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SESSÃO DE 25 DE JUNHO DE 1887

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.

Francisco José de Medeiros
Maria José de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral

SUMMARIO

Representações mandadas para a mesa pelos srs. Goes Pinto, Consiglieri Pedroso, Pedro Monteiro, Tavares Crespo, Baptista de Sousa, Cardoso Valente, Oliveira Martins e visconde da Torre. - Apresentam requerimentos de interesse publico dos srs. Alfredo Brandão e Antonio Castello Branco, e requerimentos de interesse particular os srs. visconde de Silvas, Reivo Godinho, Goes Pinto, Oliveira Martins, Francisco Machado e Baptista de Sousa. - Justificações de faltas dos srs. Mendes da Silva e Santiago Gouveia. - O sr. Alfredo Brandão faz algumas considerações em referencia aos acontecimentos de Ajudá, protestando contra as insinuações feitas por um jornal contra o actual governador de S. Thomé e Principe. - Apresentam projectos de lei os srs. Ribeiro Ferreira, Goes Pinto e visconde de Silves, acompanhando-os de algumas considerações. - O sr. ministro da fazenda responde ao sr. visconde de Silves. - O sr. Francisco Machado chama a attenção do governo para o estado em que se acha a viação nos tres concelhos das Caldas, Obidos e Peniche. Responde-lhe o sr. ministro da fazenda.- O sr. Antonio Castello Branco faz diversas considerações relativamente á proposta de lei sobre recrutamento. - O sr. Ruivo Godinho pede que se designe dia para realisar a sua interpellação. Informa o sr. presidente. - O sr. Augusto Fuschini refere-se ás disposições dos artigos 134.° e 135.° do novo codigo administrativo. Responde o sr. ministro da fazenda.
Na ordem do dia continua em discussão a lei de meios, usando em primeiro logar da palavra o sr. Pinheiro Chagas, que apresenta uma moção de ordem. Responde-lhe largamente o sr. ministro da fazenda, e a este o sr. Arroyo, que manda para a mesa, e sustenta, uma moção de ordem. - Apresenta um parecer da commissão de administração publica o sr. Eduardo José Coelho.

Abertura da sessão - Ás duas horas e vinte minutos da tarde.

Presentes á chamada 62 srs. deputados. São os seguintes: - Alfredo Brandão, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Alves da Fonseca, Antonio Castello Branco, Baptista de Sousa, Campos Valdez, Oliveira Pacheco, Ribeiro Ferreira, Gomes Neto, Guimarães Pedrosa, Tavares Crespo, Jalles, Pereira Carrilho, Simões dos Reis, Miranda Montenegro, Eduardo de Abreu, Eduardo José Coelho, Goes Pinto, Feliciano Teixeira, Fernando Cominho (D.), Francisco de Barros, Fernandes Vaz, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Francisco Ravasco, Soares de Moura, Gabriel Ramires, Sá Nogueira, Pires Villar, Cardoso Valente, João Arroyo, Vieira de Castro, Rodrigues dos Santos, Silva Cordeiro, Joaquim da Veiga, Simões Ferreira, Ferreira Galvão, Pereira e Matos, Ruivo Godinho, José de Nápoles, Alpoim, Rodrigues de Carvalho, José Maria dos Santos, José de Saldanha (DA, Santos Moreira, Julio Graça, Julio Pires, Poças Falcão, Luiz José Dias, Bandeira Coelho, Manuel José Correia, Marianno Prezado, Miguel Dantas, Pedro Monteiro, Pedro Victor, Sebastião Nobrega, Vicente Monteiro, Estrella Braga, Visconde da Torre, Visconde de Silves e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Moraes Carvalho, Serpa Pinto, Sousa e Silva, Antonio Villaça, Pereira Borges, Santos Crespo, Augusto Fuschini, Elizeu Serpa, Matoso Santos, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Castro Monteiro, Severino de Avellar, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Scarnichia, Franco de Castello Branco, Izidro dos Reis, Santiago Gouveia, Gouveia Martins, Jorge O'Neill, Barbosa Collen, Elias Garcia Laranjo, Pereira dos Santos, Simões Dias, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Manuel Espregueira, Manuel d'Assumpção, Manuel José Vieira, Brito Fernandes, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Marianno de Carvalho, Matheus de Azevedo, Miguel da Silveira e Tito de Carvalho.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello, Anselmo de Andrade, Antonio Candido, Antonio Centeno, Antonio Ennes, Moraes Sarmento, Antonio Maria de Carvalho, Mazziotti, Fontes Ganhado, Barros e Sá, Hintze Ribeiro Urbano de Castro, Augusto Pimentel, Victor dos Santos, Bernardo Machado, Lobo d'Avila, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Elvino de Brito, Emygdio Julio Navarro, Madeira Pinto, Estevão de Oliveira, Freitas Branco, Almeida e Brito, Francisco Matoso, Lucena e Faro, Guilhermino de Barros, Casal Ribeiro, Candido da Silva, Baima de Bastos, João Pina, Souto Rodrigues, Dias Gallas, Menezes Parreira, Teixeira de Vasconcellos, Sousa Machado, Correia Leal, Alves Matheus, Oliveira Valle, Jorge de Mello (D.), Amorim Novaes, Alves de Moura, Avellar Machado, José Castello Branco, Ferreira de Almeida, Dias Ferreira, Abreu Castello Branco, Figueiredo Mascarenhas, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, Ferreira Freire, José Maria de Andrade, Barbosa de Magalhães, Oliveira Matos, Pinto de Mascarenhas, Santos Reis, Abreu e Sousa, Mancellos Ferraz, Vieira Lisboa. Pedro Diniz, Dantas Baracho, Visconde do Monsaraz e Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

Não houve expediente.

EPRESENTAÇÕES

Dos empregados subalternos do lyceu nacional de Vianna do Castello, pedindo augmento de vencimento.
Apresentada pelo sr. deputado Goes Pinto e enviada ás commissões de instrucção primaria e secundaria e de fazenda.

Dos professores officiaes de instrucção primaria do concelho de Vianna do Castello, pedindo reforma nas leis de 2 de maio de 1878 e 11 de junho de 1880, relativas ao ensino primario.
Apresentada pelo sr. deputado Goes Pinto e enviada ás commissões de instrucção primaria e secundaria e de fazenda.

De membros e catechumenos das igrejas evangelicas de Portugal, pedindo providencias relativas ao registo civil.
Apresentada pelo sr. deputado Consiglieri Pedroso, enviada á commissão de legislação civil e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal da Azambuja, pedindo a approvação do projecto de lei que cria n'aquelle concelho tres assembléas eleitoraes uma com séde em Azambuja, outra com séde em Aveiras de Cima e outra com séde em Alcoanne.
Apresentada pelo sr. deputado Pedro Monteiro, enviada á commissão de administração publica e mandada publicar no Diario do governo.

Dos empregados da secretaria do governo civil de Leiria, pedindo augmento do vencimento.
Apresentado pelo sr. deputado Tavares Crespo, enviada a commissão de administração publica, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

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Dos escripturarios de fazenda do concelho de Alcobaça, pedindo augmento de vencimento.
Apresentada pelo sr. deputado Tavares Crespo, enviada á commissão de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.
Da camara municipal de Ribeira de Pena, pedindo providencias contra a crise agricola.
Apresentada pelo sr. deputado Baptista de Sousa, enviada á commissão de agricultura e mandada publicar no Diario do governo.

De professores de ensino primario de Cabeceiras de Basto, pedindo reforma nas leis de 2 de maio de 1878 e 11 de junho de 1880.
Apresentada pelo sr. deputado Cardoso Valente e enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria.

Dos proprietarios de fabricas do aguardente de cereaes contra o parecer da commissão de fazenda que augmenta em mais 20 réis em litro o importo sobre aquella industria.

Apresentada pelo sr. deputado Oliveira Martins, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do Villa Nova da Cerveira, pedindo que lhe sejam concedidos definitivamente os terrenos das antigas muralhas e fossos ao nascente e sul da villa.
Apresentada pelo sr. deputado visconde da Torre, devendo ter destino igual ao de um projecto de lei do mesmo sr. deputado, e que ficou para segunda leitura.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam enviados a esta camara, com a possivel brevidadade, os seguintes documentos:
Copia de toda a correspondencia entre o ex-governador de S. Thomé e Principe, Custodio Miguel Borja e o governo da metropole, com respeito ás negociações e estabelecimento do protectorado de Dahomey.
Copia do tratado ou documento official em que se estabeleceu este protectorado.
Nota especificada das despezas feitas com este projectorado durante o governo do referido Borja, comprehendendo o presente ao rei do Dahomey.
Copia de todos os documentos officiaes relativos á acquisição, remessa e entrega d'este presente.
Copia dos relatorios e de toda a correspondencia do actual governador de S. Thomé e Principe, Augusto Sarmento, com respeito ao protectorado do Dahomey. = O deputado Alfredo Cesar Brandão.

Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidos com a possivel brevidade os seguintes documentos:
Copia do requerimento em que Antonio Sebastião Nascimento da Costa pedia o arrendamento do prazo Massingire, no districto de Quelimane, com a informação respectiva das auctoridades da provincia de Moçambique, consulta da junta consultiva do ultramar e despacho.
Nota do requerimento annual d'este prazo desde que pertence ao estado. = O deputado, Alfredo Cesar Brandão.

Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar sejam enviados a esta camara, com a possivel brevidade os seguintes documentos:
Copia dos termos ou actas de vasallagem assignados pelo regulo Gungunhana, successor de Muzilla.

Copia dos titulos ou documentos officiaes que acreditaram junto do governo portuguez, na metropole, os emissarios ou embaixadores do regulo Gungunhana, que vieram a Lisboa, em companhia de José Cavalleiro de Alegria Rodrigues, residente nas terras de Goa, e de José Joaquim de Almeida, secretario do governo de Moçambique.
Nota dos individuos que acompanharam officialmente estes emissarios, e copia dos documentos em que foram auctorisados a fazer parte d'estas embaixadas.
Nota especificada das despezas feitas com as referidas embaixadas, até á data em que este pedido for satisfeito.
Copia dos relatorios e de toda a correspondencia entre o residente Cavalleiro e o governador geral da provincia de Moçambique, e entre este e o governo na metropole, com respeito a quaesquer negociações com o regulo Gungunhana.
Copia de toda a correspondencia entre o actual governador da provincia de Moçambique, Augusto Castilho e o governo da metropole, com respeito aos emissarios do regula Gungunhana.
Copia de toda a correspondencia entre o actual governador da provincia de Moçambique, o governador de Chiloane e o residente Cavalleiro, com respeito a ultima invasão e guerra dos vatuas, e á vassallagem dos regulos do districto de Inhambane. - O deputado, Alfredo Cesar Brandão.

Requeiro que, pelo ministerio da marinha o ultramar, sejam enviados a esta camara, com a possivel brevidade, os seguintes documentos:
Nota do que constar ácerca do comportamento e habilitações litterarias das duas professoras da instrucção primaria que seguiram para a Africa oriental em companhia de José Cavalleiro de Alegria Rodrigues, actual residente nas terras de Goa.
Nota do destino que tiveram estas professoras dos serviços que têem prestado e da sua residencia actual.
Nota dos regulos do Cuhambane, que, durante a administração do actual governador da provincia de Moçambique, Augusto Castilho, deixaram de prestar vassallagem a Portugal, e ficaram sendo vasallos do regulo Gungunhana.
Copia de toda, a correspondencia entre o mesmo governador e o residente Cavalleiro com respeito aos regulos ou potentados que deixaram de ser vassallos de Portugal. = O deputado, Alfredo Cesar Brandão. j

Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja remettida a esta camara certidão da acta da sessão da junta revisora de recrutas do districto de Vella Real, de 15 do corrente o dias subsequente, e copia authentica da lista dos recrutas do concelho de Alijo, que deviam ser presentes e inspeccionados na mesma sessão e nas seguintes, e bem assim copia, dos documentos comprovativos da justificação dos recrutas que não comparece sem e das ordens que pelo governo civil se expedissem para os autuamentos de refractarios. = O deputado, A. de Azevedo Castello Branco
Mandaram-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

De Antonio de Sousa, antigo cabo do batalhão de voluntarios, pedindo que seja admittido na divisão de veteranos do exercito.
Apresentado pelo sr. deputado visconde de Silves e enviado á commissão de guerra.

De Hermenegildo de Andrade Pessoa Pimentel, pedindo que se aclare o artigo 27.º
da tabella dos emolumentos e

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salarios judiciaes de 12 de abril de 1877, por já se haverem levantado duvidas sobre a sua interpretarão.
Apresentado pelo sr. deputado Ruivo Godinho e enviado á commissão de legislação civil.

De Joaquim Simões Afra, empregado do extincto monte pio de marinha, pedindo collocação definida no quadro da direcção geral da contabilidade publica.
Apresentado pelo sr. deputado Goes Pinto e enviado á commissão de fazenda.

De D. Maria Emilia da Cunha Mendes Azevedo, pedindo augmento de pensão que recebe do estado.
Apresentado pelo sr. deputado Oliveira Martins e enviado á commissão de fazenda.

De Arnaldo Belisario Barbosa, major do estado maior de infanteria, pedindo que se tornem extensivas aos commandantes dos districtos de reserva as disposições do regulamento de remonta para os officiaes montados dos corpos de infanteria.
Apresentado pelo sr. deputado Francisco José Machado e enviado á commissão de guerra.

Dos sargentos do regimento de infanteria n.° 13, Julio Augusto Teixeira Pinto e João Balthazar, e dos musicos Joaquim Victorino de Almeida, Agostinho Ferreira, Manuel Joaquim Teixeira, Luiz Bernardo, Manuel Nunes Junior e José Carlos Saraiva, representando contra a interpretação dada á amnistia geral para todos os crimes, por occasião do consorcio de Sua Alteza Real o Principe D. Carlos.
Apresentado pelo sr. dentado Baptista de Sousa e enviado á commissão de legislação criminal.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

Declaro que, por motivo justificado, não compareci á sessão de 23. = Alfredo Mendes da Silva, deputado por S. Thomé.

Declaro que tenho faltado a algumas sessões por motivo justificado. = O deputado, João Lobo Santiago Gouveia.
Para a secretaria.

O sr. Alfredo Brandão: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa os seguintes requerimentos:
(Leu.)
Aproveito a occasião de estar com a palavra para, a proposito dos acontecimentos de Ajuda, a que se referem alguns dos documentos que peço, protestar energicamente contra as insinuações com que um jornal de Lisboa, manifestando bem claro o intuito de declinar no actual governador de S. Thomé e Principe a responsabilidade dos lamentaveis resultados do celebre protectorado de Dahomey, pretende menoscabar o caracter honestissimo d'aquelle magistrado.
E faço este protesto, sr. presidente, com o maior desassombro, porque conheço bem e de ha muitos annos o actual governador de S. Thomé, podendo dar testemunho da sua illustração e das nobres qualidades do seu caracter, como ... podem
dar igualmente dar todos os que com elle têem trazido ou junto d'elle têem militado debaixo da bandeira do partido progressista, (Apoiados.) e ainda porque sei perfeitamente a quem cabe a exclusiva e inteira responsabilidade e perigo eminente em que se encontram os subditos portuguezes em Ajudá, e dos desaires futuros, cujo alcance ... se prevê por emquanto.
As noticias que recebi pelo ultimo paquete auctorisa ... me a fazer largas considerações sobre este assumpto.
Dispenso-me, porém, de dizer a v. exa. e á camara como considero, e como por todos os que estão em relações com a Africa occidental é considerado o protectorado de Dahomey, porque um dever de patriotismo me impoz silencio n'esta occasião, e tambem porque tenho inteira confiança na illustração e hombridade do nobre ministro da marinha, e estou certo da que s. exa. empregara os meios ao seu alcance para restabelecer a verdade e a moralidade na nossa administração ultramarina, e será inexorável na punição dos farçantes que nos envergonham e ludibriam, seja qual for a sua posição social, e sejam quaes forem os seus protectores.
Peço tambem licença a v. exa. e á camara para chamar a attenção do illustre ministro da marinha sobre um outro assumpto. Refiro-me ao ultimo conflicto de Matibane, que considero gravissimo pelas consequencias que d'elle podem resultar para o nosso prestigio na Africa oriental e para o bom nome da marinha portugueza.
S. exa., em uma das ultimas sessões, prometteu trazer á camara as informações que recebesse com respeito a este conflicto, certamente na esperança de que essas informações tranquillisariam o nosso espirito, e nos mostrariam como fôra desafrontada a bandeira portugueza e castigado o cheque de Matibane.
Dias depois, o nobre ministro veiu ler á camara o seguinte telegramma:
«Matibane socego. Guarda marinha Ferreira via cura. Tenente Figueiredo substituido por alferes Januario.»
A leitura d'este telegramma póde considerar-se como o principio do cumprimento da promessa que s. exa. fizera a esta casa do parlamento.
Ficámos sabendo que está restabelecido o socego em Matibane, e que fôra demittido o tenente Figueiredo, commandante militar em Chaballa.
Não sabemos, porém, como foi desaggravada a offensa feita pelo cheque de Matibane ás tropas portuguezas, e ainda menos sabemos se a substituição do referido commandante militar, que luctou corajosamente durante muitos dias com a fome e com as forças do inimigo, foi uma homenagem ás imposições e exigencias d'este, e o preço de uma paz vergonhosa, comprada á custa de uma submissão servil e abjecta.
Esta hypothese, que para nós seria triste e desanimadora, não é todavia inverosimil, alem de outras rasões que a seu tempo exporei á camara, porque a auctorisam as ultimas noticias da Africa oriental, publicadas na imprensa.
Espero, porém, que o illustre ministro da marinha complete as suas informações, para que se fique sabendo, sem sombras de duvida, se todos cumpriram honradamente o seu dever.
Por ultimo, e reservando-me para, em tempo opportuno dizer á camara e ao paiz o que sei com respeito á situação e administração das nossas colonias, tomo a liberdade de lembrar a v. exa. a urgencia dos requerimentos, que mando para a mesa, e de lembrar tambem que na sessão de 30 de abril mandei para a mesa differentes requerimentos, pedindo documentos pelo ministerio da marinha, dos quaes só poucos tiveram expediente, e relativamente os menos importantes.
Faltam-me, pois, os principaes, e precisamente aquelles de que necessito mais para corroborar as informações particulares que tenho recebido do ultramar, e para patentear á camara algumas das originalidades da nossa administração colonial.
Rogo portanto a v. exa., e muito insistentemente, que se digne dar as precisas providencias para que esses documentos sejam enviados a esta camara com a maxima brevidade, a fim de que o meu silencio não possa ser interpetrado como assentimento ás immoralidades e prepotencias do que tenho noticia.
Os requerimentos vão publicados na secção competente.
O sr. Ribeiro Ferreira: - Mando para a mesa um

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projecto ele lei, dividindo o concelho do Cartaxo em duas assembléas eleitoraes.
A representação que acompanha este projecto explica as rasões, que me levaram a apresental-o, e isso me dispensa de fazer n'este momento quaesquer considerações para o justificar.
Ficou para segunda leitura.
O sr. Goes Pinto: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei assignado por v. exa., por todos os nossos collegas do ditricto de Vianda, e por mim.
Tem esse projecto por fim fazer a concessão de um convento ao hospital de velhos e entrevados de Nossa Senhora da Caridade, estabelecido na cidade de Vianna, e é um dos estabelecimentos mais sympathicos que conheço, e a respeito do qual são unanimes os elogios de quantos o visitam.
A esphera de acção d'aquelle tão piedoso instituto é por ora restricta, mas, se os nossos collegas se dignarem approvar este projecto, como me parece justissimo, elle poderá estender os seus beneficios a maior numero de invalidos.
Rogo, pois a v. exa. se digne dar ao projecto que mando para a mesa e destino conveniente.
Aproveito o estar com a palavra, para apresentar uma representação dos professores de instrucção primaria do concelho de Vianna.
Pedem os requerentes, que sejam modificadas as leis que regem a instrucção primaria.
Devo dizer que, não obstante não concordar em absoluto com todas as affirmações e considerações produzidas pelos requerentes, entendo todavia que é digna de ser meditada e attendida esta representação, e como eu tenho a honra de fazer parte da commissão de instrucção primaria e secundaria, a cujo exame ella tem de ser submettida, reservo-me para lá tratar esta questão, que, por ter complexa, mal póde ser aqui tratada em poucas palavras, proferidas antes da ordem do dia.
Tambem mando para a mesa uma representação dos empregados menores do lyceu de Vianna, que solicitam melhoria de vencimento.
Parece me digno de ser examinado com attenção, e porventura deferido, o pedido d'estes modestos mas uteis servidores do estado, pedido que julgo sufficientemente justicado, como tive ensejo de demostrar perante a commissão de instrucção primaria e secundaria.
Por ultimo, sr. presidente, mando para a mesa, um requerimento de Joaquim Simões Afra, antigo empregado do monte pio de marinha, e hoje addido a uma das repartições de contabilidade, que pede á camara dos senhores deputados que legalise a sua situação.
O projecto de lei ficou para Segunda leitura.
O requerimento e representações tiveram o destino indicado a pag. 1411 e 1413.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Mando para a mesa uma representação de alguns membros das igrejas evangelicas, em Portugal, pedindo providencias a respeito do registo civil e da liberdade religiosa.
Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que seja publicada esta representação no Diario do governo.
Assim se resolveu.
O sr. Pedro Monteiro: - Mando para a mesa uma representação, pedindo para ser approvado o projecto de lei apresentado n'esta casa, creando no concelho da Azambuja tres assembléas eleitoraes; uma com sede em Azambuja, composta dos eleitores d'esta freguezia, dos de Villa Nova da Rainha e de Aveiras de Baixo; outra com séde em Aveiras de Cima, composta dos eleitores da respectiva freguezia; e a terceira com séde em Alcoentre, composta dos eleitores da mesma freguezia e dos da fraguezia de Manique.
Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que seja publicada esta representação no Diario do governo.
Assim se resolveu.
O sr. Visconde de Silves: - Pedi a palavra para mandar para a mesa dois projectos de lei. O primeiro tem por fim auctorisar o governo a effectuar a cobrança da contribuição industrial no districto de Faro, em quatro prestações, e o segundo é para que seja abolido o imposto de tonelagem, creado pela carta de lei de 7 de junho de 1862, no porto de Villa Nova de Portimão.
Como está presente o sr. ministro da fazenda, aproveito a occasião de justificar este ultimo projecto.
Sr. presidente, pela carta de lei de 7 de junho de 1862 foi creado um imposto especial sobre as importações e exportações, que se effectuassem pela barra de Villa Nova de Portimão, e sobre a tonelagem dos navios que frequentassem aquelle porto. Veiu depois o decreto de 2 de junho de 1884, que supprimiu os impostos especiaes, creando um imposto uniforme em todos os portos do paiz, destinado a melhorar os mesmos portos. V. exa. sabe, sabe-o a camara, que, se ha dez ou quinze annos estes impostos especiaes se pediam tolerar, com mais ou menos difficuldade, hoje, com a facilidade crescente de communicações, não podem existir estes impostos especiaes, sem comprometter a prosperidade dos portos respectivos, especialmente se esses portos têem outros vizinhos que lhes façam competencia. Ora, se evidentemente o decreto teve tambem em vista attender a estas rasões, acabando com excepções e collocando todos os portos em igualdade de circumstancias, eu não posso atinar com as rasões que determinaram a conservação do direito, ou do imposto especial de tonelagem, para os navios que frequentam o porto de Portimão, imposto que faz parte da lei abolida de 1862.
A principio imaginei que este imposto tivesse ficado em vigor por descuido, mas depois, pensando melhor, depressa me convenci que descuido não podia ser.
Crente, com tudo, nos sentimentos de justiça e rectidão do sr. ministro da fazenda, forcejei por encontrar um motivo que justificasse a existencia de similhante imposto, e imaginei que seria talvez porque o governo tivesse gasto mais dinheiro do que o rendimento do imposto, nos melhoramentos realisados nas obras do porto de Villa Nova de Portimão; mas tambem bom depressa me convenci do contrario, pela leitura dos documentos que pedi, pelos ministerios da fazenda o das obras publicas.
Sabe v. exa., sabe a camara, o que dizem esses documentos?
Que o rendimento do imposto desde 1862 até 1886 foi de 253:600$000 réis e que a despeza feita até hoje com as obras do porto é de 109:400$000 réis, havendo portanto um saldo a favor dos contribuintes d'aquella parte da provincia de 144:200$000 réis.
N'este saldo não entram 80:000$000 réis provenientes do subsidio annual de 8:000$000 réis creado pela lei de 4 de fevereiro de 1876, porque, entrando esse subsidio, como naturalmente devia entrar, o saldo a favor seria de 224:200$000 réis.
Ora, sr. presidente, eu devo declarar a v. exa. e á camara, que não acredito na continuação dos melhoramentos do porto do Villa Nova de Portimão, porque os acho inuteis presentemente, com a nova feição que os negócios têem tomado, e por causa da facilidade dos novos meios de communicação no Algarve.
Na occasião em que se votou a lei de 1862, creando um imposto, julgava-se que Villa Nova de Portimão estava destinada a desempenhar no sul do paiz o mesmo porque o Porto desempenhava e ainda desempenha no nosso paiz, por ser o porto mais central e que mais garantias de segurança offercia.
Mas hoje, com a facilidade de communicações, os productos d'aquella provincia dividem-se por todos os pontos de embarque da mesma, de modo que a grande quantidade

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de navios que frequentava aquelle porto, e lhe dava vida, movimento e importancia, foi diminuindo gradualmente, e hoje, só de longe em longe ali apparece um ou outro navio.
Para isto, tem tambem contribuido bastante a decadencia da marinha de véla, decadencia determinada pela competencia dos vapores, e de grandes vapores, porque é preciso que v. exa. saiba, que, mesmo entre os vapores a competencia, é tão grande que só as emprezas que têem grandes vapores é que, com maiores ou menores difficuldades, podem triumphar d'essa lucta enorme e extraordinaria.
Portanto, já v. exa. vê, que os taes melhoramentos da barra de Villa Nova de Portimão são completamente despropositados, porque para a collocar e o porto em condições de receber esses vapores, seria necessario fazerem-se despezas tão extraordinarias que nunca a importancia d'aquelle porto poderia justificar.
Ora, pois, se as obras da barra e porto de Villa Nova de Portimão não continuam; e esta parece ser a idéa do governo, por isso que apesar do saldo avultado para ellas proseguirem, ha annos que estuo paradas; digo, pois, se ás obras não continuam, se aquelle porto da provincia tem pago duzentos e tantos contos a mais do que já gastou, evidentemente este direito de tonelagem não se justifica, é inconveniente, é injusto.
De mais a mais ha outra rasão. No Algarve, o porto de Villa Nova de Portimão é o unico que paga este direito de tonelagem, e fica por consequencia collocado em posição desvantajosa com relação aos outros portos e isso não é justo tambem.
Ha mais. Os vapores que geralmente ali tocam são vapores muito grandes, em relação á carga que tomam, mas apesar d'isso pagam um direito de tonelagem sobre a sua medição. Exemplifico: Geralmente os vaporo que ali tocam vem do Mediterraneo e são muito grandes em relação á carga que geralmente tomam.
Se, pois, um vapor de 3:000 toneladas de registo não tomar senão 30 toneladas, que tantas são as que utilisam o porto, e a barra, nem por isso deixam de pagar o direito sobre 3:000, isto é 120$000 réis, de modo que o commercio precisa garantir carga sufficiente para cobrir as despezas ordinarias e extraordinarias dos vapores, ou então o commercio tem de pagar o excesso de frete, o que vem perturbar o andamento regular das operações commerciaes!
Não me quero demorar mais tempo n'esta questão. Creio ter dito o sufficiente para que o sr. ministro da fazenda se convença da justiça que advogo, e estou certo que s. exa. ha de attender, ás reclamações que faço pelos habitantes d'aquella parte da provincia; mas em todo o caso, desejava que s. exa. tivesse a bondade de dizer-me o que se lhe offerecer a este respeito para meu governo.
Os projectos ficaram para segunda leitura.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho):- Não posso n'este momento explicar o motivo por que se conserva ainda o imposto de tonelagem em Villa Nova de Portimão.
Quando entrei para o ministerio, já ali se cobrava este imposto e como nem ao menos, me constava que houvesse reclamação alguma contra elle, não examinei esse assumpto, havendo outros muitos que reclamavam a minha attenção, como os tenho diariamente.
Entretanto, o assumpto é sem duvida importante, como a camara devo ter reconhecido pelas considerações apresentadas paio illustre deputado, e eu prometto a s. exa. examinal-o e habilitar-me em poucos dias para dizer á camara o que penso a este respeito.
O sr. Visconde de Silves : - Eu mandei para a mesa um projecto de lei.
O Orador: - Esse projecto será examinado pelas commissões de obras publicas o de fazenda e eu ahi terei occasião de manifestar a minha opinião.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Visconde da Torre: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Villa Nova da Cerveira, auctorisando o governo a conceder-lhe definitivamente os terrenos das antigas muralhas e fossos ao nascente e sul da villa, que por carta de lei de 22 de março de 1885 lhe foram provisoriamente concedidos.
Mando tambem um projecto de lei, para que sejam concedidos esses terrenos, nos termos da mesma representação, cujos fundamentos justificam plenamente o pedido, julgando-me por isso dispensado de acrescentar quaesquer considerações.
O projecto ficou para segunda leitura.
O sr. Francisco Machado: - Sr. presidente, pedi a palavra com o fim de chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para o atrazo em que se acha a viação ordinaria nos tres concelhos, Caldas, Obidos e Peniche, que compõem o circulo que tenho a honra de representar n'esta casa.
Não estando presente o illustre ministro, nem por isso deixarei de proseguir nas considerações que me proponho a fazer, esperando que v. exa. lh'as communicára, ou que o mesmo sr. ministro tenha d'ellas conhecimento pela leitura do Diario das nossas sessões.
Sr. presidente, todos sabem que as vias de communicação constituem um dos grandes elementos de progresso e civilisação.
Ellas desempenham um importante papel na economia das sociedades, pela facilidade que os povos têem de communicar entre si.
Já J. B. Say dizia que as vias de communicação constituem o primeiro fundamento das sociedades; que estabelecer as vias de communicação d'um paiz, é augmentar a área em que os povos podem effectuar as suas trocas, é contribuir poderosamente para augmentar a sua riqueza, é facilitar o derramamento da instrucção, é emfim multiplicar e aperfeiçoar todos os outros agentes activos da civilisação.
Este espirito altamente observador, este economista distincto e publicista notavel, disse uma verdade incontestavel e incontestada, que eu tenho verificado praticamente n'algumas das povoações dos concelhos a que me referi.
Posso affiançar a v. exa., que em poucos pontos do paiz a viação ordinaria estará tão atrazada e tambem haverá poucos pontos onde ella se torne tão necessaria.
Os diversos governos têem descurado completamente esta região, que pela feracidade do seu solo, natureza e abundancia dos seus productos, situação topographica e a sua proximidade da capital, devia ter merecido especiaes cuidados.
Eu, sr. presidente, emquanto tiver a honra de ter logar n'esta casa, hei de pugnar com todas as minhas forças para que se realisem os melhoramentos de que as localidades do meu circulo tanto carecem.
Posso affiançar a v. exa. que ha muitas povoações importantes que não têem uma unica estrada que as ponha em communicação com o resto do paiz, e este facto origina um atrazo que mal se pode descrever, mas que facilmente se póde imaginar.
Por este motivo, são prejudicados os povos e o governo, que não tira o resultado que devia tirar dos elementos de riqueza, que ali se podiam desenvolver.
As Caldas da Rainha reclama com justa rasão uma estrada que ligue a povoação de Santa Catharina com esta villa, unico meio de fazer affluir os seus importantes productos á estação do caminho de ferro, reduzido o percurso de tres leguas proximamente, pois que emquanto não existir a estrada indicada, terão os povos d'aquella região de procurar a estação de Alcobaça que lhe fica a cinco leguas de distancia, emquanto que as Caldas lhe fica a duas.
Por aqui se vê quão importante é a estrada de Santa Catharina ás Caldas, e eu espero que o illustre ministro das obras publicas attenderá a estas considerações, man-

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dando no mais curto espaço de tempo possivel proceder á sua construcção.
As Caldas da Rainha é a povoação mais importante das proximidades da capital e que está destinada a um largo futuro, quando se abra á circulação o caminho de ferro. Portanto, o governo deve attender ás suas justas necessidades, para que adquira o desenvolvimento a que tem direito.
As suas notabilissimas aguas, sem duvida as primeiras do paiz e talvez da peninsula, fazem com que ali concorra muita gente de todas as partes do paiz e do reino vizinho, e mal parece que se regateiem os melhoramentos concedidos a localidades de somenos importancia.
Breve vae abrir-se á circulação o caminho de ferro que atravessa áquella região, e os povos não poderão tirar vantagens d'este importante melhoramento sem que estejam ligados por meio de estradas com as diversas estações.
Hoje chegou pela primeira vez ás Caldas uma locomotiva; aquelle povo deve sentir um justo regosijo por tão importante melhoramento, e eu associo-me de boamente ás suas alegrias, que são legitimas e plenamente justificadas
O concelho de Obidos, importantissimo pela sua extensão e pela abundancia dos seus vinhos, acha se n'um atrazo lastimoso, havendo povoações que durante a maior parte do anno não podem communicar com as suas vizinhas, sendo de uma vergonha incrivel o que ali se vê.
O caminho de ferro, que tem n'este concelho tres estações, uma no Bombarral, uma em S. Mamede e outra em Obidos, não póde transportar os productos porque elles não podem lá chegar.
Os povos têem-se farto de representar, porém, é o mesmo que clamar no deserto; parece que se suppõe que aquella região hão é portugueza, ou que fica lá pura os confins da nossa provincia de Moçambique.
Ainda ha pouco recebi duas representações dos proprietarios, operarios e trabalhadores do Bombarral e povoações vizinhas, pedindo a conclusão das estradas n.ºs 82 e 82-A, que ha muito se acham em construcção.
Essas representações, dirigidas a Sua Magestade, foram entregues por mim ao illustre ministro das obras publicas que prometteu attendel-as, por as achar do toda a justiça.
Sua exa. presta com isso um grande serviço áquelles povos e sobretudo ao thesouro. Porque, quanto mais mercadorias o caminho de ferro tiver a transportar, menor será o subsidio que o governo tem de dar á companhia.
Hontem recebi outra representação que tenho aqui presente e que mostro á camara, contendo grande numero de assignaturas, muitas d'ellas das pessoas mais influentes d'aquellas localidades, e no mesmo sentido das anteriores.
Por aqui se vê o desejo ardente d'aquelles povos, em ver concluido um melhoramento para elles de summa vantagem.
A conclusão d'estas estradas, que ha muito se acham em construcção fará afluir á estação do caminho de ferro do Bombarral os povos dos concelhos da Lourinhã e Cadaval, que tambem representaram no mesmo sentido; e portanto eu cumpro o meu dever, pugnando pelos interesses dos povos que me elegeram para seu procurador. Não sei á certamente minha a culpa se não conseguir realisar os seus desejos. Hei de porém, demonstrar que cumpro o meu dever!
Ho concelho de Peniche não se falla.
Basta dizer que a villa de Peniche, uma das mais formosas do paiz e das mais populosas, não tem um unico caminho para de lá se poder saír.
Está o que se chama isolada do resto do paiz, porque não vae lá ninguem que não seja a isso obrigado poios seus deveres officiaes, quando, se tivesse uma estrada, seria immensamente frequentada na epocha dos banhos, por ter uma das melhores praias que conheço.
Ha mais de vinte annos que começou a construcção da estrada que ha de ligar Peniche com as Caldas que é a cabeça da comarca, porém com tanta morosidade têem andado os trabalhos, que ainda não chegou a meio.
Esta estrada serve uma quantidade grande de povoações, como Athouguia da Baleia, Coimbra, Serra d'El-Rei, Olho Marinho, Amoreira e outras, que utilisariam bastante com a sua conclusão e que suspiram por ella, como os povos suspiravam pela vinda do Messias.
Só quem passa por aquelles caminhos, como mais d'uma vez me tem acontecido, pode avaliar os precipios que ali se encontram.
Peniche é uma villa de 3:500 habitantes com industrias de bastante valor, como o peixe, rendas, etc., e productos, taes como, batata, vinho, etc., e não tem, como já disse, uma unica estrada que a ponha em communicação com o resto do paiz.
O peixe, que tem chegado a render 50:000$000 réis por anuo, é todo transportado a dorso de cavalgaduras, que percorrem caminhos por onde o gado caprino lhe custaria a andar.
Peniche dista 33 kilometros das Caldas; vão ali diariamente muitas pessoas para negocios da comarca, como jurados, membros de conselho de familia, testemunhas, etc., etc.
Mal se póde avaliar as enormes difficuldades que soffrem estes desgraçados para irem ás Caldas nalgumas epochas do anno.
Peniche não póde utilisar-se das vantagens do caminho de ferro porque não tem para elle accesso.
Como disse, vão diariamente ás Caldas muitas pessoas tratar negocios judiciaes.
Acontece, porém, que têem do irem muitas vezes de noite para lá chegarem a horas de comparecer no tribunal, e mais de uma vez tem succedido faltarem, porque se perdem logo á saída da villa, nas noites escuras, andando horas e horas, e quando apparecem os rubores da madrugada encontram-se ainda quasi no ponto de partida.
O caso, porém, mais notavel, é que os individuos que faltam pela circumstancia apontada, têem de pagar a multa, o que tem succedido repetidas vezes.
Os desgraçados habitantes d'esta villa têem assim de pagar faltas para que não contribuiram e que têem origem no desprezo com que os varios governos têem tratado esta localidade.
Ha tempos deu-se ali um caso, que corrobora bem o que deixo dito.
Na marcha de um destacamento de caçadores n.° 6 para aquella praça, ficou á retaguarda um soldado com licença do commandante da força.
Perdeu-se, e por mais que fizesse não póde encontrar o caminho.
O desgraçado andou para todos os lados, e cada vez se emaranhou mais no labirintho de medas de areia, até que as trevas da noite os vieram surprehender sem poder saír da posição verdadeiramente difficil em que se encontrava.
Perde a coragem, lamenta a sua desgraçada sorte, carrega a arma e põe termo á vida no meio do desespero o mais cruel, maldizendo a hora em que o arrancaram do seio de sua familia para servir a patria.
No sitio onde se encontrou o cadaver, mandaram os habitantes da villa collocar uma cruz, para attestar aos que por ali pagarem o triste fim de um desgraçado, victima da incuria dos governos do seu paiz.
Este caso tetrico, mas absolutamente verdadeiro, é uma vergonha para nós, e mal parece que uma villa importante, nas proximidades da capital, esteja nas mesmas condições que se estivesse situada no decerto de Sahara.
Ha pouco, foi áquella praça uma commissão de engenheiros, composta dos srs. Domingos Pinheiro Borges, actualmente par do reino, Firmino José da Costa, actual governador de Macau, e Theophilo José da Trindade; como chegassem de noite, e esta estivesse um pouco escura, perde-

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ram-se no meio da praia, não sendo possivel reunirem-se, por mais que chamassem uns pelos outros.
O seu unico recurso foi dispararem os rewolvers, e só assim conseguiram reunir-se.
Francamente, é vergonhoso este estado, e eu hei de empregar a actividade de que sou capaz, para conseguir a conclusão da estrada, que reputo da mais utilissima vantagem.
E note, sr. presidente, que para ligar Peniche com o resto do paiz só faltam 2 kilometros de estrada.
Eu mesmo já me vi perdido por aquellas paragens, e o que me valeu, foi, que não perco o sangue frio logo ás primeiras, senão teria de passar a noite ao relento deitado sobre uma meda de areia.
Gritava com quanta força tinha, e mais outro companheiro, mas era o que se chama gritar no deserto, porque ninguem nos ouvia.
Protestei que havia empregar todos os meios ao meu alcance para que a estrada se conclua.
Hei de cumprir o meu dever, porque, como deputado por aquelle circulo, e conhecedor pratico das suas necessidades, não descansarei emquanto não conseguir remedial-as; serei um porpugnador paciente, tenaz e constante dos justos interesses d'aquelles povos, e emquanto tiver lingua para fallar, pennas para escrever e pernas para andar, não descansarei.
Os srs. ministros das obras publicas e fazenda estiveram o verão passado para ir a Peniche, e eu tive muito pesar que este passeio se mallograsse, porque desejava que s. exas. conhecessem todas estas cousas praticamente.
Era bom que os nossos ministros fizessem muitos passeios por todo o paiz para conhecerem das suas necessidades, que são muitas e algumas inadiaveis.
Não é certamente rnettidus nas secretarias que podem conhecer as necessidades do paiz, é vendo, examinando, e colhendo informações que isso se consegue.
Vou finalisar, sr. presidente, mostrando ainda mais outro inconveniente a que esteio sujeitos aquelles povos, não me alargando mais, para não cansar a camara, porque senão estaria até ámanhã a contar casos tristes.
Para ir uma carta de Peniche ás Caldas são necessarios tres dias, porque tem de vir primeiro a Lisboa e d'aqui seguir para as Caldas.
Portanto, quem escreve uma carta em Peniche para as Caldas só póde obter resposta no fim de cinco dias e vice-versa e para isto é necessario que quem a recebe responda immediatamente. Era menos tempo vae uma carta á Russia.
O mesmo acontece para Obidos, que fica á distancia de 28 kilometros.
Não é necessario mais por agora, para vermos qual a necessidade de pôr em communicação estas povoações que têem entre si relações muito directas e constantes.
Discutiu-se ha pouco o projecto das estradas, mas como são necessarios dezoito annos para ellas se concluirem, é possivel que as estradas a que me tenho referido fiquem para o fim, e não é justo que tal aconteça.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Ouvi com bastante attenção as considerações que o illustre deputado fez com relação ao estado em que se acha a viação em Peniche, Caldas e Obidos.
O sr. Frederico Arouca: - E Cadaval?
O Orador: - E Cadaval tambem.
Eu communicarei ao meu collega das obras publicas as observações feitas por s. exa.
Devo, porém, dizer, em nome da verdade, que aquelle circulo tem tido sempre valiosissimos e desvelados protectores n'esta camara, como, por exemplo, o sr. Pinheiro Chagas, por quem os eleitores do mesmo circulo ainda hoje mostram o maior reconhecimento, (Riso.) e actualmente é seu representante o sr. Francisco Machado, que não é seu menos desvelado protector.
Mas o remedio para o mal que s. exa. apresentou está justamente na lei de Estradas, que já foi approvada por esta camara, e que espero será brevemente approvada tambem na outra casa do parlamento.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Antonio Castello Branco: - Vou chamar a attenção da camara para um assumpto que me parece digno de alguma importancia, assumpto que está affecto á illustre commissão do recrutamento.
Refiro-me á proposta de lei apresentada ao parlamento pelo sr. presidente do conselho, relativamente á reforma d'esse serviço.
Faço votos por que essa proposta de lei seja discutida n'esta sessão e que seja approvada com todas aquellas modificações que sejam tendentes a melhorar, quanto possivel, todos os serviços que prendem com o recrutamento.
Opportunamente farei tambem sobre esse assumpto as considerações que entender e empregarei a minha experiencia d'esse serviço administrativo em favor d'essa proposta; agora, porém, limito-me a referir unicamente um facto que me parece merecer a attenção da commissão do recrutamento; porque essa commissão deve ter em vista, não só modificar as leis antigas no sentido de as melhorar, mas sobretudo incluir n'ellas as disposições indispensaveis a obstar a que essa lei dê ensejo aos abusos que, durante mais de trinta annos, só têem praticado, e que têem sido um dos motivos pelos quaes a lei de 1855 e as posteriores têem por vezes reclamado uma reforma radical, que ainda se não realisou, (Apoiados.)
O facto a que alludi é o seguinte:
Ha dias reuniu-se ajunta de revisão do districto de Villa Real, e de um dos concelhos do districto foram remettidas as relações dos mancebos que deviam ser inspeccionados pela junta de revisão. As relações são feitas em duplicado, n'uma d'ellas, porém, antes da inspecção, já estavam mencionados os individuos que deviam ser julgados aptos para o serviço militar, os que deviam ser rejeitados e os que deviam ser esperados!
Um dos facultativos militares, o digno e illustrado cirurgião de infanteria 19, o sr. Arnaldo Torres, lançando os olhos para essa nota, ficou surprehendido com o que via, e com palavras nobres e energicas chamou a attenção do presidente da junta para este facto, protestando contra a inspecção de taes recrutas, e d'ahi resultou que nenhum d'esses individuos foi inspeccionado, o que redundou em ficarem todos esperados para outra sessão.
Ora eu não faço por emquanto a critica d'este facto, apenas o exponho e os illustres deputados farão sobre elle as ponderações que o seu criterio lhe suggerir. É tão singular, que dispensa quaesquer commentarios. (Apoiados.)
Tenho este facto como verdadeiro pelo credito que me merece quem me fez cornmunicação d'elle; todavia não tenho documento nenhum que me auctorise a fazer desde já uma interpellação sobre o modo como se está administrando o districto de Villa Real.
Quer antes, quer depois da epocha eleitoral, têm-se praticado irregularidades que é indispensavel que o paiz, que todos os membros da camara e especialmente os membros da commissão de recenseamento tenham diante dos olhos, para expungirem todos os obstaculos e estorvos que se oppõem a que a futura lei seja executada, sem os abusos que com a legislação actual se praticam, e que eu desejo não continuem a repetir-se de futuro, aliás possivel é que não haja serviço militar. (Apoiados.)
Se porventura tivesse já os documentos dirigir-me-ía ao governo, especialmente ao sr. ministro do reino, que não vejo presente, mas como os não tenho ainda, e unicamente me estou referindo a informações particulares, que me foram transmittidas, apresento por isso um requerimento pedindo esclarecimentos e quando opportunamente tiver as informações officiaes, confirmativas do exposto, farei uma

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interpellação, e as arguições para que houver fundamento. Por hoje limito-me a estas considerações.
Envio para a mesa o requerimento a pedir documentos e informações do facto a que alludi, e que a camara não deixa de considerar com certa estranheza. (Apoiados.)
O sr. Tavares Crespo: - Mando para a mesa duas representações; uma assignada pelos escripturarios da fazenda de Alcobaça, pedindo augmento de vencimento, e outra dos empregados da secretaria do governo civil de Leiria, pedindo a approvação da proposta de lei do governo n.°? com as seguintes modificações: (Leu.)
Que estes funccionarios estão mal remunerados, como o está em geral o funccionalismo portuguez, não me parece susceptivel de contestação; mas o que resta averiguar é se as condições do thesouro são de tal modo favoraveis, que elles possam ter melhoria de situação por uma medida geral.
Se a illustre commissão de fazenda e a camara, poderem attendel-os nas suas reclamações, praticar-se-ha um acto de justiça.
Peço a v. exa. que se digne consultar a camara se permitte que estas representações sejam publicadas no Diario do governo.
Foi approvada a publicação e tiveram o destino indicado a pag. 1411.
O sr. Baptista de Sousa: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho da Ribeira de Pena, pedindo providencias, que em parte indica, para acudir á crise agricola geral e sobretudo d'aquelle concelho, onde tão perniciosa se está mostrando.
Mando tambem varios requerimentos de praças de pret do regimento de infanteria n.° 13, pedindo, a fim de lhes aproveitar, melhor interpretação do decreto que concedeu a amnistia geral por occasião do consorcio do Principe Real.
Parecem-me justas todas estas petições e entendo que ellas devem ser attendidas.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que estas representações sejam publicadas no Diario do governo.
Como estou com a palavra, e tendo ouvido o que o sr. Antonio d'Azevedo Castello Branco acaba de expor ácerca do modo como procedeu a junta de revisão do districto de Villa Real, aproveito a occasião para dizer que aguardo tambem as informações que s. exa. pediu para devidamente discutir o assumpto, no caso de s. exa., conforme declarou ter de fazer algumas aceitações a este respeito, porque, segundo as informações que tenho, estas accusações poderão e deverão ser efficazmente levantadas.
Foi auctorisada a publicação. Os requerimentos tiveram o destino indicado a pag. 1413.
O sr. Ruivo Godinho: - Mando para a mesa um requerimento do contador de Pombal, em que pede que se façam algumas modificações na tabella dos emolumentos judiciaes.
As rasões que o requerente apresenta são sufficientes para mostrar, a justiça do pedido e dispensam-me de apresentar outras considerações.
Já que estou com a palavra, peço licença a v. exa. para lhe dirigir uma pergunta, e é se v. exa. já se concertou com o sr. ministro do reino para se marcar o dia em que s. exa. venha responder á interpellação que lhe annunciei, sobre o cumprimento do decreto dictatorial relativo á instrucção secundaria.
Já ha muito tempo que annunciei esta interpellação, e já ha muito tempo tambem que s. exa. se declarou habilitado a responder; mas declarar-se habilitado e não responder é a mesma cousa que não se dar por habilitado.
Pergunto, portanto, a v. exa. se posso contar que ha de realisar-se brevemente a minha interpellação.
O sr. Primeiro Secretario (Medeiros): - Na mesa ainda não consta que o sr. presidente do conselho se desse por habilitado para responder.
O Orador: - Se v. exa. dá licença, direi que, numa das ultimas sessões o sr. presidente do conselho se declarou habilitado para responder.
Eu tinha perguntado a s. exa. se estava já habilitado para responder á minha interpellação, e s. exa. respondeu que, comquanto não tivesse ainda recebido a nota de interpellação, mal parecia que se não declarasse habilitado a responder ácerca de um decreto que promulgára em dictadura, e que portanto estava prompto a responder logo que a interpellação fosse dada para ordem do dia. Isto consta dos registos parlamentares.
Portanto, resta só que a mesa dê a interpellação para ordem do dia, e a minha pergunta limita-se tão sómente a saber se o sr. presidente já combinou com o sr. ministro do reino o dia em que a interpellação se ha de verificar.
O requerimento teve o destino indicado a pag. 1412.
O sr. Presidente: - Brevemente darei a interpellação para antes da ordem do dia, porque os importantes assumptos que ha tratar não me permittem destinal-a para ordem do dia.
O sr. Fuschini: - Desejo chamar a attenção do governo para um assumpto de alto valor, mas não quero tomar muito tempo á camara, mesmo porque não vejo presente o sr. ministro do reino, a quem especialmente me queria dirigir.
O codigo administrativo, publicado em dictadura, diz no artigo 133.° quaes são os impostos directos municipaes, e no § l.° prescreve o seguinte:
«Uma percentagem addicional ás contribuições directas do estado, predial, industrial, de renda de casas e sumptuária ou áquelles que as substituirem.»
Por outro lado no artigo 134.° estabelece-se o seguinte:
«O maximo da percentagem addicional ás contribuições directas do estado será annualmente fixado por lei.
«§ 1.° Se por qualquer motivo as côrtes não fixarem a percentagem a tempo de poderem ser votados os impostos municipaes nas epochas designadas n'este codigo, considerar-se-ha auctorisada a percentagem votada no anno anterior.»
«Quanto aos impostos indirectos temos o artigo 138.°, que diz assim:
«Os impostos indirectos consistem em uns tantos réis lançados sobre os generos vendidos no concelho para consumo.
«§ 1.° Sobre os generos sujeitos ao real de agua ou ao imposto que o substituir, o imposto municipal limita-se a uma percentagem addicional á pauta do estado, até ao maximo fixado annualmente pelas côrtes.
«§ 2.° Dos generos que não estão sujeitos ao real de agua poderão ser tributados sómente aquelles que forem designados na pauta que o governo decretar.
«§ 3.° A pauta a que se refere o paragrapho antecedente não poderá comprehender os generos isentos por lei de imposto para o estado.»
Como se vê, ha n'isto a quinta essencia da tutela administrativa; e desde que assim é, convém que o governo venha propor as medidas legislativas de que dependem os orçamentos municipaes.
Uma voz: - Isso é para a questão do bill.
O Orador: - O bill não vem; mas, venha ou não, estamos no dia 26 de junho.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Aliás 25, que é o dia dos meus annos.
O Orador: - Então peço licença para me congratular com s. exa. e para considerar este dia como de festa nacional, porque, para mim, s. exa. está já na categoria dos homens notaveis; já o approximaram dos Camachos e dos Maglianis...
Sr. presidente, este assumpto é importantissimo. Uma das rasões por que se publicou em dictadura o código administrativo foi, segundo se disse, por ser necessario introduzir a unidade na administração e corrigir os abusos tributarios

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das camaras municipaes. É claro e evidente que isto ha de trazer, como resultado immediato, a extincção de um certo numero de pequenos concelhos. E eu digo a v. exa., aqui muito á puridade, que, para mim, esta extincção será o unico resultado bom das disposições que ha pouco citei e li.
Mas não era este o fim que se tinha em vista; era outro; e porque aquellas disposições dão este resultado é que não se quer apresentar as leis necessarias pura ellas serem postas em vigor.
Desde o momento em que o governo entendeu que devia curar uns certos males da administração por meio da tutella, ao menos seja bom tutor e publique a tempo as medidas que julgar necessarias para se chegar ao resultado que se tem em vista.
É desnecessario observar á camara, porque ella de certo já o sabe tão bem como eu, que estas são umas das disposições do novo codigo, que eu julgo pessimas.
Quando se discutir o bill, se se discutir, desenvolverei esta doutrina; mas desde já desejo mostrar quanto é absurdo o preceito tutellar a que me refiro.
É sabido que não só, foram conservadas todas as despezas obrigatorias do codigo de 1878, em relação aos municipios, mas ainda se acrescentaram mais algumas.
Para não citar senão duas, direi que uma, e esta não resulta do codigo, mas nem por isso deixa de pesar sobre as camaras, é a que provém da creação dos julgados municipaes, e a outra é a dos expostos.
O codigo de 1886, ao passo que por um lado augmentou as despezas a que eram obrigadas as camaras pelo código de 1878, reduziu por outro lado as receitas, que ellas tinham sido auctorisadas a crear para poderem occorrer a essas enormes despezas.
O natural seria facultar-lhes mais receitas; mas fez exactamente o contrario; reduziu-lh'as!
O resultado é que os pequenos concelhos hão de ser eliminados, ou por annexação ou por outro qualquer meio.
Para mim, repito, é este o unico resultado bom, o unico resultado conveniente que a lei tem; mas o governo é que não entende assim, e por isso ha do, por todas as formas possiveis, protrahir a apresentação das providencias legislativas que são indispensaveis para execução d'aquelle preceito; isto é, que determinem o maximo dos addicionaes para as camaras municipaes.
Ora, se o governo as não apresentar, o que acontece é ficarem de pé as percentagens do anno anterior, as mesmas contra as quaes se revoltava o governo, allegando que com ellas eram vexados os contribuintes.
Por isso, como quero salvar a minha responsabilidade n'este assumpto, lembro ao sr. ministro da fazenda, unico que está presente, a necessidade impreterivel de se legislar a este respeito, para que não subsistam as causas e os defeitos que no dizer do governo motivaram a publicação do novo codigo administrativo.
Bem sei que esta questão é com o sr. ministro do reino e por isso não peço ao sr. ministro da fazenda uma resposta. Unicamente desejo que s. exa. communique ao seu collega estas minhas duvidas, ou antes estes receios.
A reforma administrativa que de futuro houver de se legislar, tem necessariamente de se basear sobre a reducção do numero de concelhos e de districtos; e por isso uma disposição que leva a estes resultados é para mim muito vantajosa; e eu quero que, pelo menos, se apure qual foi a quantidade de bom senso que se empregou para se introduzirem no codigo os artigos a que me tenho referido.
Aqui está explicado o motivo por que eu pedi a attenção do sr. ministro. Se soubesseque s. exa. completava hoje o seu 51.° auniversario, dava-lhe os parabéns e não o teria incommodado com similhante pedido; mas este negocio é de simples administração e eu sei que s exa. sacrifica todos os seus interesses particulares e todos os momentos do ocio ao cuidado das cousas publicas. (Apoiados.)
Tenho dito.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Vou responder ao illustre deputado o sr. Fuschini por quem tenho muita consideração, já como meu amigo pessoal, já pelo seu caracter e pelo seu talento.
S. exa. é o primeiro a reconhecer a inopportunidade do se entrar agora na discussão sobre as vantagens ou inconvenientes do alguns artigos do codigo administrativo, ultimamente publicado, e limita-se a desejar que eu coinmuniqne ao meu collega do reino as observações que s. exa. acaba de apresentar. Assim o farei, e estou certo que o sr. ministro do reino não se demorará em vir dar as explicações precisas ao illustre deputado.
Este assumpto prende-se com outro que está a meu cargo, e que se refere ao real de agua. Prende se ainda com outras questões e eu espero em breves dias apresentar á camara, uma proposta de lei em relação a esses assumptos. E o que posso dizer por agora ao illustre deputado.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Oliveira Martins: - Mando para a mesa uma representação de alguns proprietarios de fabricas de aguardente de cereaes, contra o parecer da commissão de fazenda, que propõe onerar com mais 20 réis em litro aquelle artigo da industria nacional.
Igualmente mando um requerimento de D. Maria Emilia da Cunha Mendes Azevedo, pensionista do estado, pedindo augmento de pensão.
Peço a publicação da representação no Diario do governo.
Foi auctorisada a publicação, e teve o destino indicado a pag.
O sr. Cardoso Valente: - Mando para a mesa uma representação dos professores de ensino primario do concelho de Cabeceiras de Basto, pedindo que sejam reforma das leis de 2 de maio de 1878 e 11 de junho de 1880.
leve o destino indicado a pag.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 120
(lei de meios)

O sr. Pinheiro Chagas: - Apresentou e sustentou com largas considerações a seguinte

Proposta

A camara, lamentando que o parecer da lei de meios fosse submettido ao exame parlamentar, sem prévia discussão do bill de indemnidade, continua na ordem do dia. = Pinheiro Chagas.
Lida na mesa, foi admittida.
(O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho):- Respondeu detidamente ao sr. Pinheiro Chagas.
(O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)
O sr. Arroyo (sobre a ordem): - Apresenta a seguinte moção:
«A camara protesta contra a protelação systematica do parecer relativo ao bill de indemnidade, e continua na ordem do dia. = João Arroyo.»
Sustentou as conclusões a que o sr. Pinheiro Chagas havia chegado relativamente aos orçamentos de previsão e rectificado.
Disse que a lei de meios era uma questão de confiança politica no governo, e não tendo essa confiança, e entendendo que a marcha do governo era prejudicial ao paiz, recusava-lhe a lei de meios.
Não acceitava o caracter dado á discussão pelo sr. ministro da fazenda, e precisava dizer alguma cousa ácerca

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de expressões pronunciadas pelo sr. ministro da fazenda, relativamente ao sr. Pinheiro Chagas. O nome d'este cavalheiro era um dos primeiros titulos de gloria de s. exa., e queria aproveitar esta occasião para prestar o merecido preito a uma individualidade tão talentosa, a uma respeitabilidade tão reconhecida.
Era sua opinião que o sr. ministro da fazenda não dera resposta satisfactoria ás principaes considerações feitas pelo sr. Pinheiro Chagas.
Este illustre deputado mostrára que o governo praticára grandes excessos de despeza, e com rasão o disse, como especialmente o comprovava o exame do orçamento do ministerio das obras publicas. E pelo que diz respeito ás questões militares, o sr. ministro declarara que havia de apresentar os meios de receita correspondentes aos novos augmentos de despeza. Registava essa declaração para ver como ella era cumprida. E, se s. exa. havia de apresentar os meios correspondentes á despeza, era claro que havia de recorrer ao imposto.
A lei de meios era perfeitamente injustificavel em face das medidas dictatoriaes que inverteram os serviços publicos; era a maior violencia que se encontrava nos annaes parlamentares.
O governo no dia 25 de junho apresentava-se perante a camara impenitente pelos excessos dictatoriaes que praticára, e n'essa situação não podia pedir uma lei de meios.
Elle, orador, podia apresentar uma proposta limitando o praso da lei de meios ao tempo que se julgasse necessario para o governo regular a sua situação constitucional perante a camara, mas como tinha a certeza de que tal proposta não alcançava os votos da maioria, entendia mais regular negar o seu voto á lei de meios.
A sua posição na camara era de opposição franca, clara e intransigente ao governo.
Disse que o governo, pelos seus actos, não era merecedor de que se lhe votasse a lei de meios, por isso que tem calcado aos pés as leis e a constituição. Percorrendo successivamente os diversos titulos da constituição, indicou quaes os artigos da carta que, segundo a sua opinião, foram violados pelo governo, fazendo a este respeito largas considerações.
Alludiu ás declarações feitas n'esta camara pelo sr. presidente do conselho, relativamente á transferencia dos caminhos de ferro do Minho e Douro para os bancos do Porto, como compensação dos prejuizos soffridos com o syndicato Salamanca, e ás declarações a esse respeito feitas na ultima sessão da camara dos pares pelo sr. ministro da fazenda, parecendo-lhe que fôra uma vingança que este sr. ministro tirára das declarações do sr. presidente do conselho, declarando ao tempo que não havia harmonia entre os srs. ministros a este respeito.
E para que esta questão se liquidasse era preciso que o sr. ministro da fazenda apresentasse a carta, que lera na outra camara, do sr. presidente do conselho.
Entendendo que o procedimento do governo justificava a apresentação da sua moção, mandava-a para a mesa.
(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

A camara protesta contra á protelação systematica do parecer relativo ao bill de indemnidade, e continua na ordem do dia. = João Arroyo.
Foi admittida.

O sr. Eduardo José Coelho: - Mando para a mesa um parecer da commissão de administração publica, fazendo extensivo a todos os membros do quadro de saude da camara municipal de Lisboa o disposto no § unico do artigo 230.° da lei de 18 de julho de 1885, sempre que o desempenho do serviço estranho ao municipio não prejudique o bom andamento dos serviços de saude da camara municipal.
Mandou-se imprimir:
O sr. Presidente: - Hoje ha sessão nocturna. A ordem da noite é a mesma que vinha para hoje.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarde.

Redactor = S. Rego.

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