SESSÃO NOCTURNA N.º 62 DE 9 DE MAIO DE 1898
adiaveis do thesoure, e, ou estão seis deputados d´este lado da camara, ou estão doze d´aquelle lado n´uma cavaqueira alegre. (Apoiados.)
Eu não me arrogo o direito de fazer censura a ninguem; os illustres deputados podem fazer o que quizerem, mas lamento que a indifferença pela causa publica, o abandono, pelo nosso futuro vá até um tão grande extremo. (Apoiados.)
Eu não quero, a proposito das emendas do orçamento, fazer um discurso politico, e digo discurso, porque temos o costume, quando se falla n´esta camara, de dizer que se faz um discurso; e eu não tenho essa pretensão porque me faltam qualidades intellectuaes e a palavra; (Não apoiados.) mas se eu tivesse publico, que me ouvisse, e uma camara que me desse a honra de escutar as minhas palavras, eu diria que por mais que phantasiemos uma desgraça para o nosso paiz, ficâmos abaixo da perspectiva dolorosa que diante de nós está. (Apoiados.)
Conversamos alegres aqui em animada cavaqueira, rimo-nos por vezes de um argumento mais ou menos acalorado, que se apoda de sair de uma alma desconsolada; diz-se isto com certo ar de tristeza, mas no fundo ha um certo ar de troça. E comtudo se v. exa. conversar um a um com os membros que compõem esta camara, todos elles lhe dirão que nunca Portugal esteve tão proximo de um abysmo, como está hoje. (Apoiados.)
Não se póde dizer tudo quanto se sente; eu sei quanto devo ás conveniencias parlamentares e sobretudo ás conveniencias do paiz.
Não se póde dizer tudo; mas se eu podesse, diria a v. exa. que é preciso que haja um optimismo doentio para não nos convencermos de que em virtude de erros de ha muitos annos accumulados, estamos á beira de uma desgraça nacional, e quem sabe até onde ella poderá chegar! (Apoiados.)
E é n´estas circumstancias que nós arrostâmos com toda a casta de antipathias apresentando propostas de redacção de despeza, e que a maioria da camara, de accordo com o governo, as trata com tão grande desdem, que não tem uma palavra para as rejeitar, uma palavra para dizer a rasão porque o governo as não acceita. (Apoiados.)
Podia dizer-se: não ha grande necessidade disto; a reducção de despezas representa sempre sacrificio, quer seja reduzindo os melhoramentos materiaes de que o paiz carece, quer seja reduzindo gratificações mais ou menos illegaes a determinados funccionarios publicos. Não ha duvida nenhuma de que tudo isto representa sacrificio; que não ha necessidade nenhuma de exigir, visto que graças aos processos orçamentologicos do governo e da commissão do orçamento, este accusa um saldo de 1:905 contos de réis.
Não ha ninguem de boa fé que se convença de que o orçamento está saldado. (Apoiados.)
Póde dizer-se que reduzimos as despezas publicas; não é verdade. (Apoiados.)
Podem fazer essa affirmação por todas as fórmas e feitios; não é verdade. (Apoiados.)
É facil, facilimo n´este cantinho da Europa, n´este estreitissimo tracto de terreno saber quaes as despezas publicas que o governo reduziu; nenhumas. (Apoiados.)
A gerencia de 1896-1897 fechou com um deficit de 6:000 ou 7:000 contos de réis. Não tenha V. exa. duvida de que a de 1897-1898 fecha, com um deficit de 8:000 contos de réis; e que a de 1898-1899 ha de accusar um deficit enormissimamente crescido, visto que n´esta occasião o thesouro está comprando oiro, não já com o agio de 50 por cento mas de 77 e está a compral-o porque o governo se desfez de tudo quanto lhe podia dar oiro sem recorrer ao mercado.
Ainda ha poucos dias tentei demonstrar que o saldo que a commissão do orçamento pretendeu descobrir é de toda o ponto ficticio, não digo illusorio, porque nem a propria commissão se illudiu a este respeito.
Tenho ouvido dizer que lá fóra aquelles com que se pretende fazer alguma operação de credito exigem o orçamento equilibrado. Eu comprehendo que aquelles com quem nós desejâmos contratar tenham uma certa garantia de que o thesouro portuguez não gasta mais do que arrecada. Mas temos nós a pretensão de fazer convencer o estrangeiro, que conhece tão bem as nossas finanças como nós, que temos o orçamento equilibrado, e com saldo, quando elle accusa um enorme e consideravel deficit? (Apoiados.)
Lá fóra não se lêem jornaes, não se lêem os nossos discursos, não se estudam as nossas finanças? (Apoiados.)
Por ser portuguez não digo que lá fóra se estudam ás nossas finanças melhor do que nós as estudamos. É uma illusão convencer-nos de que do saldo ficticio do orçamento resulta qualquer vantagem para nós perante os nossos credores. É facil descobrir que onde ha um saldo de 1:900 contos de réis, ha, pelo menos, um deficit de 3:000 e tantos contos de réis.
Ha poucos dias, ante-hontem, creio eu, fiz a demonstração de que era absolutamente necessario incluir na tabella da despeza 100 contos de réis para material para laboração das officinas do arsenal, 700 contos de réis para cobrir os deficits dos orçamentos das províncias ultramarinas e outros.
[Leu]
Eu ante hontem tive a pretensão de demonstrar a1 v. exa., que a verba de 600 contos de réis, descripta no orçamento da receita do ministerio das obras publicas para edificios publicos, ficava muito áquem da verba que se gastava em 1896-1897; e como no anno de 1897 o numero de operarios não tinha diminuido, concluia eu que a verba de 650 contos de réis para o anno de 1897-1898 ficava muito áquem da despeza effectiva com os operarios em Lisboa. Puz de parte a questão da compra dos materiaes, que é importantissima, assim como o que se gasta com operarios e material nos edifícios publicos no resto do paiz, e encontrava só para os operarios no districto de Lisboa 741 contos de réis!
E hoje, sr. presidente, não me surprehendi, nem espantei com uma noticia que vi n´um dos mais lidos jornaes de Lisboa, de que uma commissão de fornecedores tinha procurado o sr. ministro das obras publicas para lhe mandar pagar 380 contos de réis de fornecimento de materiaes para edificios publicos de Lisboa. E acrescentava n´essa noticia, com todos os visos de verdadeira, e a esse respeito não me fica duvida nenhuma, que o sr. ministro das obras publicas, reconhecendo a legitimidade da reclamação, recommendára a commissão ao sr. ministro da fazenda.
Oh! Sr. presidente, pois então gastámos 741 contos de réis com salarios, devem-se 380 contos de réis, o que vae pouco mais ou menos a 1:100 contos de réis e v. exa. quer que seja necessario que se mantenha no orçamento a verba de 650 contos de réis!
Noto a v. exa., que previno já a resposta, se tiver a ventura de qualquer sr. deputado d´aquelle lado da camara me responder. Podem-me dizer de lá: mas o senhor propoz a reducção da verba destinada a operarios!
Propuz, sr. presidente, e propuz porque eu n´esse ponto de vista, penso inteira e absolutamente de maneira, diversa da que pensa o governo. Se vingassem os meus princípios, se vingassem as minhas idéas e opiniões ácerca dos operarios em Lisboa, a verba de 325 contos de réis era mais do que sufficiente; mas o governo entende, que esse systema não é o mais consentaneo com os interesses publicos - mantem-se no regimen em que temos vivido ha tres ou quatro annos - julga que é de uma extrema felicidade para o paiz fazer, e desfazer obras sem nenhuma necessidade reconhecida; desde que mantem operarios e