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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso que devia ser transcripto a pag. 918, col. 1.ª, lin. 49.ª do Diario de Lisboa, na sessão de 28 de março

O sr. Fontes Pereira de Mello: — Depois do largo intervallo que decorreu posteriormente ao discurso que tive a honra de proferir n'esta casa, difficilmente poderei hoje ligar as minhas idéas e encaminhar os meus raciocinios, de maneira que possa apresentar á assembléa, tão claramente como desejo, as conclusões que pretendo tirar. Pôde acreditar a camara, que se não fosse o imperioso dever que me obriga a continuar este debate, julgaria sufficiente o que já tive a honra de expor á assembléa, e não occuparia uma parte da sessão de hoje para continuar a minha tarefa.

Estou convencido porém que o projecto que nos occupa é altamente prejudicial aos interesses publicos, diminue consideravelmente a renda do thesouro, affecta os consumidores, e serve unicamente para acrescentar algumas fortunas particulares.

N'estes termos, sr. presidente, entendi eu que faltaria ao meu mais sagrado dever, se não levantasse a minha voz nesta casa, e não continuasse a apresentar á camara os fundamentos valiosos que me levam a rejeitar a proposta do governo.

Talvez a camara tenha notado que tanto da minha parte, como da dos illustres oradores que me precederem n'este debate, se tem mostrado empenho de evitar por todos os modos que se converta em questão politica o negocio de que tratámos.

V. ex.ª é testemunha e a camara igualmente o é, do que os oradores da opposição se têem limitado a apresentar raciocinios e argumentos que demonstram aos nossos olhos os inconvenientes administrativos e financeiros que devem resultar da approvação do projecto, sem termos adduzido uma só consideração politica em abono d'estas conclusões. E comtudo V. ex.ª observaria que dos bancos do ministerio o illustre secretario da fazenda, quando tomou parte n'este debate, seguindo caminho opposto, procurou dar á questão o caracter politico mais significativo, que é possivel, declarando-a tão abertamente ministerial, que a ella se acha vinculada a existencia do gabinete.

Se este auxilio da politica é necessario para fazer triumphar o projecto, comprehende-se bem o empenho com que o nobre ministro da fazenda lhe quiz dar este caracter. Se as rasões administrativas, economicas e fiscaes não são porém sufficientes para levar o convencimento ao seio da camara, não abona isso muito o merecimento intrinseco do projecto que discutimos; e permitta-me a maioria d'esta assembléa que tantas vezes tem censurado a opposição pelas rasões politica que faz valer, quando são inseparaveis da natureza do assumpto, que eu ponha em relevo esta declaração do governo, e responda com ella a tantas accusações injustas que por motivo similhante nos têem sido feitas.

Sr. presidente, eu não censuro o governo por dar a este importante negocio o caracter politico e ministerial que lhe foi attribuido. Está no seu direito, e já por vezes se tem feito o mesmo em casos analogos e em objectos talvez de menor importancia. Porém quando eu vejo que em assumpto tão grave, como era a reforma do exercito, que fez saír um ministro dos bancos do gabinete, e que tinha sido mencionado no discurso da corôa, não teve as honras de questão ministerial; quando vejo que na camara dos pares se acha empenhada uma questão gravissima, a respeito da qual todavia o sr. ministro da justiça declarou que a responsabilidade era exclusivamente sua; quando vejo que as suspeições politicas foram votadas n'esta casa, declarando se na outra o sr. presidente do conselho em manifesta contradicção com os seus collegas; quando vejo tudo isto, repito, não posso deixar de reconhecer que o nobre ministro da fazenda foi aconselhado pela experiencia a declarar peremptoriamente o gabinete compromettido todo n'este projecto, para escapar á sorte que teve o sr. visconde de Sã, e á que parece aguardar resignado o seu collega da justiça (apoiados).

Ainda bem, sr. presidente, que o negocio importante de que se trata, foi resolvido em conselho de ministros; porque assim a entidade governo, que até agora tem fugido constantemente ás questões, deixando-as á responsabilidade individual de cada um dos seus membros, vem apresentar-se constitucionalmente diante das casas do parlamento, tomando a responsabilidade dos seus actos e das suas propostas.

Entretanto se o nobre ministro teve em vista estreitar mais os laços que o ligaram á maioria que o apoia, annunciando-lhe que a este projecto está vinculada a existencia do gabinete, não creio que tenha conseguido muito, porque se eu tivesse a honra de ser membro da maioria, não me faria grande peso a declaração de s. ex.ª (Uma voz: — Apoiado.)

Eu digo a rasão d'isto ao nobre deputado, e talvez que depois me não apoie.

É porque este gabinete não obedece aos preceitos constitucionaes, é insensivel ás demonstrações parlamentares, e recebe com a maior indifferença do mundo a censura ou reprovação dos seus actos (muitos apoiados).

Pois que? Não vimos nós ainda na sessão passada o sr. presidente do conselho, que symbolisa o ministerio, e que tambem era ministro das obras publicas, perder na camara dos dignos pares a questão mais ministerial que é possivel apresentar se ao parlamento, a questão de um contrato feito por elle? (Apoiados.) E que aconteceu? Aconteceu que o governo continuou a permanecer á frente dos negocios, não obstante o contrato por elle feito e apresentado ao parlamento ficar reduzido a zero (apoiados). A responsabilidade ministerial desappareceu diante do pensamento unico, inalteravel, que tem manifestado este gabinete, de se sustentar a despeito de todas as considerações e de permanecer firme no seu posto, ainda que para isso seja preciso calcar aos pés os principios constitucionaes (apoiados). Esta é a resposta que eu dou aos apoiados do nobre deputado.

Quando isto se observa, quando isto se vê, quando isto se praticou ainda hontem, pôde a maioria estar socegada, porque, se o ministerio faz a fortuna d'este paiz, continuará do mesmo modo a sua gloriosa tarefa, ainda que o projecto seja rejeitado.

Mas deixando estas questões que são incidentes no assumpto de que se trata, e que não formam a essencia e natureza d'elle, permitta-me v. ex.ª eu passe agora a occupar-me especialmente de demonstrar á camara, quanto couber nas minhas forças, como são inexactos os calculos apresentados pelo governo ácerca do rendimento que o thesouro publico ha de auferir por este projecto, ácerca dos preços por que hão de ficar os generos, e das consequencias financeiras, economicas e administrativas que se hão de seguir para o paiz, se acaso o mesmo projecto for transformado em lei do estado.

Em primeiro logar, sr. presidente, occupar-me-hei de provar á camara qual é o desfalque que, na minha opinião, ha de resultar da approvação d'este projecto. E n'esta parte sigo não só o caminho encetado pelos meus illustres antecessores na tribuna, porém aquelle mesmo que deixou trilhado o nobre ministro da fazenda.

E permitta-me a camara que de passagem diga, que não respondo de modo algum pelos algarismos que servem de base aos argumentos que vou apresentar á assembléa. Não se surprehenda a camara com esta minha declaração.

Não respondo de modo algum pela exactidão dos algarismos, porque não são o resultado de esclarecimentos colhidos por mim em qualquer parte, que não fosse um documento official, que todos temos diante dos olhos. Querendo eu, sobretudo, mostrar á camara que eram inexactos os argumentos e as conclusões tiradas pelo nobre ministro da fazenda no seu relatorio, eu não podia fazer melhor do que adoptar todos os elementos sobre os quaes elle fundou os seus calculos, e mostrar com esses mesmos elementos, que as legitimas conclusões são inteiramente diversas. Se os dados são exactos ou não, responderá a isso o nobre ministro. Eu que não tenho meios particulares de informação, que não posso ir buscar a outra parte os fundamentos para os meus calculos, não tenho remedio senão aceitar aquelles, e parto do principio de que são exactos e averiguados, como devem ser os elementos que se apresentam em um documento official d'esta ordem.

Já na sessão passada eu tinha procurado mostrar á camara quaes eram os factos capitães em que differiam profundamente as apreciações do governo e as da opposição, porque á primeira vista não ha duvida que surprehende a todos, ver que em objecto tão simples e de tão pouca difficuldade, os calculos differem tão completamente, que emquanto o governo julga que ha de auferir uma somma de duzentos e mais contos, alem d'aquella que recebe na actualidade, a opposição tem procurado mostrar á camara que longe do projecto ser vantajoso ao estado, longe de produzir um augmento de receita, dará em resultado um deficit consideravel.

Procede isto, sr. presidente, de tres pontos capitaes. O primeiro é a exageração da importação dos tabacos adoptada como base pelo sr. ministro da fazenda. O segundo é a falta que o nobre ministro commetteu, quando tratou de examinar o preço por que ficavam os generos depois de ser convertido em lei o projecto que discutimos, não attendendo ás quebras, que o illustre ministro, mesmo no seu relatorio, declara que têem os tabacos em virtude da manipulação. Consiste finalmente o terceiro, em que o sr. ministro calculou empyricamente a importação de tabacos fabricados na importancia de 100:000 kilogrammas de charutos, e 48:000 kilogrammas de tabaco de cheiro, e outras especies, emquanto que a opposição reduz aos seus justos limites esta exagerada somma: procedendo assim se encontra de accordo com a verdade dos factos, e apoiando-se nos elementos fornecidos pelo proprio governo.

Já na sessão passada eu perguntei qual era o fundamento que tinha o sr. ministro da fazenda para dizer que a importação dos tabacos ha de ser de 1.468:800 kilogrammas. Porventura esta somma encontra-se na importação de algum dos annos que precedem o actual? Será ella o resultado de algum termo medio da importação nos anãos anteriores? Não, e se v. ex.ª e a camara consultarem o relatorio apresentado n'esta casa em 1857 e habilmente feito pelo sr. conde d'Avila, onde se descrevem as importações de muitos annos, e se depois d'isso as confrontarmos com as que se têem realisado desde então até hoje, terão de reconhecer que em nenhum d'elles chegou a importação a 100:000 arrobas de tabaco, ou 1.468:800 kilogrammas. Em que se funda pois esta hypothese de que a importação dos tabacos ha de ser de 1.468:800 kilogrammas? Funda-se apenas na vontade do sr. ministro, é um producto da sua imaginação, é empyrica, é arbitraria, é fallivel, e por con-

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sequencia falliveis são e arbitrarios todos os calculos que partirem d'esta base.

Se examinarmos o mappa, a que acabo de me referir, e que faz parte do relatorio de 1857, veremos que desde 32:178 arrobas em 1838, e 34:339 arrobas em 1845, até 87:855 arrobas em 1843, que é a maxima importação de tabaco que se encontra no periodo de dezenove annos de que ali se dá conta, ha grandes alternativas e variantes, todas para menos comtudo, não attingindo portanto nunca a importação n'esses annos, nem de longe, a de 100:000 arrobas, que o sr. ministro da fazenda adopta para ponto de partida nos seus calculos.

Permitta-me agora a camara que eu lhe diga qual tem sido a importação do tabaco pela alfandega desde então até hoje.

Peso em kilogrammas Direitos

Em 1857-1858

1858- 1859........1.176:579........169:964$680

1859- 1860........1.197:304........182:296$466

1860- 1861........1.187:575........221:810$194

1861- 1862........1.329:070........247:201$168

1862- 1863........1.282:714........227:147$466

D'onde resulta, termo medio, em peso nos ultimos cinco 1.234:648 kilogrammas, e em direitos 209:6830995 réis.

Já se vê que da importação do tabaco n'estes ultimos annos até á de 1.468:800 kilogrammas, que o governo calcula que ha de ser a normal do paiz, ha uma differença, termo medio, de mais de 234:000 kilogrammas; differença importante, e que altera profundamente os calculos do governo em relação á verdade dos factos em cerca de réis 300:000$000 para menos do que suppõe o sr. ministro da fazenda.

Mas admittamos, por hypothese, que seja 1.468:800 kilogrammas a importação legal. Embora seja assim, eu pretendo mostrar á camara que, mesmo n'esse caso, adoptando os elementos que serviram aos calculos do governo, as consequencias são inteiramente differentes, e note-se que eu supponho que esses elementos são exactos; supponho que o consumo se eleva ás ordens do governo de uma maneira tão prodigiosa em tão pouco tempo; supponho, em uma palavra, que os consumidores obedecem á vontade do sr. ministro da fazenda, fazendo com que entre para consumo 1.468:800 kilogrammas de tabacos, embora até hoje para o consumo de todos os annos, sem excepção, nunca tenha sido possivel introduzir no paiz tal quantidade; supponho todos os dados do governo auctorisados e verdadeiros, e vou tirar as consequencias; vou tirar consequencias differentes das que o governo tirou, de accordo com as indicações e as bases do seu relatorio.

Supponho portanto a importação de 1:468:800 kilogrammas de tabacos. Mas d'esta somma tenho a deduzir, para applicar ao resto o direito de 1$200 réis por kilogramma, o tabaco de rolo para cigarros e o tabaco em charutos; porque a camara sabe que, tanto uma como outra d'estas especies de tabaco, têem um direito diverso de 1$200 réis estabelecido no projecto. O governo tinha proposto o mesmo direito para todos os tabacos em bruto, isto é, o direito de 1$200 réis; porém a illustre commissão de fazenda, e n'esta parte lhe dou os meus emboras, entendeu, no interesse dos consumidores, que era conveniente reduzir a 1$000 réis o direito sobre o tabaco de rolo. E em consequencia necessario, para poder fazer o calculo, deduzir a parte do tabaco que corresponde aos charutos, a fim de applicar o direito de 1$200 réis sómente á differença. Fazendo isto sobre os algarismos do relatorio do governo, temos o seguinte:

Importação de todas as especies de tabaco,

[Ver diário original]

Temos por conseguinte uma receita de 1.589:000$000 réis, que comparada com a de 1.748:000$000 réis, que o governo diz ser a receita que actualmente o thesouro aufere do tabaco, apresenta um deficit de 159:000$000 réis proximamente, na hypothese que figurei.

V. ex.ª reconhecerá que não é facil, ao correr de uma discussão, apresentar estes resultados, de modo que se possa comprehender á primeira vista se não ha um ou outro erro de calculo, ou um erro de apreciação nos elementos que servem para elle. Mas eu terei a honra de mandar para a mesa estas notas, que farão tambem parte do meu discurso, e a camara e os homens que se quizerem dar ao estudo d'este negocio, examinarão se ha rasão da minha parte em diminuir, ou se ha rasão da parte do nobre ministro da fazenda, e dos defensores do projecto, em exagerar.

Porém eu não posso aceitar estes resultados. A camara vê bem que para chegar a elles eu adoptei todos os algarismos e todos os elementos fornecidos pelo relatorio do governo, e eu estou muito longe de acreditar na exactidão d'elles; e duvido essencialmente em tres pontos.

Um dos pontos em que eu estou completamente em divergencia com o modo por que o nobre ministro no seu relatorio aprecia o rendimento do tabaco, é, como disse ha pouco, a receita proveniente do imposto de importação da fazenda. O meu nobre amigo o sr. Casal Ribeiro, nos calculos que apresentou á camara, partiu de uma base que está muito mais proxima da verdade; mas quanto a mim, apesar d'isso, ainda pecca um pouco por exagerada para sobre ella se calcular esta receita. O meu nobre amigo, levado do desejo de mostrar o erro em que estava o sr. ministro da fazenda, auctorisou se com as regras por s. ex.ª consignadas no regulamento geral de contabilidade, foi buscar a importação do ultimo anno, viu qual era o rendimento correspondente, e construiu sobre esta base todo o seu calculo. É inquestionavel que este modo de raciocionar é muito mais exacto do que aquelle que seguiu o sr. ministro, porque se refere a um certo anno que teve uma conhecida e determinada receita. Porém eu entendi que, seguindo o exemplo do que se tem feito constantemente entre nós para avaliar receitas eventuaes, como é aquella de que se trata, e em geral são todas as receitas indirectas que se cobram nas alfandegas, procedia de um modo mais exacto, e conseguiria chegar mais proximo da verdade indo buscar o termo medio da importação e rendimento dos ultimos cinco annos, e fundando sobre esta base todos os meus calculos. E para provar á camara quanto é necessario, conveniente, rigoroso e seguro tomar este termo medio, e não adoptar hypotheses empyricas e arbitrarias, como adoptou o sr. ministro da fazenda, peço licença para pôr diante dos olhos da assembléa o já referido e interessante relatorio do sr. conde d'Avila, na parte em que apresenta a importação do tabaco nas alfandegas em diversos annos desde 1838 até 1856. Se nós observássemos n'este exame que havia em tão largo periodo uma rasão progressiva de augmento ou diminuição, seria regular e natural que adoptassemos o ultimo anno que deveria ser corrigido, para mais ou para menos, conforme as tendencias da serie, e a rasão da progressão da mesma. Mas não acontece isso, e vê-se por exemplo, que tendo sido em 1841 a importação do 65:643 arrobas, desceu no anno seguinte a 60:214 arrobas; que foi de 87:855 arrobas em 1843, e logo depois em 1844 de 58:419 arrobas; de 65:683 em 1848, e sómente de 56:867 em 1849; finalmente de 76:494 arrobas em 1852, e apenas de 51:838 arrobas em 1853. Já se vê que ha saltos tão consideraveis e tão valiosos de anno para anno que só um termo medio pôde servir de base approximada para taes calculos.

V. ex.ª terá presente, e a camara do mesmo modo, que o termo medio de importação e direitos nos ultimos cinco annos dá o seguinte resultado:

Peso em kilogrammas Direitos

Tabaco importado....... 1.234:648....... 209:683$995

Sendo de 427:300 kilogrammas o peso do tabaco em rolo, charutos de 20 réis e superiores, correspondente á importação de 100:000 arrobas ou 1.468:800 kilogrammas, segundo o calculo do governo, e suppondo que a importação das differentes especies guardará proporcionalidade, teremos, fazendo as proporções devidas:

[Ver diário original]

Eu terei occasião de provar durante o meu discurso que os charutos de 20 réis não podem com o direito estabelecido no projecto, para serem importados do estrangeiro, e por isso se attendermos á influencia que d'aqui resulta para a receita, podemos calcular sem exageração que o estado perderá 500:000$000 réis annuaes, em virtude d'este projecto, sem tomar em consideração o desfalque resultante do contrabando, adoptando para base da importação o termo medio dos annos que decorrem de 1858 a 1863, e aceitando, como certo, todos os elementos mencionados no relatorio do sr. ministro da fazenda.

Foram estes, pelo menos, os resultados que eu tirei. Mas se alguem poder surprehender se com elles, se v. ex.ª e a camara podessem imaginar por um momento que eu era capaz de torcer algarismos á minha vontade para chegar aos resultados que apresento, peço licença para notar que os calculos do sr. ministro induzem por tal fórma em erro, que alem da importação arbitraria que imaginou, absolutamente fallando, suppõe que a importação de tabaco manufacturado devia chegar até 148:000 kilogrammas; hypothese insustentavel, que tem sido sempre desmentida pelos factos, e que pôde ser negada á priori com os mais solidos fundamentos (apoiados).

Já os cavalheiros que antes de mim tomaram parte n'esta discussão, procuraram mostrar á camara, pelo exame do que acontece na Inglaterra, que era impossivel, ou pelo menos que era altamente improvável o calculo apresentado pelo governo ácerca da importação e despacho dos charutos pelas nossas alfandegas.

Vós que defendeis o parecer da commissão e proposta do governo, adoptaes o systema inglez, estabeleceis um grande imposto sobre o tabaco pago na alfandega, e o imposto de fabrico que é um verdadeiro addicional do primeiro; por consequencia não podeis estranhar que nós vamos consultar as estatisticas inglezas, e tiremos d'ellas argumento para provar que a importação entre nós não pôde ser na proporção que dizeis. O imposto sobre os charutos estrangeiros, segundo o projecto, deve montar a 280:000$000 réis, e por consequencia é uma verba importantissima, a fim de se verificar até que ponto se pôde contar com ella.

O sr. Casal Ribeiro tinha dito que a importação dos charutos em Inglaterra em 1861 correspondia a 18/10 por cento da importação do tabaco em rama. Este calculo do illustre deputado provinha de uma estatistica do distincto economista, o sr. Block, na qual se descreviam as importações do tabaco bruto nos tres annos de 1859 a 1861, e igualmente do tabaco manufacturado em charutos. O illustre deputado mostrou á camara que em Inglaterra no anno do 1861 a importação tinha sido de 1 8/10 por cento em charutos, relativamente ao tabaco em bruto. Entretanto V. ex.ª e a camara são testemunhas de que o sr. ministro da fazenda no dia immediato procurou aqui sustentar que isto não era exacto, dizendo que tratando de calcular a importação provavel dos charutos n'aquelle paiz, achara que estava para o tabaco em rama importado na proporção de 5 por cento, e não na de 1 8/10 por cento, como tinha dito o sr. Casal Ribeiro.

Ora eu tenho presente o livro que serviu tanto para os calculos apresentados pelo sr. Casal Ribeiro, como para as apreciações feitas pelo sr. ministro da fazenda, e não ha duvida que o sr. ministro da fazenda encontrou na pagina 364 as seguintes indicações:

1859 1860 1861

Tabaco em folha..... 48.606:000 48.936:000 50.754:000

» manufacturado 2.065:000 2.727:000 2.110:000

Sendo o peso a que se refere este mappa em libras inglezas de 453,593 grammas cada uma.

Peço porém licença á camara e ao sr. ministro da fazenda para lhe dizer que tenho pena, que sinto profundamente que s. ex.ª, quando apresentou estes algarismos, quando leu a pagina de que acabo de dar conta á camara, não lesse logo em seguida a outra pagina d'este mesmo livro, fronteira aquella, na qual está indicada a reexportação do tabaco em bruto e manufacturado, o que altera completamente a percentagem.

Sabe v. ex.ª o que diz Block logo na pagina seguinte aquella de que fez uso o sr. ministro da fazenda para o seu calculo? Diz que uma parte d'este tabaco, tanto em rama como manufacturado é exportado da Gran-Bretanha para abastecer as colonias e o estrangeiro.

Ora quando é evidente, quando resulta do mesmo livro citado pelo sr. ministro da fazenda, da mesma auctoridade, da mesma estatistica, a demonstração de que parte desses tabacos importados foram depois para o estrangeiro e para as colonias, e que não foram consumidos em Inglaterra, como vem o sr. ministro dizer: «Olhae que vos illudis, porque a importação dos charutos não é de 1 8/10 por cento como dizeis, mas sim de 5 por cento!» E a reexportação? Sabe v. ex.ª o que diz Block a respeito da reexportação? É o seguinte:

REEXPORTAÇÃO

[Ver diário original]

Eu supponho sempre a melhor boa fé no sr. ministro da fazenda, mas parece incrivel que s. ex.ª, tendo ido buscar este livro como base para a sua argumentação, olhasse apenas para uma pagina e não visse a outra! Foi uma fatalidade para os seus calculos.

E não vê a camara qual é a conclusão a que se chega pela comparação destes diversos algarismos? E que em Inglaterra a importação do tabaco manufacturado a respeito do tabaco em rama, foi de 1 4/10 por cento em 1859, de 3 por cento em 1860 e de 1 8/10 por cento em 1861, exactamente como tinha assegurado o meu illustre amigo o sr. Casal Ribeiro, que se referiu sómente ao anno de 1861.

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O termo medio por consequencia d'estes annos seria de 2 por cento e não de 5 por cento, como disse o sr. ministro.

Já vê portanto V. ex.ª e a camara que não é de estranhar que qualquer de nós se não preste a jurar sobre as palavras do sr. ministro da fazenda, e sobre os calculos do seu relatorio, quando em um objecto tão especial, tão determinado e positivo, em que elle tinha á vista os proprios elementos que podia confrontar, como todos nós, veiu apresentar á camara resultados inteiramente diversos d'aquelles que de taes elementos se podiam deduzir.

Mas não pense a camara que esta differença é de pouca importancia como parece á primeira vista, por ser apenas de 5 ou 2 por cento. A questão é importantissima, porque corresponde a muitas dezenas de contos de réis. O governo imagina receber direitos de 100:000 kilogrammas de charutos. Com que auctoridade se pôde apresentar ao parlamento este calculo, com que segurança nós podemos acredita-lo para votar o projecto, que tem bases tão falliveis e tão completamente destituidas de fundamento? Admittindo o termo medio de 2 por cento dos tres annos que citei em Inglaterra, teriamos em Portugal uma importação de 26:898 kilogrammas de charutos estrangeiros, em logar de 100:000 kilogrammas. Por consequencia já vê V. ex.ª que carece completamente de correcção o calculo do nobre ministro, na parte em que elle pretende que a importação dos charutos manufacturados será de 100:000 kilogrammas. Mas se estas apreciações, que faço, vão affectar o calculo feito pelo nobre ministro, tambem affectam igualmente o que apresentei ha pouco á camara, porque suppuz, tomando a base do relatorio, uma importação de 45:412 kilogrammas de charutos, emquanto na proporção da Inglaterra não se importariam mais de 26:898 kilogrammas. Quer isto dizer que eu suppuz 18:514 kilogrammas a mais, isto é, um augmento de mais de 40 por cento do que devia ser em relação ao consumo referido n'aquelle documento official.

Se v'. ex.ª quizer mais uma prova de que não se pôde acreditar n'esta importação de charutos manufacturados em consequencia do direito que se lhe impõe, basta examinar qual é esse direito é a quanto monta em relação a cada charuto, para se ver immediatamente que é impossivel que possa augmentar, pela maneira que indica o governo, essa importação.

V. ex.ª sabe, e a camara tambem, que o governo propõe 2$800 réis de imposto em cada 1 kilogramma de tabaco manufacturado, com mais 3 por cento addicionaes, vem a ser 2$884 réis. Para saber qual é a importancia, do direito que tem a pagar os charutos, seria preciso conhecer primeiro qual é o peso de cada um d'elles, ou quantos charutos contém 1 kilogramma. Não pude pesa-los, nem me occupei d'isso; pareceu-me mais simples adoptar as bases indicadas pelo sr. ministro no seu relatorio, e fazer sobre ellas as minhas reflexões. Infelizmente o relatorio do sr. ministro da fazenda em differentes partes conclue diversamente, quanto ao peso de cada um dos charutos. E lamentavel que n'um documento d'esta ordem, e sobre um ponto como este, que influe consideravelmente no resultado do calculo, se encontrem estas divergencias, que deixariam de existir se tivesse havido mais cuidado na sua redacção.

Diz o sr. ministro da fazenda que = o charuto de 10 réis tem de peso 4,80 grammas =. Diz isto a pag. 13 do relatorio, que todos têem presente, emquanto que na pagina anterior se descreve n'um mappa o consumo annual de 279:072 kilogrammas de charutos de 10 réis na importancia de 608:000$000 reis. Dividida esta somma pelo preço de cada charuto, achâmos que se consomem 60.800:000 charutos, os quaes correspondendo a 279:072 kilogrammas, como ali se diz, dão em resultado o peso de 1 kilogramma para 217 charutos. Se o peso de cada charuto fosse porém de 4,80 grammas, como adiante se indica, teria 1 kilogramma 208 charutos de 10 réis sómente. Não sei se me explico com clareza, mas a differença é sensivel. Peço aos nobres deputados que tomarem a palavra depois de mim, que tenham a bondade de justificar esta differença.

Com os charutos de 20 réis acontece exactamente o mesmo. Suppondo tambem que pesam 4,80 grammas, acho uma differença consideravel entre este peso e o que resulta do exame do mappa referido, que attribue o valor de 166:000$000 réis para 38:097 kilogrammas consumidos, ou 217,8 charutos por cada kilogramma. De tudo isto resulta, sr. presidente, que o charuto de 10 réis tem de pagar na alfandega 13,87 réis de direitos, isto é, uma quantia muito superior ao valor por que hoje se vende no mercado. E claro, portanto, e evidente a todas as luzes, que não é possivel importar charutos d'esta qualidade, porque se teria de pagar, só de direitos, muito mais do seu valor, independente do custo do genero, das despezas de commissão, de transporte e de todos os encargos que são inherentes a este genero de commercio. E para os charutos de 20 réis sabe a camara em quanto importa o direito que lhes corresponde? Importa em 14,90 réis, ou proximamente 15 réis. Segue-se d'aqui que, para que possam ser importados charutos de 20 réis é necessario que venham ao nosso mercado, pelo preço de 5 réis cada um, o que é impossivel; e portanto torna-se tambem impossivel que os despachos d'este genero se façam na alfandega na importancia e desenvolvimento que o governo inculca no seu relatorio (apoiados).

A proposito porém d'esta questão, permitta-me a camara que de passagem lhe observe que vi com sentimento, no meio das protestações que se fazem, por parte dos defensores do projecto, da observancia e rigor dos principios no sentido liberal em que é feita esta reforma; permitta-me, repito, que lhe diga que vi com sentimento e pezar que se vão impor ao tabaco manufacturado direitos ainda mais protectores do que os da ultima reforma que, sobre o mesmo objecto, teve logar em Inglaterra (apoiados). A reforma ingleza sobre o tabaco tem por fim não só diminuir o contrabando que se fazia n'este genero, mas tambem continuar no systema seguido pelos homens que pertencem á escola do Free trad, os quaes têem sustentado e defendido a reducção dos direitos protectores. Os ministros da Gran-Bretanha, seguindo o caminho já ha muito encetado n'aquelle paiz, reduziram a 5 schellings e 5 por cento addicionaes os direitos de cada libra de tabaco manufacturado, de modo que fica pagando 2$604 réis por cada kilogramma.

E sabe v. ex.ª qual é o imposto que o governo e a commissão estabeleceram no seu projecto para o tabaco manufacturado? E 2$884 réis por kilogramma, isto é, mais 280 réis que na ultima reforma ingleza (apoiados). No momento em que se falla em liberdade commercial, em que se encarecem os principios e as melhores doutrinas economicas, propõe o governo direitos mais protectores do que os estabelecidos na reforma de Gladstone, que pretendeu copiar! (Apoiados.) Os principios, segundo a escola do governo, são só para se fallar n'elles, mas não para os seguir (apoiados).

Sr. presidente, todos sabem que o nobre ministro da fazenda e os defensores do governo trataram de provar á camara que por este projecto o thesouro não sómente seria embolsado da renda que até aqui percebia, mas que ainda teria de auferir muitos maiores lucro. Pintam-n'os o reinado de Astréa. O estado, os contribuintes e os consumidores todos lucrariam nesta feliz transformação. Examinemos detidamente este negocio, e vejamos que deploravel illusão desvairou por um momento os meus illustres adversarios.

Para começar pelo genero de maior consumo eu vou mostrar á camara qual será o preço por que hão de ficar os cigarros, logo que seja convertido em lei o projecto que discutimos.

[Ver diário original]

Adoptando os elementos de calculo fornecidos pelo governo, creio que dou uma prova de lealdade, e de que não pretendo illudir ninguem. A camara pôde ver com quanta exactidão eu fui buscar ao relatorio do sr. ministro da fazenda, e só ao relatorio, os algarismos que produzem este resultado.

E antes de passar adiante eu peço á illustre commissão que quando algum de seus membros tomar a palavra, me explique categoricamente, qual é o modo por que julga que se devem contar os 3 por cento. Eu entendo que estes 3 por cento affectam todo o imposto que se cobrar na alfandega, e n'esta hypothese calculei.

Entretanto devo apresentar a duvida que se me offerece n'este ponto, comquanto para o resulta-lo final seja quasi insignificante a sua influencia.

Isto posto, eu peço a v. ex.ª e á camara que reflictam bem qual é a importancia do consumo na especie de tabaco a que me referi, e que vejam por isso qual é a gravidade do augmento do preço de um genero que se fuma em tão grande escala.

Examinando o mappa que no relatorio do sr. ministro da fazenda se encontra a pagina 9, vê-se que no consumo geral do tabaco que é de 1.344.000:000 kilogrammas, o rolo de que se fazem os cigarros figura na somma de 381:000 kilogrammas, isto é, quasi a terça parte do consumo total.

Ora, sabendo todos que o tabaco em cigarros é consumido exactamente pelas classes inferiores, pelas classes desvalidas ou menos abastadas, este projecto que tanto falla em principios de liberdade, vae exactamente sobrecarregar o genero que é consumido pelo povo; emquanto allivia o charuto fino, que é fumado em geral pelos homens da alta sociedade, pelos individuos que têem meios, que possam supportar estas despezas de puro luxo (apoiados).

Mas não é sómente o cigarro que ficará mais caro, é tambem a folha picada.

Quer a camara saber qual o preço por que fica a folha picada, segundo os dados apresentados pelo sr. ministro da fazenda; sem alterar de modo algum os elementos do relatorio? E o seguinte:

[Ver diário original]

O que quer dizer que cada kilogramma de folha picada, independentemente do lucro dos fabricantes, ha de ser vendido ao povo por mais 300 réis approximadamente, com o que me parece que não ficarão muito penhorados os consumidores d'esta especie de tabaco.

Applicando para o charuto de 10 réis o mesmo calculo e os mesmos raciocinios, resulta o seguinte:

Sendo o preço do kilogramma do tabaco em folha posto na fabrica 2$208,16 réis, como acabámos de ver, e suppondo que o charuto pésa 4,80 grammas, segundo o relatorio do sr. ministro da fazenda, ficará para os fabricantes pelo preço de 10,61 réis; isto é, por maior preço do que actualmente se vende.

Á vista d'isto é claro que o tabaco manufacturado consumido pelas classes populares, isto é, tabaco que entra por tres quartas partes no consumo total, fica mais caro do que estava até agora pelo systema do monopolio arrematado.

Mas se for preciso uma prova de que o tabaco em geral ficará mais caro, não tratando de um ou outro genero em particular, mas considerando a todos conjunctamente, mesmo porque d'este modo se devem reputar mais exactos os diversos, termos medios indicados pelo sr. ministro da fazenda, essa prova deriva do proprio relatorio de s. ex.ª. Examinando pois o calculo apresentado no dito relatorio, a paginas 11, eu espero mostrar á camara que, dadas todas as hypotheses, o admittidos todos os elementos que o governo ali adopta, ha de o tabaco em geral ficar mais caro para o publico do que está na actualidade.

Eu adopto como exacto o preço de 297,42 réis para cada kilogramma de tabaco; 1$150 réis a importancia dos direitos, porque, como uma parte do tabaco paga 1$200 réis e outra só 1$000 réis, isso corresponde proporcionalmente para 1 kilogramma em geral a 1$150 réis; 100 réis de imposto do fabrico, e 37,5 réis encargo de 3 por cento de emolumentos sobre o direito proporcional. Calculo em 9 por cento as quebras, termo medio, porque assim as calcula o governo no relatorio a paginas 9.

Adoptando todos estes valores e estas hypotheses, que são as do sr. ministro da fazenda, tenho o seguinte, para achar o custo de 1 kilogramma de tabaco manufacturado em geral, termo medio:

[Ver diário original]

Não chegando assim a differença, que é o lucro dos fabricantes a representar 2 por cento do capital despendido, é evidente que o tabaco em geral se ha de vender mais caro do que se vende pelo monopolio arrematado, para que seja possivel esta industria, não sendo portanto exactas as conclusões a que chega o sr. ministro da fazenda no seu relatorio a pag. 11, como acabo de demonstrar (apoiados).

Ha porém ainda um ponto sobre o qual eu desejo chamar a attenção da camara, porque o considero muito grave. Refiro-me, sr. presidente, á importancia das quebras e á influencia que ellas exercem n'estes calculos.

O meu nobre e intelligente amigo, o sr. Gomes, no discurso que fez sobre esta questão, e nas interrogações que dirigiu ao sr. ministro da fazenda, poz sempre em relevo, que tomava em linha de conta as quebras que computou em 9 por cento, termo medio, por serem de 13 por cento para o tabaco em rolo e folha picada, e 20 por cento de acrescimo para o tabaco de cheiro.

O sr. ministro, tendo-se esquecido de as calcular, e apanhado em flagrante pelo meu nobre amigo, respondeu com grande segurança de si, e por um modo que parecia triumphante que não tinha de calcular as quebras, porque ellas estavam já computadas ou comprehendidas nos 130:000$000 réis que se attribuem no relatorio para despezas de fabricação. Peço pois a attenção da camara e examinemos o alcance da declaração feita pelo sr. ministro.

Supponhamos que as quebras são exactamente o que o governo declarou no seu relatorio, isto é, 125:29 kilogrammas, ou 9 por cento, termo medio do tabaco importado.

N'esta hypothese poderemos discorrer do modo seguinte: Quebras segundo o relatorio a pag 9, kilogrammas......................... 125:289

Custo de 1 kilogramma de tabaco com os

direitos pagos, termo medio, réis...... 1$584,92

Importância total das quebras, em réis... 198:573$041

O relatorio calcula para as quebras...... 130:000$000

Déficit em relação ao calculo do relatorio.. 68:573$041

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Bastava este modo de apreciar os algarismos para que eu tivesse duvidas profundas sobre os resultados dos calculos feitos pelo sr. ministro no seu relatorio, por isso que se fundam em dados que não são exactos, como acabo de mostrar á assembléa. Isto, sr. presidente, não é serio (apoiados). Não calculastes as quebras, e vindes depois dizer que já estavam comprehendidas nos 130:000$000 réis de despezas de fabricação, quando ellas importam n'uma somma muito superior aquella que se attribue ás ditas despezas! (Apoiados.)

Sabe v. ex.ª quaes são as quantias que têem de saír dos 130:000$000 réis em que são computadas as despezas da fabricação? São naturalmente as que são necessarias para pagar as ferias dos operarios, o juro do capital empatado, o entretenimento da fabrica e das machinas, a compra das substancias indispensaveis para a manipulação e muitas outras que não enumero, para não cansar a attenção da camara. Tudo isto ha de saír dos 130:000$000 réis. Pois bem. Supponhamos que nas fabricas ha 1:800 operarios, que vençam, termo medio, 240 réis diarios, importarão as ferias em 300 dias

uteis............................. 129:600$000

Juro a 6 por cento do capital de 600:000$000

réis.............................. 36:000$000

Entretenimento, suppondo 5 por cento sobre 200:000$000 réis............... 10:000$000

Somma...... 175:600$000

Acrescentando a importancia das quebras calculadas pelos elementos do relatorio.. 198:573$041

Somma...... 374:173$041

Sem metter em conta a compra das materias estranhas ao tabaco, mas precisas para a manipulação e outras despezas menores, que não tenho elementos para apreciar, segue-se de tudo isto que das declarações do sr. ministro da fazenda, e dos seus calculos, se conclue que de 130:000$000 réis hão de saír pelo menos 374:000$000 réis!

Isto está abaixo da critica, e dispensa todos os commentarios (apoiados).

Quando por tal modo se pretende influir no animo do publico, e no dos representantes do paiz, para que elles, em nome de principios inexactamente invocados, e invocados em vão, sobretudo, prejudiquem a receita do thesouro tão profundamente como tenho indicado á camara; quando isto se faz, tenho direito de concentrar o meu espirito, de duvidar de tudo quanto se affirma no relatorio, e de olhar com uma justa prevenção para um projecto que é defendido por taes meios e com taes argumentos (apoiados).

Sr. presidente, os 13 por cento das quebras não estão calculadas era parte alguma...

Uma voz: — No preço da materia prima.

O Orador: — Perdão, está enganado o illustre deputado. O preço da materia prima lá está calculado em 297 réis por kilogramma; mas isso é outra cousa. O sr. ministro diz que = a importancia das quebras está comprehendida nas despezas da fabricação =; o nobre relator da commissão diz que = o está no preço da materia prima =; e eu digo que o não está em parte alguma, argumentando com o proprio relatorio do sr. ministro da fazenda, para o qual peço toda a attenção do illustre deputado. Quando muito poderia dizer-se que estava no preço da materia prima a quebra da materia prima relativamente ao seu preço, porém não relativamente aos direitos que paga, que são enormes. Veja a camara que o sr. ministro da fazenda acha o preço de 297,42 réis para cada 1 kilogramma de materia prima dividindo 400:000$000 réis, que diz ser o custo dos tabacos, por 1.344:906 kilogrammas, que suppõe ser o consumo annual. É evidente pois que n'aquelles 400:000$000 réis não estão comprehendidos os direitos, que só por si importariam no quadruplo daquella quantia.

Onde estão pois, repito, consideradas as quebras do tabaco? Peço perdão ao illustre deputado para lhe dizer que não estão em parte alguma, e que os resultados que se colhem do exame dos proprios elementos do relatorio do sr. ministro provam até á evidencia que essa despeza não foi calculada, e que só n'um momento de apuro o nobre ministro se lembrou de dizer ao sr. Francisco Luiz Gomes, que =as quebras saíam dos 130:000$000 réis das despezas de fabricação = (muitos apoiados).

Ainda resta porém considerar um elemento, que escapou completamente aos calculos, que não está mencionado em parte alguma, que mesmo o não pôde estar, e que representa uma somma que nenhum de nós pôde antecipadamente dizer qual seja. Refiro-me ao contrabando, e creio que se poderá provar exuberantemente que o contrabando, por este systema de direitos excessivos, ha de ser muito mais valioso e importante, o ha de prejudicar muito mais os interesses da fazenda publica, do que o que se faz com o systema actual, ou o que se faria com o da régie.

O contrabando é de diversas naturezas, e faz-se de differentes maneiras, isto é, deixando os generos de pagar os direitos na alfandega, sophisticando a fabricação ou adulterando o tabaco nos estancos, como eu mostrarei á camara que se pôde fazer, porque é isso proprio d'este systema, e ha de affectar profundamente os calculos do sr. ministro da fazenda.

Fallou-se em Inglaterra, emquanto ao systema ali adoptado e aos resultados que d'elle aufere a fazenda publica d'aquelle paiz, para mostrar que com igual systema se deviam colher identicos resultados em Portugal. Mas todos sabem que o contrabando do tabaco em Inglaterra é por tal fórma importante, que foi já avaliado na Irlanda em tres quartas partes do consumo, e na propria Inglaterra na quarta parte. Ora é preciso advertir que a Inglaterra é um paiz que não confina com qualquer outro estado onde exista a liberdade do tabaco; as suas fronteiras são todas maritimas, a sua fiscalisação é immensa, a esquadrilha encarregada de vigiar as suas costas é numerosa e tem grande força, os regulamentos são severos e mais severa ainda a execução d'elles, o tabaco não pôde ser conduzido senão em pacotes que contenham certa porção, e em navios pelo menos de cem toneladas, e apesar de tudo isso o que acontece? Ha um contrabando immenso que zomba de todos os rigores do excise, e de todos os obstaculos que lhe põe a fiscalisação maritima (apoiados). Todos nós temos ouvido aqui accusar mil vezes o governo e as auctoridades, por (não impedirem a entrada do contrabando; não digo já d'esse contrabando dos generos, que n'um pequeno volume têem um grande valor, embora seja artificial, mas dos generos que têem um volume enorme, cujo valor não está em relação com esse volume, e que representam uma somma muito menor do que representa o mesmo volume de tabaco.

Pois não sabe toda a gente que se tem feito um grande contrabando de assucar, de cereaes e de aguas ardentes? Pois estes generos, debaixo do mesmo volume, têem um valor maior que o do tabaco? Pois não será possivel, não deveremos acreditar mesmo que o contrabando do tabaco se ha de desenvolver em uma escala proporcional ao direito que o vae sobrecarregar á entrada e ás facilidades que são proprias do systema que se adopta?

Mas diz-se que em Hespanha ha a régie, e que em Hespanha os tabacos têem um preço que não convida ao contrabando. E o nobre ministro da fazenda procura no seu relatorio attenuar os receios do commercio illicito, indicando qual é o preço dos differentes generos de tabaco em Hespanha, e como não podem concorrer com os tabacos do nosso paiz. Não ha duvida. Se acaso nós imaginarmos que o tabaco que entrar em Portugal é o manufacturado pela régie hespanhola, de certo que pôde ter rasão o nobre ministro; porém, como eu creio que o tabaco que ha de entrar no paiz ha de ser o que entra em Hespanha tambem por contrabando, devo suppor, e com rasão, que sendo o direito de importação muito forte, podem ser muito consideraveis tambem as despezas que se hão de effectuar, e os riscos que se hão de correr para o introduzir no reino, sem que isso desanime os contrabandistas.

Mas V. ex.ª não ignora, e não ha ninguem que não saiba, que actualmente se introduz n'este paiz tabaco vindo de Hespanha, e principalmente tabaco manufacturado, duma quantidade consideravel, e sobretudo nas terras proximas á fronteira. Toda a gente sabe isto. Então porque hei de eu suppor que, adoptado a systema da liberdade, em que a fiscalisação necessariamente tem de se resentir, como logo farei ver á camara, d'esta mudança de systema; como hei de suppor, repito, que o tabaco, e principalmente os generos finos, que até agora entravam, mais ou menos, para consumo do paiz, deixarão de entrar d'ahi por diante? Não o posso suppor, não ha rasão nenhuma que o justifique; e devo por consequencia imaginar que, pelo menos em charutos, o contrabando que se ha de fazer, ha de ser muito consideravel.

Mas não é sómente o contrabando que se faz na importação que nos deve dar cuidado; ha outra especie de contrabando, que eu julgo talvez mais perigosa ainda, é a que se faz pela sophisticação nas fabricas; esta, em grande parte, escapará á acção do governo; esta, para se evitar, seria preciso que se empregasse uma fiscalisação tão vexatoria e tão incessante, que deixasse a perder de vista a que actualmente tem o contrato do tabaco. E digo, deixasse a perder de vista, porque o contrato do tabaco, como tem só duas fabricas, não tem necessidade de exercer a fiscalisação e vigilancia que terá necessidade de exercer o governo, quando existirem diversas fabricas, nas quaes se possa fazer a sophisticação do genero, o que é muito mais perigoso e tem muito maior alcance.

Por conseguinte a asserção que eu fiz na sessão passada subsiste. Tinha eu dito. que o contrabando, debaixo da fórma de sophisticação nas fabricas, será tanto maior, quanto maior for o imposto que pagar o tabaco nas alfandegas. Mesmo á primeira vista custa a comprehender que haja quem duvide da verdade d'esta proposição. E claro que as fabricas que carecem de um genero que é onerado com um imposto muito forte, têem por isso mesmo um grande incentivo para o substituir por outras substancias, e tanto maior quanto maior for esse imposto. Acontecerá portanto que o incentivo para a sophisticação será immenso, e na proporção do imposto que, segundo este projecto, ha de pagar o tabaco na alfandega, é maior do que o que paga actualmente.

Mas pensa alguem, por acaso, que será sómente nas fabricas que se ha de dar esta especie de contrabando a que o meu amigo, o sr. Casal Ribeiro, justamente chamou sophisticação do genero? Ha de ser nas fabricas e nos estancos, e principalmente nos estancos pelo que diz respeito ao tabaco de cheiro, porque é facilimo adultera-lo, augmentando-lhe o peso com a introducção de outras substancias, e até simplesmente com agua. Pergunto agora, qual ha de ser a fiscalisação que ha de chegar, não digo já para as fabricas que se estabelecerem, porque não hão de ser muitas, mas para os estancos? Qual será a fiscalisação que baste para se exercer de modo tal, que haja a consciencia de que o tabaco se não adultera?

Eu bem sei que me podem dizer, que é verdade que os estancos podem ter interesse em adulterar, mas têem o risco, e por consequencia os estanqueiros hão de pensar antes de praticarem a adulteração. A isto responderei eu, sr. presidente, que a sophisticação se ha de fazer inevitavelmente nas fabricas, e a adulteração nos estancos, porque a isso serão convidados pelo maior de todos os estimulos, que é o interesse. No regimen do monopolio arrematado o fabricante é o contratador, o qual, mesmo querendo falsificar o genero, tem para isso apenas o incentivo do seu valor intrinseco, e o dos pequenos direitos de importação a que está sujeito. O estanqueiro é um dependente do contrato, a quem pôde ser tirada a faculdade de vender tabaco por simples ordem dos caixas, sem proceder processo nem condemnação; emquanto que, no systema de liberdade, os estanqueiros exercem um ramo de commercio, que se colloca no direito commum, mas que por isso mesmo tambem dá muito menos acção á auctoridade para evitar as fraudes.

E não se diga, sr. presidente, que eu estou combatendo aqui as idéas da liberdade, em primeiro logar porque a não ha no projecto senão muito limitada, e depois d'isso, porque na especie de que se trata não conheço economista que não julgue necessario modificar certos principios em nome de um grande interesse fiscal. Como o estado não pôde existir sem receita, creio que não se offendem os bons principios pedindo ao voluntario consumidor do tabaco, o que, aliás, teremos de ir buscar ao pão, ao vinho, ao vestido, á casa, á propriedade e á industria do contribuinte (muitos apoiados). Estas idéas não são absolutas, nem estes principios estão condemnados. Não é assim. Quando nós vemos que nações tão importantes, como a França, a Hespanha, a Austria e a Italia conservam o monopolio do tabaco por conta do estado; quando lemos o que escrevem a tal respeito os economistas mais distinctos da escola liberal, encontrámos bastantes e respeitaveis auctoridades para abonar a nossa opinião (apoiados).

Mas se nós estamos em erro, se a liberdade é o pharol que vos guia e vos esclarece, se é em nome d'esse santo principio que pretendeis levar á consciencia da camara o convencimento da opportunidade e vantagem da vossa proposta, sede sinceros, sede coherentes sobretudo, e vinde propor as outras liberdades, que tantas vezes vos temos pedido, para outros generos de industria e de commercio, não menos valiosas, não menos importantes do que este de que se trata (apoiados). Pois quando se têem levantado n'esta casa tantas vozes pedindo a liberdade do commercio dos vinhos do Douro, que responde o governo? Declara que não se persuada ninguem que o gabinete tem modificado as suas idéas a respeito d'esse negocio, que os seus principios são sempre os mesmos, mas a execução d'elles é que não chega nunca! (Apoiados.) Porém o paiz está farto de palavras, e quer factos, e por isso muitos insistem na liberdade dos vinhos. O governo responde-lhes com a liberdade do tabaco! Mas pedimos mais do que para os vinhos do Douro; pedimos liberdade para a uma (apoiados), pedimos liberdade para o direito eleitoral (muitos apoiados), que foi calcado aos pés em Villa Real, e que está fazendo correr o sangue dos cidadãos n'aquelle districto (muitos apoiados). Responde o governo propondo a liberdade do tabaco! Pedimos liberdade do homem para a manifestação das suas opiniões, para o exercicio dos seus direitos escriptos na carta constitucional da monarchia, e escriptos com o sangue derramado nos campos de batalha (apoiados), e responde o governo dando nos a liberdade do tabaco! Isto não se commenta (apoiados). E licito duvidar da viva fé, que ha era taes principios, quando elles se esquecem ou se atropellam, em tantos ramos da publica administração, e até no que diz respeito ao que ha de mais fundamental e de mais sagrado no systema representativo (apoiados).

Sr. presidente, eu não receio os inconvenientes apontados n'esta casa, a respeito da administração do monopolio por conta do estado, inconvenientes que foram destruidos pelo eloquente discurso que, com tanta copia de esclarecimentos, proferiu aqui o meu illustre amigo, o sr. Casal Ribeiro. Não me fazem peso os receios que se manifestaram, porque, se se decretasse a administração por conta do estado, não havia obrigação alguma de copiar esta ou aquella legislação; podendo nós aliás estabelecer todos os preceitos e condições que julgassemos convenientes, e que fossem compativeis com casa fórma de administração.

Receia-se a administração por conta do estado, pela faculdade que ficava ao governo de poder augmentar os quadros com mais empregados, e portanto augmentar as despezas publicas, acrescentando todos os dias o numero d'aquelles que se sentam á mesa do orçamento. Aonde ficam os empregados do contrato, que por um artigo do projecto passam para o serviço do estado? Não ficam a cargo do thesouro? Não vão sentar-se tambem á mesa do orçamento? (Apoiados.) Pois estes 120:000$000 réis de fiscalisação e dos empregados do escriptorio não vão sobrecarregar immediatamente o thesouro publico? O que resta alem d'elles? Restam os estanqueiros. Mas os estanqueiros hão de continuar a ter a mesma percentagem para vender o tabaco, porque o tabaco não se vende de graça; ou por conta do estado, ou pelo monopolio arrematado, ou pelo projecto, ha do haver sempre quem venda por meio de commissões. Emquanto aos mais, alem dos administradores que de algum modo hão de ser em parte substituidos, os outros empregados, que passam todos para o estado, esses ficam a cargo do thesouro.

Encarando agora este negocio debaixo do ponto de vista fiscal, eu creio que não podem dizer os illustres defensores do projecto que este systema é mais favoravel para a receita publica, por não exigir tantos empregados, quando elles ficam á disposição do governo. Eu receio muito, e receio ainda mais depois que ouvi o sr. ministro, receio que a fiscalisação, que é indispensavel para assegurar a receita, se modifique e se attenue por tal fórma, que não dê garantia alguma. Ouvi o nobre ministro dizer que = uma das bellezas d'este projecto, um dos seus merecimentos, consistia em diminuir o vexame da fiscalisação =. Quando o meu illustre amigo, o sr. Casal Ribeiro, disse que = a fiscalisação era vexame =, foi-lhe isso contestado pelo sr. ministro da fazenda, e eu entendo comtudo que a fiscalisação não é, nem pôde ser, outra cousa. Pois quando eu chego a um paiz,

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ao meu ou outro qualquer, e quando na alfandega tenho de parar, pára serem examinadas as minhas malas, poderá alguem negar que sou incommodado? E quando se quer ir mais longe, e se examina o que cada um leva nas algibeiras, ha ou não ha vexame? Quando nos obrigam a seguir por um certo caminho em logar de outro, que nos convinha, não será isto vexame? Vexame e fiscalisação são inseparaveis. Não se comprehende fiscalisação sem vexame, que aliás pôde ser maior ou menor, mas que nem por isso deixa de existir.

Lamento portanto muito sinceramente que o sr. ministro da fazenda, para correr atrás de uma falsa popularidade, pretendesse inculcar que d'este projecto se hão de seguir facilidades que seriam o mais grave compromettimento da renda.

Os rigores fiscaes podem ser exagerados, e n'esse caso são condemnaveis, porém cada um tem a sua missão a desempenhar, e a de um ministro da fazenda não é a de fazer uma critica apaixonada contra a fiscalisação (apoiados).

Sr. presidente, este ponto chamou a minha attenção, porque o que mais me preoccupa n'este negocio é o justo receio de que diminua esta copiosa fonte de receita. Convencei me do contrario, e tendes-me ao vosso lado, acompanho-vos nas vossas idéas, tenho as mesmas aspirações; porém não posso chegar ás mesmas conclusões, porque receio que, na situação em que se acha o paiz, no estado em que se encontra a fazenda publica, nós vamos sacrificar interesses importantissimos e comprometter ainda mais o futuro.

Isso é que eu não quero. Emquanto não me provarem que do systema proposto hão de provir para o thesouro vantagens, pelo menos iguaes ás que actualmente elle aufere, declaro que não acompanho os illustres deputados. Não posso, em nome do meu dever, em nome da minha consciencia, apoiar uma tentativa arriscada que ha de ser fatal para o paiz.

E é n'este momento, e é agora, quando nós lutamos com tantas difficuldades, quando temos pedido ao paiz sommas tão consideraveis para os seus melhoramentos mais importantes, quando vemos que os deputados dos diversos lados da camara todos os dias se levantam n'esta casa a pedir uma estrada, um caminho de ferro, a abertura de uma barra, um porto artificial, melhoramentos que importam em milhares e milhares de contos de réis, e que todos elles, salvas as devidas proporções de localidade e de importancia, são sem duvida uteis e recommendaveis; quando não temos ainda pago os nossos caminhos de ferro, apesar de se haverem contrahido emprestimos para esse fim na importancia de quasi 34.000:000$000 réis nominaes; quando se diz que o sr. ministro das obras publicas tem assignado as bases de novos prolongamentos de caminhos de ferro, ponto que eu não discuto agora, reservando-me para o fazer em occasião opportuna; dispondo para a subvenção dos ditos prolongamentos, do producto da renda da testa da linha do sul, emquanto que o sr. ministro da fazenda tinha assegurado que as sommas que d'ali proviessem haviam de servir para attenuar o deficit; quando tudo isto acontece é que nós havemos de votar um projecto, que compromette tão gravemente a receita publica? (Apoiados.)

Hesito, duvido, recuso no interesse do meu paiz, approvar uma medida tão arriscada, que nos pôde ser fatal, tornando cada vez mais embaraçosa e difficil a nossa situação financeira (apoiados).

Eu bem sei, sr. presidente, que para não excitar a susceptibilidade do contribuinte, o problema será resolvido por meio dos emprestimos. Mas sabe v. ex.ª o que é o recurso ao credito? É o imposto adiado, mas inevitavel, pesando com mão de ferro sobre o paiz (apoiados), o imposto a que ninguem se pôde recusar. Emquanto o imposto pedido directamente á camara pôde ser votado ou não, o imposto depois de contrahido um emprestimo não pôde deixar de ser votado pelo parlamento, nem ha parlamento que o recuse. Esta fórma de imposto é a mais inexoravel e tremenda, porque não pôde o imposto quasi que ser discutido senão na fórma, e tem de ser votado (apoiados).

Pois é debaixo d'esta fórma que o governo nos ha de aqui vir pedir os 500:000$000 réis, os 600:000$000 réis, ou não sei quantos mais centos de contos de réis, que hão de preencher o desfalque annual proveniente do projecto de que se trata (apoiados).

Quando se consideram os principios economicos, é preciso attende-los todos, e não considerar unicamente certos principios para desprezar outros.

Quando se falla em nome dos principios, e sobretudo se pede ao paiz um grande sacrificio, porque o é, ou porque ha de dar logar a elle, a verdadeira sciencia indica o caminho que se deve seguir, que não é este, e devem ser consultados e attendidos os homens competentes na materia.

O tabaco é consumido voluntariamente por quem o quer consumir, e não fórma a base de nenhuma especie de alimentação, nem mesmo se pôde classificar o seu uso como produzindo goso ou distracção que sirva para desenvolver as faculdades physicas ou intellectuaes do homem. E por isso que todos os economistas fazem uma excepção a seu respeito, e dizem que elle auctorisa uma modificação á regra geral, podendo ser onerado mais profundamente do que os outros generos necessarios ou agradaveis á vida.

Sendo isto assim, como é que se pôde vir aqui em nome dos principios, que não são senão certos principios, sem se attender aos outros, pedir que votemos a reforma da legislação sobre o tabaco, declarando livre o fabrico, que não fica livre, declarando livre o commercio, que não fica livre, e estabelecendo com respeito á cultura a prohibição tão ampla, tão completa e tão absoluta, como no monopolio arrematado, ou administrado por conta do estado? (Muitos apoiados.)

Que importa a um habitante de Coimbra, de Vianna do Castello, de Vizeu, ou da Guarda, que se decrete a liberdade do fabrico para os habitantes de Lisboa e Porto, que ainda assim têem de pedir licença ao governo? Como é que em nome dos principios generosos da escola liberal se estabelecem tão odiosas e repugnantes desigualdades (Apoiados.)

A vista d'isto, sr. presidente, não se pôde vir aqui com a voz elevada, com o entono proprio dos grandes homens nas grandes occasiões, dizer: «Nós vimos zelar os principios, vimos dar um passo para a liberdade, e aquelles que nos contrariam são os reaccionarios de economia politica, os defensores do monopolio, os inimigos do progresso». Não, sr. presidente, nós como os amigos da liberdade, mas da liberdade livre, e não d'essa ficção de liberdade enganosa, que nos dá o projecto do governo, nós somos sobretudo os amigos do paiz, cuja fazenda não queremos ver arruinar n'uma tentativa perigosa, unicamente em nome de uma palavra vã, que é desmentida completamente na contextura da lei que nos é proposta (apoiados).

Tinha eu fallado no contrabando, sr. presidente, no contrabando que nos ha de fazer pagar cara esta veleidade do governo, se o projecto que discutimos chegára ser lei do estado, e tinha eu dito que o estanqueiro, no regimen do monopolio, era até certo ponto interessado em não adulterar o genero, com o receio de perder immediatamente e peremptoriamente a licença e a commissão. Mas que acontece pelo systema proposto no projecto? Acontece que o estanqueiro é um contribuinte, que o estanqueiro é um homem que exerce uma industria e um commercio unica e simplesmente sujeito a uma licença que lhe é facultada pela respectiva auctoridade, pelo que paga um certo imposto e nada mais. Qual é o meio de actuar sobre o estanqueiro em ambos os casos? No primeiro caso o estanqueiro é vigiado pelo contratador ou seus delegados, e no systema da régie pelo governo ou seus agentes, e despedido de estanqueiro sem mais formalidade nem sentença, unicamente em nome de legitimas desconfianças de que elle tinha falsificado ou adulterado o genero, que lhe era permittido vender. A adulteração era á custa ou em prejuiso do contratador no monopolio arrematado, e do estado no systema da régie, e n'um ou n'outro caso não havia considerações a attender, procedia-se contra o estanqueiro, tirava-se-lhe o estanco pela desconfiança de que elle falsificara ou sophisticára o genero em que lhe tinha sido permittido negociar. Estes meios de acção que garantiam a venda, desapparecem pelo projecto.

O estanqueiro fica um cidadão a vender tabaco a quem quer e como quer, pôde alterar o genero sem grande risco, e ha de faze-lo tanto quanto lh'o permittirem as auctoridades fiscaes. Mas qual fica sendo a influencia da auctoridade sobre o estanqueiro? Quaes são as penas a que fica sujeito? Qual é o processo a seguir? No caso do estanqueiro falsificar o genero, e quando seja por isso accusado, o processo a seguir é o processo ordinario intentado perante as justiças do paiz. N'esse processo têem de ser ouvidas testemunhas, é feito com audiencia do réu, emfim seguem se n'elle todos os termos que estão estabelecidos para todos os processos d'esta ordem, e o resultado faz-se esperar por tanto tempo, que já no fim terá excitado a benevolencia da opinião, principalmente quando a adulteração não tenha sido em prejuizo da saude publica, mas sómente no interesse do vendedor.

De tudo isto concluo eu, sr. presidente, que o contrabando, debaixo da fórma da adulteração do genero, como já se tem praticado muitas vezes, ha de ser immensamente maior pelo systema adoptado no projecto, que pelo systema actual, ou pelo da régie (apoiados).

Mas o governo responde a tudo era nome dos grandes principios de que se diz defensor, em nome da palavra sympathica da liberdade. Porém que liberdade é esta? Liberdade de quê? Liberdade de commercio? Já disse á camara, e repito agora, que não pôde ser considerada liberdade de commercio aquella que não permitte que possam despachar este genero senão aquelles que tiverem fabrica (apoiados), e que, não poderão ter fabrica senão os individuos a quem o governo especialmente fizer a graça de lhes conceder licença para isso (apoiados), e quando o genero é carregado com um forte imposto de 400 porcento (apoiados). A liberdade de commercio considerada debaixo d'este ponto de vista não é liberdade (apoiados). Liberdade de fabricação. Mas qual? Aonde está ella, quando ninguem pôde fabricar senão aquelles a quem o governo fizer essa concessão? (Apoiados.)

Que fabricas poderão estabelecer uma verdadeira concorrencia, se apenas será permittido monta-las a alguns individuos em Lisboa e no Porto e mais ninguem em todo o reino? (Apoiados.)

Que concorrencia poderá resultar de um projecto trazido á Ultima hora? (Apoiados.) Essa concorrencia fica sendo impossivel durante muito tempo, e ficará sómente uma unica fabrica a trabalhar (apoiados). Podereis, n'este caso e n'estas circumstancias, invocar os principios da liberdade de commercio, da liberdade do fabrico, e o da concorrencia, para em nome d'elle pedir á camara que vote o projecto, que diz respeito a interesses tão graves como aquelles de que se trata? Creio que não (apoiados).

Lisboa é grande, merece sem duvida a attenção dos poderes publicos, e o Porto tambem, mas Portugal não é Lisboa e Porto (apoiados). Não são filhos uns e outros enteados (apoiados). Não ha direitos para uns mais do que para outros (apoiados). E principalmente, quando se falla em nome da liberdade, os direitos devem ser iguaes para todos (apoiados).

No systema do monopolio arrematado todos estão sujeitos igualmente a esse regimen, regimen este que eu êxodos nós condemnâmos (apoiados), e que com satisfação vejo que é condemnado pelo governo e pela commissão de fazenda; e oxalá que se mantenham sempre n'este campo, e que com satisfação vejam ainda obrigados, pela força das circumstancias, a vir aqui modificar as suas opiniões (apoiados) quando virem que é impossivel fazer converter em lei este projecto (apoiados).

Applaudo o governo e a commissão dei fazenda, por terem condemnado o monopolio arrematado; neste ponto estou a seu lado, apoio as suas idéas, e faço votos para não assistir ao espectaculo da votação d'esta camara auctorisando mais uma arrematação.

O governo, e os illustres defensores do projecto, apresentam um outro argumento, que pôde fazer impressão, e que é muito attendivel, para poder ficar sem resposta. Comparando systema da liberdade com o da administração por conta do estado, dizem que nós vamos depositar nas mãos da auctoridade uma grande influencia eleitoral.

Basta a enunciação d'esta proposição por parte do governo, para que pareça a toda a gente extraordinario que dos bancos do ministerio, da parte d'aquelles que hão de exercer esta influencia, que se suppõe nefasta á genuina representação nacional, é que se proclamem estas doutrinas (apoiados) e se exponham estes receios.

E do seio do gabinete, é d'entre aquelles que têem confiança nos srs. ministros, que partem as duvidas, os receios, as apprehensões sobre a influencia que podem exercer as auctoridades, estando á frente d'ellas o ministerio que se senta n'aquellas cadeiras! (Indicando as do governo.) Até que ponto chegâmos nós! Pois já nem os ministros confiam em si? (Apoiados.) Pois já não tendes confiança nos srs. ministros, ou julgaes que o governo cáe n'esta questão e que a opposição toma conta das pastas? Será esta ultima hypothese? Não, por certo.

O governo já declarou que este negocio tinha sido resolvido em conselho de ministros, que todos os ministros estão responsaveis por elle, e não o está só o sr. ministro da fazenda.

Portanto o ministerio está seguro, e depois d'esta declaração não se podem já nutrir taes receios no animo d'aquelles que julgam conveniente sustentar este gabinete.

Supponhamos porém que era esta uma arma perigosa na mão do governo; quem o obrigava a usar d'ella? (Apoiados.) Quem compellia o governo a proceder por tal fórma que, aproveitando-se da influencia que tivesse sobre os empregados do tabaco, por meio d'elles procurasse violentar o voto publico, e fazer com que ao parlamento não viessem aquelles que, por uma eleição livre, aqui deviam ter assento? (Apoiados.)

Isto é uma utopia; é uma pura imaginação suppor que o parlamento, e sobretudo a opposição, queria investir o governo com a faculdade de sophismar a representação nacional, ou dar-lhe mais uma arma para o conseguir (apoiados).

Sr. presidente, sabe v. ex.ª d'onde pôde vir a influencia que actue no animo dos eleitores, por meio dos agentes do tabaco, quando este seja administrado por conta do estado, a ponto de falsificar o voto publico? Não podia vir senão da fiscalisação, em virtude da qual os agentes do governo teriam a faculdade de exercer violencias contra os adversarios, e ter condescendencias com os amigos, que dessem em resultado conquistar o voto de alguns eleitores menos independentes. Esses abusos porém e esses vexames, podem igualmente ser praticados sendo convertido em lei o projecto que discutimos (apoiados).

Quando se diz que o governo, por meio de tal ou tal auctoridade, tem influencia para fazer prevalecer um candidato sobre outro, quer dizer isto que essa auctoridade pôde abusar, ou permittir que alguem abuse, fazendo vexames a quem lhe não agrada, ou fazendo concessões a uns que a outros nega.

Qual é a rasão por que os administradores dos concelhos são considerados como fabricantes de eleições, como disse o meu illustre amigo o sr. Casal Ribeiro? Tirem-lhe os meios de abusar e veremos depois qual é o resultado que conseguem. Tirem aos regedores a influencia que tem na sua parochia, pela dependencia da sua auctoridade e pelo temor dos abusos que pôde commetter e que muitas vezes commette, e verão que a sua influencia desapparece. Porque são influentes os recebedores e os escrivães de fazenda? E porque podem exercer pressão sobre os contribuintes, que são ao mesmo tempo eleitores.

Mas quer o monopolio seja administrado, por conta do estado, quer se approve o systema proposto pelo governo, as auctoridades fiscaes são as mesmas, e todas ellas ficam debaixo das ordens do ministerio (apoiados). Ora, as auctoridades fiscaes é que têem a influencia, porque são ellas que podem abusar. Não se argumente portanto com o grande, perigo da intervenção dos empregados do tabaco nas eleições, se porventura se estabelecesse a administração por conta do estado; porque a influencia é a mesma em ambos os casos, e do mesmo modo sujeita á auctoridade central (apoiados).

Este projecto, por exemplo, prohibe a cultura, como a prohibe o monopolio arrematado, e como a prohibiria tambem o monopolio administrado por conta do estado. Qual é pois a consequencia da prohibição da cultura? É que a auctoridade administrativa, ou outra qualquer, ha de ser encarregada em todos os districtos, em todos os concelhos, em todas as parochias, de examinar se acaso se faz plantação de tabaco em maior ou menor escala. E sabe v. ex.ª a que conduzem estas investigações? Aos vexames inherentes á fiscalisação, ás visitas domiciliarias, aos exames sobre; as localidades, á necessidade de devassar as propriedades particulares. E estes meios de acção, que podem ser origem de tantos vexames, deixam acaso de existir pelo projecto do governo? (Apoiados).

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Pois se se converter em lei á proposta que estamos discutindo, não ha de haver a mesma fiscalisação, a menos que se não queira que as rendas publicas sejam defraudadas? De certo. E quem ha de exercer essa fiscalisação? Os empregados do tabaco. E a quem ficam elles sujeitos? Ao governo. E evidente portanto, sr. presidente, que o governo fica com tanta influencia sobre elles, como teria se porventura o monopolio fosse administrado por conta do estado (apoiados). Essa influencia directa sómente deixa de a ter o governo pelo systema do monopolio arrematado, porém tal systema está condemnado por todos, e por isso a objecção não tem fundamento algum.

Alem dos empregados fiscaes, a que me acabo de referir, ha tambem cerca de 1:800 operarios. Porém acaso votam elles todos? Por certo que não. Uma parte d'elles são creanças, outra são mulheres, e do resto poucos serão eleitores (apoiados).

Resta me fallar dos estanqueiros, que não têem influencia alguma, o que dispõem apenas do seu voto, os que o têem, que não são todos.

Se o governo tiver a peito, como devo suppor, zelar e rendimento publico, não imagine pessoa alguma que no regimen chamado da liberdade, os estanqueiros estão sujeitos á vigilancia das auctoridades locaes, simplesmente como aquelles que vendem quaesquer outros generos. O justo receio das adulterações que podem praticar, ha de fazer com que os regulamentos sejam tão rigorosos com elles, que os constituirão numa verdadeira e constante dependencia. Se a auctoridade portanto podia exercer uma certa influencia nelles, sendo estanqueiros da régie, não ficam todavia isentos dessa influencia, embora por outra fórma, exercendo o commercio de vender tabaco a retalho. Em ambos os casos póde haver abuso e pressão eleitoral, considerada a questão debaixo d'este ponto de vista.

Não se apresentem portanto, sr. presidente, argumentos que não têem applicação, e sejamos logicos sobretudo. Se o parlamento receia dos sinistros, se os ministros receiam de si proprios, se a auctoridade não se pede conter, que não abuse, não votemos este projecto, que dá ao governo os mesmos meios de acção que lhe dá a régie, e haja novo contrato, que só por esse meio podemos conjurar o perigo que tanto assusta os illustres deputados. Arrematemos assim a uma companhia a faculdade de intervir nas eleições Permitta-me a camara que eu recuse o meu voto a um tal expediente que eu tenho condemnado sempre, que está proscripto em toda a Europa, e que é improprio do seculo em que vivemos, e contrario á indole das instituições que nos regem (apoiados).

Agora peço ao governo que me diga - se no caso de se não poder converter em lei este projecto até 1 de maio, em que finda a actual arrematação — e não creio que esteja na mão do governo dictar ás casas do parlamento o uso que hão de fazer do seu direito de discutir —; digo, no caso de que não seja possivel, dentro do tempo que decorre até 1 de maio, ser convertido em lei este projecto, qual é a sua intenção? Desejo saber mais — qual é o methodo que o governo adopta, e sobre este ponto é necessario que o parecer da illustre commissão seja mais explicito, para a cobrança do imposto correspondente ao genero que, na occasião em que se passar para a liberdade, existir em ser na mão dos contratadores, convindo que se determine se esse pagamento é immediato, ou á proporção que se for consumindo o tabaco que existir?

Finalmente, sr. presidente, vou concluir, e julgo que cumpri o meu dever expondo á camara esta observação, porque se me afigura que o projecto que se trata de levar á pratica é em prejuizo dos mais caros interesses do meu paiz, e póde comprometter gravemente o thesouro. N'estes termos e n'estas circumstancias eu faltaria á minha consciencia se deixasse de apresentar á camara, não digo um discurso, mas uma serie de considerações que explicassem as minhas duvidas, e que manifestassem os receios que tenho das difficuldades que um tal projecto póde originar em prejuizo da fazenda publica.

Tenho receio d'isto. Entendo que a melhor cousa a fazer seria executar a lei actual, que manda pôr em vigor a régie, emquanto um inquerito, que tenho a honra de propor á camara, e cuja proposta vou mandar para a mesa, não tiver illustrado os poderes publicos, a fim de que se possa resolver convenientemente, e com inteiro conhecimento de causa, este importante assumpto.

Receio que o tempo seja escasso para se vencerem as difficuldades de um projecto de tão vasto alcance, que tem tantos artigos, e que a proposito de cada um d'elles se podem levantar tantas duvidas; e receio isto muito mais quando vejo que estamos no fim de março, que em 1 de maio acaba o praso legal, e que este projecto, alem de ser discutido na especialidade, tem ainda de passar para a outra camara, aonde não póde deixar de levar tambem bastante tampo a sua discussão.

Receio que, sendo isto assim, nós tenhamos de ver que se recorre ainda mais uma vez ao peior de todos os systemas, ao systema da arrematação, ao systema que foi fulminado pelo governo no seu relatorio e pela commissão no seu parecer. Oxalá que não seja este o resultado a que nos hão de levar todas as difficuldades inherentes á resolução d'este negocio, apresentado tão tardiamente, e a respeito do qual se torna quasi impossivel tomar uma decisão conveniente e acertada.

Se assim for, a prophecia, a que se referiu o meu illustre amigo, ha de ser cumprida. Se assim for, será mais um desengano para todos nós; assim como será um desengano para muitos se este projecto, defendido aqui tão calorosamente e declarado ministerial, não ficar a coberto dos vaivéns da sorte, das inconstancias da fortuna, e for naufragar na outra casa do parlamento.

Tenho a honra de mandar para a mesa a minha proposta.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)

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