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1571

Mr. Henry de Riancey, antigo deputado e auctoridade respeitavel n'estas materias, dizia por essa occasião, que as propriedades pertencentes ao hospicio da caridade, e reunidas depois ao hospicio de París, rendiam no seculo XVIII 4:281 francos, e em 1855 rendiam 23:000 francos; que as propriedades que em 1261 Godofredo e sua mulher deram ao Hotel Dieu de París, no seculo XVIII quasi nada rendiam, e que valiam em 1840 3.000:000 francos.

Mr. Davenase, director geral da administração de assistencia publica, no seu relatorio administrativo para o exercicio de 1855, depois de apresentar dados estatisticos muito curiosos, e varias considerações sobre a desamortisação dos bens dos estabelecimentos de beneficencia, diz que em 1845 as rendas dos hospicios de París, provenientes de propriedades em París, eram 432:003 francos, e que 10 annos depois essas rendas subiram a 482:357 francos; que nos bens ruraes a renda subiu 400 por cento de 1730 a 1830, que de 1819 a 1849 a renda em bens ruraes subira 250 por cento, que de 1849 a 1855 subira 31 por cento, que a propriedade chamada S. Gobert rendia no seculo XVII 3:600 francos e 2 meios de trigo, e que em 1855 rendia 18:540 francos, e por isto propunha que da renda dos papeis de credito em que se convertesse o producto da venda dos bens se reservasse 1/10 todos os annos para fundo de reserva dos estabelecimentos de caridade.

Mr. Ploix, administrador do hospicio de Versailles, sustentou que em todo o emprego de capitaes proveniente da venda de bens dos estabelecimentos de caridade se reservasse uma porção da renda, fixada por a administração; que com esta renda se formasse um fundo de reserva, e que todos os annos se empregasse convenientemente; sustentou mais, que os estabelecimentos de beneficencia podessem fazer o emprego dos seus capitaes e do producto da venda dos seus bens não só na renda do estado, mas em titulos de obrigações municipaes, e de companhias designadas por o estado. «É por este modo, diz o respeitavel mr. Ploix, que as rendas dos estabelecimentos de beneficencia não enfraquecerão por o correr dos tempos, augmentarão sempre, e a actual geração poderá gloriar-se de salvaguardar o interesse das gerações futuras.»

Eis aqui como se pronunciava este homem tão notavel e tão entendido n'estas materias.

(Áparte que não se ouviu.)

É uma pieguice economica isto? E qual será a rasão por que, quando se põe uma propriedade em praça, o capitalista contenta-se com um rendimento de 3 ou 4 por cento, isto é, dá um capital pela propriedade, cujo rendimento está com esse capital na proporção de 3 por cento, e quando o mesmo capitalista vae comprar fundos publicos, não quer dar senão 40$000 por uma renda de 3$000 réis, isto é, não se contenta com menos de 7 por cento de juro? A rasão d'isto é a tal pieguice economica. A pieguice economica é o bom juizo dos capitaes, e o bom juizo dos capitaes vê perfeitamente que o rendimento da terra em geral progride sempre, emquanto que o rendimento dos fundos publicos, se não diminue, e está pelo menos estacionario.

Pieguice economica era tambem aquelle estabelecimento do fundo de reserva, que em França se pretendia estabelecer, fundo de reserva que eu desejaria que tambem cá se estabelecesse e que nos havia salvaguardar dos inconvenientes de uma depreciação dos fundos publicos, que se póde I dar no futuro?

(Áparte que não se ouviu.)

Ha de have-la, diz o nobre deputado. Talvez. Deus queira que não: Se nós quizermos restaurar as finanças com projectos d'esta ordem; se, para votarmos as nossas finanças, formos lançar mão de parte da propriedade das corporações de máo morta, é possivel que isso se dê, porque uma nação, que eleva o roubo a principio financeiro, é uma nação que se degrada, e unia nação que se degrada, morre. Mas suppondo mesmo que o estado não vae lançar mão da parte da propriedade dos estabelecimentos, que os não rouba, eu entendo que este projecto vae tirar ás corporações os meios de estabelecerem aquella caixa ou fundo de reserva, que os podia salvaguardar dos prejuizos resultantes do valor progressivo da terra, e estacionamento da renda publica. E porque? Porque este projecto faz perder ás corporações 25 por cento do seu rendimento.

Uma voz: — Peço perdão, mas não faz perder similhante cousa.

O Orador: — Ora supponhamos que se vende uma propriedade por 1:000$000 réis, pertencendo essa propriedade a uma d'estas corporações; as inscripções estão a 40 por cento, portanto, póde-se comprar com esse dinheiro réis 2:500$000 réis nominaes, o que rende 75$000 réis por anno; mas por este projecto, as corporações são obrigadas a receber do governo só 2:000$000 réis nominaes, e portanto perdem ou não 15$000 réis de rendimento? Pois ha de ir só ás misericordias, irmandades e hospitaes, cujos bens ainda não estão vendidos, mas desamortisados, pela lei de 22 de julho de 1866, e ha de dizer-se: «Em nome da necessidade de acabar com a divida fluctuante, eu estado quero-vos vender esses bens por minha conta; não vos quero entregar o producto d'esses bens, mas sim um papel com um valor nominal que eu lhe quero dar; esse papel está a 40 por cento, mas hei de dar-vo-lo a 50 por cento, e isto porque o meu estado financeiro não é bom?»

Ámanhã se eu fizer tres parvoíces, se eu tiver uma infelicidade qualquer, se as minhas finanças se desorganisarem, e se me chegar ao pé do primeiro homem rico, e lhe disser — para cá dinheiro, porque quero satisfazer as minhas dividas (riso), como se chamaria isto?

Não se riam os nobres deputados; o negocio é serio. Se o estado tem direito de obrigar a vender ás corporações de mão morta os seus bens, e a não lhes entregar real a real o producto da venda d'esses bens, mas lhes entrega só um papel com um valor nominal superior ao valor do mercado, se ha direito a esta espoliação, ámanhã haverá direito de chegar o tutor junto do seu pupillo, e dizer-lhe — quero vender os teus bens, as tuas propriedades, e não te quero entregar o producto da venda, mas um papel com um valor que eu lhe quero dar, com um valor arbitrario, superior ao valor do mercado. Aonde nos póde levar esta cerebrina opinião? Que nome darão os nobres deputados a isto? O de roubo. Eu chamar-lhe-hei espoliação, para lhe não chamar roubo.

Mas diz-se — as corporações ficam muito bem, dando-se-lhes titulos de divida publica a 50 por cento.

No relatorio das commissões reunidas diz-se que, valendo a propriedade tanto, o seu rendimento será só de 3 ou 4 por cento, e recebendo as corporações titulos a 50 por cento, ficarão auferindo uma renda de 6 por cento do seu capital, quando até agora só recebiam 3 ou 4 por cento; devem pois as corporações ficar ainda muito agradecidas ao estado. Não nos illudâmos com está argumentação. As corporações não ficam bem, nem têem que agradecer; as corporações ficam espoliadas em tanto quanto for a differença entre o valor real dos titulos de divida publica no mercado e o valor arbitrario que o governo lhes quer dar. Esta é que é a verdade. É um roubo de 25 por cento na renda.

(Áparte que não se ouviu.)

São 25 por cento do rendimento. Pois entre 75 e 60 não ha differença de 15? E 15 não é a quarta parte de 60?

Eu com 1:000$000 réis compro 2:500$000 réis, estando as inscripções a 40; e estando ellas a 50 compro só réis 2:000$000. Comprando 2:500$000 réis, tenho de rendimento 75$000 réis; e comprando 2:000$000 réis, tenho de rendimento 60$000 réis. Isto é que não póde ser duvidoso; isto é que é exacto.

Pois o estado, para organisar as suas finanças, ha de fazer uma espoliação d'esta ordem?!... E a quem!... As misericordias e aos hospitaes!!

Pois quando ha o fervor da caridade, quando se estão deixando legados grandes e importantes aos estabelecimentos de piedade, vae ferir-se o direito de propriedade destes estabelecimentos que têem por fim cumprir as obras de misericordia, a caridade nas suas diversas formas, e fazer com que os bemfeitores não continuem a enriquecer estas admiraveis instituições, tão nossas, tão portuguezas?

E vae ferir-se o direito de propriedade a estabelecimentos d'esta ordem n'um paiz que se chama Portugal!... Estavamos reservados para, em 1868, vermos aqui a espoliação elevada a um principio financeiro! Estavamos reservados para, em 1868, vermos a espoliação considerada, por um ministro da fazenda em Portugal, como pedra angular do seu edificio financeiro!...

Custa-me isto, porque tenho amor aos brios da minha terra e á dignidade d'esta nação. Custa-me porque sou portuguez, e não desejava que n'um parlamento de Portugal houvesse um ministro que apresentasse um projecto d'esta ordem, o roubo arvorado em systema financeiro.

Como expediente financeiro voto contra o projecto com toda a força da minha convicção; daria contra elle trinta votos se podesse dispor d'elles. Como medida economica, como ampliação da desarmortisação já votada, votaria a favor d'elle; mas votar o projecto como elle está, atacando o direito de propriedade d'estas corporações para tentar salvar as finanças, isso é que não posso fazer, porque, como ainda ha pouco disse n'um áparte o meu nobre amigo que está ao meu lado, a espoliação, como principio financeiro, é uma cousa que degrada, e eu nunca poderia votar no parlamento portuguez uma medida que degradasse este paiz.

Estou cansadíssimo, e por isso não acrescentarei muitas outras considerações que podia apresentar, mas não posso deixar de tocar ainda alguns pontos, como é, por exemplo, que este projecto vae diminuir ainda mais o preço arrastado a que estão já as nossas inscripções.

E preciso dizer isto (áparte que não se ouviu), e eu o vou provar, porque ha um áparte que me obriga a dizer ainda duas palavras a este respeito.

Quando porventura este projecto não fosse senão a ampliação da lei de 1868, o dinheiro proveniente da remissão dos fóros e da venda dos bens havia de ser empregado em inscripções compradas no mercado, e por consequencia as inscripções haviam de subir, porque o pedido d'estes titulos augmentava; mas assim não se compram as inscripções no mercado. Agora ha uma fabrica de inscripções na junta do credito publico, o pedido estará estacionario e por consequencia o preço dellas no mercado não subirá. Esta é que é a verdade.

E depois o que quer dizer este projecto?

Em 1866 calculavam-se todos_ os bens pela desamortisação em 12.000:000$000 réis. E quer V. ex.ª saber o que eram os 12.000:000$000 réis? Eu vou ler o periodo daquelle relatorio:

«Orçando os valores pertencentes a estes estabelecimentos pela quantia de 12.000:000$000 réis, e senão a importancia da propriedade immovel apenas a quarta parte d'aquella somma approximadamente, já se vê, etc...»

Temos pois para vender 3.000:000$000 réis. O resto são fundos mutuados.

Os passaes rendem hoje 111:000$000 réis; supponhamos que têem uma avaliação muito baixa de renda, que estão avaliados em metade, e que rendem o dobro; supponhamos que davam na praça vinte vezes o seu rendimento, que é o preço regular da terra ao norte do paiz, porque é ao norte do paiz que ha mais passaes, porque foi onde os benedictinos estabeleceram ou edificaram maior numero de igrejas; supponhamos que rendem 250:000$000 réis e que dão por elles na praça 5.000:000$000 réis com 3.000:000$000 réis de bens por desamortisar, temos réis 8.000:000$000. Que vem pois o governo a lucrar com o roubo que pretende fazer? 1.600:000$000 réis! É roubo de ratoneiro. Eis-aqui o valor d'este projecto, é uma espoliaçãosita de 1.600:000$000 réis, que é quanto póde dar, mais nada.

Mando esta proposta para a mesa. Eu taxo-a como emenda, não sei se v. ex.ª concordará com isto; mas emenda ou substituição, aqui está consignado o meu voto. A camara póde votar como quizer, póde approvar ou rejeitar o projecto; eu é que não approvo senão isto que apresento, isto é, a ampliação das disposições da lei de 22 de junho de 1866, a ampliação da desamortisação, mas como medida economica simplesmente, e respeitando o direito de propriedade, facilitando a estas corporações a administração dos seus bens, salvaguardando seus interesses futuros; porque, e diga-se de passagem, a facilidade de administração foi uns dos fins da desamortisação; os bens das freiras rendiam 208:400$000 réis, e a sua administração custava réis 46:000$000, os inventarios provaram que alguns conventos eram ricos, e as freiras pediam esmola, e o governo, sabendo isto, e em virtude do seu direito de inspecção, obrigou estas corporações a converter estas propriedades em inscripções, mas respeitou-lhe o seu direito de propriedade, e essas corporações auferem hoje o dobro do que lhes rendiam os bens.

Aceito a desamortisação e quero-a, não como em beneficio das arruinadas finanças do estado, mas em beneficio do paiz e d'essas corporações, cujos bens se desamortisam.

Vendam-se os bens que hoje possuem as corporações) converta-se o producto da venda em fundos publicos, em obrigações prediaes, em acções de companhias, á escolha d'essas corporações, precedendo as formalidades legaes, e auctorisação do governo, desamortise-se o baldio, tudo o que estiver amortisado, entregue-se real a real o producto da venda ás corporações a que esses bens pertenciam, seja empregado esse capital em fundos publicos ou outros titulos, mas pelo preço do mercado, e fique esta liberdade a cada uma das corporações, precedendo as formalidades legaes e a auctorisação do estado. Eis-aqui o que eu quero.

Quanto ao mais, o projecto como está é um desgraçado expediente financeiro; não póde ser approvado por mim, porque entendo que é uma espoliação, e eu nunca poderia votar de modo nenhum uma espoliação como expediente financeiro (apoiados).

Tenho dito. Mando para a mesa a minha proposta.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos dos seus collegas.)

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho como emenda ao projecto n.° 13 o seguinte:

Artigo 1.° As disposições da lei de 22 de junho de 1866 são extensivas ao passaes dos parochos, aos direitos dominicaes e propriedades dos estabelecimentos scientificos, que não forem necessarios para poderem cumprir a sua missão, aos maninhos, terrenos baldios e logradouros communs dos municipios e parochias.

§ unico. Exceptuam-se os maninhos e terrenos baldios e logradouros communs no litoral até 6 kilometros da costa, e nas encostas, limites dos rios seus fluentes, e os terrenos que o governo, depois de havidas as necessarias informações das competentes auctoridades, julgar indispensaveis para mercados e feiras, jardins, passeios, viveiros de arvores, goso e serviço do publico.

Art. 2.º Os maninhos e terrenos baldios e logradouros communs no litoral e nas encostas, serão arborisados á custa dos respectivos municipios e parochias debaixo da direcção do estado.

Art. 3.° Todos os outros baldios maninhos e logradouros communs serão aforados, em hasta publica, aos respectivos municipios e parochianos em porções, nunca menores que um hectar.

Art. 4.° Os maninhos, baldios e logradouros communs, que não poderem ser aforados aos respectivos municipios e parochianos, serão vendidos em praça, e quando não possam ser vendidos serão arborisados convenientemente á custa dos respectivos municipios e parochias debaixo da direcção do estado.

Art. 5.° Em todos os emprazamentos haverá a faculdade de remissão dentro de 5 annos, findos os quaes, serão vendidos os fóros em praça.

Art. 6.° As camaras, parochias, pessoas moraes, corporações e estabelecimentos, cujos bens se desamortisam e se vendem, devem logo empregar o producto da venda dos seus bens, e remissão de seus fóros em inscripções, obrigações prediaes, acções de bancos e companhias por o preço do mercado, precedendo as formalidades legaes e auctorisação do governo.

Art. 7.° Metade do excesso da renda, que as corporações tiverem proveniente do emprego do producto da venda de seus bens e remissão dos seus fóros, será applicada por essas corporações a um fundo de reserva, que será todos os annos empregado para fórma prescripta no artigo antecedente.

Art. 8.° Fica d'este modo ampliada a lei de 22 de junho de 1866, e revogada a legislação em contrario. = J. Gavicho, deputado por Lamego.

O sr. Rodrigues de Carvalho (sobre a ordem): — Por parte da commissão de fazenda peço licença para mandar para a mesa tres pareceres, a fim de serem remettidos á commissão de guerra para ser ouvida na parte que lhe diz respeito.

O sr. Ferreira de Mello: — Mando para a mesa a seguinte moção de ordem (leu).

Sr. presidente, sendo o projecto, que actualmente se discute, uma medida governamental, daquellas que os habitos d'esta casa costumam classificar de completamente ministe