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SESSÃO DE 15 DE ABRIL DE 1878

Presidencia do ex.mo sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva

Secretarios - os srs.

Francisco Augusto Florido da Moula e Vasconcellos

João Maria de Magalhães

SUMMARIO

Depois do expediente entrou em discussão uma proposta do sr. Teixeira de Vasconcellos para que se publique no Diario do governo um extracto largo de cada sessão no dia immediato áquelle em que se realisa; esta proposta foi approvada depois de combatida pelo sr. Carrilho. — Outra proposta do mesmo sr. deputado auctorisando o complemento das obras dos corredores da sala e reparações menores, depois de alguma discussão não obteve vencimento na votação. — Na ordem do dia, depois de alguma discussão sobre os additamenlos dos srs. deputadosCamara Leme e Paula Medeiros em relação ao artigo 2.° do projecto sobre a pensão aos herdeiros do conde do Farrobo, não teve vencimento a votação, ficando para se renovar na sessão immediata. — Começou a discussão do projecto n.º 74 ácerca da reforma da camara dos dignos pares, fallando varios srs. deputados, e ficando ainda pendente o debate.

Presentes á chamada 38 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Pereira de Miranda, Teixeira de Vasconcellos, Cardoso Avelino, A. J. d'Avila, A. J. Teixeira, Cunha Belem, Carrilho, Zeferino Rodrigues, Barão de Ferreira dos Santos, Carlos Testa, Vieira da Mota, Custodio José Vieira, Forjaz de Sampaio, Eduardo Tavares, Filippe de Carvalho, Pinheiro Osorio, Mouta e Vasconcellos, Francisco Costa, Paula Medeiros, Illidio do Valle, J. M. de Magalhães, Matos Correia, Cardoso Klerck, Pereira da Costa, Guilherme Pacheco, Namorado, Pereira Rodrigues, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Camara Leme, Freitas Branco, Faria e Mello, Pires de Lima, Mello e Simas, Cunha Monteiro, Pedro Franco, Pedro Roberto, Placido de Abreu, Visconde da Azarujinha, Visconde de Sieuve de Menezes.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Osorio de Vasconcellos, Braamcamp, Antunes Guerreiro, A. J. de Seixas, Arrobas, Augusto Godinho, Sousa Lobo, Mello Gouveia, Neves Carneiro, Conde de Bertiandos, Conde da Foz, Van-Zeller, Guilherme de Abreu, Jayme Moniz, Jeronymo Pimentel, Dias Ferreira, José Luciano, Ferreira Freire, J. M. dos Santos, Mexia Salema, Pinto Basto, Sampaio e Mello, Luiz de Campos, Manuel d'Assumpção, Rocha Peixoto (Manuel), Pinheiro Chagas, Pedro Correia, Pedro Jacome, Visconde da Arriaga, Visconde de Carregoso, Visconde de Moreira de Rey.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Adriano de Sampaio, Agostinho da Rocha, Alberto Garrido, Rocha Peixoto (Alfredo), A. J. Boavida, Telles de Vasconcellos, Ferreira de Mesquita, Conde da Graciosa, Vieira das Neves, Cardoso de Albuquerque, Francisco Mendes, Pinto Bessa, Palma, J. Perdigão, Ferreira Braga, Barros e Cunha, Ribeiro dos Santos, Vasco Leão, J. J. Alves, Correia de Oliveira, Figueiredo de Faria, Moraes Rego, José de Mello Gouveia, Nogueira, Bivar, Alves Passos, Marçal Pacheco, Mariano de Carvalho, Miguel Coutinho (D.), Julio Ferraz, Ricardo de Mello, Visconde de Guedes Teixeira, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Abertura — ás duas horas e meia da tarde.

Acta — approvada.

EXPEDIENTE:

Representações

1.ª Do corpo de bombeiros de Lisboa, pedindo que lhe, seja concedida uma reforma.

(Apresentada pelo sr. deputado Alves.)

Enviada á commissão de administrrção publica, ouvida a de fazenda.

2.ª Dos corpos de bombeiros municipaes da cidade do Porto e de Villa Nova de Gaia no mesmo sentido.

(Apresentada pelo sr. deputado Illidio do Valle.)

Enviada á mesma commissão.

Communicação

Declaro que o sr. deputado Adriano Carneiro Sampaio, me encarregou de participar a esta camara que por incommodo de saude não tem comparecido ás ultimas sessões e faltará a mais algumas. = Guilherme Augusto Pereira de Carvalho e Abreu.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. — Não obstante o estado melindroso do thesouro, foram este anno augmentados os ordenados dos policias civis; e

Considerando que são assas desgraçadas as circumstancias dos guardas das alfandegas, com especialidade os de Lisboa e Porto, onde por um ordenado tão diminuto é quasi impossivel viver-se;

Considerando que a commissão de fazenda, allegando todavia a justa pretensão dos mesmos guardas, não tem dado parecer sobre o projecto que apresentei ha quatro annos para lhes melhorar a sua posição;

Considerando que vão ser nomeados grande numero de fiscaes para a cobrança do real de agua nos 248 concelhos de Portugal;

Tenho a honra de apresentar o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Os guardas que se acharem impedidos no serviço interno, quer por ordem do ministro da fazenda, quer por ordem dos respectivos directores, terão de ora avante parte no cofre do serviço interno como os aspirantes.

Art. 2.° Tanto os logares de aspirantes das alfandegas maritimas de 2.ª classe, como os de fiscaes de secção que vagarem nas diversas alfandegas, serão exclusivamente preenchidos pelos guardas de 1.ª classe.

Art. 3.° Haverá na direcção geral das alfandegas uma escala numerica, por onde com exactidão se regularão as promoções para aspirantes e para fiscaes.

Art. 4.° Para os logares superiores, que tenham de crear-se, para a nova cobrança do imposto denominado real de agua, serão para elles nomeados, só e unicamente, os guardas de 1.ª classe, que como encarregados tenham praticado nas barreiras de Lisboa e Porto.

Art. 5.º Quando por qualquer motivo os guardas das alfandegas de Lisboa e Porto tenham de fazer serviço fóra do districto das referidas alfandegas, nunca perceberão menos de 800 réis diarios, e uma ajuda de custa para transporte.

Art. 6.° Os guardas de 2.ª classe das referidas alfandegas que se acharem mais habilitados serão promovidos pela sua antiguidade á 1.ª classe ao passo que estes forem vagando.

Art. 7.º Serão transferidos para guardas de 2.ª classe, das alfandegas maritimas de 1.ª classe, os guardas das alfandegas menores do reino, sendo-lhes abonado pelo cofre das despezas diversas, como ajuda de custo da transferencia de um districto para outro, 9$000 réis.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara em 13 de abril de 1878. = Pedro Augusto Franco = Paula Medeiros.

Enviado á commissão de fazenda.

Leu-se na mesa a seguinte proposta, apresentada na ultima sessão pelo sr. Teixeira de Vasconcellos.

Proposta

Proponho que a mesa seja auctorisada á despeza neces-

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saria para se publicar no Diario do governo, no dia seguinte a cada sessão d'esta camara, um extracto longo e completo do que se passou n'ella. = O deputado, Antonio Augusto Teixeira de Vasconcellos.

O sr. Carrilho: — Vou dizer a rasão por que não voto esta proposta, que considero uma perfeita violação da lei.

Aos 20 de junho do 1866 era publicada uma lei quò dizia o seguinte:

«Nenhuma gratificação, ajuda de custo ou qualquer outra despeza, seja qual for a sua denominação, será ordenada por cada uma das camaras legislativas ou pelas suas respectivas mesas, senão em virtude de lei que as auctorise.»

Parece-me, pois, que nós não podemos auctorisar uma despeza nova, senão em virtude de uma lei; e uma lei não se faz por esta fórma, não se faz pela simples votação de uma proposta.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: — É pratica constante, principio geralmente seguido, e fundado na lei que organisou as duas casas do parlamento, que as despezas da publicidade das suas sessões sejam reguladas por ellas; e n'esse sentido é que a camara dos dignos pares, a que preside o mais antigo parlamentar portuguez, o sr. duque d'Avila e de Bolama, a requerimento do sr. conde de Cavalleiros, determinou que para a sessão legislativa proxima as suas sessões sejam publicadas pela maneira por que eu proponho.

Em primeiro logar o sr. duque d'Avila e de Bolama disse que a mesa faria a publicação conforme a fizesse a camara dos deputados, e depois instado pelo sr. conde de Cavalleiros, e tendo a camara toda votado a proposta do sr. conde de Cavalleiros, o sr. duque d'Avila declarou que na sessão seguinte se publicariam as sessões por este modo.

Eu não pretendo nem ter mais conhecimento das leis que nos regem, nem do modo como o systema parlamentar se executa, do que o mais antigo parlamentar portuguez, homem de tão distincta intelligencia, o sr. duque d'Avila e de Bolama. Quando eu não tivesse outros principios para me dirigir, era-me bastante este.

O meu empenho foi fazer com que esta camara não ficasse inferior na publicidade das suas sessões á camara dos dignos pares, porque v. ex.ª e a camara sabem muito bem que nós podemos determinar que as nossas sessões se publiquem no mez seguinte ou no anão proximo; mas é certo que a camara dos dignos pares as publicará todos os dias, depois da resolução que adoptou.

É uma vergonha que nós não publiquemos as nossas sessões assim. Se a camara quer passar por essa vergonha, eu não me opponho; como não posso dispor senão do meu voto, não a posso violentar.

O sr. Carrilho: — As rasões apresentadas pelo sr. Teixeira de Vasconcellos não fizeram de fórma alguma mudar a minha opinião.

A verdade é que a camara dos dignos pares tomou uma resolução contraria á lei, e não se segue d'ahi que esta camara faça o mesmo.

Nós não podemos por fórma alguma votar estas despezas senão por uma lei especial, e essa lei não se faz como o auctor da proposta pretende.

A camara faça o que entender, eu, porém, não posso votar esta proposta, e digo mais que, referindo-se esta moção a actos da futura camara, não sei realmente como nós vamos de certa fórma impor já á camara que ha de vir uma resolução que ella póde não querer acceitar.

Lendo-se na mesa a proposta para ser votada

O sr. Carrilho: — Que mesa é essa a que se refere a proposta?

O sr. Teixeira de Vasconcellos: — Eu entendo que nos actos serios se deve tratar dos negocios seriamente. (Apoiados.)

Toda a gente entende que quando se diz «a mesa», é a mesa d'esta camara porque a mesa é um corpo moral, não é o sr. Francisco Costa, o sr. Mouta e o sr. Magalhães, que ali se acham agora.

Eu trato os negocios seriamente, e pareceme que os outros tambem os devem tratar assim.

Foi approvada aproposta e leu-se a seguinte:

Proposta

Proponho que a mesa e a commissão administrativa sejam auctorisadas a completar, de accordo com o governo, as obras dos corredores da sala das sessões d'esta camara e a fazer as reparações interiores que sejam necessarias. — O deputado, Antonio Augusto Teixeira de Vasconcellos.

O sr. Carrilho: — Pedi a palavra para fazer em relação a esta proposta as mesmas declarações que fiz com respeito á primeira, que a camara acabou de votar.

O sr. Pedro Franco: — Se effectivamente ha uma lei que determina que não se auctorisem estas despezas senão por uma lei especial, não me parece regular que por uma simples proposta se altere essa lei. Não é este o modo de a alterar.

Se eu vier ámanhã apresentar aqui uma proposta para alterar uma lei, respondem-me logo que traga um projecto n'esse sentido; por conseguinte não me parece que mesmo v. ex.ª, que aliás sabo muito bem dirigir os trabalhos de que está incumbido, o a quem eu muito respeito, podia pedir votos sobre uma proposta que altera uma lei.

Peço portanto licença para me abster de votar; nem a approvo, nem a rejeito.

Não estou ao facto da lei, mas pela exposição que o sr. Carrilho acaba de fazer, que de mais a mais é deputado da maioria e por conseguinte não póde ser suspeito, parece-me que não podemos alterar uma lei por uma simples proposta.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: — É tambem para repetir quasi o mesmo que disse a respeito da outra proposta, e ainda com mais fundamento.

Nunca foi costume, e o sr. Pedro Franco não está talvez ao facto d'isto, pedir auctorisações para estas despezas.

Estas obras costumam fazer-se pelo ministerio das obras publicas, debaixo da direcção da junta administrativa da camara, sem nenhuma auctorisação. Sem ella, se abriram aquellas portas, se fizeram as obras em uma parto dos corredores, e estou certissimo de que o tribunal de contas não deixará de as approvar.

Eu entendi que era melhor que as obras se fizessem em virtude de uma auctorisação da camara e n'esse sentido é que apresentei tal proposta; mas quer ella se approve, quer não, devo declarar que o costume e a pratica é que a mesa da camara, antes de se encerrar a sessão, auctorisa, de accordo com a commissão administrativa, a junta administrativa para fazer estas e aquellas obras, umas são feitas directamente pela junta administrativa, e a respeito das outras dá se parte ao ministerio das obras publicas, e este, pela verba legal que tem para isso, manda-as fazer, como são os arranjos nos corredores, os reparos em uma parte da galeria que ameaça ruina, os telhados, e como ha do ser abrirem-se umas janellas que são indispensaveis em uma parte dos corredores em sitio mais escuro.

Repito, o costumo é o ministerio das obras publicas mandar lazer essas obras por uma verba legal que tem para isso.

E o que tenho a dizer ao illustre deputado que, acaba de fallar.

O sr. Pedro Franco: — Se a mesa tem o direito de lazer essas obras, e eu não lh'o nego, entendo que é inutil a votação da camara. Em primeiro logar vae impor-se uma obrigação a uma camara futura, a uma camara que ainda ha de ser eleita. Pareceme que á camara futura é que pertence votar uma proposta n'estes termos e não a actual.

Em segundo logar, estou na mesma em que estava ainda ha pouco, isto é, que não se póde votar uma proposta que

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altera uma lei, por isso peço licença para declarar que me abstenho de votar.

Posta em seguida, a proposta á rotação e não havendo vencimento, ficou adiada para a sessão seguinte.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. visconde de Sieuve de Menezes.

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: - Precisava usar da palavra na presença do sr. Alfredo da Rocha Peixoto, mas como s. ex.ª não está presente não faco uso d'ella.

O sr. Camara Leme: — É para apresentar um requerimento de D. Maria Magdalena de Quintella, que peço licença para ler.

(Leu.)

Mando o requerimento para a mesa, e peço a v. ex.ª lhe dê o destino conveniente.

O sr. Presidente: — O requerimento vae ser enviado á commissão de fazenda.

ORDEM D0 DIA

Continuação da discussão do projecto n.º 60 de 1876

O sr. Presidente: — Vae entrar-se na ordem do dia. Na sessão passada tinham-se votado os artigos 1,° e 2.º do projecto n.º 60 de 1876; faltava votar sómente o artigo 3.°, que diz «Fica revogada a legislação em contrario». Seguia-se votar, para serem approvados ou rejeitados, os addita mentos mandados para a mesa pelos srs. Camara Leme e Paula Medeiros, mas parece-me, segundo o meu modo de ver, que estão prejudicados pela rejeição da proposta do sr. Freitas Branco. (Apoiados.)

Se a camara resolver que esses additamentos estão prejudicados, só resta pôr á votação o artigo 3.° do projecto; mas se resolver de modo contrario, sujeitarei á votação os referidos additamentos.

O sr. Camara Leme: — V. ex.ª deve estar recordado de que fui eu o primeiro que na ultima sessão fallei na questão dos herdeiros do conde do Farrobo, e que mandei para a mesa uma proposta. Depois veiu o sr. Freitas Branco, que tambem apresentou uma proposta, mas inteiramente differente da minha, proposta esta que v. ex.ª e a camara consideraram como emenda, porque o sr. Freitas Branco invocou para isso o regimento; teve, pois, a prioridade na votação. Mas a proposta do sr. Freitas Branco, considerada emenda, é muito differente da minha, que comquanto seja um additamento, não póde considerar-se prejudicada pela approvação do artigo 2.º o rejeição da emenda do sr. Freitas Branco. Mas para tirar todas as duvidas, roqueiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se considera ou não prejudicado o meu additamento.

O sr. Presidente: — Em vista do requerimento do sr. Camara Leme, eu vou consultar a camara sobre se julga prejudicado o additamento, que o illustre deputado apresentou, com a approvação do artigo 2.° do projecto e a votação que teve logar sobre a proposta do sr. Freitas Branco.

O sr. Pereira de Miranda: — Pedia a v. ex.ª tivesse a bondade de mandar ler na mesa o additamento do sr. Camara Leme.

O sr. Secretario (Mouta e Vasconcellos): — São dois os additamentos que estão sobre a mesa; um do sr. Camara Leme, assignado tambem pelo sr. Augusto Godinho, e outro do sr. Paula Medeiros. Vou ler ambos e são os seguintes.

(Leu.)

O sr. Augusto Godinho: — É para dizer a v. ex.ª (pôde ser que eu esteja em erro) que tenho idéa de que v. ex.ª disse, quando se tratou de votar a primeira proposta, a do sr. Freitas Branco, que se votava primeiro por ser considerada emenda, e que os additamentos se votavam depois.

Ora, eu não vejo artigo nenhum no regimento, pelo qual se possa considerar prejudicado um additamento a qualquer proposta ou artigo de projecto; porque os additamentos votam-se exactamente depois de votado o artigo a que elles dizem respeito. (Apoiados.)

Portanto, não vejo necessidade nenhuma de consultar a camara sobre se o additamento do sr. Camara Leme, que eu tive a honra de assignar tambem, está ou não prejudicado. O additamento não é mais do que um acrescentamento ao artigo do projecto já votado.

O artigo do projecto concedia pensões a duas pessoas, e eu vim, e mais o sr. Camara Leme, propor que se desse a mais uma, isto é, a uma terceira pessoa que estava nas mesmas circumstancias das duas.

Portanto, eu entendo que este additamento não está prejudicado, e que se deve por á votação da camara para ella o approvar ou rejeitar como entender.

Entretanto, v. ex.ª que é quem dirige os trabalhos da camara, fará a este respeito o que tiver por melhor.

O sr. Presidente: — A proposta do sr. Freitas Branco era uma emenda e ao mesmo tempo um additamento; eu não podia saber antes da resolução da camara sobre esta moção do sr. Freitas Branco, qual ella seria, não sabia se a camara a approvaria ou rejeitaria. Por isso considerei como additamento a proposta do sr. D. Luiz da Camara.

Eu tinha declarado que reservava para o fim da votação do artigo 2.º o propor aquelle additamento; mas não podia adivinhar, antes de ser votada a moção do sr. Freitas Branco, qual seria a resolução da camara sobre ella.

E effectivamente, a proposta do sr. Freitas Branco era, não só uma emenda, mas tambem um additamento, porque abrangia um maior numero de pessoas para serem agraciadas com este beneficio.

O sr. Carrilho: — Eu pedia a v. ex.ª o favor de mandar ler a emenda do sr. Freitas Branco, que nós rejeitámos outro dia.

Com essa leitura estou persuadido de que a camara se recorda do que já votou.

Leu-se a emenda já rejeitada do sr. Freitas Branco.

O sr. Cainara Leme (sobre o modo de propor): — É sómente para notar que a emenda do sr. Freitas Branco diverge essencialmente da minha; porque o sr. Freitas Branco propor uma certa verba para ser distribuida por todos os filhos do conde do Farrobo, e a minha não falla em verba nenhuma.

Já vê v. ex.ª que o meu additamento diverge completamento da emenda do sr. Freitas Branco.

E agora peco licença ao sr. secretario para dizer que no meu additamento, que não sei se estará, bem escripto, não fallo em filha, fallo de filhos legitimos do conde do Farrobo.

O sr. Secretario (Mouta e Vasconcellos): — Foi isso mesmo o que eu li.

O sr. Pires de Lima: — Não sei se a proposta do sr. Freitas Branco é emenda ou additamento, o que sei é que a camara já pronunciou o seu juizo sobre a natureza d'ella e considerou-a como emenda.

Este juizo mantem-se emquanto a camara não o revogar. É necessario portanto que a camara declare se não quer votar o additamento do sr. D. Luiz; porque até agora a resolução que a camara tomou é esta.

Por consequencia, não se trata de um juizo particular que um deputado ou outro forme sobre a natureza da proposta do sr. Freitas Branco: o que ha é a manter a resolução da camara; e a camara considerou como uma emenda, e só como uma emenda a proposta do sr. Freitas Branco. Deixou-nos portanto a nossa liberdade para se votarem todos os additamentos. (Apoiados.)

O sr. Presidente: — Os srs. deputados que approvam que haja votação sobre os additamentos tenham a bondade de levantar-se.

A camara resolveu que houvesse rofação.

O sr. Presidente: — Vão ler-se os additamentos.

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O sr. Paula Medeiros: — Mando para a mesa este requerimento para se submetter á deliberação da camara.

(Leu.)

Mando-o para a mesa para ter o mesmo destino que teve o requerimento do sr. D. Luiz, que ainda não se resolveu e foi para a commissão de fazenda. Peço que tenha o mesmo destino. Isto não prejudica a questão.

O sr. Presidente: — Isso não póde fazer objecto de um requerimento. Devia ser uma proposta mandada em tempo. Se v. ex.ª a quizer mandar agora, eu posso admittir-lh'a.

Vae votar-se o additamento apresentado pelo sr. D. Luiz da Camara Leme.

Vozes: — Não ha numero.

Verificou-se estarem na sala 44 srs. deputados.

Passou-se á votação.

O sr. Presidente: — Não ha vencimento.

Vae votar-se o outro additamento.

O sr. Camara Leme: — Não havendo vencimento para um, tambem o não haverá para o outro. É melhor ficarem para ámanhã.

O sr. Presidente: — Não ha vencimento. Ficam ambos para se votarem ámanhã. Vae entrar em discussão o projecto n.º 74.

É o seguinte:

Projecto de lei n.º 74

Senhores. — A vossa commissão especial encarregada de dar parecer sobre o projecto n.º 69-A vindo da camara dos dignos pares, tendente á reforma da mesma camara;

Considerando que está nas attribuições das côrtes ordinarias regular as condições para o exercicio de qualquer dos poderes do estado;

Considerando que, portanto, podem as côrtes ordinarias estabelecer categorias dentro das quaes se exerça a faculdade que tem o Rei, como depositario do poder moderador, de nomear pares sem numero fixo;

Considerando que o estabelecimento das categorias enunciadas no projecto tem por fim assegurar o exercicio das funcções do pariato do modo mais consentaneo a serem representadas na camara alta as classes que pela sua illustração, riqueza e serviços prestados ao paiz, se tornem dignas d'esta elevada investidura social;

Considerando, finalmente, que é conveniente e opportuna a reforma, embora parcial, da camara dos pares:

É de opinião que o referido projecto obtenha a approvação d'esta camara.

Sala das sessões da commissão, em 8 de abril de 1878. = A. Cardoso Avelino = José Frederico Pereira da Costa = Francisco Antonio Pinheiro da Fonseca Osorio = Carlos Vieira da Mota = Manuel d'Assumpção = Julio de Vilhena, relator.

A camara dos pares envia á camara dos deputados a proposição junta, e pensa que tem logar pedir-se ao Rei a sua sancção.

Palacio das côrtes, em 4 de abril de 1878. — Duque d'Avila e de Bolama, presidente = Visconde de Soares Franco, par do reino secretario = Eduardo Montufar Barreiros, par do reino secretario.

N.° 69-A

PBOJECTO DE LEI

Artigo 1.° A camara dos pares é composta de membros vitalicios e hereditarios nomeados pelo Rei e sem numero fixo. (Carta constitucional, artigo 39.°)

Art. 2.° O Principe Real e os Infantes são pares por direito, e terão assento na camara logo que cheguem á idade de vinte e cinco annos. (Carta constitucional, artigo 40.°)

Art. 3.° Tambem são pares por direito o patriarcha de Lisboa, os arcebispos o bispos do reino, pelo simples acto da sua elevação ás referidas dignidades. (Decreto de 30 de abril de 1826.)

Art. 4.° Só podem ser nomeados pares do reino os cidadãos portuguezes que, tendo nascido taes, nunca perderam nem interromperam, por acto ou omissão propria, a sua nacionalidade, e provarem que têem trinta annos de idade, que estão no pleno goso dos seus direitos civis e politicos, e que se acham comprehendidos em alguma das seguintes categorias:

1.ª Conselheiros d'estado;

2.ª Ministro d'estado com dois annos de effectivo serviço;

3.ª Presidente da camara dos deputados em quatro sessões legislativas ordinarias;

4.ª Deputado da nação em cito sessões legislativas ordinarias;

5.ª Marechal do exercito ou almirante;

6.ª General de divisão ou vice-almirante;

7.ª General de brigada ou contra-almirante com cinco annos de exercicio n'este posto;

8.ª Embaixador em missão ordinaria;

9.ª Ministro plenipotenciario com cinco annos de exercicio em missão ordinaria;

10.ª Governador geral de possessões ultramarinas com cinco annos de exercicio;

11.ª Conselheiro do supremo tribunal de justiça ou juiz relator do tribunal superior de guerra e marinha;

12.ª Conselheiro effectivo do tribunal de contas ou do supremo tribunal administrativo, com cinco annos de exercicio;

13.ª Procurador geral da corôa e fazenda com cinco annos de exercicio;

14.ª Juiz de 2.ª instancia em alguma das relações do continente do reino e ilhas adjacentes, com cinco annos de exercicio;

15.ª Ajudante do procurador geral da corôa e fazenda com dez annos de exercicio;

16.ª Director geral em algum dos ministerios, ou governador civil, com dez annos de exercicio, tendo alem d'isto as habilitações exigidas no § 4.° do artigo seguinte.

17.ª Lente de prima na universidade de Coimbra;

18.ª Lente cathedratico ou substituto, effectivo ou jubilado da mesma universidade, professor proprietario ou substituto, effectivo ou jubilado em qualquer escola ou instituto de instrucção superior, com dez annos de exercicio effectivo;

19.ª Proprietario ou capitalista, com rendimento não inferior a 8:000$000 réis annuaes provado pelas respectivas matrizes de contribuição predial, ou por titulos de divida publica fundada, devidamente averbados com tres annos de antecipação pelo menos, sendo liquido e livre de quaesquer onus ou encargos;

20.ª Industrial ou commerciante que em cada um dos tres ultimos annos tenha pago ao estado 1:400$000 réis de contribuição industrial ou bancaria.

§ 1.° Fóra d'estas categorias só póde ser nomeado par do reino aquelle que se houver tornado digno d'esta distincção por meritos ou serviços extraordinarios e relevantes.

§ 2.° Os diplomas de nomeação de pares do reino designarão expressamente a categoria ou categorias em que se acham comprehendidos os nomeados, em conformidade d'este artigo, e no caso do § anterior especificarão os meritos e serviços que servem de fundamento á nomeação.

Art. 5.° Nenhum par será admittido a tomar assento na respectiva camara por direito hereditário, sem provar:

1.° Que é descendente legitimo por varonia do par fallecido na linha recta de successão, e que todos que o precedem em grau são fallecidos, ou que, extincta a varonia, é filho varão legitimo mais velho da fêmea mais velha já fallccida;

2.° Que o par fallecido prestara juramento e tomára assento na camara, ou que só por legitimo impedimento qualificado como tal pela mesma camara, deixara do praticar estas formalidades, e ainda de registar a sua carta, no ca-

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so de ter sido nomeado e não ter entrada na camara por successão;

3.° Que tem trinta annos completos de idade, e se acha no pleno goso dos seus direitos civis e politicos, possuindo alem disto moralidade e boa conducta comprovada pelo attestado de tres pares;

4.° Que tem carta de algum curso de instrucção superior pela universidade de Coimbra, ou por alguma das escolas e institutos officiaes do paiz;

5.° Que se acha comprehendido em alguma das categorias designadas no artigo 4.°

§ unico. A disposição do n.º 5.° d'este artigo é dispensada, quando o par por direito hereditario provar que é membro da magistratura judicial, ajudante do procurador geral da corôa e fazenda no continente do reino, capitão do exercito do reino ou primeiro tenente da armada, lente na universidade de Coimbra; professor em alguma das escolas superiores de instrucção publica, primeiro secretario de legação, tendo cinco annos de exercicio nos respectivos cargos ou posto, e prestando a prova de possuir rendimento liquido de 2:000$000 réis, proveniente de alguma das origens estabelecidas no n.º 19.° do artigo 4.°, ou de posto ou emprego inamovivel.

Art. 6.° O tempo de serviço prestado nas differentes funcções mencionadas nos artigos 4.° e 5.° póde accumular-se para completar a categoria ou a habilitação que exigir serviço mais longo.

Art. 7.° Nenhum par poderá ser privado da dignidade de par, nem impedido de exercer as suas funcções senão por alguma das seguintes causas:

1.ª Se por alguma das causas declaradas nas leis perder a qualidade de cidadão portuguez;

2.ª Se for condemnado em algumas das penas que importam perdimento de direitos politicos;

3.ª Se deixar de prestar juramento, e tomar assento na camara dentro de um anno depois de nomeado, ou de haver adquirido as condições que por lei são exigidas para o exercicio do pariato, salvo havendo impedimento legitimo reconhecido tal pela camara.

Art. 8.° Fica suspenso de exercer as funcções de par do reino:

1.° Aqueile que for condemnado á suspensão dos direitos politicos, ou a qualquer pena que importe essa suspensão, emquanto durarem os seus effeitos;

2.° O que for interdicto por sentença da administração dos seus bens;

3.° O que for pronunciado por algum crime, sendo a pronuncia ratificada pela camara com o effeito de suspensão.

Art. 9.° Aquelle em quem o direito de succeder no pariato se ache já adquirido por morte do seu antecessor ao tempo da promulgação da presente lei será admittido, em conformidade das disposições da legislação anterior.

§ unico. Aos successores dos pares actuaes que ao tempo da publicação da presente lei tiverem completado vinte e um annos de idade, serão exigidas as habilitações litterarias que estão determinadas no artigo 2.° da lei de 11 de abril de 1845.

Art. 10.° Ficam em vigor as disposições dos artigos 1.°, 3.°, 4.°, 5.°, 6.°, 7.°, 8.° e 9.° da carta de lei de 11 de abril de 1845.

Art. 11.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 4 de abril de 1878. — Duque d'Avila e de Bolama, presidente = Visconde de Soares Franco, par do reino secretario = Eduardo Montufar Barreiros, par do reino secretario.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: — Eu tenho que dizer muito poucas palavras ácerca d'este projecto.

Tenho que considerar em mim duas qualidades: a primeira a de membro d'esta casa, e a segunda a de socio da academia real das, sciencias, de que tenho a honra de ser vice-presidente. É principalmente esta circumstancia que me obrigou a tomar a palavra, porque nem o meu estado de saude me permitte fallar largamente, nem o assumpto na generalidade exige grandes considerações.

Não impugno nenhuma reforma da camara dos pares que seja votada por aquella casa do parlamento.

Eu concedo á camara dos pares a auctoridade que a lei das doze tabolas dava ao pater familias. Approvo o que ella fez a seu respeito.

Esta maneira de julgar tem sido sempre a minha a respeito de todas as leis em que a camara dos pares tem tomado a iniciativa e que lhe diziam directamente respeito.

Alem d'isso para mim tem mediocre consideração e mediocre importancia o modo de organisar a camara dos pares; o que para mais é essencial é que existam as duas camaras.

Um illustre escriptor muito conhecido de todos, ou de quasi todos que me ouvem, e muito entendido n'estas materias, dizia — vão a uma camara de radicaes, façam um tapamento ao meio: os que ficam de um lado são senadores, os que ficam do outro são deputados; os senadores hão de ser conservadores. É a propria natureza das funcções que são chamados a exercer que lhes dá o espirito de conservação, e esse espirito de conservação é o que se requer nas senados ou nas camaras dos pares, para o fim do equilibrio do systema representativo.

A esse respeito, pois, eu não tenho quasi nada a acrescentar.

Mas se me não opponho a nenhuma reforma que viesse da camara dos pares votada por ella, confesso que se qualquer membro d'esta casa tomasse a iniciativa de uma reforma da camara dos pares, havia de pensar bastante antes de lhe dar a minha approvação.

Apesar de ser toda a minha vida inclinado ás idéas mais largas do progresso, de não ter nenhum receio de dar a maior amplitude á liberdade e a tudo quanto se considere como uma parte do credo do partido radical sensato, apesar d'isso nunca fui da opinião que se implantasse no nosso paiz o que lá fóra tem rasão de ser e cá póde não a ter.

Eu entendo a reforma das instituições quando a experiencia mostrar que essa reforma é indispensavel, mas as reformas á priori entendo-as menos, e a historia da camara dos pares, seja dito em abono da verdade, é a historia mais honrosa talvez de todos os senados da Europa. (Apoiados.)

A camara dos pares nunca prestou o seu apoio a nenhuma providencia contraria á liberdade (Apoiados.)

A camara dos pares fez sempre tudo quanto póde por executar as leis, até nas situações mais difficeis em que todos os outros poderes se esquivavam á execução d'ellas. E estimo ter ocasião de alludir a um facto, visto que é para honra de uma das casas do parlamento, de um dos ramos do poder legislativo.

Em 1826 foram processados na camara dos pares quatro dos seus mais respeitaveis membros, um dos quaes ainda hoje vive e um d'elles era prelado da igreja lusitana.

A camara deu licença para o processo e estes individuos foram julgados e absolvidos na ultima sessão da camara dos pares, em março de 1827, sendo logo depois fechadas as camaras por ordem de D. Miguel!

Ainda modernamente, tendo logar uma desgraça proveniente de um negocio de honra, a camara dos pares condemnou a uma pena pecuniaria, querendo d'este modo conciliar a execução das leis com o respeito que se deve á opinião publica.

Muitas leis, das de mais alcance, que aqui são muitas vezes citadas por nós como uma prova do nosso adiantamento e do nosso progresso liberal, tiveram iniciativa na camara dos pares. (Apoiados.)

(Interrupção.)

Mas esse facto uma vez praticado, faz luzir com mais esplendor as boas obras que o procederam, e isso mesmo serve admiravelmente para o meu argumento, porque não ha cousa que tanto confirme a regra geral como a excepção. (Apoiados.)

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Portanto, eu havia de pensar duas vezes antes de tocar na instituição.

Mas diz-se: «em toda a parte os senados são electivos!» A este argumento respondo, que não é inteiramente assim, porque em algumas partes do continente são mixtos: ha membros electivos e hereditarios. (Apoiados.)

E alem d'isso é preciso notar-se, que cada paiz tem a sua especialidade, e nós tambem temos uma muito notavel.

Entre nós está prohibida a pena de morte, e ainda que ella exista na maior parte da Europa, estou persuadido que ninguem a vem propor por ella existir nos outros paizes, pedindo-nos que reconsideremos.

Não quero demorar por mais tempo a attenção da camara, porque, como já disse, voto qualquer lei que modifique a camara dos pares conforme ella a tiver votado.

Fallarei, portanto, da segunda parte, isto é, da que me diz pessoalmente respeito, e ácerca da qual tenho por dever fallar, visto que pertenço aquella illustre corporação e que exerço n'ella um cargo.

E antes de mais nada, porque n'este tempo poucos se interessam pelos assumptos pelo amor da arte, e nunca falta quem dê ás acções e ás palavras dos outros um sentido. differente do que ellas têem, peço licença á camara para n'um instante só lhe notar o desinteresse com que entro em todas as questões academicas.

Trouxe a esta casa, ha tempos, um pedido para ser augmentada a dotação da academia; a camara toda do certo me faz justiça, de que eu era inteiramente desinteressado n'esse pedido; vou, comtudo, dar uma explicação.

Sou socio da academia ha cinco ou seis annos; durante esse tempo por tres vezes têem vagado commissões subsidiadas e bastante retribuidas, as quaes não só me têem sido offerecidas pelos meus consocios, mas para o que têem instado commigo, e nomeadamente o sr. Mártens Ferrão, quando era nosso presidente, e eu nunca quiz acceitar taes commissões.

Nunca recebi da academia especie alguma de beneficio; tenho-lhe consagrado ha cinco annos todos os meus cuidados, e se não tenho feito anais em seu favor, é porque não tenho pedido, e n'estas circumstancias é que pugno desaffronlada e abertamente pelos seus interesses. (Apoiados.)

Com esse desinteresse pois, e como se diz ordinariamente, pelo amor da arte, é que venho, não pedir á camara que revogue o que fez a camara dos dignos pares, não me adianto a tanto, mas simplesmente protestar, em nome d'aquella corporação, contra a exclusão d'ella, das categorias para o pariato, exclusão de que não acho a rasão, e a respeito da qual não peço ao sr. relator nem ao governo que me responda, e não o peço, porque de ambos me honro de ser amigo, e porque os não quero pôr em graves difficuldades, por isso que não sei como me haviam de responder, principalmente, porque só no governo ha tres socios da academia; o proprio sr. relator pertence áquelle gremio desprezado.

E os que são socios da academia e que se sentam nas cadeiras do governo podiam, por acaso, ser dos que fazem pouco caso d'aquella classificação, mas, pelo contrario, são socios que constantemente têem trabalhado, e alguns dos quaes estão actualmente encarregados de commissões litterarias pela propria academia, como o sr. Corvo e o sr. Thomás Ribeiro, que não está actualmente encarregado de nenhuma commissão, mas que já o esteve, e pouco antes de entrar para o ministerio foi encarregado de fazer uma conferencia ácerca dos negocios de Africa, e que era vice-presidente da 2.ª classe o anno passado.

Não peço, portanto, nem ao governo nem ao illustre relator da commissão que me respondam, só lhes peço que me escutem como me escuta a camara, e que julguem d'este assumpto como ha de julgar o publico.

Diz o relatorio vindo da camara dos dignos pares o seguinte:

(Leu.)

E têem. Todos têem direito igual; mas eu já perguntei a mim mesmo e não achei resposta, e pergunto agora a todos que me ouvem, se realmente deviam ser postos de parte os socios effectivos da academia real das sciencias, corporação em que se encontram, pondo-me de lado a mim, que sou o mais modesto, as primeiras capacidades do paiz em todos os ramos das sciencias, e em que mesmo o mais modesto que possa haver tem uma especialidade importantissima, que muitas vezes ninguem tem fóra da academia, especialidade que lhe de entrada n'aquella corporação, como acontece em todos os paizes em institutos similhantes?

Eu pergunto porque motivo aquella classe ficou posta de parte.

Podem responder-me, e é verdade, que quasi todos os socios actuaes da academia têem outra categoria pela qual entram na camara dos pares. Eu serei o primeiro dos que estão n'esse caso, e isso faz com que a minha voz seja mais desinteressada e com que portanto eu a possa levantar mais alto.

Mas o legislador não legisla só para a actualidade, legisla principalmente para o futuro. Podem dar-se no futuro circumstancias em que a academia não esteja no caso em que está actualmente, e essas serão talvez as circumstancias em que tenha homens mais competentes em sciencias e letras.

Sabe v. ex.ª e sabe a camara a rasão porque muitas vezes a academia não trabalha? É porque é levada por diversas circumstancias a ir buscar para o seu gremio os primeiros homens do estado, os homens que mais sobrecarregados estão com funcções publicas. Esses homens ou hão de trabalhar nas funcções publicas, ou hão de trabalhar na academia. A consequencia é que não vão lá, e a academia não trabalha.

Por isso hoje as tendencias são todas para que se procurem para as academias os homens competentes nas sciencias e nas letras que não tenham funcções officiaes, e é para essas circumstancias, é para o futuro que eu entendo que a legislação deve ser feita.

Não sei realmente como se póde dizer ao paiz que os lentes do curso superior de letras são candidatos ao pariato, e os socios da academia das sciencias não o são; os socios da academia das sciencias, que a lei julga tão iguaes aos lentes do curso superior de letras, que não ha muito determinou que os fossem substituir quando elles se impossibilitassem por qualquer fórma.

Ainda ha pouco tempo esta camara fez uma lei para estabelecer um director para o conservatorio, e determinou que elle fosse escolhido de entro os socios da academia.

Oh senhores, pois a academia saberá mais de musica, de dansa e de canto, do que da maneira de dirigir os negocios do estado? Pois a academia, de que foi presidente ainda ha pouco tempo o sr. Mártens Ferrão, o de que são socios os srs. Corvo, Thomás Ribeiro, Antonio de Serpa, Pinheiro Chagas, e o illustre relator que me está ouvindo, sabe mais de musica e de canto do que está apta a dar o sou voto na camara dos pares?!...

E depois, que rigor é este para com a academia, quando se é tão pouco rigoroso para com os filhos dos proprios pares, quando se vae adoçar mesmo a legislação a esse respeito?

O projecto primitivo é feito pelo sr. conde do Casal Ribeiro, cavalheiro a quem respeito muito e por quem tenho a mais alta consideração, mas a quem não considero infallivel, nem elle assim se considera, como declarou já n'esta camara, de que foi um distincto ornamento.

N'este projecto dizia-se:

(Leu.)

Como se vê, ficou reduzido só á alta instrucção superior. A commissão, porém, entendeu dever acrescentar o seguinte:

(Leu.)

Comprehende-se isto perfeitamente, porque, por exemplo,

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a escola do exercito está no mesmo caso de outra escola superior, e não havia rasão nenhuma para dever ser excluida, assim como não ha rasão alguma para que seja excluida a academia.

Mas quer v. ex.ª ver agora o estado em que ficou este artigo, depois de passar pela discussão na camara dos pares? Eu vou ler.

(Leu.)

Portanto, o diploma de um lyceu é sufficiente para a successão: quasi que o exame de instrucção primaria é sufficiente.

Ora, eu não me queixo de que a camara dos pares resolva a respeito da successão ao pariato como ella entender, porque eu já disse qual era a minha opinião a este respeito.

A reforma politica d'aquella camara não é isto que se discute. Mas aquella camara quer isto e eu approvo-o. O que não ha é rasão nenhuma para que na successão haja tanta largueza, e nas categorias fosse excluída a primeira corporação litteraria e scientifica do paiz. Porque, por mais que se diga, por mais má vontade que possa haver contra a academia, o que não podem é tirar-lhe a categoria que a academia real das sciencias tem desde que foi fundada, de primeira instituição scientifica e litteraria; e sempre assim foi considerada, tanto em Portugal como lá fóra. (Apoiados.)

Portanto, eu tenho rasão de me queixar do que ella não fosse considerada n'este projecto.

Emfim, os argumentos são tantos, e a minha vontade de não protelar esta discussão é tamanha, que eu, pela parte que me diz respeito, vou terminar, repetindo o meu pedido tanto ao illustre relator da commissão como ao governo, de não me responderem, porque eu não desejo poios em difficuldades.

Eu sou amigo do governo e do illustre relator, e concilio assim estes dois sentimentos, e da amisade e o dos meus deveres como socio da academia, deveres que eu julgo que tenho cumprido. (Vozes: — Muito bem.)

(O orador foi felicitado por grande numero de srs. deputados.)

O sr. Dias Ferreira: — Sr. presidente, ou não combato o parecer em discussão, e creio mesmo que a assembléa o póde approvar nos termos em que está redigido.

Desde que a outra casa do parlamento elaborou uma medida politica, ácerca da sua constituição, com a qual não peiora a legislação existente, não me atrevo a combatel-a, nem mesmo a votar contra ella, prestando assim homenagem á resolução d'aquella respeitavel assembléa.

Nem ha outra rasão que justifique a approvação d'este projecto.

Ha de ser difficil justifical-o por outra fórma, desde que ponhamos de parte a deferencia devida ás deliberações da camara alta. E eu não quero referir-me ao projecto votado na outra casa do parlamento.

Não discuto nem as propostas votadas n'aquella assembléa, nem a argumentação com que ali são sustentadas.

Para mim, n'este caso, as opiniões da camara dos proceres são, se é licito exprimir-me assim, inviolaveis e sagradas. O que eu discuto é o parecer da illustre commissão especial que está sujeito ao nosso exame, e que sobre si tomou a responsabilidade da medida em discussão.

Tendo eu votado ha dias uma medida em que se consignam verdadeiros principios liberaes, alargando-se o suffragio eleitoral em termos que, n'uma epocha, mais ou menos demorada, havemos de ficar com o suffragio universal, mal preparado estava o meu espirito para deixar de combater este projecto, se não fosse o meu desejo de prestar homenagem ás deliberações da outra casa do parlamento, visto que com esta medida não peiora a legislação existente.

Não discuto a questão das categorias. O illustre deputa do, que abriu o debate, lamentou que não viessem comprehendidos nas categorias os membros da academia real daa sciencias.

E, se fosse acceitavel o systema do projecto, parecia-me racional que aquella respeitavel corporação figurasse ao lado de categorias, que não devem ter direito a ser mais consideradas no governo do estado.

Porém eu não discuto essa questão. Para mim a essencia do projecto está nos tres primeiros artigos; e se ou os podesse votar com prazer e convencimento votaria tambem a questão das categorias com mais ou menos modificações e additamentos.

Repito, não vou discutir o projecto. Não vejo grande necessidade publica de discutirmos uma reforma sem importancia preterindo outros objectos, aliás gravissimos, a que nos obriga o estado da fazenda e da administração.

Se eu quizesse discutir largamente este projecto, e apresentar agora á assembléa as minhas opiniões desenvolvidas sobre o assumpto, então havia de trazer para a camara as constituições de 1820 e de 1838, e lel-as, até onde o regimento d'esta casa o permittisse, para os meus collegas e o paiz apreciarem os progressos que nos ultimos quarenta annos temos feito no amor ás liberdades e no enthusiasmo pelos principios que constituiam o credo do velho partido progressista. (Apoiados.)

Ponho porém de parto a questão, e levanto a minha voz, não para combater o projecto, mas para dizer que o não aprecio, unicamente em homenagem o consideração á resolução tomada na outra casa do parlamento, que não prejudica a causa publica.

Não quero ficar com a responsabilidade de ter contribuido para affirmar no ultimo quarto do seculo XIX as doutrinas do projecto, que estão, é verdade, reconhecidas na legislação existente, que poderiam ter rasão de ser n'outra epocha, mas que são incompativeis com o espirito do seculo, e com o estado actual da civilisação.

Sr. presidente, ainda temos em 1878 pares por direito de herança, pares por direito de familia, e pares como graça real, annexa a um cargo publico ecclesiastico!

Dizendo á camara, que o projecto em discussão reconhece e sancciona estas doutrinas, tenho dito quanto se poderia allegar para o condemnar, e condemnar a legislação que elle adopta.

Mas o meu unico pensamento n'este momento é deixar bem assignaladas n'esta assembléa as minhas opiniões sobre a essencia do projecto, e lavrar um protesto contra a affirmação de doutrinas que julgo incompativeis com os verdadeiros principios da escola liberal avançada. (Apoiados.)

E, no meu entender, para alterar a doutrina d'estes tres artigos não são precisas côrtes constituintes; póde ser alterada pelas côrtes geraes ordinarias.

Nenhum d'aquelles artigos diz respeito aos limites e attribuições dos poderes politicos do estado. Póde acabar a hereditariedade do pariato, e deixarem de ser pares do reino os membros da familia real, e o patriarcha, arcebispos e bispos, sem se retirar á corôa a attribuição de nomear os membros da outra assembléa politica. Com a alteração d'aquelles artigos não se invadem as attribuições de nenhum dos poderes politicos do estado. Podiamos, pois, em côrtes ordinarias, e nas circumstancias actuaes, alterar radicalmente a doutrina dos tres primeiros artigos do projecto, que são incompativeis com os principios do suffragio popular, e com as conquistas da civilisação moderna.

Caíram os vinculos, caiu a successão singular dos morgados, caíram os prazos de vidas, caiu a successão dos bens da corôa, caíram, emfim, todas as instituições que davam ainda á hereditariedade do pariato certas apparencias de plausibilidade, porque a grossa fortuna de que gosava o filho do par fazia presumir que elle devia ter interesse especial na boa governação do estado. Mas desde que caíram todas essas instituições, que representavam no pariato hereditario grande accumulação de riquezas, e, portanto, interesse especial nos negocios do estado, não comprehendo

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como possa manter-se ainda Hoje a hereditariedade no pariato, o que eu reputo um verdadeiro attentado contra a civilisaçâo do paiz. (Apoiados.)

Em toda a parte a escolha dos membros da camara alta, ou dependa da vontade popular, ou do simples arbitrio da corôa ou antes do governo, visto que todos os actos do poder moderador são da exclusiva responsabilidade dos ministros, assenta em rasões de interesse publico, mais ou menos plausiveis.

Podem ser chamados ao pariato os homens que brilham pelos seus talentos, pela sua fortuna, ou por qualquer outra superioridade social. Mas o acaso do nascimento, como origem de funcções legislativas, não se comprehende, nem se explica.

Se é muito duvidoso e questionado o direito, que os costumes e as conveniencias da humanidade dão ao individuo de dispor dos seus bens alem da vida, como podemos nós conferir a quem quer que seja a faculdade de, pelo simples facto do nascimento, intervir na administração do paiz e dispor do futuro da patria?

Contra o principio que dá aos membros da familia real o pariato por direito, a minha opinião é igualmente decisiva e convicta. Os membros da familia real deveriam ser os ultimos chamados a exercer taes funcções.

Sustento esta opinião, não só por amor aos principios, mas no interesse do prestigio que deve sempre acompanhar o augusto representante do poder moderador.

Desde que a corôa não póde estar sujeita a responsabilidade alguma, deve viver n'uma região serena e inaccessivel ás contestações partidarias. Não póde haver por ella nem louvor nem vituperio no exercicio das suas funcções; mas para isso é preciso que esteja afastada de todas as circumstancias que proxima ou remotamente possam comprometter a sua irresponsabilidade.

Se formos buscar os membros da familia real para tomarem assento, n'uma assembléa politica, onde, para cumprirem o seu dever, hão de necessariamente envolver-se nas lutas dos partidos, será difficil em regra convencer o paiz de que a opinião do Rei não é sempre a opinião da sua familia no seio da representação nacional; e d'ahi derivam-se graves inconvenientes para o principio da irresponsabilidade do poder moderador.

Até os costumes e o bom senso individual protestam contra este preceito da lei. Apenas um membro da familia real tomou assento na outra casa do parlamento; mas praticado este acto de formalidade nunca mais voltou á camara, de certo para não intervir nas lutas partidarias.

Portanto, os contemplados com esta graça sem justificação são os primeiros a comprehender que devem viver afastados das discussões parlamentares.

Se serviços extraordinarios e o merito relevante de algum membro da familia real reclamarem que se lhe de assento nos conselhos da nação, deva esse individuo a sua entrada ao suffragio popular, ou á prerogativa da corôa, conforme os preceitos da constituição. Mas não lhe dê a lei assento, por direito na assembléa dos representantes do paiz, porque alem da offensa dos principios, podemos desprestigiar a corôa, que por todas as rasões deve estar fóra da discussão parlamentar e de qualquer responsabilidade politica.

Se a familia real for chamada a tomar parte nas deliberações de uma assembléa politica, póde acarretar sobre si as paixões dos partidos, e trazer responsabilidades ao poder moderador, para quem no exercicio das suas funcções não quero louvor,nem vituperio. (Apoiados.) Esta entidade politica não está sujeita a responsabilidade alguma. Todas as responsabilidades constitucionaes pesam sobre o governo e sobre o poder legislativo; e por isso organisemos a nossa legislação nas condições de tornar uma realidade aquella ficção politica.

Mas não param ainda aqui as disposições anti-liberaes do projecto. É tambem n'elle mais uma vez affirmada a doutrina do celebre decreto de 1826 que declarou o patriarcha, arcebispos e bispos, pares de direito. Os ministros distado, os directores geraes das secretarias e outros funccionarios lêem annexa a carta do conselho; e um dos prelados do reino, respeitabilissimo pelo seu caracter, pelas suas virtudes o pela sua illustracão, tem annexo o titulo de conde.

Mas dar a um prelado as funcções de legislador, em virtude da investidura concedida pela corte de Roma, é uma iniquidade severamente condemnada pelos principios constitucionaes.

Caiu o poder temporal do papa. Correm as opiniões favoraveis ao principio da separação entre a igreja e o estado em honra do sacerdocio e do poder civil. E é n'esta occasião que vamos affirmar mais uma vez o principio de que a corte de Roma dá jurisdicção para o exercicio das funcções legislativas!

Eu não quero legisladores por disposição da lei. Ainda mesmo que não sustentasse a doutrina de que o direito de legislar deve emanar da soberania da nação, e não do arbitrio da corôa, não poderia associar-me á creação do legisladores por mero facto da lei.

Como póde sustentar-se que os bispos sejam pares por direito, quando os conselheiros d'estado, em posição mais elevada, que exercem cargos, a que são chamados os homens mais conspicuos da nação, e que, pelos seus talentos e experiencia politica, estão encarregados de aconselhar a corôa nos negocios mais graves do estado, não são pares de direito? Os juizes do supremo tribunal de justiça, encanecidos no serviço publico, com uma larga experiencia dos negocios, e com um saber de experiencias feito, unico saber em que eu confio para a governação do estado, não são pares por direito. Só os prelados diocesanos são pares por effeito da lei!

Concordo em que os prelados diocesanos são todos muito dignos, pela sua illustracão e virtudes, de tomar assento na camara alta, devendo ser comprehendidos n'uma categoria especial, de modo que, ou a vontade da corôa ou a eleição popular lhes possa abrir as portas da outra casa do parlamento. Mas que os prelados do reino sejam pares, unicamente pelo direito que lhes confere a apresentação do governo e a jurisdicçâo dada pela corte do Roma, é doutrina que eu não acceito, e protesto contra ella, porque não ha rasão diante da qual possa sustentar-se similhante anomalia n'um paiz constitucional. (Apoiados.) Porque se manteria, pois, esta excepção odiosa no projecto? Será porque, salvas rarissimas excepções, quando periclitam, senão os interesses da patria, pelo menos os interesses do governo, os prelados diocesanos tomam immediatamente o seu logar de honra na camara alta, collocando-se do lado da ordem, isto é do lado do governo? (Riso.) Não sei.

Sr. presidente, não alongo as minhas considerações. Sinto-me realmente com pouca disposição para tratar de categorias n'uma occasião em que nos assoberbam assumptos gravissimos, e nas vesperas do encerramento das côrtes e da terminação do nosso mandato.

Por isso não discuto a questão, se convem ter uma ou duas camaras, se a camara conservadora deve ser electiva no todo ou em parte, ou se deve depender unicamente da nomeação da corôa, porque não discuto por amor da arte, e agora toda essa discussão seria inutil. Nós estamos desempenhando uma missão muito simples no examo d'este projecto.

Votando a reforma vinda da outra casa do parlamento, damos uma prova de consideração aquella assembléa, sem prejuizo dos interesses publicos, porque não peiora com o nosso voto a legislação existente.

Por esse motivo desisto de combater o projecto, que aliás julgo inteiramente refractario ao estado da civilisação actual, e aos bons principios do direito constitucional, lamentando apenas, que contribuamos para uma reforma, que nem era reclamada pela opinião do paiz, nem exigida pelas necessi-

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dades publicas, e que não adianta um passo no caminho liberal.

O sr. Pinheiro Chagas: —... (O sr. deputado nao restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado neste logar.)

O sr. Presidente: — Vae-se ler um decreto que acaba de ser recebido do ministerio do reino.

Leu-se na mesa o seguinte:

Decreto

Usando da faculdade que me confere a carta constitucional da monarchia no artigo 74.° § 4.°, depois de ter ouvido o conselho d'estado, nos termos do artigo 110.° da mesma carta: hei por bem prorogar as côrtes geraes ordinarias da nação portugueza até ao dia 24 do corrento mez de abril inclusivamente.

O presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza assim o tenha entendido para os effeitos convenientes.

Paço da Ajuda, em 15 de abril de 1878. = REI. = Antonio Rodrigues Sampaio.

O sr. Ministro da Justiça (Barjona de Freitas): — (S. ex.ª não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. A. J. Teixeira: — Mando para a mesa o parecer das commissões reunidas de fazenda e instrucção publica, relevando o governo da responsabilidade em que incorreu pela promulgação do decreto de 15 de setembro de 1877.

(Leu.)

O sr. Arrobas: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Osorio de Vasconcellos: — A hora creio que está muito adiantada, e não sei se será conveniente começar agora o meu discurso, porque não desejo levar a palavra para casa.

O sr. Presidente: — Falta ainda uma grande parte da hora.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Muito bem. Vou começar e com tanto mais desafogo, quanto é certo que hei de ser muito restricto e parcimonioso nas minhas reflexões, que serão apenas o resumo da minha profissão de fé politica. Começo, pois, por declarar que voto este projecto, e voto-o com a convicção profunda, de que esta reforma não satisfaz nem póde satisfazer, as aspirações legitimas da escola liberal, porque não compendia nenhum dos grandes principios que são o fundamento do nosso credo.

Sei que qualquer reforma radical da camara dos pares precisaria appellar para os meios constituintes. Sei isso perfeitamente. E como não é esta a occasião, como não existem côrtes constituintes, como os nossos poderes são limitados, é evidente que qualquer reforma que emprehenda-mos, ha do ser comprehendida dentro dos limites constitucionaes. E eu, sr. presidente, que sou tão revolucionario nas idéas, como sou pacifico e moderado nos meios; eu que sou essencialmente legalista, para traduzir em factos as grandes e fecundas theorias da revolução, não posso censurar, sem contradicção commigo mesmo, a camara dos dignos pares que tomou a iniciativa da sua propria reforma. É uma iniciativa debil, fraca, sem alcance, porque é restringida pela carta.

Todavia, repito, não a censuro, assim como não protesto contra esta camara, se der a sancção do seu voto ao projecto nascido no outro corpo colegislativo. (Apoiados.)

Mas isso não tolhe nem péde tolher a minha liberdade e a de todos os illustres deputados que queiram, como eu, a proposito d'este problema social, apresentar as suas idéas com aquella franqueza que dá uma convicção profunda, meditada e racionavel. (Apoiados.)

Eu sou, em these, radicalmente opposto á hereditariedade nas funcções politicas, em hypothese posso acceitar a hereditariedade n'uma ou noutra funcção, quando assim o determine o estado social e a vontade da nação, mas nunca no poder legislativo, porque tal privilegio é um attentado aos principios essenciaes da sociedade moderna. (Apoiados.) As funcções legislativas n'um e noutro ramo do parlamento não podem ser exercidas senão por aquelles que receberam a sua alta investidura do suffragio popular. (Apoiados.)

Póde haver divergencias de opinião a respeito da eleição da segunda camara, podem uns entender que a segunda camara deva derivar mais directamente do suffragio popular, e outros entender que deva derivar menos directamente. Mas, sem que a investidura venha da vontade da nação liberrimamento manifestada, declaro que qualquer outra reforma não póde traduzir as minhas idéas, não póde ser abraçada e perfilhada pelos homens devotadamente liberaes.

Não quero, sr. presidente, discutir tambem a necessidade de duas camaras. Não é este o momento opportuno, porque infelizmente não se trata da reforma do codigo civil.

Ha opiniões muito remotas e muito auctorisadas que são favoraveis a uma só camara, e ha outras para quem é dogma que o parlamento deve ser dividido em duas camaras, em que uma sirva de ponderador á outra.

Tambem é este um problema que não póde resolver-se independentemente das circumstancias peculiares de cada povo, da sua organisação social, das suas tradições, da sua educação democratica, etc..

É preciso estudar qual é o modo de ser social de uma nação, é preciso estudar qual é a organisação do estado para que na mente do legislador se possa formar a convicção sobre se convem bipartir ou unificar o parlamento. (Apoiados.)

Em todo o caso é para mim ponto assentado que na grande maioria das hypotheses o parlamento reduzido a uma só camara póde trazer grandissimos inconvenientes, como são os que resultam de uma dictadura legislativa, que é talvez peior do que uma dictadura executiva. Não sei o que seja mais perigoso, se a tyrannia de uma convenção se a do um despota. (Apoiados.)

Acceitcmos, e já se vê que esta discussão é simplesmente theorica, acceitemos como bem assente, como bem estabelecida a necessidade de duas camaras.

Voltando ao assumpto, e quero insistir n'este ponto, entendo que qualquer reforma é perfeitamente inutil e inoffensiva desde o momento em que quizermos restringil-a aos limites da carta, cuja reforma aliás já propuz, e pela qual insisto ainda, cada vez com mais energia e vigor. (Apoiados.)

Deus me livre de acreditar que esta proposta tinha um alcance tal que vinha ipso facto prejudicar a reforma da carta.

Se eu podesse presentir que a approvação d'esta lei, que tende a reformar a camara dos pares, prejudicava, ou pelo menos adiava indefinidamente a reforma da carta constitucional, declaro a v. ex.ª que não lhe dava o meu voto, antes me oppunha com todas as forças. Creio, porém, que é exactamente o contrario. D'este projecto infere-se logicamente que a reforma da carta é cada vez mais urgente, porque querendo respeitar a carta, chegámos a estes resultados! (Apoiados.) Chegamos a uma reforma anodyna, que não ha de trazer nem as grandes vantagens que os seus auctores suppozeram, nem tão pouco os inconvenientes que muitas pessoas imaginaram. Repito, esta reforma é perfeitamente secundaria. Esta reforma não dá nem tira vida á camara dos pares. Se porventura chegar o momento da transformação radical da camara dos pares, creia v. ex.ª que esta reforma não póde ser a sua ancora de salvação. (Apoiados) E senão vêl-o-hemos, quando soar esse momento, que não vem longe.

O que representa a camara dos pares em Portugal?

Representa por um lado a prerogativa regia; por outro

Sessão de 15 de abril de 1878

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

lado a aristrocacia. Representa por um lado a nomeação pelo Rei; por outro lado a hereditariedade.

Respeito e acato a prerogativa do chefe do estado. Não comprehendo mesmo que o chefe do estado, quer o paiz seja organisado em monarchia constitucional, quer em republica, possa existir e exercer as suas altas funcções sem certas prerogativas mais ou menos extensas. A prerogativa póde ser exercida singularmente pelo chefe do estado, ou collectivamente com o parlamento, ou em um conselho distado ou por outros meios ainda. Mas a prerogativa ha de existir. Quaes os limites d'ella n'um paiz bem constituido? Eis a questão.

Não discuto aqui a prerogativa regia em Portugal, mas estou no meu direito de dizer a minha opinião a este respeito.

E a minha opinião é que a prerogativa regia, como está determinada na carta constitucional, é demasiadamente larga, é excessiva, passa os limites necessarios.

O poder moderador é portanto absorvente de todos os poderes, emquanto a prerogativa regia não for o que deve ser.

E a camara dos pares, representando na sua maxima parte a prerogativa regia, que tem a faculdade de fazer tantas fornadas, quantas queira, é viciosa e exaucturada n'uma das suas origens.

Passemos agora á hereditariedade. Julgo-a insustentavel perante os principios sobre os quaes assentam as sociedades modernas, perante a propria rasão, perante a dignidade do parlamento e sobretudo perante a tradição d'este paiz.

Não sou jurisconsulto, mas lembrarei aos illustres deputados, que me ouvem, a existencia da lei mental, um dos monumentos da nossa civilisação, na qual um espirito muito previsto, o Rei D. Duarte, filho do heroe de Aljubarrota, determinava que a hereditariedade nos titulos nunca podia ser effectiva.

Os titulos precisariam de uma nova investidura concedida pelos reinantes.

Hoje mesmo, sabe v. ex.ª e sabe a camara que quando ha transmissão de titulos, é preciso uma revalidação pelo chefe do estado.

Comprehenderia até certo ponto a hereditariedade, se a nossa sociedade estivesse organisada como em Inglaterra, se a propriedade, longe de ser allodial como é hoje, tivesse ainda a natureza de vinculo. Então haveria a verdadeira aristocracia tradicional, influente, oligarchica, que representaria uma grande força social.

A escola liberal em Portugal deu um golpe profundo, mortal, na aristocracia, quando exterminou os vinculos e a propriedade de mão morta.

O que póde pois representar a aristocracia em Portugal? Nada. Representa quando muito, ou o favoritismo ou o emprego publico.

Nós que temos uma sociedade organisada democraticamente; nós que caminhâmos para a democracia, não podemos comprehender uma aristocracia legislativa, sem o poderio e influencia que ainda exerce em Inglaterra a camara dos lords.

De novo o repito, não comprehendo que possa ser representante da aristocracia um homem que tem toda a sua fortuna empregada em fundos publicos, ou em uma fabrica, em qualquer ramo de industria, emfim, que tenha a sua fortuna empregada em bens mobiliarios.

A aristocracia só póde viver ligada á terra, ao vinculo territorial.

Competia-me, em nome das minhas idéas, de protestar com toda a franqueza contra a hereditariedade, e contra a prerogativa, como a define, ou antes, como a não define a carta constitucional.

Approvando esta lei que é, apesar de todos os seus defeitos, um progresso, posto que quasi microscopico, ao que está não podia de modo algum deixar de manifestar com clareza quaes as minhas idéas sobre o assumpto, recommendando, cada vez mais, a urgente necessidade da reforma da carta, por modo que as nossas instituições fiquem harmónicas com a civilisação actual.

Dito isto mais em fórma de protesto, ou de profissão de fé, do que com o proposito de difficultar o andamento da lei, ou de elucidar a discussão, nada mais tenho a acrescentar.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Secretario (Mouta e Vasconcellos): — A commissão de redacção não fez alteração ao projecto n.º 63.

O sr. Luciano de Castro: — Eu pergunto a v. ex.ª se ha alguem inscripto a favor do projecto: o illustre deputado que acabou de fallar foi contra; eu tambem sou contra; por conseguinte perguntava se havia alguem para fallar a favor.

O sr. Julio de Vilhena. — Pedi a palavra para declarar a v. ex.ª e á camara que eu, como relator do projecto, tencionava responder não só ao illustre deputado como ao sr. visconde de Moreira de Rey. Por parte da defeza não ha mais ninguem inscripto; e eu espero que o illustre deputado combata o projecto e eu depois responderei.

O sr. Luciano de Castro: — Se eu cedesse n'este momento da palavra o illustre relator da commissão não deixava fechar a discussão sem pedir a palavra.

Parece que o illustre relator da commissão não quer fallar sem que eu tome a palavra n'este debate; s. ex.ª está no proposito de querer responder ás observações que eu haja de fazer, de outra maneira não se comprehende que tendo fallado um sr. deputado cuja voz auctorisada estamos acostumados a ouvir n'esta casa, e que aliás censurou o projecto como inconstitucional, fez considerações dignas de se lhe responder, e deixasse sem resposta. Parecia-me natural que agora se levantasse alguem da maioria ou o illustre relator da commissão para defender o projecto.

(Interrupção do sr. Julio de Vilhena.)

Tenho muito prazer em que s. ex.ª me dê a honra de responder ás observações que haja de fazer; mas realmente parecia-me que para podermos caminhar melhor na discussão, que s. ex.ª o sr. relator da commissão respondesse ao sr. visconde de Moreira de Rey; mesmo porque é até das disposições do regimento que a inscripção se faça pró e contra.

Portanto, se v. ex.ª permitte, eu cedo agora da palavra para fallar o sr. relator da commissão, e eu usarei d'ella depois de s. ex.ª, ou na especialidade.

O sr. Julio de Vilhena: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Teixeira de Vasconcellos: — São duas palavras só.

Eu não fazia tenção de tornar a entrar no debate, porque esperava que o sr. relator da commissão, tomando o exemplo do membro do governo, que estava presente n'essa occasião, me não respondesse, como eu lhe tinha pedido.

Effectivamente tinha-lhe pedido que me não respondesse, e o mesmo pedi ao governo; porque não desejo collocar em má situação os meus collegas e amigos, e sabia que nem uns nem outros tinham nada para me responder.

E tanto isto é verdade, que o illustre relator da commissão, o sr. Julio de Vilhena, só teve para me dizer que as suas opiniões pessoaes eram as minhas, mas que elle fallava como relator da commissão. Quer dizer, fallava como se tivesse assignado vencido, porque não se póde ter uma opinião individual, e defender aquella em que não se concorda: o que se póde é expol-a bem.

Já se vê que, quando uma causa se não póde defender, e se confessa que pessoalmente se é da opinião de quem a ataca, essa causa é uma causa perdida.

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Eu pedi a palavra principalmente quando s. ex.ª disse que havia n'estas categorias uma pela qual os socios da academia podiam entrar para o pariato, se na academia houvesse algum que estivesse no caso de ter os requisitos necessarios pelos seus talentos ou pelo seu saber.

Pois s. ex.ª duvida do que na primeira associação scientifica do paiz...

O sr. Julio de Vilhena: — Duvido tanto, que entendi que todos podiam ser nomeados.

O Orador: — Mas para que servia então a oração condicional que s. ex.ª empregou «se lá houver», se v. ex.ª conhece aquelles que ainda ha pouco lhe abriram as portas d'aquella casa?

S. ex.ª não acceitava, de certo, a qualidade de socio correspondente da academia real das sciencias, se lhe fosse dada por uma corporação em que por acaso se encontrasse algum homem que não se podesse sentar a par dos brigadeiros, dos ajudantes do procurador geral da corôa, dos juizes, dos professores, e outras classes que são consideradas como categorias para o pariato.

Eu e todos nós que estamos n'esta casa e que somos socios effectivos d'aquella corporação, aceitamos a discussão de nome com nome, e talvez que os representantes de outras classes não possam acceitar a mesma condição.

Pelo que diz respeito ao projecto, já disse como o considero, não tenho nada a acrescentar.

(O orador não reviu os discursos que proferiu n'esta sessão.)

O sr. Julio de Vilhena: —...(O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado neste logar.)

O sr. Visconde de Moreira de Rey: —...(O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Luciano de Castro: — V. ex.ª deu-me a palavra, mas eu creio que são já seis horas.

Se v. ex.ª quer que eu comece a fallar, começo; mas declaro que não tenho tempo de concluir hoje e que tenho a dizer, e por isso parece-me melhor, em vez de começar hoje para continuar ámanhã, fallar amanha unicamente.

O sr. Presidente: — Effectivamente muito pouco falta para dar a hora. Se o sr. deputado quer reservar a palavra para ámanhã, eu fecho a sessão.

O sr. Luciano de Castro: — Parece-me que é melhor resorvarme para ámanhã.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a mesma de hoje, e mais os projectos n.ºs 78, 81 e 82.

Está levantada a sessão.

Eram quasi seis horas da tarde.

Sessão de 15 de abril de 1878

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