidas, que serão, pelo ministerio da fazenda, averbadas ao dito fundo especial;

2.ª Das quotas com que contribuirem os parochos para a caixa das aposentações;

3.ª Dos minimos do producto dos bens desamortisados, que não poderem ter sido convertidos em inscripções.

§ 19.° São applicaveis ao fundo especial, de que trata o paragrapho antecedente, as disposições dos artigos 17.° e 18.° do decreto n.º 1 de 17 de julho de 1886.

§ 20.º As quotas, com que os parochos têem de contribuir para a caixa de aposentação, são as fixadas nos numeros seguintes, conforme as suas idades:

1.° - Até trinta annos .... 3 por cento
2.° - De trinta a quarenta annos .... 4 por cento
3.°- De quarenta a cincoenta annos .... 5 »
4.°- De cincoenta annos em diante .... 6 »

§ 21.º O parocho, que não quizer gosar do direito de aposentação, deverá participal-o ao ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, por intermedio do seu prelado, em requerimento por elle feito e assignado, com a assignatura devidamente reconhecida por tabellião, a fim de ficar isento de pagar as quotas estabelecidas para a caixa das aposentações.

§ 22.º O governo decretará as providencias, que julgar necessarias para a execução da presente lei, e bem assim para a regularisação e melhoramento do serviço do registo parochial.

Art. 2.° Ficam por esta fórma ampliadas e modificadas, com relação ao clero parochial, as disposições do decreto com força de lei, n.º 1.°, de 17 de julho de 1886, e demais legislação respeitante á aposentação dos funccionarios civis, e revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão dos negocios ecclesiasticos da camara dos senhores deputados, 20 de junho de 1890. = Guilherme Augusto Pereira de Carvalho da Abreu = Arthur Alberto de Campos Henriques = Julio Antonio Lima de Moura = Antonio Ribeiro dos Santos Viegas = José de Azevedo Castello Branco = Custodio Joaquim da Cunha e Almeida = Agostinho Lucio = Adolpho Pimentel = Jacinto Candido, relator = Tem voto do sr.: José Novaes.

A vossa commissão de fazenda concorda com o parecer anterior.

Sala da commissão de fazenda, aos 21 de junho de 1890.= Manuel Pinheiro Chagas = Arthur Alberto de Campos Henriques = Sergio de Castro = José de Castro = José Maria dos Santos = Pedro Victor da Conta Sequeira = Alberto Pimentel = Adolpho Pimentel = Lourenço Malheiro = Lopes Navarro = Luciano Cordeiro = Arthur Hintze Ribeiro = Jacinto Candido = Abilio Lobo = José de Azevedo Castello Branco = Antonio M. P. Carrilho, relator = Tem voto dos srs.: = Antonio de Azevedo Castllo Branco = Manuel d'Assumpção = Antonio José Arroyo = José de Abreu do Couto Amorim Novaes.

N.º 109-A

Renovo a iniciativa da proposta de lei n.° 7-H, de 10 de maio de 1889, sobre aposentação dos parochos.

Secretaria d'estado dos negocios ecclesiasticos e de justiça, 12 de maio de 1890.= O ministro da justiça, Lopo Vaz de Sampaio e Mello.

N.° 7-H

Senhores. - Venho submetter á vossa apreciação uma providencia, que é aconselhada pelos principios de justiça, porque tem por fim conceder a uma respeitavel classe de funccionarios, que prestam importantes serviços á Igreja e á sociedade, o mesmo beneficio de que gosam outros servidores do estado.

Refiro-me ao clero parochial.

Tendo sido devidamente contemplado nas differentes reformas dos ultimos tempos o pessoal de outros ramos do administração publica, não é menos justo que os parochos canonicamente instituidos encontrem tambem nas leis alguma disposição que lhes garanta uma recompensa, quando pelos annos ou por enfermidades se impossibilitam do desempenho das funcções do seu ministerio.

Pelas circumstancias do thesouro publico, o talvez pela necessidade de attender-se em differentes epochas a outros serviços igualmente importantes, não podo ainda ser votada uma medida legislativa que proveja á melhor sustentação dos ministros do altar, e ao maior esplendor do culto externo da nossa religião; o pelas mesmas considerações não posso ainda n'esta sessão, mau grado meu, submetter ao vosso exame e approvação uma proposta de lei completa sobre a dotação do culto e clero.

Comtudo, por não poderem ser presentemente superadas as dificuldades praticas, que se oppõem á realisação do meu desejo, não devo deixar de propor-vos desde já que se torne extensiva ao clero parochial a concessão do direito de aposentação, com o qual muito se melhora a sorte de uma classe que exerce inquestionavelmente a mais salutar influencia na ordem social.

As disposições que de certo prenderão mais a vossa attenção são as que se acham consignadas nos artigos 2.°, 3.° e 13.°

Pelo decreto de 19 de setembro de 1836 e pelas cartas de lei de 20 de julho de 1839 e 8 de novembro de 1841 foi o governo auctorisado a conceder soccorros provisorios,

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nunca inferiores á terça parte da congrua, nos parochos que pela sua idade ou molestias não podessem desempenhar as funcções do seu ministerio.

Não poderá talvez affirmar-se que ficasse assim legalmente constituido o direito dos parochos á sua aposentação, mas é certo que foi por aquelle modo reconhecida a sua necessidade, assim como a obrigação que têem os poderes publicos de fornecer os meios necessarios para a decente sustentação dos que se impossibilitarem de continuar a prestar os seus serviços á sociedade, tanto na ordem religiosa como na civil.

Alem d'isto, a conveniencia do serviço publico e os principios por que deve ser regulada uma boa administração parochial exigem que sejam substituidos, por quem possa satisfazer aos importantes deveres de cura de almas, os parochos que na extrema velhice ou por enfermidade grave e incuravel não possam exercer as funcções respectivas; sendo de justiça que em taes circumstancias se lhes conceda uma pensão igual á sua congrua, para que no ultimo quartel da vida não soffram privações e possam conservar a sua dignidade.

Por estas considerações parece-me que se acha justificada a disposição do artigo 2.° da proposta, comquanto seja o fim principal d'esta tornar extensivas ao clero parochial as prescripções do decreto com força de lei, n.° 1, de 17 de julho de l886.

Pareceu-me tambem igualmente justo que os parochos, que são modestissimamente retribuidos, fiquem dispensados de contribuir para a caixa das aposentações, sem que por este facto percam o direito de aposentar-se quando reunirem as outras condições para este effeito indispensaveis.

É incontestavel que os parochos, cujas congruas não excedera a 100$000 réis, mal podem sustentar-se com a dignidade e decencia que o seu estado requer; e por isso, obrigal-os a concorrer com qualquer quota para a caixa das aposentações, seria aggravar a sua situação. Já que por emquanto não podem ser elevadas aquellas congruas, suppra-se ao monos a deficiencia, concedendo aos parochos que as percebem o beneficio de gosarem do direito de aposentação, sem deducção nos seus escassos rendimentos. E convem notar que com a disposição do artigo 3.° será pouco onerado o fundo especial que se constituir na caixa das aposentações para pagamento das pensões aos aposentados em taes circumstancias, por se acharem annexadas ou providas por simples encommendação muitas das parochias que apenas têem aquelle rendimento, e tambem por terem de ser descontados das pensões os soccorros provisorios que houverem sido concedidos, como se estabelece no artigo 5.°

Achando-se já determinado pela carta de lei de 4 de abril de 1861, que os bens que constituirem propriedade ou dotação dos conventos supprimidos sejam destinados á sustentação do culto e clero, e tendo sido tambem estabelecido pelo decreto com força de lei de 1 de dezembro de 1869 que os bens das collegiadas que se supprimirem tenham igualmente aquella applicação, julgo acertado e em completa harmonia com aquellas disposições que uma parte dos rendimentos dos referidos bens venham a constituir na caixa das aposentações um fundo especial destinado exclusivamente ao pagamento das pensões dos parochos que forem aposentados, como indico no artigo 13.°

E por estas considerações espero que vos dignareis approvar a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º O direito do aposentação concedido aos empregados e funccionarios civis pelo decreto com força de lei, n.° 1, de 17 de julho de 1886, é, nos mesmos termos, ampliado aos parochos canonicamente instituidos nas igrejas parochiaes do continente do reino e das ilhas adjacentes; salvas, porém, as declarações e alterações prescriptas nos artigos seguintes.

Art. 2.° É facultada a aposentação ordinaria:

1.° Aos parochos que tiverem completado setenta e cinco annos de idade, sem dependencia de qualquer outra condição para obtel-a.

2.° Aos parochos que, contando mais de sessenta annos de idade e trinta de serviço effectivo, se mostrarem impossibilitados, physica ou moralmente, de continuarem no exercicio do ministerio parochial.

§ 1.° Se os parochos que estiverem nas circumstancias declaradas n'este artigo não solicitarem a aposentação, poderá o governo determinal-a sobre parecer e proposta do prelado da respectiva diocese.

§ 2.º Aos parochos aposentados nas condições referidas serão concedidas pensões iguaes á importancia das suas congruas.

Art. 3.° Os parochos, cujas congruas não estiverem taxadas em quantia superior a 100$000 réis, ficam dispensados de contribuir com qualquer quota para a caixa das aposentações, sem que por este facto deixem de ter igual direito a serem aposentados quando reunirem as outras condições indispensaveis para a aposentação ordinaria ou extraordinaria.

Art. 4.° As pensões de aposentação concedidas aos parochos das freguezias do continente serão computadas em proporção das congruas arbitradas ás respectivas igrejas, emquanto não for decretada por outra fórma a dotação do clero parochial; devendo observar-se a este respeito as mesmas regras fixadas no citado decreto para as pensões dos funccionarios civis aposentados.

As dos parochos das freguezias das dioceses das ilhas adjacentes serão calculadas em proporção das congruas que percebem pelo cofre do estado.

Art. 5.° Os soccorros provisorios que tiverem sido concedidos aos parochos aposentados serão encontrados nas pensões que houverem de receber nos termos do artigo antecedente.

Art. 6.° A impossibilidade physica ou moral será verificada nas sédes das dioceses, por tres facultativos para esse fim nomeados pelo ordinario, o qual depois enviará os respectivos processos de aposentação com o seu parecer ao ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, para seguirem os devidos termos.

Art. 7.º Cessando a impossibilidade, e verificado este facto pelo modo estabelecido no artigo antecedente, terminará o pagamento das pensões aos parochos aposentados logo que estes sejam apresentados e collados em outras igrejas parochiaes, ou nomeados para quaesquer outros beneficios ou empregos.

Art. 8.° Para o effeito da aposentação não será contado o tempo em que os parochos estiverem suspensos das ordens sacras ou do exercicio do seu ministerio, nem aquelle em que deixarem do residir em seus beneficios sem legitimo impedimento ou auctorisação competente. Será, porém, levado em conta todo o tempo de serviço no exercicio das funcções parochiaes, como collado ou encommendado, e o que tiverem prestado em alguma commissão de serviço publico devidamente auctorisada.

Art. 9.° Decretada a aposentação, ou por determinação regia, ou por solicitação do interessado, não se effectuará o pagamento da pensão concedida, emquanto o parocho aposentado não renunciar o seu beneficio, e não apresentar a necessaria certidão do termo da renuncia, e emquanto não tiver cabimento dentro do fundo de que trata o artigo 13.°

Art. 10.° Quando o parocho aposentado se recuse a renunciar voluntariamente o seu beneficio, ou não possa por qualquer circumstancia verificar a resignação, o prelado diocesano o removerá do exercicio do ministerio parochial, e nomeará para o substituir um encommendado; percebendo este a congrua arbitrada á respectiva igreja, e aquelle a pensão que lhe tiver sido concedida.

Art. 11.° O pagamento das quotas com que contribuirem os parochos das freguezias do continente para a caixa das aposentações será feito nas recebedorias dos concelhos

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1036 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

respectivos, visto não terem vencimento pago pelo cofre do estado, para que a importancia das mesmas quotas seja remettida por aquellas repartições á sobredita caixa, pula qual serão satisfeitas as pensões aos parochos aposentados.

§ unico. As quotas dos parochos das dioceses das ilhas adjacentes serão descontadas nas folhas das congruas pagas directamente pelo estado.

Art. 12.° Os parochos das freguezias do continente que tiverem do contribuir para a caixa das aposentações, e não pagarem as suas quotas nos devidos prasos, ficarão sujeitos ás mesmas prescripções comminatorias dos §§ 4.º e 7.° do artigo 7.º do decreto do 14 de outubro de 1886.

Art. 13.° Pelo ministerio dos negocios da fazenda será entregue á caixa das aposentações uma subvenção annual de 20:000$000 réis, proveniente dos rendimentos dos bens das corporações religiosas extinctas ou supprimidas, para ali se constituir um fundo especial destinado exclusivamente ao pagamento das pensões aos parochos que forem aposentados nos termos dos artigos 2.° e 3.° d'esta lei.

Art. 14.° O governo dará as providencias que julgar necessarias para a execução d'esta lei.

Art. 15.° Ficam assim ampliadas as disposições do decreto com força de lei, n.° 1, de 17 de julho de 1886, o revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, em 10 do maio de 1889.= Francisco Antonio da Veiga Beirão.

N.º 112-B

Renovo a iniciativa da proposta de lei sobre aposentação de parochos, apresentada na sessão legislativa de 1889. = O deputado, Francisco Beirão.

N.º 112-F

Artigo 1.º O direito de aposentação concedido aos empregados e funccionarios civis pelo decreto com força de lei, n.° 1, de 17 de julho de 1886, e nos mesmos termos, é ampliado aos parochos canonicamente instituidos nas igrejas parochiaes do continente do reino e das ilhas adjacentes; salvas, porém, as declarações o alterações prescriptas nos artigos seguintes.

Art. 2.° É facultada a aposentação ordinaria:

1.º Aos parochos que tiverem completado setenta e cinco annos de idade, sem dependencia de qualquer outra condição para obtel-a;

2.º Aos parochos que, contando setenta e cinco a imo s de idade, ou sessenta com trinta do serviço effectivo, se mostrarem impossibilitados, physica ou moralmente, de continuarem no exercicio do ministerio parochial.

§ 1.º A aposentação a que se refere o n.º 1.° d'este artigo só póde ser concedida a requerimento dos interessados.

§ 2.º Se os parochos que estiverem nas condições do n.º 2.° d'este artigo não solicitarem a aposentação, poderá o governa determinal-a sob proposta ou parecer do prelado da respectiva diocese.

Art. 3.° Os parochos cujas congruas não estiverem taxadas em quantia superior de 100$000 reis, ficam dispensados de contribuir com qualquer quota para a caixa das aposentações, sem que por este facto deixem do ter igual direito a serem aposentados quando reunirem as outras condições indispensaveis para a aposentação ordinaria ou extraordinaria.

Art. 4.° As pensões de aposentações concedidas aos parochos serão, em regra, computadas em proporção da importancia da dotação das congruas que tiver sido computada para o pagamento dos direitos de mercê em cada uma das igrejas, emquanto por outra fórma não for regulada a dotação do clero parochial no continente, ficando, porém, estabelecido que nenhuma pensão será superior a 1:000$000 réis nem inferior a 180$000 réis.

Art. 5.° Os soccorros provisorios que tiverem sido concedidos aos parochos aposentados serão encontrados nas pensões que houvessem de receber nos termos do artigo antecedente.

Art. 6.° A impossibilidade physica ou moral será verificada nas sédes das dioceses, por tres facultativos para esse fim nomeados pelo ordinario, o qual depois enviará os respectivos processos de aposentação, com o seu parecer ao ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, para seguirem os devidos termos.

§ unico. O parocho interessado será sempre ouvido n'este processo, e ser-lhe-ha permittido recorrer do parecer dos facultativos que o tiverem julgado incapaz por uma junta medica composta de dois facultativos nomeados pelo governo, dois pelo interessado de entre os professores de qualquer das escolas medicas do paia, e um empregado superior da direcção geral dos negocios ecclesiasticos do respectivo ministerio, presidindo este ultimo, que fornecerá todos os esclarecimentos precisos. Se esta junta confirmar o primeiro parecer serão pagos pelo interessado os honorarios dos facultativos que a compozerem.

Art. 7.° Cessando a impossibilidade, e verificado este facto pelo modo estabelecido no artigo anterior, serão os parochos julgados aptos apresentados e coitados, independentemente de concurso, ou de preferencia a qualquer concorrente, quando haja concurso aberto, na mesma igreja, em que estavam antes da impossibilidade, quando isso possa ser, ou n'outra cujo rendimento não seja inferior, quando esteja vaga ou logo que vague. Tambem podem ser nomeados para outros beneficios ou empregos que estejam em condições iguaes de rendimento.

E em qualquer dos casos, o pagamento das pensões só terminará quando os parochos estiverem investidos no novo cargo.

Art. 8.° Para o effeito da aposentação não será contado o tempo em que os parochos estiverem suspensos das ordens sacras ou do exercicio do seu ministerio, nem aquelle em que deixarem de residir em seus beneficies sem legitimo impedimento ou auctorisação competente. Será, porém, levado em conta todo o tempo de serviço no exercicio das funcções parochiaes, como collado ou encommendado, e o que tiverem prestado em alguma commissão de serviço publico devidamente auctorisada.

Art. 9.° Decretada a aposentação, ou por determinação regia, ou por solicitação do interessado, não se effectuará o facto nem o pagamento da pensão concedida emquanto não tiver cabimento dentro do fundo de que trata o artigo 13.°, devendo então o interessado apresentar certidão authentica de ter renunciado o seu beneficio, sem o que não se lhe principiará a pagar a pensão concedida.

Art. 10.° Quando o parocho aposentado se recuse renunciar voluntariamente o seu beneficio, ou não possa, por qualquer circumstancia, verificar a resignação, o prelado diocesano o removerá do exercicio do ministerio parochial e nomeará para o substituir um encommendado, percebendo este a congrua arbitrada á respectiva igreja, e aquelle a pensão que lhe tiver sido concedida.

Art. 11.° O pagamento das quotas com que contribuirem os parochos das freguesias do continente para a caixa de aposentações será cobrado nas recebedorias dos concelhos respectivos, como addicionaes a qualquer contribuição em que os parochos estejam collectados, ou como contribuição legal, a pagar pelo modo e nos termos da legislação em vigor, para que a importancia das mesmas quotas seja remettida por aquellas repartições á sobredita caixa pela qual serão satisfeitas as pensões.

§ unico. As quotas dos parochos das dioceses das ilhas adjacentes serão descontadas nas folhas das congruas pagas directamente pelo estado.

Art. 12.° Os parochos das freguezias do continente que tiverem de contribuir para a caixa de aposentações, e não pagarem as suas quotas nos devidos prasos, ficarão sujeitos ás mesmas prescripções comminatorias dos §§ 4.° e 7.° do artigo 7.° do decreto do 14 de outubro de 1886.

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SESSÃO NOCTURNA DE 4 DE JULHO DE 1890 1037

Art. 13.º Pelo ministerio dos negocios da fazenda será entregue á caixa de aposentações uma subvenção annual do 20:000$000 réis, proveniente dos rendimentos dos bens das corporações religiosas estinctas ou supprimidas, para ali se constituir um fundo especial destinado exclusivamente ao pagamento das pensões aos parochos que forem aposentados nos termos dos artigos 2. e 3.° d'esta lei.

Art. 14.° O governo dará as providencias que julgar necessarias para a execução d'esta lei.

Art. 15.° Ficam assim ampliadas as disposições do decreto com força de lei, n.° 1, de 17 de julho de 1886 e revogada a legislação em contrario.

Artigo transitorio. Para fiel cumprimento do disposto no artigo 4.° d'este projecto, o governo mandará proceder, com a maxima brevidade, ao apuramento do rendimento effectivo de cada uma das freguezias do continente, pelo modo como entender mais efficaz.

Sala das sessões da camara dos deputados, em 13 de maio de 1890.= Joaquim Simões Ferreira, deputado pelo circulo n.º 57 (Guarda).

O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade e na especialidade.

O sr. Jacinto Candido (relator): - Por parte da commissão mando para a mesa uma proposta que representa apenas alteração de redacção no parecer e emendas de erros typographicos.

Leu-se na mesa, é a seguinte:

Proposta

1.ª emenda. Alinea c) do § 1.°: suppressão da terceira virgula.

2.ª emenda. Alinea a) do § 1.°: eliminação das palavras - bem dependencia, etc.

3.ª emenda. Alinea c) do § 1.°: substituição da conjuncção «e» por «ou».

4.ª emenda. Alinea d) do § 1.°: acrescentar as seguintes palavras: -acompanhado de boa informação dos prelados respectivos.

5.ª emenda. § 9.° (final): acrescentar o seguinte periodo:

«N'este caso, porém, deverá contribuir para a caixa das aposentações com a quota correspondente ao periodo de dez annos.»

6.ª emenda. § 11.° alinea a): «presidido pelo presidente do tribunal da relação de Lisboa» (em vez do que lá está).

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 4 de julho do 1890. = Jacinto Candido.

Foi admittida.

O sr. Alfredo Brandão: - Mando para a mesa differentes emendas, mas todas ellas subordinadas á emenda que apresento ao final do § 4.°, e que é a seguinte:

3.ª emenda ao § 4.º (final): Substituir as palavras «lotação feita para o pagamento dos direitos de merçê», pelas seguintes: «lotação feita para o pagamento dos direitos de mercê, computando se n'ella os vencimentos do pé de altar, devidamente calculados pela media dos ultimos cinco annos, anteriores á publicação d'esta lei, conforme o que constar do registo parochial e respectiva tabeliã, ou quando não haja tabella, segundo os usos da freguezia, e bem assim quaesquer outros rendimentos parochiaes, que constem de documentos publicos o authenticos».

Esta emenda e fundamental, porque tem em vista regular a dotação que serve de base á aposentação dos parochos, por fórma que ella se realise com o rendimento que hoje tem, e se proporcione o maior pagamento para o estado, com respeito aos direitos de mercê, constituindo-se assim um elemento importante para a futura dotação do clero.

Todas as outras emendas são subordinadas a esta.

(S. exa. não reviu.)

Leram-se na mina e furam successivamente admittidas as seguintes

Propostas

1.ª emenda ao § 2.°: Substituir as palavras - para o pagamento dos direitos de mercê, - pelas seguintes: - nos termos do § 4.° d'este artigo. = Alfredo Cesar Brandão.

2.ª emenda ao § 3.º: Substituir as palavras - lotadas em quantia - pelas seguintes: - lotadas, segundo o disposto no paragrapho seguinte, em quantia = Alfredo Cesar Brandão.

3.ª emenda ao § 4.º (final): Substituir as palavras - lotação feita para o pagamento dos direitos de mercê - pelas seguintes: - lotação feita para o pagamento dos direitos de mercê, computando-se n'ella os vencimentos do pé de altar, devidamente calculados pela media dos ultimos cinco annos, anteriores á publicação d'esta lei, conforme o que constar do registo parochial e respectiva tabella, ou quando não haja tabella, segundo os usos da freguezia, e bem assim quaesquer outros rendimentos parochiaes, que constem de documentos publicos e authenticos. = Alfredo Cesar Brandão.

4.ª emenda á alinea a) do § 4.°: substituir as palavras - das congruas, segundo a mesma lotação para o pagamento dos direitos de mercê - pelas seguintes - das congruas, conforme a lotação fixada n'este paragrapho. = Alfredo Casar Brandão.

5.ª emenda ao § 22.° Addicionar o seguinte paragrapho sob n.° 22.°, passando o § 22.° a ter o n.° 23.°:

§ 22.° A apresentação extraordinaria só póde ter logar a requerimento do parodio ou por determinação do governo, sob parecer ou proposta do prelado da respectiva diocese. = Alfredo Cesar Brandão.

6.ª emenda ao § 28.°, segundo a numeração indicada na minha emenda 5.ª (final): Addicionar a este paragrapho o seguinte: podendo rever e alterar as tabellas dos emolumentos parochiaes o respectivos usos, e regular o serviço das pompas funebres e o das thesourarias ecclesiasticas. = Alfredo Cesar Brandão.

O sr. Ministro da Justiça (Lopo Vaz): - Pedi a palavra para declarar que acceito não só as emendas apresentadas pelo sr. relator da commissão, mas tambem as que acaba de mandar para a mesa o sr. Alfredo Brandão.

O sr. Santos Viegas: - Mando para a mesa tres propostas, e folgo de que uma d'ellas seja a consequencia de uma das emendas apresentadas pelo sr. Alfredo Brandão.

Leram-se e foram successivamente admittidas as seguintes:

Propostas

Ao § 5.°: Addicionar ao § 5.° o seguinte periodo:

Esta disposição não e applicavel á aposentação extraordinaria, para a qual servirá de base a congrua e lotação da igreja em que o parocho estiver collocado independentemente do tempo da collação. = O deputado, Santos Viegas.

Artigo 15.º: Addicione-se o seguinte periodo:

O parocho encommendado não perceberá a congrua por inteiro, emquanto ao aposentado não for mandado pagar a pensão da aposentação. Receberá aquelle tão sómente metade da congrua. = O deputado, Santos Viegas.

No § 3.°, onde se lê - e o que tivessem prestado em alguma commissão de serviço publico devidamente auctorisada - leia-se - bom como o prestado em qualquer beneficio curado ou simples, ainda que não tenha havido collação, o do magisterio e outros empregos dos seminarios, ou qualquer commissão de serviço publico devidamente auctorisada. = José Bento Ferreira de Almeida = O deputado Santos Viegas.

O sr. Jacinto Candido (relator): - Por parte da commissão declaro que acceito as emendas apresentadas pelos srs. Alfredo Brandão e Santos Viegas.

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1038 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Ferreira de Almeida: - Quero apenas declarar que uma das propostas do sr. Santos Viegas, a que contém uma emenda ao § 3.°, está tambem assignada por mim, porque n'ella estão incluidos os coadjutores que representam para o clero superior o mesmo que nas repartições do estado representam, em categorias, os inferiores para com os superiores.

O sr. Presidente: - Ninguem mais está inscripto; vae votar-se, começando-se, na fórma do regimento, pelas emendas.

Leram-se em primeiro logar as emendas apresentadas pelo sr. relator e foram approvadas.

Successivamente foram lidas e approvadas as emendas dos srs. Alfredo Brandão e Santos Viegas.

O sr. Presidente: - Vae ler-se agora, o projecto para ser votado, sem prejuizo das emendas já approvadas.

Foi lido e approvado.

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DA NOITE

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 120, estabelecendo um addicional de 6 por cento sobre as contribuições do estado

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco):- Responde largamente ao sr. Fuschini, defendendo o projecto.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a cita sessão, quando s. exa. haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Eduardo José Coelho (sobre a ordem): - Começo por ler a minha moção de ordem.

É a seguinte: «A camara, lamentando que o governo pelos actos da sua imprevidencia governativa seja obrigado a pedir ao paiz sacrificios tributarios, por fórma tão desigual e iniqua, passa á ordem do dia. = Eduardo José Coelho.»

Ao começar a resposta ao sr. ministro da fazenda, não posso deixar de me referir á ultima parte do seu discurso. (Apoiados da esquerda.)

Parecia-me perfeitamente correcto que o sr. ministro da fazenda, terminando o seu discurso, quizesse levantar uma phrase que lhe pareceu equivoca, proferida d'este lado da camara; mas desde o momento que o deputado que proferira essa phrase, reputada equivoca, não estava presente, sendo elle o mais competente, talvez o unico competente para explical-a, (Apoiados.) parecia-me, repito, mais prudente e mais correcto que s. exa. declarando ao parlamento que não podia dar as devidas e categoricas explicações á phrase, de que se trata, e que foi proferida pelo illustre parlamentar e meu amigo o sr. Oliveira Martins, aguardasse á presença d'aquelle illustre cavalheiro para então liquidar esta questão, se questão chega a ser. (Apoiados.)

Mas o que fez o sr. ministro da fazenda? Não só não explicou a phrase que se attribue ao illustre deputado opposicionista, mas preferiu terminar o seu discurso por uma fórma que lamento. (Apoiados da esquerda.)

Devo dizer, com verdade e com a franqueza de que me prezo, que ouvi muito attentamente a replica vigorosa, fluente, por vezes brilhante, do sr. ministro da fazenda, ao discurso do meu amigo o sr. Fuschini, (Apoiados.) e por isso mais me contristou a peroração do discurso de s. exa., que foi, como estou convencido, uma verdadeira insinuarão. (Apoiados.) Uma cousa esqueceu ao sr. ministro: é que d'essas cadeiras não é permittida a insinuação... (Apoiados.)

Repito, devo dizer ao sr. ministro, que as liberdades de defeza não vão tão longe, como s. exa. pensa, pois que o sr. ministro da fazenda concluiu por fazer mais do que insinuações, verdadeiras accusações, alludindo a operações bem, ou mal combinadas, o que desconheço, e que, em todo o caso, o deputado, a quem s. exa. se referiu explicará com hombridade e com dignidade para todos. (Apoiados.)

(Interrupção do sr. ministro da fazenda.)

O que eu vejo pela interrupção do sr. ministro da fazenda, é que s. exa. reitera na falta, que lhe estou imputando.

(Interrupção do sr. ministro da fazenda.)

Sr. presidente, com as explicações do illustre ministro dou por terminado o incidente, mas torno a dizer que me parecia talvez mais correcto que s. exa. esporasse a presença do cavalheiro, a que se referiu, para então dizer o que acaba de repetir e explicar.

Dando pois por terminado este incidente, permitia-mo v. exa. e a camara que entre na ordem de considerações que me proponho fazer.

O sr. ministro da fazenda, no seu relatorio, amplamente discutido já, procurou comparar a gerencia progressista durante todo o seu tempo com um periodo ou uma epocha da gerencia do partido regenerador; isto é, foi procurar o crescimento das receitas e o crescimento das despezas publicas em 1885, e comparou esse resultado com a receita e com a despeza do anno de 1889-1890 da gerencia progressista, e do confronto d'esse resultado concluiu, quaesquer que fossem as suas intenções, de um modo inteiramente desfavoravel para a gerencia do partido progressista. Procurou assim indicar que as duas gerencias nem sequer podiam merecer confronto.

Sr. presidente, parece-me que examinando os factos como elles são na sua ordem economica e financeira, eu não terei difficuldade para demonstrar á camara e ao sr. ministro da fazenda que as suas conclusões são completamente erroneas, contrarias á verdade dos factos.

Sr. presidente, como se vê, o sr. ministro da fazenda, para liquidar responsabilidades politicas, economicas e financeiras, sobre tudo responsabilidades financeiras, compara, confronta, analysa periodos, epochas determinadas dos ultimos tempos. É a orientação do sr. ministro da fazenda no seu relatorio: comparou periodos historicos, e depois deduz as conclusões que lhe apraz.

Se não estou em erro, o sr. ministro da fazenda adoptou no seu relatorio, paginas 8, 9, 10 e 11, o mesmo methodo, a mesma argumentação que adoptou o sr. Hintze Ribeiro no discurso por elle proferido na camara dos dignos pares, sessão de 20 de junho de 1886. A differença está apenas nas datas e nos periodos de confronto.

«Vamos agora por partes, dizia o sr. Hintze Ribeiro, e comparemos os augmentos de despeza nos exercicios de 1870-1880 (primeiro anno completo da gerencia do partido progressista) com relação ao de 1877-1878 (o primeiro na periodo de confronto) e no exercicio do 1884-1885 (o ultimo d'aquelle periodo, e o ultimo que, por completo, é da responsabilidade do partido regenerador,) com relação ao de 1879-1880.

«Assim, continúa aqnelle digno par, teremos duas epochas distinctas, uma da nossa responsabilidade, outra da responsabilidade do partido que actualmente está no poder.»

É, como facilmente se comprehende, o mesmo processo adoptado agora pelo sr. ministro da fazenda.

Mas, sr. presidente, tanto o sr. Hintze Ribeiro em 1886, como o sr. ministro da fazenda, como alguns illustres deputados d'esse lado da camara, chegaram a conclusões que não podem acceitar-se, porque encararam o problema por um lado apenas. (Apoiados.)

E, abstrahindo, quanto possivel, de cifras e calculos sobre medias, decimos, etc., verei se posso demonstrar de que lado está a melhor verdade.

O methodo do s. exas. consiste em confrontar o caminhar parallelo das receitas e despezas publicas, n'um periodo relativamente importante, pondo em relevo as alterações operadas na situação orçamental dos periodos comparados, e do maior, ou menor deficit, nos periodos comparados, deduzir a situação economica, em especial a situação financeira do paiz nos periodos comparados.

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SESSÃO NOCTURNA DE 4 DE JULHO DE 1890 1030

Mas contesto que esto modo de ver as cousas sirva, exclusivamente, para fundamentar taes conclusões. Acceitando os dados orçamentos e calculos do sr. ministro da fazenda, acceitando os periodos comparados, confio que chegarei á seguinte conclusão: que a gerencia do partido regenerador em 1884-1885, que era a continuação de quatro annos no poder, periodo suficientemente largo para definir responsabilidades, segundo o methodo de argumentação do sr. ministro da fazenda, denuncia um periodo, uma epocha das mais criticas e das mais melindrosas dos tempos modernos, encarados sobretudo pelo lado financeiro, sem embargo do caminhar parallelo das receitas e despezas e sem embargo do deficit orçamental, e que pelo contrario a gerencia do partido progressista no anno 1888-1889, que representa igualmente a continuação de quatro annos no poder, apresenta uma situação economica o financeira das mais desafogadas e seguras, que jamais houve no paiz, sem embargo do deficit orçamental. (Apoiados.)

O partido regenerador representava em 1884-1885 mais de quatro annos de poder. Não discutirei agora a theoria dos homens providenciaes, mas não ha quem conteste que o governo em toda a parte, e especialmente em Portugal, exerce uma força immensa sobre o destino do paiz, sobre o seu movimento economico, financeiro e politico. (Apoiados.)

Da iniciativa particular, sempre tardia, desconfiada e pouco efficaz entre nós, tambem não fallarei. A iniciativa parlamentar individual é o que todos nós sabemos; ou nulla de facto, ou, se alguma vez se manifesta, é porque o governo a apoia, ou pelo menos a não contraria. (Apoiados.) E sendo isto assim, o que era a situação economica e sobretudo financeira do paiz em 1884-1885, periodo procurado pelo governo para confronto, e que representava a continuação de quatro annos no poder do partido regenerador, periodo sufficientemente largo para definir responsabilidades, segundo o criterio do sr. ministro da fazenda? (Apoiados.)

É o que tentaremos demonstrar a largos traços. Acceitando o methodo adoptado pelo governo, não posso ser arguido de retaliar, ou de divagações inuteis. Acceito a lucta no campo, onde a collocaram. (Apoiados.)

A situação economica, especialmente a situação financeira, era má, era pessima em 1884-1885. E porque era má, e porque era pessima? Sinto que o governo, e particularmente o sr. ministro da fazenda, provocasse a lucta n'este terreno. O que fez o sr. Hintze Ribeiro em 1887, talvez não fosse permittido fazel-o ao sr. ministro da fazenda em 1890. As responsabilidades de par do reino são muito differentes das responsabilidades de governo. (Apoiados.)

Mas o que ora a situação financeira em 1884-1885, o celebre periodo comparado para confronto?

Desde 1878 até 1885 o recurso permanente ao credito era, termo medio, de 8.000:000$000 a 10.000:000$000 réis por anno. No orçamento rectificado d'aquelle anno o deficit era de 8.443:000$000 réis, e o sr. Marianno de Carvalho calculou o em 10.000:000$000 réis.

A receita era de 31.000:000$000 réis, e os juros da divida fundada a cargo da junta do credito publico e os que se pagam pelas obrigações do thesouro sommavam, pelo menos, 15.000:000$000 réis.

Ficavam-nos, pois, 16.000:000$000 réis para satisfazer a todas as despezas obrigatorias, a todos os serviços do estado, ás chamadas dividas mansas. Tinhamos n'aquella epocha proximamente 3:000 instituições (misericordias, asylos, creches) que, por força da lei, foram compellidas a trocar os seus bens de raiz e outros, no valor de réis 11.300:000$000 effectivos por fundos publicos no valor nominal de 23.093:000$000 réis.

Sr. presidente, estou repetindo o que disse n'esta camara na sessão de 5 de maio de 1885; citei, repi o, hoje o que então expuz á camara, com a differença que hoje o faço provocado pelo governo que concebeu a triste idéa de procurar a epocha de 1884-1885 para a comparar com a ultima epocha da gerencia progressista. (Apoiados.) E quero tornar bem patente que é um erro, uma falsidade historica, deduzir a boa ou má situação economica e financeira de uma epocha, de um periodo historico, mais ou menos largo, attendendo exclusivamente aos calculos orçamentaes, ao caminhar mais ou menos parallelos da receita e da despeza. (Apoiados.)

Já vimos o que era a situação financeira de 1884-1885 sob o ponto de vista orçamental, sob o ponto de vista das receitas e das despezas, sob o ponto de vista do deficit; mas o que era essa situação sob outros pontos de vista?

Qual era a confiança publica n'aquelle periodo?

Qual era a cotação dos nossos fundos? Como é que as mais instantes necessidades publicas eram satisfeitas? Como é que a industria agricola foi, ou podia ser attendida?

E, todavia, é preciso responder a estas interrogações para se conhecer o que é o famoso periodo historico, que se procurou para parallelos e para confrontos. (Apoiados.)

Permitta-me, sr. presidente, que renove as considerações, que então expuz; o tempo decorrido de 1885 até hoje não tem feito senão justificar a sua exactidão. (Apoiados.)

Dizia eu n'aquella epocha o seguinte:

«Afianço a v. exa. que são tres mil propagandistas contra o estado actual de cousas (Apoiados.), ou pelos menos tres mil individuos ou corporações em sobresaltos, por este recurso constante e inconsciente ao credito. (Apoiados.)

«Começo por fazer a leitura do relatorio e contas na associação dos empregados no commercio e industria, relativos ao anno de 188o, no qual a paginas 2 se diz o seguinte: «O deficit tem sido saldado com os juros do nosso fundo consolidado; porém, achando-se este empregado todo em fundos publicos, não póde a direcção, sem faltar aos deveres que lhe impõe a sua consciencia, deixar de notar a vossa imprevidencia.

«Os encargos do estado augmentam todos os annos, e portanto o receio começa a preoccupar muita gente... No dia em que o thesouro suspender o pagamento dos juros da divida publica, o que não será para admirar, teremos a associação em bancarota.»

O que prova isto, perguntava eu em 1885, e repito a pergunta em 1890?

Mas não posso deixar de bem caracterisar aquella epocha historica, pois que, é preciso dizel-o sempre, foi o escolhido para confronto, para illações desfavoraveis contra a ultima gerencia progressista. (Apoiados.)

Como se poderiam acceitar os calculos, as conclusões do sr. ministro da fazenda, sem os corrigir com todos os elementos de critica indispensaveis para conhecer o periodo comparado sob os variados e multiplices aspectos, que elle abrange? (Apoiados.)

Prosigo pois.

No relatorio da mesma associação de 1884, observo que se insistiu na mesma idéa, reiterou-se nos mesmos propositos, e tornou-se a deliberação de enviar ao parlamento uma representação, pedindo para que fosse revogada a lei de 7 de abril de 1864, a fim de que a associação podesse adquirir propriedades para garantia dos seus capitaes.

Temos mais e melhor.

O monte pio geral em 1883 participava dos mesmos perigos, dominavam-no os mesmos sobresaltos. Em 1885 esse sobresalto tinha attingido o ultimo grau.

Em 1883, no seu relatorio, indica como altamente vantajoso, que se possam empregar alguns capitães em titulos de divida publica de nações de credito inabalavel, como a Inglaterra e a França.

Logo mostrarei o que valem, o que significam estes factos, quando me occupar da gerencia progressista no pe-

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riodo confrontado pelo sr. ministro da fazenda, especialmente no anno de 1889-1890.

Reconhecer-se ha então, de que não faço historia por distracção, mas para mostrar quanto pouco reflectido foi o sr. ministro da fazenda (Apoiados.) na orientação dada ao seu relatorio n'esta parte.

A estes sobreditos, correspondia a baixa constante, gradual e successiva dos nossos fundos publicos. Ninguem ignora que desceram até 41 7/8.

E este estado de cousas, este mal estar economico e financeiro, póde explicar-se por causas imprevistas o extraordinarias?

Foi o governo de então surprehendido por alguns acontecimentos dentro ou fóra do paiz, que possam justifical-o ou attenuar-lhe as responsabilidades?

Certamente, ninguem o dirá. (Apoiados.)

Ahi tem o governo a demonstração clara, categorica, peremptoria, de que erra quem suppõe definir, caracterisar o estado economico, financeiro e politico de uma epocha, attendendo exclusivamente a calculos orçamentaes, ao caminhar mais ou menos parallelo das receitas e despezas publicas. (Apoiados.)

Ha outros factores, outros coefficientes de correcção, que é preciso attender, aliás os phenomenos sociologicos, e o modo de ser da sociedade sob os seus variados aspectos, não póde, não será nunca devidamente, nem justamente apreciado. (Apoiados.)

E o governo do 1884-1885 representava já quatro annos ou mais de poder, e, portanto, a sua influencia, boa ou má, n'um periodo sufficientemente largo, não póde ser cousa indifferente como elemento dê apreciação. (Apoiados.)

Não faço senão acceitar os principios postos pelo governo, e deduzir d'elles as devidas consequencias. (Apoiados.)

Este estado de cousas de 1884-1885 era tão grave; o governo regenerador foi obrigado a abandonar o poder em circumstancias tão extraordinarias e desfavoraveis que o digno par o sr. Hintze Ribeiro conheceu a necessidade de se defender, e não tiveram outro intuito os discursos de s. exa. nas sessões de 14, 15 e 16 de junho de 1887.

Foi especialmente no discurso de 16 de junho que aquelle digno par procurou explicar e até justificar a descida successiva e gradual dos fundos publicos, o mau catado do credito do estado.

As rasões dadas, a maior parte d'ellas, examinadas a sangue frio e placidez quasi nos fazem sorrir.

É notavel o que s. exa. disse para defeza sua, e explicação do que aconteceu n'aquella epocha, a qual (é preciso não o esquecer) o sr. ministro da fazenda escolheu para confronto (Apoiados.), e para que só não possa attribuir a lapso de memoria, ou a qualquer outra causa, menos exactidão da minha parte ao referir-mo aos discursos do digno par, o sr. Hintze Ribeiro, vou ler o que mais particularmente se liga a este assumpto.

Na sessão de 16 de junho de 1889 dizia s. exa.:

«Em todo o caso, desde que as cotações dos fundos tão notavelmente decresciam, com prejuizo para as transações financeiras e produzindo singulares embaraços ao commercio, era obrigação minha procurar combater os manejos da especulação, pondo-me ao facto das ocorrencias que mais contra nus actuavam lá fóra. Para isso pedi em julho do 1885, informações precisas á nossa agencia em Londres.
«Em 25 d'esse mez, quando a descida attingia a maxima intensidade, recebi da agencia o seguinte telegramma: Fragueza nossos fundos attribuida a receios cholera em Portugal em consequencia augmento flagello em Hespanha.
«É evidente, continuou o digno par, que esta informação me não podia satisfazer. A proximidade e os receios do cholera foram sem duvida, mais um elemento de adversidade, não só pela ameaça que pesou sobre nós, mas pelas restricções que fomos compellidos a adoptar.

Poderiam mesmo occorrer para a baixa que se dava mas não eram seguramente, a cauda determinante da descida que tão accentuadamente se manifestava.

«Em 29 de julho novo telegramma da agencia, esse dizia: A baixa attribue-se, segundo me consta, a vendas para entradas novo emprestimo egypcio.

«Tambem era um incidente; podia influir dentro de certos limites; mas não era, seguramente, o emprestimo egypcio que de 1 a 29 do julho de 1885 fazia baixar os fundos portuguezes de 45 1/4 a 43 1/8, e 43 3/8.

«Em 31 d'esse mez, finalmente, recebia eu da agencia a seguinte communicação: Consta-me que avultadas vendas só têem feito por conta do syndicato e bancos d'ahi.

«Isto sim, exclama o digno par, como quem encontra a chave do enigma, isto já me explicava a progressão da baixa.»

Como a camara vê, eu li fielmente o que o digno par, o sr. Hintze Ribeiro, expoz na outra casa do parlamento em 1887 para explicar a descida gradual e successiva dos nossos fundos, e as causas a que to pretende attribuir este phenomeno economico e financeiro; basta expol-as; não carecem hoje do refutação. (Apoiados.)

Demasiado é sabido de todos, que o credito é do paiz, (Apoiados.) mas não é menos certo, que a boa ou má gerencia dos negocios publicos, a boa ou má influencia, que os governos imprimem á administração do estado em periodo sufficientemente largo, concorro poderosamente para levantar e manter firme o credito publico, ou fazel-o oscillar e até baixar gradual e successivamente. (Apoiados.) Não raro acontece que o credito publico é um dos meios mais apropriados para distinguir os bons dos maus governos; as administrações previdentes, esclarecidas e discretamente fomentadoras da riqueza publica d'aquellas que o não são. (Apoiados.)

E para chegar a este resultado não careço, torno a repetir, de discutir, a theoria dos grandes homens, dos homens providenciaes sobre o destino dos povos. (Apoiados.)

E porque era má, excessivamente má, a situação economica e financeira de 1884-1885?

Não era isso um facto isolado, e só póde explicar-se na filiação dos factos occorridos de 1881, isto é; é preciso saber o que foi a gerencia regeneradora n'este largo periodo para poder explicar as attribulações do governo regenerador em 1885, attribulações que o obrigaram a abandonar o poder, pois que a sua permanencia n'elle seria um verdadeiro perigo nacional. (Apoiados.)

Senhor presidente. Já n'outra occasião disse n'esta casa, e ha já alguns annos, que um dos erros politicos das mais graves e funestas consequencias politicas para o paiz, fôra a guerra acintosa, cruel, desleal que se promoveu contra o partido progressista em 1880 e 1881. (Apoiados.)

Distinguiu-se n'essa guerra sem treguas o partido regenerador, e, por meios que não quero agora classificar, todos sabem que elle herdou o poder.

O governo progressista em 1880-1881, sem trahir ou renegar o seu programma, dedicára-se sobretudo á resolução da questão financeira.

A questão da fazenda era então, e será ainda por largos annos entre nós, a questão maxima da politica portugueza. (Apoiados.)

Ninguem duvida que o systema financeiro do governo progressista em 1880-1881 se caracterisou principalmente pelo imposto de rendimento. Não vou agora discutir esse imposto, mas hei de repetir n'esta camara tantas vezes quantas tiver ensejo para o fazer, que ainda não houve erro mais grave na politica portugueza dos tempos modernos, de que foi a guerra implacavel e obstinada contra a lei que pretendeu crear, ou organisar o imposto de rendimento. (Apoiados.)

Derribado o governo progressista, succedeu-lhe o governo regenerador presidido pelo sr. Antonio Rodrigues Sampaio, sendo ministro da fazenda o sr. Lopo Vaz, que folgo de

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ver presente, e por signal que o vejo muito risonho e prazenteiro. (Riso.)

Concluo que as cousas politicas vão bem, e por isso receba s. exa. as minhas felicitações. (Riso.)

A administração financeira de s. exa. n'aquella epocha tornara-se notavel por dois factos: uma portaria contra o phantasiado tyranno do real de agua, e uma operação de conversão. Mas o governo de então commettêra erro mais grave. Se o governo não trouxesse da rua e das manifestações da praça publica um verdadeiro mandato imperativo, não devia revogar a lei de 28 de julho de 1880 na parte que creava e organisava o imposto do rendimento. A suspensão da lei sem a maxima concessão que um governo discreto podia fazer ás exigencias de momento. Não teriamos um imposto, uma fonte de receita racional, e compensadora de tantas desigualdades, completamente desacreditada, e da qual fogem agora todos os ministros da fazenda. Fallo n'este assumpto, porque quero significar á camara que o partido regenerador é réu de uma grande culpa revogando a lei citada na parte, que entre nós creava e organisava o imposto de rendimento, e porque o sr. ministro da fazenda ainda hoje, no discurso que acabâmos de lho ouvir, se referiu ao imposto do rendimento, como sendo um imposto contra o qual se haviam insurgido os povos, e que por isso não podia entrar no seu plano financeiro.

O sr. ministro da fazenda, isto é, o sr. Lopo Vaz saiu do governo, e retirou-se para o seu Pathmos do Cartaxo.

É certo que á situação regeneradora, presidida pelo sr. Rodrigues Sampaio succedeu a situação regeneradora presidida polo sr. Fontes Pereira de Mello, e é para notar-se que o eminente homem d'estado e chefe do partido regenerador, escolhêra para si a pasta da fazenda.

Consultem-se as chronicas do tempo, e ver-se ha que se disse, repetiu e proclamou que a entrada do sr. Fontes para a pasta da fazenda, era o ultimo e mais assignalado serviço que este emerito estadista prestava ao paiz, porque isso equivale a dizer que a questão de fazenda ía ser resolvida de uma vez para sempre! O deficit seria extincto!

O que fez, porém, aquelle nobilissimo vulto politico? Qual o seu systema financeiro? Como e que resolveu de vez a questão de fazenda?

Todos o sabem. A iniciativa d'aquelle notavel homem de estado limitou-se ao expediente facil de lançar os addicionaes do 6 por cento, (percursores dos actuaes addicionaes do sr. ministro da fazenda), (Apoiados.) o tributo de 8 réis por litro sobre o sal importado, ou apurado nas salinas, lei de 1 do junho de 1882; (imposto que o governo progressista aboliu), (Apoiados.) elevaram-se os impostos sobre o assucar, sobre o petróleo, sobre os cereaes, sobro o chá, e pouco mais se fez.

Não julgue a camara, que eu faço historia para retaliações partidarias, ou para a distrahir do assumpto em questão. Careci de alludir a estes factos para chegar á conclusão de que o governo regenerador em 1880, periodo procurado pelo sr. ministro da fazenda para confronto, tinha provocado pelos erros da sua administração aquelle estado excepcional, que denunciava uma crise economica, e sobretudo financeira. (Apoiados.)

Saíu do ministerio da fazenda o sr. Fontes Pereira de Mello, sendo substituido pelo sr. Hintze Ribeiro.

Escuso repetir que o deficit não foi extincto, que a questão da fazenda não foi resolvida, e que a passagem do venerado e venerando chefe do partido regenerador pelo ministerio da fazenda não correspondeu ao pregão tão insistentemente feito, de que o ultimo e mais assignalado serviço que o sr. Fontes prestava ao seu paiz, ora escolher para si a pasta da fazenda. (Apoiados.)

O estado da fazenda não melhorou; aggravou-se de dia para dia. Não o affirmarei eu; as primeiras palavras do sr. Hintze Ribeiro, no relatorio e propostas de lei apresentadas á camara dos senhores deputados na sessão de 6 de fevereiro de 1886, são as seguintes: «Para a questão de fazenda converge ao presente a attenção e o interesse de todos os que têem a peito a prosperidade e o engrandecimento economico do paiz, e, como indispensaveis condições para isso, a estabilidade do seu credito, o augmento dos seus recursos, a segurança das suas transacções, e a manutenção dos fóros, que a tanto custo adquiriu, de nação honrada nos seus compromissos, activa e diligente no caminhar nas suas aspirações do progresso».

Estas palavras dizem tudo, e dispensam commentarios. (Apoiados.) Era assim que se exprimia o sr. ministro da fazenda em 6 de fevereiro de 1886, e tambem não reproduzo aqui as providencias, ou projectos de lei, que constituiam o plano financeiro, conhecido pelo plano financeiro de Canecas. (Apoiados. - Riso.)

Basta ao meu proposito chamar a attenção da camara para o estado da fazenda publica n'aquelle periodo da historia, que significava a continuação de quatro annos no poder do partido regenerador, para chegar á conclusão de que o sr. ministro da fazenda foi demasiado infeliz, muito precipitado e pouco reflectido, em procurar aquella epocha para confrontos e para descriminar responsabilidades partidarias. (Apoiados.) O sr. ministro da fazenda esqueceu-se um pouco das responsabilidades do cargo, e permittiu-se as liberdades de critica e de parcialidade como se fôra mero deputado. (Apoiados.) É preciso, pois, tornar bem patente a sua parcialidade e o seu erro, para que elle se não repita. (Apoiados.)

Devo agora, sr. presidente, fazer a analyse rapida da gerencia economica e financeira de 1888-1889, a ultima do ministerio presidido pelo illustre chefe do partido progressista. É o que fez, torno a repetir, o sr. ministro da fazenda, como se vê do relatorio paginas 8, 9 e 10, que estou discutindo. O que era, pois, essa situação, quer considerada pelo lado económico, quer considerada pelo lado financeiro?

O que era essa situação, repito, apesar do augmento das receitas e das despezas em proporção desigual, como tantas vezes tem repetido o sr. ministro da fazenda?

O que significavam, em relação ao famoso periodo de 1884-1835, procurado para confronto, as alterações operadas na situação orçamental durante a administração progressista?

As respostas a estas interrogações são por completo uma resposta decisiva ás apreciações apaixonadas do sr. ministro da fazenda, a refutação peremptoria do methodo seguido por s. exa., o qual se converteu n'uma espada de dois gumes, porque d'este confronto só resulta ficar o partido regenerador com as suas responsabilidades, descoberto e mal ferido. (Apoiados.)

Em 1888-1889 havia os sobresaltos, os receios, os retrahimentos manifestados em 1884-1885? (Apoiados.)

Em 1888-1889 as misericordias, os asylos, as creches temiam pelo seu futuro como em 1885? (Apoiados.)

Em 1888-1889 as associações que viviam o vivem do credito publico convocavam as suas assembléas geraes para reclamarem cautelas, dirigiam petições ao parlamento para que lhes fosse permittido exigir cauções em propriedade para as suas operações? (Apoiados.)

Os monte pios deliberavam nas suas assembléas a conveniencia de converter os seus capitães em titulos de credito de nações estrangeiras, como a França e a Inglaterra? (Apoiados.)

Ou, pelo contrario, em 1888-1889 não renasceu, não se fortaleceu a confiança publica? (Apoiados.)

Não acudiam em 1888-1889 as associações, os monte pios, retrahidos e desconfiados em 1885, a procurar emprego para os seus capitães nos titulos de credito nacional? ( Apoiados.)

Não se mantinha não só firme, mas não se elevava em 1888-1889 o credito, publico a proporções, ás quaes elle nunca tinha attingido? (Apoiados.)

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Não provam estes factos, contra todos as criticos superficiaes e apaixonadas, de que em 1888-1889 se confiava no desenvolvimento economico do paiz, desenvolvimento provocado por quatro annos de gerencia progressista? (Apoiados.)

Não significam estes factos, que a confiança publica via na situação financeira do paiz mais do que um artificio de momento, mais do que expedientes de occasião? (Apoiados.)

Agora permitia-me a camara, que eu aprecie alguns factos concretos, e bastar-me-hão dois para completar a minha demonstração.

De longa data vem os clamores da agricultura, da industria vinicola e industria cerealifera contra os poderes publicos. Ultimamente estes clamores, estes queixumes reuniram esforços, e tomaram um incremento notavel. Não farei agora a historia dos congressos agricolas. É de hontem; todos a sabem.

O que fez o partido, o governo progressista?

Deve-se á sua iniciativa a lei de 13 de julho de 1889, destinada a proteger o commercio e industria dos vinhos; e a lei de 15 de julho do mesmo anno estabelecendo o regimen do commercio dos cereaes.

Mas o que significam estas leis em protecção á agricultura? Significam um desfalque immediato nas receitas do estado.

A lei dos cereaes produziu em desfalque immediato cerca de 940:000$000 réis, e a lei protegendo a industria vinicola cerca de 400:000$000 réis. Tudo isto quer dizer, que em 1889 o governo progressista só com estas duas leis, protegeu a agricultura em 1.340:000$000. (Muitos apoiados.)

Aboliu o governo progressista o imposto do sal cujo rendimento, segundo os calculos do sr. Hintze Ribeiro, fôra no anno de 1884-1885 de 152:872$360 réis e aboliu-o porque este importo é dos mais odiosos, chamado por boas auctoridades um verdadeiro imposto de guerra. (Apoiados.)

Não quero, para não alargar este meu discurso, referir-me a outras economias, a outras reducções importantes das despezas publicas, e bom assim a augmentos do despezas publicas destinadas a proteger a agricultura e a melhorar a organisação de serviços publicos.

Mas, postos assim os factos, pergunto á camara se o governo regenerador podia fazer em 1885 o que fez o governo progressista em 1889? (Apoiados.)

Podia o governo regenerador em 1885 dar satisfação aos clamores da agricultura, protegendo-a em mais de réis 1.300:000$000? (Apoiados.)

Podia o governo regenerador em 1885 privar-se de uma receita tão importante? (Apoiados.)

Podia abolir o imposto do sal?

O que pretendia o governo regenerador em 1885?

Unicamente, exclusivamente augmentar as receitas publicas por meio de impostos. (Apoiadas.)

Se o governo regenerador em 1885 pensasse em proteger qualquer industria do modo que essa protecção traduzisse desfalque nas receitas publicas, seria tido por louco rematado. (Apoiados.)

Pois o que não pôde fazer, o que não podia fazer, o governo regenerador em 1885, fel-o o governo progressista em 1889. (Apoiados.) E pôde fazel-o som perigo e sem sustos; e póde fazel-o sem que o credito publico se resentisse, sem que a confiança publica se sobresaltasse. (Apoiados.) Pôde fazel-o, pelo contrario, vendo o credito publico cada vez mais firme, a confiança do paiz cada vez mais segura e resoluta. (Apoiados.)

E assim, sr. presidente, tenho completado a minha demonstração, e poderei dizer que o sr. ministro da fazenda procedeu levianamente, e foi tão injusto, quanto infeliz nos confrontos que fez no seu relatorio, e de tudo o que fica exposto tambem posso concluir, como já disse mais de uma vez, que as alterações operadas na situação orçamental durante um certo periodo não é sufficiente para conhecer a situação economica, financeira e politica d'esse periodo. (Apoiados.)

Vou agora referir-me ao que disseram alguns oradores d'esse lado da camara, e quero ainda dirigir-me designadamente ao sr. ministro da fazenda.

Não quero, porém, passar adiante, sem responder ao illustre deputado, duas vezes meu collega, o sr. Campos Henrique. Não é mero cumprimento o dever de o felicitar; é preito sincero ao merito. (Apoiados.) Acceite, pois, o meu illustre collega, cordiaes e sinceros parabens, pela sua mais do que auspiciosa estreia parlamentar. Elle foi em verdade brilhante, mas não foi superior ao que era licito esperar do seu provado talento, bom senso, e, direi até, da sua excessiva modestia. (Apoiados.)

Feito o cumprimento, que é sincero, permitta-me a critica, que é não menos sincera.

O illustre deputado foi demasiado injusto para com as reformas judiciaes do meu amigo o correligionario o sr. Francisco Beirão.

Parece que d'esse lado da camara ha como uma maçonaria ajuramentada a dizer mal das reformas d'aquelle illustre ex-ministro da justiça. A creação dos julgados municipaes é objectivo de todas as criticas.

E todavia, os julgados municipaes são já um defuncto illustre. Para que, pois, tamanhas iras? (Apoiados.) Ha, porém, manifesta injustiça da parte dos illustres deputados. Em primeiro logar, não é verdade que essa instituição, aliás tão funesta no dizer dos illustres deputados, deixasse de existir. (Apoiados.) As criticas feitas agora a essa instituição, atacam antes o governo, designadamente o sr. ministro da justiça. (Apoiados.)

O governo assume a dictadura; organisa os serviços judiciaes mais ou menos; substitue-se em tudo ao parlamento. E sendo assim, porque não exterminou a nefasta instituição dos juizes municipaes? (Apoiados repetidos.)

Pois esta instituição nefasta, tão contraria á boa administração da justiça, ainda está de pé, depois que o governo se constituiu em poder omnipotente e omnimodo? (Apoiados.)

ão chego a comprehender estas criticas, a não ser que indirectamente se queira indicar aos dictadores, que n'esta parte, foram timidos em frente de monstro tão assignalado. (Apoiados.)

Sejamos, porém, justos e rasoaveis. A creação dos juizes municipaes, isoladamente considerados, não se justificaria talvez, mas esta reforma presuppõe a reforma completa da organisação judicial. (Apoiados.)

Não duvidam os illustres deputados, que essa reforma não pôde ser lei do paiz por motivos que agora julgo inutil expor. Em todo o caso, a justiça e lealdade exige, que as reformas da iniciativa de um ministro qualquer que elle seja, não se interpretem isoladamente. (Apoiados.)

O que eu lamento, e sempre lamentarei, é que, em periodos normaes, só façam reformas judiciaes em dictadura, (Apoiados.) e lamento que collegas tão distinctos, reputações tão aureoladas na vida publica, ponham a auctoridade do seu voto e da sua palavra ao serviço de dictadores judiciaes. (Apoiados.)

Não conheço maior perigo social.

A independencia do poder judicial, garantia essencial para julgar da vida e honra dos cidadãos, póde desapparecer de um para outro momento. (Apoiados.)

Assusta-me esta possibilidade, de que um dictador possa aniquilar um dos poderes do estado, porque o mesmo é que cercear-lhe a independencia, ou regulal-o de modo que elle não possa resistir ás invasões do poder executivo. (Apoiados.)

Uma voz: - O decreto de 29 de junho de 1886 não foi dietadura?

O Orador: - Em primeiro logar não preciso dizer

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qual a minha opinião individual relativamente ao decreto de que se trata, e á opportunidade da sua publicação. A minha opinião é que, em epochas normaes, de todas as dictaduras a que mais detesto, e a que reputo mais perigosa, é aquella que se applica ao poder judicial. Em segundo logar, renovo a minha argumentação perante os illustres deputados que me interrompem. Porque não condemnam o illustre ministro da justiça, que, assumindo a dictadura, deixou o monstro ainda vivo, e com esperanças de vida por largo tempo? (Apoiados.)

Parecia me, pois, o silencio dos illustres deputados mais discreto, e talvez mais justificado do que as criticas acerbas, tantas vezos manifestadas por esse lado da camara. (Apoiados.)

Não pareça que eu sou defensor do tal instituição. Não liou; mas isso não me inhibe de dizer que a critica tem sido severa e injusta, principalmente porque se isola aquella reforma de outras, que ella presuppunha. (Apoiados.)

Não creio, como se afigurou ao illustre deputado, a quem respondo, que o juiz municipal esteja na dependência da camara municipal. Esse é o lado secundario da questão. Mas para sermos em tudo justos, e não o seremos sem respeitar as opiniões alheias, é preciso não occultar que a instituição tem muitos defensores, que muitas corporações municipaes, essencialmente democraticas, as reclamaram e reclamam e sustentam ainda. (Apoiados.}

É agora a occasião para me referir a outro facto importante do discurso do illustre relator do projecto, porque tenho a honra de ver diante de mim o illustre deputado o sr. Pinheiro Chaves.

Careço de acarear s. exa. com o illustre relator do projecto em discussão, e com o sr. ministro da fazenda, n'um ponto capitalissimo.

Chamo para o que vou expor a attenção da camara.

O sr. Campos Henriques, querendo desvanecer o mau effeito do augmento da despeza com as providencias dicta-toriaes de caracter guerreiro, disse que não havia motivos para sustos, porque ellas só se fariam mais tarde. O sr. ministro da fazenda tambem asseverou que taes providencias não foram promulgadas na expectativa de uma guerra imminente. O contrario d'isto escreveu o sr. Pinheiro Chagas no seu primeiro relatorio, defendendo o bill. Ahi a hypothese da guerra era mais que imminente; era quasi segura.

E assim vê a camara que ha divergencia n'um ponto importantissimo. (Apoiados.}

De que lado está a verdade? O que posso affirmar á camara é que a hypothese da guerra podia ser, ou deixar de ser imminente, o que é seguro, o que é tristemente certo é a enorme, a fabulosa despesa, que as chamadas providencias de defeza e de guerra vão custar ao paiz. (Apoiados.) Essa despeza é tamanha, que é impossivel calculal-a, mas ninguém a reputa inferior a 30.000:000$000 reis

O que agora vou expor á camara confirmará que não são infundadas estas apprehensões, e que o paiz está ameaçado de succumbir em frente de tão collossaes despendios. (Apoiados.)

Sr. presidente, o bill ainda não é lei do paiz, isto é, ainda não são lei do paiz os decretos dictatoriaes.

Parecia, pois, mais correcto e seria certamente mais prudente, que só depois do governo ser relevado da responsabilidade, em que incorreu, elle pensasse em dar execução a todos, a parte dos decretos dictatoriaes, segundo as circumstancias do paiz, - quer da politica interna, quer da politica internacional. Pois quer a camara saber o que o governo fez em relação a um dos decretos do ministerio da marinha, aquelle que s.e refere á compra e acquisição de cruzadores?

Posso asseverar á camara, que o governo não só fez convite ás differentes casas constructoras, mas recebeu já differentes propostas; nomeou a competente commissão para as examinar, e consta-me que ella já deu o seu parecer sobre este gravissimo assumpto.

Ahi tem a camara a demonstração concisa em como as providencias de caracter militar e de marinha são adiadas para mais tarde. (Apoiados.) A pressa é tal, que nem ao menos se espera que os decretos dictatoriaes sejam lei do paiz, (Apoiados.) e sob o ponto de vista constitucional escuso de encarecer o facto.

De ante-mão se conta que o parlamento approve tudo, chancelle tudo. (Apoiados.)

Peço agora a attenção da camara, porque vou expor-lhe a eloquência das cifras. O governo propõe-se, contra as declarações do sr. relator, a compra immediata de quatro cruzadores. Houve cinco propostas, que vou especificar. É a primeira proposta (por ordem alphabetica) de Cramp... com o preço total de cada navio 1.422:900$000 réis, que multiplicado por quatro dá a quantia total de 5.691:000$000 réis.

A segunda proposta é de Forges... com o preço total cada navio de 1.248:333$315 réis, o que dá o total de 4.993:333$315 réis.

A terceira proposta é de Germanio... com o preço total de cada navio de 1.248:333$315 réis; o que dá o total de 4.993:333$260 réis.

A quarta proposta é de Orlando... com o preço total de cada navio de 1.034:333$260 réis, dá a somma total de 4.437:333$260 réis.

A quinta proposta é de Vulcan... com o preço total de cada navio 1.197:000$000 reis, que dá a somma total de 4.788:000$000 réis.

Estes algarismos, como já disse, são de si eloquentes. (Apoiados.) Só para quatro cruzadores, e isto é uma parcella minima das despezas projectadas, temos uma despeza que se approxima de 6.000:000$000 réis, e que na melhor hypothese não é inferior a 5.000:000$000 réis.

Não é isto assombroso? Não se assustam os senhores ministros? (Apoiados.)

E a nomeação da commissão, o convite às casas constructoras, e tudo o que se relaciona com este assumpto, será para tingir? Será isto o que se chama adiar para mais tarde os encargos d'esta abominavel dictadura? (Apoiados.)

Não é, infelizmente, para fingir que tudo isto se faz. Agora a camara deduza as devidas consequencias, e d'este facto conclua para o resto. (Apoiados.)

(Entra na sala o sr. ministro da fazenda.)

A hora vae muito adiantada e por isso não repito o que acabei de expor á camara. O sr. ministro da fazenda o lerá no extracto ou no Diario das sessões, se quizer dar-se a este trabalho.

Agora, sobre este facto, direi sómente que sinto não ver presente o meu illustre amigo e correligionario o sr. Emygdio Navarro, que em uma das ultimas sessões disso aqui, que o seu espirito não se sobresaltava com o receio de que os decretos de dictadura, pelo que respeita ás despezas de guerra e da marinha, fossem uma realidade, emquanto o actual sr. ministro da fazenda se conservasse nos conselhos da corôa.

Sinto dizer-lhe que se enganou; porque os factos por mim expostos não se prestam a esse voto de confiança pessoal. Ou tudo o que já fez o ministerio da marinha é uma simulação, e eu repillo essa hypothese, ou então o sr. ministro da fazenda não póde engeitar a responsabilidade do seu collega. (Apoiados.)

E esta hypothese é a unica admissivel e talvez como resposta indirecta ao voto de confiança pessoal do sr. Emygdio Navarro, a camara terá notado, como eu tenho muito particularmente notado, que os ultimos discursos do sr. ministro da fazenda se distinguem pela enthusiastica defeza das despezas de caracter militar e guerreiro. S. exa. já se não lembra que, em certo modo, concordou com o relator da commissão. Agora approxima-se mais do sr. Pinheiro Chagas. E como esta hypothese é aquella que mais prejudica o paiz e aggrava a situação do contribuinte, pela mi-

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1044 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nha parte não soffro surpreza alguma. O meu amigo Emydio Navarro é que deve ficar tristemente desenganado. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu confesso que tambem cheguei a ter alguma esperança de que os decretos do dictadura, pelo que respeita ás despezas de marinha e defeza do porto e Lisboa, não teriam prompta e immediata applicação; mas, pelo que respeita propriamente aos decretos que se referem á, reforma do nosso exercito, nunca duvidei de que seriam em breve uma realidade.

O que essas reformas hão de custar ao paia terá elle occasião de o saber em futuro não muito remoto; ha do sabel-o praticamente, quando praticamente tiver do pagar. (Apoiados.)

Eu nunca tive illusões a este respeito.

Estou convencido, apesar da hypothese de guerra do sr. Pinheiro Chagas, que os dictadores nunca acreditaram n'ella, mas aproveitaram hábil e soffregamente o ensejo para chegar aos seus fins.

A força occulta, que aliás é conhecida de todos, e que dirigiu o pulso do ur. ministro da guerra; a força occulta que intimou pana dia e hora certa a demissão do sr. Vasco Guedes de ministro da guerra; essa forca oculta é a mesma que lhe imporá a realidade das reformas militares. Não são pois decretos platonicos, creia-o a camara. (Apoiados.) E, de mais, não haveria commissões de vigilancia ao lado do sr. ministro da guerra sómente para o contemplar. (Apoiados.)

Este assumpto ainda não foi devidamente discutido, e devia sel-o.

Oxalá que os factos me não dêem rasão em epocha alguma, mas estou convencido de que peior ainda do que todas as dictaduras, ha o precedente da demissão do sr. ministro da guerra Vasco Guedes.

Supponho que a camara me comprehende, e eu não quero agora dar maior desenvolvimento a este facto. (Apoiados.) Fica registada a minha opinião apenas.

Sr. presidente. O sr. ministro da fazenda para justificar os meios empiricos de que usa para augmentar a receita, não teve duvida em declarar que o povo não acceita a remodelação de impostos. Referiu-se ao imposto de rendimento no tempo da gerencia do sr. Barros Gomes, citou as resistencias aos projectos do sr. Hintze Ribeiro em 1885, e não esqueceu as tentativas infructuosas do sr. Marianno de Carvalho no aperfeiçoamento no systema de cobrança e boa fiscalisação do imposto.

Estes exemplos fazem do sr. ministro um empirico, ou um sceptico. Eu já me referi hoje a alguns d'estes factos, e agora, vendo o desprezo, o verdadeiro abandono do parlamento, quando se discutem as questões mais graves, mais vitaes para os interesses publicos, direi ao governo que o maior culpado não é o povo.

Temos progredido muito no que se chama decadencia do systema parlamentar, e muito pouco em resistencias populares. (Apoiarias.) Não comprehendo, pois, os sustos do governo. (Apoiados.)

Deixe o illustre ministro em paz as resistencias populares para se justificar da completa ausência de systema financeiro, que os seus projectos indicam.

O povo não rejubila, não consente, não resiste ás imposições do estado; murmura e soffre. (Apoiados.)

Já vê o sr. ministro da fazenda que, pela minha parte, não deploro, não lamento as chamadas resistências populares e lamento muito a decadência parlamentar, que se accentua de dia para dia, a qual fatalmente terá como resultado as resistencias populares verdadeiras, porque serão sinceras, porque serão justificadas. (Apoiados.)

Na decadencia do systema parlamentar não discrimino responsabilidades; caracteriso os progressos assignalados. Desde 1851 até 1880 tres vezes o poder executivo cobrou impostos em dictadura. Estes factos correspondiam a tres datas anormaes ou revolucionarias.

Em 1881, conhecido o proposito do governo regenerador prescindindo arrogantemente do orçamento e da lei de meios, a camara dos senhores deputados ainda deu signal de vida, ainda luctou pelas prerogativas parlamentares. Todos sabem que foi enviada uma mensagem á corôa, para que as camaras não fossem dissolvidas sem que se votasse o orçamento, e para o que seriam precisos apenas poucos dias de prorogação.

A resposta á mensagem dos eleitos do povo, não se fez esperar: foi um decreto da dissolução, prompto, immediato, como se a camara popular tivesse praticado um facto revolucionário. (Apoiados.) Foi consultada a alta magistratura politica, e esta, por maioria, aconselhou a corôa a responder com um decreto de morte, quando a camara pediu que a constituição fosse respeitada. Tambem se dizia n'aquella epocha, como se diz agora para justificar a dictadura, que era mister mostrar ao paiz que o governo tinha força. (Apoiados.)

O poder executivo, n'uma epocha normal, poz de lado todas as apparencias de legalidade, e investiu-se na faculdade de cobrar impostos sem intervenção do poder legislativo. Houve, em seguida, uma lucta eleitoral violenta, de verdadeiro exterminio, (eu fui victima d'essa lucta; fui espoliado; não fui vencido) mas não houve as chamadas resistencias populares.

E digo á camara profundamente convencido, que o partido progressista errou em trocar as resistencias populares pela lucta legal dos partidos. (Apoiados.)

Veiu depois a dictadura de 19 de maio reformando o exercito; vieram as dictaduras do partido progressista, e por ultimas as dictaduras do actual governo, que no seu conjuncto, financeiramente, nas suas consequencias proximas e remotas, completa a nossa ruina, politicamente, a nossa degradação civica e politica. (Apoiados.)

Em tempos não muito remotos o direito de petição, largamente exercido, era um indicador constitucional, e se não derribava situações, exercia uma influencia decisiva na governação do estado. (Apoiados.)

N'outros tempos, se os governos exerciam a dictadura obrigados por circumstancias extraordinarias, considerava-se uma prova de alta dedicação partidaria o encargo de relator para defeza, do governo, e a defeza era grave e sobria. Agora observam-se assombrosos progressos n'este assumpto. Os ministros mais benemeritos são aquelles que mais opprimem, que mais cerceiam as liberdades, as immunidades parlamentares. (Apoiados.) O que se lamenta não é a dictadura; pranteia-se que ella não fosse ainda mais larga, mais completa. (Apoiados.)

Manifestaram-se no parlamento verdadeiras tristezas, porque a gargalheira nos não estrangula de uma vez, porque a grilheta nos não tira do todo o movimento. (Apoiados.) O que se tem dito no parlamento faz-me recordar o que diziam as colarejas da praça da Figueira, nos bons tempos do sr. D. Miguel, quando bradavam e o acclamavam, dizendo: Queremol-o assoluto! (Muitos apoiados.)

Em tempos não muito remotos, o relator de um projecto de lei sobre instrucção publica, que declarasse no parlamento que a univeridade de Coimbra tinha cristallisado na idade media, alvorotava toda a cidade de Coimbra, o claustro pleno reunir-se-ía sem demora, e o ministro que não defendesse aquelle venerando instituto, não seria lá recebido se a ellc pertencesse. Agora ouve-se tudo, e muito mais, e a defeza consiste, quando muito, n'um encolher de hombros! (Apoiados.)

Estes factos, e outros que não quero accumular constituem mais do que um symptoma, são mais do que tristes apparencias. (Apoiados.)

E todavia, ha um erro grave da parte d'aquelles, que julgam mortos os sentimentos liberaes, indifferente a consciencia publica, e já triumphante o systema opposto, o regimen absoluto. (Apoiados.)

Illudem-se os que assim pensam. As conquistas da li-

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SESSÃO NOCTURNA DE 4 DE JULHO DE 1890 1045

berdade não ha já quem as possa destruir, o retrocesso ao predominio exclusivo e absoluto é impossivel. (Apoiados.)

Mas então o que significam tantos factos accumulados, tantas dictaduras repetidas, ao lado de tanta indifferença publica, ao lado de completa falta de resistencias populares?

Eu digo á camara o que ha; eu digo á camara qual é a impressão que fica no espirito d'aquelles que conhecem os homens, e só os conhece quem os lida. E é preciso que eu diga a verdade, porque como verdade tenho o que observo no contacto com os povos.

Á formula geral, synthetica, que define e caracterisa a crença geral, é que os meios regulares e constitucionaes são jã de todo inuteis. (Apoiados.)

Não se exerce senão escassa e tardiamente o direito de petição, porque poucos acreditam na efficacia d'elle; os partidos constitucionaes póde dizer-se, que abandonaram as manifestações populares pacificas, os comicios, porque tambem já perderam a fé n'este meio de propaganda. E isto é um grande mal; é o peior symptoma d'esta epocha. (Apoiados.)

É preciso que todos, os que amâmos as instituições vigentes, meditemos n'estes symptomas, que são uma quasi revellação. (Apoiados.)

Pense n'isto o governo, e não se enthusiasme com os seus faceis triumphos parlamentares.

Note bem, reflicta bom, que ha uma corrente, que todos os dias engrossa, que proclama como inuteis, como inefficazes, os meios regulares e normaes para restituir o regimen representativo á sua antiga pureza o esplendor. (Apoiados.)

Sr. presidente. Poderá parecer estranho, que ainda me não referisse directamente á proposta ministerial em discussão, mas n'esta parte eu estou de accordo com o sr. ministro da fazenda na resposta, que hoje deu ao meu amigo e illustre deputado, o sr. Fuschini.

A defeza ou a condemnação da proposta ministerial reduz-se a pouco, formula-se em poucas palavras.

Inquirir a desigualdade dos addicionaes com relação a cada um dos impostos sobre que elles vão incidir, póde ser, é com effeito, um estudo de largo folego, e que se presta às mais largas e eruditas dissertações. Apreciada, porém, a proposta, como expediente financeiro, defende-se ou condemna-se em poucas palavras.

O sr. ministro da fazenda foi, n'esta parte, claro e logico. As resistencias populares tornam impossivel as remodelações sobre impostos, e alludiu, como eu já disse, ao imposto do rendimento, ás propostas de Canecas, e ás tentativas do sr. Marianno de Carvalho Por outro lado, o sr. ministro da fazenda tem absoluta carencia do dinheiro; carece de augmentar as receitas, falta-lhe o credito, e augmenta as despezas. N'estas condições, lembrou-lhe o que occorreria a toda a gente, o addicional sobre todas as contribuições existentes.

Não procurem outras rasões, que as não ha. (Apoiados.) Os que impugnam este expediente tambem precisam dizer pouco para o condemnar implacavelmente. O addicional sobre as contribuições existentes, já tantas vezes repetido, aggrava todas as desigualdades existentes, torna quasi impossivel a subsistencia das classes menos favorecidas da fortuna. (Apoiados.) Na theoria de um imposto unico, o addicional não teria grandes inconvenientes, ou os inconvenientes seriam faceis de prever; mas com as multiplicidades de impostos que nós temos, alguns dos quaes já de si tão exaggerados, que difficilmente se podem pagar, o addicional excede tudo o que ha de desigual e iniquo. (Apoiados.)

A formula, ou a incidencia do imposto n'estas condições é cega, é deshumana, é brutal. (Apoiados.)

O imposto póde justificar-se como uma troca de serviços entre o contribuinte e o estado; contraria todos os principios de igualdade, de proporcionalidade, de equidade distribuitiva, que o justificam aos olhos do contribuinte, como uma verdadeira necessidade social. (Apoiados.) É ainda para temer que este systema medre e fructifique. Tudo se reduz-a calcular de um lado as receitas, de que ha necessidade, e do outro lado até onde devem subir os addicionaes. (Apoiados.)

Ora isto é tão monstruosamente empirico, e chega a resultados tão iniqnos e desastrados, que basta expol-o. A refutação é amesquinhar a intelligencia humana. (Apoiados.)

É por isso que a proposta ministerial restrictamente apreciada não se presta a grandes commentarios; duas palavras a condemnam: é iniqua e deshumana. (Apoiados.) A camara, porém, está certamente lembrada, de que por accordo de todos os partidos se escolheu esta proposta para ao mesmo tempo se discutir todo o plano financeiro do governo, para se discutirem e derimirem as responsabilidades de todos os partidos. (Apoiados.)

Foi esta a declaração feita pelo meu amigo e correligionario o sr. Ressano Garcia quando discutiu o orçamento rectificado. (Apoiados.)

E por isso que todos os oradores, de todos os lados da camara, e o proprio governo, têem discutido amplamente a questão politica, e a questão financeira a proposito do projecto de lei sobre addicionaes.

Recordo estes factos para minha defeza. (Apoiados.) A prova mais completa, que eu podia dar, se precisasse de justificar-me, seria lembrar á camara o variado e largo discurso de hoje, proferido pelo sr. ministro da fazenda em resposta ao illustre deputado sr. Fuschini. (Apoiados.)

Supponho que está a dar a hora, e por isso vou pôr termo ás minhas considerações.

Disse da minha justiça e da justiça do partido progressista o que soube, e o que me parece bastante, para convencer a camara, de que tem sido injustamente criticado, (Apoiados), e parece-me ter demonstrado tambem que o sr. ministro da fazenda foi verdadeiramente infeliz nos confrontos, que fez. (Apoiados.)

A experiencia ha de tornal-o mais reflectido, e convencel-o-ha de que a politica aggressiva por parte do poder é principalmente fecunda em desastres para os ministros que a usam. (Apoiados.)

De tudo que deixo exposto, repito o que já disse, e que se synthetisa na seguinte formula: O conjuncto das providencias dictatoriaes e das que estão ainda dependentes de sancção parlamentar, serão n'um futuro mais ou menos proximo, a nossa ruina financeira, e politicamente constituem a nossa quasi degradação civica, porque as tolerámos e soffremos.

Tenho concluido.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos senhores deputados.)

Leu-se na mesa a seguinte:

Moção

A camara, lamentando que o governo, pelos actos da sua imprevidencia governativa, seja obrigado a pedir ao paiz sacrificios tributarios, por forma tão desigual e iniqua, passa á ordem do dia. = Eduardo José Coelho.

Foi admittida.

O sr. Presidente: - A hora está a dar.

A ordem do dia para amanhã é a continuação da que estava dada.

Está levantada a sessão.

Era quasi meia noite.

Rectificação

Na sessão de 2 de julho, a pag. 990, discurso do sr. deputado Manuel de Arriaga, onde se lê «tendo sob essa paixão o ferir», deve ler-se «tende sob essa paixão a ferir».

O redactor = S. Rego.

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