1116 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
fazer honra á nunca assás celebrada competencia financeira do sr. ministro da fazenda.
O regimen de mistificação em que vivemos exige que no orçamento se descreva um saldo? É simples, sr. presidente; excluem-se do orçamento as verbas que correspondam a despesas determinadas e apparece um saldo.
Eu acho extraordinario que o saldo seja tão pequeno, porque, se o sr. ministro da fazenda e a commissão do orçamento se têem lembrado de tirar toda a despeza, tinham um saldo de 51:000 contos de réis! (Apoiados.)
Mas digo, exclue-se do orçamento a verba de despezas determinadas e de certo apparece um saldo.
Mas para que imaginam v. exas. que foi o saldo? Para pagar as despezas das verbas cortadas no orçamento!
Já viram cousa mais extraordinaria do que esta?!
Póde-se lá exigir mais de um ministro da fazenda!
Mas então é caso para se voltar as costas ao povo, por ingratidão, e recolher-se a penates!
Que é que v. exa. vê, sr. presidente?
Se v. exa. abrir o orçamento e ler o respectivo relatorio da commissão encontra, a pagina 30, o seguinte.
(Leu.}
Quer dizer, que a commissão do orçamento, como já tinha feito o sr. ministro da fazenda, cortou 1:600 contos de réis, evidentemente porque queria avolumar esta cousa que se chama saldo!
Mas o mais extravagante encontra-se no artigo 8.° da lei da receita e despeza, que diz (cousa curiosa!) o seguinte.
(Leu.)
Aqui vê v. exa., sr. presidente, que a commissão do orçamento, com o sr. ministro da fazenda por outro lado, arranjaram approximadamente um saldo de 1:600 contos de réis. E para que? Para gastar nas despezas cortadas do orçamento!
Eu tenho muita consideração ainda por uma velharia que se chama «syetema parlamentar«, com todos os seus defeitos, que são muito grandes, que são enormes, porque, se não fosse isso, sr. presidente, eu diria a v. exa. que isto não se faz, que isto não é serio!
Mas o que foi então que se fez? A commissão do orçamento eliminou da despeza 100 contos de réis destinados a material para laboração das officinas do arsenal de marinha!
Oh! sr. presidente, eu tenho porventura alguma duvida de que essa despeza se ha de fazer? Nenhuma. (Apoiados.)
Basta-me só a circumstancia de que a propria commissão do orçamento, assim como o sr. ministro da fazenda, resolvem na sua alta sabedoria que esta despeza continúa a pagar-se pelo saldo, o como ha já um saldo positivo de 1:900 contos de réis, é claro que essa despeza continúa a fazer-se, e continúa porque ha trabalhos no arsenal de marinha que se mantêem e d'ahi a necessidade do mesmo despendio do material.
A mesma cousa se póde dizer com relação á verba de 55 contos de réis destinados á continuação dos trabalhos de transformação do arsenal. Estes trabalhos continuam e consequentemente a despeza continúa tambem a fazer-se.
Ha só uma cousa a fazer, se é que ha alguma seriedade na organisação do orçamento, é passar para a despeza essas verbas de 100 e 55 contos de réis.
Da mesma fórma, relativamente ás missões e limitações de fronteiras, 45 contos de réis.
Pois as missões e delimitações de fronteiras não continuam? Não estamos nós tendo todos os dias noticia de que Pedro, Paulo, Sancho, Martinho foram em commissão para a provincia de Moçambique, para a Lunda em trabalhos de delimitação?
A verdade é que as despezas se mantêem, e á face dos verdadeiros principios de contabilidade publica não ha rasão nenhuma para que esta verba não venha para o respectivo capitulo de despesa. (Apoiados.}
Vamos ao deficit das provincias ultramarinas.
Eu estou fallando com a maior sinceridade e boa fé. As propostas de reducção de despeza que eu mandei para a mesa, embora partissem de um modestissimo soldado do meu partido, do mais modesto membro d'esta camara, affirmo-o a v. exa., trouxeram-me grandissimo desgosto.
Com a sinceridade e vivo desejo de que o orçamento fosse organisado de maneira que deixasse de ser uma burla como até aqui, apresentei um grande numero de propostas de redacção de despeza, e com essa mesma sinceridade estou faltando n'esta occasião em que aprecio o parecer da illustre commissão do orçamento.
Pergunto eu: é ou não um facto que as provincias ultramarinas apresentam, um deficit que vae de 700 a 800 contos de réis? Ha alguma duvida a tal respeito? Tem-na alguém? Ha alguem que tenha a coragem de fazer n'esta casa a affirmação de que as provincias ultramarinas não tenham um deficit que deva oscillar entre essas duas verbas? Disse-o o sr. Villaça.
Ao tocar hontem n'este ponto dizia-nos s. exa. que o sr. ministro da marinha está revendo o orçamento das provincias ultramarinas e que ha de empregar todos os esforços para que o deficit d'essas provincias seja reduzido.
Se não o fôr, é claro que não tem outro remedio senão pagal-o.
Mas estão reduzidas as despezas hoje? Que me importa a mim que ellas se reduzam no papel, que o sr. ministro esteja com um ou outro funccionario estudando a maneira de reduzir essas despezas, se, como nós todos bem sabemos, as despezas nas provincias ultramarinas estão a augmentar de dia para dia?
Ainda hontem aqui se apresentou um parecer, auctorisando o governo a contrahir um emprestimo de 400 contos de réis para caminhos de ferro no ultramar, de que se ha de pagar juros e creio bem que esses juros hão de ser pagos pelos cofres das provincias ultramarinas.
Não ha duvida de que o orçamento das provincias ultramarinas acusa um deficit de 700 contos de réis, e só para nos illudirmos uns aos outros é que poderemos ir tirar á despeza essa verba de 700 contos de réis, porque de contrario ella tem necessariamente de ser mantida.
Construcção e grandes reparações de estradas. Elimina-se a verba de 700 contos de réis!
Em primeiro logar deixe-me dizer a v. exa. que eu por modo nenhum concordaria em que esta verba se eliminasse, e note v. exa. que o meu campanario não traz nenhuma estrada em construcção; mas entendo eu que a eliminação d'essa verba representa uma desigualdade que não se póde justificar.
Dentro da area do municipio de Lisboa gastam-se centenas e centenas de contos de réis em obras inuteis, e v. exas. querem que nas provincias nem um unico real se gaste em estradas; v. exa. querem que aos operarios de Lisboa não falte trabalho e para os operarios da provincia querem o desprezo e a fome!
Isso não póde ser.
Se ha circumstancias de ordem publica que fazem com que se garanta o trabalho aos operarios em Lisboa, as mesmas circumstancias devem prevalecer com os operarios das provincias.
Não ha rasão nenhuma para esta desigualdade, e eu, sr. presidente, francamente o declaro, nunca darei o meu voto para a eliminação d'esta verba, não só porque é de toda a conveniencia dar trabalho aos operarios, como porque, na occasião em que todos reconhecemos que é necessario fomentar a riqueza agricola do paiz, não se póde por no desenvolvimento das vias de communicação.
Pois então acredita alguem que se cortarão no orça-