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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nado do escrivão interprete da estacão de saude de Setubal.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 26 de fevereiro de 1875. = Antonio Maria Barreiros Arrobas.

Projecto de lei n.º 65

Senhores. — A vossa commissão do legislação penal examinou com attenção o projecto de lei, apresentado na sessão do 21 de março do 1877, pelo sr. deputado Pinheiro Chagas, assignado por elle e pelos srs. deputados Carlos Testa, Paula Medeiros, Ferraz e Mariano de Carvalho, que tem por fim qualificar como crimes os maus tratos para com os animaes, em rasão do caracter de crueldade de que sejam revestidos e independentemente da rasão de offensas ou damnos á propriedade, e comminar penas contra aquelles que os commetterem; assim como lhe foi presente a representação, que á camara dos senhores deputados dirigiu a sociedade protectora dos animaes em Lisboa, com data de 15 do mesmo mez e anno, em que instantemente solicita, que seja confeccionada uma lei destinada a cohibir e corrigir os actos de crueldade praticados contra os animaes.

O bem elaborado e brilhante relatorio, que precede aquelle projecto de lei, explica sufficientemente o generoso, moral e sympathico pensamento, que guiou os seus illustres signatarios, e bem assim os benemeritos directores da sociedade protectora dos animaes em Lisboa, pensamento que a vossa commissão de legislação penal do melhor grado perfilha e adopta, porque o reputa firmado em sentimentos eminentemente humanitarios e civilisadores.

Julga por isso a vossa commissão, que esse pensamento é digno de ser traduzido em lei do paiz, tanto mais que será assim preenchida uma lacuna que existe na nossa legislação penal, sanccionando-se o preceito da protecção devida aos animaes, gravado no coração do homem, cuja inobservancia revela sempre perversão de costumes e instinctos ruins, contrarios á moral e á religião.

Não desconhece todavia a vossa commissão, que o assumpto offerece difficuldades de execução, que convem prevenir, para que não sejam desconsiderados e feridos interesses e direitos reconhecidos por lei e consagrados pelo uso.

No intuito, pois, de remover essas difficuldades e tornar excquivel a lei que se pretende confeccionar, sem que seja preciso fazer depender a sua execução e interpretação de regulamentos do governo, a vossa commissão fez inserir e declarar expressamente no artigo 1.° do projecto de lei, que tem a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação, todos os elementos essencialmente constitutivos da incriminação que se quer estabelecer, cujo conjuncto lhe parece ser sufficiente para circumserever essa incriminação dentro dos seus justos limites, e salvaguardar os direitos que ao homem legitimamente competem sobre os animaes.

Outras alterações de menor importancia julgou conveniente fazer no projecto de lei original, que facilmente se justificam, e têem por fim tornar a lei mais clara, efficaz e harmonica com as disposições geraes do codigo penal, e com as especiaes do mesmo codigo sobre damnos causados em animaes alheios; assim como eliminou a materia do artigo 4.º, por entender que não tem cabimento em uma lei meramente penal, como é a de que se trata.

E, portanto, a vossa commissão de legislação penal, sem se alongar mais em considerações, que estão no animo e no coração de todos, e que por isso reputa desnecessarias, é de parecer que merece a vossa approvação o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° Serão punidos com a pena de multa, de 1$000 a 5$000 réis todos aquelles que voluntaria e publicamente maltratarem os animaes domesticos sem necessidade.

§ unico. No caso de reincidencia a pena será o maximo da multa, podendo aggravar-se com prisão de tres a quinze dias.

Art. 2.° As penas do artigo 1.º não serão applicadas quando os maus tratos para com os animaes importarem crime de damno, que deva ser punido em conformidade das disposições legaes em vigor.

§ unico. Nos crimes de damno voluntariamente causado em propriedade alheia semovente, os actos de crueldade contra os animaes, desnecessarios á consuminação d'esses crimes, serão sempre considerados circumstaiicias aggravantes, para o effeito de serem aggravadas as respectivas penas segundo as regras geraes.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de legislação penal, em 3 de abril de 1878. = Antonio Cardoso Avelino = Carlos Vieira da Motta = Manuel Maria de Mello Simas = Visconde de Moreira de Rey = Jacinto Perdigão = Francisco Antonio Pinheiro da Fonseca Osorio, relator.

N.° 67-A

Senhores. — O progresso da civilisação moral, da civilisaçâo christã, tem trazido comsigo a brandura dos costumes, e procura em toda a parte apagar aquelles restos de ferocidade que sobrevivem no fundo da alma humana ás epochas barbaras que felizmente já vão longe. Tem sido longa essa evolução e ainda não chegou ao seu termo. O amor dos nossos similhantes, que é o fundo da doutrina de Jesus, só a pouco e pouco se tem ido infiltrando nos costumes e na legislação.

A pouco e pouco se foram apagando dos codigos penaes a tortura, as asperas punições physicas, e a pena de morte, já hoje proscripta da nossa legislação civil, macula ainda as paginas de um grande numero de codigos das nações civilisadas. Não admira, pois, que a caridade para com as especies inferiores, que existe instinctivamente em todas as almas bem formadas, não conseguisse ainda nem generalisar-se nos costumes, nem implantar-se nas leis. Ha comtudo actualmente em toda a Europa um grande movimento n'esse sentido. Formam-se sociedades que têem por fim exclusivo a protecção dos animaes, impõe-se á opinião, que sempre está primeiro disposta a recebel-as com ironico sorriso, e a final têem conseguido introduzir nas diversas legislações o principio do respeito da vida, não só restrictamente da vida humana, mas da vida de todos os entes, que a receberam, como nós, das mãos de Deus, que têem direito tambem ao seu logar ao sol, que não brilha exclusivamente para a especie humana, como se pensava nas epochas remotas, em que o orgulho da nossa raça fazia suppor que a terra, um dos infimos planetas, era o centro do universo, e que a existencia do homem, o seu bem estar, a sua felicidade, era o fim unico e exclusivo da creação.

As sociedades protectoras dos animaes são acolhidas no principio com um sorriso, porque a opinião publica suppõe sempre que ellas, desprezando o senso pratico, e comprazendo-se em sonhos de verdadeiros brahmanes, querem conduzir a humanidade ao regimen alimenlicio dos ascetas, ou querem desconhecer este principio indeclinavel da luta pela existencia, que leva o homem fatalmente a matar para viver. Conhece depois a opinião quanto errou nos seus juizos. O homem é obrigado a sacrificar á sua alimentação, a escravisar no seu serviço, a exterminar em proveito do seu bem estar milhões de entes vivos. As sociedades protectoras dos animaes não pensam nem por sombras em oppor-se a uma necessidade imperiosa, querem apenas banir todas as crueldades inuteis, circumserever nos justos limites esse exterminio indispensavel á existencia physica e social do homem. E, procedendo assim, ainda tem mais em vista a civilisaçâo humana, do que o zêlo pelas especies inferiores. Proscrevendo e punindo a crueldade com os animaes, perseguem no fundo da alma do homem essa fera que ali se aninha, que, desperta á mais leve excitação, e que conduz ao crime, combate esse elemento de bestialidade que palpita nos recessos mais obscuros do espirito humano, n'essa região tenebrosa onde, segundo a phrase brilhante de Victor Hugo, se podia inscrever como nas velhas car-

Sessão de 10 de abril de 1878