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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
a escola do exercito está no mesmo caso de outra escola superior, e não havia rasão nenhuma para dever ser excluida, assim como não ha rasão alguma para que seja excluida a academia.
Mas quer v. ex.ª ver agora o estado em que ficou este artigo, depois de passar pela discussão na camara dos pares? Eu vou ler.
(Leu.)
Portanto, o diploma de um lyceu é sufficiente para a successão: quasi que o exame de instrucção primaria é sufficiente.
Ora, eu não me queixo de que a camara dos pares resolva a respeito da successão ao pariato como ella entender, porque eu já disse qual era a minha opinião a este respeito.
A reforma politica d'aquella camara não é isto que se discute. Mas aquella camara quer isto e eu approvo-o. O que não ha é rasão nenhuma para que na successão haja tanta largueza, e nas categorias fosse excluída a primeira corporação litteraria e scientifica do paiz. Porque, por mais que se diga, por mais má vontade que possa haver contra a academia, o que não podem é tirar-lhe a categoria que a academia real das sciencias tem desde que foi fundada, de primeira instituição scientifica e litteraria; e sempre assim foi considerada, tanto em Portugal como lá fóra. (Apoiados.)
Portanto, eu tenho rasão de me queixar do que ella não fosse considerada n'este projecto.
Emfim, os argumentos são tantos, e a minha vontade de não protelar esta discussão é tamanha, que eu, pela parte que me diz respeito, vou terminar, repetindo o meu pedido tanto ao illustre relator da commissão como ao governo, de não me responderem, porque eu não desejo poios em difficuldades.
Eu sou amigo do governo e do illustre relator, e concilio assim estes dois sentimentos, e da amisade e o dos meus deveres como socio da academia, deveres que eu julgo que tenho cumprido. (Vozes: — Muito bem.)
(O orador foi felicitado por grande numero de srs. deputados.)
O sr. Dias Ferreira: — Sr. presidente, ou não combato o parecer em discussão, e creio mesmo que a assembléa o póde approvar nos termos em que está redigido.
Desde que a outra casa do parlamento elaborou uma medida politica, ácerca da sua constituição, com a qual não peiora a legislação existente, não me atrevo a combatel-a, nem mesmo a votar contra ella, prestando assim homenagem á resolução d'aquella respeitavel assembléa.
Nem ha outra rasão que justifique a approvação d'este projecto.
Ha de ser difficil justifical-o por outra fórma, desde que ponhamos de parte a deferencia devida ás deliberações da camara alta. E eu não quero referir-me ao projecto votado na outra casa do parlamento.
Não discuto nem as propostas votadas n'aquella assembléa, nem a argumentação com que ali são sustentadas.
Para mim, n'este caso, as opiniões da camara dos proceres são, se é licito exprimir-me assim, inviolaveis e sagradas. O que eu discuto é o parecer da illustre commissão especial que está sujeito ao nosso exame, e que sobre si tomou a responsabilidade da medida em discussão.
Tendo eu votado ha dias uma medida em que se consignam verdadeiros principios liberaes, alargando-se o suffragio eleitoral em termos que, n'uma epocha, mais ou menos demorada, havemos de ficar com o suffragio universal, mal preparado estava o meu espirito para deixar de combater este projecto, se não fosse o meu desejo de prestar homenagem ás deliberações da outra casa do parlamento, visto que com esta medida não peiora a legislação existente.
Não discuto a questão das categorias. O illustre deputa do, que abriu o debate, lamentou que não viessem comprehendidos nas categorias os membros da academia real daa sciencias.
E, se fosse acceitavel o systema do projecto, parecia-me racional que aquella respeitavel corporação figurasse ao lado de categorias, que não devem ter direito a ser mais consideradas no governo do estado.
Porém eu não discuto essa questão. Para mim a essencia do projecto está nos tres primeiros artigos; e se ou os podesse votar com prazer e convencimento votaria tambem a questão das categorias com mais ou menos modificações e additamentos.
Repito, não vou discutir o projecto. Não vejo grande necessidade publica de discutirmos uma reforma sem importancia preterindo outros objectos, aliás gravissimos, a que nos obriga o estado da fazenda e da administração.
Se eu quizesse discutir largamente este projecto, e apresentar agora á assembléa as minhas opiniões desenvolvidas sobre o assumpto, então havia de trazer para a camara as constituições de 1820 e de 1838, e lel-as, até onde o regimento d'esta casa o permittisse, para os meus collegas e o paiz apreciarem os progressos que nos ultimos quarenta annos temos feito no amor ás liberdades e no enthusiasmo pelos principios que constituiam o credo do velho partido progressista. (Apoiados.)
Ponho porém de parto a questão, e levanto a minha voz, não para combater o projecto, mas para dizer que o não aprecio, unicamente em homenagem o consideração á resolução tomada na outra casa do parlamento, que não prejudica a causa publica.
Não quero ficar com a responsabilidade de ter contribuido para affirmar no ultimo quarto do seculo XIX as doutrinas do projecto, que estão, é verdade, reconhecidas na legislação existente, que poderiam ter rasão de ser n'outra epocha, mas que são incompativeis com o espirito do seculo, e com o estado actual da civilisação.
Sr. presidente, ainda temos em 1878 pares por direito de herança, pares por direito de familia, e pares como graça real, annexa a um cargo publico ecclesiastico!
Dizendo á camara, que o projecto em discussão reconhece e sancciona estas doutrinas, tenho dito quanto se poderia allegar para o condemnar, e condemnar a legislação que elle adopta.
Mas o meu unico pensamento n'este momento é deixar bem assignaladas n'esta assembléa as minhas opiniões sobre a essencia do projecto, e lavrar um protesto contra a affirmação de doutrinas que julgo incompativeis com os verdadeiros principios da escola liberal avançada. (Apoiados.)
E, no meu entender, para alterar a doutrina d'estes tres artigos não são precisas côrtes constituintes; póde ser alterada pelas côrtes geraes ordinarias.
Nenhum d'aquelles artigos diz respeito aos limites e attribuições dos poderes politicos do estado. Póde acabar a hereditariedade do pariato, e deixarem de ser pares do reino os membros da familia real, e o patriarcha, arcebispos e bispos, sem se retirar á corôa a attribuição de nomear os membros da outra assembléa politica. Com a alteração d'aquelles artigos não se invadem as attribuições de nenhum dos poderes politicos do estado. Podiamos, pois, em côrtes ordinarias, e nas circumstancias actuaes, alterar radicalmente a doutrina dos tres primeiros artigos do projecto, que são incompativeis com os principios do suffragio popular, e com as conquistas da civilisação moderna.
Caíram os vinculos, caiu a successão singular dos morgados, caíram os prazos de vidas, caiu a successão dos bens da corôa, caíram, emfim, todas as instituições que davam ainda á hereditariedade do pariato certas apparencias de plausibilidade, porque a grossa fortuna de que gosava o filho do par fazia presumir que elle devia ter interesse especial na boa governação do estado. Mas desde que caíram todas essas instituições, que representavam no pariato hereditario grande accumulação de riquezas, e, portanto, interesse especial nos negocios do estado, não comprehendo
Sessão de 15 de abril de 1878