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SESSÃO DE 14 DE ABRIL DE 1888

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos srs.

Francisco José do Medeiros
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral

SUMMARIO

Lêem-se na mesa quatro officios recebidos, um do ministerio do reino, com alguns esclarecimentos sobre a escola normal de Lisboa, requerimentos pelo sr. João Pinto; outro do ministerio da fazenda, igualmente acompanhado de diversos documentos pedidos pelo sr Antonio Maria de Carvalho, relativamente ao emprestimo para estradas; outro do governador civil de Coimbra, com 150 exemplares do relatorio sobre a investigação do bacillus typhicus nas aguas potaveis d'aquella cidade, e outro do presidente da junta do credito publico, remettendo exemplares do relatorio e coutas, relativos ás gerencias de 1886-1887 e exercicios de 1885-1886 - Tem segunda leitura, e é admittida, uma proposta do sr. barão de Combarjúa para renovação de iniciativa do projecto de lei n.º 89-G, de 1880, creando uma escola de direito na capital da India portugueza. - Representação da associação de agricultura portugueza, apresentada pelo sr. Almeida e Brito. - O sr Eduardo villaça manda para a mesa o parecer das commissões reunidas de fazenda e de obras publicas, sobre á proposta de lei relativa ao porto da Leixões. - O sr. Henrique de Sá Nogueira chama a attenção do governo para o estado da ponte do caminho de ferro de leste sobre o Tejo. Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - Os srs. Manuel José Vieira e Teixeira de Vasconcellos apresentam requerimentos de interesse particular. - O sr. Serpa Pinto dirige duas perguntas ao sr. ministro da fazenda, que lhe responde em seguida. - Entrando n'este momento na sala o sr. Pinheiro Chagas, acompanhado de muitos dos seus collegas da opposição, que o tinham ido receber á sua chegada pede a palavra o sr. Manuel d'Assumpção, e, depois de se congratular com a camara e manifestar o seu jubilo pelo restabelecimento d'aquelle illustre deputado e pelo seu regresso ao parlamento, pede que, de algum modo, se consigne na acta a satisfação da camara por estes factos. - O sr ministro da fazenda, por si e em nome do governo, associa-se a esta manifestação de regosijo. - Exprimem iguaes sentimentos os srs Arroyo e Lobo d'Avila, este ultimo em seu nome e no da maioria. Responde a todos, extremamente commovido, o sr. Pinheiro Chagas, agradecendo-lhes e protestando ao mesmo tempo á camara o seu profundo reconhecimento pela manifestação de sympathia que d'ella recebêra. - Como interprete dos sentimentos de todos os srs. deputados, propõe o sr. presidente, e é approvado por acclamação, que se consigne na acta a viva e cordial satisfação com que foi saudado pela camara o estabelecimento do sr. Pinheiro Chagas e o sou regresso no parlamento. - Dirigem-se a comprimental-o os srs. presidente, secretarios, ministro dos negocios da fazenda e quasi todos os srs. deputados presentes. - Toma em seguida a palavra o sr. Franco Castello Branco, e, depois de se referir ao incidente, manifestando a sua satisfação e sublinhando o tacto da reconciliação pessoal do sr. Marianno de Carvalho com o sr. Pinheiro Chagas, pede no sr. ministro da fazenda para transmittir ao seu collega das obras publicas o desejo de que s. exa. compareça, a fim de lhe dirigir algumas perguntas relativamente a caminhos de ferro. Responde o sr ministro da fazenda.

Na ordem do dia continua a discussão do projecto de lei n.º 23, que altera o regimen sobre o fabrico dos tabacos. - Usa largamente da palavra o sr. ministro da fazenda, respondendo aos oradores da opposição, o em especial ao sr. Franco Castello Branco. - Declaração do sr. Carrilho, por parte da commissão do fazenda. - Proroga-se a sessão a requerimento do sr Santos Crespo. - Apresenta e sustenta uma moção de ordem o sr. Dias Ferreira, que combate largamente o projecto - A requerimento do sr. Mazziotti julga se a matéria discutida. - Mandam para a mesa propostas relativas ao projecto os srs. Abreu Castello Branco, Jacinto Candido, Silva Cordeiro, Alves Matheus, José de Azevedo e D. José de Saldanha - Pede para retirai a sua moção de ordem o sr. Antonio Maria de Carvalho. - Declaração do sr. relator, Vicente Monteiro, com respeito ás propostas apresentadas. - Requer o sr. Consiglieri que as propostas mandadas para a mesa, depois de encerrada a discussão, sejam enviadas á respectiva commissão. É combatido este requerimento pelo sr. Antonio Maria de Carvalho e defendido pelo seu auctor e pelo sr Arroyo. - Explicações do sr. relator Vicente Monteiro Responde-lhe o sr José de Azevedo Castello Branco - Tomam parte n'este debate os srs. Hintze Ribeiro, D José de Saldanha, Lopo Vaz e ministro da fazenda, com quem troca explicações o sr Consiglieri Pedroso. - Usam novamente da palavra sobre o incidente os srs José de Azevedo Castello Branco e João Arroyo, insistindo em que as propostas devem ir á commissão. Responde-lhes o sr Antonio Maria de Carvalho, e a este o sr Franco Castello Branco, que ao mesmo tempo troca explicações com o sr. presidente. - Usa tambem da palavra sobre o modo de propor o sr. Eduardo de Abreu, para pedir a publicação das suas propostas no Diario do governo, se não forem submettidas ao exame da commissão. - O sr. Consiglieri modifica o seu requerimento no sentido de ser aqrado o projecto, salvas as emendas que devem ír á commissão. É rejeitado. - O sr. Lopo Vaz requer que as propostas apresentadas depois de fechada a discussão do projecto vão á commissão, e que o respectivo parecer seja apresentado na segunda feira. - Trocam-se explicações entro o mesmo sr deputado, o sr. presidente e o sr. ministro da fazenda, que concorda com aquelle requerimento - Protesta contra este alvitre o sr. Fuschini. Responde-lhe o mesmo sr. ministro - É approvado o requerimento. - Seguidamente é rejeitada a proposta de adiamento e a moção do sr Arroyo e retiradas as moções dos srs. Antonio Maria de Carvalho, Consiglieri o, Centeno. - Declarações do sr relator com respeito ás propostas apresentadas pelo sr. Fuschini. - O sr. Franco Castello Branco pede um esclarecimento ao sr ministro da fazenda, que lhe responde em seguida. - E approvado o artigo 1.° do projecto, conjunctamente com a base l.ª - São rejeitadas as propostas do sr. Fuschini, com excepção da parte que foi acceita pela commissão. - Approvam-se as bases 2.ª e 3 ª, salvas as emendas já approvadas. - Declaração do sr. relator com referencia á proposta do sr. Alpoim, que é em seguida rejeitada nas mesmas condições da anterior. - Approva-se a base 4.ª, salva a modificação proposta pelo sr. Alpoim e acceita pela commissão - Declara o sr. Vicente Monteiro, em nome da commissão, que não acceita a proposta do sr. Franco Castello Branco - É rejeitada. - Approvam se em seguida as bases restantes e o artigo 2 º do projecto. - Por concessão especial usa da palavra o sr Consiglieri para se associar á manifestação com que a camara saudou o sr. Pinheiro Chagas.

Abertura da sessão - As duas horas e tres quartos da tarde.

Presentes á chamada 49 srs. deputados. São os seguintes: - Serpa Pinto, Alves da Fonseca, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Mazziotti, Barão de Combarjúa, Bernardo Machado, Madeira Pinto, Almeida e Brito, Francisco de Barros, Francisco Machado, Francisco Ravasco, Sá Nogueira, Candido da Silva, Pires Villar, João Pina, Franco de Castello Branco, João Arroyo, Menezes Parreira, Teixeira de Vasconcellos, Rodrigues dos Santos, Sousa Machado, Alfredo Ribeiro, Oliveira Martins, Amorim Novaes, José Castello Branco, Pereira de Matos. Ferreira de Almeida, Abreu Castello Branco, Alpoim, José Maria de Andrade, Rodrigues de Carvalho, José de Saldanha (D.), Julio Graça, Luiz José Dias, Bandeira Coelho, Manuel d'Assumpção, Manuel José Correia, Manuel José Vieira, Marianno de Carvalho, Marianno Prezado, Martinho Tenreiro, Miguel da Silveira, Miguel Dantas, Pedro de Lencastre (D.), Pedro Victor, Vicente Monteiro, Estrella Braga e Visconde de Silves.

Entraram durante a sessão os srs.: - Albano de Mello, Moraes Carvalho, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Antonio Castello Branco, Baptista de Sousa, Campos Valdez, Ribeiro Ferreira, Gomes Neto, Pereira Borges, Guimarães Pedrosa, Antonio Maria de Carvalho, Jalles, Pereira Carrilho, Barros e Sá, Simões dos Reis, Hintze Ribeiro, Santos Crespo. Augusto Fuschini, Miranda Montenegro, Augusto Ribeiro, Lobo d'Avila, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Eduardo de Abreu, Eduardo José Coelho, Elizeu Serpa, Emygdio Julio Navarro, Estevão de Oliveira, Mattoso Santos, Fernando Coutinho (D.), Freitas Branco, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Castro Monteiro, Fernandes Vaz, Francisco de Medeiros, Lucena e Faro, Soares de Moura, Severino de Avellar, Guilherme de Abreu, Guilhermino de Barros, Cardoso Valente, Izidro dos Reis, Santiago Gouveia, Vieira de Castro, Alves Matheus, Silva Cordeiro, Joaquim da Veiga, Simões Ferreira, Alves de Moura, Avellar Machado,

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Barbosa Colen, Eça de Azevedo, Dias Ferreira, Elias Garcia, Laranjo, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Oliveira Matos, Santos Moreira, Abreu e Sousa, Julio Pires, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Vieira Lisboa, Poças Falcão, Manuel Espregueira, Brito Fernandes, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Pedro Monteiro e Consiglieri Pedroso.

Não compareceram á sessão os srs.: - Alfredo Brandão, Anselmo de Andrade, Sousa e Silva, Antonio Candido, Oliveira Pacheco, Antonio Ennes, Tavares Crespo, Moraes Sarmento, Fontes Ganhado, Augusto Pimentel, Victor dos Santos, Conde de Fonte Bella, Elvino de Brito, Góes Pinto, Feliciano Teixeira, Francisco Mattoso, Frederico Arouca, Gabriel Ramires, Sant'Anna e Vasconcellos, Casal Ribeiro, Baima de Bastos, Souto Rodrigues, Dias Gallas, Correia Leal, Oliveira Valle, Joaquim Maria Leite, Jorge de Mello (D.), Jorge O'Neill. Ferreira Galvão, Ruivo Godinho, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, José de Napoles, Ferreira Freire, Barbosa de Magalhães, José Maria dos Santos, Simões Dias, Pinto Mascarenhas, Santos Reis, Mancellos Ferraz Matheus de Azevedo, Sebastião Nobrega, Dantas Baracho, Visconde de Monsaraz, Visconde da Torre e Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio do reino, remettendo as copias requeridas em sessão de 6 do corrente mez, pelo sr. deputado J. P. Rodrigues dos Santos.
A secretaria.

Do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Antonio Maria de Carvalho, os documentos acerca do emprestimo destinado á construcção das estradas.

Para a secretaria.

Da junta do credito publico, remettendo 150 exempla rés do relatorio e contas da junta do credito publico, relativas á gerência de 1836-1887 e exercicio do 1885-1886.

Mandaram-se distribuir.

Do governo civil de Coimbra, remettendo 160 exemplares do relatorio apresentado poios professores da faculdade de medicina da universidade de Coimbra, os srs. Philomeno da Camara Mello Cabral e Augusto Antonio da Rocha, sobre a investigação do Bacillus typhicus nas aguas potaveis d'aquella cidade.

Mandaram-se distribuir.

Segunda leitura

Renovação de iniciativa

Renovo a iniciativa do projecto de lei de 14 de fevereiro de 1880, n.° 89-G, para a creação de uma escola de direito na capital da India portugueza.

Sala das sessões, 13 de abril do 1838. - Barão de Combarjua.

Lida na mesa, foi admittida e enviada ás commissões do ultramar e de instrucção superior e especial, ouvida a de fazenda.

A renovação refere se ao seguinte:

Projecto do lei

Senhores. - No ultramar, onde, como no reino, se discutem perante os tribunaes de justiça os mais vitaes interesses dos cidadãos, a profissão de advogado, que só por excepção é ahi exercida por individuos formados em direito, carece de ser levantada a toda a altura da sua importante missão.

Urge que se lhe facilitem os meios de se illustrar e de sustentar pela sua independencia os seus fóros de nobreza, o n'este intuito julgo impreterivel a creação, em alguma das provincias ultramarinas, de uma escola de direito para & habilitação technica dos que n ellas pretendem advogar.

O estado da India portuguesa, pela, sua cultura intellectual, e por outras circumstancias que n'elle concorrem, é sem duvida, o que mais elementos e melhores garantias offerece para sede do um estabelecimento d'aquella ordem; mas como infelizmente os sou s recursos são ainda minguados para Decorrerem a todos os ramos do serviço publico que ahi demandam urgente reforma, sem aspirarmos ao optimo, é forçoso que por agora nos limitemos ao absolutamente indispensavel. As lições de experiencias, o desenvolvimento da receita publica na linha, o porventura, o auxilio de outras provincias que compartilhem dos beneficies d'essa instituição, farão o resto.

Attendendo pois, ás indicações da actualidade, e harmonisando possivelmente as exigencias do foro com as justas aspirações dos nossos compatriotas de alem mar, tenho a honra de submetter á apreciação da camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É creada, na capital da India portugueza, uma escola de direito, denominada escola de direito de Nova Goa.

Art. 2.° Os individuos, habilitados com a carta do curso d'esta escola, suo aptos para advogar em todas as provincias ultramarinas.

Art. 3.º A escola de direito de Nova Goa é regida por tres professores, bachareis ou doutores formados em direito e nomeados pelo governo, mediante concurso.

§ 1.° Na falta, ou impedimento legal dos professores, serão chamados, para a regencia, das cadeiras, individuos, habilitados nos termos da presente lei, e quando os não haja, advogados provisorios.

§ 2 ° Os substitutos, a que se refere o paragrapho antecedente, são nomeados pelo governador geral, sob proposta do conselho escolar

Art. 4 ° Os professores vencem o ordenado annual do 1:800$000 réis.

§ unico. Os substitutas vencem, por mez, 50$000 réis.

Art. 5.º Um dos professores, da escolha do governo, exerce o cargo de director do estabelecimento, e percebe a gratificação de 1:800$00 réis annuaes.

Art. 6.° A jubilação dos professores é concedida nos seguintes termos:

1.° O exercicio do magisterio, por dez annos effectivos, dá direito á primeira jubilação com 900$000 réis annuaes;

2.° O mesmo exercicio, por dezeseis annos effectivos, dá direito á segunda jubilação com 1.800$000 réis annuaes.

Art. 7.° Podem os professores continuar no exercido do magisterio, depois da segunda jubilação, uma vez que exhibam documentos da sua aptidão physica.

§ 1.° Nas circumstancias mencionadas n'este artigo, os professores percebem, como gratificação, o acrescimo de mais 1/16 de ordenado annual por cada anno que leccionarem.

§ 2.° A gratificação, proveniente do acrescimo sobre o ordenado, nunca poderá exceder de 1:800$000 réis annuaes.

Art. 8.° É permittido aos professores o exercicio na profissão de advogado no estado da India, quando do uso d'essa permissão não resulte prejuizo ás funcções do magisterio.

Art. 9.° O curso da escola de direito de Nova Goa comprehende as seguintes doutrinas:

No 1.º anno:

Direito natural - Elementos de direito romano e publico - Direito civil (l.ª parte).

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No 2.° anno:
Direito civil (2.ª parte) - Direito administrativo - Direito commercial.

No 3.° anno:
Direito ecclesiastico - Direito pessoal - Theoria e codigo do processo.

Art. 10,° São requisitos necessarios para a admissão da matricula, certidões de approvação das seguintes disciplinas:

Portuguez;
Latim e latinidade;
Francez;
Geographia e historia;
Philosophia e rhetorica;
Mathematica elementar.

Art. 11.° São complementos indispensaveis para o exame de habilitação final
certidões de approvação das seguintes disciplinas:

Inglez, maratha ou guzerate;
Economia politica.

§ unico. São validas, sendo obtidas nas escolas do governo da India ingleza, as approvações das linguas mencionadas n'este artigo.

Art. 12.° A certidão de approvação nas materias de um anno de curso é habilitação indispensavel para a matricula no anno immediatamente seguinte; e a certidão de approvação do terceiro anno do curso para os exames de habilitação final.

Art. 13.° A approvação nos exames de habilitação final dá direito á carta do curso.

Art. 14.° Os alumnos pagarão:

l.° Pela matricula annual 6$000 réis;
2.° Pelo encerramento annual 6$000 réis;
3.° Pelo diploma da carta do curso 30&000 réis.

Art. 15.° O producto das propinas pagas pelos alumnos na conformidade do artigo antecedente, passará ao thesouro publico com exclusão de 200$000 réis annuaes, que serão applicados pelo conselho escolar:

1.° Nas despezas do expediente da escola;
2.° Na acquisição de publicações litterarias e scientificas que possam ser utilmente consultadas pelo corpo docente e pelos alumnos.

Art. 16.º Dm secretario, com encargo de bibliothecario, e um continuo completam o pessoal do estabelecimento.

§ 1.° O secretario da escola tem o ordenado annual de 240$000 réis, e o continuo de 120$000.

§ 2.° O secretario e o continuo são propostos pelo conselho escolar e nomeados pelo governador geral

Art. 17.° Todas as quantias acima designadas são em moeda fraca provincial.

Art. 18.º O governo adoptará as providencias necessarias para n execução da presente lei.

Art. 19.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara, 14 de fevereiro de 1880. = O deputado, Barão de Combarjua.

REPRESENTAÇÃO

Da direcção da real associação de agricultura portuguesa, contra a representação apresentada no parlamento pelas fabricas de moagens. _ .

Aprontada pelo sr. deputado Almeida e Brito, enviada á commissão de fazenda, ouvida a de obras publicas, e manda já publicar no Diario do governo,

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

Do alferes reformado Sabino José de Ornellas e Vasconcellos pedindo melhoria de reforma.

Apresentado pilo sr. deputado Manuel José Vieira e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

De sessenta e quatro officiaes inferiores do exercito, pedindo augmento de soldo.

Apresentados pelo sr. deputado Teixeira de Vasconcellos e enviados á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

O sr. Villaça: - Sr. presidente, mando para a mesa um parecer das commissões reunidas de fazenda e de obras publicas, sobre a proposta de lei relativa ao porto de Leixões.

A imprimir.

O sr. Sá Nogueira: - Sr. presidente, não está presente o sr. ministro das obras publicas, a quem especialmente me queria dirigir, mas espero que o sr. ministro da fazenda communicará ao seu collega as observações que vou fazer, e tanto mais que o assumpto é importante.

Refiro-me ao estado de ruina em que se encontra a ponte do caminho de ferro sobre o Tejo, proximo á villa de Abrantes.

A companhia real doa caminhos de ferro, por certo melhor conhecedora do que ninguem do estado das suas linhas, está construindo já uma nova ponte junto á actual; mas, no entanto, o serviço de passageiros e mercadorias continua a fazer-se pela ponte existente, com o risco de qualquer dia termos a lamentar uma catastrophe, cujas consequencias gravissimas escuso de encarecer, porquee todos as comprehendem

Quem conhece o estado lastimoso em que se encontra aquella ponte abstem-se, quanto possivel, de a atravessar; e assim, a população de Abrantes, segundo dizem, abandonou quasi completamente a sua estação, para o serviço de passageiros, e vão tomar o comboio á estação da Praia, que lhe fica, creio, que a tres leguas de distancia.

Muitas pessoas do alto Alemtejo, e de Portalegre conheço bastantes, preferem, ao risco de um desastre, o incommodo de percorrer de carruagem ou a cavallo 55 kilometros para irem a Extremoz tomar os comboios da linha do baixo Alemtejo.

N'estas circumstancias, parecia-me conveniente, como medida de prudencia, que o
serviço entre as duas margens do Tejo, emquanto a nova ponte não se conclue, se fizesse por meio de trasbordo.

Bem sei que este meio é incommodo, mas é de certo preferivel ao risco de uma catastrophe.

Tenho plena confiança na provada solicitude do sr. ministro das obras publicas, por tudo quanto se relacione com os interesses do paiz, e por isso espero que s. exa. dará todas as providencias necessarias, mas com a urgencia que o assumpto reclame, para que não tenhamos a lamentar alguma grande desgraça.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Responde ao orador precedente que, segundo as informações que lhe haviam sido dadas pelo seu collega das obras publicas, a ponte já fôra examinada por engenheiros da companhia e do governo, sendo estes de parecer que ella, comquanto não prometta uma longa duração não offerece, comtudo, perigo algum no momento actual e ainda por um periodo de tempo suficientemente largo.
(O discurso será publicado em appendice a esta sessão. quando s. exa. o restituir.)

No momento em que o sr. ministro terminava o seu discurso, notou se que quasi todos os srs. deputados, pertencentes á opposição regeneradora, saíam dos seus lagares dirigindo-se apressadamente para o corredor da camara.

O sr. Serpa Pinto: - Sr. presidente, eu pedi a palavra porque desejo dirigir duas perguntas ao sr. ministro da fazenda...
(Pausa.)

Entra na sala o sr. Pinheiro Chagas acompanhado dos seus collegas da opposição que sabendo da sua chegada ao edificio das côrtes haviam ído ao seu encontro.

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Dirigem-se immediatamente a cumprimental-o alguns srs. deputadas da maioria.

O Orador (continuando): - Confesso a v. exa., sr. presidente, que é tão estranha a minha commoção n'este momento por tornar a ver n'esta casa o mais estrénuo dos combatentes d'este lado da camara, o mais distincto orador do parlamento, que eu me sinto pequeno e como que envergonhado por ter de usar agora da palavra.

O sr. Manuel d'Assumpção: - Peço a palavra.

O Orador: - Em todo o caso cumprirei o meu dever e deitando á eloquencia de outros oradores a manifestação do jubilo que nos causa tão agradavel acontecimento, se rei muito breve no que tenho a dizer ao sr. ministro da fazenda.

Em primeiro logar, desejo que s. exa. me diga o que ha de verdade acerca do emprestimo para estradas. Já se fallou n'isso aqui e a imprensa tambem se tem occupado do incarno assumpto, mas nada se sabe ao certo.

S. exa. desmentiu a imprensa e a imprensa desmente o sr. ministro. S exa. diz uma cousa no parlamento, mas lá fóra diz se outra e eu desejo por isso ouvir explicações categoricas a este respeito; isto é, desejo que o sr. ministro da fazenda declare do um modo positivo se o emprestimo está ou não negociado.

Quanto á outra pergunta não se refere ella a assumpto dependente da pasta da fazenda; mas ainda assim talvez s. exa. me possa responder.

A companhia real dos caminhos de ferro do norte e lesto tinha obrigação de construir um ramal de Torres á Merciana dentro de um certo praso, que já expirou. Esse praso foi prorogado e está também a terminar, sem que o ramal esteja construido. Desejo, pois, sabor porque é que o governo não obrigou a companhia a cumprir essa condição do contrato, São estas as rainhas perguntas.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - A primeira pergunta respondo que não ha contradicção alguma no que eu disse aqui, com o que diz a imprensa.

No dia em que me perguntaram se o emprestimo estava contratado, eu disse que não estava; e realmente não estava; hoje respondo que está, e em condições que me parecem boas para o paiz.

Com respeito ao segundo ponto, que se refere á companhia dos caminhos de ferro, esse assumpto não cone pela minha pasta, e, portanto, não posso dar informações completas a s exa.

Só o ramal de Runa não está concluido, nem sequer começado, de quem é a responsabilidade não sei eu; mas o que posso afiançar ao illustre deputado é que o traçado ainda não passou do primitivo concessionario para a companhia dos caminhos de ferro.

Posso tambem dizer ao illustre deputado que quando eu era administrador da companhia, já havia negociações para ser substituido por outros o ramal de que se trata.

E nada mais posso informar.
(S. exa. não reviu.)

O sr. Serpa Pinto: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se me permitte usar novamente da palavra para responder ao sr. ministro.

Foi concedido.

O sr. Serpa Pinto: - Uma vez que o emprestimo está negociado, simplesmente quero pedir a s. exa. que mande publicar officialmente o modo como elle foi contratado, ou que mande a esta camara uma nota com esse esclarecimento.

Quanto á segunda pergunta, não me admiro que s. exa. ignore a questão do ramal a que me referi, porque s. exa. anda sempre muito mal informado a respeito dos negocios da companhia dos caminhos de ferro do norte e leste.

Sr. presidente, ou disse a v. exa. que seria breve, e por isso nada mais acrescentarei, reservando-me para outra occasião conversar com o sr. ministro sobre os dois pontos de que me occupei.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho):- Com respeito aos documentos relativos ao emprestimo, digo ao illustre deputado que serão publicados, na proxima semana, no Diario do governo, todos os que o devem ser e que os restantes serão remettidos a esta camara.

Quanto á construcção do ramal do caminho de ferro, a que s. exa. se referiu, eu não posso ter um conhecimento minucioso do estado das negociações para esse fim, porque o assumpto corre pela pasta do meu collega das obras publicas, e portanto só quando s. exa. vier a esta camara poderá o illustre deputado ser informado do que houver.
(s. exa. não reviu.)

O sr. Manuel d'Assumpção (movimento geral de attenção): - Sr. presidente, as grandes alegrias, como as dores cruciantes, quando nos tomam de assalto, perturbam, e quasi suffocam; pois não permitte o coração, vibrando violento, mais do que inarticuladas exclamações. Eu, que n'este instante pretendia entoar um cantico, sinto debil e tomada a voz, falsear-me o intento, e nem sequer logro traduzir em phrases esta immensa alegria que me domina.
Manuel Pinheiro Chagas entra de novo a occupar o seu posto de honra no parlamento, e este facto que deveria ser saudado com os requintes da mais nobre e florida eloquencia, encontra a minha palavra froixa, descolorida, entrecortada pela commoção, que mal póde pallidamente expressar o sentimento enorme da minha alma.

Perdoe-mo v. exa. e a camara se tão ousadamente, e com tão fraca voz, me antecipei a ser interpetre do sentimento de nós todos. E digo nós todos, porque estou convencido de que a todos os membros d'esta camara, a todos os que me escutam, domina n'esta occasião igual sentir. (Apoiados.)

Sim, sr. presidente, qualquer que seja a nossa divergencia de opiniões, sejam quaes forem as luctas em que andamos empenhados, todos nós somos portuguezes, todos nós amâmos este formosissimo Portugal, nos orgulhâmos das suas glorias, e estremecemos vaidosos os seus filhos, sobretudo quando são tão distinctos, tão elevados, tão nobres, tão illustrados, tão gentis, como Manuel Pinheiro Chagas.

Vozes: - Bravo, bravo.

O Orador: - E, pois, unanime a camara n'esta alegria, e igualmente sincera na sua manifestação. (Vozes: - Muito bem.)

Estamos descansados; passaram as horas do perigo, aquelles dias tristes em que sobre este paiz parecia pairar a sombra da aza negra de anjo, annunciador de uma grande desgraça. A Providencia velava e não permittiu que n'um momento fatal tombasse no sepulchro aquella cabeça onde havia tanta luz; que, como estrella que se apaga para sempre, se extinguisse de vez aquelle talento brilhante que fulge e scintilla, como explende e irradia o meteoro pelo espaço; que gelasse aquelle nobre coração que sabe comprehender todos os sacrificios, pelos seus a quem estremece, pela patria a quem adora; que fosse aniquillada aquella formosissima intelligencia que atraves das fadigas árduas do trabalho improbo, encontrou sempre tempo e logar, para animar os que estudam, o trabalham, para os aconselhar e dirigir na carreira difficil das letras, e para os applaudir a cada novo triumpho que satisfeito os vê alcançar.

Alma formosissima, grande coração, intelligencia profunda, ainda bem que foste restituido ao convivio do todos os que te prezam; que foste de novo entregue aos teus amigos e collegas, restituido ao teu paiz, salvo para o coração da tua familia! (Apoiados.}

Termino, sr. presidente, fazendo um voto, uma proposta se é necessaria, para que na acta da sessão de hoje fique de algum modo expressa a alegria, que sente a camara dos deputados, por ter de novo no seu seio, Manuel Pinheiro Chagas. (Muitos apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

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O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Não tinha acompanhado a resposta que deu ha pouco ao sr. Serpa Pinto, com reflexões algumas acerca do acontecimento feliz a que o illustre deputado se referiu, porque não queria privar algum deputado do lado esquerdo da camara de ser o primeiro a manifestar os sentimentos de regosijo e alegria que todos ali sentiam por verem completamente restabelecido e de novo entre os seus collegas o sr. Pinheiro Chagas.

N'este momento, quer apenas dizer que o governo se associa cordialmente aos nobilíssimos sentimentos manifestados pelo sr. Manuel d'Assumpção, e que agradecerá, como se fossem feitas a elle proprio, todas quantas manifestações a camara queira dar do seu jubilo pelo restabelecimento do sr. Pinheiro Chagas, e pelo facto de s. exa. vir de novo honrar esta casa com a sua presença e com o seu talento. (Vozes: - Muito bem. (Apoiados geraes.)
(O orador ao pronunciar estas palavras manifestava, profunda commoção.)
(S. exa. não reviu.)

O sr. Arroyo: - Sr. presidente, parecerá talvez estranho, depois das phrases eloquentemente proferidas, sentidamente expressas, e profundamente pensadas, do meu illustre amigo o sr. Manuel d'Assumpção; parecerá talvez estranho, depois da saudação feita em termos tão claros, tão nitidos, tão patrioticos e tão alevantados, pelo sr. ministro da fazenda, que eu use da palavra n'este momento.

Mas v. exa. comprehende que o sangue meridional, que o temperamento do individuo, que uma profunda amisade, e mais do que uma profunda amisade, uma enormissima satisfação, manda mais, impera mais do que ajusta admiração pelas palavras brilhantissimas dos srs. Manuel d'Assumpção e Marianno de Carvalho.

E é-me agradavel vir dizer aqui, no seio do parlamento, n'estes poucos instantes roubados á lucta incruenta, sim, mas indefessa, que nós todos travamos com igual patriotismo e com igual lealdade, cada um em defeza do seu credo politico, mas todos em defeza do paiz; é-me extremamente agradavel poder usar da palavra em um d'esses breves instantes, em que pela voz dos correligionarios e adversarios politicos, pela mesma idéas pelas mesmas aspirações, ouço entoar o mesmo cantico, o mesmo grito de alleluia, que sáe de todos os corações, que rebenta espontaneamente dos nossos labios. (Muitos e repetidos apoiados) Sim! Pinheiro Chagas resuscitou para a lucta para a familia, para o parlamento, e para a sua patria, da qual é honra e gloria! (Apoiados. - Vozes: - Muito bem.)

Sim; resuscitou depois de um periodo amarissimo, que fez resaltar dos olhos dos seus mais obstinados e irreconciliaveis adversarios, lagrimas sentidas de compaixão e pezar; depois de uma crise tremenda de dores e angustias em que o paiz inteiro, pela voz dos oradores, pela manifestação unanimo da imprensa, por um movimento geral de sympathia, juntou ao commentario merecido do crime nefando a expressão do maximo affecto e apreço a que um trabalhador, a que um grande espirito póde aspirar! (Apoiados geraes.)

O dia de hoje é de allivio e alegria para a alma nacional. E n'este dia solta a nossa voz irresistivelmente um grito de "viva" por essa individualidade brilhante, que timbra no exercicio de todos os deveres patrioticos; um grito de aviva" por esse espirito amantissimo dos seus e da sua patria, e exemplo vivo para todos nós, amigos e adversarios politicos. (Muitos e repetidos apoiados.)
Quando Pinheiro Chagas regressou de novo a esta casa, preencheu-se um logar, que até então estava interinamente devoluto, porque ninguem podia substituil-o; (Apoiados) porque n'esta individualidade gloriosa ha alguma cousa que brilha mais do que o rutilar da intelligencia, do que o esfusiar do talento; é um thesouro de qualidades de dedicação, de abnegação, de generosidade, que rarissimo se encontra em tão alto grau. (Apoiados - Vozes: - Muito bem.)
Pinheiro Chagas fica na historia parlamentar portugueza como um cerebro modelo servido por uma alma de eleição e por um trabalho herculeo.

Quando um dia a pedra tumular se cerrar sobre o seu corpo, ficará d'elle a memoria de uma altissima individualidade intellectual, que soube alliar a uma obra collossal de parlamentar, de jornalista, de historiador e de artista, no sentido de um immaculado programma litterario e politico, predicados preciosiossimos de coração. A elle a saudação do seu partido; a elle a saudação de todo o parlamento; e parece-me que digo com rasão: a elle n'este momento feliz, e pela minha fraca voz, o protesto de respeito, reconhecimento e admiração, e a expressão do enorme jubilo de todo o Portugal!

Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)

O sr. Carlos Lobo d'Avila: - Mal pensava eu quando ha poucos momentos entrei na camara, que teria de usar da palavra hoje por um motivo, ao mesmo tão grato e tão commevedor para o meu espirito e para o meu coração.

O sr ministro da fazenda, em palavras brilhantissimas, que fazem a maior honra ao seu caracter, (Muitos apoiados.) consignou já a declaração, de que se associava em nome do governo a todas as manifestações de sympathia com que a camara quizesse saudar o sr. Pinheiro Chagas no seu regresso ao parlamento; e eu, embora sem grande auctoridade para isso, mas julgando interpretar os sentimentos de todos os meus collegas da maioria, (Muitos apoiados na direita.) venho em nome d'ella associar-me cordialmente a todas as demonstrações de jubilo partidas d'aquelle lado da camara, (Muitos apoiados na direita.) porque esta manifestação não é de um grupo ou de um partido: traduz os sentimentos do paiz inteiro. (Apoiados geraes )

E se eu tomo para mim a honra de representar n'este momento os meus collegas da maioria, é que me recordo de que, quando eu acabava de entrar na universidade, e atirei para a luz publica, com a audacia da juventude e da inexperiencia, um pobre livro de que ninguem se lembra o que eu proprio não sei já bem do que tratava, foi Pinheiro Chagas que me deu a mão apresentando-me ao publico, com palavras de immerecida e generosa bondade.

Não esqueci este facto quando me assentava nos bancos da opposição e o sr. Pinheiro Chagas era ministro da corôa; (Apoiados.) não o esqueci quando, no meio das luctas ingratas da politica, em mais do una recontro violento, tive de cruzar a minha penna ou a minha palavra com a penna e com a palavra do illustre jornalista e parlamentar; não o podia esquecer hoje, em que se trata de prestar uma homenagem de consideração e sympathia a um homem, que prezo, e cuja vida póde servir de lição e exemplo, sobre tudo aos que amam o estudo e o trabalho. (Muitos apoiados.)

Quando Pinheiro Chagas foi victima de um desastre, o desappareceu subitamente d'aqui, nenhum de nós se lembrou mais das paixões que elle aqui concitara, das palavras vehementes que aqui proferira, no ardor das luctas que aqui se travam.

Mas todos nos lembráramos, com profundo sobresalto, de que estavamos em perigo de perder um grande talento e um nobre caracter. (Vozes: - Muito bem.)

Permitia a camara que eu reavive estas impressões, que estão na memoria de todos, e que nos dão a consoladora certeza de que no meio dos combates ingratos e tanta vez estereis em que nos degladiamos, não se apagam em nós certos sentimentos fundamentaes, que são a honra dos individuos como das sociedades. (Vozes: - Muito bem.)

A camara tomará como a expressão sincera dos meus sentimentos, as poucas palavras que acabo de proferir, e em que supponho ter reproduzide o sentimento de todos os meus collegas da maioria. (Vozes: - Muito bem.)

O sr. Pinheiro Chagas (muito commovido): - Sr. pre-

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sidente; tomando pela primeira vez logar na camara, de pois da longa ausencia a que os illustres deputados acabam de se referir com palavras tão suaves e consoladoras, era minha intenção agradecer desde logo a v. exa. e á camara, o aos membros do governo que por mim se interessaram, a manifestação de sympathia que de todos recebi.

Tencionava agradecer desde logo não só esse carinho e essas consolações que recebi de todos os meus collegas, n'essa occasião, bem amarga da minha vida, mas tambem a homenagem realmente honrosissima que a camara me prestou n'uma manifestação collectiva, quando no periodo mais pungente da minha doença houve por bem mostrar de um modo frisante a sua estima e a sua sympathia por um dos seus membros.

Mas, foi grande a minha surpreza, sr. presidente, quando, ao entrar n'esta casa, vi que alem d'isso, alem dos favores já recebidos, ou tinha tambem que agradecer desde logo as palavras consoladoras e carinhosas que acabo de ouvir, que são injustas talvez, mas que revelam n'aquelles que as proferiram o mais nobre coração e o mais alevantado pensamento. (Vozes: - Muito bem.)

Foi grande, digo, a minha surpreza quando ouvi essas palavras com que foi saudada, sem eu as esperar, a minha modesta volta a esta casa.

Dos meus amigos politicos recebi sempre provas de affecto inolvidaveis.
Constantemente me trataram, não como camaradas mas como irmãos; e agora, pela boca de dois dos mais eloquentes oradores parlamentares, pela palavra vibrante do sr. Manuel d'Assumpção e pela palavra prestigiosa do sr. Arroyo, acabam de confirmar esses sentimentos fraternaes que eu nunca poderei esquecer. (Vozes: - Muito bem.)

Mas, sr. presidente, ainda não é tudo. Eu tenho tambem que agradecer, com profundo reconhecimento, aos meus adversarios politicos, áquelles a quem talvez, involuntariamente, tenho molestado algumas vezes nas lactas apaixonadas da politica, as palavras que me dirigiram e que provam a lealdade do seu caracter e a generosidade do seu coração. (Vozes: - Muito bem.)

Devo principalmente agradecer as palavras do sr. ministro da fazenda, o sr. Marianno de Carvalho, e ninguem como elle sabe, de certo, o que ha de sinceridade profunda n'este agradecimento.
(Sensação.)

Fez-me lembrar que houve um tempo na nossa vida, antes de nos lançarmos n'este campo tempestuoso da politica, em que apertámos fraternalmente as nossas mãos, não pensando um e outro senão no trabalho e no futuro.
(O sr. ministro da fazenda manifesta profunda commoção.)

Estimo que esse tempo como que resuscite n'este momento, e é por isso que me foram altamente agradaveis as phrases que s. exa. se dignou dirigir-me, esquecendo n'esta occasião as luctas asperas e vehementes que entre nós se têem travado. (Applausos geraes.)

E ao meu nobre amigo o sr. Carlos Lobo d'Avila?! A esse tambem eu mio posso deixar de agradecer penhoradissimo o ter-se lembrado de que tive a fortuna de lhe estender a mão no momento em que s. exa. entrava na vida com a aurora prestigiosa do seu grande talento, e o estender-me tambem agora a sua, saudando com a sua brilhante palavra a minha volta a esta casa. (Vozes: - Muto bem.)

Sr. presidente, peco a v. exa., que me desculpe perante a camara se mais cedo não agradeci as suas manifestações de sympathia. V. exa. sabe de certo, que houve um periodo da minha doença em que fui perfeitamente inconsciente; mal chegava ao meu quarto de enfermo, que foi durante alguns dias um quarto de moribundo, o echo do que se passava cá fóra. Nada sabia d'essas manifestações verdadeiramente commovedoras, que por toda a parte se levantaram e em que esta camara tomou parte de um modo tão captivador.

Só quando entrei em franca convalescença é que as conheci e por isso as não agradeci desde logo.

Mas agora peço que na acta se consigno este meu agradecimento, porque não queria de fórma alguma, que dos registos parlamentares só pudesse deduzir, que eu fôra ingrato á manifestação mais sympathica, mais nobre, mais commovente que tenho recebido na minha vida politica; e essa consolação suprema parte não só dos meus amigos e camaradas, mas dos meus adversarios politicos.

Sr. presidente; tão lisonjeiras o tão amaveis manifestações poderão ser injustas; mas correspondem ellas a uma qualidade, que me ufano de ter; e é a de que no meio de todas as luctas politicas, no meio de todas as paixões accesas, que por vezes têem illuminado as minhas palavras, nunca ficou no fundo do meu coração o mais leve sentimento de rancor contra áquelles com quem pelejei. (Apoiados geraes.}

É isto que me auctorisa a acceitar, sem protestar contra a sua injustiça, as palavras cordeaes e honrosas que recebi de ambos os lados da camara.

Vozes: - Muito bem, muito bem.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Creio que interpreto os sentimentos dos srs. deputados de um e outro lado da camara, fazendo consignar na acta, que a camara dos senhores deputados sinceramente felicita o distincto parlamentar, o sr. Pinheiro Chagas, pelo seu estabelecimento, e acolhe com a mais viva e intima satisfação o seu regresso ao parlamento.( Apoiados geraes.)

Em vista das manifestações da camara, será lançada na acta esta declaração, assim como o agradecimento do sr. Pinheiro Chagas.

Vozes: - Muito bem.

Depois d'esta manifestação, interrompe se por um pouco a sessão e o sr. presidente acompanhado dos srs. secretarios, o sr. Marianno de Carvalho, unico ministro presente e quasi todos os srs. deputados, que se achavam na sala, dirigem-se, visivelmente sensibilisados, a comprimentar o sr. Pinheiro Chagas abraçando-o ou apertando-lhe as mãos. Distingue-se entre todos pelo seu estado de commoção o sr. Marianno de Carvalho a quem o sr. Pinheiro Chagas abraça afectuosamente e muito commovido.

Voltando a occupar o sen togar, o sr. presidente concede a palavra ao sr. Franco Castello Branco.

O sr. Franco Castello Branco: - Agora que de um o outro lado da camara os oradores mais eloquentes do partido regenerador e do partido progressista registaram devidamente os sentimentos de jubilo e de satisfação verdadeiramente caracteristicos do nosso temperamento meridional, exagerado mas bondoso e communicativo, não precisarei eu affirmar qual foi a intensidade da alegria e do prazer que senti ao ver entrar de novo n'esta casa o sr. Pinheiro Chagas, porque, em todas as occasiões que isso tem vindo a molde, sempre hei aproveitado o ensejo para manifestara admiração e sympathia que tenho por aquelle illustre membro do partido regenerador. (Apoiados.)

Já n'esta sessão legislativa e logo n'uma das primeiras batalhas politicas, que entre nós se feriu, procurei elevar, tanto quanto a minha palavra o permittia, a estatura d'este grande homem, porque o é; (Muitos apoiados.) e agora contentar-me hei apenas em dizer, que tomei parte, não maior, porque não seria isso possivel, mas perfeitamente igual aos de todos os membros d'esta casa, tanto da opposição como da maioria, na affectuosissima manifestação que unanimemente acaba de ser feita a Pinheiro Chagas.

Sr. presidente, visto que me coube a palavra n'esta altura da sessão, quando os deveres de um e de outro lado da camara estão cumpridos, como disse, pelos oradores mais eloquentes e cuja fórma oratoria mais se amolda a estes momentos, sublinharei apenas um facto que nos deu, por certo, a todos muita satisfação, e a mim me commoveu.

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Refiro-me á reconciliação pessoal que acaba de ter logar, perante nós, entre os srs. Marianno de Carvalho e Pinheiro Chagas, então dois homens, que representam, cada um no seu partido, não simplesmente dois dos mais vigorosos o brilhantes talentos, (Apoiados geraes.) mas mais do que isto, e, acima do tudo, os dois batalhadores de mais variados recursos o de mais nervo da politica portugueza. (Muitos apoiados.)

Eu, sr. presidente, tive com isso muita consolação, por que n'este exemplo, que acaba de sei dado perante nós, vi quanto realmente são estereis e passageiros os sentimentos de animadversão, que ás vezes nos animam, e como no fundo de nossos corações de meridionaes ha uma cousa que sobreleva a todas as impressões de momento, as impressões da mocidade, d'aquelle tempo de oiro, em que sem competencias nem rivalidades, olhâmos todos para a vida como para um horisonte sem limites, aberto aos commettimentos da actividade e do espirito do cada um. (Muitos apoiados - Vozes: - Muito bem )

E eu recebi aqui um ensinamento agradavel, que poderá ainda fazer com que a minha palavra não seja por vezes tão violenta, tão acerba e tão áspera como porventura o tem sido. (Vozes: - Muito bem).

Dito isto, e tendo eu pedido a palavra para outro motivo, vou expor o assumpto para que a pedi.

É para pedir ao sr. ministro da fazenda que se digne communicar ao seu collega das obras publicas, que eu desejaria que s. exa., logo que lho seja possivel, comparecesse aqui a fim de conversarmos acerca da directriz do caminho de ferro, que deve ligar a provincia do Minho com a de Traz os Montes, e as regiões de Braga e Guimarães, com a região de Chaves.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho (muito commovido): - Agradece as expressões amaveis que o illustre deputado lhe dirigiu; e assegura-lhe que sempre o magoou profundamente a interrupção das suas relações pessoas com o sr. Pinheiro Chagas, seu amigo de infancia. Folga extremamente de poder apertar-lhe a mão ainda uma vez e pedir-lhe que o conto no numero dos seus amigos.

Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)

O sr. Almeida e Brito: - Mando para a mesa uma representado da real associação central de agricultura, reclamando contra uma representação que os donos das fabricas de moagens apresentaram n'esta camara.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

Assim se resolveu.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 23, estabelecendo a "régie" para o fabrico dos tabacos

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno do Carvalho): - Antes de entrar na defeza do projecto, e ainda visivelmente impressionado, diz: Voltemos á campanha. Acabaram as commoções agradaveis; vamos á lucta, e seja ella boa para todos, como lucta nobre e leal, em que cada um defende os seus principios e as suas convicções, sem abandonar um momento o estandarte politico em volta do qual se acha alistado. (Vozes: - Muito bem).

Explica em seguida o motivo por que ha mais tempo não pediu a palavra para entrar n'este debate. Foi porque a opposição o tratou tão bem, que elle, orador, não viu necessidade de defender-se.
Os illustres deputados atacavam, é certo, o projecto, mas esse estava sendo habilmente defendido pelo sr. relator e por outros oradores da maioria. Hontem, porém, o sr. Franco Castello Branco, deixando de considerar o sr. presidente do conselho como um tyrano feroz para com elle, orador, provocára-o a usar da palavra, dirigindo-lhe algumas perguntas a que lhe cumpria responder.
Começando por declarar que é boato sem fundamento a intervenção de alguem, estranho ao parlamento, n'esta questão, entra depois na apreciação das considerações feitas pelo mesmo sr. deputado, a quem responde largamente.
(O discurso será publicado em appendice a esta sessão logo que sejam restituidas as notas tachygraphicas )

O sr. Carrilho: - Por parte da commissão de fazenda, tenho a declarar ao sr. José Castello Branco que o projecto do sr. ministro da guerra, acerca da reforma do Serviço de saude do exercito, e a que o illustre deputado se referiu na sessão de hontem, ainda não foi sujeito ao exame d'aquella commissão.

O sr. Santos Crespo: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se entende que deve ser prorogada a sessão até se votar o projecto que está sendo discutido.
Assim se resolveu.

O sr. Dias Ferreira (sobre a ordem): - Começo por ler a minha moção de ordem.
(Leu.)

Sei perfeitamente que a camara está cansada da discussão do projecto sobre o tabaco; e importante tem sido realmente o debate, já pela qualidade dos oradores que n'elle têem tomado parte, já pela largueza e profundidade com que tem sido tratada a questão.

Resolvida, como está, a camara a votar hoje mesmo este projecto, todas as considerações sobre a materia serão inuteis.

Mas eu, sem poder aliás emancipar-me absolutamente d'esta atmosphera, o limitando por isso as minhas observações, não hei de deixar encerrar o debate sem accentuar mais uma vez as minhas opiniões a respeito da liberdade do tabaco.

Ouvi com a mais desvelada attenção as ponderações do sr. ministro da fazenda, que acaba de fallar. Instruiram-me algumas e deleitaram-me outras; mas não ouvi uma só que servisse de justificação ao projecto.

Não esqueceram ao sr. ministro da fazenda, a proposito d'esta discussão, nem as suas digressões a Vigo, nem os seus passeios de carruagem com o sr. presidente do conselho, nem os brinquedos de creanças, (Riso) talvez para introduzir uma nota alegre no meio da monotonia de uma discussão parlamentar, tão arida e secca, como é a questão dos tabacos.

Mas o discurso do sr. ministro da fazenda, tão elevado, tão edificante, e, debaixo de muitos pontos de vista, tão gracioso, não póde varrer do meu espirito a impressão dolorosa e triste de que por este projecto pretende o governo pôr de sua conta, mas á custa do contribuinte, um estabelecimento commercial de tabacos, e gastar ao paiz mais 7.200:000$000 réis. (Apoiados.)

Eu já sabia que o sr. ministro da fazenda tinha ido a Vigo por mar, passeio que lhe não invejo, porque sou incapaz de embarcar. (Riso.)

As desharmonias entro o sr. ministro da fazenda e o sr. presidente do conselho, que a opposição regeneradora tanto lamenta, ainda são a unica garantia de que os interesses publicos não sejam de todo rapidamente compromettidos.

Só todos os ministros estivessem logo de accordo com os projectos que a phantasia de cada um a toda a hora invente, aonde estariamos nós hoje. (Riso. - Apoiados.)

É uma grande fortuna para o paiz que os srs. ministros vivam em lucta constante a respeito dos seus projectos, visto que nenhum se lembra de medida, que não seja em detrimento dos interesses publicos, e porque com nenhum outro elemento da garantia póde a nação contar n'este momento!

Tambem deve estar satisfeita aquella parte da opposição extra-parlamentar que todos os dias lamentava, que se perdessem em esforços rhetoricos as discussões parlamentares

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Como queriam projectos em vez de rhetorica, já tiveram o projecto das penitenciarias, que nos ha de consumir centenares, senão milhares de contos de réis, o agora ahi está o projecto do tabaco para nos levar 7.200:000$000 réis! Esta rhetorica de tão avultados saques á bolsa do contribuinte ha do doer mais ao paiz do que a rhetorica parlamentar.

Creiam que o governo, de quem não ha de certo a esperar cousa util, ainda resgataria alguns dos seus peccados politicos, que não são poucos, se fechasse a camará só cora a rhetorica parlamentar. Evitavam-se assim, alem do que ainda ha de vir, as despezas com as penitenciarias, e esta auctorisação do 7 200:000$000 réis para estabelecimentos de tabacos de conta do governo, que deu agora em ser fabricante. (Hilaridade.)

Exactamente na occasião em que lavra a maior relaxação nos serviços publicos, em que a acção governativa está completamente enfraquecida, em que o principio da auctoridade, no sentido racional da palavra, está sem prestigio, é que o governo quer 7.200:000$000 réis para gastar com a installação da régie, e para contentar todos os fabricantes que ficam sem as suas fabricas!

E chamo-lho régie por favor e contemplação com o governo e com os meus collegas, porque este projecto tem por fim menos montar a régie, do que a dar dinheiro ás fabricas. Não póde ter outra explicação uma providencia que, no presente caso, prepara a indemnisação das fabricas com lucros cessantes!

O principal fim ou resultado d'este projecto, que parece destinado a acabar com as fabricas, é valer ás fabricas, ou antes aos fabricantes.

N'esta medida tambem os operarios toem o seu jubileu, jubileu que devem, não ao privilegio da sua sorte, mas á necessidade que o governo tem de que elles estejam socegados e quietos até que a medida esteja em execução! (Apoiados.)

Quasi que já me fallece o animo para combater estes jubileus continuados, o que todos os dias assumem proporções monstruosas. N'este projecto os operarios são postos acima dos magistrados judiciaes e dos officiaes militares.

Os magistrados judiciaes, como os officiaes militares, que para entrarem na carreira precisam de grandes habilitações, só depois de muitos annos de serviço e de grandes provações é que alcançam a sua aposentação ou reforma, e ás vezes em condições mesquinhas, quando pelo projecto se promette ao operario dos tabacos, sem lhe de terminar tempo de serviço nem as condições de idade, a reforma na importancia de 1$500 réis por semana!

Não combato este beneficio aos operarios, visto que a epocha é de jubileu para toda a gente, que póde incommodar o governo, o reconheço que outras classes em melhores circumstancias estão sendo beneficiadas á custa do estado!
Demais a, mais é a feição da epocha.

Houve um periodo e largo, em que prevaleceram na Europa as influencias theocraticas.

Tambem larga o duradoura influencia exerceu no governo dos povos o elemento do feudalismo, depois transformado na fidalguia; e hoje quem predomina é a minha gente, são as maus collegas, é o povo, quando resolve tomar uma attitude decisiva e energica.( Riso)

Não são, em todo o caso, estas as minhas idéas. Eu em vez de prometter pensões a todos os operarios, que trabalham, e que não trabalham, que se portam bem e que se portam mal, encaminharia as classes operarias para os habitos da economia, e para reservarem o excesso dos seus salarios para o caso de impossibilidade de trabalhar.

Nem os operarios aqui vem n'este projecto senão para cobrir os beneficios feitos n'outros que não são operarios, o para estarem socegados até entrar em execução esta medida!

O sr. ministro da fazenda julga-se com direito a uma estatua por ter emprehendido uma reforma que lhe permitte tirar 4.250:000$000 réis do tabaco, que até agora dava só 3.600:000$000 réis.

Não sei se por esto facto elle merece estatua, porque nem creio que pela régie augmente o valor do imposto para o thesouro, nem acredito na efficacia d'esses pretendidos augmeentos com prejuizo das liberdades populares.

Mas pelo que de certo merece estatua é pela franqueza cora que disso á camara que a régie, para render, carecia da fiscalisação parlamentar.

O sr. ministro relaxou este projecto ao braço secular da fiscalisação parlamentar.

E a peior recommendação que o projecto póde ter!

Declarar boa uma providencia, quando essa bondade tem por fundamento a fiscalisação dos interesse do thesouro por parte das côrtes, equivale a condemnar desde logo absoluta e fatalmente essa medida!

Eu vou dizer a v. exa. a confiança que me estão merecendo as actuaes côrtes no que toca a fiscalisação dos interesses do thesouro, e a zêlo pela bolsa do contribuinte, e não se escandaliso ninguem commigo pela minha franqueza, porque eu estimo muito todos os membros d'esta casa, e não tenho o intuito do offender ninguem. (Apoiados.)

A minha fortuna particular podia entregal-a a qualquer dos meus collegas individualmente; mas n'uma questão, em que estivessem em jogo as economias do estado ou a pelle do contribuinte, e que tivesse de ser julgada por esta maioria, aliás muito respeitavel em cada um dos seus membros, ou pelos juizes municipaes do sr. Beirão, eu optava pelos juizes municipaes do sr. Beirão (Riso.)

Por esta simples exposição avaliará v. exa., sr. presidente, o conceito que eu formo de um projecto, cujas vantagens ficam dependentes da fiscalisação parlamentar!

Ha de ser difficil encontrar projecto, apresentado n'esta legistura, que não tenha por fim augmentar as despezas publicas, ou sacar sobre o contribuinte. Em apresentar propostas para reduzir despezas não cáe ninguem, nem ou mesmo.

Limito-me a votar contra as propostas de alargamento de encargos.

Não posso viver em guerra com todos; e, sem proveito para o paiz, habilitar o publico a fazer mau conceito do estado das minhas faculdades, por me ver apresentar propostas de reducção de despezas, facto que, na epocha que vamos atravessando, póde ser tomado como symptoma de enfraquecimento cerebral. (Riso.)

Nas circumstancias actuaes da política portugueza não faço indicações de diminuição de despezas, que seria isso inutil, e mais do que inutil, e limitar me-hei a combater augmentos de despezas sem vantagem publica, como os creados por este projecto.

Mas, antes de entrar propriamente no exame do parecer, quero pronunciar do modo mais accentuado a minha opinião contra o abuso, que todos os dias estão fazendo os srs. ministros, do nome e da memoria do sr. Fontes.

Poucos nomes terão igual direito a ser pronunciados no parlamento portuguez, do qual elle foi um distincto ornamento; mas não têem auctoridade para cobrir com o nome d'elle o seu procedimento os actuaes ministros.

E extraordinario que, tendo os srs. ministros passado a metade da sua vida politica a proclamar o sr. Fontes, como o pae e o padrinho de todos os abusos, agora procurem escudar-se com o nome d'elle, em defeza dos seus actos, como se tivesse força de lei! (Apoiados.)

São estes processos politicos que desprestigiam os homens publicos perante a opinião. (Apoiados.)

O sr. ministro da fazenda leva a sua veneração por aquelle privilegiado talento até ao ponto de considerar os actuaes regeneradores como herdeiros forçados das opiniões do seu fallecido chefe. Por esta theoria novissima e singu-

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larissima as idéas do chefe passam em herança aos seus correligionarios, como os bens materiaes aos seus herdeiros!

Conservar-se um gabinete no poder, para realisar os planos e as idéas dos que proclamam seus adversarios, é a subversão dos bons principios e a falsificação completa do systema representativo.

Os ministros, que representam um partido politico, estão no poder para realisar o seu programma partidario no interesse do estado, e não unicamente para estarem (Riso.)

N'outros tempos o nome, que n'esta casa se citava para tudo, era o de Sá da Bandeira.

Quando um orador, e principalmente um orador ministro, estava afflicto com a discussão, em busca de um argumento, que não encontrava, não tinha outro meio para saír-se do embaraço, senão invocar o nome de Sá da Bandeira! (Riso.)
Depois era já tambem muito invocado, especialmente pelos regeneradores, o nome do visconde de S. Januario, sobretudo em assumptos de marinha o de colonias, cuja administração, segundo creio, é tambem um modelo e uma perfeição!

Agora é invocado para tudo o ar. Fontes!

E a cada um d'estes nomes, individualmente, parece attribuir-se força de lei.

Não tem precedente, nem no mundo novo, nem no mundo velho, similhante jurisprudencia.

Determinou um Imperador romano que, nos casos omissos na legislação romana, que foi, e será sempre a primeira do mundo, se seguiria o parecer do cinco jurisconsultos notaveis, que escuso agora de mencionar, adoptando-se a opinião da maioria, quando elles não fossem conformes sobre o caso, e prevalecendo no caso de empate a opinião de Papiniano, que era reputado o grande armazem da jurisprudencia romana.

Sigam ao menos a doutrina do Imperador romano. (Riso.)

Escolham cinco doutoras na politica, e invoquem os nomes d'elles em collectividade para justificar os abusos da governação, mas não estejam a gastar os nomes proprios individualmente, e tanto mais que n'esta discussão de pouco valem os nomes proprios, porque o sr. ministro da fazenda torna as vantagens do projecto dependentes da fiscalisação parlamentar.

Ora vale a pena convidar toda a gente nacional e estrangeira para ver como as nossas côrtes fiscalisam a despeza do thesouro e zelam a bolsa do contribuinte! (Riso)

A fiscalisação da régie ha do transformar-se n'um grande jubileu!

É indispensavel organisar a régie quanto antes, porque ainda ha muita gente para empregar!

A questão da régie é questão de empregos, é questão de pôr muita gente contente! (Riso.)

Quem não fica nem póde ficar satisfeito é o estado. Mas esse é um anonymo, com quem ninguem se importa! Comtanto que fiquem contentes os tabaqueiros graúdos, e á sombra d'elles o pessoal operario e não operario, o mais é indifferente!

Não é de certo precisa somma tão elevada para montar um estabelecimento official de fabrico de tabacos.

Eu não percebo nada de fabrico de tabacos. Fumo charuto, mas nunca vi fazer um charuto, e nem sei fazer um cigarro com a elegancia e habilidade de muita gente que nós conhecemos; (Riso.) e por isso desejava saber a base que o governo adoptou para pedir 7.200:000$000 réis ao paiz para as suas installações commerciaes de fabrico de tabacos.

E desejava saber as rasões porque o governo quer uma somma tão avultada para pôr fabrica de tabacos, porque tenho minhas duvidas e muito fundamentadas acerca da necessidade de saque tão violento sobre a pelle do contribuinte.

N'este ponto advirto os srs. ministros que lhes hei de argumentar com as tradições do partido historico, que já queria, como o actual ministerio quer agora, que lhe chamassem progressista.

Não sei argumentar aos mahometanos senão com o alcorão, como não sei argumentar aos catholicos senão com o Evangelho.

Não hão de ser as rasões do sr. Fontes Pereira de Mello, que os progressistas chamavam conservador, que eu hei de ir procurar.

Ora eu vejo nas paginas da legislação nacional votada no artigo consulado do partido historico, que bastavam ao governo 600:000$000 réis para pôr fabrica de tabacos por sua conta.

Assim na lei de 1807, que ordenava a arrematação dos tabacos no triennio do l.° de maio de 1858 a 30 de abril do 1861, encontro uma auctorisação ao governo para levantar 600.000$000 réis a fim de installar a régie se não houvesse quem na praça oferecesse preço vantajoso.

Ou esta auctorisação ao governo tivesse por fim evitar os conluios da praça, ou preparar alguma alteração fundamental na percepção do imposto sobre o tabaco, o certo que n'aquella occasião governo e cortes julgavam bastante a somma de 600:000$000 réis para se installar o fabrico dos tabacos por conta do estado.

Verdade é que n'essa epocha não influia na governação do estado o que hoje se chama gente de idéas elevadas, gente de vistas largas, gente enthusiasta pela Landeira das despezas da civilisação até ao ponto de deixar o contribuinte sem camisa! Quem governava então era o partido historico, que se contentava, para organisar a régie, com 600:000$000 réis, em vez de 7.200:000$000 réis, que agora se pedem.

Hoje são precisos, em vez de 600:000$000 réis, 7 200.000$000 réis para installar as fabricas, para contendi-o pessoal operario e não operario, e para quem mais Deus for servido. (Apoiados.)

Em 600:000$000 réis calculava tambem em 1864 a somma necessaria para montar a régie o sr. Lobo d'Avila, um dos nossos homens publicos mais conhecedores de negocios economicos e financeiros, a cuja iniciativa se deve a abolição do monopolio do tabaco.

Provavelmente hoje não prestaria já o sr. Lobo d'Avila para os negocios da governação em competencia com os estadistas de linha, e do vistas largas, da moderna geração!

Mas em 1864 ninguem lhe negava competencia n'estes assumptos Na occasião em que propunha a liberdade do fabrico do tabaco, e a abolição do monopolio, respondia aquelle cavalheiro aos que já então pugnavam pela régie, o seguinte no seu relatorio:

"N'estas condições não parece que a régie ou o monopolio de tabaco por conta do estado seja o systema preferivel para assegurar a renda que este aufere dos encargos que pesam sobre o consumo do tabaco.

"Se apreciarmos este systema com applicação ao nosso paiz, os seus inconvenientes aggravam se de um modo consideravel, attentas as nossas peculiares circumstancias.

"Se quizessemos passar da arrematação d'este monopolio, como existe actualmente, para a sua administração por conta do estado, teriamos de empatar desde logo um capital de 600.000$000 réis, approximadamente, para a acquisição da fabrica, compra do tabaco e custeio do fabrico abatida já a importancia das fianças dos administradores das comarcas; teriamos de fazer uma despeza de 400 000$000 réis com a fiscalisação, administração e commissões de venda; ver nos-íamos obrigados a não diminuir os preços actuaes, e mesmo a augmental os, para não corrermos tão grande risco de desfalque na renda; não veriamos assim diminuido, mas antes augmentado, o incentivo ao commercio illicito; provavelmente não poderiamos contar com tanta efficacia na acção administrativa, em presença das difficuldades com que tem de luctar a auctori-

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dade, que não se exerce entre nós com o mesmo rigor que n'outros paizes da Europa onde existe a régie, como na França, na Hespanha e na Austria."

Então bastavam 600:000$000 réis para installar as fabricas de tabacos, e 400:000$000 réis para a administração e fiscalisação, ou 1.000:000$000 réis para a organisação e custeio da régie.

Hoje, com o augmento do consumo e com o augmento dos salarios, mesmo sem metter em linha de conta a grande economia que se póde fazer com a substituição do trabalho manual pelo trabalho mechanico, não bastariam só 1.000:000$000 réis? Seriam precisos talvez 2.000.000$000 ou 3.000:000$000 réis?

Mas d'esta somma á que o governo pede a distancia é assombrosa. (Apoiados.)
A tudo isto acresce que o systema da régie não póde ser favoravel nem ao thesouro nem á liberdade no meio social em que vivemos.

A régie só poderia ser receita no nosso paiz em circumstancias extraordinarias, em que, para attender a uma calamidade publica, ou para regularisar de um modo definitivo a situação da fazenda publica, fosse necessario pôr do parte os principios. A régie, como a arrematação, são proximas parentes do despotismo!

Não levo a minha intransigencia liberal nas questões financeiras ate ao ponto de proceder, como a assembléa franceza em 1789, que inspirada unicamente na idéa -salvem-se os principios ainda que morram as colonias - decretou a liberdade de cultura, do fabrico, e da venda do tabaco, com grave prejuizo das receitas do estado, até que Napolão I em 1811 restabeleceu o monopolio.

Comprehendo que circumstancias gravissimas de momento possam obrigar os poderes publicos a tomar uma resolução que se ache fóra dos principios. Mas as circumstancias da actualidade não justificam uma providencia, como esta, que não póde deixar de ser combatida por todo o partido liberal. (Apoiados.)

O exemplo da França não me serve. E uma, nação grande, que podo ter necessidade politica de conservar nas mãos do estado esta arma para exercer acção mais forte e mais energica em toda a extensão do seu territorio, ou que não quererá metter-se em caminho de aventuras, aliciando um systema, à que o paiz está acostumado.

E a que vem a invocação da Italia! Por amor de Deus não chamem a terreno, a proposito de administração portugueza, a nação italiana, que é um dos paizes mais bem governador da Europa. (Apoiados) Nos tempos modernos nenhum paiz tem feito prodigios financeiros como a Italia, onde o governo do estado só acha entregue, não a seis ou sete ministros, mais a nação inteira, onde os ministros não seriam capazes de faltar ás exigencias das necessidades publicas, nem os povos capazes de lh'o consentir! (Apoiados.)

Comparar a administração da Itália com a administração portugueza é fazer o parallelo entro a administração de um homem bem governado e a do verdadeiro prodigo. (Apoiados.)

De mais as circumstancias, peculiares de cada povo podem determinar a diversidade de systemas na arrecadação dos impostos.

Entre nós, quando se discutiu a lei de 1864, as commissões de fazenda e de administração publica na outra casa do parlamento, declarando que o governo não acceitava a régie acrescentavam que nem as côrtes lh'a dariam, ainda que elle a quizesse, porque os principios liberaes não permettiam que se pozesse nas mãos dos ministros um elemento poderoso, que poderia ir deslocar as influencias ligitimas do paiz em proveito da auctoridade.

Sr. presidente, sempre quero dizer á camara o que pensaram em 1864, por occasião de se discutir a lei d'aquelle anno, que aboliu o monopolio do tabaco, os homens mais considerados do partido historico, incluindo o sr. presidente do conselho, n'uma epocha em que não tinhamos chegado ainda á perfeição das commissões votarem por unanimidade em tudo e por tudo com o governo.

Então raro ora o projecto de certa importancia em que nos pareceres das commissões se não encontrassem assignaturas de vencidos, e com declarações.

Pois os pareceres das commissões de fazenda e administração da camara dos deputados, compostas de vinte e dois membros, apparecem assignados sem a mais pequena declaração ou discrepancia, approvando o projecto, depois convertido na lei de 13 do maio de 1864. Direi á camara alguns dos nomes que figuram no parecer, e que toem de certo mais auctoridade na questão economica e financeira, que nos occupa, do que os depoimentos no ultimo inquerito a que se procedeu a respeito de tabaco, e que serviu tambem de pretexto pata a organisação da proposta, sujeita ao exame da camara.

Poucas cousas tenho lido com tanta paciencia o curiosidade como o inquerito a respeito dos tabacos, não porque o inquerito podesse ter grande valor, visto que as fabricas de certo não indicavam para serem inquiridos os operarios, cujos depoimentos não fizessem couta ao governo, mas para saber quaes eram os intuitos do governo, ordenando esta diligencia.

Primeiramente foram inquiridos os membros da commissão de vigilancia, commissão a que o governo pareceu reconhecer entidade juridica, e a que, portanto, deve dar uma organisação como tem o ministerio publico ou o conselho d'estado! (Riso)

Desde que a commissão de vigilancia representava uma commissão de resistencia ao governo, cujos actos estava encarregada de vigiar, claro era que o governo havia de preferir aos depoimentos, dos que porventura tivessem andado afastado das luctas, os dos revolucionarios, para os contentar. (Riso.)

Em verdade, quasi todos os operarios, alem de procurarem ser agradaveis ao governo, mostravam que eram genuinamente portuguezes. (Riso.)

Preferiam a régie na convicção de que o estado sempre havia de cuidar mais d'elles, quando impossibilitados de trabalhar. (Riso)

Em Portugal é sabido que se preferem sempre os trabalhos do estado aos trabalhos particulares. Raro é o que quer ser trabalhador em obras particulares, podendo accommodar se nas repartições do estado. (Riso.)

Precisavamos de um inquerito para sabermos as condições do fabrico e do consumo debaixo do ponto de vista economico e fiscal. Mas esse inquerito nada aproveitava ao governo. O que o governo queria era declarações dos operarios que lhe servissem de pretexto para se revoltar contra a lei de 1864. (Apoiados.)

Respeito as opiniões dos operarios; mas não me regularia só por ellas. Não havia de ter em menos conta as rasões de homens distinctos que collaboraram na lei de 1864, como João Antonio Gomes de Castro, Anselmo José Braamcamp, Torres e Almeida, Antonio Ayres de Gouveia, e Luciano de Castro.

Estes homens illustres, nos quaes figura em primeira linha o actual sr. presidente do conselho, diziam da régie o seguinte:

"A régie não é mais do que a transferencia do monopolio do escriptorio dos arrematantes para as mesas das secretarias. E o mesmo monopolio; isto é, o mesmo erro economico aggravado pelo proprio facto d'esta simples mudança. O estado feito fabricante e commerciante podo á achar argumentos no exemplo, porém não encontrará de certo defeza na sciencia e na rasão. Produz sempre mais caro do que os outros, e não poucas vezes peior. Para incentivo de aperfeiçoamento falta lhe, como diz o sr. ministro da fazenda em seu excellente relatorio, o estimulo da concorrencia e do interesse individual. Diminuo a expansão da riqueza de todos, inutilisando as forças de cada um. É justo comtudo dizer-se que, no caso de que tratâmos,

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alguma cousa augmentaria: a sujeição do olfato, do paladar e da bolsa a um producto privilegiado.

"O systema a que se estão referindo as vossas commissões não parece tambem dever produzir um satisfactorio resultado financeiro, importante sempre, e digno das mais profundas attenções, quando principalmente diz respeito á um assumpto que interessa tão de perto ás necessidades dó thesouro.

"O relatorio do governo explica de sobejo esta opinião, a favor de cuja verdade, se exceptuarmos até certo ponto a França, paiz onde uma exagerada centralisação administrativa póde prestar á régie valiosos auxilios, depõem as quantias, relativamente pouco importantes, que a Hespanha e a Italia auferem do exclusivo do tabaco, e as elevadissimas sommas que a Inglaterra, poios meios que o governo aconselha em suas propostas, recolhe do consumo d'este genero."
Pela sua parte o ministro dizia no relatorio da proposta o seguinte:

"Em conclusão, a régie exigiria um grande empate de capital, um consideravel acrescimo de despezas de administração, um augmento provavel nos preços de vendado que daria em resultado uma avultada diminuição da receita, uma cobrança mais onerosa, um maior incitamento aos descaminhos, uma diminuição provavel no consumo, cujas condições aggravava, a continuação dos actuaes vexames, sem contar as difficuldades, os embaraços e os encargos que accresciam ao governo do estado para reger e estipendiar o immenso pessoal d'este novo ramo de serviço, ou antes d'esta empreza fabril e commercial, em que thesouro iria arriscar um importante capital. Em verdade, para quem reflectir maduramente sobre este assumpto, o systema da régie é menos admissivel entre nós, e aquelle que nos prepararia a mais deploravel decepção pelos seus resultados igualmente nocivos ao publico e ao estado; teria todos os inconvenientes da arrematação sem a vantagem de assegurar a renda; não teria, nem as excellencias da liberdade, nem os proveitos do monopolio."

Aqui tem v. exa. acerca da régie, a opinião do ministro e da commissão parlamentar, que collaboraram na lei de 13 de maio de 1864.

Sr. presidente, a camara está resolvida a votar hoje este projecto, e por isso pesa-me tornar-lhe o tempo, e vou resumir o mais possivel as minhas considerações.

Conjunctamente com o pedido de auctorisação, para dispender até 7.200.000$000 réis, estabelece o projecto disposições especialmente com respeito á indemnisação que se propõe dar ás fabricas, que, se não forem aclaradas pela commissão, podem trazer graves prejuizos para o paiz. (Apoiados.)

O governo adoptou o systema de não faltar claro em cousa nenhuma n'este assumpto. (Apoiados)

Por exemplo: todos nós sabemos que á companhia nacional hão de ser pagas as suas acções pelo preço de réis 210$500, porque o ouvimos dizer. No projecto não está isso! (Apoiados.)

No projecto diz-se que hão de ser pagas pela ultima cotação anterior a 31 de dezembro de 1886. (Apoiados.)

Era melhor dizer claramente que o paiz ha de pagar réis 210$500 por acção d'aquella companhia, cujo nominal é 100$000 réis.

Outro ponto extremamente obscuro e de alta gravidade para os negocios publicos é o que respeita ao valor dos inventarios e balanços.

A companhia ha de responder para com o governo pela effectividade e não deterioração dos valores dos seus inventarios e balanços na mesma data de 31 de dezembro de 1886

Que significam as palavras effectividade dos valores dos seus inventarios e balanços? Significam que o governo acceita os haveres da companhhia nacional pelos valores que ella lhes deu nos seus balanços, sem verificar se são exactas ou exageradas as avaliações?

Creio que sim. Da redacção da base l.ª § 5.° resulta que a companhia, logo que apresente os objectos avaliados no balanço, tem cumprido pela sua parte, porque não responde pelo valor, mas pela efectividade, não podendo ser obrigada a soffrer nova avaliação, o que pôde representar graves damnos para o thesouro.

É de certo a primeira vez que se acceitam balanços sem verificação, recebendo-se os haveres alheios, não por uma avaliação com a intervenção de todos os interessados, mas pelo valor que um dos interessados lhe tenha dado a capricho, o que póde ser de gravissimo prejuizo para o estado. (Apoiados.)

Mas o governo não vae fazer doações só á companhia nacional. Comprehende no jubileu geral todas as fabricas, o que até certo ponto é reclamado pelo principio da igualdade, e vae dar um bonus de 7.200:000$000 réis, quando poderia pôr fabrica com muito menos. E a responsabilidade do augmento do bonus, ou da doação, é ainda do governo, pelas tergiversações e hesitações que revelou em todo este negocio, ou antes por não ter desde o principio um pensamento firme e definido.

Em virtude d'essas hesitações vae o thesouro pagar centenares ou milhares de contos de réis, por conta da nação e por culpa do governo (Apoiados.)

No relatorio de 1887 dizia o governo que estava quasi monopolisado o fabrico do tabaco pela companhia de Xabregas, e que, fôra da acção d'esta companhia, havia apenas em Lisboa tres fabricas de pequena valia, duas das quaes estavam até fechadas e não trabalhavam ha muito tempo, e uma no Porto; assim pagos á companhia de Xabregas os seus 2.400:000$000 réis, pouco mais era preciso para indemnisar as fabricas restantes.

Se, pois, o governo queria adoptar o systema da régie, e dar a todas as fabricas um bonus tão avultado, que abrangesse até os lucros cessantes havidos e por haver, fizesse logo verificar com rigorosa exactidão os valores das fabricas existentes, pura o que tinha grande remedio na lei de 13 de maio de 1864 e respectivo regulamento, antes de ellas saberem que o governo ía pôr fabrico exclusivo de sua conta, e que as indemnisava, não só do que ellas valessem, mas dos lucros cessantes.

Em vez d'isso, o governo, sem pensamento fixo e sem urna opinião definida, andou de plano em plano; e as fabricas perceberam que, preparando-se, como se preparava por parte do governo, um grande bonus para a fabrica de Xabregas, não podiam as outras ser excluidas do jubileu.

Por isso, as fabricas que estavam mortas, começaram de laborar, e adquiriram um desenvolvimento que aproveita a seus donos, mas que ha de ficar caro ao paiz na avaliação dos lucros cessantes, que são pagos a estas como á nacional.

Praticamente indico á camara os gravissimos prejuizos que hão de advir ao thesouro das hesitações e tergiversações dos srs. ministros em assumpto de tão elevada importancia.

A fabrica lusitana, cuja producção de tabaco em kilogrammas foi:

Em 1883 9:887
Em 1884 0
Em 1885 0
Em 1886 0
Produziu nos primeiros onze mezes de 1887 72:981

A fabrica dos vendedores, aberta em 1884, produziu de tabaco, o seguinte em kilogrammas:

N'aquelle anno 6:718
Em 1885 5:645
Em 1886 2:562
E nos primeiros onze mezes de 1887.......... 50.612

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A fabrica brigantina, no Porto, que ainda em l886 tinha produzido apenas 17:131 kilogrammas de tabaco, nos primeiros onze mezes de 1887 produziu cerca de 93:024 kilogrammas!

A nacional ainda tinha as suas acções cotadas a bom preço, o que todavia não justifica, nem desculpa, sequer o governo de lh'as pagar pelo preço da cotação n'uma dada epocha.

Mas as outras foram preparando os seus inventarios e balanços, á sombra dos erros do governo, para tambem passarem por bom preço os seus estabelecimentos.
As fabricas que estavam paradas, assim que viram surgir ao longe a esperança de que os fabricantes de tabaco íam ter jubileu, voltaram ao trabalho do fabrico, a organisaram outra vez os respectivos serviços para tambem receberem bonus fabulosos, como a nacional.

Não lhes quero mal por isso. Fizeram bom negocio Aqui responsavel é só o governo, que não zelou, como lhe cumpria, os interesses do estado.
O certo é que os documentos, polo proprio governo juntos, mostram que fabricas, que desde 1883 a 188b nada produziam, nos primeiros onze mezes de 1887 appareceram com unia producção espantosa, que o estado ha de pagar em nome da celebre base dos lucros cessantes, que o governo adoptou para indemnisar a companhia do Xabregas.

Se o governo tivesse feito avaliar as fabricas na occasião em que pensou em tocar no regimen dos tabacos, e antes de tornar conhecidos do publico os seus projectos, teriamos sido dispensados de pagar enormes sommas, que as fabricas em laboração hão de pedir, porque nenhuma quererá ficar aquém da nacional

E sobre este ponto não direi mais nada, apesar de muito ter que dizer.
Não quero, porém, concluir, sem fazer algumas rapidas considerações sobre a parte do projecto, que, no meu entendor, consigna o principio da desorganisação social.

Ninguem tem mais consideração pelos operarios do que eu, até por espirito de classe, porque não dou licença a ninguem para ser mais operario do que eu, pelo menos na assiduidade no trabalho

Devemos olhar pela posição dos operarios, como pela posição de todas as classes, e sobretudo d'aquelles que mais carecem da protecção do estado.

Mas n'isto, como em tudo, é preciso que os poderes publicos se contenham dentro dos limites da boa rasão e dos bons principios, sem se atirarem para o campo da desorganisação social.

Empreguem se, pois, todos os meios indispensaveis para melhorar as classes operaria;!, mas considerando-as sempre como um elemento social, o não as apresentando em frente do governo como um outro poder do estado.

Para collocar os operarios ao abrigo das contrariedades da vida, e para lhes dispensar todas as considerações de humanidade, não é preciso fazel-os socios de uma sociedade extravagante, em que elles são socios para ter parte nos lucros e não socios para quinhoar nas perdas.

Não comprehendo as vantagens que tira a administração publica, nem mesmo as classes operarias, de serem chamados os operarios a examinar e discutir os balanços e emitas do fabrico do tabaco, como é seu incontestavel direito, desde que por lei hão de quinhoar nos lucros. Que os poderes publicos dispensem todo o auxilio aos operarios, já providenciando acerca da sua reforma para o caso de impossibilidade absoluta e permanente do trabalho, já subsidiando uma caixa de soccorros, para lhes valor no caso de enfermidade, comprehende-se e poderá justificar-se.

Mas incluil-os como socios da régie nos lucros do estado parece-me um jubileu, que vae alem de todos os principios de organisação social na actualidade.

Isto é porém só a classe operaria, empregada no fabrico dos tabacos, que é transformada n'uma vasta organisação de empregados publicos e de socios do estado.

Fica tambem a cargo do estado, e participante nos lucros, lodo o pessoal não operario, que em 31 de dezembro da 1887 estiver nas fabricas, o que significa que as fabricas ficam auctorisadas a encampar ao thesouro quantos empregados ellas tenham nomeado antes d'aquella data, ou posteriormente nomeiem com a data conveniente!

Quanto a operarios hão de ser recebidos no estabelecimento do estado todos os que as fabricas derem como trabalhando nas suas officinas á data da presente lei, e quanto a pessoal não operario ha de ficar a cargo do thesouro todo o que as fabricas derem como existente em 31 de dezembro de 1887!

Os nossos governos parece que condemnaram a completo esquecimento todos os principies de boa administração e de real economia, sendo-lhes absolutamente indifferente a sorte do thesouro, com tanto que vençam de momento as difficuldades que encontram na realisação dos seus projectos.

Diante das conveniencias dos ministros quebram-se todas as tradições razoaveis do nosso systema administrativo.

Em l864 tambem os poderes publicos attendiam á sorte dos empregados da contabilidade e da fiscalisação do antigo contraio do tabaco; mas só podiam requerer, para serem recebidos nas repartições do estado, os que tivessem dois annos de serviço effectivo rias fabricas dos contratadores, e dois annos completo, não á data da lei, 13 de maio de 1864, mas em 19 de janeiro d'aquelle anno, e o estado não os recebia no seu serviço com os vencimentos do contrato, mas sim com os correspondentes, que lhes fixava por decreto, aos dos empregados do estado de serviço analogo. E dos operarios não tratou.

Agora votam-se largas auctorisações para levantar sommas importantes, e votam-se despezas a capricho, não se sabendo nem o custo das fabricas, nem a quantidade de pessoal operario, e não operario, que ha de, ser recebido nas fabricas, nem mesmo a importancia dos salarios dos operarios e dos vencimentos dos empregados de escriptorio.

Sabe-se apenas que o salario dos operarios ha de ser o maximo, que hoje se paga em Lisboa, quer trabalhem no Parto, quer em Lisboa, quer sejam homens quer mulheres.

Ninguem mais do que eu tem a perto os interesses das classes operarias e trabalhadoras, mas sem rasgar o meu mandato popular, com que o povo me honrou, não posso calar me diante dos comprimentos de adulação a todos aquelles de quem se espera algum beneficio, ou de quem se tem medo, porque esse systema ha de trazer resultados fataes para o paiz. (Apoiados.)

Hoje os altos poderes do estado recuam, sem attenção aos interesses do estado, diante nas reclamações dos operarios na praça publica, ámanhã hão de inclinar a cabeça diante das reclamações da classe militar, ou de qualquer outra que saiba impor-se. (Apoiados)

Os poderes publicos, os poderes do estado, só devem obediencia á constituição e As leis.

Nenhuma reclamação popular, é certo, lhes deve ser indifferente. Mas as reclamações de quaesquer classes sociaes, por fundadas que sejam, não podem nunca prevalecer sobre os interesses do estado. (Apoiados.)

Não ha governo proveitoso para o para quando os poderes publicos não têem idéas precisas e programma definido, que andam á mercê dos vai-vens da sorte

Infelizmente não posso dar remedio a este mal.

Mas em todo o caso não cesso de pugnar pelos interesses do estado e pelos bons principios, ainda com a segurança de que estando já mal com tanta gente, fique agora tambem mal com os operarios, dos quaes mo honro de ser colega, senão dos mais distinctos, ao menos dos mais assiduos.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

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Leu se na mesa a seguinte:

Moção

A camara reconhece a necessidade da execução justa da lei de 13 de maio de 1864, e continua na ordem do dia. = Dias Ferreira.

Foi admittida.

O sr. Mazziotti: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se julga a mu teria sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida.

O sr. Presidente: - Os srs. deputados que catavam inscriptos e aos quaes não coube a palavra, podem mandar para a mesa, querendo, as suas propo-las.
Mandaram propostas os srs. Eduardo de Abreu, Hintze Ribeiro, Silva Cordeiro, Alves Matheus, José de Azevedo Castello Branco e D. José de Saldanha.

O sr. Presidente: - Vão ler-se para ser admitida, a proposta do sr. Eduardo de Abreu.

O sr. Antonio Maria de Carvalho. - Peço licença para retirar a moção que mandei para a mesa

O sr. Vicente Monteiro (relator): - Peço a palavra.

O sr. Presidente: - Opportunamente consultarei a camara sobre o pedido do sr. Antonio Maria do Carvalho.

Tem a palavra o sr. relator.

O sr. Vicente Monteiro: - Por parte da commissão de fazenda, tinha a declarar que ella acceita das propostas apresentadas pelo sr. Fuschini a que eleva a percentagem dos operarios na participação dos lucros de 32/50 a 37/50 e a que declara ser o numero do horas de trabalho indicado no projecto concedido e garantido aos operarios.

A commissão acceita igualmente a proposta do sr. Alpoim, para que o terceiro vogal do tribunal arbitrar sob questões do preço do tabaco do Douro seja nomeado pelo presidente do tribunal do commercio do Porto o não pelo de Lisboa, visto ficar mais proximo d'aquelle tribunal o logar da producção; e acceita tambem as pi opostas do sr. José de Azevedo Castello Branco, que não trazem augmento de despeza, como são a de prorogação do praso de amortisação das obrigações, que poderá ir até cincoenta annos, e a referente ao tabaco do Douro, para se fixar em 10 por cento o numero do seu consumo, ficando assim tambem satisfeita parte da reclamação constante da proposta do sr. Alpoim

São estas as propostas que, por parte da commissão, podia declarar que eram acceitas, não o podendo dizer quanto ás outras, de algumas das quaes comtudo podia informar que o governo as tomará na devida considerado quando tratar do fazer o regulamento de administração, e organisar os serviços em que attenderá ás condições hygienicas reclamadas pela sciencia, sem descurar o estabelecimento de escolas e creches junto ás fabricas.

O sr. Presidente: - O sr. Vicente Monteiro acaba de declarar quaes as propostas que a commissão acceita; mas eu pedia ao sr. relator que reservasse essa declaração para o momento em que as propostas forem submettidas á votação.

O sr. Vicente Monteiro: - Como v. exa. quizer.

O sr. Antonio Centeno: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que eu retire a minha moção.

O sr. Presidente: - Quando se tratar da votação das propostas, eu consultarei a camara.

Agora, vão ler-se as propostas apresentadas pelos srs. deputados que não chegaram a usar da palavra. As primeiras são do sr. Eduardo de Abreu.

O sr. Consiglieri Pedroso (para um requerimento): - Requeiro que sejam remettidas á commissão as proposta que vão ser lidas na mesa, e que foram apresentadas depois de encenada a discussão.

O sr. Presidente: - O sr. relator do projecto já disse á camara quaes as propostas que a commissão acceitava, auto das que foram enviadas para a mesa durante a discussão do projecto de lei, como das apresentadas depois de encerrado o debate; mas não tenho duvida em submeter á votação da camara o requerimento do sr. deputado Consiglieri Pedroso.

O sr. Antonio Maria de Carvalho (sobre o modo de propor): - Parece lhe que as propostas podem ser lidas quando se tratar de as votar, e que n'essa occasião, se qualquer sr. deputado entender que alguma d'ellas deve ir á commissão, assim o poderá requerer.
(O discurso será publicado em appendice, quando s. exa. restituir.)
Alguns srs. deputados pedem a palavra sobre o modo de propor.

O sr. Consiglieri Pedroso (sobre o modo de propor): -Pedi a palavra para explicar ao sr. Antonio Maria de Carvalho o que se está passando.

O sr. relator da commissão, ao terminar com a palavra sr. José Dias Ferreira, e dada por encerrada a discussão, referiu-se ás propostas apresentadas pelos oradores que ella haviam tomado parte, e declarou quaes d'essas acceitava, em nome da commissão.

Esta declaração do sr. relator quer dizer que não haverá uma nova discussão sobre o parecer da commissão em respeito a essas propostas.

Não discuto agora a legalidade do procedimento da commissão, que tem precedentes, em relação a essas propostas.

Podia discutir a legitimidade, mas nem legalidade nem legitimidade podem existir para as outras propostas, que foram apresentadas depois de encerrada a discussão, e de que nem a commissão, nem a camara têem conhecimento, porque nem sequer ainda foram lidas na mesa.

Ha pouco, tendo eu feito esta observação junto do sr. relator, respondeu-me s. exa. que tinha conhecimento particular d'essas propostos, e que por isso podia desde já dar a respeito d'ellas a opinião da commissão.

Eu entendo, porém, que nós é que não podemos votar propostas que não vimos, que não apreciámos, e que só o sr. relator particularmente conhece. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Arroyo (sobre o modo de propor): - Pedi a palavra para frizar bem um ponto que tem passado sem considerações por parte dos deputados que têem fallado de um e outro lado da camara sobre este incidente.

As propostas que acabam de ser mandadas para a mesa, e que íam ser lidas, foram apresentadas em virtude de um direito garantido pelo regimento, qual é o de se permittir que os oradores, ainda inscriptos quando a discussão se declara encerrada, possam enviar para a mesa propostas de modificação, substituição, ou de qualquer outra natureza.

Ora, é evidente que, não tendo sido apresentadas essas propostas até ao momento em que se fechou o debate, mas somente depois de se haver julgado a materia discutida, não podia até essa occasião ter a commissão conhecimento especial das mesmas propostas. (Apoiados.)

Pergunto, se ellas foram mandadas para a mesa ha poucos minutos, quando foi que a commissão se reuniu para estudal-as, e dar o seu parecer? Se os auctores das propostas usaram do direito de as mandar para a mesa depois da discussão encerrada, a commissão não podia legal e legitimamente examinal-as senão depois do apresentadas; se, desde o momento em que o projecto está affecto á camara, as propostas não podem ser examinadas pela commissão senão depois do serem enviadas pela mesa, e a commissão não se podia reunir com a sessão aberta, sem licença da camará, como manda o regimento, segue-se que tudo isto é desordem, tudo isto que se pretendo fazer é tumultuario. (Apoiados.)

Repito, se por parto d'aquelles que não chegaram a usar da palavra, não se póde lançar mão do direito de mandar

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para a mesa quaesquer propostas, senão quando a discussão está encerrada; desde o momento em que o debate sobre o projecto de que se trata foi encerrado e só então é que as propostas foram remettidas para a mesa, a commissão não podia ter conhecimento d'ellas senão por intermedio da camara.

Portanto, para que o sr. relator podesse fazer a declaração, que ha pouco fez, em nome da commissão, era indispensavel: primeiro, que as propostas estivessem já sobre a mesa; segundo, que fossem enviadas á commissão; terceiro, que esta se tivesse podido reunir com licença da camara. Ora, não tendo a camara deliberado cousa alguma a este respeito, a commissão de certo não se reuniu e portanto a opinião do sr. relator não representa a opinião d'ella. Isto mesmo foi confirmado pela declaração de s. exa., em pregando até, só me não engano, o adverbio "particularmente". Foi apenas uma conversa particular; e mesmo, se a commissão só reuniu, foi illegalmente e por consequencia não póde ter valor qualquer deliberação que tomasse. (Apoiados )

Dito isto, peço a v. exa. que, com a sua auctoridade presidencial, representando-nos a todos, porque representa a camara, faça executar o regimento, não permittindo que elle seja dia a dia infringido.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Vicente Monteiro (sobre o modo de propor): - V. exa. o a camara estão vendo que de tudo se póde fazer uma questão. A prova que não é indispensavel parecer da commissão está no proprio requerimento do sr. Consiglieri Pedroso,
Se s. exa. reconhece que pelo regimento é necessario uma votação da camara para as emendas irem á commissão, segue-se, que a camara podo decidir sem parecer da commissão. A camara, pois, cabe resolver como entender na sua sabedoria.

Permitta se-me entretanto explicar o meu procedimento.
Tendo succedido que quatro dos illustres deputados que mandaram agora propostas, os srs. Alves Matheus, D. José Saldanha, dr. Eduardo de Abreu e José de Azevedo Castello Branco tiveram a deferencia de me communicar quaes os assumptos das propostas que tencionavam apresentar na altura própria do debate; entendi, na minha qualidade de relator, que me assistia o direito, para não dizer que me corria o dever, de communicar á camara quaes d'ellas eram conciliaveis com as resoluções e parecer da commissão de fazenda, e quaes entendi não estarem n'esse caso.

Acrescia ainda que sob algumas d'estas propostas consegui ouvir diversos membros da commissão, alem de conhecer em geral a opinião de todos os que a compõem e que bem póde ser apreciada nas demoradas sessões e larga discussão havida sobre o assumpto, tanto n'este como no anno passado.

Por isso não duvidei fallar em nome e como delegado da commissão de fazenda, por parte da qual nenhuma outra explicação tinha a dar.

Se a camara entende, que estas explicações bastam, vota desde já; se mais largas considerações sobre essas propostas reclamar, resolvo que a commissão deve ser ouvida, e vota n'essa conformidade.

No primeiro caso as propostas são lidas na mesa e a camara pronuncia-se logo sobre ellas, mesmo sem novo parecer da commissão; no caso contrario manda remetter as propostas á commissão.

Isto é inteiramente simples e conforme com o que se tem praticado quasi todos os dias n'esta casa e que nada mais é que a observancia do seu regimento interno.

O sr. José de Azevedo Castello Branco (sobre o modo de propor): - Sem querer por fórma alguma desmentir o cavalheiro que acaba de fallar, é facto que confiei as minhas propostas ao sr. Vicente Monteiro, não tenho duvida em confirmar esse facto; declaro, porém, que fiquei enormemente surprehendido de saber agora, que eu tinha confiado as minhas propostas á commissão de fazenda; e essa declaração agora á tando peior, quanto me obriga a declarar tambem, que por fórma alguma confiaria as minhas propostas ao sr. Vicente Monteiro, se porventura soubesse, que sobre ellas recairia urna opinião, que não posso reputar de fórma alguma como sendo a opinião da commissão de fazenda. (Apoiados.)

Agradeço muito ao sr. Vicente Monteiro o acceitar me algumas modificações, mas isso é a parte insignificante do que proponho, havendo ainda por attender a algumas emendas que entendo que merecem uma consideração especial, porque tratam de acautelar interesses importantissimos e essas, com toda a certeza ou pelo menos, com toda a probabilidade, a commissão não as conhece. Não posso portanto dispensar que as minhas propostas vão á commissão.

O sr. Hintze Ribeiro (sobre o modo de propor): - Pedi a palavra para declarar que a proposta que mandei para a mesa, e que foi assignada por outros meus collegas das ilhas, não foi por mim apresentada, ao sr. Vicente Monteiro.

O sr. Vicente Monteiro: - Já o declarei.

O Orador: - Nas como s. exa. não tinha referido o meu nome entre aquelles, de cujas propostas não tinha conhecimento, por isso desejei fazer esta declaração.
Repito, ninguem tinha conhecimento da minha proposta quando foi apresentada, e ella tinha simplesmente por fim provocar esclarecimentos da parte do sr. ministro da fazenda sobre um ponto que me preocupava e que dizia respeito ás ilhas adjacentes.

A lei de 18 de agosto de 1887 trazia uma disposição que regulava justamente esse assumpto; não sei se essa disposição se mantem ainda hoje, e não sabendo o que ha a esse respeito, não posso em consciencia votar o projecto.
É uma disposição que reputo de toda a importancia justamente para as ilhas que represento n'esta casa.

A minha proposta importava antes uma explicação do que outra cousa; com ella tinha em vista explicar a maneira por que entendo poder ficar mantida a disposição a que me referia e que se encontra n'aquella lei.

Ora, sobre este ponto nada se disse, nem eu tive logar de dizer cousa alguma; portanto peço a v. exa. que a minha proposta seja lula na mesa, para que ao menos o sr. ministro da fazenda emitta a sua opinião acerca d'ella. Contento me com isso, antes de ser votada.
(S. exa. não reviu.)

O sr. D. José de Saldanha (sobre o modo de propor): - Nas palavras que vou dizer, não veja v. exa., sr. presidente, censura para v. exa. nem para pessoa alguma d'esta casa.

Entendo, sr. presidente, que n'esta camara, desde que ha um regimento interno, que lhe diz respeito, nós devemos seguir, em todos os casos, a letra e a lei marcadas n'esse regimento.

Por consequencia entendo que, desde o momento que quaesquer propostas são mandadas para a mesa nas condições em que estas a que me refiro foram mandadas hoje, sobre a questão sujeita ao debato, sobre a materia em discussão, essas propostas deveriam ter sido lidas na mesa e depois consultada a camara sobre se as admittia, ou não.

Mas, sr. presidente, não pedi a palavra por causa d'isso especialmente. A verdade é que a pedi para esclarecer tambem o assumpto debaixo de uma outra ordem de idéas, que passo a indicar.

Quando na sessão de 26 de março findo se começou a discutir n'esta casa o projecto n.° 23, a questão dos tabacos, eu entendi, em consciencia, que devia tomar parte no debate. Mais tarde, deram-se circumstancias independentes da minha vontade, das quaes resultou que, quando me inscrevi, já era tarde, e digo que já era tarde, porque, desde o momento em que esta discussão tinha durado já

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um certo numero de dias, era claro que mais tarde ou mais cedo seria abafada.

A verdade, porém, era que, tendo eu pedido a palavra, obedecendo a uma certa ordem de idéas, linha tambem do adduzir algumas considerações constantes das propostas, que, a convite de v. exa. mandei para a mesa depois de encerrado o debate, e julgando a materia discutida em virtude do requerimento do sr. deputado Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, julguei-me constituido no dever de fazer o que estava ao meu alcance para que, pelo menos, antes de se proceder á votação sobro o projecto pendente - a camara, o paiz, tivessem conhecimento das - minhas propostas, pela leitura que d'ellas fosse feita na mesa. Em harmonia com este meu pensamento, tinha eu hoje, n'esta sala, antes de aberta a sessão, fallado com o sr. relator e nosso collega o sr. dr. Vicente Rodrigues Monteiro, pedindo-lhe informações sobre o que havia, a respeito da fórma por que corria hoje a discussão, e n'essa occasião, com toda a franqueza e lealdade, mostrei a s. exa. as minhas propostas, para, em boa camaradagem, lhe fazer conhecer a materia n'ella contida, e muito, principalmente para lhe indicar a difficuldade que eu tinha tido na redacção da primeira d'essas propostas, ao que acrescentei que teria muito sentimento que as circumstancias não me proporcionassem ensejo para, n'esta casa, esclarecer essa redacção.

A s. exa. fiz eu, n'essa occasião, ver. que tambem, entendo que, na minha qualidade de deputado da nação, mo occorre o dever, de n'esta casa redigir as minhas propostas sempre por fórma que na sua redacção não se possa notar qualquer caracter mysterioso, e que me parecia que com a redacção que eu lhes dera ficara tudo claro e bem explicado.

Quando mandei as propostas para a mesa, julgava eu, e bem, que ellas seriam lidas pelo sr. secretario.

A camara está certa do que acaba do se passar.

O sr. relator da commissão declarou que, por parte da commissão de fazenda, acceita algumas das proposições, contidas em varias propostas, e referiu-se designadamente a tres d'estas propostas.

Depois d'essa declaração fez s. exa. uma pequena pausa, e eu, á vista d'isso, julguei que as minhas propostas ficavam no escuro, como algumas das outras, que tinham sido apresentadas por alguns illustres membros d'esta camara.

Causára-me isto certo espanto, como era natural; mas o meu espanto mais foi, quando depois d'essa pequena pausa, o sr. relator da commissão continuou, e disse, em relação ás outras propostas, que ellas não tinham sido acceitas, que a commissão não as podia acceitar.

Em consequencia d'isso, calculei eu, não sei se bem se mal, que o sr. dr. Vicente Rodrigues Monteiro fazia esta declaração, obedecendo a um certo principio; mas esperava que s. exa. reclamasse, ou pedisse; pelo menos, a leitura na mesa d'essas propostas condemnadas de antemão, para, depois de lidas e admittidas, serem enviadas á commissão.

A camara deliberará como entender.

Poderia interromper-se a sessão, por um pouco, para a commissão de fazenda se reunir e dar parecer sobre essas propostas; mas eu não me considero á altura de indicar a melhor resolução a tomar.

O sr. Lopo Vaz (sobre o modo de propor): - Sr. presidente, respeitemos as formulas, porque ellas são condição indispensavel e garantia necessaria para o regular funccionamento dos nossos trabalhos.

Não é serio, não é regular, (Apoiados.) deliberar de improviso sobre as emendas, resolver sem conhecimento de causa e após uma rapida leitura feita na mesa da camará. Nem a commissão de fazenda póde ter conhecimento exacto da materia, nem a camara póde estar conscienciosamente habilitada para votar.
Pas trop de zèle, porque o trop de zèle, que prejudica em muitos assumptos, n'aquelles que dizem respeito ao jogo de grandissimos interesses, como o projecto da régie, lança sempre tristes suspeições sobre os poderes publicos. (Apoiados.)

Foram mandadas varias propostas para a mesa, propostas que a camara não conhece.

A maior parte dos srs. deputados não as ouviram sequer ler, ou, se foram lidas, não perceberam o que se leu, e eu, que estou fallando, desconheço-as completamente, e não catou habilitado a resolver a seu respeito. A commissão do fazenda não póde ter formulado parecer sobre ellas, porque, pelo menos algumas d'essas propostas chegaram ao conhecimento do sr. relator depois de já estar a sessão aberta, e depois da sessão aberta a commissão de fazenda não se reuniu, porque não pediu auctorisação á camara para se reunir, e não podia reunir-se sem essa auctorisação.

Ás vezes acontece, quando se discute um projecto no seio de uma commissão, que se previnem certas e determinadas hypotheses, discutem se e resolvem-se certos e determinados assumptos, e forma-se um parecer em harmonia com essas resoluções, rejeitando se propostas de alguns membros da commissão, e quando depois no decurso do debate outros deputados apresentam propostas que vão de encontro a uma resolução expressamente tomada sobre esse assumpto pela commissão e contêm materia identica á que foi já expressamente rejeitada pela commissão, o relator póde achar-se então habilitado, visto que a materia d'essas propostas foi já considerada miudamente no seio da commissão e por ella rejeitada por occasião de se discutir o projecto; póde achar-se habilitado, digo, a declarar que a commissão não acceita essas propostas.

Por vezes se tem feito isto aqui, e eu nomeadamente, como relator de alguns projectos, e cicio que já o fiz algumas vezes. Mas esta não é a hypothese sujeita. Pelo contrario, o sr. relator disse expressamente que tinha tomado conhecimento particular das propostas, que tinha fallado sobre ellas com alguns collegas da commissão, e por isso vinha declarar as que acceitava e as que rejeitava.

Portanto, nem a commissão se reuniu para apreciar as propostas, nem tinha havido uma deliberação anterior da mesma commissão, em virtude da qual s. exa. tivesse plenos poderes para rejeitar a materia d'essas propostas, aliás não teria carecido de conversar sobre ellas com alguns membros da commissão de fazenda.

É, pois, necessario que se cumpram as formulas, e as formulas são que essas propostas vão á commissão de fazenda, para esta dar o seu parecer. Uma vez dado esse parecer, a commissão apresenta-o á camara, entra na ordem do dia e discute-se. Creio que, por causa da demora de vinte e quatro ou quarenta e oito horas, não quererão que a questão dos tabacos, arrastada ha tanto tempo pelo governo desde a hypothese do gremio até á da régie, seja agora terminada de afogadilho, sem que a camara ligue a menor idéa ao que approva e ao que rejeita.

Não haverá para a causa publica perigo de uma demora de vinte e quatro ou quarenta e oito horas, e ao contrario, parece-me, que haveria conveniencia para todos, e sobretudo para a auctoridade das resoluções parlamentares, não em um protelamento indefinido, más n'este pequeno adiamento.

Com elle se evitava uma pressa que realmente se confunde com precipitação injustificavel.

Depois das declarações que acabam de ser feitas do ambos os lados da camara, eu, pela minha parte, não posso senão affirmar a minha opinião, que é adversa á resolução de não se mandarem as propostas á commissão, resolução que me parece que é contraria a todas as formulas parlamentares. (Apoiados.)

E creio que não podia haver duvida em se proceder como eu indico, porque o sr. relator, se da primeira vez que fallou disse quaes eram as propostas que estava dis-

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posto a acceitar e quaes eram aquellas que não acceitava, declarou depois, se não me engano, que não tinha duvida em que as propostas fossem enviadas á commissão para dar parecer. (Apoiados.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno do Carvalho): - Sr. presidente, pedi a palavra simplesmente por ser um membro antigo d'esta camara.

Eu queria, em relação a este assumpto, que não tem nenhuma importancia politica, lembrar aos illustres deputados da opposição quaes são as praxes e os costumes.
Discute-se um projecto, e durante essa discussão vão para a mesa emendas, additamentos eu propostas de qualquer natureza.

Para estas propostas irem a commissão é preciso que uma votação da camara assim o determine.

Não havendo essa votação especial da camara, as emendas, additamentos, ou quaesquer outras propostas que tenham sido apresentadas, são votadas antes ou depois doa artigos do projecto, conforme a sua natureza, e não vão á commissão.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Peço a palavra sobre o modo de propor.

O Orador: - É bom que este ponto fique bem esclarecido, para que não se levantem questões que não se fundem na exacta apreciação dos preceitos regimentaes e das praxes.

Quando sobre um projecto ha propostas apresentadas, torno a dizer, só por meio de uma votação da camara podem ser enviadas á commissão; fóra d'isso são votadas antes ou depois dos artigos a que se referem, conforme a sua natureza, sem irem á commissão.

Assim se tem feito sempre.

Acontece hoje que, depois da discussão finda, alguns srs. deputados julgaram conveniente apresentar propostas.

Foram ellas para a mesa, e o sr. presidente annunciou que íam ser lidas para serem admittidas á discussão, que é a, phrase consagrada.

É sabido que nenhuma proposta póde ser votada sem primeiro ser admittida pela camara; e a phrase consagrada é: admittida á discussão.

No caso de que agora se trata, o facto de serem admittidas as propostas não significa que hão de ser discutidas; significa que voto ser submettidas á consideração da camara para a votação.

E isto é que se fez sempre.

E eu digo aqui muito amigavelmente ao illustre relator da commissão que foi s. exa. quem, sem querer, por um excesso de boa vontade, perturbou tudo isto.

Se s. exa. tivesse ficado callado, nada teriam que dizer os illustres deputados do lado esquerdo da camara. Como s. exa. quiz fallar, levantou-se logo uma questão que nos está tomando muito tempo.

O que me pareço que se deve fazer agora, é proseguir a mesa no seu trabalho, lendo, para serem admittidas á discussão, ou á consideração da camara, ou como melhor lhe quizerem chamar, as propostas mandadas para a mesa depois de encerrado o debate e ainda não admittidas.

(Áparte que não se percebeu.)

É a primeira cousa a fazer. De outra maneira, sem primeiro terem sido admittidas, não póde a camara tomal-as em consideração para qualquer effeito.

Foi sempre assim, nem póde deixar do ser.

A formula adoptada para a camara considerar uma proposta, é esta: "Admittil-a á discussão".

Isto faz-se, embora a discussão esteja já encerrada.

E uma phrase que póde significar admittir á consideração; phrase que não tem uma significação determinada, como não significa cousa alguma entre nós a phrase "bill de indemnidade".

Agora, o que me parecia mais curial, e digo isto como simples opinião, porque não tenho empenho nenhum em se resolva de um ou de outro modo; o que me parecia mais curial, repito, era que, depois de admittidas as propostas á discussão ou consideração da camara, e depois do sr. presidente as ter classificado em propostas que tenham de ser votadas antes do projecto principal, e em propostas que se devem votar depois d'elle, a camara deliberasse, quanto ás primeiras, só algumas d'ellas deverão ir a commissão ou se só julgava já suficientemente illustrada para as approvar ou rejeitar: e quanto ás segundas, que decidisse, depois da votação do projecto, e a proposito de cada uma d'ellas, se julgava mais conveniente mandal-as primeiro á commissão ou votal-as logo, approvando-as ou rejeitando-as.

Isto é o que manda o regimento e o que tem sido pratica constante da camara.

Termino, repetindo que todo o equivoco está em suppor-se que as propostas vão á commissão, sem para isso haver votação especial da camara.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Consiglieri Pedroso: - Não é na minha qualidade de antigo deputado que me levanto para elucidar ou deixar de elucidar a questão; mas entre novamente na discussão que se levantou sobre o modo de propor que não posso deixar de accentuar mais uma vez qual é o meu intuito.

Sr. presidente, desde o momento em que o sr. ministro da fazenda entende que, quando o regimento diz admittir á discussão, póde esta phrase significar que se não discuta; desde que s. exa., como deputado antigo, declara, que admittir á discussão tem o mesmo valor que na linguagem parlamentar tem o bill de indemnidade...

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Eu não disso, que admittir á discussão significa o mesmo que bill da indemnidade, o que disse foi que admittir á discussão significa admittir á consideração, e que esta expressão vale tonto, como o bill de indemnidade, que nada vale em portuguez.

A pratica seguida n'esta camara desde longuissimos annos consiste em votar o projecto, salvas as emendas, que era muitos casos são a revogação completa do mesmo projecto; mas é um processo parlamentar, como outro qualquer, consagrado pela pratica e permittido pelo regimento; vale tanto como a palavra bill na lingua portugueza. Admittir á discussão significa tanto como admittir á consideração da camara, quando a camara nada tem que considerar. (Apoiados.)

O Orador: - Depois das declarações do sr. ministro da fazenda, que acabam de ser ouvidas pela camara, é perfeitamente inutil da minha parte, ou de qualquer outro sr. deputado, estar invocando a auctoridade do regimento para decidir a questão.

Desde que s. exa. declara que é praxe parlamentar votar-se um projecto, salvas as emendas, que muitas vezes vem alterar completamente a doutrina do mesmo projecto, não podemos argumentar, fundando-nos n'um regimento que permitte taes abusos.

Não sigo portanto n'este caminho. Exponho singelamente á camara a questão tal qual ella é.

O sr. ministro da fazenda declara que tem sido praxe n'esta camara não irem as emendas, que são offerecidas a um projecto, á commissão respectiva sem uma votação especial da camara. S. exa. afiança que não só a letra do regimento assim o indica, mas que tem sido essa a praxe constantemente seguida. Não discuto a legitimidade d'esse procedimento, nem d'essa praxe acceito-a como tal; mas pergunto a v. exa. e á camara se n'este momento não se trata de uma hypothese diversa.

Quando uma emenda é apresentada no correr da discussão, eu comprehendo a hypothese do um orador que usar posteriormente da palavra poder discutir essa proposta e, apoiado sobre as suas doutrinas, elucidar a opinião da camara; mas pergunto se a hypothese de uma proposta, n'estas condições, realmente discutida, embora o não tivesse

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sido pelo proprio apresentante, é a mesma de ir á camara votar sobre propostas que não conhece.

E note-se que a commissão tambem as não póde conhecer; porque o sr. relator acaba de, dizer que só particularmente as conhece, e a commissão, não só se não reuniu, porque legalmente não o podia fazer sem uma deliberarão da camara estando a sessão aberta, mas tambem nós vimos que todos os seus membros se têem conservado aqui assistindo ao debate, e, que nem só, quer te juntaram ao lado uns dos outros para accordarem em qualquer resolução; isto é uma questão de facto, que não precisa ser provado com outra allegação que não seja a da nossa propria vista. (Apoiados.)

Esta hypothese não está portanto nas mesmas condições d'aquella...

É inutil continuar n'esta discussão. Basta unicamente deixar bem accentuado o facto, note bem a camara, que ella vae votar sobre propostas que têem, não um parecer da commissão de fazenda, mas uma opinião particular do sr. relator, que só particularmente póde tomar d'ellas conhecimento.

Exposta a questão singelamente d'esta fórma, só desejo que a camara vote, porque votando não é de certo sómente contra a minoria, é mesmo contra a propria maioria.

Tenho dito.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Pedi a palavra sómente para explicar melhor o meu pensamento sobre o modo de propor.

Parece me que o sr. Consiglieri Pedroso não me comprehendeu bem. O processo que eu propunha, que é o regimental, sempre seguido n'esta camara, é exactamente o que dava os resultados que s. exa. quer.

As emendas, substituições ou additamentos hão de ser lidos na mesa. Chega a emenda n.° l; se a camara entende que está illucidada pelo debate para poder approvar ou rejeitar essa emenda, approva-a, ou rejeita-a; e se entende que não está illucidada, envia-a á commissão. (Apoiados)

E assim se faz para todas. (Apoiados.)

O sr. Franco Castello Branco: - V. exas. ha dois annos que estão no poder, e é esta a primeira sessão parlamentar em que isto se faz. (Apoiados.)
V. exa. faz favor de me citar a discussão em que isto se tenha, feito?

O Orador: - Eu podia citar, mas não me lembro.

O sr. Franco Castello Branco: - Tem havido tantas discussões importantes!... Cite-me v. exa. uma só em que isto se tenha dado.

O Orador: - Não me lembro agora, mas ha centenares de exemplos (Apoiados.)
De resto eu não tenho feito mais do, que repetir o que está no regimento.

Apresentando se uma proposta em qualquer altura do debate, é admittida á discussão; quer dizer, á consideração da camara

Uma VOZ: - Mas o debate já estava encenado.

O Orador: - O regimento tambem permitte que a requerimento do deputado interessado, as emendas possam ir para a mesa ainda mesmo depois do debate encerrado. (Apoiados.)

Ora, estas emendas, ou são importantes ou não. Pelas pessoas que as apresentarem certamente que o são; pela doutrina tambem serão; mas podem estar comprehendidas no projecto; serão contrarias ao pensamento d'elle; serão modificações já attendidas, ou cousa inutil; mas admittem-se todas á discussão. (Apoiados.) Lêem-se primeira vez pára serem admittidas á discussão, e lêem-se segunda vez para serem votadas e então é que a camara conhecerá só ellas devem ir á commissão ou devem ser já approvadas ou rejeitadas. (Apoiados.)

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. José de Azevedo Castello Branco (sobre o modo de propor): - Eu já declarei que não me envaidece que as minhas propostas sejam acceitas, assim como não me entristece o facto d'ellas serem rejeitadas; mas irritou-me a maneira como o sr. relator sé auctorisou a acceitar ou rejeitar aquillo que eu não tinha submettido ao sr. relator, mas que tinha confiado ao sr. Vicente Monteiro. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu peco a v. exa. que, se a camara entender, como eu entendo, que as propostas devem ir á commissão para sobre ellas, dar o seu parecer, a, minha proposta fique; mas, se a camara entender o contrario peço licença para retirar essa proposta. (Apoiados.)

O sr Arroyo (sobre a ordem): - Parece-lhe que depois de terem usado da palavra varios deputados que se seguiram nos debate, não se fez, por parte da maioria, senão complicar a questão e empregar uni certo numero de sophismas por tal maneira transparentes, (Apoiados.) que é indispensavel, pelo menos hoje, que não se repitam para que não se imagine que a maioria, ou o governo podem praticar violencias d'esta ordem sem protestos do lado esquerdo da camara. (Apoiados.)

A seu ver, a questão é simplissima.

Não se apresentaram propostas sómente durante a discussão, houve uma serie do propostas apresentadas, no uso de um direito garantido pelo regimento da camara, quando o debato estava já encerrado.

O sr. relator, embora de boa fé, mas illegalmente, porque não fez senão combater a propria letra expressa do regimento, apresentou-se a declarar em nome da commissão, que ella acceitava em certos pontos algumas d'essas propostas, regeitando outros e que a respeito de algumas em sequer uma pequena parte acceitava.

A commissão de fazenda não se podia reunir, porque tendo sido apresentadas as propostas já n'esta sessão, era indispensavel para isso uma auctorisação da camara e esta nada deliberou a este respeito logo é uma illegalidade evidente e manifesta, (Apoiados ) apresentar-se o sr. relator a fallar em nome da commissão. (Apoiados.)

orador, o que mais admira é que os membros da commissão de fazenda se não levantassem protestando contra uma declaração d'esta ordem.

Dirigindo-se ao sr. presidente, diz que s. exa., que timbra no cumprimento dos seus deveres presidenciaes, devia mais uma vez, no cumprimento d'esses deveres, não permittir que o sr. relator fizesse uma Declaração que dependia de uma reunião anterior, quando é certo que tal reunião não podia ter havido, e quando o sr. Vicente Monteiro fallava unicamente como deputado e não como representante official da commissão de fazenda...(Apoiados.)

Em presença d'estes factos o que lhe parece é que ha um interesse qualquer em acabar hoje a questão dos tabacos (Apoiados.) Pelo menos o sr. Marianno de Carvalho assim o tem manifestado nas duas vezes que já tem fallado.

S. exa., o antigo deputado, que só aspirava, por todas as liberdades e por todas as manifestações de pensamento, dizia agora que admittir uma proposta á discussão, era o mesmo que votar um bill de indemnidade; é tal cuidado mostrava pela approvação immediata do projecto, que dava logar a perguntar se: o que estará dentro n'elle?

A cotação das acções da companhia nacional não fica a mesma quer sejam votadas as emendas hoje quer na segunda feira? Pois ,o estado não gasta os mesmos 7 200:000$000 réis, ou sejam votadas hoje todas as emendas ou o sejam na segunda feira? O jogo de interesses, a tal intriga politica não fica porventura na mesma?

Se assim é, pois, acrescenta o orador, para que é esta precipitação na approvação do projecto, e ao mesmo tempo uma teimosia, uma pertinacia, cuja violencia tão injustificada contra as propostas da opposição parlamentar?

Que necessidade ha, como muito bem disse o sr. Lopo Vaz, de lançar mão d'estes recursos, quando a questão sé cifra unica e simplesmente em que a commissão de fazenda

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se reuna e analyse uma proposta, para que ella legalmente possa dizer que a apreciou, e para que a camara não possa dizer que essa apreciação não é legal?

Que mais deseja a opposição senão que o regimento se cumpra?

Para que se ha de infringir o regimento praticando uma violencia?

Conclue protestando contra similhante procedimento, porque vê n'elle uma illegalidade e uma falta absoluta de observancia da letra do regimento.

(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Antonio Maria de Carvalho (sobre o modo de propor): - Não concorda com o orador precedente. Acha de todo o ponto correcto o procedimento da mesa e da camara. As propostas só devem ir ás commissões, segundo o regimento, quando a camara assim o deliberar o portanto podem ser votadas sem que ellas tenham dado o seu parecer.

N'este sentido expõe o orador diversão considerações.

(O discurso será publicado na integra, e, em appendice a esta sessão quando s. exa. o restituir.)

O sr. Franco Castello Branco (sobre o modo da propor):- Pedi a palavra porque- preciso que v. exa. nos faça a fineza de nos dizer como é que tem procedido sempre em circumstancias identicas, desde que preside a esta camara.

V. exa. é um cavalheiro por tal forma respeitavel, que fazer este appello a v. exa. será o mesmo que fazel-o á propria verdade; e assim, para se pôr termo a este conflicto entre a opposição e a maioria, eu desejava, antes do mais, que v. exa. nos fizesse a declaração que peço, isto é, que nos dissesse como tem procedido em circumstancias identicas.

O sr. Presidente: - Desde que tenho a honra de occupar este logar, ainda se não levantou n'esta casa uma questão identica á que agora se está ventilando, mas o que posso assegurar a v. exa. é que, sempre que por parte de algum sr. deputado se tem pedido que qualquer proposta vá a uma commissão, é consultada a camara e é ella quem resolve. (Apoiados.)

O Orador: - E quando os relatores o não toem requerido, a mesa não tem tomado algumas vezes a deliberação de mandar propostas ás commissões?

O sr. Presidente: - Nunca as propostas foram mandadas á commissão sem deliberação da camara, e a requerimento, ou do relator do parecer, ou de qualquer outro sr. deputado.

O Orador: - Então o que se segue é que, desde que v. exa. presido á camará dos senhores deputados ainda em occasião alguma succedeu o que está succedendo hoje; quer dizer que, ainda não deixaram de ser enviadas ás commissões as propostas, sempre que isso se requeira...

Vozes: - Nada, nada.

O Orador: - Eu queria perguntar ao sr. ministro da fazenda, que tem excellente memoria, e que tem acompanhado as discussões d'esta camara; queria perguntar-lhe, digo, se em alguma discussão s. exa. tinha visto proceder como agora se queria proceder.

Não nos estejamos a illudir. O que se quer, por parte do illustre relator da commissão e da maioria, é que hoje fique completamente terminada a questão do tabaco; o que se quer é que se não gaste nem mais um minuto na discussão de um tal assumpto; e para isso, pretende-se resolver desde já sobre propostas que ninguem conheço e que não estavam na mesa na occasião em que a materia se julgou discutida. (Apoiados)

O sr. Vicente Monteiro apresentou a opinião da commissão acerca de algumas propostas, e eu pedia a s. exa. o favor de me dizer quando e aonde a commissão se reuniu.

O sr. Vicente Monteiro; - Não se reuniu.

O Orador: - S. exas. são a maioria, têem a força; mas é necessario, quando commettam uma violencia, quando se apresentem, em circumstancias como esta, dispostos a passar por cima de tudo que e do regimento, é necessario, digo, que fique bem definido o procedimento d'essa maioria, e registada a occasião em que se emprega tal violencia.

O sr. deputado Vicente Monteiro iniciou este conflicto em nome de uma commissão que s. exa. mesmo já declarou que não sã reunira, e isto é que é importante que fique registado nos annaes parlamentares.

O sr. Vicente Monteiro: - Não tenho duvida n'isso, desde que fiquem tambem consignadas as palavras do sr. Lopo Vaz.

O Orador: - O illustre deputado está no seu direito de assim o requerer; mas, se quer que eu lhe pi este o favor especial de fazer requerimentos para num e para s. exa., não tenho duvida alguma n'isso.

O que desejo é que fique bem consignado que este conflicto teve principio em uma declaração do sr. relator da commissão, e que, perguntado um que lugar se reunira a commissão, s. exa. respondeu que hão se reunira tal commissão. (Apoiados.)

Desde o momento em que a maioria e o governo querem forçar esta discussão, não tenho meio de o impedir, a não ser que quizesse lançar mão de meios extra parlamentares; mas não é esse o meu costume, e por isso apenas desejo que fique bem consignado o facto em relação ás declarações do sr. relator.

Discutiram-se o anuo passado assumptos momentosos para o paiz, taes como a creação do banco emissor e com o qual se ía firmar um contrato importante com o governo; a reforma da pauta geral das alfandegas, projecto importantissimo pela sua complexidade; a lei das estradas; a lei do recrutamento e tantas outras leis de todos os ministerios; a todos estes projectos se apresentaram emendas, additamentos e substituições, e todavia nenhuma d'essas occasiões deixou qualquer d'essas propostas de ser remettida ás respectivas commissões, e sempre, ou impressos ou escriptos, se mandaram para a mesa os respectivos pareceres.

Foi necessario que chegasse a questão do tabaco, que é acima de tudo a fabricação do tabaco por conta do estado o a expropriação das fabricas no valor de muitos milhares de contos de réis, foi necessario que chegasse um negocio d'esta ordem, para que se esquecesse todo o passado d'esta maioria parlamentar, e que v. exa., que até hoje tinha presenciado no tocante a este ponto, um proceder uniforme por parte dos membros do parlamento, assistisse hoje a um facto d'esta ordem.

Já por tres vezes se tem levantado o sr. ministro da fazenda e á terceira veiu dizer nos, com o seu ar mais fagueiro e mais carinhoso, que o regimento o que mandava era que fossem votadas, uma a uma, conjunctamente com cada artigo do projecto, que não tem senão um, e isto é o mais interessante, as propostas mandadas para a mesa e depois de admittidas, não a discussão, mas á consideração da camara!

Ora, isto é simplesmente uma comedia, e não me parece ser esta a melhor fórma do parlamento levantar o seu prestigio, nem de cada um de nós levantar o nivel dos poderes publicos em Portugal. (Apoiados.)

Se querem ir para essa violencia, vão; mas só depois de um deputado ter posto bem em evidencia o procedimento actual da maioria n um assumpto que é simplesmente um negocio, confrontando-o com o que ella tem tido em assumptos de muito maior importancia para o estado.

Pratiquem a violencia, mas fique bem consignado o procedimento do sr. relator da commissão de fazenda sobre o incidente especial a que me tenho referido.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

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SESSÃO DE 14 DE ABRIL DE 1888 1075

O sr. Eduardo de Abreu (sobre o modo de propor): - No caso da camara decidir, e o que decidir bem decidido será, que as propostas, as emendas e os additamentos que tive a honra de mandar para a mesa e que não podem melindrar em nada o governo, se elle quizer ser justo para commigo; no caso, digo, da camara decidir que essas emendas não vão á commissão, nem mesmo sejam lidas na mesa, pedia a v. exa. que ao menos fossem impressas no Diario da camara.

(S. exa. não reviu.}

O sr. Presidente: - Vae votar-se o requerimento verbal do sr. Consiglieri Pedroso. Para esclarecimento da camara pergunto a s exa. só pretende que vão á commissão as propostas mandadas para a mesa, depois de encerrado o debate, ou tambem as que foram apresentadas durante a discussão.

O sr. Consiglieri Pedroso: - O que eu requeiro é que só vote o projecto, salvas as emendas, indo estas á commissão para as apreciar.

Foi rejeitado.

O sr. Presidente: - Vão ler-se para serem admittidas as propostas que foram mandadas para a mesa, depois de encerrado o debate.

A primeira é do sr. Eduardo de Abreu.

O sr. Lopo Vaz: - Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: - Para esclarecimento da camara e regularidade dos trabalhos, devo dizer ao illustre deputado que, depois de encerrada a discussão, só póde ser concedida a palavra sobre o modo de propor ou de votar.

O sr. Lopo Vaz quer inscrever-se sobre o modo do propor ou de votar?

O sr. Lopo Vaz: - Para depois de votada a admissão das propostas.

Leram se na mesa as seguintes:

Propostas

Considerando que no inquerito sobre as condições do trabalho manual nas fabricas de tabaco e situação dos respectivos operarios, ordenado por decreto de 23 de setembro de 1887, depozeram os medicos da caixa de soccorros e de aposentações "Paulo Cordeiro", declarando que o tabaco podia ter influencia perniciosa na saúdo das pessoas que o manipulavam, e que não se podia pôr em duvida que as circumstancias, segundo as quaes entre nós era fabricado, aggravavam essa influencia;

Considerando que a opinião d'aquelles peritos, relativa á influencia do tabaco na saude dos operarios, é abonada pelas observações de grandes auctoridades de sciencia hygienica e industrial, e poios conselhos de importantes congressos, tendo caído em perfeito descredito as asserções apresentadas ha quarenta e cinco annos pelo dr. Ruef de Strasburg e pelo visconde de Siméon, director geral dos tabacos, sobre uma pretendida influencia salutar, d'esta substancia contra o apparecimento da tuberculose pulmonar;

Considerando que a opinião d'aquelles peritos, relativa ás más condições que entre nós aggravam a influencia exercida pelo tabaco sobre os operarios, é digna de ser cuidadosamente meditada pelos poderes publicos, não hesitando o proponente abaixo assignado em declarar que uma inspecção technica feita a esses centros industriaes, dirigida por medicos e engenheiros de reconhecida competencia, havia necessariamente de descobrir os perigos e apontar o meio de remover ou attenuar uma boa parte das influencias que estão deprimindo e estragando traiçoeira e permanentemente a existência de 6.000 individualidades portuguezas, homens, mulheres e creanças, pois tal é no actual momento a população operaria das fabricas de tabaco;

Considerando que estes factos estão indicados com bastante clareza e grave significação no inquerito citado, porquanto;

1.° No depoimento n.° l diz-se que "o trabalho da manipulação do tabaco é nocivo á saude dos operarios, produzindo tisicas, e que em geral não são boas as condições hygienicas das fabricas;

2.° No depoimento n.° 4 que o a tuberculose é a molestia predominante dos manipuladores, e que as condições hygienicas das fabricas são geralmente más";

3.° No depoimento n.° 8 que "n'aquelle anno do inquerito (1887) tinham morrido na mesma fabrica tres irmãos, de tisica pulmonar, facto que se attribuia a constipações contrahidas no acto de se descalçarem";

4.° No depoimento n.° 22 que "um protesto de fabricação usado n'uma fabrica desenvolvia em abundância uns gazes suffocantes, produzindo nos operarios dores de cabeça e provocando nauseas";

5 ° No depoimento n,° 23 que "a situação dos operarios em algumas fabricas, pelo modo por que eram tratados, merecia a classificação do - escravatura branca: - o que as operarias eram obrigadas a descalçar se para serem revistadas em uma casa junto da porta da rua, onde por vezes, em tempo de chuva, o chão se achava molhado, sendo os palmos que costumam estender insufficientes para evitar os effeitos da humidade ás mulheres que se achassem em condições especiaes de saude, ou que tiveram parto recente";

6.° No depoimento n." 27 que "a officina estava em pessimas condições hygienicas: que poucas vezes era limpa; que a limpeza se fazia, ás vezes, quando os operarios estavam na officina, levantando se então nuvens de pó que os operarios absorviam; que entre elles eram vulgares as tisicas provenientes do mau ar que respiravam durante longas horas";

7.º No depoimento n.° 28, que "as condições hygienicas eram más; que o chão era em parte ladeado, passando per baixo d'elle um canno de despejo que, nas occasiões da baixamar, exhalava um pessimo cheiro, sendo assim facil calcular quanto prejudica o operario estar um dia inteiro sentado com os pés sobre o lagedo";

Considerando que no 8.° annexo ao depoimento n.° 39, os medicos depoentes, depois de mencionarem as cansas que estão deprimindo a população das fabricas, avançam que "o germen da tuberculose encontra-se facilmente n'aquelle meio, e que a parte da população predisposta, mas ainda não affectada, adquire-o facilmente do ar e dos escarros",

Considerando que o presidente da secção de Lisboa, no seu officio sobre os resultados geraes do inquerito dirigido em data de 18 de dezembro de 1887 no conselheiro presidente da commissão de inquerito, declara muito terminantemente que não são boas em geral as condições hygienicas das fabricas de tabaco; que a maioria das officinas não tem a cubagem atmospherica sufficiente para o numero de pessoas que ali trabalham; que a ventilação é imperfeitissima, que estas circumstancias exercem uma influencia nociva sobre a saude dos operarios e que, finalmente, não póde deixar de ser considerado como da mais alta gravidade o facto dos medicos encarregados da clinica operaria affirmarem que na estatistica das doenças predominantes na população das fabricas de tabaco de Lisboa á tuberculose figura na proporção de 75 por cento(!);

Considerando que é em taes condições das fabricas e dos operarios que pelo projecto de lei n.° 23 e bases annexas, a fabricação dos tabacos no continente do reino passa a ser feita exclusivamente por conta do estado;

Considerando que, por esta empreza, o actual governo e aquelles que se lhe seguirem assumem, mais uma responsabilidade governativa, não pequena e nada leve, porque a sua attenção tem de ser derivada sobre o expediente superior e boa execução de mais uma lei que abrange um novo e vastissimo quadro de funccionarios publicos, que avoluma consideravelmente o diario financeiro e administrativo do estado, e que dilue por todos os cantos do paiz

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novas formulas para a circulação de dinheiros publicos, em creditos e debitos, circumstancias que vem complicar os serviços officiaes já bastante intrincados e demasiadamente luxuosos para as modestas forças da nação;

Considerando, porém, que o equilibrio financeiro do paiz exige do patriotismo do governo que assuma essa responsabilidade, da qual aliás, elle e os governos que se seguirem poderão sair-se airosamente sempre que queiram e saibam proceder energicamente no sentido de desterrarem das fabricas qualquer influencia perturbadora do trabalho dos operarios e de resistirem tenazmente contra a imposição de despezas, mais ou menos disfarçadas, e que possam levar o escriptorio ou secretaria d'este novo ramo de administração publica a figurar tambem com o seu orçamento rectificado;

Considerando que uma boa parte d'essa responsabilidade reside evidentemente nas condições hygienicas das fabricos, que, sendo más, como foi affirmado n'um inquerito official, devem sor melhoradas pelo estado, porquanto a sabedoria dos governos não deve comprazer-se tão sómente em trazer alegres pelo lado financeiro todos os elementos interessados na questão, desde o opulento accionista até ao humilde operario, mas devo tambem como poder altruista e previdente olhar pela vida e conforto da classe pobre que vae dirigir, exercendo uma tutela amoravel e benefica sobre o vigor physico das gerações operarias;

Considerando que, se os corpos co legisladores não assentarem na adopção de algumas medidas destinadas a garantir progressivamente o bem estar dos operarios nas respectivas fabricas, a questão hygienica correrá o perigo de continuar no estado lamentavel em que o inquerito a deixou, se não peiorar, caso, como até aqui, o espirito da ganancia continue a dominar as partes interessadas;

Considerando, finalmente, que sendo importantissima a receita calculada para o estado, proveniente do vicio do tabaco, é momento aproveitavel para se dar a uma pequena parte d'essa receita um uso, entre todos o mais honroso e urgente, a fim de terminar do vez um estado de cousas que traz revoltadas a sciencia e consciencia publicas o que, constituindo uma exigencia sagrada na vida do um povo livre, civilisado e bom, debalde costuma ser lembrada pelos governos quando opposições, e vice versa;

Tenho a honra de enviar para a mesa as seguintes propostas, emendas e additamentos:

Base 2 ª § 10. - Os medicos que actualmente estiverem ao serviço das fabricas de tabaco, ou aquelles que o governo designar, serão obrigados, mediante remunerarão condigna, a apresentarem relatorios trimestraes.

Base 3.ª - O governo, ao tomar conta das fabricas, mandará proceder immediatamente ao seu saneamento e á introducção dos melhoramentos mais urgentes aconselhados pela hygiene industrial.

No trabalho das fabricas não serão admittidos menores do sexo masculino de idade inferior a dez annos, nem do sexo feminino inferior a doze.

Os menores do ambos os sexos, os operarios que soffrerem doenças do apparelho respiratorio e as mulheres gravidas, não poderão ser empregadas na manufactura do rapé.

Nenhuma mulher será admittida ao trabalho senão quinze dias, pelos menos, depois do parto.

Haverá creches o escolas, fundadas, sempre que for possivel, fóra do recinto das fabricas.

Dos 5 por cento do excesso dos lucros annuaes sobre 3:000$000 réis é destinada a percentagem de l 1/2 por cento, para se manterem em boas condições hygienicas as fabricas, officinas, creches e escolas, introduzindo-se-lhes os melhoramentos que forem successivamente indicados pela hygiene industrial.

Base 10.º - Da receita dos tabacos, inscripta no orçamento respectivo, transitará annualmente para o ministerio do reino a verba de 50:000$000 réis, exclusivamente destinada para a construcção, em Lisboa, de um hospital de alienados.

Camara dos deputados, 14 de abril de 1888. = Eduardo de Abreu.

Foram admittidas.

O sr. Presidente: - Segue-se uma proposta do sr. Hintze Ribeiro.

Leu-se. E a seguinte:

Proposta

Subsiste o que determina o § l,° do artigo l.° da lei de 18 de agosto de l887, para o tabaco manipulado no continente do reino que entrar nas ilhas adjacentes.

Se o importador do tabaco for o estado, não poderá expol-o á venda nas ilhas por preço inferior á importancia por que é entregue ao consumo no continente, addicionada da differença do imposto que paga o tabaco em rama para o manipulado no estrangeiro.

O governo fica auctorisado a indemnisar as fabricas insulanas das despezas extraordinarias que fizeram no intuito de se habilitarem a usufruir as vantagens concedidas pela lei de julho de 1885, e que pela actual são annulladas.

Camara dos deputados, 14 do abril de 1888. = Jacinto Candido da Silva = Francisco Severino de Avellar = Antonio Augusto de Sousa e Silva = Arthur Hintze Ribeiro.

Foi admittida.

O sr. Lopo Vaz: - Eu tinha pedido a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: - Eu já disse a v. exa. que não ha pedido de palavra para requerimento depois de julgada a materia discutida

O sr. Lopo Vaz: - Peço desculpa, mas como v. exa. tinha dado a palavra para um requerimento ao sr. Consiglieri Pedroso.

O sr. Presidente: - Eu tenho inscripto sobre o modo de propor ou de votar, todos os srs deputados, que pediram a palavra. V. exa. não fica prejudicado no uso da palavra, porque póde inscrever se do mesmo modo, quando eu propozer á admissão alguma das propostas, que ainda não foram lidas.

O sr. Lopo Vaz: - Eu não tinha presente o requerimento. Ouvi ao sr. Consiglieri Pedroso pedir a palavra gara um requerimento depois da materia estar discutida.

Ouvi v. exa. dar a palavra a alguem e entendi por consequencia que isto tinha logar, ou porque o regimento estabelecia essa disposição, ou porque v. exa. tinha prescindido da disposição do regimento que o não permittia; mas visto que não logro merecer a benevolencia de v. exa. para me conceder a palavra n'este momento, aguardo occasião opportuna e então farei as considerações que se me offerecerem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Ha ainda quatro propostas paia serem admittidas, das que foram apresentadas depois do encerrada a discussão do projecto.

Vão ler-se:

Leu se mais a seguinte:

Proposta

Proponho:
Que no § 6.° da base 3 a fique consignado que a percentagem de participação nos lucros liquidos da fabricação do tabaco seja 10 por cento, dos quaes pertencerão 1/10 ao conselho de administração, 1/20 ao conselho fiscal,8/100 ao pessoal não operario e 67/100 ao pessoal operario.

Que no mesmo paragrapho se consigne que a verba com que cada operario contribuir para as caixas de soccorros e de reformas seja escripturada á conta individual

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de cada um, constituindo pela accumulação do juro de 4 por cento um capital não alienado, mas reservado e transmissivel por herança.

Que a liquidação d'esta conta individual possa fazer-se sempre que o operario o requeira ao cabo de trinta annos de bom serviço.

A base 3.ª, que só acrescente um paragrapho declarando legal, independentemente da auctorisação administrativa, a existencia das actuaes associações operarias, e bem assim de outras que do futuro só organizem sob a fórma de syndicatos profissionaes.

Ao § 2.° da base 3.ª, que a caixa de reformas para operarios impossibilitados seja denominada "Caixa do João Paulo Cordeiro".

Ao § 3.º da base 9.ª, que se declare que os operarios gosarão d'esta garantia mesmo no caso de por quaesquer circunstancias não vingar a régie.

Ao § 4 ° da bate 2.ª, que fique assim redigido: - Os deveres e attribuições dos membros dos dois conselhos regulam-se quanto possivel pelas prescripções do novo codigo commercial relativas a sociedades anonymas, sendo o mandato sempre revogavel.

Que o projecto seja harmonisado com o pensamento do parecer n.º 230 da sessão de 1887, no que respeita ás garantias dos operarios e com o do projecto de lei n.° ... da mesma sessão no tocante á regulamentação do trabalho dos menores e das mulheres. = O deputado, J A. da Silva Cordeiro.

Foram admittidas.

O sr Presidente: - Vão ler-se agora a proposta do sr. Alves Matheus.

É a seguinte:

Proposta

Proponho que o § 5.° da base 9.ª fique redigido pela fórma seguinte:

§ 5.º A 'disposição da base 6.ª, § 1.° não prejudicará, os actuaes depositarios e revendedores, sendo em regra as percentagens d'estes e dos vendedores, que por intermedio d'elles se abasteciam, determinadas pelas tabellas era vigor, da companhia nacional de tabacos. = Alves Matheus.

Foi admittida

Leram-se mais as seguintes:

Propostas

Proponho que no artigo 1.°, onde só lê "quarenta" se leia "cincoenta".

Na base 2.ª, onde se lê aconselho fiscal composto de tres membros, etc.", deve ler se "conselho fiscal composto de cinco membros, dois eleitos pela camara e os restantes nomeados pelo governo".

O § 5.° seja redigido pela fórma seguinte;

§ 5.° O presidente do conselho de administração, que terá a designação de administrador geral dos tabacos, vencerá o ordenado fixo de 900$000 réis; os vogaes do conselho o de 600$000 réis annuaes. Os do conselho fiscal receberão em senhas de presença 9$000 réis por sessão, cujo numero será fixado pelo conselho de administração, segundo as exigencias do serviço, devendo reunir-se pelo menos uma vez mensalmente.

Na base 4.ª, onde se lê ia consumir até 10 por cento, etc.", devo ler-se "a consumir pelo menos 10 por cento, etc."

Base 6.ª Proponho que seja redigida do seguinte modo:

A venda de tabacos fabricados continua livre nos termos da legislação em vigor.

§ 1.° A administração do estado poderá, todavia, sem prejuizo dos actuaes vendedores e revendedores, modificar os serviços de fórma a simplificar a venda, cobrança e arrecadação dos rendimentos dos tabacos.

§ 2.° Poderá igualmente o governo empregar na venda de tabacos parte do pessoal reformado da fiscalisação externa das alfandegas, o auctorisar por elles ou outros agentes, a venda ambulante unicamente nas pequenas povoações da raia.

Sala das sessões, 14 de abril de 1888. = José de Azevedo Castello Branco.

Proponho tambem que na base 3.ª, e no § 6.°, onde se diz "3/50 ao conselho fiscal" leia se "5/50 ao conselho fiscal". = José de Azevedo Castello Branco,

Foram admittidas.

O sr. Presidente: - Besta uma proposta do sr. D. José de Saldanha.

Leu-se.

É a seguinte:

Proposta

Proponho que desappareça das bases do projecto de lei n.° 23 o principio indicado pelas palavras "acrescido dos lucros cessantes", e que o projecto e bases se redijam por fórma que na expropriação das fabricas, se attenda, emquanto ao que o governo houver 4° pagar, aos principios geraes que até hoje têem regulado no paiz as compras e vendas de quaesquer bens.

a) Os vencimentos e percentagens não poderão dar honorarios superiores a:
3.00$000 réis (três contos de réis) ao presidente do conselho de administração;
2:000$000 reis (dois contos de réis) a cada um dos mais vogaes do conselho;
l:400$000 réis (um conto e quatrocentos mil réis) a cada vogal do conselho fiscal.

§ unico. O que sobrar das percentagens estabelecidas no § 6.° da base 3.ª reverterá, a favor do estado.

b) Sempre que qualquer dos membros do conselho de administração ou do conselho fiscal houver de ir ao Porto, em objecto do serviço a seu cargo, receberá uma gratificação diaria de... para prato, e ser-lhe-ha abonada a despeza de viagem no caminho de ferro, em logar de segunda classe, conforme a tarifa em vigor.

c) Fica prohibido a todo e qualquer membro do conselho de administração e do conselho fiscal, e a todo e qualquer empregado das fabricas, incluindo os operarios, o receberem luvas de qualquer natureza, sejam de quem for, e igualmente lhes é prohibido o terem qualquer ordem de transacções commerciaes com qualquer dos fornecedores das fabricas ou dos vendedores dos productos fabricados, e caso qualquer d'esses empregados do estado ou operarios incorra n'essas faltas, será processado por esses crimes

Convido a commissão a introduzir nas bases uma ou mais condições tendentes a conseguir, que, dada a diminuição do numero dos operarios com o decorrer dos annos e com as modificações das machinas e dos processos fabris, a percentagem nos lucros da fabricação concedida aos operarios não possa ir alem de uma certa quantia para cada um d'elles, revertendo o excesso para os cofres do estado. =

O deputado, José de Saldanha Oliveira e Sousa.

O sr. Lopo Vaz: - Peço a palavra sobre o modo de propor.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o illustre deputado.

O sr. Lopo Vaz (sobre o modo de propor): - Como a camara rejeitou a proposta do sr. Consiglieri Pedroso, tendente a que todas as emendas fossem enviadas á commissão e não houvesse votação sobre ellas n'este momento, não discuto nem posso discutir a resolução da camara; mas n'essas emendas ha duas categorias bem distinctas, (Apoiados.) ha as emendas, que foram apresentadas na altura do debate, que estiveram em discussão conjunctamente com o projecto e a respeito das quaes já versou ou póde versar a discussão, e ha as emendas que foram apresentadas já

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fóra da altura da discussão e que acabam de ser admittidas agora, para o facto da camara se pronunciar sobre ellas e que são justamente aquellas que a camara não conhece e sobre as quaes nós não estamos habilitados a resolver. (Apoiados.)

Ora n'estas condições pedia a v. exa. que consultasse a camara, para que ao menos, as propostas mandadas para a mesa depois de encerrado o debate, que não estiveram em discussão conjunctamente com o projecto, que ninguem conhece, sejam enviadas á commissão. (Apoiados.)

Os governos devem governar, as maiorias devem tambem governar, mas dentro dos limites racionaes e cordatos. (Apoiados.)

Governar pela violencia, pelo atropellamento, pela suppressão das formulas, que são a primeira garantia da seriedade das leis e dos poderes publicos, não é governar, é provocar. (Apoiados.)

Eu sou velho no parlamento e tenho tido occasião de ver, que não são os meios tumultuados e irregulares os melhores para se conseguir o que se deseja, e para obter vantagens para o governo e para as instituições.

Tivemos aqui ha tempo uma scena bastante desagradavel, não digo que se repita, mas tivemos uma scena violenta bastante, e porque?

Porque se quiz fazer discutir e votar pela camara, um projecto, que a opposição d'esta casa, nem sequer conhecia!

Uma Voz: - E a violencia não era tão grande.

O Orador: - Effectivamente é verdade, a violencia de então, ainda não era tão grande como esta.

E caso celebre, triste fatalidade, deu-se esse facto, quando estava ali sentado, como hoje, o sr. ministro da fazenda, a dirigir a maioria da camara!

S. exa. que é um homem illustre pelo seu talento, um orador distinctissimo, um parlamentar habilissimo, quando chega a occasião de uma votação, tem pruridos nervosos, que o levam a pretender precipitar as resoluções, sem vantagem nenhuma, nem para o governo nem para o esclarecimento dos negocios, nem para a rapidez com que os negocios andam.

Ora, sr. presidente, pedia a v. exa. que attendesse ao meu pedido, consultando a camara, porque asseguro a v. exa. que por parte da opposição, pelo menos por parte dos meus amigos politicos, não ha o minimo proposito de protelar o debate, nem de gastar muitos dias, discutindo o parecer sobre essas propostas, o que ha simplesmente da parte da opposição, é o desejo de resolver conscientemente sobre este assumpto; e fazendo este pedido a v. exa., tenho principalmente por fim, a regularidade dos trabalhos parlamentares, a harmonia e a concordia que deve existir entre todos os membros d'esta casa, no que respeita aos tramites Consignados no regimento d'esta casa, para que não aconteça tomarem-se resoluções que se contradictam umas ás outras, que abatem a auctoridade moral do parlamento que são uma serie de provocações á opposição parlamentar.

V. exa. comprehende, que já no começo d'este debate se pretendeu evitar e effectivamente conseguiu-se, a discussão na especialidade, d'este projecto dos tabacos, resolvendo-se um contrario das boas praxes parlamentares, que houvesse uma só discussão na generalidade e na especialidade.

Em seguida abafou-se a discussão, havendo ainda bastantes oradores inscriptos.

Pela resolução que a camara tomou, é claro que vão ser já votadas sem previo parecer da commissão de fazenda, as propostas apresentadas durante o debate, e que estiveram em discussão conjunctamente com o projecto.

Se se quer fazer o mesmo ás que acabam de ser lidas na mesa, e que não estiveram era discussão, nem a camara conheço devidamente, leva-se ao seguinte, o tumulto e a violencia.

Tudo tem um termo, tudo tem o limito. A paciencia da opposição tambem se esgota, desde o momento em que se quer amontoar as violencias.

Eu pedi, pois, a palavra a v. exa. sr. presidente, para pedir em nome de todos os que estando n'esta assembléa desejam a regularidade e a ordem n'esta casa, em nome da tranquillidade com que o debate tem corrido até aqui, para que continue assim, porque é assim que o parlamento se illustra e se eleva, (Apoiados.) e para que não haja a persistencia de levar por diante uma resolução, que evidentemente é uma provocação insolita á opposição; é a resolução de votar desde já as propostas apresentadas fóra do decurso do debate, isto é, depois de encerrada a discussão, e a respeito das quaes, não póde haver conhecimento sufficiente para resolver desde já Se s exas. se julgam habilitados para resolver desde já sobre algumas d'aquellas, que foram apresentadas no decurso do debate, resolvam; mas aquellas, que ainda não estiveram em discussão, pelo amor de Deus, mandem-as á commissão, para que o seu voto tenha caracter de cousa séria.

Apresente se o parecer sobre ellas na segunda-feira, e então n'esse dia resolveremos o assumpto. (Apoiados.)

Ha muita pressa? O governo precisa arrancar o projecto da camara? Apresente já na proxima sessão o parecer sobre as emendas; ponha-se em discussão este parecer, para que os deputados que queiram discutil-o, o possam fazer, e vote-se depois.

Parece-me rasoavel esta solução que eu proponho, o que vae conciliar qualquer desejo de pressa que haja por parte do governo, com relação a este projecto, com a conveniencia de não atropellar as garantias, parlamentares, que eu respeito, que o meu partido respeita, e que á camara e ao governo cumpre respeitar igualmente. É contra a violencia que eu protesto; não se póde constitucionalmente resolver a votação immediata de um assumpto, que não foi discutido, quando as opposições parlamentares declaram que não estão habilitadas em sua consciencia a votar esse assumpto. (Apoiados.) A ordem nos trabalhos parlamentares se aproveita a todos, aproveita mais aos governos do que ás opposições, e por isso sou insuspeito pedindo ao governo e á sua maioria que não persistam n'uma resolução, que, alem de injusta e iniquia, é provocadora.

Era isto que eu desejava dizer e peço desculpa á camara se me alonguei mais do que queria.

Como v. exa, sr. presidente, não me deu a palavra para um requerimento, eu peço agora a v. exa., que consulte a camara, sobre se consente em que as emendas apresentadas ao projecto, que foram mandadas para a mesa, depois do encerrado o debate, sejam remettidas á commissão de fazenda, para ella dar o seu parecer.

(Apoiados.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho (sobre o modo de propor): - Sr. presidente, eu disse desde o principio que estava completamente desprendido de toda esta questão. Para o governo é absolutamente indifferente, que se tome uma resolução ou outra, o eu, pacificamente, apenas quiz lembrar aos illustres deputados da opposição, qual era a disposição applicavel do regimento, e qual a pratica seguida.

O meu maior desejo, é que a camara vote com perfeito conhecimento do causa; assim como tambem s. exa. comprehendem, que o desejo do governo, é que as discussões não se protellem; e basta attender a que este projecto dos tabacos já se discute ha tres semanas, para ninguém se poder queixar de se abafar a discussão.

Ora, parece-me que ha um expediente conciliador; ó votar-se o projecto, como disse o sr. Lopo Vaz, conjunctamente com as emendas já anteriormente apresentadas, mandar as outras emendas á commissão de fazenda, o, na segunda fona apresentar a commissão o seu parecer sobre essas emendas, para que a camara o discuta e vote. (Apoiados )

(S. exa. não reviu).

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SESSÃO DE L4 DE ABRIL DE 1888 1079

O sr. Fuschini: - Protesta contra o alvitre indicado pelo sr. ministro da fazenda, por ser lesivo em relação áquelles que durante a discussão apresentaram as suas propostas, acerca das quaes não obtiveram resposta.

(O discurso será publicado em appendice a esta sessão quando s exa. o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno do Carvalho): - O meu desejo era conciliar e acabar com esta questão. (Apoiados.}

Se a camara votar n'este sentido, na segunda feira vem á discussão o parecer sobre as emendas apresentadas hoje. De resto, ninguem póde impedir que o sr. Fuschini peça a palavra sobro esse parecer e sustento as suas emendas.

(Interrupção do sr. Fuschini.)

Por mais que queiramos ser conciliadores não se consegue!

Pois o illustre deputado não viu que parte das emendas apresentadas pelo sr. Eduardo de Abreu coincidem com as suas?

O sr. Fuschini: - Declara que depois de rejeitadas as suas propostas não as sustenta.

Estranha que o sr. Marianno de Carvalho esteja sendo o presidente da camara.

(O discurso será publicado em appendice a esta sessão quando s. exa. o restituir.)

O Orador: - Eu não sou o presidente da camara. Tenho estado a procurar conciliar tudo, e a mostrar a minha indifferença porque se resolva de um ou de outro modo. Para questão politica, não valia a pena isto.

Mas o meu amigo o sr. Fuschini, até quer por força que sejamos todos inhabeis! Eu desejo ser habil, acabando com a questão de um modo conciliador.

Repito; o meu unico fim é conciliar as cousas para que a questão termine; não tive em vista contrariar o sr. Fuschini.

O illustre deputado sustentou as suas emendas como quiz e como entendeu, e, na segunda feira torna a sustental-as, porque ninguem o impede de o fazer; ninguem lhe tolhe o uso da palavra; por isso, sinceramente, não percebo a sua irritação.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Consulto agora a camara, sobre se admitte a proposta do sr. D. José do Saldanha, que já foi lida.

Foi admittida.

O sr. Presidente: - Vae votar-se a proposta do sr. Lopo Vaz, para que as emendas mandadas para a mesa, depois de encerrado o debate vão á commissão, a fim de que ella dê o seu parecer na sessão de segunda feira.

Foi approvada.

O sr. Presidente: - Está sobre a- mesa uma proposta de adiamento do sr. Arroyo, e que esteve em discussão juntamente com o projecto. E a primeira que tem de ler-se para se votar.

Leu-se. É a seguinte:

Proposta

Considerando que o projecto de lei que toma como base para fixar o preço da expropriação das fabricas de tabacos, não só o equivalente dos capitães effectivamente empregados n'esta industria, mas tambem o quantitativo dos lucros alem de uma certa percentagem; ou estes se computem pelo que resulta dos balanços, ou pelo excesso acima do par da cotação das acções;

Considerando que, para os effeitos da expropriação, só podem ser attendidos aquelle excesso e aquelle computo na parte em que correspondam ao legitimo e regular exercicio da industria do fabrico de tabacos;

Considerando que na régie franceza e igualmente na italiana as quantidades de materia prima (folha de tabaco) excedem a do tabaco manipulado, ou, quando excepcionalmente dá algum beneficio, é este insignificante; emquanto que em Portugal a materia prima é consideravelmente inferior ao producto fabricado; e que a differença entro esta proporção e aquella é tamanha, que só poderá ser attribuida á perfeição relativa do fabrico e á diversidade das proporções das especies de tabaco manipulado de cada paiz em confronto com os dos outros paizes, quando um inquerito minucioso e rigorosas experiencias destruam todas as duvidas a este respeito;

Considerando que o governo póde mandar proceder a estas experiencias, porque está na posse effectiva de algumas fabricas de tabaco; e que este mesmo facto facilita a realisação do inquerito e o apuramento da verdade, tão necessario para o calculo da expropriação, como para o das vantagens a auferir da régie;

Considerando que os balanços das fabricas de tabacos foram classificados pelo sr. relator do projecto, por parte da commissão da fazenda, como podendo ser ficticios, e por consequencia inexactos os respectivos relatorios;

Considerando que esses relatorios serviram de base aos calculos do governo sobre as vantagens da régie, e que, admittida a hypothese por parte da commissão do fazenda, de serem inexactos esses relatorios, admittida fica pela mesma commissão a hypothese do serem erroneos esses calculos de vantagens;

Proponho:
1.° Que o governo mande proceder, em uma ou mais fabricas de tabacos na posse do estado, e sob uma fiscalisação rigorosissima, ás experiencias necessarias papa se apurar quantos kilogrammas de materia prima são necessarios para fabricar 100 kilogrammas de cada uma das especies de tabaco manipulado nacional, que actualmente são consumidas no paiz.

2.° Que seja nomeada uma commissão de inquerito parlamentar, que apure, em relação a cada fabrica, e em relação a cada um dos annos de 1886 e 1887:

a) A existencia, por especies, de tabacos em rama, no primeiro e no ultimo dia do anno;

b) O quantitativo de tabacos em rama, que durante o anno deram entrada nas fabricas;

c) O quantitativo de cada uma das especiaes de tabaco manipulado durante o anno;

d) O quantitativo de tabacos (materia prima) despachados para importação ou arrematação na alfandega;

e) Todos os demais elementos necessarios, não só para formular um balanço exacto, mas tambem para o rectificar devidamente se se apurar que houve qualquer dolo ou faude no peso declarado dos tabacos manipulados, ou introducção do materias estranhas, ou acquisição de folha de tabaco contrabandeada, ou por outro qualquer meio.

3.° Que se aguarde o resultado d'aquelles experiencias e d'este inquerito para se resolver definitivamente sobre a adopção da régie e principalmente sobre as bases que devem regular o preço dos expropriações das fabricas de tabaco. = O deputado pelo Porto, João Arroyo.

Foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Vão ler-se agora as moções de ordem, para serem votadas, começando se pela do sr. Arroyo.

Leu-se. E a seguinte:

Moção de ordem

A camara, reconhecendo que só do aperfeiçoamento do regimen da liberdade de industria dos tabacos poderão resultar vantagens reaes para as finanças publicas, para as classes dos manipuladores e revendedores, e para os consumidores, continua na ordem do dia, =João Arroyo.

Foi rejeitada. Leu-se mais a seguinte:

Moção

A camara, reconhecendo que os desastrados effeitos da lei de 31 de março de 1879 tornam necessario o recurso

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1080 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

á régie como meio do salvaguardar os interesses tão prejudicados do thesouro, applaude o governo pelos seus esforços e continua na ordem do dia, = Antonio Maria de Carvalho.

O sr. Presidente: - O sr. Antonio Maria de Carvalho, pediu para retirar esta moção. Consulto a camara.

Permittiu-se que fosse retirada.

O sr. Presidente:- Vae ler-se a moção do sr. Consiglieri Pedroso.

Leu se. É a seguinte:

Moção de ordem

A camara, considerando que a régie vae ser financeiramente um malogro economicamente um erro, e socialmente para melhorar a condicção dos operarios, uma utilidade;

Considerando, alem d'isso, que póde converter-se nas mãos de qualquer governo pouco escrupuloso em perigosa arma politica, que todos os partidos sem distinção, deveriam ter interesse em inutilisar; affirma a sua adhesão ao principio de liberdade industrial e passa á ordem do dia = O deputado, Consiglieri Pedroso.

O sr. Consiglieri Pedroso - Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha moção.

Permittiu se que fosse retirada.

Leu se tambem a seguinte:

Moção de ordem

A camara, reconhecendo a impossibilidade do rendimento, do imposto do tabaco por meio do gremio, mau grado os esforços para esse fim empregados pelo governo durante o interregno parlamentar, e entendendo que o systema da régie é o que assegura maior rendimento ao estado, a p prova o projecto em discussão e continua na ordem do dia. = Antonio Centeno.

O sr Presidente: - O sr. Antonio Centeno pediu-me para retirar esta sua moção. Consulto a camara sobre este pedido.

Permittiu-se que fosse retirada.

O sr. Presidente: - Vae ler se agora o artigo 1.° do projecto a respeito do qual não ha sobre a mesa proposta alguma.

Leu se o seguinte:

Artigo 1.° A fabricação dos tabacos no continente do reino, será feita exclusivamente por conta do estado, sendo para isso expropriadas por utilidade publica as fabricas existentes no continente do reino, tudo nos termos e condições das bases annexas á presente lei e que fazem parte integrante d'ella.

§ 1.° O governo poderá levantar as quantias, até ao limite de 7.200:000$000 réis, de que carecer para as indemnisações, capital fixo e circulante, liquidação de contas de transição e mais pagamentos legaes, a que for obrigado emittindo para isso obrigações especiaes amortisaveis no praso maximo de quarenta annos com encargo não excedente a 432.000$000 réis annuaes para juro e amortisação.

§ 2.° A verba annual para juro o amortisação das obrigações emittidas nos termos do paragrapho antecedente é encargo da administração do fabrico dos tabacos.

§ 3.° O governo dará conta ás côrtes na sua primeira reunião do uso que fizer d'esta auctorisação.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Segue-se a base l.ª; e com respeito a esta ha apenas uma proposta do additamento apresentada pelo sr. Franco Castello Branco. Vota-se em primeiro logar a base e logo depois o additamento.

Leu se a base 1.ª É a seguinte:

1.ª

O governo, logo que a presente lei for publicada, decretará a expropriação, por utilidade publica, das fabricas de tabacos existentes no continente do reino.

§ 1.° A propriedade das referidas fabricas passará logo para o governo, que tomará posse administrativamente das que não estiverem já na sua administração, depositando na caixa geral de depositos como garantia do preço das expropriações, titulos de divida publica consolidada, equivalentes, pelo preço do mercado, ao valor do activo liquido de cada empreza, segundo a respectiva escripturação, e mais um terço d'esse valor.

§ 2.° O valor definitivo da indemnisação devida pela expropriação da fabrica ou fabricas de cada sociedade ou empreza, será fixado por arbitrios nomeados em numero igual pelo governo e pela sociedade ou empreza, e consistirá no valor effectivo dos bens e direitos transmittidos para o estado, accrescido dos lucros cessantes, a que a expropriada tenha direito.

§ 3.° O arbitro de desempate, não concordando as partes na escolha, será eleito pelo supremo tribunal de justiça que em sessão plena

§ 4.° Os arbitros decidirão ex acquo et bono sem recurso.

§ 5.º Sendo a empreza exproprianda sociedade anonyma, poderá esta optar pela venda ao estado das suas acções pela ultima cotação de operações effectuadas antes de 31 do dezembro de 1886, respondendo para com o adquirente pela effectividade e não deterioração dos valores dos seus inventarios e balanço na mesma data e transferindo lhe o resultado das operações posteriores, recebendo em troca o juro commercial da mora d'aquelle capital.

§ 6.° Os lucros cessantes devidos ás emprezas, a que não for applicada a fórma de indemnisação prescripta no paragrapho anterior, ou que por ella não optarem, serão fixados na mesma proporção para com o valor do respectivo activo liquido, que corresponda ás necessidades da producção regular de cada fabrica.

Foi approvada.

Leu-se a seguinte proposta:

Additamento

Proponho que á base l.ª do projecto de lei n.° 23 seja additado o seguinte paragrapho:

§ 7.° Em todo e qualquer caso os expropriados responderão para com o estado, independentemente do que fica preceituado para a expropriação, pelas collectas que lhes forem distribuidas, conforme a base 2.ª das annexas á lei de 18 de agosto de 1887, por todo o tempo decorrido desde 20 de outubro de 1887 até final liquidação das indemnisações devidas, nos termos d'esta lei = O deputado pelo circulo de Guimarães. = Franco Castello Branco.

O sr. Vicente Monteiro (relator): - Declaro que a commissão não póde acceitar esta proposta, pela mesma rasão porque não acceitou a bate 1.ª da proposta do governo, na parte em que consignava o mesmo principio; e isso pela rasão de se declarar uma pura e simples inutilidade, visto que os impostos do anno passado estão cobrados e os d'este anno hão de ser necessariamente attendidos nas contas.

A proposta do sr. Franco Castello Branco foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Com relação ás bases 2.ª e 3 ª, apresentou o sr. Fuschini diversas emendas. Vão ler se.

São as seguintes:

Propostas

Conselho de administração e fiscal:

Base 2.ª:

O conselho de administração será composto de tres mem-

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SESSÃO DE 14 DE ABRIL DE 1888 1081

broa, um eleito pula camara dos pares, outro pela camara dos deputados, e o terceiro nomeado polo governo, sendo este o presidente.

Os membros dos conselhos de administração e fiscal serão inelegiveis para qualquer cargo publico, politico, ou administrativo, e no caso de têem sido eleitos perderão os respectivos logares pelo facto da sua nomeação.

O estado interessará o conselho de administração, nos termos da base 3.ª § 6.°, em 1/40 dos lucros da fabricação dos tabacos.

O beneficio concedido aos operarios, nos termos da base 3.ª § 6.° será elevado a 37/50, mão d'estes 4/30; ou 1/10, constituirá o fundo da caixa de soccorros.

Sala das sessões, 9 de abril de 1888. =: Augusto Fuschini, deputado por Vizeu.

Base 3.ª, condições dos operarios.
Todos os assumptos que interessem em commum a ad-administração e os operarios, serão julgados, havendo contestação, por um tribunal de arbitros, constituido pelos tres membros do conselho de administração, por tres membros eleitos pelos operarios o por um setimo escolhido pelo supremo tribunal de justiça do Lisboa.

O mandato dos arbitros do supremo tribunal e dos operarios durará dois annos.

Os arbitros operarios pertencerão sempre á classe dos manipuladores de tabacos.

São eleitores todos os operarios:
Maiores de vinte e cinco annos;
Que saibam ler e escrever;

Que tiverem dois annos, pelo menos, de effectivo serviço sem nota.

D'este tribunal de arbitragem cabe recurso para o governo.

Os salarios dos operarios, que servirem dez annos assiduamente e sem nota, terão o augmento de 5 por cento até ao maximo de quarenta annos.

O operario que attingir quarenta annos do serviço assiduo e sem nota, e tiver mais do setenta e cinco annos do idade, se o requerer, será reformado com metade do salario que então vencer, podendo comtudo continuar empregado em misteres de trabalho suave e leve.

Nos trabalhos das officinas e manipulação de tabacos não serio admittidos menores do sexo masculino e feminino, do idade inferior a dez annos.

Para os menores de dez a dezeseis annos empregados nas officinas c na manipulação dos tabacos, ter-se-hão em vista os preceitos indicados na respectiva legislação franceza, emquanto a nossa não providenciar a este respeito sobre a natureza, duração e condições hygienicas do trabalho.

Para regular o trabalho das mulheres tomar-se-hão as seguintes bases:

b) As officinas serão separadas, e quanto possivel as entradas e as saídas dos operarios de um e de outro sexo far-se-hão a horas differentes;

b) Nas fabricas haverá salas de lactação para as creanças filhas das operarias, até doze trezes, sendo permittido ás mães, em horas fixadas em regulamento, a amamenta cão.

c) Nas fabricas haverá tambem creches para as creanças de um a seis annos, pelo menos.

d) Nenhuma mulher será admittida ao trabalho senão quinze dias, pelo menos, depois do parto.

Nas fabricas haverá escolas de instrucção elementar.

Será obrigatoria a frequencia d'estas escolas aos menores do dez a dezeseis annos empregados nas fabricas. Esta frequencia será de duas horas, pelo menos, fora das horas de trabalho.

Os operarios adultos poderão tambem frequental-as fóra das horas do trabalho, podendo para estes ser instituidos premios de assiduidade e de aproveitamento. = Augusto Fuschini, deputado por Vizeu.

Proponho que o § 3,° da base 3.ª se redija pela seguinte fórma:

O dia de trabalho será fixado e garantido em oito horas. - Augusto Fuschini.
Proponho que o § 6.° da base 3 ª do projecto da commissão seis modificado da seguinte fórma: i

a) A participação de beneficio para os operarios será de 5 por cento sobre os lucros liquidos da régie, deduzida a somma de 3.000.000$000 réis (§ 2.° da base 3.ª do projecto do ministro).

b) A participação de beneficio para o conselho de administração será de 5 por cento sobre a mesma quantia (§ 7.° da base 2.ª do projecto do ministro).

c) A pa0iticipação de beneficio para o conselho fiscal, será de Õ,ô por conto sobre a mesma quantia (ibidem).

d) A participação do beneficio para o pessoal não operario será de 0,5 por cento sobre a mesma quantia.

Lisboa, 11 de abril de 1888. = Augusto Fuschini.

Ficam prejudicadas as rainhas emendas 3 ª e 4.ª á base 2.ª do projecto da commissão. = Augusto Fuschini.

O preço da tarefa dos charutos de picar (charutos de 10 réis) será fixado em 80 réis por cada cem charutos.

As marcas actuaes ou typos estabelecidos pelas fabricas serão conservados, muito embora a administração possa crear typos ou marcas novas.

Quando nas fabricas do Porto houver necessidade de operarios, serão preferidos os das fabricas do Lisboa, das classes pedidas, que, por interesses particulares legitimos, desejaram trabalhar n'aquella cidade. O mesmo se applicará ás fabricas de Lisboa relativamente aos operarios do Porto. = Augusto Fuschini.

O sr. Vicente Monteiro (relator): - Julgo ser agora a occasião, a que s. exa. se referiu ha pouco, de fazer declarações por parte da commissão acerca d'estas propostas.

Repito que faço estas declarações por parte da commissão, julgando-me suficientemente habilitado para isso, apesar de ter já dito, por ser a verdade, que a commissão se não tinha reunido para isso.

Considero-me auctorisado a fazer estas declarações, tanto pela discussão que houve na com missão, como pelos poderes do mandato que me foi confiado, ou delegação com que fui honrado.

Se na interpretação d'esta faculdade eu exorbito, os vogaes da commissão aqui mesmo me poderão fazer sentir essa exorbitancia, o que eu proprio lhes peço.
(Pausa.)

O silencio de todos me confirma no juizo de me caber o direito, que estava exercendo, e que como relator estou habilitado a interpretar o sentir e o pensar da commissão, o que facil me é, depois da longuissima discussão que este projecto teve na commissão.

Isto posto, tenho a declarar que, em relação ás propostas do sr. Fuschini, que estão para ser votadas, a commissão acceita a elevação da participação de lucros para os operarios de 32/50 a 37/5o e a garantia das horas do trabalho para os mesmos operarios

O sr. Franco Castello Branco (sobre o modo de propor): - Pedi a palavra sobre o modo de propor, porque me parece que não me seria concedida de outra fórma.

O que eu desejo e obter um esclarecimento.

O sr. relator da commissão acaba de declarar que acceita a elevação da participação dos lucros para os operaros de 32/50 a 37/50.
Como se faz isto?

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1082 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - A totalidade que era de 5 passa a ser de 5,1.

O sr. Franco Castello Branco: - Bem. Isso é que era preciso saber-se.

Foram rejeitadas as propostas do sr. Fuschini, salvos os pontos acceitos pela commissão, nos termos da declaração do sr. relator.

O sr. Presidente: - Vão ler-se agora as bases 2.ª e 3.ª do projecto a respeito das quaes não foram apresentadas mais propostas.

Leram-se. São as seguintes:

2.ª

A administração do fabrico de tabacos por conta do estado será confiada a um conselho de administração, composto de cinco membros, sob a inspecção de um conselho fiscal composto de tres membros, nomeados ou eleitos para servirem por tres annos.

§ 1.° Um membro do conselho de administração será eleito pela camara dos dignos pares do reino, outro pela camara dos senhores deputados, e tres, dos quaes um será o presidente, nomeados pelo governo.

§ 2.° Para o conselho fiscal serão eleitos um vogal pela camara dos dignos pares, que será o presidente, outro pela camara dos senhores deputados, que será o vice-presidente, e o terceiro nomeado pelo governo.

§ 2.° As camaras legislativas elegerão para o conselho de administração e para o conselho fiscal tantos vogaes supplentes, quantos forem os effectivos que lhes pertença eleger.

§ 4.° Os deveres e attribuições dos membros dos dois conselhos regulam-se pelas prescripções do contrato de mandato, podendo este ser renovado no fim do praso e a todo o tempo revogado.

§ 5.° O presidente do conselho de administração, que terá a designação de administrador geral dos tabacos, vencerá o ordenado fixo de 900$000 réis; os vogaes do conselho o de 600$000 réis annuaes. Os do conselho fiscal receber ao em senhas de presença 18$000 réis por sessão até o máximo de vinte e quatro sessões em cada anno.

§ 6.° Os vogaes supplentes do conselho de administração e do conselho fiscal perceberão, emquanto servirem, os vencimentos fixos e as percentagens que pertenceriam aos vogaes effectivos substituidos.

§ 7.° O exercicio dos logares de membros do conselho de administração é incompativel com o exercicio de qualquer outro emprego publico. Se algum empregado publico for nomeado ou eleito a acceitar, perderá o logar.

§ 8.° O conselho do administração e o conselho fiscal apresentarão no fim de cada anno relatorios minuciosos, que pelo governo serão submettidos á apreciação das côrtes.

§ 9.° As contas do conselho de administração serão julgadas pelo tribunal do contas, como as de quaesquer outros gerentes ou exactores de dinheiros publicos.

3.ª

A fabricação dos tabacos será feita em duas fabricas em Lisboa e duas no Porto, não podendo este numero ser reduzido senão quando a diminuição não prejudique a collocação dos operarios em boas condições hygienicas.

§ 1.° As condições do serviço interno e do trabalho dos operarios, penas disciplinares e motivos de suspensão e despedida, serão determinados em regulamento proposto pelo conselho de administração, tendo ouvido os delegados dos operarios, e approvado pelo governo.

§ 2.° Será estabelecida uma caixa de reformas para os operarios impossibilitados, dotando-a annualmente o governo com 20:000$000 réis, se maior quantia não for determinada pelas cortes.

A reforma de cada operario não será inferior a l$500 réis semanaes.

§ 3.° O dia de trabalho será fixado em oito horas, podendo só em casos excepcionas reduzir-se a sois horas o pagando-se qualquer excesso sobre oito horas, á rasão de 10 por cento do dia e 20 por cento de noite.
§ 4.° As despezas do escriptorio, incluindo ordenados de empregados, não poderão exceder a 72:000$000 réis em cada anno, sendo as nomeações, promoções, demissões e castigos dos empregados attribuição exclusiva do concelho de administração.

§ 5.° Nos primeiros seis mezes do seu exercicio, o conselho de administração formulará e fará publicar no Diario do governo o quadro definitivo do pessoal de empregados de escriptorio.

§ 6.° O estado interessará os conselhos de administração e fiscal e o pessoal operario e não operario, nos lucros da fabricação do tabaco, na percentagem de 5 por cento do excesso d'esses lucros annuaes sobre 3 500.000$000 réis, dos quaes pertencerão 1/5 ao conselho de administração, 3/50 ao conselho fiscal, 1/40 ao pessoal não operario e 32/50 ao pessoal operario, e será o distribuidos a todos proporcionalmente aos respectivos ordenados e vencimentos, podendo uma parte do quinhão dos operarios ser destinada á dotação de uma caixa de soccorros.

Foram approvadas, salvas as alterações aos §§ 3.° e 6.° da base 3.ª já approvadas.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a ultima proposta, que é a do sr. Alpoim e que se refere especialmente á base 4.ª

Leu-se. É a seguinte:

Proposta

Proponho que se eliminem os §§ 2.º e 3.° da base 4.ª do projecto.

Proponho que no § 4.° da base 4.ª do projecto se substituam as palavras "presidente do tribunal do commercio de Lisboa" por as seguintes "presidente do tribunal do commercio do Porto".

Proponho que na carta de lei de 12 de março de 1884, a qual, segundo o disposto na base 4.ª do projecto em discussão continua em vigor, se consigne no § 5.° do artigo 1.° a disposição de que os terrenos devastados pela phylloxera, sejam nos tres primeiros annos em que n'elles se cultive tabaco isentos do pagamento de contribuição predial e quaesquer outras.

Lisboa, 11 de abril de 1888. = José Maria de Alpoim Cerqueira Borges Cabral, deputado por Lamego.

O sr. Vicente Monteiro (relator): - Com relação á proposta que acaba de ser lida, tenho a declarar, por parte da commissão que a acceito sómente na parte em que modifica o § 4.° da base 4.ª do projecto, estabelecendo que o presidente do tribunal arbitrai seja o juiz presidente do tribunal do commercio do Porto, e não o de Lisboa.

Foi approvada a primeira parte da proposta do sr. Alpoim, acceita pela commissão e rejeitada a segunda.

Leu-se a base 4.ª É a seguinte:

4.ª

Continuam em vigor na região do Douro as disposições da carta de lei de 12 de março de 1886 e 28 de abril de 1886, sendo, porém, obrigada a administração do estado a consumir até 10 por cento de tabaco produzido n'aquella região, quando o haja. O bonus concedido por aquellas leis será mantido como differença de preço.

§ 1.° A administração do estado consumirá tambem até 5 por cento do tabaco produzindo nas ilhas e 5 por cento das provincias ultramarinas, quando lhe seja offerecido.

§ 2.° Se a região do Douro não perfizer o fornecimento de 10 por cento de tabaco preciso para a fabricação, o governo podei á auctorisar o cultivo de tabaco em outras regiões onde os vinhedos tenham sido destruidos pela phylloxera.

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SESSÃO DE 14 DE ABRIL DE 1888 1083

§ 3.º A parte das percentagens fixadas por este artigo e seu § 1.°, que não for preenchida pelo tabaco da respectiva localidade, completar-se-ha pelo tabaco nacional das outras localidades onde for permittido pelo governo no uso da auctorisação conferida no paragrapho antecedente.

§ 4.° Na falta de accordo dos vendedores de tabacos de producção nacional do continente acerca dos preços de venda, serão estes fixados por arbitragem, sendo um dos arbitros nomeado pela administração do estado, outro pelos vendedores, e o terceiro para desempate, pelo juiz presidente do tribunal de commercio de Lisboa.

Foi approvada, salva a alteração ao § 4.º, já approvada.

O sr. Presidente: - Vão ler-se as bases restantes, a respeito das quaes não foi apresentada proposta alguma. Leram-se. São as seguintes:

5.ª

As compras de tabaco estrangeiro e de outras materias primas de consumo, superior ao valor de 10:000$000 réis em cada anno, serão feitas precedendo concurso aberto no reino e nos principaes mercados e centros productivos.

§ unico. A administração do fabrico de tabacos poderá, porém, realisar compras particularmente quando o faça por preços inferiores aos da ultima arrematação publica effectuada pela administração de qualquer dos estados que tiver empregado o meio do concurso.

6.ª

A venda de tabacos fabricados continua livre nos termos da legislação em vigor.

§ 1.° A administração do estado poderá empregar os recebedores de comarca como depositarios dos tabacos, para por si, por seus propostos e pelos cobradores da freguezia fazerem o fornecimento dos vendedores e revendedores, abonando-lhes commissão que não seja superior a 2 1/2 por cento.

§ 2.° Poderá igualmente o governo empregar na venda de tabacos parte do pessoal reformado da fiscalisação externa das alfandegas, e auctorisar tambem por elles ou outros agentes a venda ambulante, principalmente nas pequenas povoações da raia.

7.ª

Os direitos de importação sobre tabacos manipulados estrangeiros continuarão a ser os fixados no decreto de 27 de janeiro de 1887, e só dos que tiverem pago direitos de importação e dos fabricados por conta do estado é livre a venda no continente do reino.

§ unico. É prohibido o despacho para consumo de tabaco em rama, folha, rolo ou outra forma não manipulada, a não ser feita pelo estado para as suas fabricas.

8.ª

A cobrança coerciva dos creditos da administração do estado pela venda de tabacos, será feita nos mesmos termos que a das contribuições directas.

9.ª (transitoria)

O governo fará conservar nas fabricas do estado os operarios que actualmente trabalham nas particulares, e todos os outros empregados das mesmas emprezas existentes em 31 de dezembro de 1887, e reorganisará o serviço da fiscalisação, regulado por decreto de 25 de agosto ultimo, nos termos convenientes ao regimen prescripto n'estas bases.

§ 1.° Os salarios dos operarios serão regulados pelos mais vantajosos e iguaes em Lisboa e Porto.

§ 2.° O pessoal operario ou não operario, que do serviço particular passe para o de estado, não poderá ser despedido saem motivo justificado, reconhecido pelo conselho de administração ou julgado por sentença do poder judicial

§ 3.° A administração do estado garantirá a todo o pessoal operario o não operario actualmente interessado no legado João Paulo Cordeiro, o beneficio d'esse legado calculado pelo do anno de 1886.

§ 4.° O pessoal não operario, que ficar addido ao quadro definitivo organisado em observancia da base 3.ª, fará serviço nas fabricas ou nas alfandegas e outras repartições publicas onde o governo julgar conveniente collocal-o, não podendo ser admittido ou nomeado para aquelle quadro pessoal novo, ou augmentados os ordenados do actual emquanto houver empregados addidos e a despeza não estiver reduzida ao limite prescripto na citada base.

§ 5.° A disposição da base 6.ª, § 1.°, não prejudicará os actuaes revendedores, sendo em regra as percentagens d'estes e dos vendedores, que por intermedio d'elles se abastecerem, determinadas pelas tabellas em vigor da companhia nacional de tabacos.

§ 6.° Na reorganisação do serviço da fiscalisação das fabricas poderá esta ser dividida em dois districtos correspondentes aos circulos aduaneiros.

10.ª

Ficam em pleno vigor todas as disposições repressivas do contrabando, descaminho, e das transgressões dos regulamentos relativos a tabacos actualmente em vigor.

Foram successivamente approvadas.

O sr. Presidente: - Falta ainda a votação cio artigo, 2.° do projecto. Vae ler-se.

Leu o seguinte:

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Approvado.

O sr. Presidente: - O sr. Consiglieri Pedroso pediu a palavra para antes de se encerrar a sessão. Consulto a camara

Permittiu-se que usasse da palavra,

O sr. Consiglieri Pedroso: - Agradeço á camara o ter permittido que, em sessão prorogada, eu use da palavra.

Quero apenas dizer que, pessoalmente e como membro de um partido que no principio da sessão não estava representado na camara, me associo cordialmente á manifestação com que foi saudado o sr. Pinheiro Chagas, ao apresentar-se pela primeira vez n'esta sala, depois da sua grave enfermidade.

A circumstancia de pertencer s. exa. a um partido diverso do meu, impunha-me o dever d'esta declararão e que eu faço com muito prazer.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que estava dada, sendo na primeira parte a discussão do projecto n.° 204, do anuo passado, relativo ao caminho de ferro de Mormugão.

Previno a camara de que só na outra semana poderei dar para ordem do dia a interpellação, relativa ás obras do porto de Lisboa, por isso que o sr. ministro das obras publicas, tendo de estar presente á discussão que ainda continua na camara dos dignos pares, não póde por emquanto comparecer n'esta camara.

Está levantada a sessão.

Eram sete horas e um quarto da tarde.

Proposta de lei apresentada pelo sr. ministro da marinha na sessão de 13 de abril de 1888

Proposta de lei n.° 31-E

Artigo l.° A força naval para o anno economico de 1888-1889 é fixada em 2:982 praças distribuidas por um navio couraçado, tres corvetas e dez canhoneiras de vapor, tres

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1084 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

vapores, uma lancha, dois transportes, uma barca, uma fragata, escola pratica de artilheria naval, duas corvetas, escolas de alumnos marinheiros, e um rebocador.

Art. 2.° O numero e qualidade dos navios armados podem variar, segundo o exigir a conveniencia do serviço, comtanto que a despeza não exceda a que for votada para a força que se auctorisa.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 12 de abril de 1888.= Henrique de Macedo.

Proposta de lei apresentada pelo sr. ministro do reino na sessão de 13 de abril de 1888

Proposta de lei n.° 35-A

Senhores. - Uma das providencias que mais preoccupa o pensamento do governo era relação ao ensino primario é a que tem por fim melhorar a sorte dos professores, assegurando-lhes o pagamento em dia dos seus parcos vencimentos, e proporcionando-lhes meio de poderem, a breve praso, e sem aggravamento das forças tributarias do paiz, obter maior retribuição, que sirva de incitar no presente os brios d'aquelles que exercem já o magisterio, e de attrahir no futuro as vocações dos que pretendam abandonar o professorado para seguir outras carreiras que lhes offereçam maiores lucros e superiores vantagens.

Podem outras medidas considerar-se de grande utilidade, e mesmo de immediata conveniencia, para o aperfeiçoamento da instrucção primaria. Ao governo afigura-se que nenhuma merece preferencia á de que se trata, não só porque a experiencia ainda não demonstrou com perfeito conhecimento do cansa os verdadeiros e reaes defeitos do systema implantado pela legislação actual, e é mister em questões do ensino deixar amadurecer a opinião e não precipitar as resoluções, senão tambem porque, não estando os professores seguros de que lhes é garantida a subsistencia pelo pontual embolso dos seus salarios, serão inuteis e estereis quaesquer disposições tendentes a exigir-lhes mais saber, mais trabalho, mais zêlo o assiduidade no desempenho da missão que lhes está confiada

Desde julho do 1881, em que passou para as camaras municipaes a sustentação das escolas, o poder central não tem cessado de applicar constante attenção e solicita diligencia no empenho de remover e acabar o atrazo no pagamento dos vencimentos dos professores. A principio occorreram, como era natural, muitas difficuldades e numerosas duvidas sobre: organização dos orçamentos municipaes; lançamento dos impostos, fixação dos ordenados; abono de gratificações; processo para se realisar a cobrança das contribuições; modo de se effectuar aos trimestres o pagamento dos professores; etc. A tudo foi o governo acudindo e dando expediente, consoante os meios que as leis lhe facultavam. Muito se conseguiu, e força é confessar que estes serviços se acham hoje incontestavelmente melhorados.

Apesar d'isso, em mais de sessenta municipios os vencimentos dos professores são pagos ainda com atrazo, de fendendo se as camaras com a impossibilidade de regularisar o pagamento; porquanto n'uns concelhos a cobrança dos impostos municipaes era feita em epochas do anno que não permittiam estar o cofre habilitado para satisfazer mensalmente aquelles encargos; n'outros concelhos fora preciso relaxar os conhecimentos de divida por contribuições, o a execução administrativa não se fazia, ou era começada tarde e sem resultados immediatos; n'outros concelhos emfim a difficuldade de 60 fazer o apuramento da receita e despeza em cada anno, antes de terminado o exercicio, occasionava grande atrazo na concessão dos subsidios do districto ou do estado; e conseguintemente no pagamento dos professores.

A todos estes inconvenientes procura acudir a proposta da lei, que tenho a honra de submetter ao vosso esclarecido exame e apreciação.

Dotado o fundo especial da instrucção primaria pelo modo que se indica na proposta, tenho por certo que não faltarão receitas para pagar em dia ao professorado os vencimentos que lhes competem, acabando assim as frequentes queixas e reclamações na imprensa e no parlamento, e para se tornar effectivo dentro de pouco tempo o augmento a que se refere o artigo 7.° da mesma proposta, e cuja justiça é tão manifesta que escusado me parece encarecer.

Espero, pois, que merecerá a vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° é creado em cada municipio do continente do reino e ilhas adjacentes, excepto no de Lisboa, um fundo especial do instrucção primaria.

Constituem esto fundo especial:

a) As quantias que em cada anno devem ser votadas pelas camaras municipaes para as despezas obrigatorias da instrucção primaria nos respectivos concelhos, conforme o disposto nas leis de 2 de maio de 1878 e 11 de junho de 1880, e nas instrucções regulamentares de 6 de dezembro de 1880, 10 de abril de 1881 e 21 de outubro de 1882;

b) A importancia dos subsidios do districto e do estado, a que tenham direito as camaras municipaes nos termos dos artigos 13.º e 14.° da lei de 11 do junho de 1880 e 130.° § 2.º do codigo administrativo de 17 de julho de 1886;

c) O producto das multas pecuniarias, a que se referem os artigos 13.°, 14 °, 15.º e 38.° da lei de 2 de maio do 1878, e o artigo 4.° da presente lei;

d) O rendimento de heranças, doações ou legados, que tenham sido deixados ás camaras municipaes e juntas do parochia, ou venham a ser adquiridos por estas corporações, com applicação especial ao pagamento dos professores officiaes de ensino primario;

e) O producto de outros quaesquer donativos feitos aos municipios ou ás parochias com destino á creação de escolas de instrucção primaria;

f) As quantias que deixem de ser despendidas com as escolas já creadas, ou que vierem a crear-se de futuro, ou porque estejam vagas, ou porque os professores soffrem desconto nos seus vencimentos por licença, suspensão, ou outro motivo legal;

g) As quantias que forem cobradas por contribuições que tenham sido lançadas pelas camaras para a instrucção primaria desde 1881 até 1887, e que não foram pagas nos annos respectivos;

h) O producto de contribuições extraordinarias legalmente auctorisadas para este fim especial;

i) A quota parte das sobras das verbas votadas em cada anno economico no orçamento geral do estado para a instrucção primaria, depois de feita a liquidação do exercicio a que se referirem as ditas verbas;

j) A importancia dos juros dos capitães entrados na caixa geral de depositos, na conformidade do que determina o artigo 2.°

Art. 2.° No caixa geral de depositos, ou suas delegações, darão entrada por deposito todas as receitas a que se refere o artigo antecedente.

§ unico. O governo preceituará, em regulamento especial, o modo de ser feito o deposito de que se trata no presente artigo, bem como o juro que deverá abonar a caixa geral de depositos pelas quantias recebidas.

Art. 3.° As camaras municipaes são obrigadas a incluir todos os annos nos seus orçamentos as verbas de receita necessaria para fazer face ás despezas relativas a todas as escolas officiaes do ensino primario existentes nos respectivos concelhos, estejam ou não vagas, dentro dos limites lixados nos artigos 11.° da lei de 11 do junho de

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SESSÃO DE 14 DE ABRIL DE 1888 1085

1880 e 130.° § 2.° do codigo administrativo de 17 de julho de 1886.

§ 1.° Quando a camara municipal não cumprir a disposto n'este artigo, e a junta geral do districto, ou commissão districtal, não observar o preceito estabelecido no artigo 146.° do codigo administrativo, o governador civil supprirá a omissão dentro dos limites das attribuições conferidas ás camaras municipaes.

§ 2.° Sempre que as camaras municipaes precisem de subsidio do districto e do estado, nos termos dos artigos 12.°, 13.° e 14.° da lei de 11 de junho de 1880, o governador civil, ouvida a camara interessada e a junta geral ou commissão districtal, fixará em seguida á approvação definitiva ao, respectivo orçamento, a importancia dos subsidios que lhe pertencer, e que devem ser entregues no mais curto praso possivel na caixa geral de depositos ou suas delegações.

Art. 4.º D.13 receitas municipaes cobradas por administração propria, ou por meio de arrematação, a parte que houver sido votada nos orçamentos para as despezas da instrucção primaria será entregue na sua totalidade na caixa de depositos ou suas delegações até dez dias depois de paga a primeira prestação ou realisada a primeira cobrança em cada anno.

§ 1.° Os presidentes e thesoureiros das camaras são responsaveis pela falta de cumprimento d'esta disposição, e incorrem na multa de 20$000 réis até 200$000 réis para o fundo especial da instrucção primaria.

§ 2.° Dos rendimentos municipaes cobrados cumulativamente ou conjunctamente com os impostos do estado, os escrivães de fazenda dos concelhos, depois de abertos os cofres para a l.ª prestação, e assim que estejam arrecadadas as quantias sufficientes para completar a somma destinada ás despezas da instrucção primaria, entregarão directamente á caixa geral de depositos, ou á delegação respectiva, a somma de que se trata.

§ 3.° Dos impostos municipaes indirectos cobrados no acto do despacho pelas alfandegas das ilhas adjacentes, a parte pertencente á instrucção primaria será entregue á caixa geral de depositos pelos directores das respectivas alfandegas.

Art. 5 ° As camaras municipaes procederão até ao fim de outubro do corrente anno á liquidação:

I. Das dividas que estiverem em aberto, provenientes de falta de pagamento, das contribuições lançadas desde 1881 em diante para as despezas de instrucção primaria;

II. Das dividas aos professores primarios do concelho e referentes quer a ordenados, quer a gratificações, vencidas em qualquer dos annos decorridos de l de julho de 1881 em diante;

III. Das quantias que n'essa occasião existirem no cofre municipal com destino á instrucção primaria e bem assim das que devam ainda receber quando chegue a epocha da sua cobrança, se esta não se tiver realisado.

§ 1.° Os documentos relativos ás dividas a que se refere o n.° I serão relaxadas para execução administrativa pelo modo estabelecido para a cobrança coerciva dos impostos do estado. As quantias correspondentes irão entrando na caixa geral de depositos ao passo que se for effectuando a cobrança.

§ 2.° Da liquidação das dividas aos professores formar-se ha a competente conta para ser paga em prestações mensaes á proporção que as receitas do fundo especial o permittirem, e sem prejuizo do que dispõe o artigo 6.º

§ 3.° Das quantias de que trata o n.° III serão immediatamente entregues na caixa geral de depositos as que existirem no cofre municipal; o as que estiverem ainda para vencer darão entrada na mesma caixa geral á medida que se forem cobrando.

Art. 6.° As camaras municipaes devem processar e liquidar as folhas dos ordenados dos professores até ao dia l5 de cada mez com relação ao mez immediatamente anterior. Devem igualmente processar e liquidar as folhas das gratificações e de outros abonos que legalmente compitam aos professores dentro de quinze dias contados d'aquelle em que se vencerem essas gratificações e abonos.

§ l.° Liquidadas as folhas dos vencimentos dos professores serão levantadas da caixa geral de depositos, ou respectiva delegação, as quantias correspondentes, por meio de precatorios passados pelos secretarios das camaras municipaes e assignados por estes e pelos presidentes, a fim de em seguida serem pagos os vencimentos constantes das mesmas folhas.

§ 2.° Quando, recebida a importancia de qualquer folha de vencimento dos professores, não seja feito o pagamento, ou se lhe dê applicação diversa, o presidente e secretario da camara, alem da responsabilidade civil, incorrem na pena de prisão correccional.

Art. 7.° Logo que o fundo especial da instrucção primaria esteja devidamente habilitado, serão abonados por anno aos professores e professoras de ensino primario, a titulo de gratificação de exercicios, os augmentos seguintes:

50$000 réis, aos que têem pela lei o ordenado fixo minimo de 100$000 réis ou menos;
60$000 réis, aos que têem pela lei o ordenado fixo minimo de 120$000 réis;
70$000 réis, aos que têem pela lei o ordenado fixo minimo de 180$000 réis ;
80$000 réis, aos que têem pela lei o ordenado fixo minimo de 200$000 réis.

Art. 8.° O governo fará os regulamentos necessarios para inteira execução da presente lei.

Art. 9.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria distado dos negocios do reino, em 12 de abril de 1888.= José Lucinno de Castro.

Redactor = S. Rego.

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