1523
Bases para a reorganisação das matas do estado e da arborisação geral do paiz
CAPITULO I Matas do estado
Artigo 1.° Todos os terrenos situados na zona do litoral desde a foz do rio Minho até á do Guadiana, sobre 6 kilometros de largura constituirão o dominio florestal do estado.
§ 1.° São exceptuados os terrenos de qualquer modo aproveitados, pertencentes a particulares, bem como os que servirem de logradouro publico ás povoações, comprehendidos na zona do litoral a que se refere este artigo.
§ 2.° Os terrenos incultos situados na referida zona pertencentes aos municipios, ás parochias e aos particulares que de qualquer modo não forem aproveitados durante cinco annos, a contar da publicação d'esta lei, serão encorporados no dominio florestal do estado, precedendo indemnisação.
§ 3.° Farão tambem parte do dominio florestal do estado os terrenos situados nas margens e valles dos rios navegaveis, quando não pertençam ao dominio particular, municipal ou parochial, e no caso de pertencerem ser-lhes hão applicaveis as disposições do § 2.º se a utilidade publica o exigir.
Art. 2.° Todas as propriedades florestaes que actualmente estão encorporadas na administração das matas do reino e que não ficarem pertencendo, em vista das disposições do artigo antecedente e seus §§, ao dominio florestal do estado, serão alienadas pela fórma que o governo julgar mais convenientes.
§ 1.° Exceptua-se d'esta disposição a mata do Bussaco, para ser conservada e administrada pelo governo.
Se a alienação se verificar por aforamento serão preferi das as camaras municipaes e as juntas de parochia, e n'este supposto o governo prescindirá da hasta publica, convencionando com aquellas corporações uma rasoavel taxa de fôro.
§ 3.° Na carta de emprazamento impor-se-ha aos foreiros a obrigação de seguirem, na exploração das matas aforadas, as regras de silvicultura, indispensaveis para a sua conservação o melhoramento.
§ 4.° Se ao foreiro convier a substituição da cultura florestal, por outra qualquer cultura, sómente poderá effectuar a dita substituição com previa auctorisação do governo.
CAPITULO II
Matas municipaes, parochiaes e vicinaes
Art. 3.° São as camaras municipaes obrigadas a crear matas nos terrenos arborisaveis e improprios para outras culturas pertencentes aos municipios, incluindo para esse fim, nos respectivos orçamentos annuaes, uma verba não inferior a 100$000 réis.
§ unico. Não será approvado pelo conselho de districto o orçamento da despeza obrigativa de qualquer camara municipal, em que não vá incluida aquella verba, uma vez que nos bens pertencentes ao municipio existam terrenos arborisaveis.
Art. 4.° A situação das matas municipaes, as especies florestaes, de que ellas devem ser creadas, o processo das sementeiras, ou plantações, os methodos de cultura e exploração, ficam dependentes da approvação dos inspectores florestaes, que forem encarregados pelo governo d'este serviço.
Art. 5.° O producto das matas, creadas pelas camaras, será considerado como rendimento das mesmas camaras, entrando para esse effeito no orçamento da receita municipal.
Art. 6.° O governo auxiliará as camaras com sementes ou plantas para a creação das matas municipaes.
Art. 7.° São applicaveis ás juntas de parochia as disposições d'esta lei, que ficam prescriptas para as camaras municipaes, menos no que respeita á verba que deve ser incluida no orçamento, a qual não será menor de 10$000 réis, com relação ás referidas juntas.
Art. 8.° Poderão tambem os vizinhos de quaesquer povoações crear, em proveito commum, matas vicinaes, requerendo terrenos incultos e arborisaveis ás camaras ou juntas de parochia.
Art. 9.° A faculdade do artigo antecedente é extensiva aos particulares, mas, n'este caso, os terrenos municipaes ou parochiaes serão aforados para aquelle effeito em hasta publica.
Art. 10.° São as camaras municipaes obrigadas, sob indicação dos agentes florestaes do governo, a fazer coutamentos nos terrenos publicos dos respectivos concelhos em que se manifestar espontaneamente a vegetação florestal.
§ unico. As matas creadas nos terrenos coutados e vedados á fruição publica, serão administradas e exploradas pelas camaras municipaes, pertencendo sómente ás mesmas camaras o producto das madeiras, ficando para os povos circumvizinhos o aproveitamento das lenhas, estrumes e mais productos florestaes.
Art. 11.0 São applicaveis ás matas parochiaes e vicinaes as disposições do artigo 7.°
CAPITULO III.
Administração
Art. 12.° O governo publicará um regulamento especial, na conformidade das seguintes bases, para a organisação do serviço technico, administrativo e economico do dominio florestal do estado.
Art. 13.° A administração superior do dominio florestal do estado e da propriedade florestal, sujeita á superintendencia do governo, fica centralisada na repartição de agricultura da direcção geral do commercio e industria.
§ 1.° Para os fins indicados n'este artigo serão os inspectores florestaes addidos mencionada repartição, occupando um d'elles o logar de chefe de secção das matas, sem prejuizo de outros serviços externos, de que deva ser! encarregado.
§ 2.° Todos os negocios da administração florestal, que dependam de conhecimentos technicos serão resolvidos em conselho, de que farão parte o director geral do commercio e industria, os tres inspectores florestaes, e o chefe da repartição de agricultura, sendo presidente o primeiro e secretario o ultimo dos mencionados.
Art. 14.° Os inspectores e conductores florestaes constituem o pessoal technico. Os administradores, os mestres de pinhaes e guardas, o pessoal administrativo, o thesoureiro e os fieis, e o pessoal economico.
Art. 15.° Os inspectores florestaes sómente poderão ser nomeados d'entre os engenheiros civis, comprehendidos na secção das aguas e florestas, ou d'entre os individuos habilitados com o curso de engenheria agricola, ou com o curso completo das escolas florestaes estrangeiras mais acreditadas.
§ unico. Verificando-se as duas ultimas hypotheses, o vencimento dos inspectores não excederá a quantia de réis 800$000.
Art. 16.° Os logares de administradores, mestres e conductores florestaes sómente poderão ser providos nos que tiverem carta de qualquer curso superior de sciencias historico-naturaes, ou de silvicultura e agronomia pelo instituto geral de agricultura.
Art. 17.° Os logares de amanuenses, de guardas e cabos de guardas, serão exclusivamente providos nos que se mostrarem habilitados com qualquer curso profissional elementar, ou que houverem servido no exercito e apresentarem baixa de serviço, sem nota, sabendo ler e escrever, e não tendo mais de trinta annos de idade.
§ unico. Estes logares e os de que tratam os dois artigos antecedentes serão sempre providos por meio de concurso documental.
Art. 18.° O logar de thesoureiro será provido em pessoa idonea e devidamente afiançada. Compete-lhe a proposta dos fieis e amanuenses da thesouraria, pelos quaes ficará responsavel.
Art. 19.° Os actuaes empregados das matas do reino entrarão no quadro do pessoal do dominio florestal do estado, ou a elle ficarão addidos, conforme as suas habilitações, aptidão e serviços.
CAPITULO IV
Disposições geraes
Art. 20.° O governo nomeará uma commissão de pessoas competentes para codificar todas as disposições da nossa legislação florestal e da estrangeira, que tiver applicação ao nosso paiz, concernentes á protecção dos arvoredos e á repressão dos abusos contra a sua conservação, ficando auctorisado para decretar as providencias que, em vista dos trabalhos da dita commissão, julgar conveniente.
Art. 21.° Parte da verba de 4:000$000 réis, consignada no decreto com força de lei de 29 de dezembro de 1864, para concursos agricolas e pecuários, será applicada a incitamentos da cultura florestal pelos particulares.
Art. 22.° Continuará a ter vigor o disposto no artigo 6.° e seu § unico do decreto com força de lei de 29 de dezembro de 1864, para o estabelecimento de uma escola elementar de silvicultura, com a qual não poderá o governo despender annualmente mais do que a quantia de 2:000$000 réis, que será deduzida dos rendimentos das matas do estado.
Art. 23.° O governo incluirá annualmente no orçamento do ministerio das obras publicas, commercio e industria, a verba que julgar necessaria para as despezas com os diversos serviços da administração e exploração do dominio florestal do estado, e dos estabelecimentos annexos, não podendo essa verba, em caso algum, exceder o rendimento annual do mesmo dominio, e dos estabelecimentos annexos, do qual rendimento serão tambem deduzidos os ordenados e mais despezas incluídas na tabella a que se refere o artigo 2.° da proposta de lei d'esta data.
Ministerio das obras publicas, commercio e industria, 17 de junho de 1868. = Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas.