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N.° 65

SESSÃO DE 26 DE ABRIL DE 1902

Presidencia do Exmo. Sr. Matheus Teixeira de Azevedo

Secretarios - os Exmos. Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Joaquim Mendes Leal

SUMMARIO

Lê-se e approva-se a acta.- No expediente dá-se conta de um officio e dois telegrammas dirigidos á presidencia, e tem secunda leitura, sendo adimttidos, um projecto de lei do Sr. Marianno Prezado e uma renovação de iniciativa do Sr. Moreira Junior. - Sob proposta do Sr. Presidente, a que se associam os Srs. Presidente do Conselho, João Arroyo e Luiz José Dias, resolve-se consignar na acta um voto de sentimento pela morte do Digno Par Baima de Bastos. - Não e considerado urgente o assumpto para que pediu a palavra o Sr. Fuschini. - Apresenta o Sr. Presidente a listados Srs. Deputados, que nomeou, para representarem o Parlamento na conferencia da paz em Vianna de Austria. - Explicação do Sr. Presidente do Conselho com respeito a uns documentos Cedidos pelo Sr. Fuschini. - Realiza um aviso previo o Sr. Oliveira Mattos. - Apresentam projectos de lei os Srs. Petra Vianna e Madureira Beça, e um parecer o Sr. Rodrigo Pequito.

Na ordem do dia continua em discussão o projecto de lei n.° 67 (convenio), prorogando-se primeiro a sessão, a requerimento do Sr. Sousa Tavares, até que o projecto se vote. O requerimento foi approvado em votação nominal. - Combate largamente o projecto o Sr. Mello e Sousa, a quem responde o Sr. Carrilho, relator. - Segue-se o Sr. Dias Costa, respondendo-lhe o Sr. Possollo, e a este o Sr. João Pinto dos Santos, a quem responde o Sr. Carrilho. - Usa novamente da palavra sobre o projecto o Sr. Dias Ferreira, encerrando-se depois o debate a requerimento do Sr. Almeida Dias, que teve votação nominal. - São retiradas as moções a pedido dos apresentantes, e seguidamente é approvado, em votação nominal, o artigo 1.° e respectivas bases do projecto, ficando prejudicada a substituição do Sr Fuschini. - Trocam-se explicações entre os Srs. Fuschini e Presidente do Conselho em relação a uns documentos que aquelle Sr. Deputado requisitara e recebera, e cuja publicação agora pede.- Usam tambem da palavra sobre o mesmo assumpto os Srs. Arroyo e Ressano Garcia.

Primeira chamada- Ás 10 horas e meia da manhã.

Presentes = 11 Srs. Deputados.

Segunda chamada - Ás 11 horas.

Abertura da sessão - As 11 horas e meia.

Presentes - 54 Srs. Deputados.

São os seguintes: - Abel Pereira de Andrade, Agostinho Lucio e Silva, Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Albino Maria de Carvalho Moreira, Alexandre José Sarsfield, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Mendes da Magalhães Ramalho, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Alvaro de Sousa Rego, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Barbosa Mendonça, Antonio Bélard da Fonseca, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Maria Pereira Carrilho, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Carlos Malheiro Dias, Custodio Miguel de Borja, Domingos Eusebio da Fonseca, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Francisco José Patricio, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros, Henrique Matheus dos Santos, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alfredo de Faria, João de Sonsa Tavares, Joaquim Antonio de Sant'Anna, Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos, Joaquim Faustino de Poças Leitão, Joaquim Pereira Jardim, José Adolpho de Mello e Sousa, José Antonio Ferro de Madureira Beça, José Coelho da Motta Prego, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim Dias Gallas, José Joaquim Mendes Leal, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria de Oliveira Simões, Julio Augusto Petra Vianna, Julio Ernesto de Lima Duque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luciano Antonio Pereira da Silva, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz José Dias, Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Manuel Francisco de Vargas, Matheus Augusto Ribeiro Sampaio e Matheus Teixeira de Azevedo.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Affonso Xavier Lopes Vieira, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alberto Botelho, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alipio Albano Camello, Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio de Almeida Dias, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José Boavida, Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Roque da Silveira, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio de Sousa Pinto de Magalhães, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Fuschini, Augusto José da Cunha, Augusto Neves dos Santos Carneiro, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Belchior José Machado, Carlos Alberto Soares Cardoso, Carlos de Almeida Pessanha, Carlos Augusto Ferreira, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Castro e Solla, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha, Eduardo Burnay, Fernando Mattozo Santos, Filipe Leite de Barros e Moura, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, Hypacio Frederico de Brion, João Augusto Pereira, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, João Joaquim André de Freitas, João Marcelino Arroyo, João Monteiro Vieira de Castro, João Pinto Rodrigues dos Santos, José Caetano Rebello, José Caetano de Sousa e Lacerda, José da Cunha Lima, José Dias Ferreira, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Maria de Andrade e Sousa, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Manuel Affonso de Espreguei-

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ra, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Homem de Mello da Camara, Manuel Joaquim Fratel, Mariano José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Marques de Reriz, Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges (Cabral, Paulo de Barata Pinto Osorio, Rodolpho Augusto de Sequeira, Rodrigo Affonso Pequito, Visconde de Reguengo (Jorge) e Visconde da Torre.

Não compareceram á sessão os Srs.: - Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio Joaquim Ferreira Margarido, Antonio Tavares Festas, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar da Rocha Louza, Frederico dos Santos Martins, Ignacio José Franco, José da Gama Lobo Lamare, José do Mattos Sobral Cid, Manuel de Sousa Avides, Marianno Cyrillo de Carvalho e Visconde do Mangualde.

Acta - Approvada.

O Sr. Presidente: - Devo á Camara uma explicação. Se marquei sessão para hoje de manhã foi por ignorar que a Camara dos Dignos Pares não dava hoje sessão.

EXPEDIENTE

Officio

Do Ministerio da Justiça, remettendo, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado Luiz José Dias, copia do officio d'aquella Secretaria de Estado, informando quaes sejam as sociedades, tendo por fins a exploração do fabrico e venda do pão, cujo registo da contribuição social se acha feito, naquella secretaria, desde 31 de dezembro ultimo.

Para a secretaria.

Telegrammas

Vimioso. - Exmo. Conselheiro Presidente Camara dos Deputados, Lisboa.

Camara minha presidencia, reunida em sessão de hoje, deliberou implorar a alta e valiosa protecção do V. Exa. para que promova perante a Camara de sua mui digna presidencia a approvação immediata, na actual sessão legislativa, do projecto do Caminho de Ferro de Mirandella a Bragança, visto que o povo de Vimioso, reunido em comicio, se mostra altamente desgostoso e indignado • por lhe constar que não é posto á discussão na referida sessão, não obstante achar-se já adjudicado ao respectivo arrematante. -- O Presidente da Camara, Domingos José Geraldeo.

Enviado á commissão de obras publicas.

Macedo, 25.- Conselheiro Matheus Teixeira Azevedo, Presidente da Camara dos Deputados, Lisboa.

Camara Municipal, constituída em sessão permanente, esperando a resolução das Côrtes sobre o projecto de adjudicação do Caminho de Ferro de Bragança, e roga a V. Exa. seja seu interpreto perante a Camara, que tão diguamente preside, do desejo vehemente que anima os povoa d'este concelho, de que o projecto não encontre difficuldades para ser discutido e votado na actual sessão. - O Presidente, Moraes Fragoso.

Para, a commissão de obras publicas.

De Macedo, em 25.- Conselheiro Matheus Teixeira de Azevedo, Presidente da Camara doa Deputados, Lisboa.

A commissão eleita pelo comicio de 3 de março, em favor do Caminho de Ferro de Bragança, acompanha anciosamente a discussão do respectivo projecto; pede respeitosamente a V. Exa. que transmitia á Camara, que digramente preside, o desejo vehemente dos povos d'este concelho, do que a questão seja favoravelmente resolvida esta sessão legislativa. - O Presidente, Pimentel Martins.

Mandou-as á commissão de obras publicas.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - Tendo o proprietario Amaro José dos Reis Gaitado, residente na herdado da Toura, de que é proprietario, na freguesia de S. Miguel de Machede, concelho e districto de Evora, dividido a mesma herdade em 208 courelas de l hectare cada uma, com o fim de as aforar aos habitantes pobres da referida freguesia, o que constituo um factor económico importantíssimo para a mencionada freguesia, e um exemplo e incentivo louváveis para o parcellamento da grande propriedade na provincia do Alemtejo, onde a accumulação desmesurada da propriedade constituo o mais forte obstaculo ao seu desenvolvimento economico e bem-estar da grande maioria dos seus habitantes, tenho a honra, na qualidade de representante do circulo de Evora, de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei, em harmonia com a representação que grande numero de habitantes da freguesia da S. Miguel de Machede fizeram a esta camara.

Artigo 1.° É o Governo auctorizado a dispensar a contribuição de registo por effeito dos contratos de emphyteuse das 208 courelas, de l hectare cada uma, em que se acha dividida a herdade da Toura, sita na freguesia de S. Miguel de Machede, no concelho de Evora.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em. 25 de abril de 1902. Mariano Prezado.

Foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

Projecto de lei

Senhores.- A comarca e concelho de Estarreja até ao decreto de 20 de dezembro de 1898 era uma circumscripção regular composta de 9 freguesias, todas a pequenas distancias da sede do concelho e da comarca, sendo assim harmonica e reciprocamente auxiliadora a acção judicial, fiscal e administrativa conveniente a toda a divisão territorial.

Por este decreto foi desannexada d'aquella comarca a freguesia de Fermelã e reunida á de Albergaria - a - Velha, continuando porem a pertencer fiscal e administrativamente ao seu antigo concelho, o que contraria não só os principios de justiça e de administração publica, mas tambem os legitimos interesses e as commodidades dos povos da freguesia de Fermelã.

Accresce ainda que esta freguesia continou fazendo parte do Juizo de Paz do districto de Canellas da comarca de Estarreja, com competencia para o julgamento de cansas civeis até ao valor de 10$000 réis, e para proceder a corpos de delicto pelos factos criminosos nella occorridos, ficando, por esta forma, sujeita a duas jurisdicções differentes: uma a do juiz de direito da comarca de Albergaria - a - Velha, e a outra a do juiz de paz de Canellas, subordinado ao Juiz. o de Direito da comarca de Estarreja. Nenhuma conveniencia publica justifica este estado de cousas, antes a curta distancia a que a freguesia de Formeis, fica da Villa do Estarreja, inferior á que vae da mesma freguesia a Albergaria - a - Velha, as melhores e mais seguras communicações que a ligam á antiga sede da comarca interesses do todos, que seja revogado aquelle decreto de 28 de dezembro de 1898, por conveniencia urgente da administração publica e da administração do justiça, e ainda para comodidade dos seus habitantes fundamento de superior ponderação, que julgamos de mais encarecê-lo ou recommendá-lo, especialmente á reconhecida illustração da Camara dos Senhores Deputados.
Para se remediar, pois, um mal-estar que tantos prejuizos de tempo e de interesses causa áquelles laboriosos e honrados povos, temos a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

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Artigo 1.° É desannexada a freguesia de Fermelã, para todos os effeitos judiciaes, da comarca de Albergaria-a-Velha para a comarca de Estarreja a que pertencia antes da publicação do decreto de 28 de dezembro de 1898.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões 25 de abril de 1902. = 0s Deputados, Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha = Conde de Paçô = Vieira = Arthur da Costa Sousa Pinto Busto = Carlos Malheiro Dias = Mario Monteiro = Carlos Alberto Soares Cardoso = José Motta Pregoa

Foi admittido e enviado á commissão de legislação civil.

Proposta para renovação de iniciativa

Renovamos a iniciativa do projecto de lei n.° 35-A, de 1900, que determina que nos concelhos em que haja mais de um partido medico, tenha preferencia, em qualquer vaga n'elles occorrida, os medicos municipaes do mesmo concelho, por ordem de antiguidade, desde que tenham cumprido zelosamente as funcções do seu cargo. = Clemente Pinto = Manoel Antonio Moreira Junior.

Foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

Refere-se esta renovação de iniciativa ao seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.º Nos concelhos em que haja mais de um partido medico, terão direito de preferencia em qualquer vaga n'elles occorrida os medicos municipaes do mesmo concelho, por ordem de antiguidade, desde que tenham cumprido zelosamente as funcções do seu cargo.

§ 1.º Este direito cessará se, oito dias decorridos após a communicação feita pela respectiva Camara Municipal, não tiver sido requerida a transferencia.

§ 2.º As Camaras Municipaes não poderão reduzir os proventos nem augmentar os encargos aos partidos medicos sem previa auctorização do Conselho Superior de Saude Publica.

§ 3.º Só poderão aproveitar esto beneficio os medicos legalmente habilitados pela faculdade de medicina e Escolas Medico - Cirurgicas de Lisboa e Porto.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

O Sr. Presidente: - Cumpre me participar á Camara o fallecimento do Par do Reino, antigo Deputado, o Sr. Conselheiro Baima de Bastos; e por tão infausto acontecimento proponho que na acta da sessão de hoje se lance um voto de sentimento e se façam as communicações do estylo. (Apoiados).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Ao entrar hoje nesta Camara, fui dolorosamente surprehendido com a noticia do fallecimento de um dos mais antigos parlamentares, que era um dos caracteres mais nobres, mais levantados, mais dignos que teem militado na politica portuguesa, e que, como funcionario publico, bem serviu a causa do seu país, o Sr. Baima de Bastos. (Apoiados).

V. Exa. comprehende, seguramente que, tratando-se de um amigo meu tão dedicado, me seja penoso, nesta occasião, ter de levantar a minha voz, mas, fazendo-o, cumpro um dever de respeito, homenagem e sentimento, associando-me, por parte do Governo, ao voto que V. Exa. acaba de expressar, e que, estou persuadido, será compartilhado por todos os membros d'esta e da outra casa do Parlamento (Apoiados), porque, se Baima de Bastos, como funccionario, era um modelo, um exemplar de lealdade para com todos os Governos, no exercicio das suas funcções mostrou sempre a sua dedicação pelos interesses da sua patria. (Apoiados).

E se como funccionario era um exemplo, como parlamentar era dos mais austeros, dignos e correctos, pelo que tinha a estima, o respeito e a consideração de todos.(Apoiados).

São estes os motivos por que com verdadeira magua me associo á manifestação que V. Exa. acaba de propor, certo de que o país inteiro commigo honrará a memoria de Baima de Bastos. (Apoiados).

O Sr. João Arroyo: - Pedi a palavra para, em nome da maioria parlamentar, me associar ao voto de profunda condolencia por V. Exa. proposto á Camara, a proposito do fallecimento do nosso antigo collega e correligionario Baima de Bastos. (Apoiados).

Baima de Bastos era um nome demasiadamente conhecido, não só nas nossas fileiras partidarias, mas de todos os homens publicos do nosso país, para que seja necessario, neste momento verdadeiramente angustioso para o partido regenerador, traçar o seu perfil politico.

O illustre extincto impunha-se á estima e apreço de todos os seus concidadãos, não só pelas distinctas qualidades de intelligencia que possuia, como pelos predicados do seu caracter. (Apoiados).

Baima de Bastos, que foi um parlamentar distincto, foi, ao mesmo tempo, um funccionario illustre do Ministerio dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça. (Apoiados).

Tomei a palavra para deixar bem expressa a impressão que neste momento domina toda a maioria parlamentar. Apoiados.

O Sr. Luiz José Dias: - Ainda mais uma vez, não estando presente o Sr. Beirão, illustre leader da minoria, nem nenhum dos ex Ministros de Estado que se sentam d'este lado da Camara, eu uso da palavra para me associar ás phrases de condolencia, e ao mesmo tempo de elogio, que acabam de ser proferidas pelo illustre leader da maioria e pelo Sr. Presidente do Conselho, porque este lado reconhece que o extincto possuia excellentes dotes de caracter e era um funccionario distinctissimo. (Apoiados).

Como director dos Negocios Ecclesiasticos, exerceu aquelle elevado cargo com a maxima consciencia e probidade, informando sempre com rectidão e justiça todos os Ministros que geriram a pasta por onde esses negocios corriam. (Apoiados).

Como parlamentar, muitos dos presentes Srs. Deputados sabem que elle se distinguia, não só pela sua fina educação, mas ainda pela bondade que o caracterizava, e pelo fino tacto e patriotismo com que sempre soube agradar a amigos e adversarios, não perdendo nunca de vista os interesses do país. (Apoiados).

É por isso justo que nos associemos á maioria, votando a proposta que acaba de ser feita por V. Exa. (Apoiados).

O Sr. Presidente - Em vista da manifestação da Camara considero a minha proposta approvada (Apoiados ). Serão feitas as devidas communicações. (Apoiados geraes).

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Fuschini pediu a palavra para um negocio urgente, mas a mesa não o considerou como tal. Tenho, no entanto, a declarar a S. Exa. que não estão ainda sobre a mesa os documentos que pediu, e que darei a palavra a S. Exa. antes de se encerrar a sessão, para fazer as declarações que julgar convenientes.

O Sr. Augusto Fuschini: - V. Exa. faz-me o favor de mandar ler o meu pedido?

O Sr. Presidente: - Só o farei se V. Exa. recorrer da deliberação da mesa.

O Sr. Augusto Fuschini: - Recorro, sim senhor.

O Sr. Presidente: - Nesse caso vae ler-se a nota que V. Exa. mandou para a mesa.

Leu-se a seguinte

Nota de negocio urgente

Desejo fazer algumas observações acerca das declarações hontem feitas pelo Sr. Presidente do Conselho e pe-

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

dir que ainda, hoje sujam enviados á Camara documentos originaes meus, que devem estar promptos e preparados no Ministerio da Fazenda. = Fuschini.

A Camara não considerou o assumpto urgente.

O Sr, Augusto Fuschini: - V. Exa. dá-me licença para dizer quaes são os documentos que ou pedi?

O Sr. Presidente: - Não posso dar agora a palavra a V. Exa., mas dar-lhe-hei antes de se encerrar a sessão,

O Sr. Augusto Fuschini: - Reservar-me-hei então para o final da sessão.

O Sr. Presidente: - Accedendo ao convite do comité austro-hungaro para que esta Camara se faça representar na proxima conferencia da arbitragem e da paz que se deve realizar em Vienna de Austria no mês de maio, nomeio para essa commissão os seguintes Srs. Deputados:

Abel Pereira de Andrade.

Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro.

Antonio Affonso M. Vellado Alves Pereira da Fonseca.

Antonio Caetano de Abreu Egas Moniz.

Arthur Pinto do Miranda Montenegro.

Carlos Malheiro Dias.

Conde de Paçô-Vieira.

Condo de Penha Garcia.

Francisco Antonio da Veiga Beirão.

Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos.

D. Luiz Filippe de Castro.

Luiz Fisher Berquó Poças Falcão.

Luiz Gonzaga dos Reis Torgal.

José Dias Ferreira.

José Maria de Oliveira Mattos.

José Maria Pereira de Lima.

João de Sousa Tavares.

Rodrigo Affonso Pequito.

Para a secretaria.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - O illustre Deputado o Sr. Fuschini, que mandou para a mesa um pedido de documentos, tinha-me prevenido hoje de manhã que pretendia esses documentos, a fim de sobre o assumpto fazer as considerações que julgasse convenientes.

Immediatamente, quando pôde ler a carta do Sr. Deputado, escrevi ao Sr. Ministro da Fazenda para que elle trouxesse hoje á Camara os documentos pedidos. Espero que virão, e como o Sr. Presidente reservou a palavra a Exa. para antes de se encerrar a sessão, estou certo de que nessa occasião S. Exa. poderá ter presentes os documentos que solicitou.

O Sr. Augusto Fuschini: - É melhor nesta questão não fazermos observações nenhumas, porque é uma questão que se vae discutir entre o Ministro da Fazenda de 1893 e o Presidente do Conselho d'aquella epoca, e a que, portanto, a maioria tem de assistir impassivel, não dizer nada.

O Sr. João Arroyo: - Se entender nada dever dizer.

O Orador: - Agradeço os esclarecimentos que o Sr. Presidente do Conselho me deu, e unicamente o que peço é que quando me seja dada a palavra não estejamos em circunstancias por tal maneira apertadas, que eu não possa expor perante a Camara o que tenho a dizer.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Oliveira Mattos para realizar o seu aviso previo apresentado na sessão de 19 de fevereiro e dirigido ao Sr. Ministro das Obras Publicas.

O Sr. Oliveira Mattos: - Antes de entrar no motivo do aviso previo, aproveita o ensejo de haver sido nomeada a commissão que ha de representar a Camara dos Deputados na proxima conferencia da arbitragem e da paz, para dirigir os seus agradecimentos ao comité francês, da presidencia do Sr. De Labiche, pela maneira notavelmente amavel como recebeu os representantes do Parlamento na ultima conferencia que se realizou em Paris por occasião da Exposição Universal, amabilidade que foi ato ao ponto de, sendo apenas 5 os representantes do Parlamento, os convidarem, por duas vezes, para vice-presidentes das sessões preliminares, havendo ali 700 representantes de todos os Parlamentos do mundo.

E, neste seu agradecimento, não pode deixar de incluir o antigo Deputado, o Sr. João Paiva, que de uma maneira brilhante, com os seus trabalhos sobre a paz, tem conseguido para Portugal as sympathias do estrangeiro.

Entrando agora no assumpto do seu aviso previo, que, com muito sentimento seu só tão tarde pode realizar, não estranhe a Camara que elle venha pedir melhoramentos que importam despesa, porque a sua norma constante tem sido oppor-se a todas as despesas injustificaveis, mas não aquellas que são pela sua natureza reproductivas.

Faz esta declaração para evitar qualquer critica maliciosa.

Chama a attenção do Sr. Ministro das Obras Publicas para uma questão importante, qual é a do Caminho de Ferro de Arganil, com o qual o Estado não despende nem um real.

Sem contestar a justiça da proposta hontem apresentada pelo Sr. Ministro das Obras Publicas para a construcção do caminho de ferro de Mirandella a Bragança, que traz appenso, não se sabe bem porque, a do caminho de ferro do Valle do Corgo, entende que a cidade de Coimbra e a região importante que o caminho de ferro de Arganil vão servir, não tem menos direito do que Bragança a esse melhoramento.

O que pede ao Sr. Ministro das Obras Publicas, em nome dos povos d'aquella região, é que obriguem os empresarios a cumprir a lei, que não lhes conceda mais prorogações de prazo.

Disse o Sr. Ministro das Obras Publicas, na outra casa do Parlamento, respondendo sobre este assumpto a umas perguntas do Digno Par o Sr. Castro Mattozo, que era cruel obrigar os empresarios a cumprir o seu dever, porque seria forçar uma empresa que já tem despendidos 800 a 1:000 contos, a soffrer grandes prejuizos. Será cruel esse procedimento para com a empresa, mas com certeza não o é menos o que se tem tido para com o povo da região que o caminho de ferro vae servir, privando-o por tanto tempo de tão importante melhoramento.

Esse caminho de ferro não tem servido ato hoje senão para justificar uma verba de 3:000$000 réis que figura no Orçamento para pagar ao pessoal que nada faz.

Não existindo esse caminho de ferro, pedia que d'essa verba de 3:000$000 réis se desviasse uma pequena verba para pagar a dois mestres que dirigirem as respectivas officinas da Escola Industrial de Coimbra, pois é realmente para lamentar que tendo-se mandado vir o material preciso para a montagem d'essas officinas, esse material esteja ha sete annos encaixotado a deteriorar-se, por falta de mestres que mantem ali o ensino pratico.

O intelligente director d'aquelle estabelecimento, o Sr. Antonio Augusto Gonçalves, tem empregado o maior cuidado na conservação d'esse material, mas a continuar assim por muito tempo é de recear que se inutilize por completo.

O Sr. Presidente: - Observa que deu a hora de se passar á ordem do dia.

O Orador: - Muito a seu pesar dá por findas as suas considerações, porque muito ainda lhe restava a dizer; espera no entanto, ainda nesta sessão legislativa, poder-se occupar dos assumptos que deseja tratar.

(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia.

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SESSÃO N.º 65 DE 26 DE ABRIL DE 1902 5

Os Srs. Deputados que tiverem papeis para mandar para a mesa podem fazê-lo.

O Sr. Oliveira Mattos: - Pergunto a V. Exa. se estão sobre a mesa os documentos que pedi, relativamente á Irmandade do Terço e de S. Francisco.

O Sr. Presidente: - Ainda não vieram.

O Sr. Alfredo de Albuquerque: - Mando para a mesa a seguinte

Declaração

Declaro que lancei na caixa das petições dois requerimentos em que os facultativos da guarnição do Estado da India José Joaquim Fragoso é Viriato Mathias da Costa pedem lhes sejam mandadas abonar as gratificações, com excepção das de ensino, que percebem os lentes da Escola Medica de Goa, em vista do serviço extraordinario que lhes tem sido imposto pelo desenvolvimento que tem assumido a invasão da peste bubonica em alguns districtos d'aquelle Estado, principalmente em Damão e Diu. = O Deputado, Alfredo de Albuquerque.

O Sr. Julio de Petra Vianna: - Mando para a mesa um projecto de lei que tem por fim isentar do pagamento do porto de correio as cartas impressas expedidas pela Sociedade de Geographia de Lisboa.

Considero-me honrado por ter tido opportunidade do tomar a iniciativa de prestar um acto do justiça em favor de uma collectividade tão necessaria a uma nação que, como a nossa, tem um grande dominio ultramarino.

A Sociedade de Geographia de Lisboa tem contribuido importante e poderosamente para tornar conhecido e prestigioso o nome português junto dos outros paises. Não tem sido quasi uma instituição official e ha mais de vinte e cinco annos que vem provando quanto pode o trabalho intelligente e perseverante de verdadeiros patriotas, á frente dos quaes viamos ainda ha pouco tempo o erudito, honrado e grande trabalhador, o Conselheiro Luciano Cordeiro, de saudosa memoria.

Ha alguns meses a Sociedade promoveu benemerita e distinctamente um congresso colonial nacional, que mereceu a consideração universal, e mantendo relações com sociedades nacionaes e estrangeiras, é uma aggremiação digna do nosso país, que, como colonial, tem um dos logares primaciaes no mundo.

A Sociedade de Geographia de Lisboa tem contribuido elevadamente para o engrandecimento da nossa patria. Os encargos resultantes dos acordos com o Estado são superiores aos auxilios que elle lhe dispensa.

A outras collectividades que, como a Sociedade de Geographia de Lisboa, teem por principal objectivo fins altruistas, humanitarios e patrioticos, foram feitas identicas concessões, e eu conto que o projecto de lei, que tenho a honra de mandar para a mesa, ha de merecer tambem o apoio do Governo e a approvação das Côrtes.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Madureira Beça: - Mando para a mesa um projecto de lei, autorizando a Camara Municipal de Villa Flor, a levantar do fundo de viação municipal, por ella depositado na Caixa Geral de Depositos, 3:378$450 réis para serem applicados a melhoramentos materiaes de urgente necessidade.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Rodrigo Pequito: - Mando para a mesa o parecer das commissões reunidas de administração publica e de fazenda, sobre o projecto n.° 52 de 1901, que tem por fim elevar a 500$000 réis annuaes, o ordenado dos tres chefes de policia de investigação criminal de Lisboa.

Foi a imprimir.

O Sr. Alberto Charula: - Mando para a mesa uma representação da Camara Municipal de Macedo de Cavalleiros pedindo a construcção do caminho de ferro de Mirandella.

Vae por extracto no fim da sessão.

O Sr. Luiz José Dias: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. o obsequio de me dizer se já chegaram á mesa os documentos que pedi ha tempo.

O Sr. Presidente: - Ainda não chegaram.

OBDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 87, que auctoriza o Governo a converter a actual divida publica externa.

O Sr. Sousa Tavares: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Peço a V. Exa. se digne consultar a Camara se permitte que a sessão seja prorogada até acabar a discussão e ser votado o presente projecto. = O Deputado, Sousa Tavares.

O Sr. Antonio Cabral (sobre o modo de votar): - Mando para a mesa o seguinte
Requerimento

Requeiro a V. Exa. que se digne consultar a Camara sobre se permitte que sobre o requerimento para a prorogação da sessão recaia votação nominal. = Antonio Cabral.

Foi approvado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á chamada para a votação.

Feita a chamada Disseram approvo os Srs.:

Agostinho Lucio e Silva.

Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão.

Alberto Botelho.

Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro.

Albino Maria de Carvalho Moreira.

Alexandre José Sarsfield.

Alfredo Augusto José de Albuquerque.

Alfredo Cesar Brandão.

Alipio Albano Camello.

Alvaro Augusto Froes Possolo de Sousa.

Alvaro de Sousa Rego.

Anselmo Augusto Vieira.

Antonio Alberto Charula Pessanha.

Antonio Augusto de Sousa e Silva.

Antonio Barbosa Mendonça.

Antonio Belard da Fonseca.

Antonio José Boavida.

Antonio José Lopes Navarro.

Antonio Maria Pereira Carrilho.

Antonio Rodrigues Ribeiro.

Antonio Sergio da Silva e Castro.

Antonio de Sousa Pinto de Magalhães.

Arthur Eduardo de Almeida Brandão.

Augusto Neves dos Santos Carneiro.

Avelino Augusto da Silva Monteiro.

Belchior José Machado.

Carlos Alberto Soares Cardoso.

Carlos Malheiro Dias.

Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda.

Clemente Joaquim dos Santos Pinto.

Conde de Paçô-Vieira.

Custodio Miguel de Borja.

Domingos Eusebio da Fonseca.

Ernesto Nunes da Costa Ornellas.

Filippe Leite de Barros e Moura.

Francisco José Patricio.

Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros.

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Guilherme Augusto Santa Rita.

Henriques Matheus doa Santos.

Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira.

Jayme Arthur da Costa Pinto.

João Alfredo de Faria.

João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos.

José Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira.

João Joaquim André do Freitas.

João Marcellino Arrojo.

João da Sousa Tavares.

Joaquim Antonio de Sant'Anna.

Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos.

Joaquim Faustino de Pôças Leitão.

Joaquim Pereira Jardim.

José Antonio Ferro de Madureira Beça.

José Caetano Rebello.

José da Cunha Lima.

José Gonçalves Pereira dos Santos.

José Jeronymo Rodrigues Monteiro.

José Joaquim Dias Gallas.

José Maria de Oliveira Simões Julio Augusto Potra Vianna.

Julio Maria de Andrade e Sousa.

Luciano Antonio Pereira da Silva.

Luiz Filippe de Castro (D.).

Luiz de Mello Correia Pereira Medella.

Manuel Joaquim Fratel.

Marianno José da Silva Prezado.

Mario Augusto de Miranda Monteiro.

Marquez de Reriz. Matheus Augusto Ribeiro Sampaio.

Rodolpho Augusto de Sequeira.

Visconde da Reguengo (Jorge).

José Joaquim Mendes Leal.

Amandio Eduardo da Motta Veiga.

Matheus Teixeira de Azevedo.

Disseram rejeito os Srs.:

Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral.

Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral.

Antonio Rodrigues Nogueira.

Augusto José da Cunha.

Carlos Augusto Ferreira.

Francisco Antonio da Veiga Beirão.

Francisco Felisberto Dias Costa.

Francisco José Machado.

Francisco José de Medeiros.

Francisco Limpo de Lacerda Ravasco.

Frederico Ressano Garcia.

Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida a Vasconcellos.

João Augusto Pereira.

José Adolpho de Mello e Sousa.

José Maria do Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

José Maria de Oliveira Mattos.

José Mathias Nunes.

Julio Ernesto de Lima Duque.

Libanio Antonio Fialho Gomes.

Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla.

Luiz Fisher Berquó Pôças Falcão.

Luiz José Dias.

Manuel Affonso de Espregueira.

Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

Paulo de Barrou Pinto Osorio.

O Sr. Presidente: - Está approvado o requerimento do Sr. Sousa Tavares por 72 votos contra 24, e portanto prorogada a sessão.

O Sr. Mello e Sousa: - Não tem ideia de se haver nunca requerido prorogação de sessão logo no seu principio o para uma discussão que ainda não começou.

O projecto de que vae occupar-se é excellente, a solução encontrada é salvadora; mas o Governo tem prensa, muita pressa, de a fazer votar.

Elle, orador, combateu o projecto do convenio de 1898, e como justiça é devida a todos, deve dizer que a discussão correu então por modo diferente da actual. Pela sua parte falou quantas vezes quis, em quanto que hoje a discussão é muito limitada.

Protesta contra o precedente de se prorogar uma sessão logo no seu começo.

Não tem elle, orador, responsabilidades no assumpto que se está discutindo, pois que não ao combateu o projecto de 1898, como se recusou a assignar a moção apresentada pela opposição em que se reconhecia a necessidade da conversão. Encontra-se, portanto, era circunstancias especialissimas, que substituirão a habilidade que não tem, para apreciar devidamente as incoherencias d'aquelles que não continuam hoje a seu lado, como então estavam.

Pela sua parte, porem, não vê homens; vê só o país, e pelo país se encontra falando; obstem-se por isso de se referir ás opiniões anteriormente expendidas, para tratar unica e exclusivamente de apreciar o projecto em discussão.

O Sr. Presidente do Conselho confessou que havia rompido as negociações entaboladas com os credores externos pelo Governo progressista, o que importa a declaração de que depois as reatou, porque muito bem quis, o reatou-as, disse S. Exa., por entender que podia obter as vantagens concedidas neste projecto, que hão de trazer como resultado o resurgimento da nossa nacionalidade, e não porque tivesse de ceder a pressões de qualquer natureza.

Essas negociações, como se vê pela declaração do Sr. Presidente do Conselho e pelo que se lê no relatorio, estão fechadas; e, todavia, não é o contrato ajustado que S. Exa. traz ao Parlamento, mas sim um pedido do auctorização.

O Governo publicou relatorios, mas aquillo que era essencial á discussão, o que diz que está feito o que convinha conhecer-se, isso não apparece.

Nós somos os representantes da nação, os genuinos, como diz o Sr. Presidente do Conselho; mas apesar d'isso, temos menos direitos do que qualquer portador do um titulo de 20 libras da divida portuguesa.

Os comités hão de ouvir os portadores da divida portuguesa antes de assignarem o contrato; os representantes do país não teem que ser ouvidos.

Os que acceitam, não acceitam sem serem ouvidos; os que concedem, concedem sem saber o que.

Se isto não bastasse pura encobrir a tão famosa lei de que se fala, nos relatorios, quer do Sr. Ministro da Fazenda, quer da commissão, quando ha o proposito evidente de a obscurecer, estava a declaração feita nos relatorios da commissão de que o capital a reembolsar passa de 258:218 para 157:951 contos, o que não é verdade, porque o capital a reembolsar em fundos amortizaveis é de 65:000 contos e agora passa a 92:000.

No relatorio do Sr. Ministro da Fazenda, que mais alguma cousa contém que é da commissão, diz-se que, a partir do 1902-1903, a annuidade para o 4 por cento cresce de 187 a 348 contos, ou de 211 contos, e para o 4 1/2 por cento de 1:039 contos a 2:685, ou de 1:646 contos. Parece que este crescimento é immediato; mas isso é absolutamente inexacto, porque a amortização de 1965, indicada no projecto, é a ultima da escala.

O Sr. Ressano Garcia, no sou brilhante discurso, pôs em duvida as contas do quadro apresentado no relatorio do Sr. Ministro da Fazenda, e o Sr. Presidente do Conselho respondeu-lhe em tora triumphante que essas amortizações e verbas eram as citadas no relatorio de S. Exa. Ainda isto não é assim; porquanto, no relatorio do Sr. Ressano Garcia, diz-se que o encargo de 4 1/2 por cento era de 170:100$000 réis, emquanto que no relatorio do Sr. Ministro da Fazenda, diz-se ser do 180 contos de réis.

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SESSÃO N.º 65 DE 26 DE ABRIL DE 1902 7

Quando numa copia, em assumpto de tanta gravidade, se encontram erros d'esta natureza, o que succederá no resto!

Só em 1930 ou 1936 é que o encargo será quasi igual ao da lei em vigor.

Pela base 1.º estabelecem-se as differentes series de qualidades do typos em que á convertida a divida actual, e aqui vem dizer que não ha unidade de taxa e muito menos unidade de typo, porque o typo dos titulos é diverso.

A primeira serie é a dos titulos de 5 por cento; a segunda, dos titulos de 3 por cento com o premio de 25 por cento; e porque estes podem ser amortizados por compra no mercado, se dá o facto extraordinario e unico de se amortizar com premio o que pode deixar de ter premio.

A terceira serie é a dos titulos de 3 por cento e appensos de titulos sem juro.

A este respeito perguntava o Sr. Espregueira como se fazia isto praticamente; se se trocavam quatro títulos dos actuaes por tres dos modernos, dando-se um sem juro, e como se praticava para com esses titulos que correspondem a tres, quanto á numeração.

Disse o Sr. Ministro da Fazenda que é isto uma questão secundaria, sem importancia; mas, em questões financeiras, a execução é tudo; não ha questões secundarias; os melhores princípios não dão muitas vezes na pratica resultado algum, e este é o caso.

Disse ainda S. Exa. que não tinha pensado na troca; que o importante era obter amortização e que o resto era secundario.

Isto tambem não é verdade, e é S. Exa. mesmo quem se contradiz, porque escolheu o typo de 3 por cento, por ser aquelle que melhor se presta á redacção do capital e o que mais facilidade apresenta para a troca dos titulos actuaes pelos novos. Pensou, portanto, nem podia deixar de pensar, na troca dos titulos, e de toda a conveniencia era, por consequencia, que dissesse qual é a forma por que conta realizar essa operação.

S. Exa. não tem senão duas formas para a realizar: ou ha de dar ao portador titulos que representem tres quartos de valor e outro que represente um quarto sem juro, ou ha de fatalmente converter. Seja, porem, como for, a verdade é que se vae criar um titulo do Governo português, sem juro, que será positivamente um titulo de divida deferida, como os que existiram em 1852, em que os credores só tinham direito ao juro, a partir de 1863.

E exactamente o que succede agora.

Vae ser cotado nos mercados do mundo um titulo do Governo Português sem juro, um titulo de divida deferida. Julga porventura o Sr. Ministro da Fazenda que um titulo d'esta ordem pode circular nos mercados do mundo durante noventa e nove annos?

Pensa, porventura, S. Exa. que é por esta forma que se apaga o tal passado doloroso de que tanto se tem falado? Julga S. Exa. que isto é mais barato que a estampilhagem? Está completamente enganado.

Nesses titulos ha de escrever-se a razão por que não se paga o juro, e isto será um pregão do nosso descredito.

Em 1852 criaram se titulos absolutamente iguaes a estes no valor de 205:000, que só deviam começar a vencer juro a partir de 1863, mas logo em 1804-1855 foram convertidos.

Em 1855 negociou-se um acordo com os credores, que tinham impedido a cotação dos nossos fundos em Londres, por não terem acceitado o decreto de 1852, e veiu então a lei de 1856 confirmar esse acordo, pelo qual se criaram novamente titulos sem juros que foram emittidos na somma de 456:000.

No primeiro emprestimo, porem, que se conseguiu realizar em 1862, foram logo amortizados.

Esta é a razão por que elle, orador, diz que não ha meio de restabelecer o credito, fazendo circular nos mercados do mundo titulos sem juro.

E para que esse descredito seja bem publico os banqueiros hão de annunciar todos os quinze dias as quantias recebidas, para pagamento dos juros, exactamente como succedeu com o Uruguay.

Dizem os panegyristas do Sr. Mattozo Santos que S. Exa. nestas negociações conseguiu collocar se em melhor posição de que o Ministro francês Delcassé, Não sabe elle, orador, se S. Exa. o conseguiu ou não; mas isso não lhe causa surpresa, tanto é o talento de S. Exa.; tem, porem, a certeza de que S. Exa. não conseguiu illudir os financeiros que negociaram o convenio; esses difficilmente se deixam enganar, A prova está na base é ª em que elles conseguiram introduzir a seguinte clausula:

"Feita, nos termos da presente lei, a devida regularização da divida externa portuguesa, nenhuma vantagem poderá ser de futuro concedida aos titulos de qualquer das tres series, a que se refere a base 1.ª que se não torne extensiva ás demais".

Para que é que, numa regularização definitiva da divida, se estipula que de futuro não haja mais vantagens? Se é definitiva, evidentemente não ha nada mais a conceder.

Parece, e isso tem sido dito, que esta clausula não tem valor, porque o assumpto, fica definitivamente regulado; mas não é assim; apresenta até um grande perigo, e este está nos taes titulos sem juro, que a breve trecho serão amortizados, e quando se quiserem amortizar, ainda que seja por compra, vem os portadores das tres series reclamar contra a vantagem que se concede aos titulos da quarta serie, visto que foram amortizados antes dos noventa e nove annos.

E que estes titulos não podem demorar se nos mercados é evidente, porque, como já disse, constituirão um pregão da nossa fallencia. Ha de succeder-lhe o mesmo que aconteceu em 1852 e em 1855: apenas tivemos de fazer um emprestimo.

Mas o que então podiamos realizar com facilidade, não o podemos amanhã fazer depois de votada esta lei, por isso que é um beneficio o amortizar esses titulos antes de noventa e nove annos, e isto, em vista da clausula 5.ª pode motivar reclamações.

E não se diga que podem comprar-se no mercado, porque esse facto ha de ser conhecido e as reclamações hão de apparecer da mesma forma por parte dos portadores da segunda serie.

E os de 3 por cento que tão generosamente foram tratados, como a Camara vae ver, tambem hão de reclamar.

As vantagens concedidas aos portadores de 3 por cento disse o Sr. Ministro da Fazenda que tinham compensação. Elle, orador, vae mostrar qual a situação em que ficam esses portadores.

O maior empréstimo que contrahimos foi de 12.000:000 libras, negociado a 29 79, pois o Estado recebeu apenas 3.540:000 libras e agora, porque se encontra em difficuldades, porque não pode pagar a todas por igual, vae amortizar por 6.000:000 libras aquillo de que só recebeu 3.540:000 libras.

E não se allegue que a amortização é a melhor forma; se fosse, a França com certeza a teria adoptado; mas esse pais não o fez, quando o podia fazer com vantagem, porque uma cousa é a amortização facultativa, e outra é a obrigatória. Que o diga a Inglaterra que, achando-se em difficuldades, suspendeu a amortização. Nós é que, quaesquer que sejam as difficuldades, não podemos suspender cousa nenhuma, porque a amortização é obrigatoria.

O fundo português de 3 por cento a 29 vale 54$435 réis; pois o Governo obriga-se a amortizá-lo a 93$000 réis, isto é, mais 39$000 reis. E não se diga que ha facilidade em comprar o 3 por cento, porque quando se souber que o juro é garantido pelo rendimento das alfande-

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8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

gas esses titulos hão de aproximar-se na cotação da taxa dos juros. Ha de succeder-lhes o mesmo que aos fundos egypcios, que apenas foram garantidos, subiram logo, chegando até ao par.

Como a Camara vê, não nos rehabilitamos do passado; os desejos do Sr. Presidente do Conselho não foram satisfeitos; os receios de S. Exa. sobre a estampilhagem proposta pelo Sr. Espregueira, não colhem, e o que fica é ainda poor e mais dispendioso.

A respeito da base 2.ª disse o Sr. Ministro da Fazenda que a consignação era o mais attenuada possivel. Attenuada para nós, que temos de engulir a pillula, mas não attenuada para os credores.

Diz-se tambem nesta base que não se altera em nada a organização da junta. Não é assim, ou por outra, não pode ser assim, pelas razões que vão expor á Camara.

As dividas interna e externa estavam em igualdade de circumstancias. Ao encargo dos juros de ambas eram destinadas as receitas das alfandegas de Lisboa e Porto que entravam diariamente nos cofres do Banco de Portugal por conta da junta, mas posta em vigor esta lei, já não sucederá. o mesmo, porque á divida externa fica especialmente e de preferencia consignado o rendimento das alfandegas, consignação não só para o serviço dos juros, mas para o premio do agio do ouro, que até aqui como se babe, ora encargo do Estado.

Hoje a divida externa é paga antes do que qualquer outro titulo, e as receitas das alfandegas são consignadas não ao, como disse, ao pagamento dos juros e ao premio do ouro, mas até ás despesas feitas com o serviço da divida lá fora.

O rendimento das alfandegas que até aqui chegava para o pagamento das duas dividas, não chegará agora.

Diz-se que não se altera a organização da junta; mas ha de alterar-se, porque, mesmo consignando-se o rendimento todo dão alfandegas, não pode chegar para a divida interna.

Acceitando os calculos do Governo, que, aliás, estão errados, vê-se que o encargo que se vae contrahir passa a ser de 4:601 contos, o de 1:380 contos o agio. Computando-o a 30 por cento, temos 5:981 contos, que serão pagos de preferencia, porque a isso nos compromette-mos.

E note-se que o agio já hontem tinha attingido 31 por cento pela especulação, que não por beneficio do convenio, pois apenas se annunciou este projecto o cambio começou a melhorar, e, logo que o deixaram entregue a si proprio, caiu; e mais cairá ainda, porque não ha meio do compreender, que, sendo o ouro uma mercadoria no nosso país, essa mercadoria baixe de valor exactamente quando maio procura tiver. A melhoria real do cambio só pode vir da confiança, e esse não existirá emquanto não houver boa administração.

Os juros da divida interna, contando só os que estão em circulação, embora se devesse tambem contar com os que estuo representando cauções, porque estas só teem valor, quando se sabe que postos no mercado podem ser pagos, elevam-se a 9:591 contos, dos quaes deduzindo-se os 30 por cento que o regulamento da junta manda deduzir, ficam 6:714 coutos. Juntando a isto 126 contos para amortização, chega-se a uma somma de 6:840 contos.

Ora, se juntarmos aos 6:840 contos da divida interna, 5:981 contos da divida externa, encontramos um total de 12:821 contos, para fazer face aos quaes temos de direitos de importação 11:635 contos e de exportação, deduzindo os vinhos, 201 contos, ou um total de 11:836 contos, o que dá uma differença para menos de 985 contos.

Consignada a receita das alfandegas só á divida externa, veja a Camara em que situação fica a divida interna, que deixa de ficar garantida como até aqui estava por esse rendimento.

E não lhe venham dizer que esta sua exposição, cuja verdade ninguem pode contestar, pode prejudicar a cotação dos titulos internos, porque a isso desde já respondo que esses titulos baixaram antes de pronunciar estas palavras, porque só estava capitalizando a uma taxa aproximadamente do titulo externo, e ninguem que tenha olhos de ver, desconhece que elle fica agora em muito peores condições.

Não é elle, orador, que o diz, são os factos, e desde que estes o dizem, que é preciso mostrar bem ao pais o que é o convenio, não hesita em pô-los a nu.

E se com o agio a 30 por cento a receita das alfandegas não chega para o pagamento dos titulos da divida interna e externa, se esse agio subir, onde é que ha de ir buscar-se dinheiro para pagar?

Elle, orador, deu-se ao trabalho de ver qual ora o rendimento dos impostos e verificou que era de 27:301 contos, assim como igualmente verificou que os encargos do Estado, conforme estão calculados, e demonstrado foi já que o estilo muito pelo baixo, são de 29:792 contos, donde conclue que ha um deficit do 2:441 contos. Abatendo, porem, desses 2:441 contos, 550 contos que ficarão, segundo se calcula, livres da receita dos tabacos, ainda assim a receita arrecadada não cobre a despesa, pois accusa ainda um deficit de 1:891 contos.

Nestas condições, pergunta onde se ha de ir buscar com que pagar o juro da divida e os encargos do Estado.

A este proposito lê um artigo de um defensor ao convenio em que se diz que o pagamento da divida externa está assegurado, o que a haver fallencia será internamente.

Não é de presumir que os 12:000 contos da receita das alfandegas não cheguem para pagar 400 contos da divida externa, e portanto, esta está assegurada; o que pode acontecer é não chegar para a interna, mas isso não offerece perigo.

Contra isto é que o orador protesta vehementemente, pois alem do portador voluntario da divida interna ha 128:406 contos em condições de immobilidade forcada por lei e que pertencem ás misericordias, aos hospitaes, aos asylos, aos orphãos, a viuvas e dotes. Deixar de pagar esses juros, seria um verdadeiro crime.

Os titulos de divida externa não estilo nas mãos dos que primeiro os tomaram, e não é justo que a quem nos deu 29 libras se vão dar 50, quando não se paga por inteiro áquelles que o compraram á sombra da lei.

Chama muito especialmente a attenção da Camara para a demonstração que acaba de fazer, baseada toda em algarismos officiaes e que está prompto a discutir, seja com quem for, a uma mesa de trabalho, que é onde as questões do algarismos se podem discutir com proveito.

Não ha direito a dar ao portador dos titulos de 3 por cento mais do que elle nos deu, quando se corre o risco de não se puder pagar ás viuvas, aos orfãos e ás misericordias.

Este é o lado triste do projecto, mas ha ainda uma cousa a que se deve attender e para que não pode tambem deixar de chamar a attenção da Camara, pois de contrario terminaria por aqui as suas considerações.

Diz-se tambem no projecto que ficam igualmente garantidos pelo rendimento das alfandegas o serviço feito pelos encarregados da divida no estrangeiro.

O Sr. Ministro da Fazenda disse que isto era absolutamente o que estava no regulamento da junta. Não é assim.

No regulamento fala-se na remessa para as agencias do Thesouro no estrangeiro e aqui fala-se em estabelecimentos encarregados do serviço da divida.

Se é a mesma cousa, é necessario que isso se diga claramente.

É necessario ainda que se empregue a mesma expressão que está no regulamento da junta, porque a designação estabelecimentos encarregados do serviço da divida"

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existe em todos os paises que teem intervenção estrangeira.

Feito isto é tambem desnecessario dizer que os encarregados d'esse serviço terão uma garantia especial do rendimento das alfandegas, porque é impossivel que descessemos tanto, que seja necessario o Governo inscrever numa lei uma garantia para as commissões dos seus agentes no estrangeiro.

Mercê da administração seria, razoavel e economica, que agora vem ao Parlamento com uma lei de resurgimento da patria, sabia já elle, orador, que o Governo Português não conseguia descontar nas praças, senão a um juro elevadíssimo, quando conseguia descontar.

Não pode, porem, abranger-se todo o país, na mesma desconfiança, porque ao passo que o Governo só consegue descontar letras do Thesouro a 7 por cento, e juro para o commercio e até para qualquer casa particular, com a simples garantia da firma, mantem-se á taxa de 2 1/2 por cento.

Isto sabia elle, orador, mas o que não calculava, mesmo, é que, para commissões aos seus agentes bancarios, tinha o Governo de dar uma garantia, em ouro, do rendimento das alfandegas.

Salientada a differença entre o credito do Governo e o credito do país, o que é preciso é que o Governo tenha ordem e se habitue a ser economico e a administrar bem.

Uma questão de somenos importancia, mas ainda assim de bastante valor é a que se refere á sellagem dos títulos.

Na base 6.ª diz-se entre outras cousas que o Governo é auctorizado a satisfazer a importancia do sêllo dos novos titulos.

Já demonstrou que ficamos peor do que ficavamos, com a estampilhagem, ainda com a desvantagem, que precisa accentuar, agora, de ser muito mais caro e de poder vir a ser carissimo, se não se mudar a redacção da base, substituindo-a pela que vem no projecto do Sr. Espregueira. D'este modo evitam-se exigencias e reclamações. Não apresenta proposta neste sentido e deixa apenas a lembrança, porque, como já disse, não quer no projecto outra collaboração que não seja a de absoluta opposição a elle.

Demonstrou tambem já, que a base 5.ª ha de servir para constantes reclamações e repetidas indemnizações; deve, portanto, desapparecer, principalmente desde que o Sr. Ministro da Fazenda já declarou que ella não teia importancia nenhuma.

Se não tem importancia, elimine-se. O Sr. Beirão, no final do seu discurso, num arranco natural da sua alma nobre, do seu caracter lealissimo, declarou que precisavamos fazer uma conversão de todos nós, porque é necessario que tenhamos juizo.

A mesma nota frisou tambem o Sr. Ressano Garcia ao concluir a sua brilhantíssima oração, e a mesma nota é ainda accentuada pelos proprios defensores do projecto, que, como a Camara vê, não tem defesa possível.

Quando homens de incontestavel valor reconhecem que o caminho que se tem seguido é errado, é porque realmente a situação se precipita, vertiginosamente, no abysmo. Mas ter juizo, o que é? Como é que pode dar-se esse conselho ao Governo que actualmente dirige os negocios da administração?

Ter juizo é bom, é vantajoso e indispensavel, mas aconselhar juizo a este Governo é perder, completamente o tempo.

Se ter juizo é ser sensato e coherente, esse é o programma d'elle, orador; era-o mesmo antes do conselho ser expresso, porque afastando-se da commoda posição de estar ao lado de um partido do Governo, não procurou senão o bem do país.

Por sua parte elle, orador, e os seus amigos seguiram já essa orientação. O Sr. Presidente do Conselho, ao declarar que o projecto em discussão era o resurgir de um passado de ruína, accrescentou que as Cortes são soberanas e livremente deliberam.

Acaba de demonstrar que o projecto é, não o resurgir da ruina, mas um grande passo dado para maior ruína; assim, se as Cortes representam a soberana expressão da vontade do, país, que o provem, votando contra o projecto.

(O discurso será publicado na integra guando S. Exa. o restituir).

O Sr. Pereira Carrilho (relator): - Contrariamente ao que acaba de ser affirmado pelo illustre orador que o precedeu, diz que o projecto em discussão tende a diminuir, consideravelmente, a nossa divida externa, diminuindo igualmente os encargos do juro, e fazendo com que o credito publico se restabeleça.

Em 1893 teve a honra de mandar para a mesa uma substituição ao projecto que então se discutia, e que se converteu na lei de 20 de maio d'aquelle anno. Por ella obrigava-se o país ao pagamento do terço em ouro, alem da participação por metade no excesso dos rendimentos aduaneiros, sendo igualmente dividido por metade o premio do ouro, quando o agio fosse inferior a 22 por cento.

As condições de então, que eram más, sendo o premio do ouro quasi o triplo do que se pede hoje, foram aggravadas com difficuldades economicas e com guerras em Africa que exigiram expedições dispendiosas; pois apesar d'isso, tudo se pagou, e ninguem perguntou de onde vinha dinheiro.

De onde vinha? Vinha da nossa probidade, da nossa boa vontade em pagar; e, todavia, accusava-se o Governo de esbanjador, sem se querer reparar em que Portugal era o unico país que triumphava nas colonias, quando todas as nações coloniaes soffriam nellas mais ou menos dissabores.

Feitos os calculos dos encargos que resultam da proposta em discussão, e comparando-os com as vacaturas que já existem no orçamento, em resultado da differença entre a verba calculada para fazer face ao premio do ouro, 42 por cento, e o que realmente será preciso, attendendo a que o cambio está a 25, apenas faltam para o pagamento esses encargos 75 contos.

Não lhe parece que seja muito difficil descobrir a maneira de arranjar esses 75 contos.

Não é tambem de recear que as receitas das alfandegas não cheguem, como disse o Sr. Mello e Sousa, porque ellas rendem o melhor de 24:000 contos.

Lamenta que o Sr. Mello e Sousa se servisse de artigos deprimentes do bom nome português para combater o projecto.

Desejava que lhe dissessem qual é o país onde houve uma tal reducção immediata de capital. É no entanto é justo que o 4 1/2 por cento se amortize ao par. Algum do 3 por cento chegámos a emittir a 70 por cento, e no entanto nelle a reducção do capital é de 50 por cento.

Devemos tratar os nossos credores na proporção dos sacrificios que elles fizeram.

O titulo especial sem juro, que acompanha a serie, substituindo o 4 1/2 por cento, só é valorizado no momento de ser sorteado. Tem a mesma numeração dos títulos d'essa serie e quando um numero for sorteado, é amortizado o titulo com juro d'esse numero e juntamente o titulo sem juro do mesmo numero.

O orador rectifica em seguida uma allusão do Sr. Mello e Sousa á amortização antecipada dos títulos de divida deferida de 1852. O que se fez foi annullar títulos na posse da Fazenda, que estavam para se lançar no mercado.

Isto é muito differente de antecipar amortização de títulos.

O projecto dá o resultado seguinte: ficar a nossa divida externa reduzida a 50 por cento do seu valor nominal actual.

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10 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Isto nunca se tinha conseguido, porque os nossos credores se oponham terminantemente a isso. É possível que em dezembro ainda não acceitassem; agora acceitaram de bom grado e até da do país que mais se oppunha.

E não pode dizer na que vamos por esto modo beneficiar os titulos. Lembre-se a Camara do que tem succedido com alguns emprestimos realizados para a conversão do 6 por cento, do 5 por cento por 3 por cento.

O 4 por cento á que foi o inicio, a seu ver, dos nossos desastres financeiros.

A unica solução era o typo unico do juro, e depois o premio da amortização.

A concessão é feita dando-se por cada 100, 75 por cento do novo titulo e 25 por cento do titulo especial. Este tem a mesma amortização, mas não tem juro, e como tem tambem a, mesma numeração, quando é sorteado o n.°600, por exemplo, do novo titulo, sae sorteado o que tem juro e o que não tem juro.

Respondendo a uma observação feita no discurso do Sr. Mello a Sousa expõe o orador a forma como foi feito em 1865 o primeiro emprestimo por subcripção publica, para resgatar os bonds do Thesouro de 1862. Estes é que foram resgatados e não ou títulos de 1865.

O que julga necessario deixar bem assente é que se a projectada convenção do Sr. Espregueira representava já um grande melhoramento sobre o que até então exigiam os credores, o actual projecto representa uma enorme vantagem nobre todos ou outros.

Faz, todavia, a justiça de declarar que todos os diversos Ministros se não obtiveram mais, foi porque realmente não puderam.

Enumera em seguida as vantagens do projecto actual mostrando que em nenhum dos anteriores apparace não reduzido numero de exigencias por parte dos credores. No do Sr. Espregueira até se exigia o contrôle no Banco de Portugal para a emissão de notas e não havia a diminuição do capital nominal que só agora se consegue.

Se tivermos juizo, accrescenta o orador, e se não attendermos aos nossos detractores no estrangeiro, este projecto é magnifico. É necessario que se mantenha o que está nelle tal qual. As condições de segurança estão traduzidas sem alteração de uma virgula do que tinha tratado o Sr. Espregueira. O que lá não estava era o § unico. Em face d'elle que perigo pode haver de intervenção estrangeira?

Referindo se depois ao premio, considera-o uma vantagem, porque ella traz ao mercado os titulos que os seus possuidores não queriam vender.

Uma das cousas que verdadeiramente o admirou foi ver a opposição acompanhar com os seus applausos o Sr. Mello e Sousa, quando S. Exa., criticando o projecto, não fazia senão criticar a condição 6.ª do projecto do Sr. Espregueira que para este foi litteralmente transcripto, porque representa o statu quo da divida.

O que está no projecto não representa um vexame; se assim fosse nem elle, orador, o defenderia, nem o Governo o teria apresentado á Camara.

Pelo projecto do Sr. Espregueira, que era melhor quanto a exigencia, do que nem anteriores, e que nem mesmo chegou a ser approvado pelo Governo progressista, os encargos em 1909, de juro e amortização, seriam de 4:930 contos, pelo actual serão em 1909, 4:602 contos; logo ha uma differença em favor do actual projecto de 332 contos

Relativamente no sêllo dos títulos, a ideia do Governo é pagar o sêllo nos países em que elles forem entregues; não tem, portanto, duvida em acceitar qualquer emenda que neste sentido o Sr. Mello e Sousa queira apresentar.

Do projecto que se discute, vê-se que resulta, como já disse, uma enorme reducção no capital nominal da divida e diminuído no juro.

Nenhum perigo ha tambem de que não tenhamos os fundos necessarios para a satisfação dos encargos, mas se, por acaso, essa circunstancia se desse, as Côrtes amanhã poderiam facilmente providenciar.

Em relação a encargos, é incontestavelmente muito melhor do que outros projectos, cuja critica não faz, senão para mostrar como o nosso credito tem melhorado lá fora.

Em 1898 entregaram-lhe um papel com contrôle e agora como vem um papel igual sem contrôle, encontrou os nossos credores inteiramente mudados, tanto assim que o Governo pôde trazer ao Parlamento a proposta que se discute.

Razão teve, pois, para felicitar o Governo, visto que se por um lado as condições que elle, orador, levou para o estrangeiro eram restrictas e concretas, por outro lado os nossos credores, considerando a maneira como a nação tem procedido e como tem pago os seus compromissos, tudo acceitaram de bom grado.

Tem assim o prazer de ser d'esta vez o mensageiro da boa nova, elle que tantas vezes o tinha sido de más novas.

Foram-lhe extremamente agradaveis as referencias feitas pelo Sr. Ressano Garcia e pelo Sr. Arroyo, mas a verdade é que pela sua parte mais fez mais do que cumprir o seu dever como todo e qualquer cidadão faria. O Governo é que merece todas as felicitações, porque soube reatar as negociações com o melhor acerto na escolha do momento opportuno para conseguir o que conseguiu.

Vae terminar, convencido de que conseguiu demonstrar quanto o projecto é util para o país e de que respondeu a todas as observações que sobre elle teem sido feitas.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão quando S. Exa. devolver as notas tachygraphicas).

O Sr. Dias Costa: - Começa por saudar, com a maior sinceridade e enthusiasmo, o seu velho e querido amigo o Sr. Conselheiro Carrilho, verdadeiro modelo de funncionarios, que volta á Camara fazendo de novo brilhar os seus dotes de intelligencia.

Faz suas as palavras que a S. Exa. foram dirigidas pelo Sr. Ressano Garcia.

Prestada esta justa e merecida homenagem ao illustre relator do projecto, congratula-se com a Camara pelo famoso thesouro que S. Exa. descobriu na nossa probidade e na boa vontade de satisfazer os nossos compromissos.

O que não sabe é se elle será valorizavel.

Felicita-se tambem, elle, orador, pela boa nova de que já ha vacaturas no orçamento que ainda, nem sequer, começou a executar-se.

Uma consolação nos deu ainda S. Exa. dizendo que o augmento de encargos é apenas de 916 contos.

Depois fez a comparação entre o convenio, que nem sequer foi apresentado, do Sr. Espregueira, e o actual, para concluir que este é mais vantajoso.

É possivel; mas este augmenta desde já os encargos, quando a condição essencial de um convenio é o adiamento dos encargos; e assim se fazia no projecto do Sr. Espregueira.

Dito isto, passa a analysar o projecto; antes, porem, quer attribuir, como é justo, ao Sr. Presidente do Conselho, a responsabilidade de ter arrastado o debate do campo sereno em que questões d'esta ordem devem ser tratadas, para o campo das retaliações políticas, deixando assim de corresponder á intenção com que o Sr. Beirão abriu o debate.

O mesmo fez o illustre leader da maioria, e esse até foi mais longe, pretendendo transformar a tribuna parlamentar num instrumento de supplicio, no que S. Exa. aliás, se enganou.

Ao entrar na discussão do projecto, açode-lhe ao espirito a lembrança da batalha de Aljubarrota, pagina brilhante que nunca devia ser esquecida, e a alvorada d'esse bello dia, 14 de agosto de 1385. Recorda-se do que a historia nos diz do conselho dado pelo Arcebispo de Braga,

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D. Lourenço, incitando os soldados ao combate, e os combatentes da ala dos namorados diziam: Vero carum factum est.

Elle, orador, diz o mesmo que os companheiros do Arcebispo repetiam: "Verdade, verdade é muito caro este feito"; mas accrescenta: se Deus quiser, ha de ser de bom mercado.

Entrando a seguir na parte positiva do projecto, diz que não pode deixar de dedicar um capitulo das suas considerações ao illustre relator. Nesse capitulo referir-se-ha ao orçamento.

Assim o fez, repetindo os calculos feitos pelo orador que o precedeu acêrca da conversão da divida, mas declara que os não comprehende. A conclusão a que elle, orador, chega pelos seus calculos, é de que o augmento de encargos do projecto não é de 216 contos, mas de 1:124 contos; alem do pagamento dos scrips, sellagem dos títulos e despesas de impressão, etc.

Crê que umas diferenças que encontra nos calculos sejam para a réussite de l'uffaire, e pensa assim, porque todos estão muito contentes comnosco, o que não succede em todas as operações financeiras, porque, ás vezes, não é possível contentar todos, como succedeu com o Banco Ultramarino.

D'esta vez estão todos contentes e são todos nossos amigos.

A totalidade dos encargos, como elle, orador, os calcula, dá-lhe um augmento de 1:714 contos; mas suppondo mesmo que apenas seja de 1:500 contos, não sabe onda é que se possa ir buscar o dinheiro para lhes fazer face; porque, de mais a mais, o Sr. Presidente do Conselho guarda a maior reserva a esse respeito e o illustre leader da maioria apenas fala em stock de títulos, de que, segundo dou a entender, o Governo se aprovisionou.

Mas como? Com que dinheiro? Só se pedir emprestado! E neste caso o stock representa um novo encargo para o país, que ha de pesar sobre o infeliz contribuinte, eterna victima das combinações financeiras.

Em 1892, quando se pensou em salvar o país, encontraram-se duas classes privilegiadas: funccionarios publicos e juristas. Se o privilegio se mantem ainda, já se sabe onde o Governo vae buscar dinheiro.

E certo que o Governo já declarou que nenhuma alteração faria na divida interna; e ainda bem que o declarou, porque se uma nação tem de fazer sacrificios, é necessario que elles sejam impostos a todos por igual.

Apregoa-se, como uma das maiores vantagens do projecto, a reducção do capital nominal; mas se se fizer a conta ao que o Estado recebeu dos titulos que vae converter, ver-se-ha que o país, alem do que devia já aos seus credores, vae entregar-lhes de mão beijada mais 1:000 contos do que devia dar.

Segundo o projecto do Sr. Espregueira, em 1965 nós teríamos só a pagar 2:145 contos, e mais um pequeno supplemento aduaneiro, ao passo que, pelo projecto actual, em 1965 teremos que pagar 4:601 contos.

D'este modo, o projecto, pela forma por que está redigido, não satisfaz ás condições principaes de um convenio-adiamento immediato de encargos e sua diminuição no futuro.

A estes princípios obedecia o projecto do Sr. Espregueira.

Passa depois o orador a examinar se o orçamento comporta mais o augmento de encargos do projecto, que, segundo os seus calculos, é de 1:500 contos, e da analyse que demoradamente faz, resulta que o deficit é aproximadamente de 8:000 contos, porque ha erros de previsão quer na receita, quer na despesa, e a divida fluctuante tem crescido assustadoramente.

Sommados esses 8:000 contos com os 1:500 contos que resultam dos encargos do projecto, acha o orador que o país fica em condições difficilimas, porque não ha dinheiro para occorrer a taes encargos.

Naturalmente, virá então algum outro Governo de salvação publica fazer o mesmo que se fez em 1892, com a differença de ficarmos salvos de vez.

A seu ver, se se acceita este convenio, não ha no país dinheiro que chegue para os respectivos encargos; considera, por isso, um erro a apresentação do actual projecto, negociado lá fora pelo illustre relator, através de todos os dissabores e de todas as amarguras, emquanto no país o Governo fazia a mais escandalosa das dictaduras, na qual o Sr. Ministro da Fazenda tem enormes responsabilidades.

É certo dizer-se que para muitas das despesas se criaram receitas; mas estas deviam ser applicadas a diminuírem o deficit e não para avolumá-lo com novos encargos.

Felizmente, o exemplo não foi seguido por todos os Ministros, e os que o não seguiram não são menos queridos; porque a verdade é que tratando-se de jubileu, e desde que elle é geral, todos os amigos ficam contentes; mas se não chega a todos, aquelles que recebem não agradecem por que attribuem aos seus merecimentos especiaes o facto de terem sido contemplados, e os que não recebem ficam com inveja.

Se o Governo se tivesse mantido dentro de uma administração prudente, correcta e seria, está elle, orador, certo de que o portador da boa nova teria felicitado o Governo com mais razão do que o fez.

Crê ter demonstrado que os encargos que resultam do convenio aggravados pela situação do nosso deficit são incomportaveis, não em si, mas pelo estado do Thesouro e por que não vem acompanhados de um plano financeiro, como succedeu ao Brasil e á Republica Argentina, que, adiando os seus compromissos, conseguiu uma situação

O nosso país está atravessando uma crise economica terrivel, e que se accentua principalmente na vinicultura, na industria algodoeira, na do alcool dos Açores, cortiça e artes metallurgicas, não falando já na nova tendencia dos trusts, que hão de tambem produzir o seu effeito e que já existem no país para o petroleo, para as padarias, e crê que para as carnes.

A par d'isto crescem consideravelmente os preços dos generos de consumo, tornando cada dia mais difficil a vida no país.

Em circunstancias normaes as receitas crescem; mas como a administração é má, crescem tambem as despesas.

Ha quem aconselhe juízo; mas esse conselho, dado num país, que, se tem alguma cousa que o torne distincto, é exactamente a falta d´essa qualidade que deu a supremacia á Inglaterra, só pode ser pratico se se organizar uma fiscalização, um controle nacional dos actos do Governo, pela juncção da contabilidade publica com o Tribunal de Contas.

Essa revisão podia e devia ser confiada ao Sr. Carrilho que tem altissima competencia para isso e sabe bem, como ninguem, onde estão os pequeninos furos por onde se escoa o que está dentro d'este grande reservatorio chamado orçamento.

O que é preciso é uma tutela nacional; é que o poder legislativo esteja sempre acima do poder executivo e não dependente d'elle.

Tem elle, orador, sido muitas vezes accusado de faccioso; não lhe fica, portanto mal, tratar um pouco de política, que sempre tem utilidade, porque o país ouve ralhar as comadres e descobre as verdades.

A orientação da política regeneradora é tal, que o Sr. Presidente do Conselho, ainda mesmo quando se defende, ataca.

A opposição progressista tem dado o nobre exemplo de não criar embaraços ao Governo quando se trata de ques-

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tões internacionaes e dos grandes interesses da nação. Está convencido de que o Sr. Presidente do Conselho, apesar de todo o seu facciosismo, há de ser o primeiro a reconhecê-lo; mas isso não impede que ella exija a liquidação de responsabilidades; não impede que ella diga perante o país, que quando o Sr. Hintze Ribeiro accusava em 1898 o Ministro da Fazenda de então, de querer introduzir um novo regime financeiro o principio da consignação, viu-se depois obrigado a mudar de opinião.

A seu ver a maior parte das perguntas feitas pela opposição parlamentar não teve resposta; não obstante desejaria muito que o Sr. Relator dissesse se não haveria tambem neste acordo com os credores estrangeiros alguma clausula verbal, em virtude da qual, depois de convertido em lei este projecto, haja alguma troca de correspondencia outro as chancellarias portuguesa e estrangeiras da qual resulte ficar este convenio com a natureza de de um facto internacional.

Isto é que é preciso dizer e saber-se.

Pela sua parte, declara não poder votar este projecto, e nesse voto é acompanhado pelo seus collegas da opposição parlamentar. Não significa elle, de maneira nenhuma, que a opposição não considere, como uma necessidade urgente, o regular a nossa situação com os credores externon; mão entende que essa regularização deve ser feita em termos taes que, respeitando os interesses legitimos dos credores, se atttenda, tambem, aos interesses da nação, não se devendo tomar compromissos dos quaes possam resultar soffrimentos ainda maiores do que aquelles que já temos tido.

Para isso é indispensavel, suppõe elle, orador, que haja uma fiscalização interna nacional, perante o poder executivo, independente do legislativo; para isso é indispensavel que todos os homens do Governo se compenetrem de que, para fazer boa administração, basta cumprir a lei.

Quando um Governo proceder d'esta forma, e não fizer dictadura, poderá apresentar-se, de cabeça erguida, perante os credores, e terá o direito de fazer com que as suas reclamações sejam attendidas.

Faça-se, muito embora, um convenio; mas faça-se por fórum que a nação portuguesa fique com ao honras da guerra, e que saiamos d'essa situação por forma que todas as nações fiquem reconhecendo que todos nós procedemos com hombridade, e que esse é o lemma que havemos do adoptar, sempre, na nossa administração futura.

(O discurso será publicado na integra quando S. Exa. o restituir).

O Sr. Alvaro Possollo: - Sr. Presidente: cabe-me a honra de responder ao illustre Deputado e meu amigo, Sr. Dias Costa. Fa-lo-hei, conforme o conselho de S. Exa., nem preoccupações de interesses politicos de qualquer especie, sem o menor resaibo de retaliações partidarias; não deixarei, todavia, de notar que S. Exa., ao passo que me dava um tão prudente conselho, em curto prazo derivava o seu discurso para o irritante caminho das retaliações facciosas-

Eu não seguirei, porem, semelhante exemplo porque, se ha assumpto que eu, do ordinario tão afastado por temperamento e por proposito das lutas apaixonadas d'esta Camara, entendo dever ser cuidadosamente arredado do campo inconsiderado das paixões, é este que se discute, e que, pela sua grandeza, pelos altissimos interesses que envolve, tem de ser e deve ser considerado acima de todas as conveniencias partidarias (Apoiados), longe e acima de todos os interesses de facção. (Apoiados).

Não é uma questão banal de partidarismo, porque é uma questão de honra, uma questão de decoro nacional, e que, sob este aspecto, mais ainda, do que no seu ponto de vista financeiro, tem de ser calmamente apreciada e patrioticamente resolvida pelo Parlamento Português, em harmonia e de plena conformidade com o brio e a dignidade da nação. (Apoiados}.

É por isso que ou não acompanharei o illustre Deputado na analyse dos numeros orçamentaes com que S. Exa. occupou a principal parte do seu discurso, e pelo qual eu felicito a S. Exa. e á Camara, nem tão pouco o seguirei nas suas picantes considerações de natureza politica, pois que o meu pensamento, o meu principal intuito, tendo ouvido um dos mais graduados membros d'esta casa do Parlamento asseverar, com toda a auctoridade da sua palavra, que do convenio resultaria uma situação dolorosa o aviltante para a nacionalidade portuguesa, o meu principal intuito, repito, ao entrar neste debate, é assegurar á Camara e ao país, com a segurança que me dá a consciencia de que sei ser português, amigo da minha patria, que me sinto tão honrado votando o projecto em discussão, quanto vexado mu sentia perante a situarão de insolvencia em que ha annos agora temos vivido, que outra cousa não era o regime em que nos encontravamos desde 1892 até, agora.

É duro confessá-lo, mas é indispensavel dizê-lo: o que somos nós hoje, financeiramente e sob o ponto de vista do credito, senão um país absolutamente lançado á margem, sob o vexame do um profundo o vergonhoso abandono por parte de todos os mercados financeiros, de forma que todos esses mercados se nos encontram cerrados e nós votados a uma morte proxima por inanição, faltos d'estes elementos essenciaes que constituem todo o trabalho moderno, o capital e o credito; faltos d'estes factores essencialissimos para continuarmos rasgadamente no caminho amplo da civilização e do progresso?

Disse hontem um dos illustres Deputados, que por parte da minoria impugnou o projecto em discussão, que precisamente para o renascimento do nosso credito careciamos de não mais levantarmos dinheiro por emprestimo, sendo este um dos principaes fundamentos do seu voto contrario ao convenio.

Mas isto, Sr. Presidente, equivaleria a fecharmos com uma absurda barreira o cyclo dos nossos melhoramentos materiaes, sob a intransigente e infecunda formula: nem uma despesa a mais. (Apoiados).

Pois, porventura, nós, de quem ha pouco o meu amigo Pereira de Lima disse que nos achavamos atrasados de 25 annos, realizámos já tudo quanto o indefinido progresso nos poderia ter dado? Disse acaso o progresso, a poder dizê-lo, a sua ultima palavra em meio da nossa, acanhada civilização?

Felizmente que o Sr. Dias Costa se não orientou neste acanhado ponto de vista; nem podia S. Exa. fugá-lo, porque, como funccionario distinctissimo que é do Ministerio da Marinha (Apoiados), sabe bom o quanto ha por fazer nas nossas atrasadissimas colonias.

Pense a Camara quanto ellas são, politica e economicamente, o eixo e a base de toda a vida nacional; penso quanto ellas constituem a estrada real do futuro no caminho da nossa regeneração e progresso; veja como ellas definham e se sentem avassalladas perante a concorrencia de vizinhos audaciosos e ricos, e diga-me se é situação e se é viver, digno de um povo que se preza, esta situação que nos esmaga, este viver que nos afoga na absoluta impotencia de realizarmos qualquer cousa de proveitoso e de grande. Em contraposição, veja-se todo o ardor no trabalho, toda a intensidade de acção, toda a magnificencia dos resultados obtidos pelo Estado Livre do Congo!

E alcançados como, Sr. Presidente?

Porventura a golpes de discursos no Parlamento de Bruxellas? A golpes de decretos do seu poder soberano, ou por meio de inofensivas portarias dos seus agentes subalternos?

Não, Sr. Presidente, tudo á força de dinheiro, a golpes de milhões e milhões de francos, que em curto prazo realizaram a maravilha de transformarem um país inhospito,

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hostil e absolutamente infecundo, na chave já hoje, e em breve, se lhe não acudirmos com providencias que serão, mais do que uma legitima defesa, um indeclinavel dever do nosso patriotismo, no interposto unico de quasi todo o commercio do occidente africano. (Apoiados).

É, pois, economicamente, falsa, absurda e anti-patriotica a ideia de que poderemos viver sequestrados do mundo do credito, a ideia de que poderemos manter-nos nesta situação vexatoria e infecunda de cruzarmos os braços em frente aos problemas mais capitães da vida nacional, faltos, como disse, dos mais rudimentares principios de todo o trabalho e progresso moderno. (Apoiados}.

Será real o prognostico do Sr. Dias Costa asseverando que por este convenio nós caminhamos inevitavelmente para uma crise irreductivel, mas não é menos real e certo, Sr. Presidente, que nada ha mais desolador e conducente a essa crise -porque quando ao depois, em face ao inevitavel descalabro, quisermos variar de processos, será tarde já - (Apoiados) nada ha mais desolador, repito, do que esta acanhada orientação que para ahi se vae seguiu-o, do que esta ideia improgressiva e archaica de condemnarmos tenazmente, e guand même, tudo quanto possa implicar uma despesa nova, sem a preoccupação salutar de buscarmos antes saber que productivo multiplicador de ineditas riquezas poderá, ser a nova despesa que ás cegas condemnamos. (Apoiados).

Foi, Sr. Presidente, um proposito semelhante, uma cegueira igual, que precipitou o mais tragico acontecimento da historia moderna. Foi uma engenhosa operação financeira, conscienciosamente planeada por M. de Calonne, e mais tarde denunciada á assembleia dos Notaveis por esse grupo de insignificantes, a que Lafayette presidia, que eu o rebate da Revolução Francesa, e pode asseverar-se, num ponto de vista seguro de critica historica, que foi para evitar a liquidação aliás prudente e justa, de um deficit de 98 milhões - pois a tanto visava aquelle plano - que a Revolução ensanguentou a França, devorando-lhe não apenas tão diminuta somma, mas levando-lhe, com o mais generoso sangue dos seus filhos, 9 milhares de milhões de francos, ao mesmo tempo que levava o pavor e o assombro á consciencia universal. (Apoiados). O que fez dizer áquelle extraordinario bom senso do que foi Bivarol: que o espirito dos homens economicos conduziria a França á ruina, da mesma forma que os partidarios da vida á bon marché a reduziriam a morrer de fome. Singular paradoxo, que tem todo o caracter de uma estranha prophecia, e que para nós representa no presente momento todo o ensinamento de uma profunda lição.(Apoiados}.

O Sr. Dias Costa entendeu apreciar o projecto em discussão sob o ponto de vista restricto dos seus encargos presentes, e não quis S. Exa. ver que não é só o nosso interesse financeiro e o nosso futuro economico que pelo convenio nos serão salvaguardados, e que é a propria honra, o proprio decoro nacional, que por elle nos vão ser redimidos. (Apoiados}.

Nós hoje, Sr. Presidente, não passamos de um país insolvente, avexado perante a consciencia do mundo e sob a suspeita - e quanto fundada será ella no conceito de tantas victimas que fizemos - de dolo e de má fé.

Feito o acordo, seremos sim um país concordatario, mas já poderemos então levantarmo-nos altivamente, erguermo-nos de pé em face ás demais nações, e bradarmos com justiça que toda a suspeição de macula e de culpa desappareceu em absoluto da nossa passada fallencia. (Apoiados}.

Pois é, Sr. Presidente, em presença d'este facto de capitalissima importancia, e de um tão alto significado moral (Apoiados) que tambem o Sr. Dias Costa vem hoje reeditar no Parlamento a atoarda das suppostas contradições entre passadas palavras e os actos presentes do nobre Presidente do Conselho! (Apoiados).

Já o illustre chefe do Governo, com aquella nobreza de palavra que faz de S. Exa. não apenas o maior orador que conheço, mas o mais extraordinario parlamentar que eu poderia imaginar (Apoiados), mostrou a absoluta inanidade de semelhantes accusações. (Apoiados).

Mas pondere a Camara a situação que, politica, economica e moralmente, nos vae ser criada com o novo convenio, liquidando-se uma situação que era affrontosa para a dignidade nacional (Apoiados), por meio de um acordo honrada e livremente consentido por todos; pense no enorme alcance moral de vermos terminada uma questão tão cheia de perigos como vergonhosa de incidentes, que nos desprestigiavam, e diga-me se vale a pena andar-se rebuscando nos archivos parlamentares essas chamadas contradicções do Sr. Hintze Ribeiro, e se esse apparente repudio de palavras de hontem, que não eram mais que opiniões de occasião, que tinham a justificá-las a opportunidade que as ditou, não representa antes toda a grandeza civica, todo o alto relevo moral de um homem de Estado (Apoiados), que não duvidou sacrificar aquillo a que poderia chamar-se a sequencia das suas ideias a esta cousa bem mais alta, e em que S. Exa. tem sido sempre nobre e indefectivelmente coherente, que é o seu extremo amor para com o país, e o cumprimento honrado e zeloso dos seus deveres para com o Rei e com a Nação. (Apoiados}.

Mas onde está o nosso thesouro de Spandau? pergunta o Sr. Dias Costa; onde iremos buscar recursos para occorrer aos encargos do convenio? interroga S. Exa.

Iremos buscá-los, Sr. Presidente, a toda a parte onde possamos encontrá-los: a uma boa e cuidada administração primeiro, ao imposto, se necessario, e sobretudo ao desafogo financeiro, que do proprio convenio nos resulta. (Apoiados).

Affirma o illustre Deputado que no Orçamento do Estado se não encontram os meios precisos para acudir a esses encargos, e que d'ahi poderá derivar-nos uma nova e mais embaraçosa fallencia.

Não existem decerto, nem podiam existir, porque o Orçamento não foi feito na previsão d'esses encargos (Apoiados); mas, de resto, Sr. Presidente, este argumento não é digno de nós, não tem direito a apresentá-lo um país que fez a reducção dos juros da sua divida com um orçamento da despesas de pouco mais de 40.000:000$000 réis, e que successivamente o tem aggravado com crescentes encargos até á enormissima somma de 56.000:000$000 réis! (Apoiados}.

Como pode, pois, sinceramente dizer-se, allegar-se honradamente perante os credores, que não temos meios para cumprir o acordo, nós que para tudo temos tido dinheiro, e que desde 1392 até agora temos visto augmentar-se as despesas do Estado em tantos milhares de contos de réis? (Apoiados}.

Mas se o argumento, Sr. Presidente, embora aviltante e depressivo da dignidade nacional, é logico e é valido, porque o não levamos, nesse caso, ás suas ultimas consequencias, e porque é que ainda hoje damos alguma cousa aos nossos credores, desde o momento em que temos sempre vivido e continuamos vivendo num regime seguido de deficits orçamentaes?

Nós fizemos, Sr. Presidente, a reducção dos juros da divida, em 1892, a braços com um deficit verdadeiramente esmagador; e todavia o Sr. Dias Ferreira, apesar de toda a audacia do seu decreto de 13 de junho, nem sequer se lembrou de recusar ao nosso credor o terço, que aliás lho garantiu, do juro dos seus creditos.

Criámos o regime de 1893, embaraçados ainda numa situação largamente deficitaria, e entretanto o Sr. Fuschini não duvidou em offerecer e dar aos portadores da divida externa, a mais do que já recebiam, uma participação, que tem sido valiosa, nas receitas das alfandegas, e não occorreu então a S. Exa., como decerto não occorreria ainda hoje, que vivendo nós sob a miseria de um orçamento com deficit; não deveriamos dar-lhes mais, nem

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tanto, quanto lhes a segurança aquella violenta medida do seu antecessor.

Temos seguido até agora nesse depressivo regime, augmentando successivamente as despesas do Estado, e sem que o descaroavel deficit desaparecesse jamais das contas do Thesouro.

Pois nunca, Sr. Presidente, a permanencia d´este monstruoso pesadelo das nossas finanças, foi julgada razão sufficiente, ou argumento honrado para solver com elle compromissos sagrados do Thesouro Português.

Mas, mais ainda, Sr. Presidente.

Quando a nossa situação financeira se definiu, em 1892 e 1893, o encargo cambial era bom mais moderado do que ao depois se tornou, subindo por vezos a proporções tão onerosas que o cumprimento de semelhantes encargos se tornava em extremo incomportavel; pois a ninguem occorreu, nem ainda nestas circunstancias verdadeiramente afflictives, uma allegação semelhante para nos exonerarmos das nossas obrigações para com os credores - allegação que aliás estaria na logica dos argumentos, que se oppõem á ultimação do acordo - antes a mais constante preoccupação dos nossos Governos foi sempre a de procurarem solicitamente e a todo o custo e ouro com que honradamente satisfizessem sem os compromissos do Thesouro.

Que valor tem pois uma semelhante allegação?

Eu noto com pasmo, Sr. Presidente, que nós tratamos os nossos credores como um vil gado, que para pouco conta. Esquecemos a nossa situação de devedores, esquecemos sobretudo todo o humilhante da situação de um devedor remisso, e procedemos para com elles, como se fossem elles proprios que nos devessem (Apoiados), dando-nos a altitude de que qualquer concessão, que se lhes faça, tem o caracter de uma dadiva generosamente graciosa.

Pois da minha parte o que eu vejo, e o que todos devem ver de um alto ponto de vista de moral social (Apoiados), é que emquanto no Orçamento do Estado existir um saldo, o saldo existe, entre os encargos do convenio e as receitas totaes do Thesouro, ahi se encontra a torre de Spandau, o thesouro intangivel para pagar os encargos do convenio, porque ha pouco perguntava o illustre Deputado o Sr. Dias Costa, pois que a nossa mais trivial obrigação, que é tambem o mais sagrado dos nossos deveres, é honrar os compromissos tomados, soffra quem soffrer, dô-a a quem doer. Isto, que é rudimentar na moral individual, trivialissimo na vida de todo o individuo que se preza, e preza acima de tudo a honra do seu nome, e a dignidade de seu credito, porque não ha de ser por igual imperativo pelo que respeita ao dever e á moral de uma nação?

Pois se nas receitas do Estado ha de sobra com que acudir ás necessidades do convenio, embora nos falte depois para despesas de outra natureza, porque ha de ser o credor, que confiadamente se nos entregou, dando-nos com os seus capitaes, e com elle só, a faculdade de realizarmos a nossa evidente melhoria economica; porque ha de ser elle que neste fundo descalabro das nossas finanças ha de soffrer o maximo das reduções, que a tantos impulsos, e porque não se procura antes, dedicada e patrioticamente, na administração commedida dos dinheiros publicos, na applicação regrada e sobria das receitas do Estado, ao sacrificio equilibrio de todos, a maneira franca e honesta de resolver com honra suprema causa da nação?

O convenio, como nos é proposto, representa, evidentemente, um beneficio para nós, porque traduz para o nosso credor o sacrificio de 50 por cento dos seus legitimos interesses; e eu pergunto á consciencia de quantos me esctuam, e que teem de sentenciar neste pleito, quem é de entre nós que, para acudir ás terriveis consequencias da crise, que desde 1892 até agora nos tem victimado, se tenha sentido sacrificado em 50 por cento das suas receitas tambem?

Como é então que estranhos, que nada tiveram com os desatinos da nossa administração, tão apregoados nesta casa do Parlamento, nem com os desregramentos governativos, de que tanto soffreu a nossa situação financeira, que nada lucraram com os nossos progressos materiaes, nem com o palpavel desenvolvimento da riqueza do país, e que só dos seus capitães nos advieram, como é, repito, que estranhos, que confiadamente entregaram o seu dinheiro á guarda da honra da nação, estranhos que nada nos devem e aos quaes tudo devemos, hão de ter que supportar, neste negro inventario das nossas miserias, uma partilha bem mais onerosa do que aquella que nos coube a nós, que somos portugueses, cumplices d'esses desvarios? (Apoiados).

Oh! Sr. Presidente, ou não ha logica nos factos, um espirito de verdade nas nossas consciencias, ou quer a força implacavel da justiça, que nós approvemos o projecto em discussão, com o mais intenso jubilo de patriotas, e direi ainda sem este falso pudor de um patriotismo convencional, com o mais acendrado reconhecimento á generosa boa vontade dos nossos credores para connosco. (Apoiados).

E depois, Sr. Presidente, para responder a esta parte, que é a essencia do discurso do Sr. Dias Costa, vejamos que, nem financeiramente, ha motivo para os alarmes, que S. Exa. manifestou, em face dos encargos que de convenio nos advirão, porque o encargo real e effectivo d'este convenio, se é que algum existe, está bem distante do seu encargo apparente, e muito mais longo ainda do pensimimo dos calculos, que S. Exa. aqui apresentou.

Qual é esse encargo?

Pelo relatorio que acompanha a proposta ministerial vé-se que para já é de 916:000$000 réis, calculado apenas o supplemento das alfandegas em quantia identica á participação dada aos credores externou no ultimo anno.

O Sr. Dias Costas clamou contra esta forma de calou lar, porque, disse S. Exa., esses calculos não eram feitos nos termos que o regulamento da contabilidade publica preceitua para as previsões, orçamentaes. Mas não se trata, Sr. Presidente, da confecção de um orçamento, e simplesmente e apenas de um calculo sobre os resultados financeiros e as consequencias economicas de uma medida estranha áquelle diploma. (Apoiados).

E de resto, Sr. Presidente, como as receitas aduaneiras se não encontram immobilizadas, antes tendem dia a dia a um natural e progressivo crescimento, de ver é que todo o calculo, que não entre em linha de conta com este elemento, carece evidentemente do uma intelligente segurança. (Apoiados).

A que veem, pois, Sr. Presidente, os preceitos, de applicação restricta do regulamento de contabilidade publica, que o Sr. Dias Costa nos veiu relembrar?

Os encargos, pois do convenio, repito, nos termos em que foram calculados pelo Sr. Ministro da Fazendo, calculos que aliás não vi contestar validamente, são de réis 916:000$000. E a esta somma concordo eu com o Sr. Dias Costa que deve accrescer o encargo resultante das despesas proprias da conversão, o qual, no dizer do S. Exa. não deve representar-se por menos de um onus supplementar annual do 110:000$000 réis. E temos assim que o encargo total se cifrará no dispendio annual da l .026:000$000 réis. Mas este é o encargo de hoje, e que em curtos annos, seria excedido pelos encargos da amortização, como ao presente funcciona, e tanto que em 1949-1950 o onus se tornaria maior pelo actual regime do que pelo plano do convenio.

Disse o Sr. Dias Costa, comparando os encargos do regime proposto com os do convenio Espregueirae eu não quero comparar um e outro para evitar, como me propus todo o caminho de acerbas retalições - disse S. Exa. que este era mais suave no presente momento, tornando-se successivamente oneroso, ao invés do que occorre no plano do Sr. Ministro da Fazenda, em que o encargo será suc-

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cessivamente decrescente. Ainda bem que assim é, Sr. Presidente.

Eu ouvi sempre criticar tanto as operações financeiras, que repetidamente se faziam, dizendo-se que eram encargos que iamos lançar desapiedadamente sobre o futuro, que é de plena justiça, que nós, os cumplices de tantos desvarios que a esta situação nos conduziram, tratemos de sacrificar-nos pelas gerações que hão de succeder-nos e que são as dos nossos filhos.

E já aqui conviria perguntar, como o bom rei Henrique, se a coroa de França não vale bem uma missa; isto é, se não vale excessivamente o encargo annual de l.026:000$000 réis o resgate da honra e do credito da nação, e o caminho franco e aberto na estrada, que sob pena do morte não podemos abondonar, da civilização e do progresso. (Apoiados).

Mas, deve ainda calcular-se que o supplemento das alfandegas, em que hoje o credor compartilha, deve inevitavelmente crescer, não só com o natural incremento da nossa população, das nossas necessidades, e, consequentemente, do nosso commercio externo, como com o presumivel aggravamento das varias taxas de importação, sendo bem de crer que um periodo assás curto, não mais, talvez, de 12 ou 15 annos, baste para assegurar ao credor, no regime existente, tanto ou mais do que pelo convenio vamos dar-lhe.

Pois não é visivel, Sr. Presidente, que um país, cujas importações subiram de 1891 a 1900, em 10 annos, portanto, de 39.000:000$000 a 59.000:000$000 réis, isto é, um augmento de 50 por cento, embora em luta e a braços com uma crise de ouro intensissima, deixa com segurança prever, perante um tamanho coefficiente, que em curto prazo as receitas d'aquella proveniencia subirão em extremo? (Apoiados).

Não é, pois, de uma previsão trivialissima, e tão trivial como segura, que esse encargo, perante o qual tanto se atemoriza o forte espirito do Sr. Dias Costa, será real e rapidamente attenuado pela majoração de receitas, que do maior rendimento das alfandegas vos provirá, e em que o credor externo deixa de compartilhar? (Apoiados).

Mas, emfim, Sr. Presidente, isto é apenas um calculo sobre possibilidades, e alguem haverá tão meticuloso em escrupulos de contabilidade, em cujo espirito elle não possa dominar.

Ha, porem, attenuações, tanto ou mais importantes do que esta, que me dão a consciencia, e que hão de levar á consciencia de todos a certeza integral de que a ultimação d'este acordo é, no ponto de vista financeiro, não a ruina que se apregoa, mas um beneficio positivo e tangivel. (Apoiados).

A situação de descredito que resultou da nossa suspensão parcial de pagamentos, trouxe-nos, como já disse, a vexatoria e perigosa impossibilidade de realizarmos, lá fora, quaesquer operações de credito, não só porque a suspeição, o interdicto financeiro que sobre nós impende, tornariam a operação arriscada para a entidade que a contratasse, mas, e principalmente, porque no-la frustraria a impossibilidade de cotarmos novos titulos nas bolsas europeias.

Claro está que me refiro a qualquer operação quantiosa e em grande, e não a estas pequenas operações a curto prazo, feitas sob caução de valores de primeira ordem, porque para essas, como para todos os casos desesperados da vida: on trouve toujours l'arbre où se pendre. (Apoiados).

É duro confessá-lo, mas é a triste verdade das cousas, Sr. Presidente; e, porque o seja, é que eu entendo e altamente o proclamo á Camara e ao país, que é forçoso, que a todo o custo ponhamos termo a tão deprimente situação. (Apoiados).

E não ha sacrifIcio que não seja um bem relativo, não ha esforço que não represente um allivio, difficuldades que se não volvam numa redempção, quando se trata, para nós, que nós prezamos de ser portugueses, d´esta suprema cousa, que se chama a honra e a dignidade nacional. (Apoiados).

Mas, seguia eu na prova, que é a prova real da verdade, de que o encargo que do convenio nos derive, não vae ser no Orçamento do Estado um onus a maior.

Com effeito, Sr. Presidente, restabelecido o nosso credito, illibada a nossa interdicção financeira, ha uma operação, aliás facil de executar-se, tão facil como larga de beneficios, que desde logo se nos propicia. É a de uma conversão geral do emprestimo dos Tabacos.

E que ha dentro d'esta operação, Sr. Presidente? Vejamos.

Sabe a Camara que em numeros redondos o encargo annual de juro e amortização d'aquelle emprestimo é de 14.500:000 francos.

Ora, a annuidade correspondente aos encargos de um emprestimo da quantia actualmente em divida, ou sejam 40.600:000$000 réis, e com a prorogação apenas do prazo da amortização a 75 annos, seria de 10.500:000 francos, e, portanto, nesta operação, que aliás não representaria um novo emprestimo, porque o montante em divida subsistiria identico, obteriamos desde logo uma cessação annual de encargos na importancia de 4.000:000 francos.

E se ainda pudéssemos alcançar, o que se me afigura facil, desde que as obrigações em curso sustentam firmemente uma cotação acima do seu par, uma pequena reducção na taxa do juro, teriamos por esta simplissima forma obtido uma compensação equivalente aos encargos totaes do convenio. (Apoiados).

E é de ver-se, embora me não dispense de o declarar formalmente, que uma operação semelhante em nada implicaria a renovação do actual contrato do exclusivo dos tabacos, ou a sua permanencia alem dos prazos legaes, ficando elle de todo e absolutamente livre para futuras adjudicações, conforme melhor convenha aos interesses do Thesouro.

Vê-se, pois, como asseverei, que o convenio, nas suas consequencias financeiras, longe de ser um onus incomportavel como o Sr. Dias Costa assevera, é antes um beneficio positivo e real.
(Apoiados).

E isto, pelo que respeita a operações arithmeticamente calculaveis, pois que, se entrarmos em linha de conta com os ponderosos beneficios que devem resultar-nos da melhoria cambial, beneficios que o illustre Deputado contesta, mas que são incontroversos, desde que o convenio nos desafoga financeira e economicamente, e nos não força, como acaba de ver-se, a uma exportação de ouro maior para o serviço da nossa divida, se entrarmos, repito, em linha de conta com tamanhos beneficios, pode sem duvida garantir-se, a coberto de falsos optimismos, que é esta a mais segura, proficua e de maior alcance, de todas as operações de que reza a historia financeira do país. (Apoiados).

Disse o illustre Deputado que não comprehendia como, dentro da lei economica da offerta e da procura, tendo amanhã de se exportar uma maior quantidade de ouro, por virtude das necessidades do convenio, houvesse melhoria na situação cambial.

É o erro do raciocinio de S. Exa.; porque evidentemente, como creio ter demonstrado, nós não teremos de exportar para occorrer ás exigencias do convenio, nem uma libra a mais do que ás que actualmente exportamos.

Em resumo: o convenio implica para nós um encargo a maior de 1.026:000$000 réis, mas por elle cessa o supplemento, que pelas alfandegas davamos á divida externa, e cujo crescimento é de segura previsão; por elle se melhora a nossa situação cambial, desafogando-se parallelamente a economia publica e a situação do Thesouro, pelo convenio, emfim, se nos facilita uma operação financeira,

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dentro da qual encontramos precisamente todos os recursos necessarios á satisfação dos respectivos encargos, operação que sem elle jamais poderiamos realizar, dado o nosso actual divorcio com os mercados externos, dada a interacção financeira, a que o nosso descredito nos votou; e, portanto, este acordo, perante o qual tantos espiritos se apavoram, longe de ser para nós, como disse, um incomparavel encargo, é antes a medida de mais largo alcance, e o ais alto serviço financeiro, de que tem beneficiando o Thesouro Português. ( Apoiados)

E não atemoriza, nem me preocupa sequer, a circumstancia do a esse acordo devermos consignar o rendimento das alfandegas; o que não comprehende é que seja o devedor em falta, o devedor remisso, e que violentamente embrulho os seus credores de boa fé, quem tenha direito a discutir e recusar-lhes justas e sufficientes garantias que os mantenhas, e lhes assegurem a nossa solvabilidade, em meio das suas prevenções contra um passado, que nos condemna e de que lhes resultou a ruina, e de um legitimo receio por um futuro, de que infelizmente aquelle passado nosso não pode ser um seguro fiador ( Apoiados).

E tampouco comprehendo esses argumentos, que numa revoltante uma fé para ahi se fazem correr, no proposito, acaso, de levar o panico ás classes trabalhadores, e com o panico o tumulto e a desordem ( Apoiados); argumentos com que falsamente se pretende insinuar, que d´essa consignação de receitas resultará uma situação de mal-estar e de perigos para a nossa vida industrial. Perigos de que?

Perigos porque, Sr. presidente?

Perigos de que ? Perigos porque, Sr. Presidente?

Pois onde está a garantia d'essas industrias se não na nossa pauta, fundamentalmente proteccionista, e, portanto, em que mais está, Sr. Presidente, do que na manutenção ou aggravamento dos actuaes direitos, que aliás se podem dizer já em grande parte prohibitivos, e em que é que pode, pois, o interesse do credor collidir com o nosso proprio interesse e com o do nosso incremento industrial?

De resto, Sr. Presidente, qual foi o Governo, que por esta forma ousou já offender o trabalho nacional, qual o que se sentirá com forças para fazê-lo, e qual, portanto, a difficuldade que por este lado aos possa advir do convenio? (Apoiados).

Não a comprehendo, nem a alcanço sequer.

Oh, Sr. Presidente, ou comprehendo que se agite a consciencia ou insconsciencia das multidões, quando para as conduzir, revoltas embora, pelo caminho recto de uma reivindicação legitima, ou da suprema causa da honra e do direito da nação; que nos offusquem, porem com o prisma de uma ideia falsissima, que lhes conturbem a conciencia com a suggestão de uma offensa, que não existe, quer para os nossos interesses materiaes, quer para os altissimos melindres da dignidade publica, que lhes desvairem as paixões do patriotismo, que devem ser nobres, com uma especulação de baixa politica, que é sempre repugnante, constitue um attentado tão revoltante contra os mais respeitaveis interesses da patria, que ao governo cumpre reprimi-lo por todas as formas, mesmo as mais violentas. ( Apoiados).

Pois, pelo que me respeita, Sr. Presidente, confesso sinceramente á Camara que, pelo nosso proprio interesse e por bem da dignidade nacional, eu não desejaria o acordo sem semelhante clausula.

Qual o perigo d'ella? Não pagarmos amanhã? É o unico, mas se o é, tambem a razão por parte dos credores, que nela reclamam é fatal, simples e irrespondivelmente unica.

E onde existe o attentado á dignidade nacional? Pois não temos nós a receita dos tabacos consignada a um emprestimo, não temos tido a receita dos phosphoros por igual consignada, a supprimentos do Thesouro? Qual é pois o maior melindre, no ponto de vista da dignidade publica, da consignação actual? (Apoiados).

Mas não é só entre nós: a Austria e a Allemanha não tiveram porventura emprestimos tambem com condignações especiaes, consignações em que entravam os bens do dominio do Estado, as salinas, receitas aduaneiras, etc.?

Sem duvida que sim, e se o não fazem já hoje é porque a seriedade das suas finanças, a grandeza do seu credito dispensa em absoluto essas garantias supplementares.

Diga-me agora a consciencia da camara se da nossa parte se pode dizer altivamente o mesmo. (Apoiados).

Mas eu desejo, repito, essa consignação, se ella implica para nós um perigo, se algum dia deixassemos de pagar aos nossos credores, porque o que eu sobretudo quero é que semelhante desdouro jamais só repita nas paginas da nossa historia financeira. (Apoiados).

Trar-nos-ha o cuidado de todos os dias, a preocupação de todos as horas, o receio pungente de uma presto eventual?

Ainda bem que assim será, porque a braços com este mesmo, em que parece nos esgotamos dia a dia, terá por ventura a grande virtude de nos criar uma alma nova, apaixonando-nos com o pensamento de zelarmos com honra a dignidade da nação, um luminoso ideal nacional, que sempre nos faltou, em meio e na sombra dos passados dos fallecimentos. (Apoiados).

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi cumprimentado por todos os Ministros presentes e maioria).

O Sr. João Pinto dos Santos: - Começa por ler a seguinte moção:

A Camara, reconhecendo que o projecto em discussão nos impõe encargos que, na conjuntura actual, não podemos satisfazer, continua na ordem do dia. = João Pinto dos Santos.

Continuando, diz que lhe cabe a honra de responder a um dos mais distinctos oradores d'esta Camara, não só pela sua palavra, mas pela educarão fina do seu espirito; nas deve accrescentar que se, propositadamente, procurasse um orador, que precedendo-o, mais facilitasse a sua tarefa, não encontraria ninguem como S. Exa.

Quer S. Exa. que esta questão seja tratada com toda a imparcialidade; quer que não se lhe ponha a mais pequena nota partidaria; mas antes do S. Exa. o dizer, já estava na consciencia d'elle, orador, tratar da questão no renamente, sem a mais pequena paixão partidaria, unicamente com a paixão patriotica, como homem sincero, que procura bom servir o seu país, e que entendo dever estar nesta Camara, para se oppor a todas a medidas, que, a, seu ver, possam ser prejudiciaes ao país.

Não se propõe mostrar as contradicções do Sr. Presidente do Conselho, por mera política; não alludirá, tambem, a algumas incoherencias do discurso do Sr. Possollo; limitar-se-ha a demonstrar que o projecto do convenio não satisfaz ás condições a que o Sr. Presidente do Conselho quis attender.

Disse S. Exa., quando discutiu a proposta apresentada em 1898, que um convenio deve satisfazer ás seguintes condições: não offender a dignidade da nação, estar em harmonia com as circunstancias do Thesouro, e affirmar aos portadores dos títulos da divida publica a satisfação possível do nosso credito.

Satisfaz o actual projecto a essas condições? A resposta a esta pergunta está noutro brilhante discurso do Sr. Presidente do Conselho, que o orador lê á camara.

Como se pode approvar um convenio como o que se discute, quando se reconhece, de antemão, que nós não podemos cumpri-lo, porque as condições do agio do ouro podem collocar-nos em condições de faltar á nossa pala-

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vra, sendo então obrigados a confessar, ou que fomos levianos ao negociá-lo, ou negociámos de má fé?

Apparece á Camara este convenio com a forma de uma auctorização; mas as auctorizações estão tão desconsideradas nos ultimos tempos, que se torna necessario entrar em vida nova. Se o Parlamento quer entrar num caminho serio e honrado, não deve, por um acto internacional, adoptar uma formula de auctorização tão vaga como esta.

A seu ver, o convenio impõe encargos com que o país não pode. Alem de, no orçamento, termos já um deficit de 5:000 a 6:000 contos, se já não temos meios sufficientes para pagar o que devemos, como poderemos pagar mais mil e tantos contos, alem das despesas do convenio?

É completamente impossivel.

Havemos, então, de recorrer aos emprestimos, para aggravar mais ainda a situação?

É necessario que o país tenha credito, que possa, de prompto, realizar alguns melhoramentos; mas não se deve abusar do credito como até aqui temos feito, não para fazer obras productivas, mas para, não poucas vezes, satisfazer ás exigencias de caciques eleitoraes.

Elle, orador, considera este convenio verdadeiramente attentatorio da dignidade nacional. A Junta do Credito Publico fica de tal maneira organizada que parece ser uma caixa onde se depositarão os dinheiros que hão de ser enviados para pagamento da divida externa.

Estipula o projecto que os rendimentos hão de vir das alfandegas para a junta, a qual pela sua parte tem de enviá-los depois para quaesquer outras entidades. D'esta forma, poderemos ter, não o contrôle, mas uma tutela.

Referindo-se ao discurso do Sr. Alvaro Possollo, não concorda o orador com o que S. Exa. disse quanto aos credores externos; porquanto o credor externo não é uma victima que se impõe á nossa consideração; é um usurario em procura de lucros e, portanto, arriscado aos prejuizos resultantes.

Vae ler um documento preciosissimo, que é resposta cabal aos que dizem que devemos tratar os credores na proporção dos seus sacrificios. É o jornal Economista, de 1893, onde vem uma lista dos emprestimos portugueses com o seu capital nominal, as quantias realmente recebidas pelo Governo e os respectivos juros.

Da leitura d'esse jornal conclue o orador que, certo de que em 1893 ainda ficamos pagando 40 por cento de juro pelo capital realizado, não ha razão para que estejamos e joelhos deante dos credores, que não podem apresentar-se como victimas imbelles.

Não ha comparação possivel entre a moral individual e a moral social. As grandes guerras são actos grandiosos das nações, mas actos semelhantes praticados por individuos seriam latrocinios.

Podemos, pois, e devemos dizer ás nações que estamos promptos a pagar tudo quanto devemos, mas que não pagamos senão aquillo que podemos.

Tem ouvido dizer, de todos os lados da Camara, que é indispensavel seguir rumo novo, mudar de vida. Ninguem deixa de concordar com isso; mas deve dizer que só se toma juízo, quando se quer.

Não podemos transformar os nossos habitos com a mesma facilidade com que se bebe um copo de agua. Mas, para termos juizo, a primeira cousa que ha a fazer é respeitar as leis. Ahi é que deve haver o verdadeiro contrôle nacional, que não deixa gastar absolutamente nada que não esteja no orçamento.

Se um contrôleur nomeado, com gravissimas responsabilidades, não quizer obrigar o Governo a cumprir religiosamente com os seus deveres; se d'ahi não se tirar resultado, então poder-se-ha dizer que o povo português é um povo de mareantes, mas não tem tino para se governar, não lhe restando, então, senão a tutela estrangeira.

É preciso que os Governos administrem economicamente, desenvolvendo a riquesa nacional; é preciso que as Camaras não sejam subservientes ás vontades governamentaes; é preciso que o povo saia da indifferença criminosa em que tem vivido, para se impor a quem governar, para fazer cumprir as leis, e evitar que se queira comprometter a honra e a dignidade nacional.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir).

O Sr. Carrilho: - Viu a Camara que o illustre Deputado Sr. João Pinto dos Santos, no seu discurso, não adeantou cousa alguma ao que se tem dito na Camara, a proposito do projecto em discussão. Antes, pelo contrario, não fez senão repetir observações e criticas que já tinham sido largamente respondidas.

Achou S. Exa. contradicção entre o que disse o Sr. Hintze Ribeiro a proposito da lei de 1898 e o projecto em discussão.

Qual é, porem, a differença entro uma e outra?

Neste diz-se qual é o capital, como se pode pagar, e quaes as garantias que se dão; ao passo que no outro projecto de 1898 não havia nada d'isto.

Ahi mesmo nem se dizia quaes eram os encargos.

Leu S. Exa. á Camara a opinião que elle, orador, tinha 1883 a respeito dos credores; mas essa opinião ainda hoje a tem.

Porque a tinha então, e apresentou os calculos que S. Exa. leu? Porque, nessa data, os nossos credores não só não queriam fazer nenhuma reducção no capital, dando-nos, apenas, uma reducção de juro de 50 por cento; mas ainda exigiam que num periodo muito proximo pagassemos o capital inteiro.

A reducção de hoje representa, pois, uma mudança completa e radical; a distancia é enorme, e, conseguintemente, não ha senão razões para se dizer que d'esta vez não ha motivo de queixa.

Disse S. Exa. que nós não temos recursos para satisfação dos encargos provenientes d'este convenio.

Já o mesmo se disse a respeito da lei de 1893; mas tivemos o premio do ouro, as guerras de Africa, a crise operaria; as despesas augmentaram; todavia pagou-se isso tudo, e não se pediu um real ao estrangeiro.

Portanto, a probidade da nação portuguesa, satisfazendo todos os seus encargos, é que faz, agora, com que o convenio se realize; e temos a convicção de que os nossos credores acreditam que havemos de cumprir o que está no projecto.

Resta-lhe dizer que a commissão de fazenda, analysando as propostas apresentadas durante a discussão, e, conformando-se com as explicações dadas pelo Governo, declara não poder aceitá-las.

Em conformidade, ainda, com a declaração que ha pouco fez ao Sr. Mello e Sousa, manda para a mesa a seguinte proposta de additamento:

Accrescentar á base 6.ª - final do n.° 1.°: "Nos paises onde elles forem trocados" = A. Carrilho.

Foi admittida.

(O discurso será publicado na integra guando o orador o restituir).

O Sr. Dias Ferreira: - Começa por ler a seguinte moção:

"A Camara, reconhecendo que a providencia em discussão reclama sacrificios de dinheiro e de dignidade que os representantes da nação não podem acceitar, passa á ordem do dia = Dias Ferreira".

Continuando, dirige os seus cumprimentos ao Sr. Carrilho, pelo seu enthusiasmo, perfeitamente juvenil, com que disse á Camara que os credores estrangeiros foram, esta vez, amaveis comnosco. Só faltava, realmente,

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que depois de dizerem que nós estavamos ás portas da ruina; depois de nos terem, pedido amaior somma de garantias, agora, que se lhes dá a consignação do rendimento das alfandegas, como privilegio, collocando-nos na durissima e cruel situação de lhes remettermos, dentro de quinze dias, esse rendimento transformado em ouro, elles não ficassem contentes!

Nesta altura da discussão, porem, falta ainda uma resposta indispensavel, da parte do Governo, ou da commissão: como se paga o convenio? Esta é que é a questão. Agora é que começa a obrigação; a liquidação virá depois.

Não teremos no Orçamento do Estado outros encargos, senão os dos credores estrangeiros? Não teremos outras despesas? Então, agora, só nos preoccupa o credor externo? A que proposito é isto? Que circunstancia tão violenta nos impelle a entrar num caminho, em que o Estado fica perfeitamente engasgado, porque dentro de quinze dias, haja ou não haja ouro, chegue ou não o cambio a 300, ha de, forçosamente, remetter ouro para o estrangeiro?

Não se deve levar as expansões a tal ponto, porque não pode ser.

Seja-lhe relevado usar segunda vez da palavra; mas a culpa é do Governo, que tem respondido aos argumentos apresentados, por parte da opposição, não com o que foz, mas com o que outros teem feito.

Não pode transigir com tal Systema; mas a isso não se referiria agora, se o Sr. Ministro da Fazenda, com uma tranquillidade de animo invejavel, não viesse discutir um convenio, que tinha morrido ás mãos d'elle, orador.

Pois não disse o Sr. Ministro da Fazenda que todas as difficuldades que tem havido foram filhas das providencias d'elle, orador? Então o causador de tudo foi um homem só? Poderia lisonjear-se com a situação que S. Exa. quis criar-lhe, mas não acceita.

Tendo então o país reduzido os juros da sua divida, tinha obrigação de d'ahi por deante levar uma vida austera que resgatasse os seus peccados.

Não succedeu, porem, assim, e as desposas que em 1892-1893 eram de 45:000 contos, tres annos depois montavam a 60:000.

Fazia-se em 1893 a reducção dos juros; pois logo em 1894 se projectava um emprestimo sobre os rendimentos coloniaes, e em 1896 propunha-se uma conversão que, dêem-lhe a volta que quiserem, é um emprestimo.

Em 1892 o contribuinte não estava esgotado; mas hoje quaes são ou recursos de que o Governo pode lançar mão para prover ás urgencias do Thesouro?

Que o Governo faça quatrocentos inspectores de instrucção, nomeie setecentos inspectores de impostos e aguas mineraes, que cria universidades de pharmacia, metta mais professores nas escolas superiores, modifique o paladar aos pratos, tudo isso pouco importa, porque tudo pode desapparecer com um traço de penna; mas um contrato com o estrangeiro é cousa mais seria, porque havemos de pagar, quer queiramos ou não.

Quando se publicou o decreto de 1892 atacaram-no por pagar um terço, que alguem entendeu ser mais do que 50 por cento; mas depois, quando encetarem as negociações, não offereçam um terço, offereçam um quarto.

Tomou elle, orador, uma medida violento, é certo; mas, que havia de fazer, tendo apenas 35:000 contos para pagar 55:000, e cotando os mercados complemente fechados?

O deficit era de 16:000 contos, por consequencia, não tinha outra cousa a fazer senão praticar um acto de audacia.

Qual era o perigo do decreto de 1892?

Fecharem-se todas as bolsas da Europa, onde havia interessados na divida portuguesa?

Isso era, no seu parecer, preferivel a sacrificar os interesses do país.

O decreto de 1892 era violento, mas, desde que estava em execução, era preciso mantê-lo, até se chegar a um acordo, e foi isso o que elle, orador, tentou, mas que não conseguiu, pelos factos que a Camara conheço e que neste momento recorda, para mostrar a justiça com que tem sido accusado.

Expõe, em seguida, o orador, detidamente o que então se passou na Camara, accentuando, especialmente, o procedimento havido para com o Governo, por parte da commissão de fazenda, e affirma que o que sempre teve em vista, foi não estabelecer differença entre o tratamento dado ao credor nacional e ao estrangeiro.

Parece-lhe portanto de mau gosto a observação que o Sr. Ministro da Fazenda lhe fez.

Está com escrupulo de demorar a Camara por mais tempo; mas não quer terminar sem dizer que o Sr. Ministro da Fazenda, quando leu o artigo 10.º da lei de 26 de fevereiro de 1892, fê-lo só até onde lhe convem; se o tivesse lido todo, veria que elle deixava de servir para a sua argumentação.

O orador lê, a proposito, um documento que remette depois para a mesa, a fim de que o Sr. Presidente o faça archivar no archivo da Camara.

Conclue, dizendo que muitas vezes, no periodo já longo da sua profissão de advogado, tem visto o pactuante que tem de assignar uma escriptura em que se compromette a um pagamento oneroso, garantido com hypotheca nos seus bens em geral e em uma parte designada, em especial, humedecer com lagrimas o papel da respectiva assignatura. O que não esperava, era ver que uma Camara, verdadeiramente portuguesa e onde todos estão possuidos do mesmo sentimento de patriotismo, vá ligar a responsabilidade de uma nação inteira a um convenio, que Deus sabe, se o país pode cumprir e se cumprir quem sabe quantas vezes será regado com lagrimas de sangue.

(O discurso será publicado na integra quando s. Exa. o restituir).

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo Sr. Dias Ferreira.

Leu-se, foi admittida e ficou em discussão conjuntamente com o projecto.

O Sr. Almeida Dias: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. se digne consultar a Camara sobre se julga sufficientemente discutida a materia do artigo 1.° do projecto e em discussão. = Almeida Dias.

O Sr. Rodrigues Nogueira (sobre o modo de votar): - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. que se digne consultar a camara se consente que haja votação nominal sobre o requerimento que vae votar-se. = A. R
Nogueira.

O Sr. Fuschini: - Peço a V. Exa. que me diga quem é que estava inscripto.

O Sr. Presidente: - Estavam inscriptos os Srs. Espregueira e Ressano Garcia.

Vae ler-se o requerimento mandado para a mesa pelo Sr. Rodrigues Nogueira, sobre o modo de votar o requerimento do Sr. Almeida Dias.

Leu se e foi approvado.

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á chamada:

Feita n chamada:

Disseram approvo os Srs.:

Abel Pereira de Andrade.

Affonso Xavier Lopes Vieira.

Página 19

SESSÃO N.º 65 DE 26 DE ABRIL DE 1902 19

Agostinho Lucio e Silva.

Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão.

Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho.

Alberto Botelho.

Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro.

Albino Maria do Carvalho Moreira.

Alexandre José Sarsfield.

Alfredo Augusto José de Albuquerque.

Alfredo Cesar Brandão.

Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho.

Alipio Albano Camello.

Álvaro Augusto Froes Possollo de Sousa.

Álvaro de Sousa Rego.

Anselmo Augusto Vieira.

Antonio Alberto Charula Pessanha.

Antonio de Almeida Dias.

Antonio Augusto de Mendonça David.

Antonio Augusto de Sonsa e Silva.

Antonio Barbosa Mendonça.

Antonio Belard da Fonseca.

Antonio José Boavida.

Antonio José Lopes Navarro.

Antonio Maria Pereira Carrilho.

Antonio Rodrigues Ribeiro.

Antonio Roque da Silveira.

Antonio Sergio da Silva e Castro.

Antonio de Sousa Pinto de Magalhães.

Arthur da Costa Sonsa Pinto Basto.

Arthur Eduardo de Almeida Brandão.

Augusto Cesar Claro da Ricca.

Augusto Neves dos Santos Carneiro.

Avelino Augusto da Silva Monteiro.

Belchior José Machado.

Carlos Alberto Soares Cardoso.

Carlos Malheiro Dias.

Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda.

Clemente Joaquim dos Santos Pinto.

Conde de Castro e Solla.

Conde de Paçô - Vieira.

Custodio Miguel de Borja.

Domingos Eusebio da Fonseca.

Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha.

Eduardo Burnay.

Ernesto Nunes da Costa Ornellas.

Filippe Leite de Barros e Moura.

Francisco José Patricio.

Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros.

Guilherme Augusto Santa Rita.

Henrique Matheus dos Santos.

Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira.

Hypacio Frederico de Brion.

Jayme Arthur da Costa Pinto.

João Alfredo de Faria.

João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos.

João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira.

João Joaquim André de Freitas.

João Marcellino Arroyo.

João de Sousa Tavares.

Joaquim Antonio de Sant´Anna.

Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos.

Joaquim Faustino de Pôças Leitão.

Joaquim Pereira Jardim.

José Antonio Ferro de Madureira Beça.

José Caetano Rebello.

José Caetano de Sousa, e Lacerda.

José Coelho da Motta Prego.

José da Cunha Lima.

José Gonçalves Pereira dos Santos.

José Jeronymo Rodrigues Monteiro.

José Joaquim Dias Gallas.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro.

José Maria de Oliveira Simões.

José Maria Pereira de Lima.

José de Mattos Sobral Cid.

José Nicolau Raposo Botelho.

Julio Augusto Petra Vianna.

Julio Maria de Andrade e Sousa.

Luciano António Pereira da Silva.

Luiz Filippe de Castro (D.).

Luis Gonzaga dos Reis Torgal.

Luis de Mello Correia Pereira Medello.

Manoel Joaquim Fratel.

Marianno José da Silva Prezado.

Mario Augusto de Miranda Monteiro.

Marquez de Reriz.

Matheus Augusto Ribeiro Sampaio.

Rodolpho Augusto de Sequeira.

Rodrigo Affonso Pequito.

Visconde de Reguengo (Jorge).

Visconde da Torre.

José Joaquim Mendes Leal.

Amandio Eduardo da Motta Veiga.

Matheus Teixeira de Azevedo.

Disseram rejeito os Srs.:

Albano de Mello Ribeiro Pinto.

Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral.

Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca.

Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz.

Antonio Centeno.

Antonio Eduardo Villaça.

Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral.

Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra.

Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti.

Antonio Rodrigues Nogueira.

Augusto Fuschini.

Augusto José da Cunha.

Carlos de Almeida Pessanha.

Carlos Augusto Ferreira.

Conde de Penha Garcia.

Francisco António da Veiga Beirão.

Francisco Felisberto Dias Costa.

Francisco José Machado.

Francisco José de Medeiros.

Francisco Limpo de Lacerda Ravasco.

Frederico Alexandrino Garcia Ramirez.

Frederico Ressano Garcia.

Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida o Vasconcellos.

Henrique Carlos do Carvalho Kendall.

João Augusto Pereira.

João Monteiro Vieira de Castro.

João Pinto Rodrigues dos Santos.

José Adolpho de Mello e Sousa.

José Dias Ferreira.

José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

José Maria de Oliveira Mattos.

José Mathias Nunes.

Júlio Ernesto de Lima Duque.

Libanio António Fialho Gomes.

Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla.

Luis Fisher Berquó Poças Falcão.

Luis José Dias.

Manoel Affonso de Espregueira.

Manoel Antonio Moreira Junior.

Manoel Homem de Mello da Camara.

Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

Paulo de Barros Pinto Osorio.

O Sr. Presidente: - Disseram approvo 95 Srs. Deputados e rejeito 42. Está, portanto, approvado o requerimento do Sr. Almeida Dias, e julgado sufficientemente discutido o artigo 1.° e respectivas bases do projecto.

Vae ler-se a moção do Sr. Ressano Garcia.

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20 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

É a seguinte:

Moção

A Camara dos Deputados da Nação Portuguesa affirma que a regra suprema de uma administração verdadeiramente patriotica deve ser, na presente conjuntura, reduzir a despesa publica ao minimo exigido pelas necessidades impreteriveis da nação, e convida o Governo a proceder a uma acurada revisão do Orçamento, de modo que, o mais breve possivel, toda a despesa publica, incluindo a que resultar da projectada conversão, não possa exceder a receita do Estado. = Frederico Ressano Garcia.

O Sr. Arroyo: - Declara, por parte da maioria parlamentar, que ella não pode approvar a moção do Sr. Ressano Garcia, porque as ponderações com que S. Exa. acompanhou a sua apresentação manifestam que essa moção é de desconfiança.

O Sr. Ressano Garcia: - Quando eu apresentei essa moção á consideração da Camara, fi-lo despido de qualquer pensamento politico (Apoiados), e sem o minimo intuito de censura para ninguem. Appellei legalmente para os sentimentos patrioticos de toda a Camara, sem distincção de partidos, e isto movido apenas pelo sincero desejo de que todos nós, representantes da nação, nos congregassemos na obra de salvação do país e conjugassemos os nossos esforços, em satisfação ás reclamações do país.

Moções d'esta ordem, Sr. Presidente, ou se votam por unanimidade, senão por acclamação, ou não se rejeitam, e como eu quero poupar á maioria d'esta Camara o sacrificio de ter de rejeitá-la, eu peço a V. Exa. a fineza de consultar a Camara sobre se permitte que eu a retire.

Permittiu-se que retirasse.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo Sr. Espregueira.

É a seguinte:

Moção

A Camara dos Senhores Deputados, julgando mais conveniente aos interesses publicos que o projecto em discussão seja substituido pelo texto de acordo já acceito pelos representantes dos credores estrangeiros, como é notorio, a fim de que fiquem bem definidas e claramente fixadas, por deliberação das Côrtes, as obrigações que o país vae assumir perante o estrangeiro, evitando-se que por má interpretação d'esta lei possam ser ainda aggravados os encargos do Thesouro e o Governo tome compromissos que venham prejudicar o nosso futuro, continua na ordem do dia. - Manuel Affonso de Espregueira.

O Sr. Espregueira: - Peço a V. Exa. que consulte a Camara sobre se consente que eu retire a minha moção.

Foi auctorizado a retirar.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo Sr. Pinto dos Santos.

É a seguinte:

Moção

A Camara, reconhecendo que o projecto em discussão nos impõe encargos que, na conjuntura actual, não podemos satisfazer, continua na ordem do dia. = João Pinto dos Santos.

O Sr. João Pinto dos Santos: - Peço a V. Exa. se digne consultar a Camara sobre que eu retire a minha moção.

Foi auctorizado a retirá-la.

O Sr. Presidente: - Segue-se a moção mandada para a mesa pelo Sr. José Dias Ferreira.

É a seguinte

Moção

A Camara reconhecendo que a providencia em discussão reclama sacrificios de dinheiro e de dignidade que os representantes da nação não podem acceitar, passa á ordem do dia. = Dias Ferreira.

O Sr. José Dias Ferreira: - Peço a V. Exa. se digne consultar a Camara sobre se consente que eu retire a minha moção.

Foi auctorisado a retirar.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo Sr. Deputado Fuschini. A mesa considerou a como emenda e como tal a vae sujeitar á votação da Camara.

É a seguinte

Proposta

«Base 2.ª:

§ unico. O Governo Português declara muito expressamente que, em qualquer data d'este acordo, se reserva em absoluto a plena liberdade de modificar os direitos da importação (pautas aduaneiras), em harmonia com os interesses nacionaes, quer estas modificações tenham por fim melhorar a distribuição da riqueza publica, quer a celebração de tratados commerciaes uteis para a industria e o commercio portugueses, quer por quaesquer outras causas legitimas e de interesse publico.

Todos os signatarios d'este acordo, em seu proprio nome e em nome dos interessados de qualquer ordem que representem, ou possam representar, acceitam sem restrições esta declaração do Governo Português, reconhecendo e respeitando nella, como em tudo que respeitam e respeitarão, os direitos da soberania de Portugal».

Foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á votação do artigo 1.° do projecto.

O Sr. Fuschini: - Lembro a S. Exa. que ha ainda uma proposta minha para ser votada.

O Sr. Presidente: - Essa proposta foi considerada pela mesa como uma substituição; só pode, portanto, ser posta á votação depois do artigo, se este for rejeitado.

Leu-se o artigo 1.°

O Sr. Costa Pinto: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que sobre o artigo 1.° do projecto que se vae votar recaia votação nominal. = Jayme Arthur da Costa Pinto.

Foi approvado.

Feita a chamada

Disseram approvo os Srs.:

Abel Pereira de Andrade.

Affonso Xavier Lopes Vieira.

Agostinho Lucio e Silva.

Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão.

Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho.

Alberto Botelho.

Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro.

Albino Maria de Carvalho Moreira.

Alexandre José Sarsfield.

Alfredo Augusto José de Albuquerque.

Alfredo Cesar Brandão.

Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho.

Alipio Albano Camello.

Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa.

Alvaro de Sousa Rego.

Anselmo Augusto Vieira.

Antonio Alberto Charula Pessanha.

Antonio de Almeida Dias.

Antonio Augusto de Mendonça David.

Antonio Augusto de Sousa e Silva.

Antonio Barbosa Mendonça.

Antonio Belard da Fonseca.

Antonio José Boavida.

Antonio José Lopes Navarro.

Antonio Maria Pereira Carrilho.

Página 21

SESSÃO N.º 65 DE 26 DE ABRIL DE 1902 21

Antonio Rodrigues Ribeiro.

Antonio Roque da Silveira.

Antonio Sergio da Silva e Castro.

Antonio de Sousa Pinto de Magalhães.

Arthur da Costa Sousa Pinto Basto.

Arthur Eduardo de Almeida Brandão.

Augusto Cesar Claro da Ricca.

Augusto Neves dos Santos Carneiro.

Avelino Augusto da Silva Monteiro.

Belchior José Machado.

Carlos Alberto Soares Cardoso.

Carlos Malheiro Dias.

Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda.

Clemente Joaquim dos Santos Pinto.

Conde de Castro e Solla.

Conde de Paçô Vieira.

Custodio Miguel de Borja.

Domingos Eusebio da Fonseca.

Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha.

Eduardo Burnay.

Ernesto Nunes da Costa Ornellas.

Fernando Mattozo Santos.

Filippe Leite de Barros e Moura.

Francisco José Patricio.

Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros.

Guilherme Augusto Santa Rita.

Henrique Matheus dos Santos.

Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira.

Hypacio Frederico de Brion.

Jayme Arthur da Costa Pinto.

João Alfredo de Faria.

João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos.

João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira.

João Joaquim André de Freitas.

João Marcellino Arroyo.

João de Sousa Tavares.

Joaquim Antonio de Sant'Anna.

Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos.

Joaquim Faustino de Poças Leitão.

Joaquim Pereira Jardim.

José Antonio Ferro de Madureira Beça.

José Caetano Rebello.

José Caetano de Sousa e Lacerda.

José Coelho da Motta Prego.

José da Cunha Lima.

José Gonçalves Pereira dos Santos.

José Jeronymo Rodrigues Monteiro.

José Joaquim Dias Gallas.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro.

José Maria de Oliveira Simões.

José Maria Pereira de Lima.

José de Mattos Sobral Cid.

José Nicolau Raposo Botelho.

José Augusto Petra Vianna.

Julio Maria de Andrade e Sousa.

Luciano Antonio Pereira da Silva.

Luiz Filippe de Castro (D.).

Luiz Gonzaga dos Reis Torgal.

Luiz de Mello Correia Pereira Medella.

Manoel Francisco de Vargas.

Manoel Joaquim Fratel.

Marianno José da Silva Prezado.

Mario Augusto de Miranda Monteiro.

Marquez de Reriz.

Matheus Augusto Ribeiro Sampaio.

Rodolpho Augusto de Sequeira.

Rodrigo Affonso Pequito.

Visconde de Reguengo.

Visconde de Torre.

José Joaquim Mendes Leal.

Amandio Eduardo da Motta Veiga.

Matheus Teixeira de Azevedo.

Disseram rejeito os Srs.:

Albano de Mello Ribeiro Pinto.

Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral.

Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca.

Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz.

Antonio Centeno.

Antonio Eduardo Villaça.

Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral.

Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra.

Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti.

Antonio Rodrigues Nogueira.

Augusto Fuschini.

Augusto José da Cunha.

Carlos de Almeida Pessanha.

Carlos Augusto Ferreira.

Conde de Penha Garcia.

Francisco Antonio da Veiga Beirão.

Francisco Felisberto Dias Costa.

Francisco José Machado.

Francisco José de Medeiros.

Francisco Limpo de Lacerda Ravasco.

Frederico Alexandrino Garcia Ramirez.

Frederico Ressano Garcia.

Gaspar de Queiroz de Almeida e Vasconcellos.

Henrique Carlos de Carvalho Kendall.

João Augusto Pereira.

João Monteiro Vieira de Castro.

João Pinto Rodrigues dos Santos.

José Adolpho de Mello e Sousa.

José Dias Ferreira.

José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

José Maria de Oliveira Mattos.

José Mathias Nunes.

Julio Ernesto de Lima Duque.

Libanio Antonio Fialho Gomes.

Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla.

Luiz Fisher Berquó Poças Falcão.

Luiz José Dias.

Manoel Affonso de Espergueira.

Manoel Antonio Moreira Junior.

Manoel Homem de Mello da Camara.

Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

Paulo de Barros Pinto Osorio.

O Sr. Presidente: - Declara que o artigo 1.° foi approvado por 97 votos contra 42.

A pedido do Sr. Luiz José Dias leram-se na mesa os nomes dos Srs. Deputados que rejeitaram o artigo.

O Sr. Presidente: - A proposta de substituição mandada para a mesa pelo Sr. Fuschini ficou prejudicada com a approvação do artigo 1.° do projecto.

Lê-se em, seguida a proposta de adiamento apresentada pelo Sr. Dias Ferreira.

Leu-se, e posta á votação, é rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se para ser votado o additamento do Sr. Pereira Carrilho.

Leu-se a seguinte

Proposta de additamento

Accrescentar á base 6.ª - final do n.° 1.°: «Nos paises onde elles forem trocados». - A. Carrilho.

Foi admittida.

Le-se em seguida o artigo 2.° do projecto, sendo approvado sem discussão.

O Sr. Alipio Camello: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que seja auctorizada a reunir a commissão de redacção durante os trabalhos da sessão. = O Deputado, Alipio Camello.

Foi approvado.

Página 22

22 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Sr. Fuschini: - Sr. Presidente: vae muito adeantada a hora, n'uma sessão prorogada, para que eu deva tomar muito tempo á Camara; resumirei, pois, os meus raciocinios aos que forem indispensaveis para dar cabal resposta, a affirmações do Sr. Presidente do Conselho, feitas, segundo se diz, na sessão de hontem.

Assim, começo por ler uma carta que hontem, depois da leitura de alguns jornaes, dirigi ao Sr. Hintze Ribeiro, porque, lendo-a, emprego a palavra escripta mais synthetica e rigorosa do que a falada. Eis a carta na sua parte substancial para não gastar tempo com a leitura completa, visto que será toda publicada amanhã nos jornaes e depois em momento opportuno e conveniente:

«Lisboa, 25 de abril de 1902 (á noite).

«Exmo. sr. Presidente do Conselho de Ministros. - Sahi hontem da camara, depois da leitura do officio do director geral do Thesouro de 11 de setembro de 1893 porque entendi não dever ouvir phrases inuteis e improprias do parlamento; absolutamente indifferente porém, emquanto á natureza da questão levantada, porque «ninguem», que seja sincero e ponderado, deixará de ver n'aquelle officio simples resposta de um funccionario do Estado, expondo a sua opinião ácerca da doutrina «expressa» no regulamento de 14 de agosto de 1893, por mim referendado; como aliás se deprehende da propria construcção grammatical do officio.

Alem d'isso, v. exa. não ignora que se o officio constituisse uma aclaração, ou additamento ao referido regulamento - o que será impossivel de encontrar na redacção d'elle - deveria ter sido assignado por mim, ou feito em virtude de despacho meu, com a devida auctorisação do conselho de ministros, seguindo-se natural e logicamente os tramites que se haviam seguido para o proprio regulamento.

Hoje, assumpto importante impediu-me de comparecer na sessão, não tendo eu, aliás, o menor proposito se levantar esta desastrada questão, cuja apreciação deixava ao criterio dos homens serios do paiz; aconteceu, porém, que v. exa. nas declarações, que acabo de lêr na Tarde, deu consideravel importancia ao assumpto e originou, estou convencido de que involuntariamente, versões tão desagradaveis para v. exa. como para mim.

Em primeiro logar, diz-se, e creio que se escreveu em jornal muito affecto ao governo, que v. exa. «me poz fóra do ministerio» quando conheceu o citado officio. Este assumpto, de caracter essencialmente particular, não desejo eu discutir no parlamento, deixando a v. exa. a plena liberdade de fazer a este respeito a declaração que tiver por justa.

Depois, v. exa. declarou que, conhecendo só o officio em fins de dezembro de 1893 - depois da minha saida do ministerio? - fôra obrigado a reconhecer os principias n'elle contidos, por não poder engeitar responsabilidades, que constavam de um documento official.

Esta declaração, que a meu ver tornou a questão muito delicada, obriga-se a pedir a v. exa. o seguinte:

1° Que me porporcione na sessão de ámanhã, sabbado 26, o uso da palavra antes da ordem do dia;

2.° Que v. exa. mande immediatamente buscar ao ministerio da fazenda todos os documentos citados no referido officio, bem como o «meu despacho original» que auctorisou este officio e a respectiva minuta; 1

Em primeiro logar, devo observar que o periodo, notado no officio da Thesouraria do Ministerio da Fazenda, não envolve compromisso algum sobre a consignação dos rendimentos aduaneiros; leamos esse periodo:

- «Tudo o que a lei quiz principalmente - dotação da divida, a sua administração independente do Governo, consignação das receitas aduaneiras (com excepção das dos tabacos e dos cereaes), fiscalisação da Junta e applicação das suas receitas - tudo foi introduzido no regulamento.»

O periodo é claro: tudo que a lei quiz principalmente, tudo foi introduzido no regulamento.

Ora, a lei de 20 de maio de 1893 não quiz a consignação e não a concedeu; nem o regulamento de 14 de agosto a envolve em qualquer das suas disposições; mais ainda, não a podia legalmente envolver, porque alterava a essencia da propria lei de que emana o referido regulamento.

A lei de 20 de maio de 1893 e o regulamento de 14 de agosto do mesmo anno são os unicos documentos officiaes, que podem trazer compromissos para o paiz, os unicos que, seguidos todos os tramites legaes, foram assignados por mim como Ministro da Fazenda.

Ora, na lei de 20 de maio de 1893 nada ha absolutamente que signifique consignação, e no regulamento de 14 de agosto apenas existe uma unica disposição, em que se emprega a palavra consignados, é a seguinte:

Artigo 9.°, § 3.°:

Os rendimentos, que nos termos do artigo 19.° da lei de 26 de fevereiro de 1892 e dos §§ 1.º e 2.° da lei de 20 de maio de 1893, foram expressamente attribuidos ao serviço da divida fundada, não poderão ser consignados a quaesquer emprestimos, ou operações financeiras.

Manifestamente, não é aqui que se concede a consignação, quando pelo contrario se declara que rendimento algum, dos definidos no artigo 19.° da lei de 10 de fevereiro de 1892 ou na lei de 20 de maio de 1893, poderá ser consignado a quaesquer emprestimos ou operações financeiras.

Vejamos o que diz o artigo 19.° da lei de 10 de fevereiro de 1902:

Para assegurar aos credores, tanto nacionaes como estrangeiros, o pagamento integral e regular dos juros e amortização, o governo poderá consignar a esse fim, dos rendimentos nacionaes aquelles que entender necessarios e preferiveis; sem, todavia, alterar a forma ordinaria de percepção dos mesmos rendimentos, mas sim, restaurando, por modo conveniente, o antigo regimen de dotação.

Vejamos, egualmente, o que dizem os §§ 1.° e 2.º da lei de 20 de maio de 1893:

§ 1.° O excesso do producto annual, a contar do 1.° de julho de 1893, das receitas no continente e ilhas adjacentes, tanto de direitos de importação de varios generos e mercadorias (tabacos e cereaes exceptuados} como de direitos de exportação, sobre a quantia total de 11.400:000$000 réis será, na razão de 50 por cento e em moeda corrente, distribuido proporcionalmente pelos titulos da divida fundada externa, emittidos até esta data, com excepção dos que o foram por decreto de 30 de março de 1891.

1 Eis o final da carta:

Estes pedidos, que certamente V. Exa. considerará rasoaveis da parte do Ministerio da fazenda de 1893, que sempre procedeu com a maior lealdade para com os seus collegas, são formulados por mim, porque segundo consta não haverá outra sessão.

Se a houver e V. Exa. entender util não confundir a discussão do convenio com este assumpto tão leviana e malevolamente levantado no Parlamento pelo Sr. Arroyo, sujeito-me á opinião de V. Exa., pedindo-lhe apenas, que declare o meu desejo e a acceitação da discussão.

V. Exa. comprehende que este assumpto tem de ser esclarecido.

Sou de V. Exa. com toda a consideração - Att.º Vol e Corg.ºs = Augusto Fuschini.

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SESSÃO N.° 65 DE 26 DE ABRIL DE 1902 23

§ 2.° Metade da differença annual para menos de 22 por cento, em moeda corrente, que hoje, a datar do 1.° de julho de 1893, na importancia do premio do ouro pela transferencia de fundos para paizes estrangeiros, a fim de assegurar o pagamento do terço do coupon, fixado para os titulos de que trata o § 1.°, pelo decreto de 13 de junho de 1892, e respectiva amortisação, será tambem pela mesma forma distribuida pelos titulos de divida fundada externa.

Devemos, pois, concluir que nenhum d'estes documentos envolve a consignação de rendimentos; portanto, o officio em questão, ainda que tivesse valor legal - que não tem - não podia trazer compromissos d'esta natureza para o paiz.

Alem d'isso, as phrases contidas entre linhas, nada mais são do que desenvolvimentos da proposição principal; com effeito, a redacção é a seguinte:

«Tudo quanto a lei quis principalmente - dotação da divida, a sua administração independente do Governo, consignação das receitas aduaneiras (com excepção das dos tabacos e dos cereaes) fiscalisação da junta e applicação das suas receitas - tudo foi introduzido no regulamento».

Seria um absurdo que d'estes periodos incidentes se procurasse tirar um compromisso, suppondo até que o officio fosse assignado por quem de direito o podia tomar; mas a verdade é que nem na lei de 20 de maio de 1893, nem no respectivo regulamento, nem nas leis citadas n'estes documentos, nem no proprio officio em questão, existe base para firmar um compromisso.

O Sr. Presidente do Conselho não podia ignorar isto porque o regulamento de 14 de agosto de 1893 foi approvado em conselho de Ministros, e muito especialmente a redacção do § 3.° do artigo 9.°, por mim discutida durante semanas com o Sr. Hocnemzer, representante do Banco do Commercio e Industria de Berlim. Esta redacção, ponderada no conselho e por mim explicada, foi sem a menor alteração introduzida no regulamento.

Como se podia, pois, admittir que eu sempre adverso á consignação dos rendimentos das alfandegas, que eu, ha vendo durante semanas resistido a todas as pressões, em 11 de setembro, menos de um mez depois de publicado o regulamento, tomasse um compromisso sobre a consignação dos rendimentos da alfandega?

Podiam todos admittir esta hypothese, menos os meus antigos collegas no ministerio e entre elles o Sr. Presidente do Conselho, Hintze Ribeiro.

Mas vejamos ainda a natureza do documento. O officio é de simples expediente, nem ao menos tem a phrase consagrada: por ordem de S. Exa o Ministro.

Para o não ser, era necessario ter sido assignado por mim, ou feito em virtude de um despacho meu.

Ora, não só não é assignado por mim; mas, n'este ponto, pergunto ao Sr. Ministro da Fazenda se existe de facto algum despacho do meu punho a este respeito? Aguardo a resposta.

O Sr. Ministro da Fazenda (Mattozo Santos): - Nos documentos, que até agora li, não ha, propriamente, despacho algum de S. Exa.

O Orador: - Effectivamente, achara-se sobre a mesa os documentos, que na minha carta pedi ao Sr. Hintze Ribeiro, entre elles a minuta do officio de 11 de setembro de 1893; ora, esta minuta é feito pela letra do Sr. Director Geral do Thesouro e sobre ella não existe despacho meu algum. O officio é de mero expediente.

Em regra, todos os ministros o sabem, quando um negocio importante foi resolvido, a acção do ministro termina para começar a execução pelas respectivas Direcções Geraes. Foi pelo menos este o meu systema. Bem aviados estavam os ministros, principalmente o da pasta da fazenda, se tivessem de ler e de conhecer as centenas de officios de expediente, que dia a dia saem dos ministerios!

É evidente que o Director Geral da Thesouraria, se tivesse ligado importancia essencial ao officio, seria o primeiro a pedir a sua homologação com o meu despacho na minuta, ou em outro qualquer documento; ora esse despacho não existe, não foi pedido, nem foi dado.

Alem d'isso, este officio não é um facto isolado; acêrca da execução da lei de 20 de maio e do respectivo regulamento muitos se trocaram da mesma natureza, segundo as mesmas normas e com as mesmas entidades; todos podem verificar esta affirmação, porque os documentos estão sobre a mesa da presidencia.

Agora, permitta-me o Sr. Presidente do Conselho Hintze Ribeiro, algumas simples observações.

Sendo o officio de 11 de setembro, porque seria que o Ministro da Allemanha só a elle se referiu depois da minha saida?

Não seria mais regular liquidar esta questão directamente comigo, emquanto eu estivesse no Ministerio?

Depois, o Sr. Hintze Ribeiro antes de dar a importancia que deu ao officio e este não tinha, como já demonstrei, porque não se informou se existia despacho meu, que o auctorizasse?

E se não encontrava despacho meu, por que motivo o Sr. Hintze Ribeiro, cujas relações pessoaes comigo eram excellentes n'essa epocha, não se me dirigiu perguntando-me acêrca de tão importante assumpto o que eu pensava e o que eu praticára?

Ora, o Sr. Hintze Ribeiro não fez nada d'isto, nem uma unica vez se referiu a este officio falando comigo muitas vezes, nem mesmo quando, como era natural, me fez a honra e me deu a prova de confiança de me pedir que fosse ao estrangeiro tratar da conversão da divida externa. Era certamente essa occasião bem opportuna.

O tempo ha de liquidar este negocio do officio... emquanto ás minhas responsabilidades ficam assim liquidadas.

É talvez o ultimo discurso que faço no parlamento. É tempo de descansar.

Posso ter errado, posso ter sido apaixonado em muitos actos da minha vida politica; sairei, porém, tendo conservado immaculada a minha honestidade e o profundo e sincero o meu amor pela Patria. É quanto me basta.

Peço a V. Exa. se digne consultar a Camara se permitte a publicação de todos os documentos por mim pedidos e que estão sobre a mesa.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Sr. Presidente: o illustre Deputado, o Sr. Fuschini, leu, da carta com que me honrou, a parte que julgou substancial; mas desde que o illustre Deputado trouxe ao Parlamento essa carta, não posso mais considerá-la uma carta particular, e tenho, portanto, o direito de me referir a ella, para justificar a forma por que este incidente se levantou agora.

Nessa carta, alem dos dois pedidos que S. Exa. agora leu e que eram, o de virem á Camara os documentos do tempo em que geriu a pasta da Fazenda, e o de se lhe dar á palavra na sessão de hoje para, acêrca d'esse assumpto, fazer as ponderações que julgasse convenientes, por constar não haver outra sessão, accrescenta S. Exa. o seguinte:

«Se a houver e V. Exa. entender util não confundir a discussão do convenio com este assumpto (seguem-se algumas palavras, que eu peço licença para não ler, por me não dizerem respeito, e porque não desejo aggravar o incidente) sujeito-me á opinião de V. Exa. pedindo-lhe apenas que declare o meu desejo e a acceitação da discussão».

Trago estes dois periodos da carta de S. Exa., para mostrar que o Sr. Fuschini desejando falar antes da ordem do dia sobre o assumpto, me deixava todavia a faculdade

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24 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

de, se eu entendesse não dever intercalar a discussão do convenio com as explicações que viesse dar, reservar para depois de votado o convenio essas explicações, na sessão de hoje. Não ha, portanto, uma violencia feita a S. Exa. porque mesmo o illustre Deputado me deixou a faculdade de determinar quando havia de falar.

(Aparte do Sr. Fuschini que não se ouviu).

Não era esse o meu intento. O que desejo é esclarecer este incidente em todos os seus pontos.

e resto, não podia suppor que S. Exa. me quisesse attribuir uma cousa que não podia estar nas minhas intenções, desde que S. Exa. terminava a sua carta dizendo: Sou de V. Exa. com toda a consideração - att.° ven. e obrig.º - Augusto Fuschini

A esta carta de S. Exa. respondi eu nos seguintes termos, que tambem vou ler á Camara, pois que já não é de maneira nenhuma carta particular:

«Recebo neste momento, 9 horas da manhã, a carta de V. Exa., de hontem á noite, e com a nota de muito urgente.

Vou pedir ao Sr. Ministro da Fazenda que leve á Camara os documentos a que V. Exa. se refere, para antes da ordem do dia, ou no final da sessão de hoje, em explicações, - o que para ordem dos trabalhos parlamentares será talvez preferivel, - dizer, em resposta a V. Exa., o que, de verdade, deva, como sempre timbro em fazer».

Sr. Presidente: esta foi a minha resposta ao illustre Deputado, e agora vou cumprir a minha promessa, como cumpro sempre, dizendo, com verdade, o que realmente se passou entre nós.

Ha um ponto da carta do illustre Deputado, que S. Exa deixou para ser por mim esclarecido, se eu o entendesse conveniente, mas a que não se referiu nas suas explicações, por melindres que eu respeito. É a referencia que fez a um boato qualquer, que não averiguo de onde veiu, e que me custa dizê-lo no Parlamento, mas que, repito, se encontra na carta de S. Exa. Essa referencia foi feita na seguinte phrase: que S. Exa. fôra posto fora do Ministerio por mim, quando tive conhecimento do officio, de 11 de setembro.

Não tenho na minha vida publica senão uma cousa que me encaminha e me determina: é o respeito pelas pessoas, e o sentimento da verdade. Direi, pois, que o Sr. Fuschini não saiu do Ministerio de 1893, affirmo-o de um modo absoluto, por motivo d'aquelle officio; saiu do Ministerio, como naquelle tempo se declarou, por divergencias com os seus collegas acêrca da marcha politica do Governo e acêrca da remodelação que naquella occasião se fazia. Esta é a verdade.

O Sr. Augusto Fuschini: - Muito obrigado.

O Orador: - Posto isto, vou responder ao mais que S. Exa. referiu.

S. Exa. invocou o meu testemunho asseverando que o regulamento da Junta do Credito Publico, de agosto de 1893, fôra a Conselho de Ministros, e que ali se approvara. Já hontem, numa interrupção feita ao Sr. Deputado Ressano Garcia, assim o confirmei. Não ha duvida; o regulamento da junta, de 1893, foi approvado em Conselho de Ministros.

Mas o que eu disse na sessão de hontem, foi que só tivera conhecimento do officio de 11 de setembro, apresentado nesta Camara pelo Sr. Arroyo, e mandado publicar, quando mais tarde o representante da Allemanha nesta Côrte perguntara ao Governo se confirmava a declaração inserida naquelle documento. Disse mais que então, entendendo, e creio que estou reproduzindo quasi textualmente as palavras que proferi na sessão de hontem porque S. Exa. não estava presente, entendendo, digo, que o acto, emanado da Direcção Geral da Thesouraria, era um acto do Ministerio da Fazenda, e que, dada a natureza do assumpto, o alcance, e a importancia d'aquella declaração, julguei dever meu confirmá-la.

Quaesquer que sejam as apreciações que se possam fazer acêrca da minha declaração, é certo que ella foi feita, e quando eu declaro o que é verdade, fico bem com a minha consciencia, e quando um homem publico está bom com a sua consciencia, está sempre bem. (Muitos apoiados).

Vamos agora ao ponto unico em que pode haver divergencia entre nós, - eu, e o illustre Deputado - ou antes entre as considerações feitas por S. Exa. e o que eu hontem declarei á Camara.

Perguntou S. Exa. ao Sr. Ministro da Fazenda se havia algum despacho seu que auctorizasse a expedição d'aquelle officio, e o Sr. Ministro da Fazenda, com inteira verdade, respondeu que, propriamente despacho, não havia; e não ha, realmente. D'ahi quis o illustre Deputado concluir, como concluiu, que fôra absolutamente entranho á expedição d'aquelle officio; e que, sendo elle de mero expediente, representava apenas a opinião de quem o tinha assignado, que foi o Director Geral da Thesouraria.

É neste ponto que divirjo; e tenho de divergir, desde que tomei sobre mim a responsabilidade de confirmar a declaração da Thesouraria, e desde que entendo que, embora S. Exa. diga ter sido absolutamente alheio á redacção d'esse officio, todavia, me cabia a mim, na comprehensão dos meus deveres de homem de Governo, a obrigação restricta de confirmar o que fôra declarado.

Neste ponto é que nós divergimos.

Não quero discutir com o illustre Deputado; quero simplesmente referir-me a factos, e deixo a cada um apreciar se procedi bem ou mal, quando confirmei aquella declaração que, no meu entender, era do Governo e que, como tal, não podia deixar de confirmar. (Apoiados).

Vou ler á Camara o documento a que S. Exa. se referiu na sua carta, porque nelle é que está a justificação dos meus actos, sem que as minhas palavras possam ter a intenção de um desmentido qualquer para com S. Exa. (Apoiados) na justa apreciação dos factos e das responsabilidades, porque S. Exa. entende que essas responsabilidades não são do chefe do Governo nem do Ministro da Fazenda, mas sim de um funccionario superior do Ministerio da Fazenda, funccionario aliás digno de todo o respeito e consideração. (Apoiados).

Sr. Presidente: em officio de 11 de agosto de 1893 o Banco de Darmstadt, dirigiu-se á Direcção Geral da Thesouraria; nem elle podia dirigir-se a outra entidade; a sua correspondencia não era directamente com o Ministro, correspondia-se neste assumpto com o Director Geral da Thesouraria e este trazia os officios que recebia do Banco ao Ministro para resolver.

Esse officio respeita ao artigo do regulamento da Junta do Credito Publico, porque o Sr. Fuschini, Ministro da Fazenda, entendeu e, repito, eu não commento nem aprecio, cito os factos e mais nada, entendeu que antes da publicação do regulamento da junta, de 1893, devia pôr-se em boa harmonia com o Banco do Darmstadt, acêrca dos termos em que esse regulamento devia ser formulado.

D'ahi veiu uma correspondencia entre o Banco de Darmstadt e a Direcção Geral da Thesouraria.

Pois com relação ao artigo 9.º do regulamento, diz o officio de 11 de agosto:

«Vous confirmez dans votre lettre et votre dépêche ce que nous avons regardé, dés le debnt, comme bien établi, c'est-à-dire, que le gouvernement portugais a l'intention, eu vertu de l'autorisation donnée par l'article 10° de la lei du 25 février 1892, de consigner maintenant, par décret rétablissant la junta, les recettes d'impôts d'importation, et d'exportation, sauf le tabac et, les céréales, aveo affectation au service de la dette d'État. Mais le réglement ne s'exprime pas à cet égard assez clairement pour être à la portée de l'intelligence de tout le monde. En conséquence nous jugeons nécessaire d'introduire dans cet arti-

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cle une formule, déclarant plus explicitement les prévisions ci-dessus».

Por consequencia, como a Camara vê, em 11 de agosto, quando o regulamento ainda não estava publicado, na correspondencia que se trocava entre o Banco de Darmstadt e o Sr. Fuschini, e da qual eu não tive conhecimento, o Banco de Darmstadt chamava a attenção do Governo para a consignação de receitas aduaneiras ao serviço da divida externa, invocando para isso a disposição do artigo 10.° da lei de 26 de fevereiro de 1892.

Este officio para a Direcção Geral da Thesouraria, não chegou ás mãos do Sr. Fuschini? Não se trata de correspondencia do Director Geral, mas do Governo com os representantes dos credores allemães? Deixo isso á consideração da Camara e não entro nesse assumpto.

Em seguida a este officio, num outro de 30 de agosto, veiu transcripto um telegramma, enviado pela Direcção Geral da Thesouraria ao proprio Banco de Darmstadt, e no final d'esse telegramma diz-se o seguinte:

«Par. 3 article 9° et article 19° est trés claire quant aux recettes pour service nôtre dette».

É exactamente aquelle que trata da consignação e da disposição pela qual elles não poderão ser applicados a outros fins.

Esta tinha sido a resposta da Direcção Geral da Thesouraria ao Banco de Darmstadt.

Num dos officios, o Banco de Darmstadt, transcrevendo esta resposta da Direcção Geral da Thesouraria, faz sobre ella as suas considerações. Neste officio está lançada a seguinte nota:

«Tire copia d'este officio para S. Exa., o Ministro».

E ha depois o registo de que uma copia foi tirada e levada a S. Exa em 7 de setembro de 1893.

Presumi por isso, - bem ou mal, qualquer o presumiria - que o Ministro da Fazenda tinha tido conhecimento d'esta correspondencia trocada entre o Director Geral da Thesouraria e o Banco de Darmstadt.

Desde que d'estes officios, que acabo de ler, e dos telegrammas da Direcção Geral da Thesouraria se tinham mandado tirar copias para o Ministro da Fazenda, que era o Sr. Fuschini, copias que foram effectivamente tiradas, S. Exa. houve pleno conhecimento do assumpto; foi a minha deducção. Mas posso ter errado.

Acresce que, ainda a 28 de setembro, o Banco de Darmstadt, num novo officio para a Direcção Geral da Thesouraria, dizia:

«Nous prenons acte de vetre déclaration portant que, en vertu du réglement de la Junta do Credito Publico, les droits d'importation et exportation (tabaes et céréales exceptés) doivent être consignés en affectation au service de la dette d'État portugaise. Mais nous ne pouvons nous empêcher de répréter que le texte même du réglement n'est pas assez clair à cet égard pour être compris de tout le monde. Nous nous réservons de revenir à cette affaire après avoir entendu les membres de notre comitê».

Isto foi o que encontrei, o que está no officio.

Já vê a Camara, se a correspondencia que houve com o Banco de Darmstadt num assumpto tão importante, como era o regulamento de serviço da divida, pode ser considerada uma cousa do mero expediente do Director Geral da Thesouraria, em que elle expressava a sua opinião e não as ordens que recebia do Ministro respectivo.

Mas para que não houvesse duvidas, o illustre Deputado disse que foi estranho aos officios que eram do mero expediente. Eu li os officios para que a Camara pudesse fazer o seu juizo, se effectivamente eram ou não de mero expediente. Não entro nessa apreciação; deixo-a ao juizo de cada um; mas devo dizer que os Ministros, como é natural, teem sempre conhecimento de todos os officios trocados e são elles que auctorizam a expedição dos que saem das secretarias.

Observou ainda o Sr. Fuschini que só tres meses depois é que o Ministro da Allemanha tinha vindo fazer a pergunta. Porque não a fizera, quando era Ministro da Fazenda o illustre Deputado?

stá S. Exa. muito enganado. A pergunta foi feita e apresentada pelo Sr. Conde de Bray quando o illustre Deputado era Ministro da Fazenda. Foi feita em 13 de dezembro e em 15 de dezembro, num officio assignado por num, que era então Ministro dos Negocios Estrangeiros, e dirigido a S. Exa., eu lhe pedia informações, que me habilitassem a responder.

Este officio, segundo a declaração que tenho aqui, deu entrada em 18 de dezembro e só em 20 de dezembro o Sr. Fuschini deixou de ser Ministro da Fazenda.

Portanto a pergunta foi feita, sendo ainda Ministro da Fazenda o Sr. Fuschini, e eu officialmente communiquei-a ao illustre Deputado, quando S. Exa. ainda era Ministro da Fazenda, pedindo-lhe informações para poder responder.

O que aconteceu, é que, dois dias depois, a 20 de dezembro, S. Exa. saia do Ministerio sem ter habilitado o seu successor, a poder responder, como devia.

Quando tomei a gerencia da pasta da Fazenda, tive então conhecimento do estado em que se encontrava a questão, pelos documentos que me foram apresentados pelo Sr. Perestrello, e tive de me conformar com o que se havia feito, e fazer a declaração que fiz.

Aqui tem o illustre Deputado a resposta ás considerações que fez.

Repito; longe do meu espirito, o contestar actos, ou desmentir factos.

Não é essa a minha intenção.

Creio ter dado ao Parlamento as explicações que poderia dar sobre o assumpto, e cumprido a promessa que fiz ao illustre Deputado, de dizer toda a verdade, como é sempre o meu costume.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Fuschini: - Peço que sejam publicados todos os documentos que me foram enviados do Ministerio da Fazenda.

O Sr. Presidente: - Peço a attenção da Camara. O Sr. Deputado Arroyo pediu a palavra, mas não lh'a posso conceder sem que isso me seja auctorizado. Vou, pois, consultar a Camara.

Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.

O Sr. João Arroyo: - Sr. Presidente: confesso que, pela primeira vez, me sinto embaraçado no Parlamento.

Levanto-me para responder a uma phrase da carta que, como acabo agora de saber, foi dirigida pelo Sr. Fuschini ao Sr. Presidente do Conselho, phrase em que aquelle Sr. Deputado se refere a mim.

Como já disse, confesso que, pela primeira vez, me acho embaraçado, porque, por um lado, não posso abdicar, já não direi, do meu direito de falar, mas do meu dever de falar neste momento; e, por outro lado, enleia-me o facto de, quando eu falo, ver S. Exa., pela segunda vez, sumir-se pela porta fora.

Devo dar uma explicação a todos os membros do Parlamento, e devo-a, Sr. Presidente, porque nunca, desde a primeira vez que me sentei nestas cadeiras, da minha boca saiu uma palavra que pudesse ser considerada como impropria da Camara. (Muitos apoiados).

Como o Sr. Deputado Fuschini saiu, e eu quero conciliar a necessidade da minha exposição, com a situação de ter de falar não estando elle presente, eu empregarei na primeira parte das minhas declarações, a suavização de palavras necessaria para eu legitimamente as poder proferir na sua ausencia.

Não posso levar mais longe os extremos da minha delicadeza para com elle.

Como já disse, é absolutamente inexacto que eu proferisse qualquer termo ou palavra impropria do Parlamento. (Apoiados). Não appello já para a mesa presidencial; ap-

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pello para a memoria de todos que me escutam. (Apoiados).

Quanto ao Sr. Deputado que, tendo proferido essa phrase, acaba de sair, limito-me a repellir essa phrase, porque infelizmente, nenhum outro procedimento seria legitimo da minha parte.

Peço aos Srs. tachygraphos que sublinhem o adverbio que acabo de empregar.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Sr. Ressano Garcia: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que eu use da palavra.

Consultada a Camara, resolveu, affirmativamente.

O Sr. Ressano Garcia: - Sr. Presidente: não posso deixar de me associar ás palavras do Sr. Presidente do Conselho, quando fez o elogio merecido do distincto Director Geral da Thesouraria. (Apoiados).

Posso dar testemunho á Camara de que o Sr. Perestrello é um funccionario modelo, extremamente cauteloso. (Apoiados).

Como fui Ministro da Fazenda com aquelle funccionario, não quis deixar, por parte da opposição, de acompanhar o elogio que merecidamente lhe fez o Sr. Presidente do Conselho.

Julgo que a Camara não se oppõe a que sejam publicados os documentos a que se referiu o Sr. Fuschini; mas eu peço mais: peço que alem d'esses documentos se publique tambem a informação que o thesoureiro do Ministerio da Fazenda deu, acêrca da nota allemã do Ministro nesta Côrte, e que o Sr. Presidente do Conselho disse ter recebido em 17 de dezembro.

Se o Governo reconhece não haver inconveniente, peço a publicação d'esse documento.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - É para dizer a S. Exa. que nenhum inconveniente tenho na publicação pedida pelo illustre Deputado.

S. Exa. sabe que, em 1898, esse documento, que é a informação da Thesouraria, foi apresentado na Camara dos Pares. Não se publicou então, mas se S. Exa. deseja que se publique agora, eu accedo do melhor grado, e tanto mais quanto, pela minha parte, não engeito responsabilidades.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Sousa Tavares: - Por parte da commissão de redacção envio para a mesa a ultima redacção do projecto de lei n.° 67.

O Sr. Presidente: - Vae ser remettida á Camara dos Dignos Pares.

A primeira sessão é na segunda feira de manhã, devendo fazer-se a primeira chamada ás 10 e meia horas e a segunda as 11. A ordem do dia é a mesma que estava dada, e mais os projectos n.ºs 86 e 88, começando a discussão pelo projecto n.° 88, caminho de ferro de Bragança.

Está encerrada a sessão.

Eram 7 horas e 35 minutos.

Representações enviadas para a mesa nesta sessão

1.ª Do Syndicato Agricola de Reguengos, contra a restricção da planta do vinho.

Apresentada pelo Sr. Presidente da Camara, enviada á commissão de agricultura e mandada publicar no Diario do Governo.

2.ª Da Associação Industrial Portuense, contra o projecto de conversão da divida externa.

Apresentada pelo Sr. Presidente da Camara e enviada á commissão de fazenda.

3.ª Da Camara Municipal de Macedo de Cavalleiros, pedindo a approvação do Caminho de Ferro de Mirandella a Bragança.

Apresentada pelo Sr. Deputado Alberto Charula, enviada á commissão de obras publicas e mandada publicar no Diario do Governo.

4.ª Dos empregados dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste o Minho e Douro, pedindo um augmento nos seus vencimentos com as sobras e receitas fora do trafego.

Apresentada pelo Sr. Deputado Joaquim de Sant'Anna, enviada á commissão de obras publicas e mandada publicar no Diario do Governo.

5.ª Representação da Camara Municipal do concelho de Ancião, pedindo para que na proposta de lei n.° 19-D, sobre o imposto do real de agua, seja permittido ás camaras municipaes lançar percentagens ás taxas de licença cobradas pelo Estado, ou substituir o imposto sobre os generos de consumo, por licenças ou taxas analogas ás do Estado.

Foi mandada enviar á commissão de fazenda.

O redactor = Affonso Lopes Vieira.

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APPENDICE Á SESSÃO N.º 65 DE 26 DE ABRIL DE 1902 27

Discurso proferido pelo Sr. Deputado José Dias Ferreira, que devia ler-se a pag. 17 da sessão n.° 65 de 26 de abril de 1902

O Sr. Dias Ferreira: - Senhor Presidente, começo pela leitura da minha moção de ordem:

«A Camara reconhecendo que a providencia em discussão reclama sacrificios de dinheiro e de dignidade que os representantes da nação não podem acceitar, passa á ordem do dia. = Dias Ferreira.»

Senhor Presidente, permitta-me V. Exa. que antes de mais nada eu dirija, os meus cumprimentos ao illustre relator da commissão pelo calor e enthusiasmo com que conta á Camara que os nossos credores foram extremamente amaveis com Portugal.

Realmente estamos no costume de fazer tudo quanto querem os credores externos.

É pedirem por boca.

Pediram em tempo a consignação dos tabacos. Deu-se-lhes.

Pedem agora a consignação dos reditos das alfandegas. Dá-se-lhes.

Collocaram-nos na situação dolorosa e cruel de lhes remettermos de aqui dentro em quinze dias as receitas das alfandegas transformadas em ouro, quando a nossa moeda é papel e com curso forçado.

Nós estivemos por tudo.

E não haviam de ser amaveis comnosco os credores externos? Era o que faltava!

Agora quando pedirem a consignação colonial, que Portugal ha de acceitar e agradecer, conto que hão de ser tambem extremamente amaveis para comnosco!

Nem outra cousa era de esperar de gente bem educada.

Mas, Sr. Presidente, o que se não diz no relatorio do Governo nem no parecer da commissão é como se paga o convenio. (Apoiados). E aqui é que está a questão.

Não vamos fazer a rehabilitação do país, como outro dia affirmava o Sr. Presidente do Conselho. Pelo contrario. Vamos assignar um titulo de confissão de divida com consignação de rendas. Agora é que começa a obrigação garantida. A liquidação virá depois! (Apoiados).

Não vamos rehabilitar o país, vamos compromettê-lo, e com tanta maior crueldade, que não sabemos de onde hão de vir os recursos para elle se desempenhar dos compromissos a que o sujeitámos!

Não nos preoccupamos com os recursos necessarios para as despesas de soberania e para as despesas de civilização!

Limitamo-nos a assegurar, com prejuizo de todos os mais serviços, o pagamento dos encargos com os credores estrangeiros!

Quer o Governo reorganizar a magistratura judicial, acabando por completo com todos os nossos desembargadores e com os juizes de direito, e substituir tudo pelos Juizes da vintena da antiga monarchia?

Na instrucção publica quer o Governo prescindir de todo o ensino official?

Quer tambem o Governo acabar com as guardas de segurança, e com o exercito como instituição militar, e substituir tudo pelo cabo de policia?

Reorganizando ou desorganizando assim os serviços ha é vontade para pagar a divida externa, e satisfaz-se o nosso ideal e a nossa unica aspiração de hoje que é trazer contente o credor externo!

Mas como surgiram circumstancias que nos sujeitam ás ultimas violencias, inclusivamente á de remetter para o estrangeiro dentro de quinze dias, haja ou não haja ouro a preço razoavel, esteja ou não o cambio a 100 ou a 300 por cento como já esteve na Republica Argentina, os rendimentos das alfandegas transformados em ouro?

O illustre relator da commissão veiu com uma ideia nova que muito ha de facilitar o pagamento de tão extraordinarios encargos, e que vem a ser a probidade do povo português.

Effectivamente a ideia é luminosa. Com o grande stock de probidade que ahi temos pode pagar-se ao estrangeiro até por inteiro, 1/4 em dinheiro e 3/1 num cartão de probidade! (Riso).

Sr. Presidente, eu não posso transigir com tal systema, que é muito do Sr. Ministro da Fazenda, o qual com uma tranquillidade de animo que eu lhe não invejo se entreteve durante quasi l hora a discutir um convenio que já morreu, e que morreu ás minhas mãos!

O Sr. Ministro da Fazenda, seguindo no caminho dos seus antecessores e dos seus alliados, affirmou que todas as nossas difficuldades financeiras nasceram das minhas providencias de reducção das despesas!

Attribue assim a um homem só todas as perturbações financeiras do país! (Riso).

Eu comprehendo bem o pensamento patriotico dos meus illustres adversarios, aproveitando-se dos meus serviços, e impondo-me todas as responsabilidades. (Riso).

É certo que os estrangeiros não gostaram, como não gostaram os nacionaes, de lhes serem reduzidos os juros.

Ora com a minha saida do Governo coincidiu uma circumstancia muito extraordinaria, que foi o augmento successivo das despesas!

Em todos os paises onde se reduzem os juros da divida publica é obrigação dos Governos seguir d'ahi por deante uma vida tão austera, que colloque a nação ao abrigo da repetição de semelhantes desastres.

Ora em Portugal succedeu precisamente o contrario!

As despesas, que eu encontrei em 55 000:000$000 réis, deixei-as, com a reducção dos juros e com outras providencias economicas, ao sair do Governo em começos de 1893 na somma de 45.000:000$000 réis.

Pois tres annos não eram decorridos quando estavam já em 60.000:000$000 réis!

Não haveria credores que supportassem tal procedimento aos Estados seus devedores!

Ainda mais.

Mal se tornava definitiva a reducção dos juros em 1893, e logo em 1894 se projectava um grande emprestimo sobre os rendimentos coloniaes, e já em 1896 se propunha uma conversão em que a troco de um emprestimo se davam tambem quantias fabulosas aos credores externos!

Por isso hoje estamos mil vezes peor do que em 1892!

Em 1892 não estava ainda esgotado o contribuinte. Hoje de que recursos ha de o Governo lançar mão para pagar os novos encargos com a divida externa e para custear despesas com os constantes e interminaveis jubileus?

O peor em todo o caso, porque ahi os males são irremediaveis, é o convenio.

Que o Governo em vez de 400 nomeie 4:000 inspectores de instrucção primaria, que em vez de 700 no-

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meio 7:000 fiscaes de impostos, que em vez de l nomeie 10 inspectores de aguas mineraes, que em vez de uma crie dez universidades de pharmacia, que em vez de mais 10 ou 12 crie mais 110 ou 112 professores para as escolas superiores, não é isso que compromette irremediavelmente a situação financeira, pois que todas essas reformas no dia em que o país tiver Governo desapparecem com um traço de penna. (Apoiados}.

O que pode prejudicar a nossa vida financeira e mesmo a nossa autonomia politica são os contratos com o estrangeiro em que tomamos compromissos sem a certeza de os poder cumprir.

Se o Thesouro tem pago e vae pagar mais do que o terço é porque eu não pude vencer difficuldades internas para fazer o convenio pelo terço, porque não podia lutar contra os poderes constituidos.

As difficuldades externas venci eu todas.

O vencido foi o país, e os vencedores foram os responsaveis pela desgraçada administração que nos levou a uma bancarota, o que estão preparando as cousas com novos augmentos de despesas para outro desastre.

Pois não desistem de attribuir ao decreto de reducção dos juros as desgraças de que só foi causa uma administração sistematicamente perdularia.

Mas o Sr. Ressano Garcia, que teve occasião de ver os documentos, como membro que então era da commissão de fazenda, ou porque lhe doesse a consciencia, ou por qualquer outra circumstancia, pôs á mostra a responsabilidade dos regeneradores, e nomeadamente do Sr. Presidente do Conselho, em sessão de 22 de junho de 1893.

É claro que não ficaram contentes com a reducção do juro ao terço os credores, o que lutaram como puderam contra as medidas do Governo.

Mas eu reputava de salvação publica aquella providencia, que ninguem deixará de applaudir desde que se transporte á epoca em que ella foi decretada.

O país tinha então para pagar uma despesa de réis 55.000:000$000 a receita de 37.000:000$000 réis, estavam-lhe fechados os mercados, e depois da operação dos tabacos não podia mais levantar dinheiro por emprestimo nem caução.

O deficit de gerencia subira a mais de 10.000:000$000 réis.

O certo é que a reducção do juro ao terço teria salvo a nação de quaesquer perturbações e contratempos economicos e financeiros, se continuasse o systema de administração por mim inaugurado em 1892.

Mesmo que com a publicação do decreto se nos fechassem as Bolsas da Europa, como em 1852 se fechou a Bolsa de Londres unica onde estavam cotados os nossos titulos, nenhum perigo corria o país, e apenas correria perigo o Gabinete.

Como nas suas revelações o Sr. Ressano Garcia affirmasse que o Sr. Hintze Ribeiro começara por offerecer um quarto ao credor externo, eu trouxe o assunto ao debate nesta Camara.

O Sr. Hintze Ribeiro em discurso de 13 de abril de 1896, proferido na sala da bibliotheca da Academia Real das Sciencias, e com applausos ruidosos que estão em praxe nas assembleias independentes, não se atreveu a negar, respondendo apenas, com a costumada retaliação, que melhor era começar por offerecer um quarto, do que offerecer 50 por cento e depois reduzir o offerecimento ao terço!

(O orador não foi ouvido convenientemente na mesa aos tachygraphos).

A Allemanha contestou desde sempre ao Governo o direito de regular a divida externa, que considerava como contrato bilateral, que não podia ser alterado sem a acquiescencia de todos os interessados.

Mas a final o Ministro allemão, depois de oito meses de diligencias empregadas pelo Governo para desfazer a nota violenta em que elle nos ameaçara com a intervenção collectiva das potencias, já se resignava com a reducção do juro da divida ao terço com a condição de entrar em novo acordo com os credores.

Mas eu não podia iniciar o acordo com as Côrtes abertas, porque a paixão politica tinha desvairado a opposição até o ponto de se sustentar que ao Thesouro custava mais o terço do que metade. Não teria sentido estar eu no meu gabinete a offerecer o terço apenas ao credor externo, e ao meu lado no exercicio pleno das suas funcções a representação nacional a sustentar que devia pagar-se metade.

Pedi portanto um curto adiamento de Côrtes, adiamento que ha muitos annos é considerado negocio de expediente, como acto de expediente é de ha muito considerada a dissolução das Côrtes.

O adiamento porem foi me negado, o que determinou a demissão do gabinete, e em seguida concedido aos meus successores.

Mando para a mesa a carta do Ministro da Allemanha, e peço a V. Exa. o favor de a mandar archivar nas repartições d'esta Camara.

Sr. Presidente, termino dizendo á Camara que mais de uma vez no periodo já longo e bem longo da minha profissão tenho visto o devedor, ao assinar escritura de hypotheca especial e dos seus bens em geral, humedecendo com lagrimas o papel onde põe a sua assinatura!

Hoje assistirei ao doloroso espectaculo das alegrias de uma Camara verdadeiramente portuguesa no acto de ligar a responsabilidade da nação inteira a um convenio que só Deus sabe se o país pode cumprir, e que em todo o caso em muitas occasiões só poderá cumpri-lo com lagrimas de sangue!

Tenho dito.

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