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iguaes direitos, e por consequencia não podia ter em menos conta o pedido do illustre deputado, por quem tenho a maior consideração.

As rasões por que não me apressei a vir dar as explicações pedidas, foram primeiro porque não tinha n'aquelles primeiros dias todas as informações necessarias para satisfazer o illustre deputado, e depois porque sabia que o facto de que tratava a interpellação referia-se á prisão de dois dos maiores contribuintes; como o facto foi desmentido e se verificou não ser exacto, julguei que a interpellação tinha perdido a importancia.

Agora passo a responder aos factos que o illustre deputado referiu. Eu, sem denegar a sua importancia e gravidade, não posso considerar o administrador do concelho tão culpado como o illustre deputado o julgou. O procedimento deste funccionario foi na realidade irregular; no entanto as suas intenções, pelas informações que até hoje tenho colhido, não me parece que possam ser classificadas de tão parciaes e de tão criminosas como o illustre deputado as julgou; porque, segundo o que elle respondeu e o governador civil informou, consta que foi justamente para obstar a manejos e a influencias de individuos da mesma localidade, a fim de encaminhar a eleição n'um certo sentido que o administrador assim procedeu: ou, por outra, o administrador teve em vista estabelecer a liberdade dos quarenta maiores contribuintes, e procedeu de uma maneira que confesso ser um pouco irregular e reprehensivel (apoiados); mas parece-me que estas foram as suas intenções, e elle explica até certo ponto as intimações que fez aquelles dos quarenta maiores contribuintes para virem á casa da administração.

Pretende elle, que o que diz respeito a um d'elles tinha sido intimidado; porque os individuos, a quem já me referi, queriam encaminhar a eleição n'um certo sentido, e tinham sido intimados por elle para tratarem d'ella no sentido que elle desejava. Tinha até asseverado o administrador, que este individuo tinha sido retido por algumas horas n'uma certa localidade, causando este facto grandes apprehensões a sua familia, entre outros a um filho que andava á procura onde o pae estava, e foi ter com o administrador; porém o administrador sabendo que elle estava na sala, foi por este motivo que o mandou chamar para o mostrar ao filho, que se achava na sua presença. Isto foi o que se me disse. Ora, mas o governador civil, a quem pedi estreitas informações a este respeito, confessou que, pelo que diz o administrador e o presidente da camara, são por tal fórma contradictorios que elle não sabe de que lado está a verdade. Mandei submetter estas informações ao ajudante do procurador geral da corôa, e este magistrado foi de opinião que se procedesse a uma syndicancia sobre todos esses acontecimentos. Agora o que convem saber é que as cousas não tomaram uma feição tão medonha como informaram ao illustre deputado.

O sr. Thomás Ribeiro: — Peço perdão. Um jornal do Porto de hoje diz que todo aquelle concelho está n'um completo estado de anarchia.

O Orador: — Eu agora referi-me sómente aos factos succedidos no dia da eleição. Depois do dia em que a eleição foi interrompida, marcou-se um novo dia para a eleição e ella correu muito regularmente, tanto que os quarenta maiores contribuintes votaram unanimemente na mesma lista.

O sr. Thomás Ribeiro: — Mas não foi no dia 14 de janeiro que a eleição se fez definitivamente?

O Orador: — Eu já declarei que effectivamente a eleição foi interrompida em consequencia d'aquelles factos; lavrou-se d'isso a competente acta, á qual se referiu o illustre deputado: a assembléa declarou-se coacta por aquellas intimações do administrador, adiou se a eleição; mas quando ella se fez de novo, correu tão regularmente que os contribuintes que se reuniram votaram todos na mesma lista.

No relatorio que eu aqui tenho estão consignados alguns factos, de que será bom que a camara tome conhecimento, e para esse fim tomo a liberdade de o ler (leu).

Todas estas informações, como eu já disse, foram presentes ao ajudante do procurador geral da corôa, para elle as examinar e indicar a marcha que se deveria seguir. Foi de opinião que se procedesse a uma minuciosa syndicancia; eu assim o ordenei, e agora espero pelo resultado d'essa syndicancia.

Parece-me que tenho satisfeito ás perguntas que o illustre deputado me dirigiu, se bem não respondesse separadamente a cada uma das perguntas do illustre deputado e na mesma ordem em que me foram dirigidas.

O sr. Thomás Ribeiro: — Se quando eu entrei n'esta casa tivesse duvidas a respeito do irregular procedimento do administrador do concelho de Castello de Paiva, depois das explicações que me acaba de dar o nobre ministro do reino nenhuma me podia restar. O processo do administrador do concelho está nos documentos que s. ex.ª apresentou á camara. S. ex.ª não se atreveu, porque é muito cavalheiro para o fazer; não se atreveu, digo, a negar que o procedimento d'aquelle funccionario fosse muito irregular. Não negou que da sala fossem retirados alguns dos maiores contribuintes; negou que elles fossem presos, mas a acta d'essa sessão ainda não appareceu desmentida.

Nas informações que deram ao sr. ministro do reino de certo abusaram da sua boa fé. Pois como se pôde acreditar que todos os actos irregulares praticados pelo administrador do concelho foram para dar protecção a quem lh'a não pedia? (Apoiados.) De mais a mais dizendo se que esses individuos, a quem o administrador queria dar protecção, pertenciam á opposição! Mas, o que me levou mais ao convencimento dos fins para que o administrador tinha mandado retirar da sala um dos contribuintes, foi o dizer-se que =elle o tinha mandado retirar para o mostrar a um filho que o andava procurando afflicto! =

Ora, sr. presidente, nada ha tão inverosímil como esta engraçada historia! (Riso.) Se isto me fosse contado na minha aldeia, eu julgaria estar ouvindo um conto de fadas.

Declaro a v. ex.ª que não acredito que o sr. ministro do reino me dissesse isto com inteiro convencimento...

O Sr. Presidente do Conselho: — Eu disse o que me disseram; referi-me ás informações.

O Orador: — Eu faço inteira justiça á elevada intelligencia de s. ex.ª, mas comtudo...

O sr. Presidente do Conselho: — Note o illustre deputado que eu disse que o ajudante do procurador geral da corôa tinha achado aquellas informações tão contradictorias, que não podia julgar da verdade d'ellas.

O Orador: — Muito bem. Já se vê pois que os actos do administrador do concelho de Castello de Paiva, praticados na occasião da eleição da commissão de recenseamento, não têem justificação possivel (apoiados): o seu procedimento foi contra a lei e contra uma das mais caras liberdades do nosso paiz.

Quando eu comecei a fallar n'esta questão, disse que ella era apenas um symptoma da grave molestia que vae lavrando por toda a nação (muitos apoiados).

O systema que se apresentou nas ultimas eleições municipaes, foi apenas o ensaio geral de um grande drama que se preparava de certo para ser representado nas proximas futuras eleições de deputados. Como é costume, appareceu algum publico a ver esse ensaio geral, e esse publico insoffrido e indignado pateou estrepitosamente os papeis e os actores d'essa comedia (susurro e apoiados).

O governo tremeu, porque era empresário d'aquella companhia, e esperava auferir grandes lucros eleitoraes da representação do seu drama. Por consequencia o que tinha a fazer o governo para que lhe não caísse a sua obra por terra? A primeira cousa era conservar os actores, e isso era facil, porque os actores estavam escripturados e tinham vinculados na escriptura os seus interesses; a segunda porém era mais difficil contentar o paiz! Foi isso justamente o que o governo não pôde ainda conseguir.

O paiz tinha adoecido de uma molestia grave chamada indignação, com accessos intermittentes de desconfiança. Era difficil a cura. Sabe v. ex.ª qual foi o intuito do governo na presença d'esta molestia gravissima do paiz? Foi trata-la com paliativos. Senão vejam.

Que fez o governo desde que os primeiros symptomas se manifestaram graves e aterradores no districto de Villa Real? Era na cidade do Porto. Uma commissão composta de cavalheiros distinctissimos do districto de Villa Real foi ali para apresentar as suas queixas contra os abusos eleitoraes das auctoridades administrativas d'aquelle districto, solicitar uma audiencia de El-Rei. Pois logo então a resposta de Sua Magestade áquella commissão manifestava o pensamento do governo.

O sr. Luciano de Castro: — Se a questão de Villa Real está em discussão, peço a palavra.

O Orador: — Não está em discussão, nem eu agora a discuto; mas o medico que discute um symptoma pôde fallar da molestia (apoiados). A prova de que o mal é mais grave do que parece, é que a consciencia do sr. deputado está tão melindrosa e tão susceptivel que bastou uma menção casual para se mostrar aggravada e insoffrida (muitos apoiados). Eu fallo na questão geral, porque não posso fallar numa sem fallar na outra.

O governo disse, pela bôca de El-Rei, a esses cavalheiros, no Porto, que = Sua Magestade tinha os seus poderes constituidos, os quaes haviam de avaliar a questão =; isso equivalia a dizer que — Sua Magestade não tinha outra missão mais do que a de visitar os povos do seu reino =. Pois aconselharam mal a El Rei, inspirando-lhe uma inexactidão. Um rei, mesmo constitucional, pôde ao menos nomear os seus ministros, e por consequencia demitti-los (apoiados).

Á queixa da opposição, expulsa de ao pé de El-Rei, entrou n'esta casa, mas o systema dos paliativos entrou com ella; o governo propoz um adiamento para evitar a discussão; reina hoje ainda o mesmo systema; o governo, diz-nos, que mandou syndicar dos actos do administrador do concelho de Castello de Paiva, e são passados tres mezes depois d'aquelles acontecimentos! Aqui está a paridade, e aqui tem o illustre deputado que me interrompeu o motivo por que fallo na questão de Villa Real.

Apresentou-se por essa occasião a proposta do adiamento, mas a questão teimou em ficar, e ficou ainda em discussão n'esta casa; depois abafou se aqui e levantou-se na camara dos dignos pares; e deu-se por essa occasião o singular facto nos nossos annaes parlamentares de o ministerio aceitar n'uma das casas do parlamento aquillo que recusou aceitar na outra (apoiados).

Esta questão, desengane-se a camara e o governo, esta questão não é o capricho de um homem, como se disse por ahi; é o remorso de um partido! (Apoiados.)

O assassino pôde lavar das mãos o sangue da sua victima, mas não pôde nunca arrancar a mancha da sua consciencia (susurro).

Não trago isto como comparação, que fôra offensivo o argumento, e eu não desejo offender nenhum dos meus collegas; trago-o sómente como exemplo (susurro). Não têem de que se escandalisar os illustres deputados, especialmente depois de declarada a formula do meu argumento (apoiados).

Sr. presidente, é preciso que nós sejamos os mantenedores infatigáveis da pureza da uma e da liberdade eleitoral. Da prostituição da urna é consequencia fatal a bastardia dos eleitos (apoiados).

Por isso entendo que a primeira necessidade de um governo é abster-se por uma vez de intervir por fórma alguma nas eleições do seu paiz.

Se fosse deputado da maioria como sou da opposição, daria ao governo do meu paiz um conselho, e folgaria bem que m'o recebesse, era que por uma vez se abstivesse de se fazer corretor de eleições municipaes ou geraes...

(Interrupção que se não percebeu.)

O Orador: — Isso nunca se fez em Portugal, bem o sei, mas quereria que se fizesse. A causa publica, o nome o está dizendo, não é o apanagio de meia duzia de homens que se sentam nas cadeiras do poder hoje, ou de meia duzia de homens que se poderão sentar ámanhã; por muito que os considere e respeite, e considero e respeito, parecem-me sempre pequenos e insignificantes quando os contemplo em presença do paiz. Se a questão é da nação, a nação que a discuta e a julgue; deixe-se o governo de intervir em questões que são propriamente d'ella.

Nós fallamos aqui, n'este paiz, aonde realmente ha liberdade geralmente fallando, e que é lá fôra considerado por um dos paizes mais livres e mais liberaes da Europa, e todas as vezes que n'esta casa se quer apresentar exemplo de uma nação atrazada em politica, vem sempre á téla da discussão os estados pontificios ou a nossa vizinha Hespanha. Não vem fôra de proposito dizer a v. ex.ª e á camara, o que ella de certo sabe; mas que não sabe todo o paiz, e vem a ser que n'essa Hespanha, que nós considerámos uma nação muito atrazada, se está discutindo e votando uma lei, que tem por fim reprimir os abusos das auctoridades em actos eleitoraes. Vou ler a v. ex.ª um artigo desse projecto que lá se está discutindo, que se fosse em uma lei nossa teria inteira applicação ao actual administrador do concelho de Paiva (leu.)

(Interrupção que não se percebeu.)

Vozes: — Já temos isso e mais.

(Susurro.)

O Orador: — Temos muito bons principios e excellente doutrina, a duvida está na pratica (muitos apoiados); mas deixem-me ao menos concluir o meu raciocinio. Se nós já temos isso e temos mais, qual é a rasão por que o governo com os documentos que tem presentes, e sabendo que aquelle funccionario é pernicioso n'aquella terra; dizendo mesmo que, pelas informações que tem, os odios são pessoaes e não politicos, deixou passar tres mezes e ha só um mez que s. ex.ª fez mandar proceder a syndicancia? E a syndicancia de Villa Real (apoiados). Mas lá estão para responder ás syndicancias os meetings da capital do districto que todos os dias se repetem, os assassinatos de Murça e de Alijó; lá estão respondendo...

(Susurro.)

O Orador: — Isto são os factos de todos os dias.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Deixem desabafar.

O Orador: — Diz o nobre deputado que deixem desabafar, effectivamente é preciso o desabafo (apoiados); ss. ex.ª estão todos os dias a pregar que são tão largamente progressistas e não querem que o progresso seja uma realidade? (Apoiados.) Não se escandalisem com tão pouco.

Vozes: —Não.

O Orador: — Escandalisem-se com os factos e não com a verdade, e com quem a vem apresentar (apoiados.) (Interrupção.)

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Como as eleições de 1859.

O Orador: — Eu não sou das eleições de 1859. Entrei na vida publica depois de 1859, e não tenho que responder por acto algum senão depois de ter entrado n'esta casa. E por esses que eu respondo.

Termino mandando para a mesa uma moção de ordem. Creio que a camara está disposta a absolver todos os peccados mortaes e veniaes...

(Susurro.)

Não me parece que eu seja tão imprudente que entre aqui com intuitos de offender qualquer dos meus collegas. As pouquissimas vezes que tenho fallado nesta casa tenho-o feito tão respeitosamente para com todos, que não me parece que haja motivo hoje para me receberem tão adversos (apoiados), pois se isto é assim porque os vejo tão impacientes, e sem quererem deixar-me concluir o meu pensamento, para só me pedirem contas depois de o terem ouvido inteiro?

(Interrupção que não se ouviu.)

O Orador: — Eu disse já uma vez que esse argumento era adduzido como exemplo e não como comparação; já vê o illustre deputado que não ha offensa no que eu disse (muitos apoiados).

A minha moção é a seguinte:

«A camara, tendo ouvido as explicações do nobre ministro do reino ácerca do procedimento da auctoridade administrativa do concelho de Castello de Paiva, no districto de Aveiro, e lamentando que similhantes desvios dos principios liberaes se estejam repetindo n'este paiz, pede ao governo que dê toda a possivel attenção á salva guarda das doutrinas e praticas liberaes, e passa á ordem do dia.»

Uma voz: — Vamos a tratar do tabaco.

O Orador: — Ha pressa do tabaco? A lei do tabaco pôde ser uma grande medida, mas não é de certo mais liberal do que esta pequena moção, que tenho a honra de apresentar á camara, e de que um illustre deputado se está rindo. Eu sei a rasão por que o illustre deputado se ri. E porque está certo na sua consciencia de que é um homem muito liberal (O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Apoiado, apoiado.); mas não se importa nada com que as auctoridades do governo lá por fóra estejam a desmentir as doutrinas que s. ex.ª professa (apoiados).

Por consequencia ria-se o illustre deputado muito embora, mas olhe que o paiz recebe os seus risos n'esta casa antes como uma provocação, do que como uma fiança dos seus destinos (muitos apoiados).

Leu-se na mesa a seguinte: