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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Annunciei uma interpellação ao sr. ministro do reino, e s. ex.ª respondeu-me que era conveniente que os papeis não viessem, para que eu, deputado da opposição, continuasse a ter motivos de aggressão ao governo!

Esta declaração categorica de que o governo não mandava, depois de muitos annos, os papeis, sobre um assumpto tão grave, mostra o respeito e consideração que o governo regenerador tem, ha algum tempo, não só pelas leis constitucionaes do paiz, mas pelos direitos dos senhores deputados.

Não me admira, pois, agora que, tendo eu pedido aqui ha mais de um mez e com urgencia, os documentos necessarios para verificar uma interpellação sobre acontecimentos passados no concelho da Certa e em outros, acontecimentos tambem importantes, acontecimentos que implicavam tambem a violação dos direitos dos cidadãos; o governo fizesse, como costuma, pouco caso, e não mandasse esses documentos.

Eu não posso attribuir senão á falta de vontade que ha de que se esclareçam aqui estes assumptos, o modo porque o governo tem procedido n'este caso. Não posso deixar de attribuir a esse fundamento o facto de não terem vindo os documentos, porque, faltando eu com o sr. ministro da fazenda, pedi a s. ex.ª que, se não podia mandar as copias, como eu desejava, por levarem muito tempo a fazer, remeti esse ao menos os originaes, o eu com velos na camara me contentaria.

Não vieram, porém, nem copias nem originaes, e o que eu concluo d'aqui é que o governo não quer que se verifique a interpellação, assim como não quiz que se verificasse a interpellação relativa ás violencias praticadas no Sabugal e em Penamacor.

Tudo isto é coherente, porque este procedimento do governo não tem sido só commigo, tem sido com todos os deputados que tambem tem pedido documentos, para depois o inlerpellarem.

Ali está por exemplo o sr. Paula Medeiros, que por quatro vezes pediu documentos para fazer uma interpellação sobre o assumpto importantissimo do pagamento de gratificações a empregados que andam a passear, sem poder obter esses documentos.

O sr. Paula Medeiros: — Isso é uma verdade.

O Orador: — A final, convencido de que elles não vinham, v. ex.ª fez uma declaração no Diario da camara para que ella apreciasse, como entendesse, o desprezo que o governo tem pelas reclamações dos srs. deputados.

Isto não e portanto um caso novo, e eu não o estranho.

Torno a dizei o governo não quer que a minha interpellação se fica. Não se fará, pois. Mas ao menos, visto que não posso fazer a interpellação, faço a declaração do que não a posso realisar, porque me não dão as provas necessarias para isso; e narrarei á camara os factos sobre que ella se basearia. Sirvam os documentos então para o governo vir aqui, se lhe acordarem esses brios, contestar o que vou dizer: invertam-so os papeis.

Porém, sr. presidente, antes de, entrar no assumpto, antes de dizer a v. ex.ª e á camara quaes foram as violencias praticadas ultimamente no districto de Castello Branco, não posso deixar de fazer uma rapida comparação entre o procedimento do partido regenerador, quando está no governo; e o procedimento do mesmo partido, quando o opposição.

No principio d'este anno o partido regenerador, sendo opposição, annunciava duzias de interpellações; pedia carradas de documentos para se realisarem essas interpellações; exigia que elles viessem em poucos dias: quando não vinham os documentos, immediatamente erguia o collo e levantava a voz altivamente.

Censuro profundamente que um partido, que ha meia duzia de dias ainda procedia d'esta fórma, quando estava fóra do poder; mude de tal maneira o seu procedimento agora, quando está no governo. Lastimo do coração que um partido do meu paiz se esqueça tão depressa da coherencia que deve á propria dignidade!

Se quando estavam na opposição. se reconheciam direitos e queriam para si garantias na sua qualidade de vencidos; nós agora, tambem na opposição, e tendo-os na nossa frente vencedores, não teremos os mesmos direitos, não poderemos exegir as mesmas garantias? As attenções que pretendiam hontem do governo de então; não se devem igualmente a nós, quando as reclamamos do governo de hoje?

Mas, pondo de parte tudo isto, limifar-me-hei agora a referir em poucas palavras os factos que eu desejaria que fizessem o objecto de uma interpellação, mas que já vejo que o não poderão fazer.

Mencionarei em primeiro logar attentados, contra a segurança e contra a dignidade das pessoas no concelho da Certã.

Como v. ex.ª sabe, hoje o governador civil do districto de Castello Branco é oriundo da Certã. Parece que a Certã tem um enorme orgulho por ter dado nascimento a um conterraneo que soube elevar-se por duas vezes a tão excelço cargo, e entendeu comemorar a ultima ascençâo ao poder do seu filho dilecto com grandes vivorios e descantes. Tudo isto até aqui se me affigura de uma alegria, que não fazia mal senão a alguns ouvidos delicados. Mas houve mais.

Muitos dos enthusiastas do sr. Baima de Bastos entenderam dever manifestar lhe o excesso dos seus affectos, indo ás casas de alguns cidadãos da, opposição, ou suspeitos d'isso, fazer-lhes assuada, tocar-lhes á porta latas e tambores velhos, atirar-lhes foguetes pelas janellas dentro e partir-lhes as vidraças á pedrada! Ora isto não são só indignidades, mas são actos que o codigo penal castiga severamente.

Sr. presidente, não me consta que as auctoridades actuaes d'aquelle concelho tenhão tomado providencias para que taes actos do selvageria se não repitam; e consta-me pelo contrario que os homens, que muito á sua vontade e em pleno dia insultaram os seus concidadãos, ainda não foram presos ou mettidos em processo.

Mencionarei a v. ex.ª entre outros offendidos, o dignissimo delegado do procurador regio n'aquella localidade; auctoridade que, apesar do respeito que devia impor, foi desacatada. O escrivão de fazenda, funccionario muito digno, foi do mesmo modo aggravado; e ficou tão desgostoso pelo acontecido que pediu a sua transferencia. Foi igualmente, insultado o sr. Queiroz, camarista ou membro do concelho municipal. Podia citar muitos outros mais, mas citando auctoridades das mais importantes deixo a camara avaliar, como seriam tratadas outras pessoas menos gradas e cuja politica é, ou se suppõe ser, da opposição.

É sobretudo, em Idanha a Nova, onde procura manifestar-se mais fortemente a acção dos partidarios do governo e do proprio governo: ahi é onde esta se revela da maneira a mais altamente lamentavel. Chamo sobre, este ponto a attenção de v. ex.ª e da camara, porque ali, alem de muitas outras prepotencias, verificaram-se transferencias de empregados que se não podem justificar, e que só se explicam pelos desejos que o ministerio tem de se preparar para as proximas eleições n'um concelho em que não tem popularidade, alguma.

Por exemplo, o chefe fiscal da alfandega do Idanha foi transferido em commissão para Portalegre. O chefe fiscal de Portalegre acha-se com licença e devia, segundo é costume, ser substituido interinamente por um dos fiscaes do seu districto. Foi porém substituido, contra todos os usos o fazendo-se com isso despezas extraordinarias, pelo seu collega de Idanha; porque o governo, ao que parece, quer fazer politica eleitoral por todos os meios na Idanha, e não podia contar para isso com o digno chefe fiscal da alfandega d'aquella terra.

Como era um empregado a quem se não podiam imputar

Sessão de 12 de abril de 1878