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O que é pois a prohibição do tabaco na Irlanda? O que significa ella? Não significa nada d'aquillo que a commissão, e o governo querem que signifique.

Mas dir-se-ha, e com isto vou terminar as poucas e mal alinhavadas palavras que tinha a apresentar, dir-se-ha, se a cultura do tabaco foi prohibida na Irlanda, por isso que á sombra de uma producção mesquinha se fazia um contrabando espantoso, como não deveremos temer que esse mesmo contrabando venha a fazer-se em Portugal? Direi desde já que a objecção está prevenida de antemão nas minhas considerações que tenho apresentado á camara. O contrabando faz-se ordinariamente quando a materia contrabandeada se não póde dar no paiz aonde se faz o contrabando por um preço inferior aquelle d'onde vem o contrabando. Isto é natural, é o incentivo do contrabando, e incentivo tanto maior quanto menor é o preço da materia do contrabando, e maior o imposto com que está sobrecarregada a materia sujeita á venda legal.

Mas pelas considerações que fiz estou convencido que o tabaco portuguez, o tabaco produzido em Portugal, fica ao productor por 20 por cento menos que o tabaco estrangeiro. E sendo assim como se póde receiar o contrabando? Como é possivel temer-se o contrabando de uma materia que cultivada no paiz sáe por um preço muito inferior á que póde vir de fóra? É impossivel. Mas vem outra objecção e é a seguinte. Faz se o contrabando da materia manufacturada. Entre os differentes productos que sáem das fabricas de tabaco, o charuto é de uma fabricação tão simples e singela, que effectivamente em todas as terras aonde se produzisse o tabaco se podia fazer essa pequena manufactura e inundar-se o mercado d'esse contrabando, prejudicando assim de uma maneira espantosa as rendas do estado.

A isto direi em primeiro logar, que á barateza por que o tabaco se me afigura que póde crear-se em Portugal, admittida a sua cultura, é tal, que estou persuadido que o contrabando não seja convidado a fazer-se. Mas ainda ha outra consideração a fazer.

A fiscalisação que o governo por esta lei tem de exercer, ha de ser exercida nas alfandegas e portos de mar por onde póde entrar o tabaco exotico, nas fabricas com relação aos differentes fabricos e na venda dos estancos; por consequencia não me parece difficil conhecer o charuto que é feito n'essas fabricas e o que é n'ellas introduzido e nos estancos por contrabando; em a fiscalisação sendo efficaz, o contrabando não ha de ser muito facil, e quanto ao contrabando que tiver de se fazer nas granjas onde se cultivar o tabaco, desse não tenho eu medo; é insignificantissimo.

Por consequencia não ha rasão nenhuma plausivel pela qual se possa suppor que effectivamente este methodo que proponho, ou a liberdade de cultura que proponho possa prejudicar as vistas que o governo teve na factura do seu projecto, primeiramente a liberdade, se assim se póde chamar, e em segundo logar o auferir a favor do fisco uma renda igual á que percebia pelo contrato do tabaco arrematado.

Em ultimo logar e terminando digo, que senti profundamente, porque poetas de parte todas as considerações politicas que me afastam do actual gabinete, tenho a honra de ser amigo pessoal de alguns dos srs. ministros, desejava vê-los sempre n'uma posição onde não podessem nem ligeiramente ser arguidos, digo que senti profundamente que o sr. ministro não procedesse de outro modo.

Desejava muito mais, e a camara terá visto que não sou dos mais prodigos com a receita do estado, mas desejava muito mais que o governo e a situação actual, collocada debaixo da égide de um grande principio, do principio da liberdade, se tivesse provido com os meios que julgasse indispensaveis para fazer face a um tal ou qual prejuizo que podesse haver nos primeiros annos da passagem do monopolio para a liberdade, porque se nos primeiros tempos esse prejuizo se podesse dar elle havia de ser depois largamente resarcido (apoiados).

Leigo como sou nas sciencias economicas, julgava que estes principios economicos, esta idéa de liberdade de commercio, não era um sonho, uma ficção, uma imaginação que se tinha creado para seduzir a credulidade publica, que estes grandes principios economicos eram um aphorismo que resultava de longas experiencias e aturados estudos. Pois a liberdade do commercio e todas as industrias será uma simples palavra, uma palavra magica com que nos queiram seduzir, ou é o resultado de grande numero de factos, e um aphorismo, resultado de longos estudos? Quem invoca a liberdade do commercio, a primeira cousa que tem a demonstrar é que d'ella auferem todas as industrias maiores beneficiou do que o que lhes resulta da restricção.

Se pois isto assim é, que medo ha da parte do gabinete e das commissões em darem o seu assentimento a este principio?

E não se diga que eu quero a liberdade até ao communismo, não a quero; quero a liberdade até ao ponto que merece o nome de liberdade, e não ficando no ponto em que a collocou o governo, que póde ser tudo menos liberdade (apoiados).

Repito portanto, se o governo abraçasse antes os verdadeiros principios da liberdade, estou intimamente convencido que havia de resarcir consideravelmente em muito pouco tempo e de uma maneira espantosa todos os sacrificios que se fizessem nos primeiros annos da transição do monopolio para a mesma liberdade, e então se o governo nos tivesse dito com franqueza que esse deficit nas receitas publicas, podendo ser calculado por mais ou por menos, e se habilitasse para cobrir esse deficit com uma certa quantia, fazendo-nos ver, sem grande esforço de demonstrações, que passados alguns annos, esse deficit devia ser exuberantemente coberto pelo augmento da renda, por effeito da liberdade, nós não tinhamos a fazer senão um pequeno adiantamento. Este argumento está-se produzindo todos os dias a respeito da despeza com a viação publica e, caminhos de ferro, e se nesta occasião s. ex.ª se tivesse tambem lembrado d'elle, lhe daria logar a apresentar um projecto mais significativo do que este, e que ficava de certo a coberto de todas as invectivas de qualquer opposição que se podesse fazer. Estes são os meus votos. A materia da generalidade está vencida, conseguintemente serão baldados todos os esforços que fizesse n'este sentido; mas não são baldados todos os esforços que possa fazer para que do projecto sáiam todas as disposições de repressão, que até certo ponto aniquilam o principio da liberdade inaugurada no artigo 1.°

Liberdade! Quem a não quer, quem a não deseja? O governo e o parlamento approvam um systema de liberdade para o tabaco, tambem eu o approvo. E eu que tenho uma pequena propriedade, direi que tenho mais uma industria agricola á minha disposição. Vou tenta-la, o vou ver se sou mais feliz com ella, do que com outra cultura que a Providencia tem desgraçadamente inutilisado ha annos a esta parte no nosso paiz!

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Peço a palavra para um requerimento, que tem por fim prorogar-se a sessão até se votarem os artigos.

O Orador: — Vencido o artigo 3.° fica o privilegio simplesmente para algumas localidades; e eu não poderei agricultar a minha terra; mas poderei fazer uma fabrica. Eu que junto á minha casa tenho ahi um motor inanimado, uma ribeira caudalosa, que tenho um certo capital que posso dispensar, fundarei portanto uma fabrica de tabaco já que a industria agricola me é vedada... Mas nem isso, porque a lei diz: «Vos não podeis fazer uma fabrica na vossa localidade porque não é aquella aonde a lei exclusivamente as consente, que é Lisboa e o Porto!» Lisboa e Porto? Nem Lisboa nem Porto. E n'esta parte chamo a attenção do sr. ministro da fazenda, não porque isto embarace o governo, que com uma simples portaria destroe toda essa antinomia legislativa; mas a actual proposta de lei o que revela é menos reflexão da parte de quem a confeccionou, da parte de quem a estudou e a referendou.

Ainda ha pouco, sob esta administração, passou a lei de 21 de outubro de 1863, referendada pelo sr. Anselmo José Braamcamp. Sabe a camara o que essa lei diz? Repartiu as industrias em tres classes, e diz que a industria do tabaco é classificada na segunda, isso quiz dizer, perigosa e incommoda, não poderá ser permittida senão longe do povoado.

Quando um fabricante vier pedir ao governo licença para estabelecer a sua fabrica, se a quizer estabelecer em Lisboa, diz lhe a lei que não o póde fazer, porque o conselho de saude, que vela pela saude publica, ordenará que vá para longe do povoado. Sáe da circumvallação, e vem as camaras dos Olivaes e Belem, e dizem-lhe: «Não podemos permitte as fabricas, porque esta lei que discutimos, diz que só as poderá haver em Lisboa e Porto.» Aonde fica a fabrica? A fabrica ha de ficar, as fabricas hão de existir; e mais uma vez o governo se verá na necessidade de por uma portaria inutilisar as disposições de uma d'estas leis! Qual ella seja s. ex.ª saberá melhor do que eu. Mas finalmente não poderei cultivar o tabaco, não poderei fabricar tabaco, mas poderei comprar tabaco, e usar d'elle livremente por todo o paiz? Cautela, se muito junto da raia se me apprehenderem com 41 grammas de tabaco fabricado, é necessario provar primeiro que não sou cumplice do desvio da fazenda publica, aliás teria de soffrer uma pena de prisão, que póde passar de tres mezes. Aqui tem a camara e sobretudo o paiz, a liberdade dó commercio inaugurada n'este projecto. Eu venho portanto hoje com relação a este artigo 3.°, ver se posso fazer com que este monstro horaciano fique um pouco menos disforme do que está. Mando para a mesa a minha proposta. (Apoiados. — -Vozes: Muito bem).

O Orador foi comprimentado por deputados de todos os lados da camara.

A proposta é a seguinte:

PROPOSTA

É livre a cultura do tabaco em todo o reino. = Beirão.

Foi admittida.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que se prorogue a sessão até que se vote esta materia.

Consultada a camara, decidiu afirmativamente.

O sr. Paula Medeiros: — A substituição que envio para a mesa combina e reune duas condições essenciaes, que se devem ter em vista na confecção d'este artigo, pois que n'ella, emquanto se asseguram para o estado os 70:000$000 réis em que é computado o rendimento do tabaco nas ilhas adjacentes, se dá a mais ampla liberdade para a cultura do tabaco, isentando-a de toda a sorte de tributos, unico meio efficaz de proteger aquella nova e desconhecida industria agricola.

Os cinco annos que eu consigno para que a cultura do tabaco deixe de pagar impostos, é o lapso de tempo que me pareceu indispensavel para, em larga escala, se poderem ensaiar todas as experiencias que se exigem para o seu aperfeiçoamento; e a fim de se dar nos quatro districtos um equitativo e proporcionado rateio dos 70:000$000 réis, fui buscar, como ponto de partida para a sua distribuição, o numero de fogos que cada um contém.

Mais considerações deveria adduzir para motivar esta substituição; a hora porém já deu, foi até com difficuldade que tomei a palavra, e eu não quero, nem devo abusar da benevolencia da camara; reservo-me comtudo para fallar a este respeito em occasião opportuna.

Leu-se na mesa a seguinte proposta.

SUBSTITUIÇÃO AO ARTIGO 4.º

Por espaço de cinco annos é livre e isenta de qualquer imposto a cultura e fabrico do tabaco nos districtos dos Açores e Madeira.

§ 1.° O tabaco importado do estrangeiro para aquellas ilhas ficará sujeito a um direito igual ao do continente.

§ 2.° Os 70:000$000 réis em que é computado o actual rendimento liquido do tabaco nas mencionadas ilhas, serão tirados dos direitos de importação, e bem assim do imposto sobre as licenças dos estabelecimentos de venda do dito genero.

§ 3.° O que porventura faltar para preencher aquella cifra, será lançada como addicionaes pelas contribuições directas.

§ 4.° Servirá de base para o rateio dos 70:000$000 réis nos quatro districtos, o numero de fogos que cada um contém.

§ 5.° Todo o tabaco produzido nas mesmas ilhas ficará livre de direitos de exportação durante os ditos cinco annos.

§ 6.° Todos os instrumentos e machinas importadas para a cultura e fabrico do tabaco, durante o dito periodo de tempo não pagarão direitos. = O deputado, Henrique Ferreira de Paula Medeiros.

Foi admittida.

O sr. Arrobas (para um requerimento): — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida.

O sr. Ministro da Fazenda (sobre o modo de propor): — Ainda agora disse e repito, que me parece que se póde votar este artigo e seu § unico, sem prejudicar as propostas que foram apresentadas á camara, e sem prejudicar a continuação da discussão d'este projecto. Pedia pois a v. ex.ª que pozesse á votação o principio, que é a liberdade da cultura nas ilhas, e em seguida se votasse o § unico, ficando reservado o modo de auferir o imposto que deve substituir o actual rendimento do contrato do tabaco, quando a commissão de fazenda der o seu parecer sobre as diversas propostas que lhe forem enviadas.

Posta á votação a proposta do sr. Sant'Anna foi approvada, e em seguida igualmente o artigo 3.º

Foi tambem approvado o artigo 4.º no sentido da proposta do sr. Sant'Anna e Vasconcellos.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que vinha para hoje, e mais o projecto n.° 73 de 1862.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.