SESSÃO NOCTURNA DE 7 DE JULHO DE 1890 1093
A capacidade das embarcações portuguezas figura portanto no movimento marítimo geral do paiz com a exigua percentagem de 5 por cento.
A somma de fretes, a que annualmente dão logar a nossa importação e a nossa exportação não podo calcular-se em menos de 6.000:000$000 a 8.000:000$000 réis; a navegação portugueza não aproveita nesta riquisissima industria mais de uns 500:000$000 réis.
Não é, porém, sob este aspecto sómente que o problema deve preoccupar vivamente os poderes públicos. Sob outro ainda deve elle ser encarado de alcance patriotico mais elevado, e de consequências não menos importantes.
Não se comprehende um paiz colonial sem uma grande marinha, que possa assegurar e sustentar o seu domínio. Mas é obvio também, que as circumstancias do nosso paiz, não permittindo a existencia de uma poderosa marinha de guerra permanente só pelo apoio directo em uma grande marinha mercante se poderá chegar a dispor rapidamente de transportes e cruzadores de guerra e sobre tudo de tripulações experimentadas, cujo auxilio, em um momento de perigo, póde ser de um valor incalculavel.
Nações muito mais poderosas e de mais largos recursos assim o têem entendido.
Por motivos idênticos áquelles, que estamos considerando foi promulgada em França a lei de 29 de janeiro de 1881 estabelecendo:
Como encargos para a marinha mercante;
A requisição pelo estado em caso de guerra;
Transporte gratuito da correspondencia.
Como compensação:
Premios de construcção;
Premios de navegação proporcionaes á tonelagem e ao numero de milhas percorridas;
Augmento de 15 por cento dos premios para os navios construídos segundo planos fornecidos pelo estado.
Todas estas providencias são necessárias, e cada uma dellas visa a um objectivo especial eminentemente util.
Mas o fim do governo, neste momento, não é dar uma solução immediata e completa ao problema, nem os recursos actuaes do thesouro permittem sair de normas extremamente moderadas.
A questão, por agora, deve encarar-se sob o seu aspecto mais urgente.
O que é necessario, desde já, o que importa sobretudo é desenvolver as forças da nossa marinha do commercio, venham os navios donde vierem, sejam construídos no paiz ou fora d'elle.
Propõe, pois, o governo, aproveitando-se dos recursos novamente procurados ao thesouro pelas propostas do fazenda ultimamente apresentadas, que seja distribuída em premios de navegação uma quantia certa, que para o anno civil próximo de 1891 será de 25:000$000 réis, e que nos annos posteriores se fixará no orçamento, em harmonia com as circumstaneias da fazenda publica e o desenvolvimento crescente da marinha mercante nacional.
Em compensação reclama o governo em beneficio do estado o direito de requisição, para o caso de guerra, dos navios mercantes, que destes premios se aproveitem, assim como o transporte gratuito da correspondencia.
Os bons resultados, que desta primeira experiencia se colherem, hão de necessariamente levar o estado á creação de outros premios e medidas de efficaz protecção.
Tem, pois, o governo a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° São creados premios de navegação, nos ter mós desta lei, destinados a desenvolver as forças da marinha mercante nacional de longo curso e grande cabotagem, devendo a verba a esse fim destinada ser votada annualmente pelas cortes,
§ 1.° Fica o governo auctorisado a despender em premios de navegação, no proximo anno civil de 1891, a quantia de 20:000$000 réis.
§ 2.° São exceptuadas destes premios as embarcações pertencentes a companhias ou emprezas subsidiadas pela estado.
Art. 2.° A quantia a que se refere o artigo antecedente será repartida annualmente, em proporção com o numero de milhas percorridas por cada navio, e a respectiva tonelagem, tomando-se para base da distribuição o producto do numero de milhas percorridas multiplicado pelo numero de metros de arqueação bruta dos navios, avaliado pelo systema Morsom.
§ unico. Para esse effeito o numero de milhas percorridas será determinado em linha recta, desde a saida dos navios até á sua entrada nos portos nacionaes do continente e ilhas adjacentes. As viagens intermediárias, as escalas e arribadas, quando as haja, deverão ser justificadas com a apresentação de documentos passados pelas auctoridades consulares portuguezas dos portos onde os navios tenham successivamente entrado.
Art. 3.° A quota de premio de navegação para os navios naufragados, ou que forem condemnados por innavegaveis, será regulada pelo numero de milhas percorridas desde a saída dos mesmos navios, até ao local onde se tiver realisado o naufrágio, ou ao porto em que for julgada a innavegabilidade. No caso de não ser possivel determinar-se o ponto onde succedeu o naufragio, contar-se-ha por inteiro a distancia como se o navio houvera chegado ao seu destino.
Art. 4.° A liquidação dos premios de navegação effectuar-se-ha annualmente, fechando-se as contas no dia 31 de dezembro, e satisfazendo-se aos armadores dentro do praso maximo de noventa dias, posteriores áquella data, as importâncias liquidadas.
Art. 5.° Em caso da guerra o estado poderá requisitar para o seu serviço os navios mercantes que se hajam aproveitado dos premios concedidos por esta lei. Os capitães e mestres desses navios são obrigados a transportar gratuitamente as malas que o correio lhe confiar, nos portos portugueses donde partirem ou onde arribarem.
Art. 6.° Esta lei terá execução a partir de 1 de janeiro de 1891, e o governo fará os regulamentos necessários para a sua execução.
Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.
Lisboa. 7 de julho de 1890. = João Ferreira Franco Pinto Castello Branco=Julio Marques de Vilhena.
Proposta de lei n.° 147-G
Senhores. - Entre os melhoramentos mais instantemente reclamados pelas nossas províncias ultramarinas, e que mais efficazes se afiguram para lhes assegurar condições de progresso e de desenvolvimento de riqueza, apresenta-se como um dos primeiros a construcção de um caminho de ferro destinado a ligar com o litoral, por communicação facil e rapida, o planalto da Chella no districto de Mossamedes.
Se examinarmos com demorada attenção as condições especiaes deste districto e ponderarmos com cauteloso exame todas as vantagens que devem resultar do caminho de ferro indicado, parece-nos que não será possivel hesitar na urgência deste melhoramento e na preferencia justificada que elle deve ter em relação a outros, embora tambem reclamados e tambem de incontestável utilidade.
Data de 1849 o empenho dos poderes públicos em promover a colonisação e a agricultara nesta região da província de Angola. Occupada e começada a povoar dez annos antes, apenas contava n'aquella epocha algumas feitorias; mas a benignidade do clima e o favorável resultado das pequenas explorações agrícolas haviam-lhe conciliado desde logo a fama de paiz excepcionalmente apto para a colonisação.
Circumstancias especiaes provocaram então a saída do Brazil de grande numero de portuguezes, que, auxiliados