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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO EM 2 DE ABRIL DE 1864

PRESIDENCIA DO SR. CESARIO AUGUSTO DE AZEVEDO PEREIRA

Secretarios os srs.

Miguel Osorio Cabral

José de Menezes Toste

Chamada — Presentes 61 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs. Adriano Pequito, Affonso Botelho, Garcia de Lima, Annibal, Braamcamp, Abilio, Ayres de Gouveia, Quaresma, Brandão, Mazzioti, Mello Breyner, Antonio Pequito, Pinheiro Osorio, Magalhães Aguiar, A. V. Peixoto, Zeferino Rodrigues, Barão da Torre, Barão do Vallado, Barão do Rio Zezere, Abranches, Carlos Bento, Cesario, Cypriano da Costa, Poças Falcão, Coelho do Amaral, Fernandes Costa, Borges Fernandes, F. L. Gomes, F. M. da Costa, F. M. da Cunha, Sant'Anna e Vasconcellos, Mendes de Carvalho, J. A. de Sousa, Mártens Ferrão, Nepomuceno de Macedo, Aragão Mascarenhas, Sepulveda Teixeira, Albuquerque Caldeira, Matos Correia, Mello e Mendonça, Neutel, Faria Guimarães, Fernandes Vaz, Alves Chaves, Costa e Silva, Frasão, Sieuve de Menezes, Menezes Toste, José de Moraes, Camara Falcão, Levy Maria Jordão, Camara Leme, Alvos do Rio, Manuel Firmino, Sousa Junior, Murta, Pereira Dias, Miguel Osorio, Modesto Borges, Placido de Abreu, Ricardo Guimarães e Teixeira Pinto.

Entraram durante a sessão — Os srs. Vidal, Soares de Moraes, Sá Nogueira, Correia Caldeira, Gonçalves de Freitas, Ferreira Pontes, A. Pinto de Magalhães, Arrobas, Fontes Pereira de Mello, Pereira da Cunha, Lopes Branco, A. de Serpa, Palmeirim, Barão de Santos, Garcez, Freitas Soares, Albuquerque e Amaral, Almeida e Azevedo, Beirão, Ferreri, Conde da Torre, Fernando de Magalhães, Fortunato de Mello, Bivar, Izidoro Vianna, Cadabal, Gaspar Pereira, Guilhermino de Barros, Henrique de Castro, Medeiros, Blanc, Gomes de Castro, João Chrysostomo, Fonseca Coutinho, J. J. de Azevedo, Calça e Pina, Joaquim Cabral, J. Coelho de Carvalho, Rodrigues Camara, J. Pinto de Magalhães, Lobo d'Avila, Sette, Figueiredo Faria, Luciano de Castro, Alvares da Guerra, Silveira e Menezes, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Batalhes, Mendes Leal, Julio do Carvalhal, Freitas Branco, Rocha Peixoto, Mendes Leite, Vaz Preto, Marianno de Sousa, Monteiro Castello Branco e Visconde de Pindella.

Não compareceram — Os srs. A. B. Ferreira, Mais, Antonio Eleutherio, Gouveia Osorio, Seixas, Lemos e Napoles, Pinto de Albuquerque, David, Barão das Lages, Oliveira e Castro, Bispo Eleito de Macau, Cyrillo Machado, Pinto Coelho, Almeida Pessanha, Claudio Nunes, Conde da Azambuja, Domingos de Barros, Drago, Barroso, Abranches Homem, Diogo de Sá, Ignacio Lopes, Gavicho, Bicudo, Pulido, Chamiço, Gaspar Teixeira, Pereira de Carvalho e Abreu, Silveira da Mota, Costa Xavier, Ferreira de Mello, Torres e Almeida, Simas, Veiga, Gama, Galvão, Infante Pessanha, José Guedes, D. José de Alarcão, J. M. de Abreu, Casal Ribeiro, Latino Coelho, Rojão, Affonseca, Moura, Alves Guerra, Pinto de Araujo, Charters, R. Lobo d'Avila, Moraes Soares, Fernandes Thomás, Simão de Almeida, Thomás Ribeiro e Vicente de Seiça.

Abertura — Ao meio dia e tres quartos.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

1.º Um officio da camara dos dignos pares, acompanhando a relação dos projectos de lei, que lhe foram enviados por esta camara, e ali approvados. — Inteirada.

2.º Do ministerio da justiça, acompanhando o mappa estatistico, pedido pelo sr. Garcia de Lima, das congruas arbitradas aos parochos; e participando que opportunamente serão enviados os outros esclarecimentos pedidos pelo mesmo sr. deputado sobre os benesses recebidos pelos parochos. — Para a secretaria.

3. Do ministerio da marinha, devolvendo informado o requerimento do primeiro tenente da armada Joaquim Romão Lobato Pires. — Á commissão de marinha.

Foram approvadas as ultimas redacções dos projectos de lei n.ºs 159 de 1863, 29 de 1864 e 70 de 1861.

O sr. Presidente: — Continua a discussão do projecto de lei n.° 132 de 1861.

O sr. Coelho do Amaral: — Sendo eu um dos signatarios do parecer em discussão, e não se achando presente o illustre relator d'este parecer, entendi que não devia deixar correr a sua discussão, sem apresentar os fundamentos com que a commissão se auctorisou para o formular. E aproveito a occasião para responder ao meu antigo amigo o sr. José de Moraes, que hontem entendeu que a camara não devia tomar em consideração as reclamações que se apresentam aqui por parte de povos que desde ha muito estão soffrendo grandes vexames com a divisão territorial, com o fundamento, dizia o meu illustre amigo, de que a divisão territorial não deve ser feita á retalho, mas sim em globo. Ha dez annos que se fez a divisão territorial, da qual resultaram, como v. ex.ª e a camara toda sabe, pelas muitas representações que têem vindo a esta camara, grandes vexames. Ha dez annos, digo, que os povos estão expondo em representações os males que lhes resultam da actual divisão territorial; e se porventura nós esperarmos por uma medida geral, poderemos talvez esperar outros dez annos, sem que se reparem os inconvenientes que motivam as queixas dos povos.

Ha na divisão territorial feita em 1855 absurdos, anomalias, e até mesmo disparates, que não podem justificar-se e não podem attribuir-se senão a lapsos dos individuos que foram encarregados então da divisão territorial, mas a que nós não podemos deixar de attender para lhe dar o devido remedio. Ha, por exemplo, freguezias que foram destacadas de concelhos e encorporadas em outros, ficando aliás rodeadas por todos os lados de terras pertencentes aos concelhos donde foram desannexadas! Ainda ha pouco aqui se votou um parecer da commissão de estatistica, que justifica o que acabo de dizer, e em breve pedirei á camara que tambem admitta á discussão um outro parecer de uma freguezia que está exactamente nas mesmas circumstancias. Ha concelhos, como por exemplo o do Sabugal, de uma extensão de 9 leguas ou 40 a 50 kilometros, onde os povos das suas extremidades têem, para satisfazer a deveres de pequena importancia, como por exemplo ao pagamento de contribuições geraes e municipaes, de contribuições de 40, 60, 80 e 100 réis, têem, repito, de fazer dois e tres dias de jornada; e isto traduz-se em um grande desperdicio de tempo, em um imposto onerosíssimo para estes povos; traduz se n'um disparate que não tem justificação.

Pergunto eu, e dever-se-ha esperar por uma medida geral, para se remediarem os prejuizos que estão soffrendo os povos, e de que ha muito tempo deviam ter sido alliviados? Não póde ser, e a camara compenetrada da necessidade de resolver os males que estão soffrendo os povos, não póde deixar de attende-los, e n'este caso estão os extinctos concelhos de Palmella e de Azeitão, aos quaes se refere o parecer em discussão, que separados por uma grande distancia, e por maus caminhos, do concelho de Setubal, estão soffrendo nas suas relações graves transtornos, e pedem a sua reconstrucção.

O antigo concelho de Palmella, assim como o de Azeitão, têem pessoal mais que sufficiente para exercer todos os cargos municipaes; têem meios para viver uma vida propria, e portanto querem vive-la, e não póde recusar-se-lhes um deferimento favoravel á sua pretensão.

A opinião de que os concelhos deviam ser grandes já passou, caiu. Entendia-se que com os grandes concelhos se poderiam proporcionar maiores vantagens aos povos; mas a experiencia tem mostrado o contrario. Os grandes concelhos podiam aproveitar ás suas cabeças, nas quaes se absorvem os meios e a vida d'elles, ficando as extremidades completamente esquecidas, e logrando apenas algum favor, ou alguma attenção quando podem eleger um vereador seu. De contrario são inteiramente esquecidas.

Tudo isto sabe-o a camara, e portanto escuso de cansar a sua attenção, porque é obvio e de uma intuição completa que os grandes concelhos, estão produzindo resultados contrarios aquelles que se esperavam com a divisão feita em 1855, e quando preponderava a opinião das grandes circumscripções. Sejam concelhos, sejam familias, quando o quizerem ser; mas onde houver meios para satisfazer aos encargos municipaes, e onde houver pessoal para exercer os cargos necessarios, ahi devem estabelecer o concelho ou familia.

Portanto a commissão de estatistica, compenetrada d'estas, idéas, tem apresentado já e continuará a apresentar alguns pareceres, porque esperando pela divisão em globo, não findara as grandes difficuldades que ha a superar antes que essa medida se possa realisar.

A commissão de estatistica entende que não deve desattender por mais tempo estas reclamações de uma instante e urgente reparação, que os povos estão apresentando todos os dias, e neste sentido eu entendo que a camara não póde tambem deixar de attender e approvar o parecer, que está em discussão, assim como outros que se apresentarem, para os quaes desde já peço a mesma attenção, pelos motivos que acabo de expor.

O sr. Annibal: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara, se a materia está discutida.

Consultada a camara verificou-se não haver vencimento.

O sr. Abilio da Costa: — Cumprindo o regimento, principio por mandar para a mesa uma moção de ordem que passo a ler. A minha moção é de justiça tão obvia que me julgo dispensado de a sustentar.

Coherente com as idéas que sempre tive a respeito da divisão territorial, approvo o projecto para serem reconstruídos os concelhos de Palmella e Azeitão. Em 1854 e 1855 combati na junta geral de districto de Coimbra, na imprensa e n'esta casa, a divisão de territorio que existe hoje no paiz. Tenho muito respeito pelos municipios, que considerava uns baluartes da liberdade, e o meu respeito crescera sempre quando considerava que os nossos réis nunca lhe tocaram, quando neste paiz se estabeleceu o absolutismo systematicamente, e que a mesma revolução franceza os acatara quando durante os seus delírios nem aos mortos poupara.

Fez-se a divisão de territorio creando grandes concelhos, porque se esperava que as despezas municipaes diminuiriam, que os municipios obteriam mais facilmente meios com que podessem emprehender melhoramentos, e que a administração melhoraria havendo nos concelhos grandes mais pessoal habilitado para os cargos municipaes: estas esperanças não se realisaram, e os grandes concelhos o que trouxeram aos povos foi grandes encommodos e vexames, obrigando-os a vir de grandes distancias ás capitaes dos grandes concelhos para satisfazer suas necessidades, e a perder grande numero de dias, o que importa uma pesada contribuição.

As despezas municipaes em nada diminuiram. Os administradores do concelho e escrivães da camara, tendo de occupar-se com mais assiduidade do serviço publico e não podendo entregar-se a outras occupações, exigiram maiores ordenados e gratificações, e estão ainda hoje exigindo amanuenses, de sorte que a despeza hoje de qualquer municipio é muito maior que era a de todos os municipios que concorreram para a sua construcção. Salvas poucas excepções os melhoramentos materiaes têem sido nenhuns, porque aos municipios grandes faltam lhes os meios como faltavam aos pequenos. Os expostos absorvem todas as rendas municipaes, as derramas são pesadas, as camaras pouco podem fazer, e quando de alguma cousa podem dispor em regra geral, applicam-na ás capitaes dos concelhos, emquanto as outras povoações careceram de fontes e calçadas. Quem se quizer desenganar os melhoramentos materiaes que trouxe aos povos a divisão de territorio, percorra os concelhos extinctos e verá o estado de ruinas em que se acham as calçadas e fontes até das proprias capitaes dos antigos concelhos.

Quanto ao pessoal governante, embora seja maior de direito, os factos mostrára que é o mesmo nos concelhos ruraes, ou estes sejam grandes ou pequenos.

Os vereadores eleitos para as differentes vereações são em regra geral, com poucas excepções, tirados das villas ou das suas vizinhanças, e muito poucas vezes das freguezias que distam das capitaes dos concelhos mais de 5 kilometros; não o consentem os habitantes das villas, que têem sempre maior influencia, e desejam monopolisar a governança por interesses muitos variados, nem tambem os elegiveis das freguezias remotas procuram ser eleitos, antes fogem a isso para se livrarem dos incommodos que trazem as vereações, do sorte que, por um accordo tacito de uns e de outros, poucas vezes os vereadores são tirados das freguezias que distam mais de 5 kilometros da capital do concelho, e a roda dos elegiveis fica de facto sendo a mesma no concelho que tem só 1 legua de raio, que n'aquelle que tem 2, 3 e 4 leguas.

Mas como os negocios a tratar e as questões a resolver nos concelhos muito extensos são mais numerosos e difficeis, e precisam mais actividade, intelligencia e assiduidade que nos concelhos menos extensos, resulta d'aqui que a administração nos concelhos maiores é menos bem gerida que nos concelhos mais limitados, e isto que a rasão nos mostra é hoje confirmado pelos factos. Para bem gerir a administração de alguns concelhos tão extensos que hoje existem no paiz, seria necessario grande intelligencia e grande actividade, e seria preciso que os vereadores deixassem as suas occupações ordinarias para se dedicarem ao serviço publico; mas isto não se póde esperar de empregos gratuitos, e eis-aqui a rasão por que a administração nada tem ganhado com a grande extensão dos concelhos, antes tem perdido.

Mas por estas mesmas considerações não se acredite que eu quero que de cada freguezia se forme um concelho; inda hoje ha concelhos que eu creio poderiam ser supprimidos sem inconveniente algum, e talvez sem opposição de seus habitantes; mas quando elles queiram continuar em municipios distinctos, e se prestem a satisfazer o augmento da despeza que d'ahi possa resultar, para que havemos estar a violenta-los? Para que havemos fazer-lhes um beneficio que elles não aceitam?

A minha opinião, sr. presidente, é que o municipio não deve ter um raio maior de 5 kilometros, para que o cidadão n'um só dia possa ir á capital do concelho tratar dos seus negocios e voltar para sua casa. Agora a comarca ou julgado entendo que póde e deve ser maior sem grande incommodo dos povos; porque a justiça não é necessaria a todos, mas só áquelles cujos direitos são atacados. Entendo que a justiça póde estar longe da porta, mas não assim a administração; e não vejo inconveniente em uma comarca ou julgado ser composta de dois ou mais concelhos.

A camara está impaciente, e eu terminarei aqui as minhas considerações.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Começo por me felicitar pela resolução que a camara acaba de tomar, estabelecendo o bom precedente de não se julgarem as materias discutidas antes de o estarem na realidade.

Vou mandar para a mesa uma moção de ordem, a qual é concebida nestes termos (leu).

Este projecto appareceu aqui desacompanhado inteiramente de informações. Todos sabem que ha nesta camara alguns deputados que pertencem a outras provincias do reino, e que não sabem o que se vae votar por meio deste projecto; não sabem em que condições se acha este concelho, nem que rasões influiram para a suppressão dos concelhos de que se trata.

Trata-se de divisão administrativa, e trata-se de divisão judicial; foi porventura ouvido o sr. ministro da justiça? Apresentou s. ex.ª as considerações que lhe suggeriram as auctoridades administrativas e judiciaes?

Foi ouvido o procurador geral da corôa e as outras auctoridades competentes sobre as conveniencias de serviço judicial?

Foi ouvido o sr. ministro do reino sobre as conveniencias administrativas? Apresentou s. ex.ª as informações do governador civil de Lisboa? Foi ouvido o administrador do concelho de Setubal? Foi ouvida a respectiva camara municipal? Não se apresentaram, nem se allude ás informações das auctoridades competentes, e quer-se ir votar o restabelecimento destes dois concelhos!

A minha proposta de adiamento portanto tende a habilitar a camara com as informações necessarias para se julgar uma materia d'esta importancia; e digo d'esta importancia, porque quando se trata de alterar a divisão territorial não é uma questão de localidade, não é uma questão de interesse de um só concelho ou de uma só freguezia; é uma questão de interesse geral, porque a questão da divisão territorial faz parte do systema geral de administração publica, em que não se póde mexer de leve.

O governo e a commissão que inauguraram a divisão territorial publicada no decreto de 24 de outubro de 1855 não procederam a capricho nem arbitrariamente: podiam errar; mas o que é certo é que procuraram obter informações das competentes auctoridades, e resolveram á vista d'essas informações.

O decreto de 24 de outubro de 1855 inaugurou um systema novo no paiz a respeito de divisão territorial. Esta divisão teve em vista um fim altamente administrativo, e é

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Preciso que saibamos qual elle foi, para de uma vez para sempre acabarmos com estas modificações a retalho que estamos a fazer todos os dias.

O decreto de 24 de outubro reduziu a administração demasiadamente: extinguiu as enfraquecidas municipalidades de povoações muito pequenas, onde não havia posses para satisfazer aos encargos do concelho, nem mesmo pessoal habilitado para exercer as funcções municipaes, porque se requeriam para esses logares homens com certas habilitações, e os mesquinhos ordenados que recebiam não convidava os que estavam nas circumstancias de bem servir. Reconheceu que não podiam, nos concelhos muito pequenos, estarem as auctoridades sobranceiras e separadas das paixões mesquinhas e particulares de pessoas de uma pequena área administrativa. Entendeu que devia alargar os concelhos pequenos, com o fim de que as despezas municipaes fossem repartidas por um maior número de pessoas e por uma maior massa de materia tributaria, e com o fim de que as auctoridades estivessem sobranceiras ás intrigas de localidade: e assentou finalmente o principio de fazer municipalidades era áreas de uma certa extensão.

Mas não foi só isto o que aquelle decreto teve em vista: inaugurou tambem um outro principio em favor do qual eu vejo reclamar-se constantemente. Refiro-me á extincção dos juizes ordinarios.

Todos os dias ouço aqui dizer que é preciso ir encaminhando as cousas até á extracção completa d'aquella instituição (apoiados); e todos os dias vejo projectos que restabelecem juizados ordinarios

Ora, se os povos se queixam, e com justiça, dos inconvenientes d'esta instituição; se um dos pensamentos capitaes do decreto de 24 de outubro foi acabar com os inconvenientes d'esta instituição, senão de todo, ao menos em grande parte, e fazer com que as camaras abrangessem uma maior área de terreno, para se poderem supprimir os juizes ordinarios; se todos os dias estamos aqui pedindo ao sr. ministro da justiça que proponha á camara uma medida tendente a acabar de todo com esta instituição; como é que nós havemos de votar o restabelecimento de juizados ordinarios?

Repito pois: foi ouvido o sr. ministro da justiça sobre este projecto? Quaes são as vantagens para a administração da justiça que resultam aos povos que hoje formam a comarca de Setubal em lhe porem dois juizes ordinarios nos antigos concelhos de Palmella e Azeitão? Esta questão é só administrativa e só municipal? Não se trata aqui de uma questão de administração de justiça?

O concelho de Palmella fica a uma legua de Setubal, tem uma bella estrada, é um passeio agradavel, e póde-se dizer que de Setubal a Palmella é apenas uma rua.

Ora, V. ex.ª não sabe, nem sabem a maior parte dos meus collegas que discutem, que com o restabelecimento do concelho de Palmella, o concelho de Setubal fica desorganisado. Para se fazer uma citação a um homem que mora a curtíssima distancia da cidade de Setubal, será preciso passar uma deprecada, e isto quando passando-se um pouco adiante do campo de Bomfim, se está no concelho de Palmella.

O concelho de Palmella tem mil trezentos e tantos fogos que não estão agglomerados, e alguns dos quaes ficam a tanta distancia de Palmella como de Setubal; por consequencia os povos não lucram nada com o restabelecimento do concelho de Palmella; antes pelo lado judicial ficam prejudicados, porque depois de intentada qualquer questão perante o juizo ordinario, tem de recorrer para o juiz de direito de Setubal.

O antigo concelho de Azeitão tinha oitocentos e tantos fogos, e não dou outra rasão para impugnar o parecer senão a propria que dá a illustre commissão de estatistica, de que são oito aldeias espalhadas que formavam o antigo concelho de Azeitão. Que mais prova se quer de que não ha necessidade de restabelecer este concelho? Se fossem oitocentos fogos agglomerados, ainda podia descobrir-se uma rasão para o restabelecimento do concelho; mas são oito freguezias ou aldeias separadas, e qualquer que não seja a se colhida para sede de concelho, tem de transpor tanta distancia para ir á cabeça do concelho como se, tivesse de ir a Setubal.

Diz se que ha a enorme distancia de duas leguas para ir a Setubal! Quem conhece os concelhos do Alemtejo não pôde ouvir fallar na distancia de duas leguas sem rir. Duas leguas é uma distancia pequenissima. No meu concelho ha distancias de quatro e cinco leguas, e ha concelhos com a distancia de seis e sete leguas dentro do concelho; isso é uma feição especial das povoações do Alemtejo.

O sr. Annibal: — Não ha estrada em boas condições entre Azeitão e Setubal, o alem d'isso ha montanhas que separam um concelho do outro.

O Orador: — Não ha estrada de Azeitão para Setubal, mas a camara municipal de Setubal, de que é presidente o illustre deputado, deveria ter provido a essa necessidade; e eu desde já presto o meu pequeno auxilio, ainda que não tenho outra importancia senão a do meu voto, ao illustre deputado, se quizer pedir á camara um subsidio para ajudar a feitura da estrada de Setubal a Azeitão. Se não ha estrada é uma rasão para ella se fazer, e não para se ir desorganisar completamente o concelho da cidade de Setubal. Este projecto desorganisa e tira toda a importancia aquelle concelho.

Eu tinha pedido a palavra simplesmente sobre a ordem, e não quero dizer mais nada do que o necessario, para fundamentar o meu adiamento.

Creio que a camara não quererá votar materia d'esta importancia sem estar habilitada e ter ouvido a esse respeito o sr. ministro do reino e o da justiça, cujos serviços são altamente interessados n'esta questão.

Leram-se na mesa as seguintes propostas:

ARTIGO ADDICIONAL

Proponho o seguinte additamento ao projecto, que tomará o logar do artigo 2.°:

«O concelho actual de Setubal restituirá aos concelhos de Azeitão e Palmella todos os bens municipaes que pertenceram a estes concelhos, ou o seu valor, no caso de terem sido alienados durante a annexação. = Abilio Gomes da Costa.»

Foi admittido á discussão.

PROPOSTA

Proponho o adiamento do projecto até que o governo tenha dado informações sobre elle pelos ministerios do reino e da justiça. = Aragão Mascarenhas.

Foi apoiada.

O sr. Ministro da Guerra (Ferreira Passos): — Pedi a palavra para mandar para a mesa sete propostas de lei.

Para não cansar a camara com a sua leitura, porque têem de ser impressas e distribuidas, peço licença para ler só a synopse.

São as seguintes:

PROPOSTA DE LEI N.° 41-B

Senhores. — Pela carta de lei de 13 de fevereiro de 1862, foi o governo auctorisado a despender a quantia de réis 7:000$000 com a construcção de mais duas enfermarias, tres quartos para enfermeiros, arrecadação, refeitório, etc. no terreno que se adquiriu para alargar o edificio em que se acha estabelecido o hospital militar permanente de Lisboa.

A construcção das indicadas obras que era reclamada por todas as considerações da sciencia, e que contribue poderosamente para que o referido hospital seja levado a um grau de perfeição analogo ao bom serviço que presta, está em andamento e não obstante ter sido dirigida com toda a economia, não poderá ser concluida sem que se despenda mais a quantia de 4:533$265 réis, alem da que pela supracitada carta de lei de 13 de fevereiro de 1862 está votada.

A grande importancia das ditas obras com respeito ao aperfeiçoamento do hospital em questão; a grande quantidade de trabalho que já está feito e que ficaria inutilisado com manifesto prejuizo da fazenda, se não progredisse, e a circumstancia de ter sido a obra arrematada e por conseguinte obrigado o governo por um contrato a satisfazer a referida quantia; são as considerações pelas quaes tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.° É o governo auctorisado a despender até á somma de 4:533$265 réis com os melhoramentos de que carece o hospital militar permanente de Lisboa, alem da somma de 7:000$000 que para o mesmo fim foi votada por carta de lei de 13 de fevereiro de 1862.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 2 de abril de 1864. = José Gerardo Ferreira Passos.

PROPOSTA DE LEI N.° 41-C

Senhores. — A diversos empregados do real collegio militar não se chegou a realisar o pagamento das quinzenas (meios soldos) em, divida dos ordenados e gratificações vencidas em 1847 e 1848. Estes empregados têem reclamado por si ou representados por seus herdeiros o pagamento das quantias em divida, cuja somma monta a 604$168 réis. O direito que lhes assiste para serem attendidos n'esta reclamação é incontestavel, e em presença d'esta circumstancia foram expedidas por este ministerio ao director do dito collegio as ordens precisas para o competente pagamento d'estas dividas, por ser ao cofre do mesmo collegio que competia solve-las em seu devido tempo pela respectiva dotação.

Não tendo porém sido possivel distrahir do dito cofre a quantia precisa para realisar o pagamento em questão, em consequencia de outros encargos de maior necessidade, que lhe incumbia satisfazer, e não se podendo transferir dos fundos votados a este ministerio no presente anno economico a sobredita quantia para o cofre do collegio militar, nem tão pouco inclui-la na lista das divida relativas a annos economicos, cujo exercicio se acha findo, visto achar-se declarado que tal divida é excluida da regra geral a similhante respeito, por isso e para que os direitos dos credores originarios ou de seus herdeiros sejam devidamente attendidos como é reclamado pela justiça; venho submetter á vossa judiciosa apreciação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E o governo auctorisado a consignar no orçamento do estado e a despender no anno economico de 1864— 1865 a quantia de 604$168 réis, com o pagamento das quinzenas (meios soldos) em divida dos ordenados e gratificações, vencidas por empregados do collegio militar em 1847 e 1848.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 2 de abril de 1864. = José Gerardo Ferreira Passos.

PROPOSTA DE LEI N.° 41-D

Senhores. — Compenetrado da instante necessidade de ampliar o quartel do regimento de infanteria n.° 12, na cidade da Guarda, e de melhorar as suas actuaes casernas e calabouço, não só para remover alguns, e attenuar outros dos inconvenientes apontados no relatorio do cirurgião de brigada, inspector sanitario na 6.º divisão militar, mas principalmente para combater as más condições hygienicas do mesmo quartel, ás quaes com boas rasões se attribue a ophthalmia desenvolvida n'aquelle corpo; porém convencido não menos da impossibilidade em que se acha o ministerio da guerra, de fazer face á importante despeza reclamada pelas obras que é mister executar no alludido quartel, dispondo, como dispõe, tão sómente de 40:000$000 réis annuaes, que tanto se lhe vota no respectivo orçamento, e que nem sufficiente é para occorrer ás mais urgentes reparações de tão avultado numero de praças de guerra, pontos fortificados, quarteis e differentes edificios da sua dependencia, que todos necessitam de obras urgentes, orçadas em mais 300:000$000 réis; convencido, repito, de que o ministerio a meu cargo não pôde ordenar o que se julga conducente ao melhoramento do quartel do regimento de infanteria n.° 12, sem que seja habilitado com os fundos indispensaveis, que não está no caso de realisar nem mesmo por meio da venda de alguns edificios desnecessarios ao serviço do exercito, attento o pouco que similhante venda ha produzido, e o limitado da verba que se poderá ainda obter; n'estes termos tenho a honra, senhores, de vos apresentar a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E o governo auctorisado a despender, durante o anuo economico de 1864-1865, até á quantia de réis 10:000$000, com a ampliação e melhoramento do quartel do regimento de infanteria n.° 12, na cidade da Guarda.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 2 de abril de 1864. = José Gerardo Ferreira Passos.

PROPOSTA DE LEI N.° 41-E

Senhores. — A instrucção pratica relativa ao serviço de artilheria que é ministrada aos officiaes e mais praças d'esta arma no campo de instrucção das Vendas Novas, é da maior utilidade e até indispensavel para que d'ella se possa obter com vantagem o serviço que é destinada a prestar.

Esta verdade tem sido reconhecida pelo parlamento, e para attender ás despezas que todos os annos ha necessidade de fazer com os trabalhos do referido campo de instrucção, tem sido votada a verba de 6:000$000 réis. No orçamento da despeza do estado do corrente anno economico, relativo ao ministerio da guerra, não foi consignada a mencionada verba, e como o facto de se interromper a instrucção seria de grande inconveniente, mesmo porque inutilisaria a despeza e esforços empregados nos annos anteriores, por isso tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E o governo auctorisado a despender no actual anno economico a quantia de 6:000$000 réis, com os trabalhos já realisados ou que houverem de se realisar no campo de instrucção das Vendas Novas.

Art. 2.° É igualmente auctorisado o governo a consignar nos orçamentos da despeza do estado, que houverem de se fazer, com relação ao ministerio da guerra, para os annos economicos futuros, a verba de 6:000$000 réis para serem applicados aos trabalhos que nos respectivos annos houverem de se fazer no referido campo de instrucção das Vendas Novas.

Art. 3.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 2 de abril de 1864. = José Gerardo Ferreira Passos.

PROPOSTA DE LEI N.° 41-F

Senhores. — Pedro Caetano Portugal obteve a nomeação de servente da administração geral dos correios em 26 de setembro de 1835, assentou praça de correio conductor supranumerário em 4 de outubro de 1837, passou interinamente, a fazer o serviço a cavallo ás ordens da secretaria d'estado dos negocios da guerra em 29 do março de 1847, foi transferido tambem interinamente para o commando em chefe do exercito em agosto do mesmo anno, sendo ali nomeado em março de 1850 correio a cavallo pertencente ao quadro, e pela extincção do referido commando em chefe regressou para a secretaria d'estado, onde actualmente se acha como addido. Tem portanto este correio mais de vinte e oito annos de bons e assiduos serviços civis, alem de vinte e sete de honrosos serviços militares em differentes corpos do exercito, assim na guerra peninsular, de que possue a cruz de condecoração n.° 6, como na legião constitucional lusitana destacada para o Brazil, e nas campanhas da liberdade, pelas quaes lhe foi concedida a medalha n.° 9; mas como não pertence ao quadro da secretaria d'estado, não pôde aspirar ás vantagens concedidas aos correios effectivos pelos decretos de 14 de agosto de 1824 e 21 de maio de 1825. Todavia, considerando eu este empregado, pelos seus longos serviços, em circumstancias não menos attendiveis do que as do correio addido ao ministerio das obras publicas, commercio e industria, Antonio de, Almeida Vizeu, a favor do qual foi promulgada a lei de 11 de julho de 1863, tenho a honra de offerecer á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É extensivo ao correio addido á secretaria d'estado dos negocios da guerra Pedro Caetano Portugal o disposto na carta de lei de 11 de julho do anno proximo findo, para, da mesma fórma que o correio addido ao ministerio das obras publicas, commercio e industria, Antonio de Almeida Vizeu, de quem trata a mesma carta de lei, ser considerado correio effectivo da predita secretaria d'estado, sómente para os effeitos de gosar as vantagens concedidas na regulação annexa ao decreto de 14 de agosto de 1824, no regulamento mandado observar pelo decreto de 21 de maio de 1825 e mais disposições em vigor.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 30 de março de 1864. = José Gerardo Ferreira Passos.

Foram enviadas á commissão de guerra, ouvida a de fazenda. PROPOSTA DE LEI N.° 41-G

Senhores. — Devendo, na conformidade do disposto no § 10.° do artigo 15.° do capitulo 1.º do titulo 4.° da carta constitucional da monarchia portugueza, ser fixada no corrente anno a força do exercito, vou submetter á vossa consideração a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° A força militar do exercito é fixada em 30:000 praças de pret de todas as armas.

Art. 2.° D'esta força o governo fica auctorisado a licencear a que poder ser dispensada sem prejuizo do serviço.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

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Secretaria d’estado dos negocios da guerra, em 2 de abril de 1864. = José Gerardo Ferreira Passos

PROPOSTA DE LEI N.° 41-H

Senhores: A força do exercito, conforme o mappa referido a 31 de dezembro ultimo, era de 19:301 praças de pret de todas as armas, d'estas 1:454 têem direito a ser licenciadas para a reserva até ao fim de dezembro proximo futuro, por irem completando durante este periodo os cinco annos de serviço effectivo prescripto no artigo 4.° da lei de 27 de julho de 1855; 525 têem direito a baixa por já haverem completado o tempo de serviço marcado no artigo 4.° da lei de 5 de dezembro de 1840, e mais 88 que vão adquirindo esse direito até ao fim do corrente anno; e calculam se em 1:200 as vacaturas que devem resultar das praças passadas ás guardas municipaes de Lisboa e Porto, ás guarnições das provincias ultramarinas, a veteranos, as impossibilitadas do serviço por incapacidade physica, por incorregibilidade, por deserções e fallecimentos.

Desejando 590 praças continuar no serviço, tendo 62 requerido a sua readmissão por mais tres annos, segundo o disposto no artigo 10.° da lei de 27 de julho de 1855; e calculando-se em 481 os alistamentos por contrato no corrente anno, que tantos foram os effectuados no anno anterior, faltam por consequencia 12:833 praças para o completo das 30:000 em que é fixada a força do exercito na respectiva proposta de lei.

No fim de dezembro ultimo subia a 22:604 o numero de recrutas em divida dos contingentes decretados depois da publicação da sobredita lei. Alistaram-se nos corpos do exercito no anno antecedente 3:507 recrutas e remiram-se do serviço militar 1:735 por virtude da faculdade concedida no artigo 7.° da lei de 4 de junho de 1859. No total das referidas recrutas ha 1:950 que pertencem ao contingente de 7:200, decretado pela lei de 9 de julho de 1863 e 3:292 que pertencem a contingentes anteriores.

Attendendo pois ás exigencias do serviço, e a que os districtos administrativos do continente do reino e ilhas adjacentes amortisaram uma grande parte da divida dos contingentes decretados nos annos de 1860 a 1863, que somma 10:899 recrutas, por isso que o governo espera obter o resultado das providencias que vae tomar a este respeito, submetto á vossa consideração, em cumprimento do preceito do artigo 3.° da lei de 27 de julho de 1855 a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° O contingente para o exercito no presente anno é fixado em 3:600 recrutas, distribuido pelos districtos administrativos do continente do reino e ilhas.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 2 de abril de 1864. = José Gerardo Ferreira Passos.

Foram enviadas á commissão de guerra.

O sr. Sieuve de Menezes: — Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: — Tem a palavra.

O sr. Sieuve de Menezes: — Como está presente o sr. ministro da guerra, e s. ex.ª se deu, ha algumas sessões, por habilitado para responder a uma interpellação que lhe annunciei sobre licenças concedidas a umas praças de pret no districto dos Açores; e como na occasião em que s. ex.ª veio á camara para responder a esta interpellação, eu não tinha commigo os documentos precisos para a verificar, e como esta interpellação é desagradavel ao ministerio da guerra, desejava verifica-la agora, se a camara permittisse e s. ex.ª quizesse.

O sr. Ministro da Guerra (Ferreira Passos): — Estou prompto a responder.

O sr. Presidente — Vou consultar a camara. Os srs. deputados que entendem que se deve interromper a discussão do projecto n.° 132, para ter logar a interpellação do sr. Sieuve de Menezes, tenham a bondade de levantar-se.

Consultada a camara, resolveu negativamente.

O sr. Presidente: — Está em discussão a proposta de adiamento do sr. Aragão ao projecto n.° 132.

O sr. Faria Guimarães: — Uma das rasões que vi apresentar para se sustentar o adiamento proposto, foi não ter sido ouvido o governo relativamente ao objecto do projecto.

Parece-me que este projecto é do tempo em que era ministro do reino o sr. Braamcamp; se isso é verdade, as opiniões de s. ex.ª são conhecidas em favor do restabelecimento dos pequenos concelhos, toda a vez que os povos o requeiram e julguem, que têem meios de se sustentarem como concelho.

Eu conheço por experiencia alguns concelhos que foram sacrificados por esta idéa de engrandecer os concelhos sem nenhuma rasão e conveniencia para os povos; e de tal modo foi feita essa divisão que, como ha pouco disse o sr. Coelho do Amaral, deixaram-se algumas freguezias encravadas de modo que, para irem ao seu concelho, têem de atravessar forçosamente outro concelho. Nesse caso está a freguezia da minha naturalidade, de que os habitantes não podem ir á cabeça do seu concelho sem passarem por outro.

Eu tratei de me informar se o restabelecimento destes concelhos foi pedido pelos povos respectivos. Disseram-me que sim, e se isto é verdade voto contra o adiamento, e voto para que se satisfaça á pretensão do povos, porque elles é que sabem o que melhor lhes convem.

O sr. Presidente: — Fica suspensa esta discussão para se passar á ordem do dia, visto estar presente o sr. ministro da fazenda.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO DO ORÇAMENTO NA SUA GENERALIDADE

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Mârtens Ferrão para continuar o seu discurso.

O sr. Mártens Ferrão:- (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar:)

O sr. Presidente: — Vae ler-se a ultima redacção do projecto de lei n.° 19.

Leu-se e foi approvada.

O sr. Secretario Miguel Osorio: — Vae ser expedido para a outra camara.

O sr. João Antonio de Sousa: — Para um requerimento. Requeiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se julga sufficientemente discutida a generalidade do orçamento.

Posto á votação este requerimento foi approvado.

O sr. Quaresma (sobre a ordem): — Mando para a mesa um parecer da commissão de estatistica.

O sr. Ministro da Justiça (Gaspar Pereira) (sobre a ordem): — Mando para a mesa uma proposta de lei.

Esta proposta que tenho a honra de apresentar, responde era parte a uma das perguntas que acabou de fazer o nobre deputado o sr. Mártens Ferrão, relativamente aos trabalhos do regulamento geral da lei hypothecaria.

Não exponho agora á camara, porque não é occasião opportuna, mas falo hei por outra vez, os motivos que têem dado causa a esta demora. O que posso dizer, é que tenho as mais fundadas esperanças de que em breve teremos o regulamento geral para se poder pôr em pratica a lei hypothecaria.

Pelo que respeita á segunda pergunta, relativamente ao accordo com o banco, ainda se não pôde conseguir; mas estou persuadido de que se realisará, e o governo ha de empregar todos os meios para isso, a fim de que em breve esta lei tão importante tenha execução.

A proposta é a seguinte:

proposta DE LEI n.° 41-a

Senhores. — O governo tem empregado, como era do seu dever, todos os meios que lhe pareceram convenientes para que possa quanto antes ser posta em execução a lei hypothecaria de 1 de julho do anno proximo preterito, a qual, collocando o nosso regimen hypothecario sobre bases mais solidas, o adaptou para servir de fundamento, e dar uma larga desenvolução ao credito predial, que só pôde fornecer em condições favoraveis á agricultura, á primeira das nossas industrias, os capitaes de que tanto precisa para florescer e prosperar a ponto de chegar a competir com a de qualquer das outras nações da Europa, visto como nenhuma, ou bem poucas, foram dotadas pela Providencia com tão propicio clima e tão abençoado sólo.

Cônscio pois d'aquelle dever, o governo, logo depois de publicada a lei, encarregou a redacção do projecto do regulamento geral, que deve desenvolver e tornar mais facilmente applicaveis as suas disposições, a um illustre jurisconsulto, membro de uma das casas do parlamento, de provada competencia em materias juridicas, e conhecido com distincção dentro e fóra do paiz por seus escriptos sobre aquella de que se trata.

Concluido o projecto foi, por decreto de 15 de outubro ultimo, nomeada para o rever e examinar uma commissão composta, alem do auctor do mesmo projecto, de mais seis vogaes, tres membros da camara electiva e da commissão de legislação que, sob proposta do governo, apresentou na mesma camara o projecto da lei hypothecaria, sendo um d'elles o presidente da commissão, e outro o relator do projecto; e os outros tres vogaes jurisconsultos distinctos de reconhecida capacidade e sciencia.

Os trabalhos d'esta commissão, pelo zêlo com que ella se tem dedicado ao desempenho da sua ardua tarefa, acham-se bastante adiantados, e o resultado d'elles não poderá tardar muito em ser presente ao governo para lhe dar a consideração devida. Não se fará portanto esperar tambem longo tempo a publicação do regulamento geral da lei hypothecaria; e como já foi publicado, em data de 31 de dezembro ultimo, o decreto que regulou o concurso para o provimento dos logares de conservadores privativos e de seus respectivos ajudantes, em harmonia com o disposto no artigo 7.° da mesma lei, temos bem fundados motivos para crer que não está longe a epocha em que ella possa ser posta era execução.

Para conseguir esse fim é comtudo ainda indispensavel que o governo seja, quanto antes, habilitado devidamente com os meios pecuniarios precisos não só para a acquisição dos livros que devem ser fornecidos ás conservatorias tanto de 1.ª como de 2.ª ordem, mas tambem para o pagamento das despezas que tem occasionado, e que ha de occasionar ainda, a organisação, revisão e exame do projecto de regulamento geral da referida lei.

Segundo o calculo da somma approximada do custo dos referidos livros, que a regularidade do serviço exige que sejam uniformes em todas as conservatorias, para o que importa que sejam fornecidos directamente pelo governo, calculo feito pela sobredita commissão; aquella somma não pôde, de modo algum; rasoavelmente descer a menos de 15:000$000 réis, attendendo a que são 298 conservatorias, a cada uma das quaes têem de ser fornecidos 8 livros; 4 em grande formato, sendo 2 de 600 paginas cada um e dois de 400; e outros 4 em formato mais pequeno; sendo 2 de 400 paginas cada um, e outros 2 cada um de 200; e a que a esta quantia é mister addicionar a que terá de despender se com o sêllo de dois d'elles para cada Conservatória, e com a conducção de todos aos seus destinos; parecendo me sufficiente quanto ás outras despezas indicadas; a somma de mais 5:000$000 réis, que com aquella perfaz a total de 20:000$000 réis:

Á vista do que fica exposto, tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação a seguinte proposta de lei:

Artigo l.º E auctorisado o governo a despender até á somma de 20:000$000 réis na acquisição dos livros necessarios para o serviço do registo em todas as conservatorias creadas no continente do Reino e ilhas adjacentes pela carta de lei de 1 de julho de 1863, e bem assim nas demais despezas da organisação, revisão e exame do projecto de regulamento geral da mesma lei.

Art. 2.º O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer da presente auctorisação.

Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios ecclesiasticos e de justiça, em 31 de março de 1864. = Gaspar Pereira da Silva = Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

Foi enviada á commissão de legislação, ouvida a de fazenda.

O sr. Antonio de Serpa (para um requerimento): — Mando para a mesa o seguinte requerimento, e peço a v. ex.ª que lhe dê o destino conveniente (leu).

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — Este requerimento entra no expediente.

O sr. Carlos Bento (sobre a ordem);— Mando para a mesa uma proposta, e peço a v. ex.ª que tenha a bondade de a sujeitar á deliberação da camara na occasião competente. Tenho simplesmente em vista que seja remettida á commissão de fazenda.

A proposta é a seguinte:

PROPOSTA

Proponho que seja fixada a importancia da divida fluctuante no anno economico de 1864-1865. = Carlos Bento.

O sr. Presidente: — Será tomada em consideração na occasião competente.

O sr. Camara Leme (sobre a ordem): — Mando para a mesa alguns pareceres da commissão de guerra, e entre estes vae o relatorio ao projecto apresentado pelo sr. deputado Sant'Anna e Vasconcellos, ácerca dos segundos sargentos que serviram na junta do Porto; e outro sobre o projecto apresentado pelos srs. deputados Coelho do Amaral e Gonçalves de Freitas, para serem applicadas as disposições da carta de lei de 30 de julho ao sargento ajudante do regimento n.° 6.

O sr. Quaresma (para um requerimento): — Requeiro que v. ex.ª consulte a camara para se dispensar o regimento, a fim de se passar desde já á especialidade do orçamento. Assim se decidiu.

O sr. Presidente: — Entra em discussão o orçamento relativo á junta do credito publico.

JUNTA DO CREDITO PUBLICO

Encargos da divida interna

Capitulo 1.º Gratificações aos membros da junta e ordenados aos empregados — 20:176$000 réis.

Foi approvado.

Capitulo 2.° Juros — 2.793:965$621 réis.

Foi approvado.

Capitulo 3.° Amortisações — 3:670$036 réis.

Foi approvado.

Capitulo 4.° Diversos encargos — 8:300$000 réis.

Foi approvado.

Encargos da dívida externa

Capitulo 5.° Despeza com a commissão da agencia financial em Londres — 7:549$090 réis.

Foi approvado.

Capitulo 6.° Juros —2.890:490$925 réis.

Foi approvado.

Capitulo 7.° Amortisações.

Foi approvado.

Capitulo 8.° Diversos encargos — 30:800$000 réis

Foi approvado.

Ministerio da fazenda

Encargos geraes

Capitulo 1.º Dotação da familia real — 641:000$000 réis.

Foi approvado.

Capitulo 2.° Côrtes — 91:289$400 réis.

Foi approvado.

Capitulo 3.° Presidencia do conselho — 3:200$000 réis

Foi approvado.

Capitulo 4.° Juros e amortisações a cargo do thesouro — 1.081:389$613 réis.

Foi approvado.

O sr. Carlos Bento (sobre a ordem): — É para dizer a v. ex.ª que mandei para a mesa a minha proposta unicamente com o fim de ser remettida á commissão de fazenda. O sr. Presidente: — Remette se.

Capitulo 5.° Classes inactivas — 501:743$979 réis.

O sr. Visconde de Pindella: — Pedi a palavra porque desejava fazer algumas considerações a respeito da proposta que acabou de apresentar o meu illustre amigo e collega o sr. deputado por Valença; mas como a camara já deliberou que fosse á commissão, espero que ella a attenderá como é de justiça. Tenho toda a esperança de que assim ha de acontecer, porque é tão clara e manifesta a justiça que assiste a esta classe, que não posso esperar senão que tanto o sr. ministro como a commissão hão de procurar esforçar-se por melhorar a situação infeliz em que ella se acha. Mas tendo eu tido a honra de apresentar differentes representações, pedindo que a prestação aos egressos fosse por inteiro, tendo chamado a attenção da commissão de fazenda e do governo para este negocio, e havendo se me respondido que a occasião competente de tratar d'elle era quando se discutisse o orçamento, não pedia tambem, n'esta occasião, deixar de chamar a attenção do nobre ministro da fazenda e dos illustres membros da commissão respectiva, para que procurassem melhorar a sorte d'estes pensionistas.

Vejo presente principalmente o dignissimo relator da commissão de fazenda, meu amigo, e pedia-lhe que fizesse quanto estivesse ao seu alcance pura que se faça justiça a uma classe que tanto direito tem a ser attendida.

O sr. Blanc: — Tem rasão.

O Orador: — Depois do que s. ex.ª acaba de me dizer, mais esperança tenho de que na presente sessão, esta classe será considerada com mais justiça de que o tem sido até

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aqui, e espero que esta mesma discussão levará alguma esperança a esta classe.

Muito se poderia dizer, muito se poderia discursar sobre o direito que têem estes pensionistas a serem melhorados na sua posição; podia se mesmo fallar ao sentimentalismo; mas este negocio é daquelles que basta annunciar-se para todos nos capacitarmos da sua justiça.

Eu não proponho que se lhe dêem 10, nem 15, nem 20; o meu desejo seria que se lhe desse tudo; mas se isto não é possivel, dê-se lhe o mais que poder ser. Houve um decreto que reduziu os seus subsidios a metade; ha dezoito annos que isto teve logar, e este decreto ainda hoje existe em vigor. E doloroso dizer isto, mas que remedio temos nós senão repetir uma cousa que creio nos envergonha!

E isto não é só com o actual governo, vae ter com todos os governos, porque todos têem desamparado uma classe tão desprotegida.

Não digo mais nada, e peço á illustre commissão de fazenda e ao governo que lhe dêem alguma cousa, porque é de toda a justiça.

Termino, declarando que assigno com muito gosto a proposta do meu nobre amigo, deputado por Valença.

É a seguinte:

PROPOSTA

Proponho que se votem mais 15 por cento ás classes inactivas de não consideração. = Ferreri = Fernando Magalhães Villas Boas = Visconde de Pindella, deputado pelo 2.° circulo eleitoral de Guimarães.

Foi admittida e enviada á commissão de fazenda.

O sr. Antonio de Serpa: — Desejo dizer apenas duas palavras, a fim de chamar a attenção da commissão para um objecto em que tenho aqui fallado mais de uma vez. Refiro-me ás pensionistas do monte pio militar. Eu receio que o muito, o mais, prejudique o menos.

As classes inactivas têem direito de ter mais alguma cousa do que têem, entretanto como o numero de pessoas que estão comprehendidas n'esta classe é muito grande, receio que o espirito de economia prepondere na commissão e no governo, e porque se não pôde fazer o mais, se não faça o menos.

Mas n'esta classe ha uma especialidade, cujos direitos nós temos obrigação de reconhecer. Nós somos muito complacentes para uns, e para com outros menos e causa até admiração a dureza do nosso coração durante tantos annos, em não pagar aquella pobre e desgraçada classe aquillo que se lhe deve. Ás outras classes é de equidade que se lhes pague; mas a esta, cujos paes legaram certas sommas ao estado para depois da sua morte ficar um subsidio ou uma pensão ás suas viuvas e filhas — a esta digo, não só é de equidade, mas de justiça pagar-lhe.

Em 1843, pela falta absoluta de meios, e attento o estado em que se achava o paiz, decidiu-se que a estas pensionistas se pagasse só metade; mas que para o futuro se pagaria por inteiro, e que seriam indemnisadas dos annos em que recebessem só metade.

Todos os annos estamos votando augmento de ordenado para as classes activas; não digo que não tenham justiça, mas essa justiça não será mais evidentemente para a classe d'estas pensionistas?

Por conseguinte pedia á commissão de fazenda a sua attenção para o estado desgraçado em que esta classe se acha, e espero que a commissão e o governo não terão duvida em elevar um pouco o subsidio a esta classe.

O sr. Castro Ferreri: — As classes inactivas de não consideração fizeram um requerimento a esta camara, o qual está sujeito ao exame da illustre commissão de fazenda; mas até hoje não vi resultado nenhum d'esse requerimento, nem me parece, pela tardança, que a illustre commissão de fazenda esteja resolvida a dar um parecer favoravel a esta infeliz classe.

Eu tenho pugnado sempre e constantemente, não por um favor, mas para que se lhe faça justiça. A camara no anno passado e no outro fez um augmento nos vencimentos d'esta classe de 5 e 10 por cento; mas toda esta importancia computou apenas em 12:000$000 réis. Foi este o beneficio que n'estes dois ultimos annos se lhe fez; que não é beneficio, mas restituição de uma parte do que lhe deve.

Ora, se o governo julga o nosso estado lisonjeiro, segundo diz o orçamento, porque n'elle vem consignadas despezas em larga escala, parece-me que era de rigorosa justiça que a esta classe se lhe restituisse o que lhe pertence, visto a posição desgraçadissima em que se encontra. Os seus vencimentos são limitadíssimos e já se vê que qualquer augmento que se lhe fizesse não seria desfalcar o thesouro.

Tratando-se pois da verba relativa a esta classe, eu não podia ficar silencioso, vendo que nem a commissão de fazenda emittia opinião alguma a seu respeito, nem que o governo a queria por agora considerar. Portanto chamo a attenção do sr. ministro da fazenda sobre este objecto, porque entendo ser de justiça, dar-se-lhe mais alguma cousa. Por consequencia mando para a mesa uma proposta, e espero que a commissão de fazenda e o governo a attenda, porque é uma cousa justissima.

Congratulo-me em ver que o meu paiz se acha em um estado prospero, e que a situação financeira é a melhor possivel segundo nos assevera o illustre relator o sr. Blanc, pelo que felicito o governo, a illustre commissão de fazenda, a camara e o paiz. Ora tendo nós dinheiro para todas as despezas, entendo que devemos dar aos pensionistas d'esta classe, aquillo que se lhes deve.

Esta classe é muito respeitavel e deve merecer a attenção do corpo legislativo; não se deve desprezar só porque é uma classe que não figura, e quem não figura na sociedade mau é. Aquelle que não figura na sociedade a sua influencia é nulla, e se alguma ha, é como o fumo, rapidamente se evapora.

Portanto, não se dando a estes pensionistas importancia alguma, se não houver alguma alma caritativa que se interesse por elles, ficarão no esquecimento.

O sr. Castello Branco: — Ficam no limbo.

O Orador: — Peior, porque no limbo nem se gosa, nem se soffre. Mas soffrem na miseria.

Portanto mando uma nota para a mesa o peço á commissão e ao governo que a attendam.

O sr. Ministro da Fazenda: — Quanto propõe?

O Orador: — O meu desejo era que se lhe restituisse o resto de que se lhe deve, mas se se lhe não pôde dar, dê-se-lhe o que poder ser, segundo os recursos do thesouro.

Mando a proposta, e espero que a commissão de fazenda de accordo com o sr. ministro da fazenda não ha de deixar de a attender.

(Pausa.)

O Orador: — Nesta proposta digo que se lhe dêem 15 por cento mais sobre o nominal; se o governo lhe quizer dar mais será para mim uma fineza da parte do sr. ministro da fazenda, e s. ex.ª praticará um acto de justiça.

Devo tambem notar que não tenho pessoa nenhuma que me pertença n'esta posição; por consequencia não é interesse pessoal que me move a vir lembrar esta classe, mas sim um acto de justiça que desejo ver praticar (apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda: — Que vá a proposta á commissão.

O Orador: — Peço que a proposta vá á commissão.

O sr. Ministro da Fazenda: — O governo está tão animado como todos os srs. deputados, do sentimento de proteger estas classes que realmente têem estado privadas de uma parte dos vencimentos que lhes pertenciam (apoiados), porque as nossas circumstancias não têem permittido pagar integralmente a todos; mas tem-se dado alguns passos para melhorar a sua situação, e n'este sentido têem-se-lhes diminuido as deduções. Não se pôde porém ir tão longe como desejâmos, e temos de ficar onde os recursos nos prendem. (apoiados).

Este anno deu se tambem um passo em referencia ás classes activas: diminuiram se as deduções. E não quero dizer que as classes inactivas não sejam dignas de attenção; mas aquellas que trabalham successivamente tambem se devem attender, visto o preço a que se tem elevado todos os generos necessarios á vida (apoiados), visto o augmento a que tem subido n'estes ultimos tempos o preço das subsistencias (apoiado). Portanto, por parte do governo tem se tido em consideração a necessidade de ir diminuindo quanto possivel as deduções.

Pelo que respeita ás classes inactivas, e principalmente aquellas a que acabam de se referir os illustres oradores que me precederam, tenho em muita consideração a justiça, a equidade e contemplação que ellas merecem, e peço que esta proposta vá á commissão de fazenda para combinar com o governo sobre o que se deve fazer. Se se lhes não puder dar mais é porque os limites da nossa receita o não permittem; mas se se puder fazer alguma cousa, por parte do governo ha desejo igual ao dos illustres deputados em beneficiar quanto possivel estas classes (apoiados).

Pensem todavia bem os illustres deputados em que ha um deficit, e que, posto não ser tão grande como se diz, elle existe. Todos sabem a difficuldade que ha em que as receitas cresçam de repente, e os mesmos illustres deputados que sustentam a necessidade do augmento da receita e de que o deficit desappareça, não ignoram a difficuldade de haver mais receita. O augmento da receita não provem senão de impostos novos ou do successivo incremento dos impostos actualmente existentes; e ainda que vão crescendo alguns impostos, como o imposto do sêllo e o do registo, não pôde comtudo esse augmento cubrir desde logo todas as despezas que se votam (apoiados); e aquelles que julgam que o governo calculou a receita de um modo exagerado são os que devem ser mais parcos em votar augmentos de despeza, ou então devem propor novos meios de receita, porque não hão de querer aggravar o deficit.

E já que fallei a este respeito, e que ainda agora não pude dar algumas explicações ao illustre deputado que fallou, aproveitarei a occasião para dizer que, com relação ao calculo da receita, o governo tratou de se approximar quanto possivel da verdade, e que todas foram calculadas segundo a cobrança effectuada.

A dos direitos de mercê é uma d'ellas, e os illustres deputados sabem que esta receita se cobra dentro do praso de quatro annos. Portanto, n'esta parte a receita deve calcular-se pela liquidação da do anno anterior, porque como digo, esta cobrança é certa e determinada por um praso de quatro annos, e foi o que eu fiz...

Uma voz: — Ninguem fallou n'isso.

O Orador: — Não foi o sr. Mártens Ferrão, foi o sr. Carlos Bento, e se não fallou n'isto agora, fallou em outra occasião.

Quanto ao calculo da receita das alfandegas, parece-me que esta receita não é por tal modo contraria á apreciação exacta dos factos que não fosse o anno passado, mesmo concedida pelo sr. Casal Ribeiro quando fallou sobre este assumpto.

Portanto parece-me que não andâmos muito longe da verdade, calculando a receita das alfandegas do modo porque o fiz, e que esta receita effectivamente se deve realisar.

O regulamento de contabilidade como lei, como obrigação de fazer o calculo não pôde adduzir se, porque o regulamento veiu depois do orçamento estar feito; e como principio ou indicação dão se circumstancias especiaes que nos induzem a acreditar que o calculo que fazemos se approxima da verdade e as circumstancias que se dão entre nós para este augmento é muito de suppor que existam no anno seguinte.

Pelo que respeita ao imposto do registo vê-se felizmente que este imposto vae crescendo, por que passou de trezentos e tantos contos a sete centos contos que foi a ultima cobrança. Por conseguinte tem crescido consideravelmente, e sendo um d'aquelles impostos que acompanha o desenvolvimento da sociedade nas suas transacções, já se vê que deve crescer ainda mais.

Pelo que respeita á lei hypothecaria o meu collega já respondeu. Disse o sr. Mártens Ferrão que parecia que o regulamento era mais difficil de fazer do que a lei.

Eu ainda que me não tenho dedicado a esta especialidade com a proficiencia do illustre deputado, acredito que o regulamento é mais difficil de fazer do que a lei. Vejo a doutrina immensa que este regulamento encerra, principalmente em Hespanha onde se fez um muito desenvolvido. E n'esta lei a parte da execução é a mais difficil, porque é preciso estar a prevenir todas as hypotheses.

Portanto o regulamento d'esta lei é altamente importante e envolve doutrina que precisa ser madura e seriamente considerada, e desenvolvida numa serie muito grande de artigos; e por consequencia não é de admirar que a feitura d'este regulamento tomasse entre nós bastante tempo, e occupasse a attenção de distinctos jurisconsultos, como tem occupado; sem que isto prove que haja da parte do governo menos cuidado na sua confecção, antes pelo contrario o governo tem empregado todos os esforços para que o regulamento seja feito, o qual, como annunciou o meu collega, será em breve concluido.

Havendo pois de executar-se em breve essa lei, maior facilidade haverá para a permutação de todos esses valores, e por consequencia para o augmento do imposto da transmissão.

Tambem o illustre deputado interpellou o governo sobre se tem a idéa de proseguir na desamortisação.

Já aqui declarei uma vez e torno a repetir que o governo tem a idéa firme de proseguir na desamortisação; julga isso altamente conveniente, tanto debaixo do ponto de vista economico, como financeiro. Esse projecto está na commissão; ella tem trabalhado para elaborar o seu parecer que o governo conta será ainda n'esta sessão presente á camara para discutir e resolver esse assumpto (apoiados).

S. ex.ª disse ainda agora tambem que a commissão tinha achado saldo positivo.

A commissão não achou saldo positivo, porque effectivamente reconhece que ha um deficit. E a vantagem que ha era se fazer o orçamento, classificando-se a despeza em ordinaria e extraordinaria, não é simplesmente uma vantagem de methodo, como aqui se disse, methodo que ainda n'este orçamento não está perfeitamente applicado, nem era possivel exigir-se isso no primeiro ensaio que d'elle se faz entre nós; mas é tambem para as côrtes terem presentes toda a despeza que votam (apoiados); porque ainda que as despezas votadas em leis especiaes não estão sumidas nem são mysteriosas, pois, como todos nós sabemos, não ha nada mysterioso no governo representativo, comtudo é facto que as despezas votadas em leis especiaes dispersas são difficeis de encontrar; e, não havendo o trabalho de as procurar, acontece muitas vezes que nem mesmo lembra que existem nem que se votaram; e vão se votando muitas despezas sem lembrar o que já está auctorisado (apoiados).

Assim, por exemplo, a respeito d'esta divida fluctuante de que se fallou, e de que teremos occasião de tratar com especialidade quando se discutir a proposta do sr. Carlos Bento, muita gente diz: «E preciso pôr um termo á divida fluctuante. »

E chama se entre nós divida fluctuante a uma cousa que o não é em parte nenhuma. Uma divida que está auctorisada por uma lei, que deu ao governo auctorisação de emittir inscripções para realisar certa somma, e o governo só o que fez foi empenhar provisoriamente as inscripções, porque achou esse expediente melhor, não se pôde reputar que é divida fluctuante; é uma divida que transitoriamente tem esse caracter, mas o governo está por lei auctorisado a vender esses titulos para consolidar a divida; porque quando a lei foi votada na camara auctorisando a emissão d'esses titulos, deu-se a isso o caracter de divida consolidada, e se se empregou o expediente de se empenharem, foi uma cousa transitoria, e não porque o governo não estivesse auctorisado na lei a vender os titulos. Essa parte da divida que foi contrahida sobre penhores, que são titulos cuja venda auctorisou uma lei especial para satisfação de despezas, não pôde ter o caracter de fluctuante. Divida propriamente fluctuante é aquella que se levanta sobre bilhetes do thesouro, para apurar receita, a fim de que se possam satisfazer pontualmente as despezas correntes. Essa divida contrahida sobre penhores, divida auctorida por lei especial, como acabo de dizer, é propriamente divida consolidada, e se transitoriamente não tem esta fórma, porque se adoptou o empenho dos titulos como expediente, está auctorisada a sua consolidação, e estabelecido o limite dentro do qual se pôde fazer a venda dos titulos (apoiados).

O anno passado o sr. Carlos Bento achava que o melhor expediente era augmentar muito a divida fluctuante, que era o melhor recurso financeiro: a divida consolidada e outros expedientes não prestavam. Este anno, como em França se fallou tombem em que a divida fluctuante tinha augmentado consideravelmente, e que se elevava já a quasi metade da despeza total do orçamento francez, o illustre deputado trouxe para cá essa idéa. Mas não me parece que seja boa a applicação, porque effectivamente a divida fluctuante em França tem um caracter diverso da divida fluctuante entre nós. Lá não existe esta divida sobre penhor, que como eu disse, é impropriamente chamada fluctuante, e que verdadeiramente é uma divida consolidada, porque já está auctorisada a sua consolidação pela lei, e portanto

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tem uma natureza diversa da que tem a fluctuante. Lá a divida fluctuante é uma divida a prasos que não tem penhor, cujos titulos o governo não está auctorisado a vender, que não tem dotação para lhes garantir um juro. Lá a divida fluctuante é levantada sobre bilhetes do thesouro, bons du Trésor, é uma divida a prasos; emquanto que entre nós chama se divida fluctuante á divida sobre penhor, que não é propriamente fluctuante, porque os titulos já têem a dotação na junta do credito publico para pagamento dos respectivos juros, e está auctorisada a sua venda dentro de certos limites, e portanto póde-se consolidar, e esta divida longe de dar augmento de despeza, dá pelo contrario um augmento de receita, pois aquillo por que se venderem os titulos ha de ser um valor superior aquelle por que estão empenhados (apoiados); sem acrescer nenhuma verba de despeza nova para a junta do credito publico pelos juros d'esta divida, porque já lá estão dotados estes titulos. Isto é differente do estado da divida fluctuante franceza.

Mas eu não quero proseguir agora n'esta discussão, porque como a proposta do sr. Carlos Bento foi para a commissão, nós teremos occasião de tratar esse assumpto quando elle voltar á discussão.

O que eu posso assegurar á camara é que o governo tratou de se approximar quanto possivel e conscienciosamente ao que elle reputa a verdade e a exactidão nos calculos que fez no orçamento, apresentando á camara todas as despezas que existem, assim como todas as receitas, conforme elle entende que effectivamente se devam realisar.

O sr. Visconde de Pindella: — Eu pedi a palavra na occasião em que o meu nobre amigo o sr. Antonio de Serpa disse que = não era mesmo preciso fazer proposta =. Eu tambem o entendia assim, porque (e talvez não lembrasse ao meu nobre amigo) existia uma representação d'estas pensionistas na commissão de fazenda; por consequencia era uma proposta natural, mas visto que s. ex.ª sempre fez uma proposta, eu tambem tive a honra de a assignar.

Depois de ouvir as explicações do nobre ministro da fazenda, das quaes deprehendo que tem muito boa vontade de que se dê alguma cousa a esta classe, não tenho mais nada a acrescentar.

Reconheço que ha um deficit, que se não poderá dar tudo quanto se deve, mas que se poderá dar alguma cousa. Voto que se elevem as prestações ás classes inactivas porque entendo que têem justa rasão (apoiados). O proprio sr. ministro da fazenda disse que = as subsistencias estão muito mais caras =: é verdade. Estas classes têem fome (apoiados), as outras tambem precisam, mas estas precisam mais (apoiados). E como vejo que ha boa vontade da parte do nobre ministro e commissão de fazenda nada mais direi. Peço que a estas classes se dê alguma cousa, se se lhes não poder dar tudo (apoiados).

O sr. Coelho de Carvalho: — Pouco tinha a dizer. O meu amigo o sr. Antonio de Serpa precedeu me nas considerações que eu tencionava fazer, especialmente em relação ás pensionistas do monte pio militar. Eu assignei tambem a proposta do sr. Serpa, e quando a commissão der parecer sobre ella e entrar em discussão, usarei da palavra e direi aquillo que entender.

O sr. Antonio de Serpa: — Folgo que o sr. ministro da fazenda viesse dar rasão á nossa votação, de que não estava discutida a materia da generalidade do orçamento (apoiados); porque s. ex.ª foi aquelle que teve de discutir a generalidade do orçamento a proposito deste capitulo das classes inactivas (apoiados).

E desnecessario estar a querer estreitar de mais a discussão, porque está provado que da parte da opposição não ha tenção do demorar o debate (apoiados), e tanto que todos os oradores que têem fallado por parte da opposição o têem feito no mais breve numero de palavras que poderam (apoiados), e até já têem deixado de votar uns poucos de capitulos sem discussão (apoiados).

O assumpto sobre que fallou o sr. ministro a respeito da divida fluctuante deve ser mais largamente tratado quando se discutir a proposta do sr. Carlos Bento (apoiados).

O nobre ministro tem rasão quando diz, que a nossa divida chamada fluctuante não é só divida fluctuante; mas tambem não deixa de ser verdade que não é ainda divida consolidada; é divida sobre penhores, é uma divida que tem até certo ponto o caracter de fluctuante, porque é divida a prasos =.

Ora a idéa do sr. Carlos Bento, que é tambem a minha, não é que se confunda essa divida com a que é propriamente divida fluctuante; mas ao menos, que nós saibamos, que o paiz saiba quaes são as sommas por nova emissão ou por imposto que o governo precisa levantar durante o anno (apoiados); porque a não ser assim a vantagem que s. ex.ª o sr. ministro diz que apresenta hoje no orçamento de não dar uma auctorisação indefinida, essa vantagem desapparece. O governo tem inscripções disponiveis dotadas por lei, ou as tem empenhadas, o governo pôde vende-las, e n'este caso o governo pôde gastar, alem das sommas votadas pelo orçamento, as sommas provenientes da venda d'estas inscripções, que estão empenhadas a 40 por cento, mas que valem 47, 48 e 49 por cento; se os vender por este preço ahi está uma receita que pôde ser importante, porque as inscripções empenhadas sobem a muitos mil contos, e o governo se realisar essa venda obterá uma somma importante, que junta aos 3.000:000$000 réis que se votaram no orçamento, significam uma auctorisação mais ampla do que parece á primeira vista. O que é conveniente é que o parlamento proceda de modo que fique sabendo o que o ministro fica auctorisado a gastar durante o anno.

É necessario que o paiz e o parlamento saibam quanto se pôde gastar, e isto não se fica sabendo pelo orçamento como está, sem se fixar o que pôde levantar pela divida fluctuante, ou pela venda das inscripções empenhadas.

Portanto entendo que a proposta do sr. Carlos Bento tem todo o cabimento para se ficar sabendo qual é a somma de que o governo julga ter necessidade no proximo anno para gerir a fazenda publica, que não são só os réis 3.000:000$000 que estão no orçamento.

A divida fluctuante como está hoje deixa uma porta aberta para o governo levantar fundos.

Quando se tratar especialmente deste objecto farei mais largas considerações.

O sr. Ministro da Fazenda: — Não obstante dizer que esta questão devia ficar reservada para quando se tratasse do parecer sobre a proposta do sr. Carlos Bento, não posso deixar desde já de rectificar a asserção do sr. Antonio de Serpa quando disse que = o governo ficava auctorisado a levantar fundos alem d'aquelles que estão votados no orçamento =. Não fica, porque se, por exemplo, pela consolidação de uma parte da divida sobre penhores o governo realisar alguns fundos, inutilisa se então a parte correspondente á auctorisação que tem para levantar dinheiro.

O governo fixa no orçamento toda a despeza ordinaria e extraordinaria, e tambem fixa toda a receita ordinaria e extraordinaria, e depois de fixar todas as despezas e receitas, diz: «Falta para preencher esta despeza tal receita». Fica limitado a isto, não pôde levantar nem realisar fundos senão para satisfazer a despezas legaes, e não pôde ir alem dos limites da auctorisação concedida (apoiados). É exactamente o principio que está consignado no orçamento e que não estava nos orçamentos anteriores (apoiados); onde, quando se apresentava a lei de receita, dizia-se n'um artigo: «O governo usará dos meios de credito para levantar os fundos necessarios, a fim de occorrer com regularidade ao pagamento das despezas auctorisadas por lei». Essa auctorisação era indefinida; mas no orçamento actual é definida. Do que se tratou foi de fixar bem este ponto, e de modo que o governo depois se não visse embaraçado para gerir a fazenda publica, confiando em que dentro dos limites que propõe escusem de vir pedir nova auctorisação ao parlamento, que é o receio do sr. Mártens Ferrão, o qual está persuadido de que o governo, pelo modo como está calculada a receita, deverá vir mais tarde pedir auctorisação á camara para levantar novos fundos. Estou persuadido que não, e não seria eu que fosse crear esse embaraço a mim proprio, porque é principalmente sobre o ministerio da fazenda que vão recaír todas as requisições dos outros ministerios para satisfazer ás despezas. Portanto se não tivesse a convicção firme que tenho pelo exame das cobranças, pelo modo como ellas correm e pela analyse do crescimento dos diversos impostos e melhor cobrança, de que a receita ordinaria podia satisfazer á despeza ordinaria, eu pediria uma auctorisação para realisar 200:000$000 ou 300:000$000 réis, ou aquillo que fosse necessario; mas reputo não ser isso necessario.

O que tinha a peito era fazer ver que o governo não tem auctorisação alguma indefinida, porque está fixada a somma que elle pôde levantar, e a parte d'essa somma que deve ser realisada por uma consolidação de divida, não se pôde levantar por outro modo. Portanto não pôde haver receio algum. O governo não pôde senão, ou representar a receita do anno a consolidar alguma divida, para cuja consolidação já está auctorisado, e ganhar a differença entre o valor por que estão empenhadas as inscripções e aquelle por que as vender.

As inscripções estão hoje cotadas a 50 por cento, o que me parece que não depõe contra o nosso credito, pelo contrario prova o nosso credito (apoiados). E tambem seja-me licito dizer, não depõe contra a gerencia do governo, porque se ella fosse má, de certo que os nossos fundos não estariam assim cotados, (apoiados). E um facto que deve regosijar a todos nós, porque manifesta a prosperidade do paiz (apoiados).

Quiz unicamente ratificar estas idéas, reservando-me para maior desenvolvimento a respeito da fixação da parte da divida fluctuante sobre penhores e que não é propriamente divida fluctuante. E um expediente que se julgou mais opportuno em certa epocha. Em logar de lançar as inscripções no mercado, empenhavam-se, parecendo que isso influiria menos na baixa dos titulos. Acho conveniente ir consolidando essa divida, que é uma divida amphibia, porque nem é fluctuante nem consolidada, e ambas com esta ameaça sobre o mercado, que influe de um modo desvantajoso na cotação dos fundos.

Isto não é condemnar o expediente. Os expedientes justificam-se pela occasião em que se empregam. Este podia ser vantajoso na occasião em que se empregou. Em logar de se lançar no mercado uma massa de titulos, conseguiu-se o dinheiro por um preço inferior, esperando occasião opportuna para ir lançando esses titulos no mercado. Esse expediente, portanto, podia ser vantajoso na occasião em que se empregou; mas as nossas circumstancias felizmente têem melhorado e não melhorando progressivamente, entendo que se deve ir consolidando aquella divida, e que a epocha em que este expediente podia ser adoptavel já passou (apoiados).

E pondo se logo á votação o

Capitulo 5.° — Foi approvado.

Capitulo 6.° Encargos diversos — 155:113$155 réis.

O sr. Castro Ferreri: — Pedi a palavra para chamar a attenção do nobre ministro da fazenda sobre o objecto em que vou rapidamente fallar.

N'este capitulo vem uma differença de tresentos e tantos mil réis com relação a fóros impostos sobre bens nacionaes, e, aproveitando a occasião de se tratar deste objecto, desejava que o sr. ministro da fazenda dissesse se tem idéa de apresentar ainda n'esta sessão uma proposta de lei para a alteração da lei de 4 de abril de 1861, sobre a remissão de fóros.

Eu já pedi n'esta camara uma nota dos fóros remidos, foi enviada pelo ministerio da fazenda, e por ella se vê que existem dezenove mil e tantos fóros, e que apenas se acham remidos cento e tantos.

Já se vê que a difficuldade na remissão dos fóros provém dos laudemios. Emquanto existirem os laudemios como se acham estabelecidos não será possivel fazer-se a remissão; isso é obvio, escusado é demonstra lo.

Pôde ser pequeno o fôro imposto em qualquer propriedade, e comtudo o laudemio ser de natureza tal que não convide o emphyteuta a fazer a remissão.

Não se levando a effeito a lei que permittiu a remissão dos fóros, julgava conveniente que o governo propozesse a alteração dessa lei eliminando os laudemios. Ainda que essa eliminação pareça um ataque á propriedade do directo senhor, comtudo, se a medida é justa e conveniente, é preciso que se faça a eliminação dos laudemios...

Uma voz: — A reducção.

O Orador: — Eu quereria mesmo a eliminação...

O sr. Visconde de Pindella: — Era melhor.

O Orador: — Não julgo que o directo senhor lucre muito com a existencia do laudemio, não havendo a remissão, e o que nós vemos é que a lei não se põe em execução, e que a remissão não se faz, porque existem dezenove mil e tantos fóros e apenas se acham remidos 151.

Uma voz: — Ainda não acabaram os seis mezes.

O Orador: — Já se vê que a difficuldade está n'isto, e não pôde deixar de estar. Portanto chamo a attenção do governo sobre este objecto, a ver se s. ex.ª está disposto a apresentar alguma alteração a este respeito.

O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra para chamar a attenção do sr. ministro sobre a verba de quatro contos e tanto, que vem incluida n'estes encargos diversos.

Esta verba representa no orçamento da despeza como de fóros que a fazenda nacional pago de diversas propriedades que possue a differentes corporações e particulares.

Parecia me conveniente, para que esta verba deixasse de apparecer no orçamento, que a fazenda nacional, tendo como tem muito fóros de igual valor, remisse estes por outros; porque assim como o sr. ministro está auctorisado para vender esses fóros, tambem está auctorisado para os poder trocar por outros das differentes corporações, ficando d'este modo os bens da fazenda sem esse encargo. Assim a propriedade da fazenda nacional ficava livre, e as outras corporações não perdiam nada, porque recebiam outros fóros de igual valor. Por exemplo, o jardim botanico de Coimbra, que paga um fôro creio que de 6$000 réis ás freiras de Sant'Anna, que duvida ha em que a fazenda nacional dê um fôro ás freiras de Lorvão em troca do que a fazenda está pagando, uma vez que seja de igual valor?

O Sr. Rocha Peixoto: — Não pôde ser d'esse modo.

O Orador: — O illustre deputado tem a palavra, é uma alta intelligencia e ha de facilmente poder rebater a minha opinião; mas deixe-me continuar.

Eu concordo com a opinião do illustre deputado que acabou de fallar, era que a lei de 4 de abril de 1861 pouco ou nenhum resultado pôde dar, e que os fóros difficilmente hão de ser remidos emquanto existirem os laudemios como estão. E eu fallo com a maior franqueza porque não sou emphyteuta de nenhuma corporação, mas entendo que essas corporações ganham muito se o projecto apresentado pelo sr. ministro da fazenda e affecto á commissão competente for approvado por esta camara, porque a maior parte das corporações, como são os cabidos e as freiras, têem fóros por cobrar desde 1832, e se a esses fóros se tirarem os laudemios a remissão ha de ser prompta e importante. Emquanto isso se não fizer o resultado ha de ser o que apontou o illustre deputado, isto é, de continuarem a existir dezenove mil e tantos fóros sem os quererem remir.

Quem quizer a liberdade da terra deve quere-la completa, e isto não se alcança senão abolindo ou reduzindo os laudemios para facilitar a remissão dos fóros.

O sr. Rocha Peixoto: — Os srs. deputados Ferreri e José de Moraes sentem que as remissões dos fóros, censos ou pensões não tenham tido logar em mais larga escala e com o desenvolvimento que seria para desejar. Eu não acho procedentes, nem fundados os motivos a que os illustres deputados attribuem a falta ou difficuldades das remissões.

A ultima providencia que o sr. ministro da fazenda apresentou á camara no anno passado para facilitar a remissão dos fóros, é de julho de 1863, e o regulamento que se fez para a execução d'essa providencia é de dezembro do mesmo anno, e n'esse regulamento ha uma disposição determinando que a lei principie a ter execução desde a data do regulamento. Estabelece a lei o praso de seis mezes para os foreiros, censuarios e pensionistas requererem a remissão, e esse praso ainda passou, por consequencia ainda se não pôde conhecer e verificar os effeitos que essa lei pôde produzir, nem se pôde apurar o numero dos que pretendem remir. Só passados seis mezes, praso que pela lei foi concedido e fixado aos foreiros para a remissão dos fóros, é que se poderá averiguar até aonde chegará a remissão, porque só então serão conhecidos os que a pretendem; emquanto esses seis mezes não passarem, não se pôde queixar ninguem de que ella não produziu os resultados que se tiveram em vista quando foi apresentado e convertido em lei o projecto do sr. ministro da fazenda. São pois prematuras e infundadas as conjecturas dos illustres deputados.

Não posso concordar com o arbitrio proposto ou lembrado pelo sr. José de Moraes, de que o governo pôde e deve permittir os fóros em que a fazenda nacional succedeu por outros para facilitar as remissões, por nem direito ter para o fazer, nem é conveniente que se faça, porque se a fazenda nacional for permutar os fóros por outros, a liberdade da terra nada terá conseguido, porque passarão pela permuta para possuidor que não os remirá.

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A ultima lei, á qual já me referi, estabelece que todo o individuo que paga um fôro á fazenda, tem a faculdade de o remir, satisfazendo as diversas condições prescriptas na lei e requerendo a remissão no praso de seis mezes; este praso ainda correu e por isso não tem direito o governo de permutar os fóros emquanto que este praso não acaba. Por consequencia o sr. José de Moraes, querendo facilitar a liberdade da terra pelo methodo lembrado, vae difficulta-la.

Quanto á questão dos laudemios á camara sabe que essa questão tem vindo aqui differentes vezes. Todos reconhecem a necessidade de reduzir os laudemios para facilitar a remissão, mas não extingui-los.

O laudemio é uma condição do contrato que deve respeitar-se quando estipulada nos limites do justo, e segundo as leis especiaes que regulam os contratos.

E o governo de per si não póde reduzir nem extinguir os laudemios. Essa faculdade pertence ao poder legislativo, principalmente a respeito dos bens sobre os quaes o estado exerce a suprema fiscalisação, tanto a respeito da sua administração como de sua transmissão.

O laudemio, como todos sabem, é uma parte complementar do dominio directo. Se o illustre deputado o sr. Castro Ferreri quer levar a camara a eliminar o laudemio, então vá mais longe, elimine o fôro, elimine o direito de propriedade. E quer isto? Não póde ser. Se querem reduzir o laudemio á quarentena, isso mesmo é uma questão difficil e grave, mas isso voto (apoiados) e voto porque os laudemios acima de quarentena foram estabelecidos pela pressão, pela superioridade dos senhorios sobre os foreiros pobres e desgraçados. A reducção do laudemio á quarentena tem o meu voto, e estou persuadido que não hei de ficar só (apoiados). Mas agora eliminar os laudemios, isso não póde ser, nem nós temos a faculdade de o fazer, seria uma expoliação. Podemos nós extinguir o direito de propriedade, ou privar alguem d'este direito sem previa indemnisação? São estas reflexões que tenho a fizer, e espero que o illustre deputado não insista n'isso. Concluindo declaro, que o meu voto será sempre pelas mais faceis remissões, pela desamortisação, pela reducção dos laudemios.

O sr. Ministro da Fazenda: — Pouco acrescentarei ao que se tem dito. Por parte do governo posso dizer que as leis têem sido executadas. O que peço aos nobres deputados é que reservem estas reflexões (apoiados), sobre a questão dos laudemios ou fóros, para quando vier o projecto de lei (apoiados), porque agora não nos leva a conclusão alguma (apoiados), e deixámos de votar o orçamento (apoiados). Já disse que esta questão de reduzir o laudemio, assim como todas as que dizem respeito ao grave assumpto da remissão, é tratada no projecto. Era pois melhor esperar por essa occasião, e escusarmo-nos de a tratar agora e a proposito do orçamento, porque isso não nos conduz a conclusão alguma (apoiados).

(O sr. ministro não reviu discurso algum dos que proferiu n'esta sessão.)

O sr. José de Moraes: — Ouvi o meu collega e particular amigo, o sr. Rocha Peixoto, e esperei que o illustre deputado com a sua alta intelligencia, que todos nós reconhecemos, me elucidasse e mostrasse que estava em erro, mas na realidade o illustre deputado confundiu completamente a questão. E vou prova-lo á camara.

O illustre deputado entendeu que eu tinha fallado na lei de 13 de julho de 1863, e no regulamento de dezembro d'esse anno; entendeu mal, porque eu sei perfeitamente qual a disposição da lei de 13 de julho de 1863. Na proposta d'essa lei havia o sr. ministro da fazenda consignado que fossem isentos de laudemio os fóros que estavam encorporados na fazenda nacional, quer dizer, os fóros que tinham sido dos antigos conventos dos frades. Como porém no artigo 23.° vinha a isenção do laudemio, tambem para os fóros da escola polytechnica, eu e mais os meus collegas do districto de Coimbra propozemos a eliminação dos laudemios para os bens que estavam encorporados no hospital da universidade de Coimbra, e assim ficou estatuido na lei.

Já vê pois o illustre deputado que eu não podia argumentar com a disposição d'esta lei nem do regulamento, e que só por falta de lembrança sua não comprehendeu que é a lei de 4 de abril de 1861, aquella a que me referi, e o sr. Castro Ferreri, e não á lei de 13 de julho de 1863. Essa lei trata da desamortisação dos bens das corporações religiosas, das freiras e dos cabidos; e n'essa lei não está tirado o laudemio, antes se dispõe que o laudemio será pago na quantidade estipulada no contrato.

Ora o illustre deputado sabe por consequencia, e escusava eu de lh'o dizer tambem, que por esse regulamento da lei de 4 de abril já acabou o praso; e tanto acabou que o illustre ministro da fazenda mandou vender uma porção de fóros de bens pertencentes a essas corporações, e não achou na praça quem os comprasse. Isto é, a praça mesmo veiu justificar a minha opinião, de que com o laudemio que estava não se podia dar liberdade á terra.

Já vê o illustre deputado que eu quero mais a liberdade da teria do que querem aquelles que pertencem á extremidade do norte (apoiados), aonde estavam abraçados aos fóros, como o christão se abraça á fé em Nosso Senhor Jesus Christo. Os illustres deputados do Minho, vendendo-se os fóros que pertenciam á fazenda nacional, deixaram o fôro de 10 e 20 réis (apoiados): queriam ainda que terra ficasse escravisada (apoiados). Os que não representam o norte, mais o centro das provincias do reino, o que querem é a liberdade completa da terra (apoiados).

Como não desejo prolongar agora este debate, quando vier essa questão á camara, a tratarei e mostrarei ao illustre deputado que não quero roubar os senhorios, porque nunca roubei ninguem (riso).

O sr. Faria Guimarães: — Pedi a palavra para dizer que me parecia que esta questão era agora mal cabida (apoiados), e havia aqui uma grande confusão de leia, que era a lei de abril de 1861 a que trata da desamortisação dos bens das mitras, dos cabidos, das freiras e das collegiadas, e a lei de julho de 1863 a que trata da remissão dos fóros.

Ora, como se fallou na lei de 4 de abril, limito-me a dizer que estimaria muito que a commissão de fazenda, que tem prompto o projecto para se reduzir o laudemio, o trouxesse á discussão, sem o que a desamortisação é impossivel (apoiados). Mas isso não é para agora. Fiz simplesmente esta observação, pelo desejo que tenho de que este projecto venha á camara quanto antes.

Vozes: — Votos, votos.

E pondo-se logo á votação o

Capitulo 6.° — foi approvado.

O sr. Presidente: — Como a hora está a dar, vou dar a ordem do dia para terça feira, que é a continuação da que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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