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Sessão de 27 de junho de 1868

PRESIDENCIA DO SR. JOSÉ MARIA DA COSTA E SILVA

Secretarios — os srs.

José Tiberio de Roboredo Sampaio.

José Faria de Pinho Vasconcellos Soares de Albergaria.

Chamada — 75 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: R. de Azevedo,

A. E. de Seabra, Annibal, Alves Carneiro, Ferreira de Mello, Villaça, Antonio de Azevedo, A. Bernardino de Menezes, Falcão de Mendonça, Ferreira Pontes, Antas Guerreiro, A. José da Rocha, Faria Barbosa, Costa e Almeida, Lopes Branco, Montenegro, Belchior José Garcez, Cunha Vianna,

B. Francisco de Abranches, C. Testa, Vieira da Motta, Conde de Thomar (Antonio), Custodio Freire, Pereira Brandão, Fernando de Mello, Fortunato Frederico de Mello, Dias Lima, Gavicho, Francisco Luiz Gomes, Bicudo Correia, Moraes Pinto, Guilhermino de Barros, Noronha e Menezes, I. J. de Sousa, Freitas e Oliveira, Almeida Araujo, Judice, Matos e Camara, Assis Pereira de Mello, Ayres de Campos, João de Deus, Cortez, João M. de Magalhães, Aragão, Fradesso da Silveira, Ribeiro da Silva, Joaquim Pinto de Magalhães, Faria Guimarães, Gusmão, Galvão, Bandeira de Mello, Sette, Correia de Oliveira, Faria Pinho, Firmo Monteiro, Carvalho Falcão, Teixeira Marques, Lemos e Napoles, Vieira de Sá, Costa e Silva, Achioli de Barros, Frazão, Rodrigues de Carvalho, Mesquita da Rosa, José de Moraes, José Tiberio, L. de Carvalho, Camara Leme, M. B. da Rocha Peixoto, Motta Veiga, Aralla e Costa, Lavado de Brito, P. A. Franco, P. M. Gonçalves de Freitas, Sabino Galrão, Bruges.

Entraram durante a sessão — os srs.: Sá Nogueira, Barros e Sá, Azevedo Lima, A. J. de Seixas, A. J. Teixeira, A. Pinto de Magalhães, Magalhães Aguiar, Araujo Queiroz, Torres e Silva, Augusto de Faria, Barão da Trovisqueira, Carlos Bento, Silva Cabral, Faustino da Gama, F. M. da Rocha Peixoto, Silveira Vianna, F. Van-Zeller, Rolla, Blanc, I. F. Silveira da Motta, Meirelles Guerra, Baima de Bastos, Santos e Silva, J. A. Vianna, Mártens Ferrão, Gaivão, Pinto de Vasconcellos, Pinto da Silva, Klerk, Mardel, Dias Ferreira, J. M. Lobo d'Avila, Menezes Toste, José Paulino, Pinto Basto, Levy, Alves Ferreira, Penha Fortuna, Pereira Dias, Mathias de Carvalho, Raymundo Rodrigues, Ricardo de Mello, Venancio Deslandes.

Não compareceram — os srs.: Fevereiro, A. de Ornellas, A. Braamcamp,. Rocha París, Costa Simões, Correia Caldeira, Gomes Brandão, Silva e Cunha, Seabra Junior, Arrobas, Falcão e Povoas, Pequito, Falcão da Fonseca, Saraiva de Carvalho, B. F. da Costa, Velloza, E. Tavares, F. de Albuquerque Couto, Silva Mendes, Coelho do Amaral, Pinto Bessa, Gaspar Pereira, J. M. da Cunha, Albuquerque Caldeira, Calça e Pina, J. T. Lobo d’Avila, Maia, Costa Lemos, J. I. Pereira de Carvalho, Leite Ferraz, José M. de Magalhães, Silveira e Sousa, Batalhoz, Coelho do Amaral, Mendes Leal, Leite de Vasconcellos, M. J. Guerra, Quaresma, Paulino Teixeira, Sebastião do Canto, Thomás Lobo, Vicente Carlos, Scarnichia, Visconde dos Olivaes.

Abertura — Ao meio dia e meia hora.

Acta — Approvada)

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

Officio

Do ministerio da marinha, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Joaquim Henriques Fradesso da Silveira, copia de um projecto de lei para reformar o serviço dos lastros, e do regulamento respectivo, conforme foi apresentado pela commissão nomeada por decreto de 10 de junho de 1862.

A secretaria.

Representações

1.ª De varios proprietarios e lavradores no campo de Maiorca, concelho da Figueira, pedindo varias providencias sobre a administração dos campos do Mondego.

A commissão de administração publica.

2.ª Dos officiaes dos juizos de direito da comarca de Lisboa, pedindo que lhes sejam applicadas as disposições da, lei de* 11 de setembro de 1861.

A commissão de legislação.

3.ª Do clero e varios cidadãos residentes no arcebispado de Braga, pedindo que não seja approvada a proposta n.° 1, apresentada pelo sr. ministro da fazenda. A commissão de fazenda.

Participações, 1.ª Participo á camara que o sr. Eduardo Tavares não tem comparecido ás ultimas sessões, nem comparecerá a mais algumas, por incommodo de saude. = José de Faria Pinho.

2.ª Participo a v. ex.ª, que faltei ás ultimas sete sessões da camara, porque legitimo impedimento obstou ao meu comparecimento. = Eduardo Augusto Pereira Brandão.

Inteirada.

Declarações de voto

1.ª Declaro que votei a deducção de uma decima no subsidio dos deputados, proposta pela commissão de fazenda, na sessão de hontem, como votaria pela suppressão total do subsidio; mas este voto não significa para mim uma habilitação previa para votar deducções nos vencimentos dos servidores do estado. ==0 deputado por Arganil, Freitas e Oliveira = Agostinho de Ornellas.

2.ª Declaro que faltei á sessão de hontem, por incommodo de saude, e que, se estivesse presente, votaria o parecer da commissão de fazenda sobre a deducção nos subsidios dos deputados, e votaria tambem a extincção do mesmo, o que farei na discussão do orçamento. =Pedro Augusto Franco.

Mandou-se lançar na acta.

Requerimento

1.° Requeiro que se peça ao governo que, pelo ministerio competente, remetta com urgencia a esta camara, uma relação de todos os passaes do continente e ilhas, com designação do valor de cada um. = O deputado pelo 2.° circulo de Guimarães, A. Alves Carneiro.

2.° Requeiro se peça ao governo que, pelo ministerio competente, remetta com urgencia a esta camara, uma nota do numero dos requerimentos entrados até hoje na repartição dos proprios nacionaes," e feitos pelos parochos, pedindo a desamortisação dos seus passaes, como lhes é facultado pela lei de 22 de julho de 1866, com designação das freguezias, concelhos e districtos a que pertencem, e quaes os valores da desamortisação effectuada. = O deputado pelo 2.° circulo de Guimarães, A. Alves Carneiro.

3.° Requeiro que, pela direcção geral das alfandegas, seja enviada a esta camara a nota dos empregados fiscaes que nas ilhas adjacentes são occupados na cobrança do imposto do pescado naquellas ilhas, bem como tudo quanto para elucidar ou provar o quanto se despende com a cobrança d'aquelle imposto. = O. Bruges.

Foram remettidos ao governo.

SEGUNDA LEITURA

Projecto de lei

Senhores. — A ilha de S. Miguel, apesar da benignidade de um clima salubre, tem n'estes ultimos annos sido flagellada por endemias mais ou menos extensas o intensas, que quasi periodicamente se têem manifestado em suas diversas povoações.

Estas endemias originadas talvez de constituições atmosphericas particulares, são incontestavelmente entretidas pela pouca hygiene que nas freguezias ruraes geralmente se observa, o que é devido não só á falta de meios e commodidades convenientes, senão tambem e principalmente á deficiencia de certos conhecimentos praticos dos preceitos hygienicos que infelizmente se nota não só nas povoações dos campos, mas ainda das cidades.

Para debellar estas endemias e occorrer ás populações affectadas tem-se até hoje recorrido á caridade publica, que ali tem sempre sido larga e efficazmente exercida.

A disposição endemica parece querer ainda continuar, e portanto torna-se indispensavel crear meios promptos e efficazes, com os quaes seja possivel combater a doença desde o principio da invasão, tornando por esta fórma mais facil a sua extincção e evitando assim os tristes effeitos que ali se tem infelizmente presenciado.

Nos rendimentos das confrarias, irmandades, misericordias e camaras municipaes, se póde convenientemente por meio de uma derrama proporcional, feita pela junta geral de districto, crear e constituir os fundos indispensaveis para conjurar desde logo, como é mister aquelle flagello, visto que não é possivel nem prudente contar sempre com a caridade publica, cujo recurso cumpre não esgotar nem cansar; alem de que, a indole das instituições acima mencionadas não repugna nem póde repugnar a que parte dos seus rendimentos seja applicada para fim tão humanitario.

Por todas estas considerações temos a honra de offerecer á illustrada consideração da camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Com applicação ao tratamento e soccorro dos doentes pobres das povoações ruraes da ilha de S. Miguel, no districto de Ponta Delgada,.por occasião de endemias ou epidemias, é creado um fundo não inferior a 4:000$000 réis, constituido dos rendimentos das confrarias, irmandades, misericordias e camaras municipaes da referida ilha.

Art. 2.° A junta geral do districto de Ponta Delgada é encarregada, tendo em vista o rendimento de cada uma das referidas corporações de fixar annualmente a quantia

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com que cada uma é obrigada a concorrer para o fim designado no artigo antecedente.

Art. 3.° As corporações acima mencionadas incluirão em seus respectivos orçamentos, sob pena de lhes não serem devidamente approvados, as quotas que em harmonia com os artigos antecedentes lhes forem arbitradas pela junta geral do districto.

Art. 4.º As quantias em que, conforme a presente lei, forem cotisadas as confrarias, irmandades, misericordias e Camaras municipaes, deverão immediatamente dai' entrada no cofre da junta geral do districto de Ponta Delgada.

§ unico. Este fundo, assim constituido, não poderá, sob nenhum pretexto, ter applicação diversa da designada no artigo 1.º d'esta lei.

Art. 5.° E permittido a qualquer das referidas corporações recorrer para o conselho de districto sem effeito suspensivo do accesso, tanto da quota respectiva, como da somma total fixada pela junta geral do districto.

Art. 6.° A junta geral do districto de Ponta Delgada, quando assim o entender, póde, por falta de motivo, deixar de fixar as sommas designadas na presente lei.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos srs. deputados, 26 de junho de 1868. = Os deputados, Adriano Antonio Rodrigues de Azevedo = Francisco Manuel Raposo Bicudo Correia.

Foi admittido e enviado á respectiva commissão.

O sr. A. J. da Rocha: — Mando para a mesa uma representação dos officiaes de diligencia das seis varas da comarca de Lisboa em que pedem ser comprehendidos nas disposições da lei de 11 de setembro de 1866.

Já a este respeito se apresentou outra representação dos officiaes de diligencia de Braga, e que se acha na commissão de legislação; peço portanto a v. ex.ª queira dar o mesmo destino a esta representação.

O sr. Fernando de Mello: — Mando para a mesa uma representação feita em nome dos srs. Frcderick, Darly Rose, e Charles Capper, que eram os concessionarios do cabo submarino, que partindo de Falmouth, na costa de Inglaterra, passasse por Peniche e terminasse em Gibraltar, na qual pedem que não seja approvada a parte do contrato feito pelo governo em 21 de janeiro do corrente anno.com Duarte Medlicott e Thomás Rumball, concedendo tambem licença para a construcção e exploração de uma linha ou cabo submarino, partindo de Falmouth, na costa de Inglaterra, para o Porto, na costa de Portugal, e d'ali para uma das ilhas dos Açores, d'onde seguirá para a America do norte, porque da ultima concessão resultam prejuizos para os primeiros concessionarios.

Ha um contrato feito em 13 de agosto de 1867 e outro em 21 de janeiro d'este anno. No ultimo fazem-se concessões que prejudicam as que foram feitas áquelles concessionarios no antigo contrato.

Um dos artigos, creio que é o 13.°, concede a estes requerentes uma garantia que não póde deixar de ser vantajosa para elles, e é que todas as participações de Portugal para Inglaterra deverão ser transmittidas pelo cabo electrico dos concessionarios, sempre que não haja da parte do expedidor declaração de que desejam fazer a communicação por via terrestre.

Pelo contrato de 21 de janeiro faz-se igual concessão aos srs. Duarte Medlicott e Thomás Rumball, concessão que necessariamente prejudica os primeiros concessionarios, e por isso esta camara deve tomar esta representação na conta que merece.

Pedia que a representação fosse publicada no Diario, porque é pequena, e porque nos deve levar a isso a attenção para com subditos estrangeiros que vem representar ao parlamento contra concessões feitas, e que lhe são prejudiciaes, e mesmo porque me parece que este documento elucidará bastante a camara para a occasião de tratar da approvação do contrato de 21 de janeiro, que esta affecto ao parlamento. Se v. ex.ª não tivesse n'isto duvida, pedia que consultasse a camara, e com urgencia. '

O sr. José de Moraes: — Se é sobre a urgencia que se vae votar nada digo, porém se é sobre a concessão para a publicação, peço a palavra.

O sr. Fernando de Mello: — Eu tambem peço a palavra.

O sr. Presidente: — E sobre a publicação, por isso tem a palavra o sr. José de Moraes.

O sr. José de Moraes: — Declaro a v. ex.ª e á camara que é preciso sermos muito parcos na publicação de documentos como o que se apresentou. Se estabelecermos precedentes, admittindo a publicação d'estas representações, por mais pequenas que sejam, como disse o illustre deputado, ámanhã vem outra, e mais tarde outras, e a despeza torna-se grande. Não sei para que o illustre deputado quer que esta representação seja publicada no Diario de Lisboa, só se é porque o typo do Diario é mais bonito e legivel do que o do Jornal do commercio, onde já veiu publicada; por consequencia não acho necessidade de nova publicação, porque os srs. deputados que quizerem podem lê-la n'aquelle jornal. Isto é um desperdicio, por isso voto contra.

¦ Consultada a camara foi rejeitado o requerimento para a impressão.

O sr. José de Moraes: — Vou mandar para a mesa uma interpellação ao sr. ministro do reino, concebida nos seguintes termos (leu).

Espero que s. ex.ª se habilitará quanto antes para responder á interpellação, que lhe dirijo, e que formulei para ser apresentada aos seus antecessores, á qual infelizmente nunca responderam. Hei de continuar na tarefa de instar pela sua verificação, porque entendo que estou no meu direito de querer saber onde existe um livro importante que devia estar na bibliotheca do Porto.

Agora vou dirigir ao sr. secretario, a fim de que s. ex.ª me informe sobre se o sr. ministro da fazenda já satisfez a um requerimento que fiz na sessão de 23 de maio do corrente anno, em que pedia a s. ex.ª que mandasse á camara uma relação nominal dos devedores de contribuições de réis 10$000 para cima, bem assim a outra em que pedia a relação nominal dos devedores de direitos de mercê. Tendo tambem dirigido ultimamente outro requerimento ao mesmo sr. ministro, pedindo uma relação dos devedores de contribuição de 10$000 réis para cima só no districto de Coimbra, ainda não foi satisfeito. Se estes requerimentos não foram ainda satisfeitos, pedia que se renovassem os pedidos.

Tantas vezes hei de instar, pedir e solicitar do sr. ministro que mande os documentos que peço, que a final s. ex.ª para se ver livre de mim ha de manda-los.

Por ultimo peço a v. ex.ª, sr. presidente, que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro da fazenda.

O sr. Secretario (José Tiberio): — Tenho a declarar ao illustre deputado que os seus requerimentos foram dirigidos ao sr. ministro, mas ainda não veiu resposta alguma, e logo que venha avisarei s. ex.ª

O sr. José de Moraes: — Peço ao sr. secretario que tenha a bondade de renovar o pedido.

O sr. Menezes: — Mando para a mesa uma representação do clero e povo do arcebispado de Braga contra o projecto n.° 1, no seu artigo 3.°, em que trata da venda dos passaes.

Esta representação vae acompanhada de vinte e tantas adhesões, contando muitos centos de assignatura, e os seus fundamentos são dignos de attenção.

Dizem elles: primo, que a venda dos passaes é attentatoria dos direitos da igreja; secundo, que é subversiva dos direitos da propriedade, e tertio que é contraria ás conveniencias dos povos, e por ultimo que é attentatoria de todos os direitos civis e ecclesiasticos que vigoram desde a fundação da monarchia.

Como hei de tomar parte n'esta discussão, apresentarei então as rasões que julgar conveniente para defender a representação dos signatarios.

O sr. Villaça: — Tendo por mais de uma vez instado pelos documentos que pedi, pelo ministerio do reino, e para que o sr. ministro respectivo se dê por habilitado para responder a uma interpellação que lhe dirigi sobre um objecto grave e serio como já tive a honra de dizer á camara, s. ex.ª apesar d'isso ainda não veiu satisfazer a estes meus pedidos e instancias repetidas; e creio mesmo que não virá sem ser obrigado a isso por meio de um pedido da camara; e tão certo estou d'isso que mando para a mesa uma proposta n'esse sentido.

O objecto da minha interpellação cada vez se torna mais serio e grave, porque apparecem documentos do sr. ministro do reino passados quatro dias depois em que elle determina o contrario do que ordenou á camara dos Olivaes por meio de uma portaria.

Parece-me que s. ex.ª quer existam tantos codigos administrativos quantos são os empenhos que s. ex.ª tem para assim praticar.

Este negocio é serio e grave pelas circumstancias de que se acha revestido e pelas arbitrariedades a que esta dando logar. A camara já o sabe pelas muitas vezes que aqui tenho tratado d'esta questão, e por isso limitar-me-hei a requerer que o sr. ministro do reino seja convidado a vir com urgencia á camara dar explicações sobre este assumpto, o declaro que se não tem vindo pelos documentos que pedi ainda não estarem colligidos, que para mim prescindo d'elles, porque apesar de muito trabalho já os obtive das proprias camaras, e só insisto pela presença de s. ex.ª para dar explicações e que n'essa occasião traga comsigo os documentos pedidos para não me poder dizer que os que tenho não são exactos.

O sr. Lopes Branco: — Pelo estado em que se acha a administração dos campos do Mondego, e que em virtude de algumas diligencias que empreguei quando governador civil pude conhecer, entendi do meu dever apresentar o projecto de lei que passo a ler (leu).

Por esta occasião mando para a mesa uma representação que diz respeito a outro objecto e não tomarei muito tempo á camara dizendo algumas palavras em referencia a ella.

A representação é feita pelos proprietarios do campo de Maiorca, queixando-se da centralisação que se tem dado ás attribuições que formam a administração dos campos do Mondego, mostrando os prejuizos que d'esta centralisação lhes têem resultado, e concluindo por pedirem providencias a esta camara.

Notarei que á frente dos signatarios d'esta representação apparece o nome do sr. João de Lemos Seixas Castello Branco, assim como o da sr.ª viscondessa de Maiorca, o que mostra que estas queixas são feitas com justificado fundamento, e eu, em vista do que os signatarios apresentam n'esta representação e do conhecimento que tenho das necessidades daquelles campos, tenho a honra de mandar para a mesa outro projecto de lei que passo a ler (leu).

Mando tambem para a mesa um requerimento pedindo varios esclarecimentos ao governo (leu).

Já que estou com a palavra aproveitarei a occasião para perguntar ao sr. 1.º secretario se porventura já vieram os esclarecimentos que pedi pelos ministerios das obras publicas e do reino ácerca da mata de Fôja.

O sr. Secretario: — Ainda não veiu esclarecimento algum a esse respeito, mas póde V. ex.ª ficar na certeza de que quando quaesquer esclarecimentos cheguem á mesa serão immediatamente avisados os srs. deputados que os pediram.

O Orador: — Mas como eu desejava que se renovasse este pedido, era do meu dever perguntar primeiramente se já estava satisfeito; por isso peço a v. ex.ª que tenha a bondade de mandar pedir novamente, pelos dois ministerios, a satisfação do meu requerimento, porque eu preciso d'estes esclarecimentos para combater a venda d'esta mata, que esta comprehendida na proposta em que o governo pede auctorisação para vender as matas nacionaes.

O sr. Secretario (José Tiberio): — O sr. deputado exige que eu declare quando o seu requerimento foi expedido?

O Orador: — Não, senhor. Só peço, em conclusão, ás illustres commissões a quem os projectos forem distribuidos que os considerem de muita urgencia, porque dizem respeito a questões que affectam interesses de muita gravidade.

O sr. Pedro Franco: — Mando para a mesa um requerimento renovando a iniciativa de outro requerimento em que pedia ao ministerio da fazenda os documentos relativos á divida que o thesouro diz dever-lhe a camara municipal de Belem. Forneceram-me os documentos da parte do debito, e não os da parte do credito, e portanto peço novamente estes esclarecimentos, porque preciso habilitar-me com elles para tratar d'este assumpto por occasião da discussão do orçamento.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO SOBRE O ADIAMENTO DO PARECER DA COMMISSÃO DE SABROSA

O sr. Presidente: — Passa-se á primeira parte da ordem do dia. Entra em discussão o adiamento proposto pelo sr. Silveira da Motta. Aos srs. deputados inscriptos devo advertir que não esta em discussão a validade ou nullidade da eleição de Sabrosa, mas unicamente a conveniencia de se adiar ou não esta discussão (apoiados).

Tem a palavra o sr. Faria Rego.

O sr. Faria Rego: — Quando V. ex.ª hontem me concedeu a palavra principiei, dizendo que o parecer em discussão sobre a eleição de Sabrosa tinha sido apresentado n'esta casa no dia 22 d'este mez, mais de dois mezes e meio depois de constituida a commissão de verificação de poderes.

Disse que esta demora não tinha rasão de ser, não se podia justificar; que no meu entender era um precedente terrivel, um precedente inconstitucional, um precedente contrario a todas as regras e praticas do systema parlamentar, um precedente de que não havia exemplo, um precedente, que, no meu entender, estabelecia um meio de excluir do seio da representação nacional um eleito do povo, quando a maioria lhe fosse contraria.

Acrescentei mais que eu não podia deixar de protestar contra este precedente, e que com todas as minhas forças o censurava e detestava.

Fui chamado á ordem por um illustre deputado. Não sei que proferisse palavras pelas quaes não estivesse na ordem, e menos que ellas offendessem a camara ou algum sr. deputado; ò por isso desejava muito ser esclarecido sobre este facto, e que me dissessem por que rasão fui chamado á ordem, e bem assim por que se levantou um susurro, uma agitação, um alvoroço, como ainda não vi n'esta casa.

O sr. Santos e Silva: — Não foi contra o illustre deputado.

O sr. Ferreira de Mello: — Eu explico isso logo a s. ex.ª

O Orador: — Desejarei muito; e por esta occasião direi que já me observaram que v. ex.ª se equivocou, julgando que eu dirigia uma censura á camara pela decisão que ha pouco havia tomado. (O sr. Ferreira de Mello: — Apoiado.)

Pois então direi ao nobre deputado que não tinha muita rasão; eu não dirigi censura alguma á camara, porque respeito as suas decisões, mas acredite que senti muito que se não admittisse a discussão do adiamento juntamente com o parecer, porque ainda ha poucos dias se tinha deliberado o contrario, tanto na discussão da generalidade do projecto sobre aposentações, como na especialidade. A ultima decisão deu-se com o sr. Camara Leme. Para mim a votação nominal foi de muita satisfação, para que o publico ficasse sabendo quem votou pro e quem votou contra.

Quantos adiamentos se têem discutido juntamente com as propostas? Votar hoje de uma fórma e ámanhã de outra, não acredita a camara, e é mister assentar em uma das cousas.

Repito, não posso descobrir os motivos por que fui chamado á ordem, e se apresentasse a camara n'um estado tumultuario, a ponto de ser preciso levantar a sessão. Eu não me julgo o offendido por me chamarem á ordem, quando se pratica um acto d'estes, quem o pratica é que esta fóra da ordem e é o que fica mais offendido do que aquelle a quem se dirige. A camara e a presidencia foram os mais offendidos.

Entrarei agora, sr. presidente, na discussão do adiamento.

A commissão de verificação de poderes apresentou em 25 de abril passado um parecer sobre esta eleição, no qual relatando todo o protesto apresentado contra a mesma eleição, e que não leio no todo, visto que todos os nobres deputados o possuem, concluiu d'esta fórma (leu o seu final).

Em 25 do dito mez apresentou o dito parecer, declarando a commissão que não podia de modo algum formar juizo livre de escrupulos e de duvidas a respeito da validade ou nullidade da eleição, sem que lhe fosse presente o processo que existia no juizo de Villa Real, para provar o que se relata no protesto, e concluiu pedindo o adiamento até que chegasse o dito processo, a commissão pedia um adiamento indefinido. A camara entendeu na sua alta sabedoria que não era possivel conceder-se á commissão o que ella pedia, e concedeu-lhe apenas o praso de quinze dias. A commissão depois de obter este primeiro adiamento julgou que devia por si só, independente da concessão da camara prorogar este adiamento dos quinze dias concedidos a cincoenta e tantos, apresentando o parecer em 22 do presente mez, segundo adiamento, e ainda não satisfeita vem pedir terceiro adiamento, tendo tido o longo praso de mais de dois

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mezes e meio para estudar o processo. Parece incrivel!... Mas não é. *. < • ¦

Depois daquelles dois adiamentos, surprehendeu-me que um membro da mesma commissão, um membro tão distincto e illustrado, como é o sr. Silveira da Motta, apresentasse o pedido de um terceiro adiamento, e adiamento indefinido, tendo já a camara rejeitado a petição do primeiro adiamento indefinido, e muito mais me surprehenderam as rasões e os motivos que s. ex.ª declarou para o justificar. S. ex.ª disse que não estavam • presentes dois membros da commissão, sendo um o respectivo relator. V. ex.ª, sr. presidente, declarou hontem que por cartas que tinha recebido do illustre relator, sabia com. certeza que elle não voltava á camara.

Não comparecendo, como não comparece o relator, restam ainda dois membros dos que assignaram o parecer da maioria com o sr. Silveira da Motta e outro o sr. Pequito. Se o sr. Pequito que esta fóra, não voltar, como acontece com o relator da illustre commissão, ou se a sua ausencia for muito prolongada, ha de estar o parecer sem ser discutido? Será este proceder admissivel depois de tanta demora? Será justo? A camara não soffrêra se o consentir?

A praxe n'esta casa é o membro presente substituir o relator e encarregar-se da defeza e da sustentação do parecer.

Diz-se que esta eleição é de grande consideração e importancia, e summamente grave. Quero conceder tudo isso, apesar de que me não convenço que o seja, porque aqui vieram pareceres sobre eleições muito mais graves, muito mais complicadas e muito mais importantes, e o que mais é approvando essas eleições.

O illustre membro da commissão, o sr. Silveira da Motta, por duas vezes estudou esta eleição, porque tanto o primeiro como o segundo parecer estão assignados, por s. ex.ª, e não se póde duvidar que os havia de estudar com aquella proficiencia que é propria da illustração e caracter de s. ex.ª Teve o processo á sua disposição perto de tres mezes. S. ex.ª demais é um distincto orador, uma das illustrações do parlamento, um dos seus principaes ornamentos. Não estará habilitado para sustentar é defender o parecer? Quem o póde negar?

Não me convenço nem o acredito. O que me parece é que s. ex.ª tem repugnancia em defender e sustentar o parecer que se apresenta; não deseja dar-lhe a paternidade, muito embora fique um exposto, sem pae; mas acredite s. ex.ª que ha de haver outras illustrações que lhe dêem a paternidade. Não fica abandonado e sem defensor. Hontem bem se patenteou.

S. ex.ª ha de ter muito, quem o auxilie, apesar de que eu devo declarar que ainda não cheira a cadaver, mas apresenta symptomas de molestia grave. O primeiro parecer destroe, mata completamente o segundo, enterra-lhe o punhal até ao coração; estão em manifesta contradicção os dois pareceres.

A commissão confessa no primeiro que sem o processo da justificação não póde sem duvida, sem escrupulos, decidir-se pela validade ou nullidade da eleição, pela procedencia ou improcedencia do protesto; como é pois que, antes de chegar esse processo, se pronunciam pela nullidade da eleição? De duas, uma; p primeiro estudo não foi perfeito, houve reconsideração, ou então as duvidas, os escrupulos ficaram, e a consciencia não ficou tranquilla. Pois não diz a commissão no seu parecer estas palavras terminantes e positivas? (Leu.)

E depois de terem os illustres membros da commissão declarado isto, como é que julgam e decidem pela nullidade antes da apresentação do processo? Não sei como se possa justificar esta manifesta contradicção.

O nobre deputado, o sr. Silveira da Motta, ha de estar lembrado d'aquella proposta dos depositarios do geral que eu tantas vezes pedi a s. ex.ª e á commissão, n'esta casa, para que dessem o seu parecer, e apesar das muitas promessas nunca o pude conseguir. Aconteceu-me justamente o mesmo que o illustre deputado, o sr. Sá Nogueira, disse hontem; a commissão poz-lhe o seu veto. Talvez se pretenda o mesmo com este parecer. Não é possivel. A camara não póde nem deve consenti-lo sem quebra de sua dignidade.

É preciso que a camara saiba que o sr. deputado eleito a quem se refere este parecer esta em Lisboa desde a abertura da sessão, fazendo despezas sem receber subsidio; fez parte da junta preparatoria, e muitos daquelles srs. deputados que d'elle receberam um voto a favor são justamente os que lhe fazem agora guerra. Eu podia contar a verdadeira historia d'este processo, mas não o faço, não a relato, e vou terminar.

Parece-me que este adiamento indefinido, tendo a camara já votado contra elle, é impossivel o conceder-se. Esta presente o illustre membro da commissão, o sr. Silveira da Motta, que possue, como já disse, uma illustração muito distincta, e conhecimentos vastissimos da materia, e ninguem melhor do que s. ex.ª póde tomar a defeza da sua obra; obra que s. ex.ª estudou super abundantemente em tão longo praso, o que se prova pelas duas assignaturas' de s. ex.ª nos dois pareceres. Temos presenciado por mais de uma vez a maneira digna como s. ex.ª se desempenha de todas as commissões de que é encarregado. Mas não é só a circumstancia de ter sido esta questão estudada duas vezes por s. ex.ª, é tambem o ter á sua disposição o processo perto de tres mezes, tempo superabundante para s. ex.ª obter todos os esclarecimentos de que precisasse.

Por todos estes motivos voto contra o adiamento, porque entendo não poder ser I concedido sem quebra da dignidade da camara. E injusto e até revoltante.

Termino, porque mais collegas têem pedido a palavra, e decerto melhor podem illustrar a camara.

O sr. Ferreira de Mello: — Sr. presidente, V. ex.ª e a camara comprehendem de certo que, tendo sido eu quem hontem n'esta casa chamou á ordem o meu illustre collega que acaba de fallar, e tendo-se elle de mais a mais referido a mim, tenho rigorosa necessidade de explicar, tanto ao sr. Faria Rego como á camara, os motivos que me levaram a chamar a s. ex.ª á ordem na sessão de hontem, e de dar emfim as explicações que o sr. deputado reclama a este respeito.

O que eu hontem ouvi distinctamente, e o que ouviram commigo mais de dez collegas meus, cujo testemunho posso invocar, foi que o sr. Faria Rego disse que a resolução que a camara acabava de tomar estabelecia um precedente iniquo, escandaloso e immoral.

Quando ouvi isto é que pedi a palavra para chamar o sr. deputado á ordem.

Depois a discussão acabou em tumulto, e eu posso e vou tambem dizer ao illustre deputado a rasão por que acabou assim, r • -

Disseram-me porém, no fim da sessão, o mesmo que ex.ª acaba de dizer agora, e o mesmo que nos extractos da sessão, publicados em varios jornaes, eu li esta manhã; disseram-me que s. ex.ª não se referia á resolução tomada pela camara, mas á demora das commissões em apresentarem os seus pareceres.

Não tenho duvida alguma em (declarar franca e positivamente ao meu collega que dou mais fé á palavra e á declaração de s. ex.ª do que ao meu proprio ouvido. S. ex.ª falla baixo, e, ainda que eu estava proximo, era muito facil equivocar-me, ou, pelo menos, era isso possivel; o que é impossivel é que s. ex.ª se equivocasse, porque sabe perfeitamente o que diz, e o que disse ou. queria dizer.

Em vista pois da declaração que s. ex.ª fez, de que se referia á demora das commissões em apresentarem os seus pareceres, e não á resolução que a camara acabava de tomar, retiro a chamada á ordem que fiz em relação a s. ex.ª, e reconheço que, sendo assim, não tinha eu motivo algum para a fazer. Não a faria, se tivesse ouvido bem s. ex.ª, e só afiz, porque estava persuadido de que elle dissera uma cousa muito diversa d'aquella que declara agora.

Quando chamei o sr. deputado á ordem, entendi que o podia fazer em harmonia com os artigos 36.° e 37.° do regimento, os quaes me, dispenso de ler, porque V. ex.ª e a camara os sabem melhor do que eu; mas, alem do regimento, seja-me licito invocar aqui o testemunho insuspeito e a auctoridade incontestavel do nobre presidente do conselho de ministros, a quem outro dia, em uma discussão que se tornava um pouco intoleravel, ouvi dizer que a camara tinha meio de evitar isso, levantando-se um deputado, chamando á ordem o que estava fallando, e demonstrando em seguida e brevemente que elle effectivamente estava fóra da ordem; que era esta a pratica parlamentar, a disposição do regimento e o que se costumava fazer.

Declaro que não só concordei com estas idéas do sr. presidente do conselho, mas encontrei-as nos artigos 36.° e 37.° do regimento, cuja analyse não faço á camara para a não fatigar. E a rasão por que adopto este systema, é porque me parece muito mais digno, muito mais curial e muito mais proprio de uma assembléa illustrada e séria como esta, do que o systema contrario que produziu não só o tumulto da sessão de hontem, mas já o de outras sessões. Por aquelle systema o deputado que entende que o orador esta fóra da ordem, ou fallando inconvenientemente, chama-o á ordem, apresenta os motivos que teve para isso, e a camara, depois de ouvir a defeza do orador, resolve; e pelo systema seguido hontem o que acontece? E que dois ou tres membros d'esta casa, que têem pulmões fortes, e são um pouco azados para suffocar uma discussão, levantam-se e gritam «ordem, ordem»; isto não tem geito, não tem logar nenhum.

Ora eu, com quem a natureza á falta de outros dotes que eu invejo n'esses mesmos membros, foi um pouco prodiga, concedendo-me uma voz que se ouve bem, e um genio muito avesso a tolerar tyrannia ou despotismo de ninguem, e mesmo um pouco irascivel quando me querem abafar sem ceremonia, não me revolto nem faço tumulto contra a camara, que respeito muito, mas revolto-me contra estes tres ou quatro membros, que têem tanto direito de fallar aqui como eu e o resto da camara, mas não mais; revolto-me contra esses tres ou quatro membros, que respeito muito como individuos, mas a quem não posso dar a importancia, ou a quem não reconheço o direito de representarem ou absorverem a camara (apoiados). É n'estas circumstancias que eu uso dos recursos que a natureza me concedeu; e quando vejo que gritam, grito tambem, e creio que grito mais do que elles; quando vejo que saltam e se irritam, salto o irrito-me tambem (riso), e n'este genero creio que estes quatro cavalheiros difficilmente poderão obter vantagem sobre mim (riso).

O illustre deputado que acabou de fallar disse que se tinha admirado muito de que esta camara, tendo resolvido duas vezes que as propostas de adiamento se discutissem conjunctamente com o projecto que se pretendia adiar, viesse hontem tomar uma resolução em contrario, e de uma fórma em contrario tambem á praxe constantemente seguida n'esta casa.

Permitta-me v. ex.ª que eu, como membro d'esta responda só por mim. O illustre deputado tem grande vantagem de ser parlamentar antigo

Desde a primeira vez que aqui se agitou a questão, se a proposta de adiamento devia discutir-se conjunctamente comi o projecto, desde essa primeira vez, votei que o adiamento se discutisse em separado. E digo a v. ex.ª a rasão porque; entendo que uma proposta de adiamento não tem outro fim se não evitar a discussão principal. Desde o momento em que o adiamento só pretende evitar a discussão principal, manda-lo discutir conjunctamente com essa discussão principal, põe já completamente de parte o unico fim que o adiamento tinha em vista conseguir.

A decisão em contrario, isto é, discutir o adiamento com a materia principal, podem ter uma rasão philosophia; mas eu que não sou forte em philosophias transcendentes, emquanto não me explicam essa versão transcendente ou essa maravilha que póde determinar-nos na mandar discutir um adiamento, que quer evitar a discussão principal, conjunctamente com essa discussão, o que eu vejo é que o adiamento fica sem rasão de ser, porque não evita o que pretendia evitar, e não evitando, declaro que voto contra tal systema, porque não o entendo, (apoiados).

Argumentam com a praxe. É preciso que todos nos convençamos de que a praxe só se admitte e só se sustenta quando é racional e legal (apoiados). E ainda mais; o argumento da praxe póde colher contra um parlamentar antigo, que sempre votou n'esta casa por este systema; mas não póde nunca admittir-se contra um deputado novo que principando a votar contra esse systema quer exactamente evitar o peccado em que ss. ex.ªs incorreram e o inconveniente de se lhes dizer — voto isto, porque votou sempre assim. Eu pela minha parte nunca votei, e declaro que nunca o votarei, excepto n'um caso. Nos adiamentos ha muita diversidade. (O sr. Faria Rego: — Apoiado.)

Desde que o sr. Faria Rego concorda commigo, tem de reconhecer que o que s. ex.ª disse ha pouco com' relação á camara, exigindo que ella resolvesse por uma vez se os adiamentos se haviam discutir conjunctamente ou em separado, não procede nem póde admittir-se. Se concorda que os adiamentos têem causas differentes, reconhece implicitamente que a camara tem de resolver separadamente sobre cada um d'esses adiamentos e considerar as circumstancias especiaes que n'elles concorrem para resolver se se discutem conjunctamente ou em separado, sendo portanto impossivel estabelecer regra fixa o immutavel.

Agora faço um pedido ao digno secretario o sr. Tibério porque a declaração de s. ex.ª foi o unico motivo que me levou hontem a pedir a palavra. S. ex.ª declarou-me particularmente, e á camara em voz alta que tinha uma carta do digno relator d'este parecer, e que podia afiançar que elle não vinha. Pergunto a s. ex.ª se essa carta é participação official dirigida á camara de que s. ex.ª nos dava conhecimento, se é documento authentico que nós possamos apreciar, ou se é apenas uma simples carta particular...

O sr. Secretario (Tibério): — Se me dá licença, direi a v. ex.ª que a carta é particular, na qual declara que não póde comparecer á sessão. Se v. ex.ª a quizer ver posso mortrar-lh’a.

O Orador: — Desde o momento que a carta é particular, e que não ha participação official, nós não devemos aceita-la como declaração official, nem toma-la para base da nossa resolução, nem para assumpto de discussão n'esta casa. Ora, para mim ha só uma cousa que me leva a votar o adiamento, não o adiamento indefinido (apoiados), como o sr. Faria Rego receia, mas um adiamento limitado, e em harmonia com as circumstancias muito attendiveis de que não só esta ausente o relator da commissão, mas outro membro da commissão, ornamento muito distincto d'esta casa que é o sr. Pequito, o qual sabemos que chega brevemente, e que aqui esta por força na terça feira. Por consequencia o adiamento é de dois a tres dias.

Sabe v. ex.ª a rasão que me levou ainda mais a votar pelo adiamento? Foi ver a justa indignação do meu distincto collega, o sr. Faria Rego proromper unicamente depois da apresentação do parecer da commissão, quando eu presenciei

1 O sr. Faria Rego: — Esteve dois mezes meio para saír.

O Orador: — E durante esses dois mezes meio s. ex.ª soffredor, impassivel, silencioso, nunca reputou o precedente iniquo, immoral e escandaloso, em quanto que o sr. José de Moraes, que apoia o adiamento não para simplesmente se adiar a discussão, mas para se não discutir sem perfeito conhecimento - de causa, procedeu de Uma maneira' contraria, porque veiu pedir por mais de uma vez á commissão que apresentasse o seu parecer immediata e brevemente. N'esse tempo o meu distincto collega, o 'sr. Faria Rego não acompanhava o sr. José' de Moraes nos seus pedidos, mas estava quieto calado, impassivel, silencioso! (Apoiaãos.)

O adiamento não representa o desejo de demorar a discussão d'este negocio, manifesta apenas e unicamente o desejo de que se esclareça esta questão, cuja importancia esta demonstrada pela demora que a commissão teve em apresentar o seu parecer, pelas respostas por ella dadas ao Sr.s José de Moraes, declarando que todos os dias lhe chegavam novos esclarecimentos, e que havia infinitos documentos relativos á questão; e mostra tambem o desejo de que haja quem nos explique todos esses documentos e todas essas circumstancias (apoiados).

E não é agora, quando ha um parecer da maioria da commissão e outro de um membro da, mesma commissão, muito distincto e muito intelligente sr. Mardel, que deu parecer em separado; não é agora, depois de nós termos reconhecido e aceitado as rasões da commissão, que justificava

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a sua demora com a necessidade de estudar e obter esclarecimentos; I não é agora, estando ausentes dois dos distinctos membros da commissão, que a camara ha de aproveitar esta ausencia para collocar o sr. Mardel em circumstancias de ter só um individuo com quem lute, e para se privar dos esclarecimentos que esses membros ausentes nos podem prestar, em primeiro logar o sr. relator, e secundariamente, mas com igual proficiencia, o outro membro da commissão (apoiados).

São estas as rasões por que voto o adiamento.

Sobretudo, para mim, a rasão essencial e a mais forte é que, desde que o unico membro presente da maioria da commissão é o primeiro a reclamar o adiamento até que algum dos seus collegas venha, eu, tendo consentido na demora do parecer até hoje, não posso deixar de approvar a demora da sua discussão por mais dois ou tres dias, até terça feira, que é o limite que eu desejo para o adiamento, a fim de discutirmos a questão na presença de algum dos membros da commissão que estão ausentes, e com pleno conhecimento de causa e perfeita informação de todas as difficuldades que causaram a demora da apresentação do parecer (apoiados).

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem, muito bem. Leu-se na mesa a seguinte

Proposta.

Proponho que o adiamento da discussão da eleição de Sabrosa seja limitado até quarta feira proxima. = -4. A. Ferreira de Mello.

O sr. Pinto de Magalhães: — Começo por deplorar os factos que hontem se deram n'esta assembléa, e espero que v. ex.ª, valendo-se de futuro da auctoridade da sua posição, empregará todos os seus esforços para que taes acontecimentos nunca mais se repitam (apoiados).

Ha quatorze annos que tenho estado consecutivamente n'esta casa, e posso declarar á camara que tenho aqui presenciado, sessões apaixonadas; mas nunca vi uma sessão tão tumultuaria como a de hontem! Não sei quem teve a culpa d'esses tumultos, mas o facto é que se deram esses deploraveis acontecimentos! (Apoiaãos.)

Nós somos todos filhos do governo representativo, somos todos filhos do povo e devemos amar este systema. E emquanto aqui se praticarem scenas como as de hontem, damos de certo motivo para alguem se pronunciar contra o systema parlamentar. Por consequencia espero que v. ex.ª usando da sua auctoridade, não deixará de futuro continuar a sessão em similhante desordem (apoiados).

E ha uma cousa notavel no dia de hontem! Quando no Diario de Lisboa se apresentava uma amnistia a todos os tumultuarios, parecia que a camara dos deputados á noite se pronunciava contra ella.

(Susurro.)

(Varios srs. deputados pedem a palavra.)

Lanço um véu sobre o passado, porque não quero excitar paixões (apoiados), e vou tratar das questões do adiamento; porque o meu fim é que as sessões corram regularmente como é da honra da missão que temos.

O adiamento não se póde admittir, porque não temos direito a privar por mais tempo um collega nosso que tomou parte nos trabalhos das sessões preparatorias, de concorrer para as resoluções d'esta camara.

O adiamento é muitas vezes justo e rasoavel quando se marca dentro de certo praso; mas quando o adiamento de que se trata faz com que um collega nosso fique privado dos seus direitos a ponto de não poder talvez tomar parte nos trabalhos parlamentares d'esta sessão, acho isso irregularissimo (apoiados).

Entendo que as rasões que a favor do adiamento se allegaram, não têem cabimento á vista do regimento e dos precedentes d'esta camara.'

O regimento manda que a assembléa preparatoria resolva sobre todas as eleições, a respeito das quaes não houver duvidas, e que aquellas sobre que houver contestação fiquem adiadas para depois de constituida a camara; mas entenda-se que o regimento marca para essa resolução um praso rasoavel e não indefenido (apoiados).

Na verdade admiro-me muito que o sr. Silveira da Motta entenda que é necessario que este parecer seja adiado até que o sr. relator da commissão esteja presente! Pois o sr. Silveira da Motta não ouviu na commissão as rasões que havia contra aquella eleição, não assignou esse parecer?!

Foram apresentadas todas as rasões que levaram a commissão a annullar a eleição, e s. ex.ª, em vista d'esses argumentos, é que se pronunciou tão fortemente contra a eleição para lançar fóra d'esta casa um seu collega. S. ex.ª sabe isso. S. ex.ª sabe quaes são os motivos que o resolveram, e, no seu entender, devem levar a camara a votar pela annullação d'esta eleição, e portanto a favor do parecer da maioria da commissão. S. ex.ª sabe expor esses motivos á camara, porque s. ex.ª é um orador distincto, trata todas as questões perfeitamente, com applauso de todos e muito gosto meu. S. ex.ª não póde eximir-se a apresentar á camara as rasões que o determinaram a propor a annullação da eleição. S. ex.ª para isso não precisa esperar pela presença do relator da commissão. S. ex.ª esta habilitado tão bem como o relator para defender o parecer, e melhor que o mais habilitado.

Eu estou aqui para combater o parecer, porque o considero injusto. Direi as rasões que tenho para o impugnar. S. ex.ª dirá as que tem para o defender. A camara ouvirá umas e outras e resolverá a final como lhe parecer mais justo.

Mas s. ex.ª quer expor as suas rasões, ou quer que se discuta o parecer na presença do relator da commissão, e por isso sustenta a sua proposta de adiamento, a fim de que se espere pelo relator. Pois é preciso que se espere pelo relator para a camara saber os motivos que tiveram os membros da maioria da commissão para assignarem aquelle parecer? Pois é este um daquelles negocios em que o illustre deputado assignasse o parecer debaixo da fé do relator? Precisa s. ex.ª de relator para este defender o parecer em nome dos seus collegas? Se s. ex.ª não fosse orador, senão estivesse habituado a fallar, podia até certo ponto admittir-se o pedido; mas s. ex.ª não esta n'esse caso. S. ex.ª sabe as rasões que teve para assignar o parecer, e sabe expo-las á camara com muita clareza.

Além d'isto ha outra cousa sobre que chamo a attenção da camara.

E sabido que um dos membros da commissão, o sr. Mardel, não concordou com os seus collegas, que fez um parecer em separado contra o dos seus collegas. Este illustre deputado ha de expor as rasões que teve para se separar dos seus collegas. Aqui tem V. ex.ª mais um motivo para a discussão se não adiar. Os argumentos hão de cruzar-se na discussão entre o sr. Mardel, membro da minoria, e o sr. Silveira da Motta, membro da maioria da commissão.

Noto ainda que o illustre deputado, o sr. Silveira da Motta, assignou dois pareceres a respeito d'esta eleição; tem por isso uma responsabilidade indeclinavel ácerca d'este negocio. S. ex.ª precisa explicar-se. Ha de explicar-se, e estou certo que o fará brilhantemente, e da mesma fórma defenderá os pareceres. Pelo sr. Silveira da Motta respondo eu (riso).

É por estas rasões que voto contra o adiamento. A camara não póde annuir ao pedido do sr. Silveira da Motta, seria mesmo infligir uma suspeita muito immerecida sobre um dos nossos collegas que a não merece.

Não devemos adiar esta eleição por julgarmos o illustre deputado incapaz de sustentar o parecer, porque ha de sustenta-lo brilhantemente, e devemos considerar a proposta que s. ex.ª mandou para a mesa como uma proposta de melindre; póde ter rasões especiaes para isso, mas a camara é que não as póde admittir.

Sem entrar na questão, porque me quero ligar exactamente ao adiamento, voto contra elle, porque não quero rebaixar um collega meu.

(Pertencendo a palavra ao sr. Costa e Almeida, o sr. deputado cedeu-a ao sr. Silveira da Motta, sendo collocado na ordem da inscripção no logar em que este sr. deputado estava inscripto.)

O sr. Silveira da Motta: — Começo agradecendo ao meu illustre collega, o sr. Costa e Almeida, o ter cedido da palavra em meu favor, para eu poder defender o adiamento que propuz.

O parecer a que me refiro é verdadeiramente importante. Trata-se de uma eleição que a commissão julga nulla por manifesta infracção da lei e por fundadas suspeitas de fraude. Dos cinco membros da commissão, um, o sr. Alves Carneiro, que já em tempo deu seu o voto contra este processo eleitoral, julga-se com motivos bastantes de suspeição, motivos que devemos respeitar, embora os ignoremos; outro, o sr. Mardel, dá opinião em separado; e dos tres que restam e que assignaram o parecer, faltam o respectivo relator e o sr. Pequito de Seixas.

Em taes circumstancias poderá regularmente discutir-se? Será justo que quando temos esperado tanto tempo para a decisão d'este assumpto, não possamos agora demorar-nos por mais alguns dias, até que compareça o relator da commissão, ou que pelo menos esta possa reunir-se e escolher novo relator? Será prudente emittir o nosso veredictum sem primeiramente alcançarmos todas as garantias de que julgâmos com perfeito conhecimento de causa? Sem hesitar declaro á camara que me persuado que não (apoiados).

Disse o primeiro orador que impugnou o parecer, o sr. Faria Rego, que talvez eu o teria assignado por condescendencia, e que por isso não o quereria defender. Protesto contra esta asserção. Nunca assignei, nem em minha vida hei de assignar nenhum acto importante, nenhum parecer perante qualquer assembléa, e sobretudo perante uma assembléa tão respeitavel como é o parlamento, simplesmente por condescendencia.

A cima de todas as condescendencias, acima de todas as considerações de sympathia e de estima, a cima de quaesquer vantagens ou inconvenientes, esta a sustentação da verdade (apoiados). E esse um dever impreterivel, dever a que entendo que não póde faltar nenhum homem honesto, e de modo algum podem eximir-se aquelles que recebem a honra de ser representantes do paiz (apoiados).

Disse tambem o sr. Faria Rego que «poderia contar a historia d'este processo na commissão». Desejaria muito que s. ex.ª o fizesse, porque quanto a mim a reticencia é sempre peior que a narrativa (apoiados). Peço ao sr. Faria Rego que diga tudo quanto suspeite ácerca dos membros da commissão; porque eu para os defender julgo-me desde já perfeitamente habilitado.

Quanto ao que disse o meu amigo, o sr. Pinto Magalhães, distingo entre o favor e o argumento; o favor agradeço-o, e tanto mais quanto só posso attribui-lo (sem fingida modestia o declaro) á estima com que me honra; o argumento não o aceito, porque, quando se trata de objectos tão importantes, nunca são de mais todas as garantias para que se possa tomar uma deliberação acertada.

Mas o sr. Pinto de Magalhães levou a tal extremo o seu rancor contra o adiamento que quasi manifestou a vontade de que o sr. Mardel, não obstante sustentar uma opinião diametralmente opposta á do parecer da commissão, se encarregasse de ser o relator d'esse parecer.

Vou terminar, e peço desculpa á camara de lhe ter tomado mais tempo do que porventura devia. Espero que o adiamento será votado, principalmente depois da modificação apresentada pelo sr. Ferreira de Mello, modificação que eu já tencionava propor, e que aceito completamente, e espero que assim succederá, porque a camara de certo avalia quanto em honra das instituições liberaes e em homenagem á justiça é necessario que sejamos cautelosos e imparciaes. Imparciaes á custa de qualquer sacrificio; imparciaes, porque é esse o dever indeclinavel daquelles a quem cabe a nobre commissão de juizes. Vozes: — Muito bem.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Rodrigues de Azevedo.

O sr. Rodrigues de Azevedo: — Sr. presidente, acredito na theoria das compensações, nem posso deixar de o fazer. Não me recordo de ter pedido a palavra sobre o adiamento em questão, e todavia V. ex.ª offerece-m'a e eu aceito-a, porque vejo ahi uma compensação ás vezes que a tenho pedido, e me não tem chegado.

Aceito-a, repito, e começarei as minhas reflexões com as mesmas palavras com que o illustre deputado, o sr. Silveira da Motta, acabou o seu discurso em defeza do adiamento que propoz e que eu combato.

Disse s. ex.ª =votemos o adiamento por honra do systema representativo, que tem sempre tudo a ganhar, quando decidamos com justiça e moralidade =. Pois é por estes mesmos principios que eu digo, sr. presidente, — não votemos o adiamento, por que, por honra do systema representativo, é necessario mostrar que somos determinados em nossas acções por espirito de verdadeira justiça, dignidade e moralidade: e a justiça, a moralidade e a dignidade d'esta camara exigem imperiosamente que não protrahiâmos indefinidamente nem por mais tempo a entrada n'esta casa a um eleito do povo, que se esta legalmente eleito, tem tanto direito a estar aqui como qualquer de nós. A justiça, a moralidade e a propria dignidade ordenam que assim façamos, e é por isso que não desejo que a discussão d'esta eleição seja adiada por mais tempo.

Pronunciei-me e pronuncio-me contra o adiamento pelas mesmas rasões, que se tem apresentado para o sustentar. A falta do illustre relator da commissão, assim como a falta do sr. Pequito, são em verdade muito para sentir; mas a commissão não se reduz exclusivamente a estes dois illustres cavalheiros; pertencem a esta commissão outros illustres deputados, entre os quaes occupa logar distincto o sr. deputado Silveira da Motta, que acabou de fallar. E se eu ou alguem n'esta camara duvidasse da sua elevada capacidade, da fluência da sua palavra, ou dos seus dotes oratorios, o discurso que s. ex.ª acaba de pronunciar, seria rasão mais que sufficiente para dissipar todas as duvidas.

Em uma questão tão importante como esta, em que para formular o respectivo parecer, se deram taes difficuldades, que foram precisos mais de dois mezes de incessantes lucubrações e discussões no seio da commissão, para poder vir á luz do dia, não póde dizer-se, e ainda menos suppor-se, que o illustre orador que me precedeu não esteja completa e devidamente habilitado para sustentar o parecer que assignou, e que seja necessario esperar pelo sr. relator e pelo sr. Pequito. Uma questão tão importante como parece ser esta em vista do que se tem passado, foi por certo muito meditada e discutida no seio da commissão, e nenhuma das circumstancias relativas ao processo eleitoral podia deixar de ser attendida por mais insignificante que ella fosse ou parecesse.

Portanto em um negocio assim examinado e discutido, e por tanto tempo, não é possivel que haja um só membro, da commissão que não esteja devidamente habilitado para o tratar e esclarecer; e sendo assim, como não póde deixar de ser, por que e para que se ha de votar o adiamento?!

Não trato agora de saber se a eleição esta ou não legal, se esta ou não valida; a discussão ha de esclarecer esse negocio, e eu hei de votar pró ou contra; segundo as determinações que ao meu espirito impozerem as rasões e argumentos que forem apresentados.

Não conheço o cavalheiro a quem se refere esta eleição; é verdade que já hontem esteve n'este casa; mas, apesar d'isso, assevero a v. ex.ª que se agora o vira, de certo o não conheceria. Não tenho com elle relações de ordem alguma nem directas nem indirectas, estou por conseguinte inteiramente livre para ajuizar da questão só e exclusivamente pelos dictames da minha consciencia; e com relação ao adiamento considero-o pura e simplesmente em si e em relação á camara.

Digo pois que o adiamento não tem rasão de ser, e digo mais, que não é proprio da dignidade d'esta camara adiar por mais tempo a entrada n'esta casa a um eleito do povo, se a sua eleição estiver legal, porque n'este caso elle tem tanto direito a estar aqui como aquelle cujas eleições foram julgadas legaes. Se a eleição não estiver legal, devemos ser rigorosos reenviando-o perante os comicios que novamente decidirão. A honra e dignidade do systema representativo exige toda a circumspecção, e a maior justiça para que só entrem n'esta casa os verdadeiros eleitos do povo; e eu desejaria, sr. presidente, que a similhante respeito se tivesse empregado sempre o maior escrupulo e rigor. Até agora só tenho visto indulgencia, e por isso não posso deixar de estranhar o rigorismo que estou presenciando! Faz-me isto crer, sr. presidente, que ha aqui motivos ou rasões occultas que eu ignoro, e que mesmo não desejo nem quero saber.

Eu não sei se o candidato pertence a alguma das igrejinhas mais ou menos santas que me parece estarem já formadas n'esta casa. Como sou pouco devoto, assevero a v. ex.ª que não pertenço a nenhuma.

Tem-me parecido que se quer estabelecer n'esta casa uma certa divisão, e tenho por vezes ouvido fallar de uma certa • valia que dizem ser muito profunda e larga. Ainda não pude distinguir bem a tal valia; creio porém que existe e que será mesmo muito profunda; mas quanto á largura, sr. presidente, parece-me insignificante; e tanto que qualquer sem

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alargar o passo alem do natural facilmente a transpõe de um para o outro lado.

E com relação ainda á valia, permitta-me v. ex.ª, sr. presidente, que eu lhe diga com toda a franqueza que ainda não sei o que ella significa. Se se quer com isso significar que entre os membros d'esta casa ha uma grande distancia politica ou divergencia de intuitos, eu, na minha humilde obscuridade, não vejo nem uma nem outra cousa; antes me parece que são todos conformes em adoptar, acatar e desejar fazer adoptar e respeitar os principios da verdadeira liberdade. Parece-me tambem que todos estão conformes em apoiar, sustentar e propagar os principios de verdadeiro progresso e civilisação. Pelo lado politico pois não vejo a tal valia, e persuado-me que o sr. deputado eleito partilhará d'estas mesmas idéas.

Pelo que respeita á administração economica creio ainda que a reparação não é muito sensivel, porque me parece que todos nós estamos convencidos de que é preciso trabalhar efficazmente, e empregar todos os esforços para sairmos da pessima situação financeira a que somos chegados; situação que não vem d'este ou d'aquelle ministerio, mas que tem causas complexas e de longa data, sendo uma das principaes a epocha em que do paiz se apoderou uma verdadeira febre de melhoramentos materiaes e em larga escala, sem que devidamente se pensasse nos encargos que d'ahi resultariam para o paiz.

Agora o que é preciso, o que é urgente, é que todos façamos os sacrificios necessarios para sairmos d'este estado desgraçado; mas creio que ainda a este respeito todos estaremos a final de accordo, e em vista d'isso a tal valia se existe é bem microscópica.

Insensivelmente e sem o querer afastei-me do ponto em discussão—o adiamento, e d'isso peço desculpa a v. ex.ª; como porém não esperava fallar n'esta materia, não tinha tomado apontamentos alguns, e por isso fui apresentando as minhas reflexões como ellas se iam offerecendo ao meu espirito.

Em compensação vou resumir em poucas palavras o que ainda tenho a dizer, mesmo para não abusar da benevolencia com que a camara se tem dignado ouvir-me.

Se eu duvidasse da intelligencia, illustração ou capacidade de qualquer dos membros da commissão, não teria duvida em votar pelo adiamento, por isso que é preciso haver quem elucide devidamente a camara e a habilite a votar com inteiro conhecimento e verdadeira justiça; mas o sr. Silveira da Motta, jurisconsulto consummado, orador distincto, que deve ter discutido por muitas vezes este parecer no seio da commissão, que deve saber, e sabe com certeza, todas as circumstancias que lhe dizem respeito, por mais insignificantes que ellas sejam ou pareçam ser, esta de certo habilitado a esclarecer a camara e a fazer-nos sentir a todos as rasões que actuaram em seu espirito e o determinaram a assignar o parecer.

Deus me livre de fazer a s. ex.ª a injustiça de o não suppor devidamente habilitado, maximo tendo s. ex.ª assignado o parecer. Respeito assás s. ex.ª e a mim proprio para pensar de outra maneira.

Temos portanto quem sustente o parecer e tambem temos quem o combata. Sustentará o parecer o illustre deputado, o sr. Silveira da Motta, e combate-lo-ha o meu collega e amigo, o sr. Mardel, que até assignou um parecer em sentido contrario.

Temos pois dois distinctos oradores para discutir e pleitear esta eleição, e do certamen entre ss. ex.ªs, que provavelmente se não acharão só em campo, ha de saír uma luz tão clara como a do meio dia para elucidar e esclarecer o espirito da camara e habilita-la a julgar com verdadeira e recta justiça.

Estamos portanto no caso de rejeitar o adiamento e passar já á discussão do parecer. Praticar o contrario d'isto seria estabelecer um precedente de graves consequencias, e de alcance tal que nem ouso nem desejo qualificar.

Um tal precedente habilitaria a commissão a pôr fóra d'esta casa, quando quizesse, os deputados a respeito de cuja eleição tivesse de dar parecer. E para isso principiaria a commissão por demorar dois mezes o seu parecer, depois, quando o parecer estivesse dado para ordem do dia, faltaria o relator da commissão, e sendo necessario faltaria mesmo um outro membro. Fundamentado na falta do relator e de um outro membro, propor-se-ía o adiamento da discussão, e no entretanto o tempo correria, a sessão fechar-se ía e o deputado eleito ficaria a esperar a discussão da sua eleição até ás kalendas gregas.

Reflicta a camara bem n'isto e nas tristes consequencias a que um similhante precedente póde dar logar, não só com relação a qualquer eleição, senão tambem com relação á discussão de qualquer projecto de lei que haja de discutir-se e cuja discussão possa desejar-se embaraçar. Eleve-se a camara á sua verdadeira altura, e verá que a justiça, a moralidade e a lealdade lhe impõem o rigoroso dever de não dar occasião a que factos da ordem que venho de expor possam ter logar.

Eu não digo que seja tal o pensamento da actual commissão, composta como é de cavalheiros respeitaveis, mas entendo que a camara deve sempre conservar-se na altura que lhe é propria, e fazer com que todas as suas decisões tenham o cunho da moralidade, da justiça e da dignidade, sem o que a camara não póde ter força para impor ao paiz as suas resoluções. E todas as vezes que as resoluções da camara não forem tomadas debaixo d'este ponto de vista, tenho para mim que não fazemos senão abrir a cova para esconder o systema representativo.

Por conseguinte não se supponha que a camara não poderá esclarecer-se pela falta do sr. relator e do sr. Pequito, antes pelo contrario temos direito e obrigação de acreditar que a camara ha de ser sufficientemente esclarecida n'esta

questão, e depois d'isso a camara votará com a independencia que lhe é propria e como o pedirem a justiça e dignidade da camara. Rejeito pois o adiamento. Tenho dito.

O sr. Presidente: — Convido o sr. Sá Nogueira avir occupar o logar da presidencia.

Foi occupada a presidencia pelo sr. Sá Nogueira.

O sr. Almeida Araujo: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se julga esta materia sufficientemente discutida

Foi approvado este requerimento.

O sr. Seixas: — Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta. Voto contra o adiamento, sendo indefinido, e por isso mando para a mesa a seguinte proposta (leu).

O sr. Presidente: — Ha na mesa uma proposta do sr. Ferreira de Mello; pergunto ao sr. Silveira da Motta se concorda com a proposta do sr. Ferreira de Mello, e retira a sua?

- O sr. Silveira da Motta: — Sim, senhor.

O sr. Presidente: — Então ha a proposta do sr. Ferreira de Mello, sobre que se vae votar, devendo advertir, que estando n'este logar, cumpre-me dizer, que a proposta do sr Seixas, apesar de ser com pouca differença, a mesma do sr. Ferreira de Mello, não podia ser admittida, porque s. ex não tinha pedido a palavra durante a discussão, e é só permittido mandarem propostas aos srs. deputados que têem pedido a palavra sobre a materia, durante a discussão.

Vae portanto propor-se á votação a proposta do sr. Ferreira de Mello.

O sr. Secretario (José Tiberio): — Levantaram-se a favor da proposta 53 srs. deputados, e contra igualmente 53, portanto não ha votação.

Vozes: — Continua a discussão.

O sr. Rocha Peixoto: — Levantou-se agora mais um sr deputado.

O sr. Secretario: — Então esta rejeitado o adiamento. Vozes: — Não póde ser, não póde ser. O sr. Seixas: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer votação nominal sobre esta proposta (apoiados). Foi approvado o requerimento.

O rs. Presidente: — Vae proceder-se á votação; os senhores que approvam dizem approvo, e os outros senhores dizem rejeito.

Feita a chamada disseram approvo os srs.: — Annibal, Braamcamp, Ferreira de Mello, Villaça, Sá Nogueira, Castilho Falcão, Barros e Sá, Azevedo Lima, A. J. da Rocha, Magalhães e Aguiar, Costa e Almeida, B. F. Abranches, Conde de Thomar (Antonio), Custodio Freire, Eduardo Cabral, Fernando de Mello, Gavicho, F. L. Gomes, Silveira Vianna, Van-Zeller, Rolla, Guilhermino de Barros, Silveira da Motta, Freitas e Oliveira, Baima de Bastos, Judice, Mattos e Camara, Ayres de Campos, João de Deus, Gaivão, Cortez, Aragão Mascarenhas, Pinto de Vasconcellos, Fradesso da Silveira, Faria Guimarães, Gusmão, Galvão, Bandeira de Mello, Correia de Oliveira, Sousa Monteiro, Freire Falcão, Lemos e Napoles, Vieira de Sá Junior, J. M Lobo d'Avila, Rosa, José de Moraes, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Motta Veiga, Aralla e Costa, Pereira Dias, Lavado de Arito, Mathias de Carvalho e R. Venancio Rodrigues.

E disseram rejeito os srs: — Adriano de Azevedo, Alvaro Seabra, Antonio de Azevedo, A. B. de Menezes, Ferreira Pontes, Guerreiro, Seixas, A. J. Teixeira, A. Pinto de Magalhães, Faria Barbosa, Araujo Queiroz, Lopes Branco, Torres e Silva, Augusto de Faria, Barão da Trovisqueira, Garcez, Cunha Vianna, Testa, Vieira da Motta, Pereira Brandão, Faustino da Gama, F. F. de Mello, Dias Lima, F. M. da Rocha Peixoto, Xavier de Moraes, Henrique Cabral, Faria Blanc, I. J. de Sousa, Meirelles Guerra, Almeida Araujo, Santos e Silva, J. A. Vianna, Mártens Ferrão, Assis Pereira de Mello, J. M. de Magalhães, Ribeiro da Silva, J. Pinto de Magalhães, Xavier Pinto, Klerk, Mardel, Sette, Faria Pinho, Teixeira Marques, Achioli de Barros, Frazão, J. M. Rodrigues de Carvalho, José Paulino, José Tiberio, J. F. Pinto Basto, M. B. da Rocha Peixoto, P. A. Franco, P. M. Gonçalves de Freitas, Ricardo de Mello Gouveia, Galrão, Theotonio de Ornellas e Deslandes.

Verificou-se que o adiamento fôra rejeitado por 56 votos contra 54.

O sr. Presidente: — Vae entrar-se na discussão do parecer sobre a eleição de Sabrosa. A mesa manda convidar o sr. deputado eleito, Jeronymo da Cunha Pimentel Homem de Vasconcellos, que se acha nos corredores da camara, para vir defender a sua eleição á barra.

(O sr. deputado eleito foi introduzido na sala.)

O sr. Faria Rego: — As actas d'esta eleição e os recenseamentos estão perfeitos, sem constar d'estes documentos que houvesse a menor illegalidade ou irregularidade na eleição de Sabrosa; e isto não sou eu só que o digo, são todos os membros da illustre commissão, que tanto no primeiro parecer como no segundo declararam que das actas nada consta contra a legalidade e regularidade da eleição.

Não posso deixar, para melhor esclarecimento da camara, de historiar, o que farei o mais resumidamente possivel, os factos que se deram n'esta eleição, e d'esta maneira parece-me que tambem satisfaço os desejos do meu illustre collega, o sr. Silveira da Motta.

Na assembléa de Provezende é que se suscitou questão sobre a nullidade ou validade da eleição; mas em todas as outras assembléas não se deu questão alguma ou queixa.

A eleição de Provezende correu tranquilla e socegadamente. Estando presentes os gladiadores de um e de outro lado, e em todo o acto não appareceu uma só queixa ou uma só reclamação.

Assim correu esta eleição até ao dia 29 de março, em que se tratou do apuramento dos votos.

N'essa occasião diz-se que se apresentou um protesto mas não existem provas; e diz se tambem que não fôra aceita pela mesa do apuro por estarem concluidos os seus trabalhos e assignada a acta. '"'

No dia 30 de março fez o cidadão José Correia de Barros, em a nota de um dos tabelliães de Sabrosa, um protesto contra a eleição de Provezende; escuso de le-lo porque vem relatado no seu todo em o primeiro parecer da commissão.

Depois d'este dia, no dia 1 de abril, requereu o mesmo José Correia de Barros ao juiz ordinario de Sabrosa o justificar as illegalidades ou nullidades das eleições de Provezende, declaradas no protesto, sendo-lhe designado para o inquerito o dia 4.

Tendo-se inquerido uma unica testemunha no referido dia, appareceu um advogado com procuração legitima do eleito, o sr. Pimentel, pedindo vista para contestar essa justificação. Foi-lhe concedida e contestou.

Recorreu o justificante d'este deferimento que concedeu a vista e admittiu a contestação para o juizo de direito da comarca.

O recorrente foi provido e d'este provimento se recorreu para a relação. Assim n'este estado existe o processo em Sabrosa, sem d'elle se poder colher prova alguma que justifique esses actos illegaes declarados no protesto.

Depois foi requerida outra justificação perante o juizo de direito de Villa Real, e eu peço a attenção da camara para o que vou relatar sobre o modo como se procedeu n'essa justificação. No dia 7 de março requereu, não José Correia de Barros, mas José Augusto Correia de Barros, para justificar perante o juizo de direito de Villa Real a materia do seu protesto. No dia 7 apresentou-se o requerimento; no dia 7, foi deferido; no dia 7 foi distribuido, sem ser dia de audiencia, contra a expressa determinação da lei; no dia 7 passou-se o mandado e assignou-se para serem citadas as testemunhas, a fim de deporem no dia 8; no dia 7 todas as testemunhas foram citadas em Villa Real, sendo de freguezias distantes mais de tres leguas.

Póde-se de um documento tal obter prova clara e que convença de que aquelles actos declarados no protesto existiram de facto? Póde-se negar que as testemunhas foram trazidas a Villa Real de distancia de tres leguas, pela propria parte justificante? Quem póde dizer que estas testemunhas merecem fé e credito em juizo?

Mas não pára aqui o escandalo. Inquirida a primeira testemunha no dia 8, appareceu um advogado com procuração legitima do presidente da mesa de Provezende, a requerer vista da justificação para a contestar. Negou-se-lhe a vista; aggravou, e não se lhe admittiu o aggravo; requereu depois carta testemunhal. Em seguida o deputado eleito mandou tambem uma procuração ao mesmo advogado que requereu vista, não só para contestar mas para deduzir uma excepção litis-pendentes, visto que existia já uma justificação identica e sobre o mesmo objecto em Sabrosa. Negou-se-lhe tambem a vista; aggravou, não se lhe admittiu o aggravo e requereu carta testemunhavel.

Mas o mais notavel de tudo é a rasão por que não se concedeu esta vista. Disse o douto juiz que a não concedia por não ser o requerente, o sr. Pimentel, parte legitima nem interessada na questão. Pretendia-se annullar-se-lhe a eleição, e não é parte legitima nem interessada. Isto não se acredita, mas é verdade, o processo o prova. O juiz declarou que a parte legitima que podia contestar a justificação era a mesa. Appareceu em seguida o mesmo advogado com procuração legitima a pedir vista em nome da mesa; negou-se-lhe igualmente, e quer a camara saber o motivo? Negou-se-lhe, porque os cavalheiros que estavam assignados na procuração não provavam que eram os que tinham constituido a mesa. Isto é que é ser juiz.

Aggravou-se d'este indeferimento, mas não se admittiu o aggravo, e pediu-se tambem carta testemunhal.

Foram pois inquiridas as testemunhas, e até n'este acto procedeu o juiz de uma fórma revoltante; o predito advogado pediu e requereu permissão de instar as testemunhas, não se lhe concedeu, e só o de assistir ao inquerito, sendo o acto publico. A final o mesmo advogado deduziu ao juiz uma suspeição pela sua parcialidade e grande amisade.

Póde haver maior parcialidade e maior injustiça?! Póde a commissão dar fé a um documento d'estes?! Póde a commissão obter prova d'esse documento?

Inquiriram-se as testemunhas, como já declarei, e deixarei para logo a analyse de seus depoimentos. O eleito, o sr. Jeronymo Pimentel, requereu, no juizo de Sabrosa, o justificar a materia da sua contestação, e produziu ahi sete' testemunhas, cujos depoimentos tratarei. Esta justificação esta concluida e julgada, o que se não dá com as de que primeiro fallei, requeridas por José Correia e José Augusto Correia.

As testemunhas produzidas pelo dito cidadão José Augusto Correia no juizo de Villa Real, não só foram trazidas a Villa Real a rogos do justificante, mas por elle sustentadas. D'isto não se póde duvidar, não foram todas de Provezende, onde teve logar a eleição, foram quatro de Sabrosa e seis de differentes freguezias do concelho de Provezende, foram mendigadas por toda a parte menos em Provezende. Andou-se de freguezia em freguezia para se poderem arranjar. Que podem provar estas testemunhas trazidas pelo justificante? Todas ellas fallaram de ouvida na maior parte e singulares nos factos que juram de presencear, e são todas de uma classe baixa. Pelo contrario as testemunhas que juraram pelo cidadão, o sr. Jeronymo Pimentel, são advogados, vereadores e conselheiros municipaes, todos pessoas mais elevadas, e que juram uniformemente sobre os seguintes factos:

Juram que, quando se terminaram os trabalhos eleitoraes no primeiro dia, o presidente perguntara se queriam lacrar

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A urna e que os da parte contraria lhe disseram que confiavam na probidade da mesa.

Juram que o presidente não fez só isto; que o presidente fechou a uma com tres chaves, que reservou uma para si, porque a lei lh'a, mandava entregar, que as outras duas foram entregues aos dois secretarios e uma a cada um, que depois a uma fôra fechada em um caixão que estava na sachristia, sendo tambem a chave entregue ao presidente, que offereceu as duas chaves ao chefe dos contrarios, que as recusou, dizendo da mesma sorte que confiava na mesa. Isto juram todas as testemunhas do justificante, o sr. Pimentel, que são todas uniformes em o asseverar.. E jura-o uma testemunha contraproducente produzida pela parte contraria na justificação de Villa Real, o doutor, cujo depoimento eu passo a ler á camara. Não o lerei todo, para a não cansar, mas só no ponto de que trato (leu).

É uma testemunha produzida pela parte contraria, o vencido José Augusto Correia, que corrobora, que confirma os depoimentos das testemunhas do justificante, o sr. Jeronymo Pimentel.

Passo a ler o depoimento de uma das testemunhas d'esta justificação, visto que são todas conformes, e seria fastidiosa á camara a leitura de todos os depoimentos, por isso que os póde ver e examinar n'este documento.

Eis-aqui pois os documentos juntos ao processo para provar a materia do processo. Os dois primeiros por concluir, por julgar, não se admittindo o eleito a contestar, a defender-se, nem a mesa, nem q presidente, praticando-se assim as maiores injustiças parcialidades, e onde as testemunhas foram trazidas a distancia de tres leguas, sendo mendigadas pelos freguezes, pelo proprio justificante, e o terceiro provando que a eleição correu com toda a legalidade e que a mesa usára de toda a franqueza com os contrarios, offerecendo-lhes até as chaves da uma, e o poderem lacra-la.

A commissão tanto o reconhece, que. no parecer não diz uma só palavra sobre estes documentos.

Porque não se queixaram, não reclamaram, não protestaram os contrarios no acto da eleição do dia 22, e só no dia 30 é que protestam? Isto não prova a má fé do protesto, corroborada pelo que dizem as testemunhas referidas? Entendo que sim.

Que diz o parecer? O parecer apresenta unicamente quatro considerandos para base da conclusão:

Primeiro que =as listas não foram rubricadas e que o eleito o confessa na sua eleição, sendo certo que pelo artigo 74.°, § 1.° da lei, de 30 de setembro de 1862 é uma nullidade =. O § 1.° diz que =se a votação se não concluir serão as listas rubricadas, mas a votação conclue-se =. Estas são as palavras da lei, e em presença da letra da mesma lei, concluida a, votação, não obriga a rubricar. Por que não houve este escrupulo: com as eleições de Mafra, Arouca, Caldas, e outras que se apresentaram no mesmo estado? Qual a pena da lei pela falta das rubricas? A de nullidade? Não a encontro.

Segundo que =não fôra sellada a uma, nem a area em que fôra guardada =. Aquelle dito § 1.° diz = o cofre poderá ser sellado e as testemunhas do eleito, o sr. Pimentel, e uma contraproducente do cidadão Barros juram que = o presidente perguntara se queriam a uma sellada, e que se respondêra negativamente =.

Terceiro que, = a eleição em Sabrosa tendo mais votantes acabára no mesmo dia, o que se não dera em Provezende tendo menos, não constando da acta o motivo da demora =. Que lei o manda declarar? Quantos motivos não podiam occorrer? Diz o protesto que = se procurava demorar a eleição = e tambem diz que = se não fez a chamada que demorava bastante =. Por que não reclamaram os contrarios que estavam presentes, por que não sellaram a uma, por que não aceitaram as chaves? Na eleição da Barca aconteceu o mesmo, sendo ainda menos os votantes, e n'esta casa não se ouviu uma voz. O eleito era o sr. ministro das obras publicas.

O quarto são os 182 eleitores que declararam em documentos reconhecidos o terem, votado no cidadão José Augusto, Correia, tendo este só 62 votos.

A illustre commissão, tão escrupulosa em tudo, não teve escrupulo em deixar de fazer um serio e detido exame sobre os documentos juntos, tendo dois mezes e vinte e tantos dias para faze-lo? Se os examinasse como era de seu dever, havia de encontrar que parte dos taes 182, uns não são recenseados, outros não votaram, e convencer-se de que se empregou toda a qualidade de alcantinisse para se obter documentos que fizessem annullar a eleição.

Sr. presidente, que se pretende com os adiamentos, tendo este ultimo 54 votos para ser discutido em separado? Ouvi dizer que uns adiamentos podiam ser discutidos conjunctamente, outros não. E o regimento vivo, é um direito só proprio e privativo d'esta casa, onde ninguem sabe a quantas anda (riso).

A illustre commissão reconhece a grave molestia que soffre o parecer, e receia ve-lo morrer-lhe nas mãos. Nem outro póde ser o motivo de tão escandalosos adiamentos.

O que mais condemna a commissão e o parecer em discussão é a incontestavel contradicção em que ella se envolveu e que é patente da confrontação do primeiro parecer com o segundo; a commissão declara no primeiro parecer que = emquanto, não receber os documentos comprovativos dos factos declarados, no protesto, com consciencia desaffrontada e livre de escrupulos, não podia julgar da validade ou nullidade, da eleição, nem da procedencia ou improcedencia do»protesto, e que por isso era mister esperar essas provas que estavam requeridas no judiciario =. Agora, depois de tanto tempo de estudar, considerar e meditar, apresenta-nos' um parecer em, contrario, sem lhe serem presentes os taes documentos comprovativos!!! Até certo tempo & consciencia da commissão estava mergulhada em duvidas, em escrupulos, e agora sem motivo plausivel, apparece com a consciencia desassombrada! (Apoiados).

É porque chegaram os taes documentos? (Disse-se ha pouco.) Quaes são os documentos que chegaram? Será um o da relação dos 182 eleitores que, confrontada com o recenseamento (ao qual trabalho se não quer dar a commissão, sendo tão escrupulosa), se encontra parte dos ditos eleitores não recenseados e outros que não foram votar? Será com este documento que a commissão desassombrou a sua consciencia e se pretende salvar? ¦

Qual é o novo documente que chegou em auxilio da commissão e que a justifica? É a justificação de Villa Real a mais parcial que se tem visto? Parece incrivel que na presente epocha se procedesse com tanta leviandade e injustiça. Uma justificação onde se não admittiu contestação, nem defeza, nem recursos, nem cousa alguma e só e unicamente se consentiu ao advogado o assistir ao inquerito, sendo publico, e nenhum outro favor (riso).

São estes os documentos novos em que a commissão fundamenta o segundo parecer? O processo não apresenta outras.

Se a commissão não podia esperar pelas justificações judiciaes a pro do protesto, o que devia reconhecer, para que foi tanta demora? A commissão ficava em melhor campo, se apresenta este segundo parecer em logar do primeiro. Logo que apresentou o primeiro parecer e os documentos chegados são mais a favor da validade do que da nullidade,

O segundo parecer é insustentavel por parte da commissão. Não quero por mais tempo cansar a camara, e por isso

concluo votando contra o parecer da maioria e votando pelo da minoria, elaborado magistralmente e que convence da contradicção em que se encontra a commissão com os dois pareceres, e da injustiça manifesta com que se conclue pela nullidade da, eleição no segundo parecer (apoiados). Vozes: — Muito bem.

O sr. Mathias de Carvalho: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se me concede a palavra para um negocio urgente.

Abstenho-me de fundamentar o meu requerimento, porque a camara bem sabe que não costumo abusar da palavra que se me concede.

Peço pois a v. ex.ª que submetta á votação da camara o meu requerimento.

O sr. Presidente: — Peço ao sr. deputado que queira indicar-me o objecto de quer tratar, porque de outro modo a camara não póde votar com conhecimento de causa se lhe deve ou não conceder com urgencia a palavra.

O Orador: — Julgava que os requerimentos se não podiam fundamentar; mas visto que v. ex.ª me convidou a indicar o objecto para que pedi a palavra vou indica-lo. ¦ Fui surprehendido, e desejo uma explicação do governo, visto que não esta presente o ministro a quem desejo referir-me; fui surprehendido, digo, com a comparação que se póde estabelecer entre o despacho do ministerio dos negocios da justiça, publicado no Diario de 20 de junho, e o despacho publicado no Diario de 27 de junho. D'esta comparação resulta que para o mesmo logar estão nomeados dois delegados pela transferencia do mesmo individuo! Parece-me que é uma cousa inteiramente nova...

1 O sr. Presidente: — O sr. deputado já indicou o objecto da sua moção e por isso vou consultar a camara sobre se lhe dá a palavra.

Consultada a camara decidiu negativamente por 55 votos contra 33.

O sr. Mathias de Carvalho: — Então peço a v. ex.ª que me conceda a palavra antes de se fechar a sessão.

O sr. Ministro da Fazenda (Dias Ferreira): — Mando 'para a mesa uma proposta de lei sobre a necessidade de prorogar ainda, o praso para o curso legal das moedas mandadas retirar da circulação pelas disposições das leis de 29 de julho de 1854.

O sr. Presidente: — Continua a discussão sobre a eleição do circulo n.° 44.

O sr. Faria Guimarães: — -Estas questões eleitoraes são essencialmente melindrosas, porque envolvem personalidades; e por essa rasão eu tive sempre grande repugnancia em tomar parte em discussões d'esta ordem; mas agora tenho motivos para me não limitar a dar um voto secreto; porque o conhecimento que tenho de algumas particularidades que se deram na eleição de Sabrosa, e especialmente na assembléa de Provezende, me convenceram da nullidade d'esta eleição, antes mesmo de ver o parecer da illustre commissão.

Não direi porém á camara as rasões particulares que concorreram para me convencer da nullidade da eleição;.porque são confidenciaes, e a camara não tem os motivos que eu tenho para dar inteiro credito aos factos que influiram na minha convicção. Tratarei sómente do que é publico.

E sabido, e no seu parecer de 25 de abril o dizia a commissão, que o candidato José Augusto Correia de Barros, tratava de justificar em juizo a fraude que se deu na assembléa de Provezende, mas tambem é sabido que se tem por todos os modos tratado de evitar essa justificação, que por causa de taes embaraços ainda não esta concluida. Eu não ligo grande importancia a esta? justificações po-. líticas, que em regra são consideradas como graciosas; mas em presença de um documento publico fornecido pelo presidente da assembléa de Provezende, e do empenho com que se procurou embaraçar aquella justificação parece-me que sem dependencia do exame que fez a commissão, e do estudo do seu relatorio se póde duvidar da validade da. eleição.

O documento publico a que me refiro é uma carta do presidente da mesa da assembléa de Provezende, José Joaquim de Oliveira Abreu, parcial do candidato ou deputado eleito, a qual vem publicada no Commercio do Porto, n.° 85, de 15 de abril, em que se confessam faltas, que independente de outros factos, são para mim motivo de nullidade.

Direi mesmo que me parece que isto que fez peso no meu animo o deve fazer no da camara. Refiro-me principalmente á falta de rubrica nas listas da eleição na assembléa de Provezende. E este um acto de que se não póde prescindir.

A lei exige expressamente que se rubriquem as listas. E este um preceito da lei tendente a acautelar as fraudes que se podem fazer. Se fosse um preceito de que se podesse, prescindir, então de certo a lei não fallava d'elle; mas a lei que o estabelece, é porque quer que se observe para evitar as fraudes que era facil darem-se se não existisse esse preceito, e se existindo, não se observar.

Disse eu, e repito, que antecipadamente ao parecer da commissão tinha formado o meu juizo ácerca d'esta eleição, porque logo liguei muita importancia a esta falta de rubrica nas listas.

Desde que o presidente da mesa da assembléa de Provezende declarou expressamente que as listas não foram rubricadas, e que a uma não foi lacrada, etc.. para mim esta claro que a eleição é nulla.

Tenho presente esse documento que me induz a acreditar muito na nullidade da eleição.

O documento a que me refiro é, como já disse, uma carta de José Joaquim de Oliveira Abreu, presidente da mesa eleitoral da assembléa de Provezende, que, respondendo a artigos que contra elle se publicaram, diz, entre outras cousas, o seguinte:

«Cumpriram-se todas as formalidades que a lei determina, nem uma só escapou, e só agora dizem o contrario, ou mentem ou ignoram a lei.»

Note-se bem, cumpriram-se todas as formalidades que a lei determina, nem uma só escapou. Mas mais adiante diz o seguinte:

«Terminada a votação, e findas as duas horas de espera, era sol posto, não podiam por isso continuar os trabalhos eleitoraes. Não foram rubricadas as listas, porque a lei o não manda; quem asseverar o contrario ignora completamente o artigo 74.° do decreto eleitoral, que só as manda rubricar quando se não tenha concluido a votação no primeiro dia.»

Declaro pois que não foram rubricadas as listas.

N'uma, parte diz que = se cumpriram todas as formalidades marcadas na lei, que nem uma só escapou =. E logo em seguida diz que =as listas não foram rubricadas =.

A lei quiz esta cautela da rubrica das listas, para evitar as fraudes.

A rubrica dar, listas é obrigatoria em presença da disposição do § 1.° do artigo 74.º da lei eleitoral, que não póde querer acautelar o menos, e abandonar o mais...

(Interrupção que não se ouviu.)

Bem. Eu não sou jurisconsulto. Mas admiro a conclusão que quer tirar o presidente da mesa de Provezende, que me consta é jurisconsulto, e vejo que a opinião d'elle é apoiada por outro jurisconsulto, que muito respeito, o sr. Faria Rego.

Eu não entendo que se possa tirar tal conclusão; talvez seja isto por falta de conhecimentos juridicos da minha parte. Porém admiro que se diga — não se faltou a uma só das formalidades marcadas na lei, e logo em seguida se diga — não se rubricaram as listas; formalidade esta que esta marcada na lei, que de certo não teve em vista evitar a falsificação a retalho, e permitti-la por grosso.

Mas diz-se mais n'esta carta:

Fechada a uma, perguntei se alguem requeria que ella fosse lacrada; ninguem o requereu. Perguntei ainda onde queriam que ella ficasse; o silencio foi a resposta. Deliberou então a mesa que ella fosse encerrada n'um caixa forte, pertencente á irmandade das Almas, e que se acha na capella mór da igreja. Collocada ahi em presença dos srs. Santos, foi fechada a caixa, cuja chave, bem como a da uma, que me pertencia como, presidente, foram por mim offerecidas ao sr. Antonio dos Santos, que recusou guarda-las.

«Estando tudo concluido, e fechadas as portas da igreja, levei as chaves para minha casa, onde estava hospedado o sr. Antonio dos Santos.

«Instado este senhor para que aqui ficasse, recusou-se por motivo de negocios de sua casa, que é inutil mencionar. Durante a noite, como constasse que gente de S. Martinho e Sabrosa queriam vir roubar a uma d'esta assembléa, porque já previam a derrota, alguem se conservou nas vizinhanças da igreja para reagir, caso tentassem, vir roubar-nos a uma.

«Nada d'isso aconteceu porém.

«No dia seguinte, á hora marcada, etc...

«Provezende, 8 de abril de 1868. = José Joaquim de Oliveira Abreu.»

Conservou-se alguem em volta da igreja com o receio de que a uma fosse roubada. Mas a mim fica-me a suspeita de que talvez a guarda á igreja tivesse outro fim.

Agora sempre fallarei n'uma cousa, apesar de não ligar grande importancia ás justificações d'esta natureza politica, cousa que não vi, mas que me asseguram que alguem ida commissão viu n'este processo, e é o seguinte:

Uma testemunha das que depõe na justificação do sr. deputado eleito, diz que = dormiu na casa do presidente da mesa eleitoral na noite seguinte á da eleição, que viu a sala onde ficaram as chaves, e que observou que durante toda a noite ninguem foi áquella sala =

Eu não sei se a testemunha padecia de insomnia; mas a, conclusão que se deve tirar do seu depoimento, é que não dormiu toda a noite, por isso que assevera que durante ella.

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ninguem foi á sala onde estavam as chaves. Parece-me que prova de mais.

No parecer em separado que apresenta o illustre membro da commissão, o sr. Mardel, censura-se de algum modo a delonga que tem havido em concluir a justificação que a commissão julgava que deveria influir no seu animo, para a resolução d'esta questão. Pois eu declaro que a rasão por que essa justificação aqui não tem chegado, influe tambem no meu animo, para suspeitar de que o que se queria justificar era verdade, porque desde que se empregou toda a chicana forense (creio que é expressão propria de gente de fôro), desde que se embaraçou, por todos os modos que a lei permitte, que a justificação se concluisse, aquelle que assim procedeu, parece-me que apresenta suspeitas contra si proprio.

Voltando á carta, dir-se-ha: «Mas esse carta que appareceu publicada no jornal o Commercio do Porto, será verdadeira?» Em primeiro logar não me consta que o sr. Abreu reclamasse contra ella; mas ainda assim, eu, apesar do conceito que faço da illustre redacção do Commercio do Porto, de que não era capaz de publicar um documento d'esta ordem sem ser devidamente reconhecido, como aquelle documento fazia muito peso no meu animo, dirigi-me á redacção d'aquelle jornal, pedindo-lhe o obsequio de dizer se estava ou não reconhecida a firma d'aquelle individuo, e o sr. Manuel de Sousa Carqueja, proprietario e administrador d'aquelle jornal, fez-me a honra de me responder o seguinte:

«Ex.mo sr. — Satisfazendo da maior vontade á pergunta que v. ex.ª me faz, cumpre-me dizer-lhe que a correspondencia assignada por José Joaquim de Oliveira e Abreu, publicada no n.° 85 do nosso jornal, se acha competentemente reconhecida pelo tabellião de Villa Real, José de Oliveira, e que nos foi apresentada pelo sr. José Francisco da Costa Guimarães, pessoa para nós e para V. ex.ª da maior confiança.

«Porto, 21 de maio de 1868. =21. S. Carqueja.»

Depois d'isto desappareceram para mim todas as duvidas que podia ter sobre se o documento era authentico, e sendo-o, como creio que é, parece-me que a coarctada de que o artigo 74.°, § unico, da lei eleitoral não exige a rubrica dás listas, não aproveita nada á defeza da eleição.

Vozes: — Deu a hora.

O Orador: — Deu a hora e ainda que pouco mais tenho a dizer, peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para a sessão seguinte.

O sr. Presidente: — Tinha pedido a palavra para antes de se fechar a sessão o sr. Mathias de Carvalho.

O sr. Mathias de Carvalho: — Respeito a decisão que a camara tomou, não me deixando usar da palavra na occasião competente; mas aproveitando o direito que me compete, mando para a mesa a seguinte nota de interpellação:

«Desejo interpellar, com toda a urgencia, o sr. ministro da justiça ácerca do despacho de dois bachareis para o mesmo logar de delegado de procurador regio na comarca da ilha de S. Jorge.»

Espero que o sr. ministro venha, quanto antes, dar explicações á camara ácerca d'este negocio, que me parece realmente cousa inexplicavel, a não ser que houvesse algum engano; mas eu tenho algumas considerações a fazer a respeito da possibilidade do engano, e por isso desejo que o sr. ministro venha, quanto antes, responder a esta interpellação, que reputo urgente.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para terça feira é a mesma que estava dada, devendo começar pela continuação da discussão do parecer sobre a eleição de Sabrosa, seguindo-se depois o projecte sobre a desamortisação.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

Em cumprimento de resolução da camara dos senhores deputados se publica o seguinte

Proposta, de lei n.° 22-B

Senhores. — Por carta de lei de 2 de julho de 1867 foi o governo auctorisado a transferir do capitulo das despezas diversas da tabella do ministerio dos negocios da fazenda as sobras que n'elle houvesse, e a applicadas no exercicio de 1867 ao pagamento das quotas de cobrança dos rendimentos publicos e despezas diversas das repartições de fazenda, descriptas no capitulo 8.° da mesma tabella, não podendo resultar d'esta transferencia augmento de despeza em relação do que fôra fixado para os referidos dois capitulos por lei de 19 de junho de 1866.

Por carta de lei de 16 de junho de 1866 fôra igualmente o governo auctorisado a tomar de emprestimo até á somma de 6.500:000$000 reis com applicação á despeza ordinaria e extraordinaria do estado nos exercicios de 1865-1866 e 1866—1867, sendo conseguintemente auctorisados os encargos com esta operação, que descriptos no artigo 17.° da tabella de despezas do ministerio da fazenda no exercicio de 1866-1867 por 659:000$000 réis, foram elevados a réis 1.183:118$399 em consequencia daquelle emprestimo, vindo assim a ser a somma total da despeza pelo ministerio da fazenda no dito exercicio, auctorisada por leis de 16 e 19 de junho de 1866, 4.782:198$063 réis.

Mas se as despezas liquidadas pelo ministerio da fazenda não excedem a totalidade que foi' auctorisada no dito exercicio de 1866-1867, comtudo não correspondem exactamente artigo por artigo ás fixadas na tabella respectiva. Ha sobras que é necessario transferir para que as differentes verbas fiquem sufficientemente dotadas, isto é, torna-se necessario applicar a doutrina da lei de 2 de julho de 1867 aos diversos capitulos da tabella de despeza, e n'estes termos tenho a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E o governo auctorisado a applicar as sobras que houver nos diversos artigos da tabella de despeza do ministerio dos negocios da fazenda, no exercicio de 1866-1867, ás despezas legaes do mesmo ministerio, que não tiverem sido sufficientemente dotadas, sem que comtudo d'essa transferencia possa resultar augmento de despeza em relação ao que foi votado por lei de 16 de junho de 1866, 524:118399 réis, e por lei de 19 de junho de 1866, réis 4.258:079#664, fazendo o total de 4.782:198063 réis.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, 30 de junho de 1868. = José Dias Ferreira.

Proposta, de lei n.º 22-C

Senhores. — A importancia total da despeza auctorisada ao ministerio dos negocios da fazenda, no exercicio de 1867-1868, por lei de 26 de junho de 1867, é sufficiente para a satisfação de todas as despezas liquidadas e que se liquidarem no mesmo exercicio; torna-se porém necessaria a transferencia das sobras de alguns capitulos para dotar outras verbas, que não o foram sufficientemente no respectivo orçamento, e por isso tenho a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É auctorisado o governo a applicar no exercicio de 1867-1868, as sobras que houver nos diversos capitulos da tabella de despezas do ministerio dos negocios da fazenda, approvada por lei de 26 de junho de 1867, ás despezas legaes do mesmo ministerio no referido exercicio, comtanto que d'esta transferencia não resulte augmento de despeza em relação ao que se acha fixado na legislação em vigor.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario. Ministerio dos negocios da fazenda, em 30 de junho de 1868. = José Dias Ferreira.

Proposta, de lei n.° 23-A.

Senhores. — Ha muitos annos que se reconhece a necessidade de melhorar as condições florestaes do paiz, mas até hoje não se hão dado senão timidos passos n'esse caminho.

Havia no reino grande copia de arvoredos, que lenta e successivamente se foram derrotando, para aproveitar os terrenos em culturas arvenses, e mais tarde na plantação das vinhas e olivaes.

D'aqui não veiu o mal, que actualmente sentimos, porque na vastidão dos nossos bosques havia muitos terrenos ferteis, que convinha rotear, sem prejuizo das necessidades do consumo dos productos florestaes.

Quando se intentaram as gloriosas navegações o conquistas, que immortalisam o nome portuguez, os nossos soberbos galeões eram todos fabricados das excellentes madeiras que então havia no reino. Esta circumstancia chamou a attenção dos monarchas sobre a necessidade de proteger os arvoredos contra uma imprevidente devastação.

Ao abrigo d'este principio protector, corroborado pelo intuito da creação dos animaes silvestres reservados para a venação do rei e dos nobres, passaram através de seculos grandes massas lenhosas, sempre respeitadas do machado arboricida.

As isenções e vantagens do officio de monteiro mór do reino, exercido sempre pela alta nobreza, testemunham o desvêlo com que a corôa entendia na conservação das matas, defezas ou coutadas, em que era prohibido, sob penas severas, caçar ou cortar madeira sem licença regia. No cartorio da montaria mór existem maços de cartas regias, e algumas até escriptas pelo punho do proprio rei, concedendo licenças, ás vezes, para insignificantes córtes de madeiras.

O que attesta ainda de um modo irrefragavel a vigilancia e cuidado, que os antigos monarchas empregavam para crear e conservar a propriedade florestal, é sem duvida, a sementeira dos pinhaes de Leiria, que as tradições attribuem, em parte, ao nosso memoravel Rei-lavrador, porque o resto foi mandado semear por El-Rei D. João III.

Mas a prova mais concludente de que nas passadas eras se comprehendia a necessidade de fomentar a riqueza florestal, esta no complexo da nossa legislação, que encerra uma serie de providencias, todas fundadas sobre os principios da protecção e conservação dos arvoredos, tanto dos que eram administrados pelo estado, como dos que pertenciam ao dominio particular.

E sendo assim, como é que chegámos, pela desarborisação do paiz, a uma situação insustentavel, na presença das exigencias da economia publica?

De uma nota que acompanha o regimento do monteiro mór do reino, datado de 1604 consta que em diversas localidades do continente do reino existiam para mais de 157 grandes matas, pinhaes ou coutadas, das quaes nem vestigios se encontram actualmente. De outros documentos se collige que ainda nos reinados de D. João IV, D. Affonso VI e D. Pedro II se conservaram grandes massas de arvoredo, e que dellas se extrahiam as madeiras necessarias para as construcções navaes.

Parece pois que a desarborisação do paiz data do reinado de D. João V, e que ella se deve ás seguintes causas:

1.ª A cultura do milho grosso ou maiz nos terrenos marginaes dos rios e ribeiras das provincias da Beira, Minho e Traz os Montes, que occasionou a extirpação dos brejos e arvoredos que desde primitivos tempos ali vegetavam;

2.ª A cultura da vinha, cujo desenvolvimento data do principio do seculo passado, que originou a roteação de grandes tractos de terrenos encostados, que mantinham espessos arvoredos silvestres;

3.ª Em geral, ás culturas arvenses e principalmente a dos prados permanentes, que se alargou á custa da roteação de bosques;

4.ª Ao estreitamento das relações commerciaes com os portos do Brazil, que introduzindo no reino as preciosas madeiras das colonias promoveu a depreciação das indigenas;

5.ª Á distillação dos vinhos, que tendo desde os fins do seculo passado grande incremento, determinou o côrte radical de muitas plantas arboreas que nunca mais se substituiram;

6.ª Ao machado do carvoeiro, inimigo implacavel das matas e montados, que figura como principal agente da destruição florestal;

7.º Finalmente, aos incessantes incendios fortuitos ou premeditados que têem reduzido a cinzas incalculaveis valores de productos florestaes.

São estas, em summa, as causas activas da desarborisação, as quaes coincidem com as causas passivas, isto é, com a imprevidencia e com o desprezo pela conservação dos antigos bosques e pelo plantio dos novos, trouxeram as cousas a ponto de se ter suscitado, da parte dos que comprehendem a importancia da riqueza silvícola, uma poderosa reacção a favor do melhoramento das condições florestaes do paiz.

Mas de que modo se póde regular este movimento espontaneo dos espiritos esclarecidos e affeiçoados pelo bem commum?

Não se apresenta o problema desacompanhado de graves difficuldades. E mais facil enunciar e demonstrar a necessidade e vantagens da sua resolução, do que prescrever as regras praticas que se devam seguir.

Vejamos pois em que termos bem claros se ha de collocar a questão, pondo de parto aquelles que" podem originar estereis e embaraçosas controversias.

O principio fundamental em que tudo se deverá assentar exprime-se n'este axioma: conservar o que temos e crear o que nos falta.

Antes de passar adiante, cumpre esclarecer um ponto escuro que nos póde transviar.

Deve o estado intervir na conservação e creação da riqueza florestal, ou deve abster-se, deixando á iniciativa particular essa funcção?

Dada a intervenção, devo ella exercer-se directa ou indirectamente?

A opinião dos homens mais competentes n'esta materia, em todos os paizes cultos, é que ao estado cumpre interferir, de ambos os modos, no fomento da riqueza silvícola.

Eis-aqui as rasões capitaes:

O governo central é, nos paizes livres, o protector nato de todos os grandes interesses sociaes, e ninguem contesta a necessidade e utilidade da sua intervenção indirecta no aperfeiçoamento das condições geraes da actividade industria.].

E portanto de rigor que o governo promova, dentro da orbita d'estes principios, o progresso silvícola do paiz, diffundindo os conhecimentos da economia florestal; removendo todos os impedimentos ao facil e livre transito dos seus productos, incitando, por meio de recompensas os que mais se distinguirem n'este ramo de industria, e reprimindo com a inflexivel vara da justiça penal, os attentados que contra a propriedade florestal se commetterem.

Mas que força de argumentação se apresentará para ultrapassar a esphera d'estes principios, geralmente admittidos, e sustentar a necessidade da intervenção directa dos poderes publicos, controvertida por uns, e reputada obnoxia por outros?

O modo como o governo deve interferir directamente na conservação e creação da riqueza florestal, diversifica na opinião dos economistas. Não vem a proposito referir o que diz cada um d'elles, bastará declarar, d'entre as diversas opiniões, a que se adoptou, e sobre a qual assentaram as respectivas disposições da proposta de lei que logo terei a honra de vos apresentar.

Os productos da industria florestal differem a muitos respeitos em sua natureza e no modo por que são creados, das producções de todas as demais industrias.

Basta reflectir que a sua creação depende dos morosos processos da vegetação, durante uma longa serie de annos.

O consumo d'esses productos representa uma verdadeira necessidade da economia social. A falta d'elles poderia trazer uma crise funesta, cujos damnos seriam incalculaveis. Nas outras industrias é mais remediavel a falta dos seus productos, que se obtêem na roda do anno, como na agricultura, ou ás vezes no giro diario, como nos artefactos.

E quem póde responder pelos desastrosos resultados da imprevidencia dos particulares?

O interesse privado não, porque são muito seductores os lucros provenientes da venda de massas florestaes de qualquer modo adquiridas. Ahi esta o exemplo na devastação de extensos montados povoados de sobreiros seculares, sacrificados pelo machado do carvoeiro.

Não é ainda o interesse particular que póde incitar o plantio de bosques, nas proporções das necessidades do consumo de seus productos. Suppõe-se geralmente que as sementeiras ou plantações florestaes só podem aproveitar ás gerações vindouras.

Para neutralisar os deploraveis effeitos da imprevidencia ou do egoismo dos particulares, é que se julga indispensavel a ingerencia governativa na producção silvícola. A nação bem administrada deve possuir reservas de producto florestaes, que salvem os riscos de uma crise, que a sua falta poderia originar, ainda em tempos normaes, quanto mais na presença de certa ordem de calamidades publicas, como a guerra, os grandes incendios e terremotos.

Das duas formas se póde estabelecer a intervenção directa, ou decretando as necessarias restricções no direito da propriedade particular, ou tomando o governo sobre si o cuidado de crear e conservar uma certa quantidade de riqueza florestal, a que se julgue sufficiente, a fim de consti-

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tuir as reservas indispensaveis para garantir a sociedade dos riscos de uma crise de productos silvicolas.

Esta ultima fórma, que se adopta é a mais conforme com as doutrinas da escola liberal. Estabelecido o principio da interferencia governativa, pela fórma que fica expressa, resta ainda ampla margem para discutir os termos da sua applicação.

Em que regiões do paiz, em que terrenos, com que extensão se deve constituir o dominio florestal do estado?

O intuito do governo é que este dominio se constitua só e unicamente em toda a nossa costa maritima, desde a foz do Guadiana até á do Minho.

Eis-aqui resumidamente as rasões em que se apoia esta disposição.

É sem duvida nas regiões do litoral que a agricultura silvícola traz mais vantagens. Obsta á invasão das areias nos terrenos da zona maritima; abriga os terrenos contíguos das asperezas dos ventos que reinam do mar; serve de regulamento aos extremos dos phenomenos meteorologicos adoçando o clima em toda a linha do litoral; proporciona a facilidade do movimento dos productos florestaes, ou para se exportarem para paizes estrangeiros, ou para sé navegarem por toda a costa e se introduzirem pelas barras dos nossos rios; torna productivos muitos terrenos improprios para outros aproveitamentos agricolas; concentra emfim, sobre pontos restrictos, a actividade da administração florestal, diminuindo consideravelmente as suas despezas.

O dominio florestal do estado estende se ainda pelas margens dos rios navegaveis, sobre os terrenos desaproveitados e indispensaveis para as obras, de que possa depender o governo das aguas.

Dados estes limites ao dominio florestal do estado, parece que se põe de lado a idéa da arborisação das montanhas, tão preconisada em alguns paizes da Europa.

Mas não se põe inteiramente de lado a idéa, o que se quer fazer é declinar da administração central esse encargo muito superior aos recursos do nosso pobre thesouro publico.

Segundo os calculos de maior probabilidade, dois terços da superficie do continente do reino é composta de terrenos desarborisados, montanhosos na sua maior parte, despovoados, muito distantes dos centros de consumo e intransitaveis na sua maior extensão.

Suppondo comtudo que a arborisação das montanhas não era contrariada por nenhuma daquellas circumstancias, e que d'ella adviriam muitas vantagens para a economia nacional, ainda assim a operação das sementeiras e os consequentes actos administrativos imporiam ao estado encargos, que de nenhum modo se chegariam a compensar.

Eis aqui uma breve e clara demonstração.

Havendo no paiz 6.000:000 de hectares arborisaveis, ninguem poderia reputar arborisadas as nossas montanhas, reduzindo-se a cultura florestal por conta do estado a um sexto d'aquella extensão.

Mas partindo da hypothese, que se arborisaria 1.000:000 de hectares, simulemos a seguinte conta de despeza:

Sementeira de 1.000:000 de hectares a réis

10$000 por hectare................ 10.000:000$000

Administração: um guarda por 100 hectares, a 300 réis diarios; ou 10:000 guardas por anno...................... 1.095:000$000

11.095:000$000

Estes numeros, qualquer que seja a reducção que se faça, ou na superficie arborisada ou nas despezas da sementeira e administração, patenteiam a impossibilidade de intentar a arborisação das nossas montanhas; porquanto, se limitarmos a sementeira a uma pequena area, as montanhas ficarão despidas do arvoredo como estão hoje; se dermos grandes dimensões ás sementeiras, iremos acrescentar os encargos da divida publica, tomando capitaes por juro tão elevado, que nunca se poderão elles reproduzir nem amortisar, á custa do producto das matas que se crearem.

A doutrina exposta apparenta contradicção com as disposições do artigo 3.° da proposta de lei a que já alludi. Sem duvida a contradicção não e real, porque excluindo-se do dominio florestal do estado varias propriedades florestaes que actualmente estão encorporadas na administração das matas do reino, não se segue que os respectivos terrenos venham a desarborisar-se.

Na relação junta incluem-se as matas que, pela sua pequenez, ou distante situação, complicam, difficultam e encarecem as funcções administrativas do dominio florestal do estado; todavia acautela-se a sua devastação, impondo-se aos novos possuidores a obrigação de as conservarem.

Contradicção haveria com a maxima fundamental da proposta de lei se, tratando-se de conservar a riqueza florestal que temos e crear de novo a que nos falta, fossemos entregar ao dominio particular matas já creadas, sem restricção alguma, no direito que se lhe conferia, de conservar ou destruir o arvoredo que ellas contivessem.

Vê-se pois que nas disposições do artigo 3.° não ha outra idéa que não seja a da simplificação do serviço administrativo do dominio florestal do estado, que mal reconstruído ficaria sem essa simplificação, como a experiencia de longos annos tem demonstrado. Para a demonstrar basta referir que uma visita de inspecção ás matas dispersas a grandes distancias, traz uma verba de despezas superior algumas vezes ao rendimento liquido das mesmas matas.

As subsequentes disposições da proposta de lei, removem toda a duvida, ácerca do intuito fundamental d'ella, que consiste em promover, e não embargar o progresso florestal do paiz.

E com esse intuito que se prescreve a obrigação, que se impõe ás camaras, para que possua cada uma dellas a sua mata.

Todas as rasões, que militam para se constituir o dominio florestal do estado, argumentam com igual força, para que haja, em cada municipio, um dominio florestal.

Esta providencia principia por significar a descentralisação administrativa, no ramo de que se trata; leva depois o progresso da silvicultura ás localidades, em que os seus productos se tornam mais necessarios, e accessiveis ao consumo; diffunde por toda a parte a benefica influencia dos arvoredos; e liberta finalmente o thesouro de enormes encargos, se o estado tomasse sobre si a iniciativa da arborisação geral do paiz.

Pouca reflexão basta para se reconhecer, que são applicaveis á parochia e a qualquer povoação os principios estabelecidos, com relação ás camaras municipaes.

Duas objecções se podem offerecer contra o que fica relatado. Uma fundada sobre os inconvenientes da amortisação de bens immoveis, na máo das corporações da administração municipal e parochial, e outra sobre o facto das irregularidades d'essa administração.

Nenhuma das objecções é concludente. A creação de matas municipaes é uma excepção que não abala a solidez dos principios que aconselham a desamortisação dos bens municipaes, porque a riqueza florestal é tambem uma excepção, comparada com a riqueza creada pela actividade industrial, applicada a outros fins.

São precisas muitas gerações para crear a riqueza florestal, e só as corporações, que não morrem, como os individuos, é que podem prover á sua conservação por uma longa serie de annos.

A objecção derivada do facto das irregularidades administrativas, attribuidas á gerencia municipal, não tem força, porque o facto não é geral. Camaras ha que administram convenientemente os negocios municipaes, e algumas, na materia de que se trata, estão dando provas seguras da sua competencia.

As camaras municipaes de Penamacor, de Peniche e das Caldas da Rainha e outras, testemunham praticamente o que todas podem conseguir de tão concludente exemplo.

Completa-se o systema de arborisação com duas providencias, das quaes podem, com o andar dos tempos, derivar-se incalculaveis resultados.

Uma d'essas providencias é o coutamento dos terrenos publicos, em que a vegetação das especies florestaes se manifesta espontaneamente.

As condições orographicas do paiz favorecem o desenvolvimento espontaneo da vegetação florestal; porque, tendo as montanhas diversas exposições e altitudes, aqui ou ali, sempre as differentes plantas, de que se compõe a nossa flora silvícola, encontram situações favoraveis.

Os gados, os incendios e a obnoxia fruição commum são inimigos crueis da vegetação florestal nos terrenos publicos.

O coutamento convenientemente regulado é o unico meio de neutralisar os deploraveis effeitos da triplicada acção daquelles agentes destruidores, das plantas nascentes.

O coutamento foi por largos annos uma funcção da administração central e local. Caíu em desuso como muito» outros preceitos sanccionados pelas leis antigas e convertidos em costumes dos povos.

O coutamento pois perseverantemente seguido produzirá sem encargos para o thesouro, os resultados da arborisação dos terrenos montanhosos, ou planos onde a vegetação florestal é uma funcção espontanea da natureza.

A outra providencia alludida comprehende alguns rasoaveis incitamentos, estabelecendo recompensas para os silvicultores, que mais se distinguirem. Este methodo de promover os melhoramentos de qualquer industria esta geralmente adoptado, e aos seus effeitos se attribue o progresso de muitos d'elles. Tem ainda a vantagem de assentar sobre factos consumados, porque as recompensas não se adjudicam senão aos que satisfizerem, com maior distincção, ás condições do programma.

Cumpre ainda observar, que não traz augmento de despeza a adjudicação dos premios, porque a sua importancia será deduzida da verba já votada para applicações de igual natureza.

Exporei agora os fundamentos, em que assentam as disposições da proposta de lei, relativas á administração do dominio florestal do estado.

De tres elementos se compoz essa administração, entrando n'ella a parte technica, a administrativa propriamente dita e a economica. Dividiu-se o pessoal em tres secções, correspondentes a cada uma daquellas tres partes.

O pessoal technico, composto de engenheiros florestaes, entenderá em todos os actos de administração, que dependam de conhecimentos especiaes da sciencia florestal. O pessoal administrativo convenientemente localisado, não só executará as deliberações superiores; mas alem d'isto, despachará todos os negocios de ordinario andamento que reclamam prompta expedição.

O pessoal economico fica incumbido do movimento da receita e despeza do dominio florestal do estado; bem como da arrecadação dos respectivos fundos.

As tres ordens de funcções technicas, administrativas e economicas, ficam ligadas e subordinadas á superintendencia de uma repartição central esclarecida pelas luzes de um conselho, composto dos indispensaveis elementos para deliberar com acerto ácerca de tudo quanto for concernente aos melhoramentos florestaes do paiz, na conformidade das leis e regulamentos que estiverem em vigor.

Ao pessoal technico e administrativo exigem-se as habilitações necessarias para desempenharem, como cumpre a este importante ramo da administração especial as funcções dos respectivos cargos.

Ao chefe da administração economica poder-se-ha tornar effectiva, mediante a competente fiança, a sua responsabilidade e a dos seus subordinados, por; quem é obrigado a responder.

Não falta portanto, na reorganisação dos serviços da administração silvicola do estado, nenhuma das condições de que possa depender a conservação da riqueza florestal, que já existe, e o progressivo desenvolvimento do que é necessario crear.

Ha ainda um ponto que merece a vossa attenção. Refiro-me ás vantagens que devem resultar do estabelecimento da escola elementar de silvicultura, creada pelo decreto, com força de lei, do 29 de dezembro de 1864.

O fim d'esta escola é habilitar silvicultores praticos.

O dominio florestal do estado occupa na roda do anno muitos centenares de individuos inscientes dos processos racionaes da cultura das plantas silvicolas; e como ninguem ignora que progressos de qualquer industria dependem essencialmente do aperfeiçoamento dos instrumentos de trabalho que n'ella se empregam, é facil de ajuizar ácerca da benefica influencia do ensino elementar de silvicultura, nos destinos do dominio florestal do estado.

Tanto se despende com os trabalhos dirigidos e executados, segundo os processos rotineiros ou segundo os processos racionaes. Mas nos resultados ha grandissima differença, que é serem aquelles trabalhos incomparavelmente mais productivos, quando os que os dirigem e executam reunem á aptidão pratica os sufficientes conhecimentos theorico s.

Vê-se pois que a despeza, aliás insignificante, feita com a escola elementar, representa um elemento de productividade, no aperfeiçoamento dos trabalhos silvicolas.

E insignificante a despeza, porque não excede a quantia de 2:000;>000 réis, sendo a maior parte d'ella empregada no subsidio de alumnos pobres. No ensino haverá sómente remunerado o professor de instrucção primaria, porque os outros logares do professorado podem ser exercidos pelos empregados da administração.

Uma das ultimas disposições da proposta de lei comprehende a auctorisação que o governo solicita para codificar e harmonisar as differentes providencias concernentes ao direito e policia florestal, que se acham dispersas no corpo da nossa legislação.

Concluido aquelle trabalho por uma commissão composta de pessoas competentes, a propriedade florestal, publica e particular, ficará ao abrigo dos attentados que contra ella se estão commettendo impunemente, por falta de regulamentos especiaes que ordenem e simplifiquem o processo da repressão dos abusos e delictos florestaes.

Resta-me fazer algumas observações ácerca da parte financeira da proposta de lei.

Ha mais de dez annos que as matas do reino produzem

O rendimento necessario para todas as suas despezas e para todos os melhoramentos que n'ellas se têem feito, tanto em sementeiras como em construcções de officinas industriaes e obras de diversas naturezas.

Do que se segue que o thesouro cessou de concorrer para uma despeza que a seu cargo andou por largos annos.

A reforma proposta não altera os resultados financeiros do ultimo decennio, porque o dominio florestal do estado continuará a fornecer os meios necessarios para a sua conservação e progressivo melhoramento sem dependencia do thesouro.

Com estes fundamentos tenho a honra de submetter ao vosso esclarecido exame a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a providenciar ácerca das matas do estado e da arborisação geral do paiz, na conformidade das bases juntas a esta lei, e que d'ella fazem parte.

Art. 2.° A despeza com o pessoal da administração das matas do estado, será regulada pela tabella que tambem faz parte d'esta lei.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 17 de junho de 1868. = Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas. _

Tabella a que se refere o artigo 2.° d'esta lei

[Ver Diario Original]

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, 17 de junho de 1868. = Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas.

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Bases para a reorganisação das matas do estado e da arborisação geral do paiz

CAPITULO I Matas do estado

Artigo 1.° Todos os terrenos situados na zona do litoral desde a foz do rio Minho até á do Guadiana, sobre 6 kilometros de largura constituirão o dominio florestal do estado.

§ 1.° São exceptuados os terrenos de qualquer modo aproveitados, pertencentes a particulares, bem como os que servirem de logradouro publico ás povoações, comprehendidos na zona do litoral a que se refere este artigo.

§ 2.° Os terrenos incultos situados na referida zona pertencentes aos municipios, ás parochias e aos particulares que de qualquer modo não forem aproveitados durante cinco annos, a contar da publicação d'esta lei, serão encorporados no dominio florestal do estado, precedendo indemnisação.

§ 3.° Farão tambem parte do dominio florestal do estado os terrenos situados nas margens e valles dos rios navegaveis, quando não pertençam ao dominio particular, municipal ou parochial, e no caso de pertencerem ser-lhes hão applicaveis as disposições do § 2.º se a utilidade publica o exigir.

Art. 2.° Todas as propriedades florestaes que actualmente estão encorporadas na administração das matas do reino e que não ficarem pertencendo, em vista das disposições do artigo antecedente e seus §§, ao dominio florestal do estado, serão alienadas pela fórma que o governo julgar mais convenientes.

§ 1.° Exceptua-se d'esta disposição a mata do Bussaco, para ser conservada e administrada pelo governo.

Se a alienação se verificar por aforamento serão preferi das as camaras municipaes e as juntas de parochia, e n'este supposto o governo prescindirá da hasta publica, convencionando com aquellas corporações uma rasoavel taxa de fôro.

§ 3.° Na carta de emprazamento impor-se-ha aos foreiros a obrigação de seguirem, na exploração das matas aforadas, as regras de silvicultura, indispensaveis para a sua conservação o melhoramento.

§ 4.° Se ao foreiro convier a substituição da cultura florestal, por outra qualquer cultura, sómente poderá effectuar a dita substituição com previa auctorisação do governo.

CAPITULO II

Matas municipaes, parochiaes e vicinaes

Art. 3.° São as camaras municipaes obrigadas a crear matas nos terrenos arborisaveis e improprios para outras culturas pertencentes aos municipios, incluindo para esse fim, nos respectivos orçamentos annuaes, uma verba não inferior a 100$000 réis.

§ unico. Não será approvado pelo conselho de districto o orçamento da despeza obrigativa de qualquer camara municipal, em que não vá incluida aquella verba, uma vez que nos bens pertencentes ao municipio existam terrenos arborisaveis.

Art. 4.° A situação das matas municipaes, as especies florestaes, de que ellas devem ser creadas, o processo das sementeiras, ou plantações, os methodos de cultura e exploração, ficam dependentes da approvação dos inspectores florestaes, que forem encarregados pelo governo d'este serviço.

Art. 5.° O producto das matas, creadas pelas camaras, será considerado como rendimento das mesmas camaras, entrando para esse effeito no orçamento da receita municipal.

Art. 6.° O governo auxiliará as camaras com sementes ou plantas para a creação das matas municipaes.

Art. 7.° São applicaveis ás juntas de parochia as disposições d'esta lei, que ficam prescriptas para as camaras municipaes, menos no que respeita á verba que deve ser incluida no orçamento, a qual não será menor de 10$000 réis, com relação ás referidas juntas.

Art. 8.° Poderão tambem os vizinhos de quaesquer povoações crear, em proveito commum, matas vicinaes, requerendo terrenos incultos e arborisaveis ás camaras ou juntas de parochia.

Art. 9.° A faculdade do artigo antecedente é extensiva aos particulares, mas, n'este caso, os terrenos municipaes ou parochiaes serão aforados para aquelle effeito em hasta publica.

Art. 10.° São as camaras municipaes obrigadas, sob indicação dos agentes florestaes do governo, a fazer coutamentos nos terrenos publicos dos respectivos concelhos em que se manifestar espontaneamente a vegetação florestal.

§ unico. As matas creadas nos terrenos coutados e vedados á fruição publica, serão administradas e exploradas pelas camaras municipaes, pertencendo sómente ás mesmas camaras o producto das madeiras, ficando para os povos circumvizinhos o aproveitamento das lenhas, estrumes e mais productos florestaes.

Art. 11.0 São applicaveis ás matas parochiaes e vicinaes as disposições do artigo 7.°

CAPITULO III.

Administração

Art. 12.° O governo publicará um regulamento especial, na conformidade das seguintes bases, para a organisação do serviço technico, administrativo e economico do dominio florestal do estado.

Art. 13.° A administração superior do dominio florestal do estado e da propriedade florestal, sujeita á superintendencia do governo, fica centralisada na repartição de agricultura da direcção geral do commercio e industria.

§ 1.° Para os fins indicados n'este artigo serão os inspectores florestaes addidos mencionada repartição, occupando um d'elles o logar de chefe de secção das matas, sem prejuizo de outros serviços externos, de que deva ser! encarregado.

§ 2.° Todos os negocios da administração florestal, que dependam de conhecimentos technicos serão resolvidos em conselho, de que farão parte o director geral do commercio e industria, os tres inspectores florestaes, e o chefe da repartição de agricultura, sendo presidente o primeiro e secretario o ultimo dos mencionados.

Art. 14.° Os inspectores e conductores florestaes constituem o pessoal technico. Os administradores, os mestres de pinhaes e guardas, o pessoal administrativo, o thesoureiro e os fieis, e o pessoal economico.

Art. 15.° Os inspectores florestaes sómente poderão ser nomeados d'entre os engenheiros civis, comprehendidos na secção das aguas e florestas, ou d'entre os individuos habilitados com o curso de engenheria agricola, ou com o curso completo das escolas florestaes estrangeiras mais acreditadas.

§ unico. Verificando-se as duas ultimas hypotheses, o vencimento dos inspectores não excederá a quantia de réis 800$000.

Art. 16.° Os logares de administradores, mestres e conductores florestaes sómente poderão ser providos nos que tiverem carta de qualquer curso superior de sciencias historico-naturaes, ou de silvicultura e agronomia pelo instituto geral de agricultura.

Art. 17.° Os logares de amanuenses, de guardas e cabos de guardas, serão exclusivamente providos nos que se mostrarem habilitados com qualquer curso profissional elementar, ou que houverem servido no exercito e apresentarem baixa de serviço, sem nota, sabendo ler e escrever, e não tendo mais de trinta annos de idade.

§ unico. Estes logares e os de que tratam os dois artigos antecedentes serão sempre providos por meio de concurso documental.

Art. 18.° O logar de thesoureiro será provido em pessoa idonea e devidamente afiançada. Compete-lhe a proposta dos fieis e amanuenses da thesouraria, pelos quaes ficará responsavel.

Art. 19.° Os actuaes empregados das matas do reino entrarão no quadro do pessoal do dominio florestal do estado, ou a elle ficarão addidos, conforme as suas habilitações, aptidão e serviços.

CAPITULO IV

Disposições geraes

Art. 20.° O governo nomeará uma commissão de pessoas competentes para codificar todas as disposições da nossa legislação florestal e da estrangeira, que tiver applicação ao nosso paiz, concernentes á protecção dos arvoredos e á repressão dos abusos contra a sua conservação, ficando auctorisado para decretar as providencias que, em vista dos trabalhos da dita commissão, julgar conveniente.

Art. 21.° Parte da verba de 4:000$000 réis, consignada no decreto com força de lei de 29 de dezembro de 1864, para concursos agricolas e pecuários, será applicada a incitamentos da cultura florestal pelos particulares.

Art. 22.° Continuará a ter vigor o disposto no artigo 6.° e seu § unico do decreto com força de lei de 29 de dezembro de 1864, para o estabelecimento de uma escola elementar de silvicultura, com a qual não poderá o governo despender annualmente mais do que a quantia de 2:000$000 réis, que será deduzida dos rendimentos das matas do estado.

Art. 23.° O governo incluirá annualmente no orçamento do ministerio das obras publicas, commercio e industria, a verba que julgar necessaria para as despezas com os diversos serviços da administração e exploração do dominio florestal do estado, e dos estabelecimentos annexos, não podendo essa verba, em caso algum, exceder o rendimento annual do mesmo dominio, e dos estabelecimentos annexos, do qual rendimento serão tambem deduzidos os ordenados e mais despezas incluídas na tabella a que se refere o artigo 2.° da proposta de lei d'esta data.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, 17 de junho de 1868. = Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas.

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